LIVRO I
“O homem nasce livre e por toda parte se encontra sob grilhões. Aquele que mais
acredita ser o senhor dos outros não deixa de ser mais escravos que eles [...] a ordem social é
um direito sagrado que serve de base a todos os outros. Esse direito, entretanto, não deriva
absolutamente da natureza, está fundado sobre convenções” (ROUSSEAU, 2017, 14).
“O mais forte não é suficientemente forte para ser sempre o senhor, se não transforma
sua força em direito e a obediência em dever [...] se é necessário obedecer pela força, não é
preciso obedecer por dever, e se não é mais forçado a obedecer, não se está mais obrigado a
fazê-lo [...] a palavra direito não acrescentou nada à força” (ROUSSEAU, 2017, 16 – 17).
“Convenhamos então que a força não estabelece o direito, e que só se está obrigado a
obedecer aos poderes legítimos” (ROUSSEAU, 2017, 17).
CAPÍTULO IV – DA ESCRAVIDÃO
“Uma vez que nenhum homem tem autoridade sobre seu semelhante e que a força não
gera nenhum direito, restam então as convenções, como base de toda autoridade legítima entre
os homens” (ROUSSEAU, 2017, 17).
Um homem não se torna escravo por vontade própria, ao fazer isso renuncia à sua
condição de homem, aos seus direitos como humano e aos seus deveres, se o fizesse estaria
louco, e a loucura não estabelece direitos.
“Se a guerra jamais confere ao vencedor o direito de massacrar os povos vencidos, esse
direito que ele não tem não pode fundamentar o de escravizá-los. Só se tem o direito de matar o
inimigo, quando não se pode torna-lo escravo; daí o direito de escraviza-lo não deriva do direito
de mata-lo: trata-se, pois, de uma troca iníqua fazê-lo comprar, pelo preço de sua liberdade, sua
vida, sobre a qual não se tem nenhum direito” (ROUSSEAU, 2017, 21).
Alguém que foi feito escravo não tem nenhum compromisso com o seu senhor,
obedece-lhe apenas enquanto é forçado a fazê-lo, tento como única autoridade a força. Nesse
sentido, há o estado de guerra entre eles que mesmo feito por uma convenção, não destrói o
estado de guerra, mas dá continuidade a ele.
Dessa maneira: “o direito de escravidão é nulo, não somente porque é ilegítimo, mas
porque é absurdo e não tem qualquer significado” (ROUSSEAU, 2017, 22).
Há uma grande diferença entre subjugar uma multidão e governar uma sociedade “Não
vejo nada além de um senhor e escravos, e de forma alguma vejo um povo e seu chefe, quando
homens dispersos, qualquer que seja o número, são sucessivamente submetidos a um único
homem [...] não existe aí nem bem político, nem corpo político [...] é sempre um interesse
privado” (ROUSSEAU, 2017, 22)
“Se não houvesse de fato convenção anterior, em que se basearia a obrigação da minoria
de se submeter à vontade da maioria – a não ser que a eleição fosse unânime – e como cem que
querem um senhor tem o direito de votar por dez que absolutamente não o querem? A lei do
plural idade dos sufrágios é em si mesma um estabelecimento de convenção e supõe a
unanimidade pelo menos uma vez” (ROUSSEAU, 2017, 23).
A passagem do estado de natureza para o estado civil substitui o instinto pela justiça e
agrega moralidade às suas ações.
“Mesmo que nesse estado se prive de várias vantagens que usufruía na natureza, ganha
outras maiores: suas faculdades se exercitam e se desenvolvem, suas ideias se ampliam e seus
sentimentos se enobrecem, toda a sua alma se eleva a tal ponto que, se os abusos dessa nova
condição não o degradassem frequentemente a uma condição inferior àquela donde saiu, deveria
bendizer sem cessar o instante feliz que o arrancou de lá para sempre, e que transformou um
animal estúpido e limitado em um ser inteligente e um homem” (ROUSSEAU, 2017, 28).
