OU
CONTRIBUIÇÃO PARA A CRÍTICA FEMINISTA MATERIALISTA HISTÓRICA DO EMPREGO DOMÉSTICO
Tese de Láurea
Orientador Professor Associado Dr. Jorge Luiz Souto Maior
OU
CONTRIBUIÇÃO PARA A CRÍTICA FEMINISTA MATERIALISTA HISTÓRICA DO EMPREGO DOMÉSTICO
São Paulo
Setembro de 2014
3
AGREDECIMENTOS
A meu filho, Caetano D´Alkimin Landi Fazzio, por revolucionar o sentido do trabalho
reprodutivo em minha vida.
À mãe dele, Larissa D´Alkimin. Há trabalho seu nessas linhas, invisível, mas
completamente.
À minha mãe e meu pai, Eliane Gehrt Landi Fazzio e Ricardo Fazzio, por todo o
carinho, cuidado e trabalho. A meu pai, por me despertar o interesse pelo estudo, pelas
letras e pela ciência. À minha mãe, pelas lições de abnegação e paciência. E, em nome
deles, à toda a família, especialmente às minhas irmãs, Luana Leme Fazzio e Mariana Landi
Fazzio.
SUMÁRIO
Introdução ....................................................................................................................7
Conclusão ..................................................................................................................56
INTRODUÇÃO
PEC das Domésticas. Foi assim chamada na imprensa privada e nos meios
oficiais e ficou conhecida pela população brasileira a Emenda Constitucional 72 de
abril de 2013, cuja regulamentação não foi concluída até a data da conclusão e
entrega desta monografia à avaliação, o que permite ainda o aprofundamento do
debate sobre o sentido da regulamentação do trabalho doméstico. Ainda sim, a
tramitação e aprovação da PEC 66/2012 ergueu debates sobre a condição jurídica e
social das empregadas domésticas.
Nos debates jurídicos, tanto nos julgados quanto na ciência do direito, o ponto
de vista das famílias empregadoras frente às empregadas domésticas e seus
direitos trabalhistas foram esmiuçados. O efeito inflacionário da aprovação da PEC
nos rememorou argumentos seculares.3 A despeito de terem alguns juristas lançado
luz ao significado histórico trabalhista e mesmo racial da aprovação da PEC, suas
implicações foram parcamente apreendidas de um ponto de vista do reconhecimento
do trabalho feminino.
No campo da ação política feminista e em outras áreas das ciências humanas,
1
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. Trad. Álvaro Pina. São Paulo: Expressão
Popular, 2009.
2
KERGOAT, D. Divisão sexual do trabalho (verbete) In.: HIRATA, LABORIE, LE DOARÉ, SENO-
TIER (Orgs.). Dicionáriocritico do feminismo. São Paulo: EditoraUnesp, 2009.
3
“Tentou-se, por fim, formar o convencimento de que a abolição representaria a falência da
economia nacional e percebendo que o argumento não era sustentável, tendo à vista a grande
inserção do trabalho imigrante nas lavouras, passou-se a defender a necessidade do recebimento de
uma indenização pela perda da “propriedade”, qual seja, os escravos.”. Jorge Luiz Souto Maior, na
Carta Maior. Disponível em: http://bit.ly/1w4Gi7S. Acesso em 08/09/2014.
8
4
MACHADO, Gustavo Seferian Scheffer. A Ideologia do contrato de trabalho: contribuição à
leitura marxista da relação jurídica laboral. São Paulo, 2012, p. 10.
9
Preliminarmente
5
FERRAZ, Fernando Basto; RANGEL, Helano Márcio Vieira. A discriminação sociojurídica ao
emprego doméstico na sociedade brasileira contemporânea: uma projeção do passado colonial.
Fortaleza: Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI, 2010, p. 8640.
10
6
Sobre a utilização do conceito de “questão meridional”, oriundo de Gramsci, à realidade
brasileira, ver SINGER, André. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São
Paulo: Editora Companhia das Letras, 2012.
