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Escatologia

A doutrina das últimas coisas

1. Introdução

A palavra escatologia é formada por , eschatos, último, fim, e


, logos, palavra, discussão, instrução, ensino, assunto, tema. Portanto,
escatologia é o estudo do fim ou o estudo das últimas coisas, ou, ainda, o estudo
dos últimos dias.
Os últimos dias iniciaram-se com o derramar do Espírito no dia de
Pentecostes (At 2.17, sobre Jl 2.28). Aquele dia foi marcado pelo evento que
capacitou a Igreja para proclamar a mensagem do Evangelho em todo o mundo.
A expressão “últimos dias” envolve a noção de uma nova criação,
diferente daquela que foi manchada pelo pecado de Adão, pecado que se
alastrou por toda ela (Gn 3.17; Rm 5.12). Jesus é a nova criação e seu
primogênito (Cl 1.15), a manifestação visível na História do ainda invisível
Reino de Deus (Lc 17.20,21).
Tendo em vista que os últimos dias já começaram, é de se ver que
Escatologia não tem a ver unicamente com o futuro, mas, também, com o
passado e o presente. Com o passado porque, nele, Jesus realizou a obra que
tinha que realizar, morrendo, ressuscitando e ascendendo ao céu. Com o futuro,
visto que lá se cumprirá o restante das coisas. Com o presente, pois ele é
moldado conforme a compreensão que se tenha sobre o que já foi feito e sobre o
que será feito. Sendo assim, passado e futuro alimentam o presente de
esperança.

2. Passado e futuro que enchem de esperança o cristão

O crente está eleito desde a eternidade passada (Ef 1.4). No entanto, dada
a condição de pecado de cada um, foi necessário que as condições estipuladas
por Deus em Sua lei fossem atendidas a fim de que a eleição se efetivasse. Está-
se falando da mobilização da própria Trindade a favor dos escolhidos. Assim,
cada uma das Pessoas operou para que o plano se consolidasse: o Pai escolheu
quem quis, o Filho obedeceu e derramou Seu sangue, e o Espírito atua nos
crentes para fazê-los ver o que fora feito e para transformá-los (I Pe 1.2).
A ação de Deus no passado gera o futuro (I Pe 1.3-5), futuro seguro,
guardado de toda contaminação (I Pe 1.4), sendo ambos, passado e futuro, a
razão da alegria cristã no presente (I Pe 1.6), presente que também está
guardado (I Pe 1.5) – uma alegria escatológica.
É importante ressaltar que a alegria se deve ao fato de que as tribulações,
no presente, seguidas do cumprimento da posse da glória, no futuro, cumprem
o mesmo trajeto de Jesus (I Pe 1.11; Hb 12.2). A identificação com o Salvador é o
verdadeiro motivo da alegria (At 5.40-42).

3. A chegada do Reino

O Senhor Jesus não lutará contra Satanás no futuro; Ele lutou no passado,
como se verá, e o derrotou, de maneira que o futuro será apenas para consumar
o que já está feito. Havendo Jesus derrotado o inimigo dEle e dos eleitos, logo se
vê que a relação dos crentes com o mal é mudada pela percepção de que se luta
com um inimigo já vencido. Sendo assim, a Escatologia é algo que toma a obra
executada no passado, com consumação certa no futuro, para transformar o
presente.
Falar sobre a chegada do Reino de Deus exige uma explicação: na
realidade, o Reino de Deus sempre existiu. Ele é o Criador de todas as coisas, e
reina sobre tudo desde sempre. O sentido que se quer dar à expressão “chegada
do Reino de Deus” é jurídico, pois, com o pecado de Adão, Satanás passou a
requerer que Deus condenasse os homens, conforme foi Sua determinação no
princípio (Gn 2.16,17). Satanás assumiu o papel de acusador (Ap 12.10).
Jesus reconheceu esse fato ao não questionar o diabo durante Sua
tentação no deserto (Mt 4.8,9; Lc 4.5-7). Num certo sentido, Satanás ganhou
autoridade sobre a criação. Foi preciso, então, que o plano de Deus fosse
executado para que a autoridade voltasse ao Senhor. Para este fim Jesus veio,
para tomar da mão do inimigo o que ele usurpou.
O próximo item falará da guerra jurídica que foi travada na cruz. Por
enquanto, diga-se que o Reino de Deus tem uma conotação presente (Mt 3.2,
João Batista; 4.17, Jesus; 10.7, os discípulos; Rm 14.17; I Co 4.20; Ap 12.10), que é
uma antecipação do que se verá na consumação (Mt 10.8; 12.28; Lc 10.9) e outra,
futura, quando tudo for consumado (Mt 19.24; Mc 1.15; 9.47; 14.25; Lc 7.28;
13.28,29; Jo 3.3,5; At 14.22; I Co 15.24; Tg 2.5).