Ou seja, perde a sua liberdade natural (forças do indivíduo) e o direito de ter tudo o que
pode adquirir, mas ganha a liberdade civil (força da vontade geral e a posse) e o direito à
propriedade e a liberdade moral (homem como senhor de si).
“o Estado, pelo contrato social, que serve de base a todos os direitos, é senhor dos bens
de todos os seus membros, mas perante as outras potências só é o senhor daqueles bens pelo
direito do primeiro ocupante, que lhe foi dado pelos particulares” (ROUSSEAU, 2017, 29).
O direito do primeiro ocupante só se torna direito depois que se estabelece o direito de
propriedade.
“O pacto fundamental, ao invés de destruir a igualdade natural, substitui a desigualdade física
que a natureza pode ter colocado entre os homens, por uma igualdade moral e legítima, e que,
podendo ser desiguais na força ou na competência se tornem todos iguais por convenção e de
direito” (ROUSSEAU, 2017, 32).
LIVRO II
Já que a sociedade foi instituída pela vontade geral, por esta deve ser governada; ou
seja, a soberania é o exercício da vontade geral “ o soberano, que é apenas um ser coletivo, só
pode ser representado por ele mesmo: o poder pode muito bem ser transmitido, mas não a
vontade” (ROUSSEAU, 2017, 33).
Se o homem apenas obedece, ele então perde a sua qualidade de povo “não existe o
soberano a partir do instante em que tem um senhor, e desde então destrói-se o corpo político”
(ROUSSEAU, 2017, 34).
“A soberania é inalienável, pela mesma razão que é indivisível, uma vez que a vontade, ou é
geral, ou não, ou é aquela do corpo do povo ou somente de uma parte. No primeiro caso, essa
vontade declarada é um ato de soberania e tem valor de lei. No segundo caso, não passa de uma
vontade particular, ou de um ato de magistratura, no máximo é um decreto” (ROUSSEAU,
2017, 34).
CAPÍTULO III – SE A VONTADE GERAL PODE ERRAR
Há uma diferença entre a vontade geral e a vontade de todos. A primeira diz respeito ao
interesse comum, já a segunda ao interesse privado.
“Quando o povo, suficientemente informado, delibera, se os cidadãos não tiverem
nenhuma comunicação entre si, da variedade de pequenas diferenças resultaria sempre a
vontade geral, e todas as vezes a deliberação seria boa. Mas quando se fazem intrigas,
associações parciais as expensas do todo, a vontade de cada uma dessas associações torna-se
geral em relação a seus membros, e particular em relação ao estado; pode-se dizer, então, que
não há tantos votantes quanto são os homens, mas somente tantos quanto são as associações. As
diferenças tornam-se menos numerosos e geram um resultado menos geral. Finalmente, quando
uma dessas associações é tão grande que se sobrepõe a todas as outras, não tereis como
resultado uma soma de pequenas diferenças, mas uma diferença única, então não há mais
vontade geral e a opinião que domina é particular” (ROUSSEAU, 2017, 36 – 37).
O Estado é um corpo social e precisa de uma força para mover-se. “Como a natureza da
a cada homem um poder absoluto sobre todos os seus membros, o pacto social da ao corpo
político um poder absoluto sobre todos os seus [...] e esse mesmo poder que, dirigido pela
vontade geral, recebe o nome de soberania” (ROUSSEAU, 2017, 37 – 38).
Todo ato soberano favorece todos os cidadãos. Não é uma convenção do superior com o
inferior, mas uma convenção do corpo com os seus membros. Convenção legítima, equitativa,
útil e sólida.
“Os súditos, enquanto submetidos apenas às convenções, não obedecer a ninguém mais
somente a sua vontade própria [...] Assim, fica claro que o poder soberano, por mais que seja
totalmente absoluto, sagrado e inviolável, não ultrapassa nem pode ultrapassar os limites das
convenções gerais, e que todo homem pode dispor plenamente dos seus bens e da sua liberdade
naquilo que foi estipulado por essas convenções, de modo que o soberano nunca tem o direito
de sobrecarregar mais um súdito que o outro, uma vez que seu poder não é mais competente,
quando o assunto se torna particular” (ROUSSEAU, 2017, 40).