7
JACQUET, Christiane. Urbanização e emprego doméstico. São Paulo: Revista Brasileira de Ci-
ências Sociais, vol. 18, nº 52, 2003. Importante ter em conta também as reflexões sobre uma sociolo-
gia do trabalho doméstico no interior da sociologia das migrações em BLÈTIÈRE, Vanessa. Por uma
Sociologia do Trabalho Doméstico: Contribuição para um Projeto Interdisciplinar. Lisboa: Centro de
Estudos sobre a Mudanças Socioeconomica, 2008. Disponível em: http://bit.ly/1nyDnMx. Acesso em:
04/08/2014
11
Periodização
8
FILHO, Wilson Ramos. Direito capitalista do trabalho: história, mitos e perspectiva no Brasil. São
Paulo, LTr 2012.
9
BERNARDINO-COSTA, Joaze. Sindicato das trabalhadoras domésticas no Brasil: teorias da
descolonização e saberes subalternos. Brasília: UNB, 2007. SANTOS, Judith Karine Cavalcanti, Par-
ticipação das trabalhadoras domésticas no cenário político brasileiro. Santa Catarina: Seminário In-
ternacional Fazendo Gênero, 2010.
12
10
Ambas citações dos juristas se encontram em FERRAZ, Fernando Basto; RANGEL, Helano
Márcio Vieira. A discriminação sociojurídica ao emprego doméstico na sociedade brasileira
contemporânea: uma projeção do passado colonial. Fortaleza: Anais do XIX Encontro Nacional do
CONPEDI, 2010, p. 8636-8637.
11
ANDRADE, Dárcio Guimaraes de. Empregado doméstico. Belo Horizonte, Revista do TRT da
3ª Região, jul./dez., 1997, p. 69/75.
13
preceitua que a todo trabalho de igual valor corresponderá igual salário, sem
distinção de sexo (artigo 5º), e já exclui as empregadas domésticas de tal guarida,
mesmo por que, afinal, não vê valor econômico em seu labor.
A CLT opera tal exclusão do emprego doméstico em relação aos Direitos que
institui “salvo quando for, em cada caso, expressamente determinado o contrário”.
Tal hipótese apenas veio décadas depois a ser utilizada. Quase que por cinismo do
legislador, no entanto, outros diplomas legais posteriores foram desnecessariamente
categóricos em reiterar a exclusão do emprego doméstico: a Lei 605 de 1949, que
institui o repouso semanal remunerado, afirma não se aplicar aos empregados
domésticos; e a Lei 3.807 de 1960, que dispõe sobre a Lei Orgânica da Previdência
Social, exclui expressamente de seu regime os empregados domésticos, salvo na
condição de se inscrever “na instituição de previdência social de profissional
comerciário, cabendo-lhes no caso, o pagamento em dobro das respectivas
contribuições”.
Em 11 de Dezembro de 1972, durante a presidência do militar Emílio G. Médici, a
promulgação da Lei 5.859 significou uma grande mudança para a regulamentação
do emprego doméstico, ainda que mantido o espírito de exclusão e diferenciação de
tal categoria frente ao emprego em geral. O empregado doméstico passa a ser
considerado “aquele que presta serviço de natureza continua e finalidade não
lucrativa à pessoa ou família no âmbito residencial destas”. A Lei implica em
uma conquista de Direitos, por um lado, ao estender algumas garantias à categoria
(vedação do desconto no salário por fornecimento de alimentação, vestuário, higiene
ou moradia; férias anuais remuneradas e acesso aos benefícios e serviços da Lei
Orgânica da Previdência Social na qualidade de segurados obrigatório). Por outro
lado, institui que o acesso a tais direitos apenas é dado ao empregado doméstico
que preste seu serviço de forma contínua, e estando registrado mediante a
assinatura pelo empregador de sua Carteira de Trabalho. Mantidos os altos índices
de informalidade no mercado do trabalho doméstico, e no contexto de crescimento
da prestação do trabalho doméstico na forma da prestação eventual das diaristas, a
Lei 5.859 se positiva assegurando direitos apenas a uma pequena parcela das
empregadas domésticas – as registradas.