4. A guerra jurídica

É certo que o nascimento de Jesus, em si, representou um baque na


autoridade que Satanás detinha. Ele representa o que a Bíblia chama de
manietar o valente (Is 49.24,25; Mt 12.29; Mc 3.27; Lc 11.21,22). Um bom
exemplo é João 9. Ali se fala sobre a cura de um cego de nascença, isto é, a
restauração de alguém que sofria os efeitos da Queda. O verso 32 é elucidativo:
“Desde o princípio do mundo, nunca se ouviu que alguém abrisse os olhos a um cego de
nascença”. Em outras palavras, ninguém entrara na casa do valente (o mundo),
que fosse mais valente. Mas o nascimento de Jesus mostrou que chegara o mais
Valente.
A expulsão de demônios é outro exemplo útil para se entender que havia
poder em Jesus para fazer tal coisa. Mas não apenas poder; também
legitimidade, autoridade (Mc 1.27). As pessoas estavam presas porque são
pecadoras, e o pecado é a chave para a prisão que Satanás impõe (I Co 15.56).
Ao expulsar os demônios, Jesus estava demonstrando que a legalidade do diabo
havia terminado. Mesmo antes de morrer na cruz, Jesus exercitava o que seria
consumado no Calvário. Era o Santo, mantendo-se Santo, a despeito de estar,
por assim dizer, na casa do pecado, o mundo.
A prova de que a questão era mais jurídica que de força é o fato de os
discípulos conseguirem expulsar demônios (Lc 10.17). Ora, claro está que os
homens, pecadores como são, não são mais fortes que Satanás; mas Jesus
compartilhou com eles Sua autoridade (Lc 10.20).
Para ser crucificado, Jesus precisou que houvesse autoridade das trevas
para O levarem ao Calvário (Lc 22.52,53), pois o plano eterno de Deus, de
sacrificar Seu Filho para benefício da humanidade requeria autores humanos
para ser executado (At 2.23; 4.27,28). Portanto, houve esse lapso de tempo em
que Jesus não usou Sua autoridade (Jo 19.9-11), mas submeteu-se à do diabo, o
que significa que entregou Seu calcanhar para ser picado pelo inimigo (Gn 3.15;
Sl 41.9; Jo 13.18).

5. A cruz

Palavras do Pr. Leandro Lima: “Na linguagem do Novo Testamento, Ele


havia recebido sobre si os nossos pecados (I Pe 2.24), foi contado com os
malfeitores (Lc 22.37), foi levantado da terra como um maldito (Gl 3.13). Aquele
foi o momento em que, ainda na cruz, de certo modo, Cristo experimentou os
tormentos do inferno, ou seja, quando Cristo sofreu sob a ira de Deus, tendo
que pagar tanto em seu corpo quanto em sua alma o preço da nossa
reconciliação com Deus”. Calvino disse: “Nada teria acontecido se Jesus
sofresse apenas a morte temporal. Pois era necessário que sentisse em Sua alma
o rigor do castigo de Deus, para Se pôr sob a Sua ira e satisfazer Seu justo juízo.
Pelo qual convinha também que combatesse com as forças do inferno e que
lutasse com o horror da morte eterna... De fato, não em um sentido espacial,
mas em um sentido espiritual, Ele desceu ao inferno”.
Jesus disse: “Tetelestai”, ou “... Está consumado...” (Jo 19.30). A prova de
que ao morrer Jesus, de fato, pagou toda a dívida dos eleitos é que o véu do
templo se rasgou (Mt 27.51; Mc 15.38), querendo dizer que a separação entre
Deus e os homens havia acabado. Deus aceitou o sacrifício de Jesus.
Esse foi o momento em que a cabeça do diabo foi ferida (Gn 3.15). A
morte de Cristo matou a serpente.
O processo na cruz foi o seguinte, segundo Colossenses 2.14: primeiro,
Jesus riscou a cédula. O verbo usado, traduzido por riscar quer dizer rasurar ou
borrar, isto é, não poderia mais ser lido; segundo, tirou a cédula, frase que tem
o sentido de Jesus ter sumido com a pasta onde estava o processo contra os
eleitos; terceiro, cravou a cédula na cruz; por isso, ela sumiu; estava na cruz.
Cl 2.15: o resultado do verso 14 é a total vitória de Cristo sobre Satanás e
as hostes que compõem a força do mal, expondo-os à vergonha.