CAPÍTULO VI – DA LEI
É por meio da legislação e das convenções que há a união dos direitos aos deveres que
permite reconduzir a justiça ao seu objetivo. Todos os direitos são fixados por lei. A matéria
sobre a qual se legisla é geral, da mesma forma que a vontade que legisla. Toda função que diz
respeito a um objeto individual não pertence ao poder legislativo.
Aquilo que o homem ordena por conta própria, ou sobre um objeto particular, não é
absolutamente uma lei, é um decreto, não é um ato de soberania, mas de magistratura.
A republica então, é o Estado regido por leis independentes de forma de administração,
porque só o interesse público governa e a coisa pública é algo. Todo governo legítimo é
republicano.
As leis então são as condições da associação civil onde o povo submetido a elas deve
ser o seu autor, e, para que haja o entendimento e a vontade tem que haver um legislador.
O legislador deve saber primeiro se o povo está apto a receber as leis a qual irá redigir,
já que assim como o homem, as nações tem um tempo de maturidade a qual as leis devem ser
aplicadas.
“uma vez estabelecidos os costumes e os preconceitos enraizados, querer reforma-los é
um empreendimento perigoso e vão [...] só pode tornar-se livre, quando é bárbaro, não podendo
mais fazê-lo, quando o recurso civil é usado. Então, os distúrbios podem destruí-os sem que as
revoluções possam restabelecê-lo, e assim que seus grilhões se quebraram, cai desfeito e não
existe mais: necessita, de agora em diante, de um senhor e não de um libertador. Povos livres
lembrai-vos desta máxima: pode-se adquirir a liberdade, mas jamais recuperá-la” (ROUSSEAU,
2017, 51 – 52).
CAPÍTULO IX – CONTINUAÇÃO
Assim como há limites, no que diz respeito à estatura do homem, estabelecido pela
natureza, há também limites na constituição de um estado, no que diz respeito a sua extensão.
O território não deve ser muito grande, para que seja bem dirigido, e nem muito
pequeno, para que possa se manter e resistir aos abalos que poderá sofrer.
CAPÍTULO X – CONTINUAÇÃO
Um corpo político pode ser medido por sua extensão territorial e pelo número
populacional. A terra então deve ser necessária para alimentação dos habitantes.
“se há terreno em demasia a guarda é onerosa, a cultura insuficiente, o produto
supérfluo: essa e a causa imediata das guerras defensivas; se não há suficiente o estado fica a
mercê de seus vizinhos para sua manutenção, e essa é a causa imediata das guerras ofensivas
[...] para instituir um povo é necessário acrescentar uma condição que não pode suprir a
nenhuma das outras, mas sem a qual todas as outras seriam inúteis: a fruição da abundância e da
paz uma vez que o tempo em que se organiza um Estado é [...] o instante em que o corpo está
menos capacitado à resistência e mais fácil de destruir. Em uma desordem absoluta se resiste
melhor que em um momento de gestação, onde cada um se preocupa com o seu papel e não com
perigo” (ROUSSEAU, 2017, 56 – 57).
Para Rousseau o povo apto a receber a legislação seria: “Aquele que, estando já ligado
por qualquer laço de origem, de interesse ou de convenção, não conheceu ainda o verdadeiro
jugo das leis; aquele que não tem nem costumes nem superstições bem enraizadas; aquele que
não teme que possa ser arrastado por uma invasão súbita, e, sem tomar parte nas querelas de
seus vizinhos, pode resistir sozinho a cada um deles, ou ligar-se a um para repudiar o outro;
aquele onde cada membro pode ser conhecido por todos e onde não se e forçado a ser
sobrecarregar um homem com um fardo que ele não pode suportar; aquele que pode passar sem
os outros povos e sem o qual todos os outros povos podem passar; aquele que não é nem rico e
nem pobre, e pode bastar-se a si mesmo; enfim, aquele que une à consistência de um povo
antigo à docilidade de um povo novo” (ROUSSEAU, 2017, 58).