Não seria preciso recorrer à hipótese da expressa determinação em caso
contrário, contida no artigo 7º da CLT, como fundamento da harmonização de tal Lei
com a Consolidação, vista a especificidade do diploma de 1972. Da mesma forma,
15
não seria o caso dos avanços legislativos contidos na Constituição Federal de 1988,
exatamente pelo caráter constitucional da normal contida no parágrafo único do
artigo 7º (ainda que, formalmente, o texto legal apresente exatamente a expressa
determinação em contrário exigida pela CLT, o que não desvirtua, em verdade, de
seu continuado espírito de diferenciação e minoração do empregado doméstico em
relação aos demais empregos). Talvez a única expressão de tal hipótese (ressalvada
a Lei Complementar 103 de 2000, da qual trataremos mais adiante) esteja contida
no Decreto 95.247 de 1987. Ao instituir o Vale-Transporte, a LC 103/2000
expressamente trata dos empregados domésticos, incluindo-os no conjunto de seus
beneficiários, no inciso II de seu artigo 1º. Sem sequer se valer da hipótese da CLT,
no entanto, salta aos olhos que apenas a partir de 1972, 31 anos após sua primeira
aparição jurídica, o emprego doméstico tenha alçado alguma proteção trabalhista.
Não obstante, pouco depois, em 1984, veto do presidente João Figueiredo
impediu a ampliação do direito a férias de 30 dias para empregadas domésticas, sob
a seguinte fundamentação:
12
BERNARDINO-COSTA, Joaze. Sindicato das trabalhadoras domésticas no Brasil: teorias da
descolonização e saberes subalternos. Brasília: UNB, 2007, p. 238.
16
14
MACHADO, Gustavo Seferian Scheffer. A Ideologia do contrato de trabalho: contribuição à
leitura marxista da relação jurídica laboral. São Paulo, 2012.
17
2. GÊNERO E TRABALHO
18
MELO, Hildete Pereira de. O serviço doméstico remunerado no Brasil: de criadas a
trabalhadoras. Brasília, Revista Brasileira de Estudos da População, 15(1), 1998.
19
DIEESE, Boletim Trabalho Doméstico. Março de 2012. Disponível em: http://bit.ly/YfkOrc .
Acesso em: 15/05/2014
20
PED, A mulher nos mercados de trabalho metropolitanos. Abril de 2011. Disponível em:
http://bit.ly/1qAw0HP. Acesso em: 15/05/2014.
22
número de diaristas pode ser verificada, ainda que a proporção de mensalistas tenha
se mantido, nas grandes capitais, superior a 68,7% do contingente de empregadas
domésticas.21 Relevante, porém, notar o crescimento das diaristas em Porto Alegre
(de 24,6% para 32,6%), em São Paulo (de 20,4% para 31,3%) e em Salvador (de
10,3% para 21,6%). Ainda que a proporção seja próxima da auferida em outras
capitais, o destaque as esses exemplos permite verificar crescimento similar em
regiões com distintas proporções de composição de renda e raça em sua demografia,
razões que podem estar na origem dos índices diversos.
Confirmado o caráter feminino do emprego doméstico, é necessário fazer uso da
formulação feminista sobre o trabalho para entender tal sobrefeminilidade. Como
explica Maneschy:
21
PED, A mulher nos mercados de trabalho metropolitanos. Abril de 2011, p. 9. Disponível em:
http://bit.ly/1qAw0HP. Acesso em: 15/05/2014.
23
22
MANESCHY, Maria Cristina. O emprego doméstico e as relações de gênero no mundo do
trabalho. Belém, Gênero na Amazônia, n. 3, jan./jun., 2013.
23
Sobre a centralidade do conceito de divisão social do trabalho, ver MARX, Karl. Introdução à
crítica à economia política. Trad. Florestan Fernandes. São Paulo: Expressão Popular, 2008. “"Na
produção social da própria vida, os homens contraem relações determinadas, necessárias e
independentes de sua vontade, relações de produção estas que correspondem a uma etapa
determinada de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A totalidade destas relações de
produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta uma
superestrutura jurídica e política, e à qual correspondem formas sociais determinadas de consciência.
Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrário, é o seu ser social que
determina sua consciência.””
24
24
HIRATA, Helena; KERGOAT, Danièle. Paradigmas sociológicos e categorias de gênero. Que
renovação aporta a epistemologia do trabalho? Belém: Novos Cadernos NAEA, v. 11, n.1, p; 39-50,
jun. 2008.