6. A expulsão de Satanás

Satanás foi destruído na cruz (Hb 2.14,15). Suas obras também foram
desfeitas (I Jo 3.8). Agora, ele precisava ser expulso do céu, onde acusava os
crentes de dia e de noite (Ap 12.10).
Para a expulsão de Satanás era importante que Jesus ascendesse ao céu.
Quando Ele lá chegou (Ap 5.1-14), assumindo o lugar de Reis dos reis e Senhor
dos senhores ao tomar o livro em que a História é desvendada, e apenas Ele
poderia fazê-lo (Ap 5.2-5), toda a criação irrompeu em um novo cântico (Ap
12.9,12,13).
Era a hora de colocar Satanás fora do céu. Ele relutou, pois foi necessária
força bruta para fazê-lo, mas o exército angélico, comandado pelo arcanjo
Miguel (Jd 9), venceu para expulsar o inimigo (Is 14.12; Ez 28.17; Lc 10.18).

7. O milênio

A palavra milênio se refere aos mil anos mencionados em Apocalipse


20.2,3-5,7. Sua interpretação é difícil; em consequência, quatro visões sobre o
assunto são defendidas nas Igrejas nos dias de hoje: pré-milenismo histórico,
pré-milenismo dispensacionalista, amilenismo e pós-milenismo. Os prefixos pré
e pós antes da palavra milênio têm a ver com o momento da segunda vinda de
Cristo em relação ao próprio milênio.
7.1. pré-milenismo histórico

Segundo esse ponto de vista, a presente era da Igreja continuará até que,
com a proximidade do fim, venha sobre a terra um período de grande
tribulação e sofrimento. Depois desse período de tribulação no final da era da
Igreja, Cristo voltará à terra para estabelecer um reino milenar. Quando Ele
voltar, os crentes que tiverem morrido serão ressuscitados, terão o corpo
reunido ao espírito, e esses crentes reinarão com Cristo sobre a terra por mil
anos. (alguns pré-milenistas o consideram mil anos literais, enquanto outros o
entendem como expressão simbólica para um período longo).
Durante esse tempo, Cristo estará fisicamente presente sobre a Terra em
seu corpo ressurreto e dominará como Rei sobre toda a terra. Os crentes
ressuscitados e os que estiverem sobre a Terra quando Cristo voltar receberão o
corpo glorificado da ressurreição, que nunca morrerá, e nesse corpo da
ressurreição viverão sobre a Terra e reinarão com Cristo. Quanto aos incrédulos
que restarem sobre a Terra, muitos, mas não todos, se converterão a Cristo e
serão salvos. Jesus reinará em perfeita justiça e haverá paz por toda a Terra.
Muitos pré-milenistas sustentam que a Terra será renovada e veremos de
fato o novo céu e a nova terra durante esse período (mas a fidelidade a esse
ponto não é essencial ao pré-milenismo, pois é possível ser pré-milenista e
sustentar que o novo céu e a nova terra virão só depois do juízo final). No início
desse tempo, Satanás será preso e lançado no abismo, de modo que não terá
influência sobre a Terra durante o milênio (Ap 20.1-3).

7.2. pré-milenismo pré-tribulacionista ou dispensacionalista

Segundo essa posição, Cristo voltará não só antes do milênio, mas


também antes da grande tribulação. Esse ponto de vista é semelhante à posição
pré-milenista clássica, mas com uma importante diferença: acrescenta outra
volta de Cristo antes de sua vinda para reinar sobre a terra no milênio. Essa
volta é vista como um retorno secreto de Cristo para tirar os crentes do mundo.
A visão dispensacionalista considera que Israel e Igreja são dois povos
diferentes, e que a Igreja será retirada da Terra antes que Deus trate com os
judeus, em particular.

7.3 pós-milenismo

O pós-milenismo ensina que os mil anos de Apocalipse 20 ocorrem antes


da segunda vinda de Cristo. Até recentemente, a maioria dos pós-milenistas
ensinava que o milênio seria os últimos mil anos do presente século. Hoje,
muitos pós-milenistas ensinam que a era do milênio é todo o período entre o
primeiro e o segundo advento de Cristo. Isso significa que versões
contemporâneas do pós-milenismo são muito próximas em muitas maneiras ao
amilenismo contemporâneo. A principal diferença entre os dois não é tanto o
momento do milênio, mas a natureza do milênio. Em geral, o pós-milenismo
ensina que no presente século, o Espírito Santo atrairá multidões sem
precedentes para Cristo através da fiel pregação do Evangelho. No fim do
presente século, Cristo retornará, haverá uma ressurreição geral dos justos e
injustos, e o julgamento final acontecerá.