25
MANESCHY, Maria Cristina. O emprego doméstico e as relações de gênero no mundo do
trabalho. Belém, Gênero na Amazônia, n. 3, jan./jun., 2013.
25
Ainda que seja evidente que uma enorme massa de trabalho é realizada
gratuitamente pelas mulheres, essa gratuidade e imposição às mulheres se vê
26
SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. São Paulo:
Editora Perspectiva, 1985.
27
SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. São Paulo:
Editora Perspectiva, 1985, p. 98.
28
SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. São Paulo:
Editora Perspectiva, 1985, p. 100.
26
29
KERGOAT, D. Divisão sexual do trabalho (verbete) In.: HIRATA, LABORIE, LE DOARÉ,
SENOTIER (Orgs.). Dicionáriocritico do feminismo. São Paulo: EditoraUnesp, 2009.
30
MELO, Hildete Pereira de; CASTILHO, Marta. Trabalho reprodutivo no Brasil: quem faz? São
Paulo: R. Econ. Contemp., v. 13, n. 1, p 135-158, 2009.
31
MELO, Hildete Pereira de; CASTILHO, Marta. Trabalho reprodutivo no Brasil: quem faz? São
Paulo: R. Econ. Contemp., v. 13, n. 1, p 135-158, 2009.
32
Fundação Perseu Abramo. Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado. Agos-
to de 2010. Disponível em: http://bit.ly/1txtztk. Acesso em: 06/09/2014.
27
mulheres não casadas e sobre para 48 e 30 minutos entre as que moram com o
cônjuge, contra 5 horas e 36 minutos de seus parceiros. O trabalho global dos
cônjuges aumenta levemente além do dobro do que a mulher não casada, mas é
transferido majoritariamente para a mulher.
O recurso ao cômputo das horas utilizadas em afazeres domésticos é importante
por auferir o volume do trabalho socialmente utilizado para a reprodução das
condições de produção e reprodução. Para outras atividades (as ditas produtivas), é
possível lançar mão à estimativa do preço global ou médio de tal força de trabalho,
ou mesmo o volume da riqueza produzida com tal trabalho em dado tempo, em
termos correntes nas relações de troca. Da desproporção entre tais medidas deriva
o conceito de mais-valia. Para o trabalho doméstico, uma vez que se trata de
trabalho não remunerado, todas essas verificações são impossíveis, senão num
plano hipotético de (provavelmente) impossível comprovação empírica, substituída
por planilhas de cálculos de remunerações lastreadas no valor corrente do emprego
doméstico e desdobramentos inflacionários. Daí que, para aquelas e aqueles que se
põe do ponto de vista da práxis 33 , a estimativa do tempo médios gasto em tais
afazeres é fundamental.
Da mesma forma, é fundamental o estudo do trabalho reprodutivo exercido fora
do próprio domicilio.
33
“Os filósofos apenas interpretaram o mundo de diferentes maneiras; porém, o que importa é
transformá-lo”. MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. Trad. Álvaro Pina. São Paulo:
Expressão Popular, 2009.
28
34
GOLDMAN, Wendey. Mulher, estado e revolução: política familiar e vida social soviética, 1917-
1936. Trad. Natália Angyalossy Alfonso. São Paulo: Editora Boitempo, 2014, p. 62 e 66.
29
Saffioti ajuda a afastar o idílio que lança a divisão sexual do trabalho a tempos
imemoráveis e tribais, quando homens caçavam e mulheres coletavam e cuidavam
das crianças. A exclusão e a subordinação feminina ao mundo produtivo não é mero
legado do passado humano, mas forma de organização social reavivada pela
revolução burguesa, quando da constituição das instituições políticas republicanas e
das relações de produção industriais e modernas.
O desenvolvimento ulterior do capitalismo brasileiro viria a reintroduzir
gradativamente a mulher na esfera produtiva, em posição de subordinação e
desvalorização. Já em 1970 (década de aprovação da primeira Lei a dar direitos às
empregadas domésticas):
35
SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. São Paulo:
Editora Perspectiva, 1985, p. 98.
36
GONÇALVES, Renata. O feminismo marxista de Heleieth Saffioti. Lutas Sociais, n. 27, São
Paulo, 2011.