7.4. amilenismo

Segundo essa posição, a passagem de Apocalipse 20.1-10 descreve a


presente era da Igreja. Trata-se de uma era em que a influência de Satanás sobre
as nações sofre grande redução de modo que o Evangelho pode ser pregado por
todo o mundo.
Aqueles que reinam com Cristo por mil anos são os cristãos que
morreram e já estão reinando com Cristo no céu. O reino de Cristo no milênio,
segundo esse ponto de vista, não é um reino físico aqui na terra, mas sim o
reino celestial (Mt 28.18).
Esse ponto de vista é chamado amilenista por sustentar que não existe
nenhum milênio que ainda esteja por vir. Como os amilenistas creem que
Apocalipse 20 está se cumprindo agora, na era da Igreja, sustentam que o
milênio aqui descrito já está em curso no presente. A duração exata da era da
igreja não pode ser conhecida, e a expressão mil anos é simplesmente uma
figura de linguagem para um longo período em que os propósitos perfeitos de
Deus vão se realizar.

8. A tribulação

A tribulação será um período de sete anos, de sofrimento ímpar sobre


toda a terra, como nunca houve na história da humanidade. Também é assunto
de difícil interpretação; por isso, gerou diferentes correntes de interpretação,
como segue.

8.1. pré-tribulacionismo

Essa visão defende que a volta de Cristo se divide em duas etapas:


secretamente para buscar a Igreja, e em glória, sendo visível a todos após o
período de grande tribulação. É por conta do arrebatamento secreto, antes da
tribulação, que esta posição é chamada de pré-tribulacionismo.
O pré-tribulacionismo está diretamente ligado ao dispensacionalismo
clássico. No pré-tribulacionismo, geralmente existe uma completa distinção
entre a Igreja e Israel. Os pré-tribulacionistas dizem que, basicamente, Jesus
veio para os judeus, porém os judeus O rejeitaram, e, então, Ele suspendeu
temporariamente Seus planos para Israel, e é aí que aparece a Igreja, como uma
espécie de parêntese na História.
Portanto, como existe um plano especial para Israel, a Igreja será tirada
da terra antes da grande tribulação, que será um período onde a ira de Deus
será derramada sobre os ímpios que ficarem na terra, e também um momento
especifico no tratamento de Deus com Israel.
No pré-tribulacionismo, como existe essa distinção entre os dois povos, e
a Igreja não tem nada a ver com o tratado de Deus a respeito de Israel, então ela
não poderá estar na terra nesse momento.
Outro argumento muito usado é que, após o capítulo 3, a palavra Igreja
não é mais encontrada no livro de Apocalipse até aparecer novamente no final
do livro. Dentro dessa linha de interpretação, durante o período de grande
tribulação a Igreja estará no céu participando das bodas do Cordeiro.
Os textos mais utilizados para defender o arrebatamento pré-
tribulacionista são: Rm 8.1; I Co 15.51; I Ts 1.10; 4.17; 5.9; Ap 3.10.

8.2. meso-tribulacionismo

O meso-tribulacionismo defende que a Igreja será arrebatada no meio da


grande tribulação. Sendo a tribulação um período de sete anos, então haverá
três anos e meio de paz e três anos e meio de muita dificuldade. Esse sistema
tem muita similaridade com o pré-tribulacionismo, porém difere na ideia de
que o arrebatamento ocorrerá quando os três anos e meio de paz terminarem.
Existem meso-tribulacionistas que defendem que a grande tribulação não terá
necessariamente sete anos de duração.
A principal defesa do meso-tribulacionismo é uma cronologia (II Ts 2.1-
3) em que o Anticristo parece ser revelado antes do arrebatamento da Igreja,
além de uma combinação entre a trombeta de I Co 15.52 com a trombeta de Ap
11.15.

8.3. pós-tribulacionismo

O pós-tribulacionismo defende que o arrebatamento e a segunda vinda


de Cristo são um único evento, e que ocorrerá após o período de grande
tribulação. Nessa interpretação, a Igreja passará pela grande tribulação, que não
precisa ser necessariamente um período de sete anos. Dentro do pós-
tribulacionismo existem amilenistas, pós-milenistas e pré-milenistas.
Os principais argumentos pós-tribulacionistas são: Jesus, em Seu sermão
escatológico, nos Evangelhos de Mateus (24), Marcos (13) e Lucas (21), deixou
claro que só voltaria após o período de grande tribulação; em II Ts 2.3, Paulo
afirma que antes de Cristo voltar o Anticristo se manifestará; em II Pe 3,
o apóstolo Pedro também descreve a vinda de Cristo como um evento único;
em Apocalipse, em nenhum momento são mencionadas duas fases da volta de
Jesus, e, quando a segunda vinda é descrita, ela ocorre após o período de
tribulação.

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