30
37
Somadas aos empregados domésticos, são 7,2 milhões de pessoas em tais empregos. A índia
é o país com o segundo maior contingente de pessoas em empregos domésticos> 4,2 milhões. Cabe
considerar que a população indiana é quase seis vezes maior que a brasileira.
38
POCHMAN, Márcio. Nova classe média? O trabalho na base da pirâmide social brasileira. São
Paulo: Editora Boitempo, 2012, p. 47.
31
39
Não obstante o parco rendimento auferido, cumpre destacar que tal remuneração corresponde
a 40% da renda familiar das empregadas domésticas brasileiras. POCHMAN, Márcio. Nova classe
média? O trabalho na base da pirâmide social brasileira. São Paulo: Editora Boitempo, 2012, p. 61.
40
POCHMAN, Márcio. Nova classe média? O trabalho na base da pirâmide social brasileira. São
Paulo: Editora Boitempo, 2012, p. 10.
41
MELO, Hildete Pereira de; PARREIRAS, Luiz Eduardo; PESSANHA, Márcia Chamarelli. A
economia política do serviço doméstico remunerado: rendimentos e luta sindical. Revista Mulher e
Trabalho, v. 5, Porto Alegre, 2005, p. 93.
42
POCHMAN, Márcio. Nova classe média? O trabalho na base da pirâmide social brasileira. São
Paulo: Editora Boitempo, 2012, p. 64.
32
43
Ver, a esse respeito: NICHOLSON, LINDA. Chapter 6: Karl Marx: the theoretical separation os
the domestic and the economic. In: Gender & History. Columbia University Press, Columbia, 1986; e
FIRESTONE, Shulamith. The dialetic of sex. Londres: The Women’s Press, 1979.
44
HIRATA, Helena; KERGOAT, Danièle. Paradigmas sociológicos e categorias de gênero. Que
renovação aporta a epistemologia do trabalho? Belém: Novos Cadernos NAEA, v. 11, n.1, p; 39-50,
jun. 2008.
33
45
CODAS, Gustavo. Economia neoclássica e economia marxista: dois campos teóricos e as
possibilidades das analises de gênero. In: FARIA, Nalu; NOBRE, Miriam. Economia feminista. São
Paulo: Sempreviva Organização Feminista, 2002, p. 18.
46
MARX, Karl. Livro 4 – Teorias da mais-valia. São Paulo: Bertrand, v. 1, 1987.
34
[...]
b) Trabalho Produtivo no Sistema de Produção
Capitalista
Só o tacanho espírito burguês, que considera absolutas
e, portanto, formas naturais eternas as formas capitalis-
tas de produção, pode confundir estas duas perguntas -
que é trabalho produtivo do ponto de vista do capital, e
que trabalho é em geral produtivo ou que é trabalho pro-
dutivo em geral - e assim ter-se na conta de muito sábio,
ao responder que todo trabalho que produza alguma coi-
sa, um resultado qualquer, por isso mesmo, é trabalho
produtivo. [...]
Tome-se, ao contrário, outro ramo de produção, por e-
xemplo, tipografia, onde ainda não se emprega maquina-
ria. Nesse ramo, 12 horas produzem tanto valor quanto
12 horas em ramos de produção em que a maquinaria
tem desenvolvimento máximo. Por conseguinte, o traba-
lho que produz valor continua sempre a ser trabalho do
indivíduo, mas se expressa na forma de trabalho geral. O
trabalho produtivo - como trabalho que produz valor -
confronta, por isso, o capital sempre na forma de traba-
lho da força de trabalho individual, do trabalhador isola-
do, sejam quais forem às combinações sociais de que
participem esses trabalhadores no processo de produ-
ção. Assim, enquanto o capital representa perante o tra-
balhador a força produtiva social do trabalho, o trabalho
produtivo representa sempre perante o capital nada mais
que o trabalho do trabalhador isolado. [...]
A produtividade do capital consiste em contrapor-se ele
ao trabalho convertido em trabalho assalariado, e a do
trabalho, em contrapor-se aos meios de trabalho
convertidos em capital.” (grifo nosso)
47
CODAS, Gustavo. Economia neoclássica e economia marxista: dois campos teóricos e as
possibilidades das analises de gênero. In: FARIA, Nalu; NOBRE, Miriam. Economia feminista. São
Paulo: Sempreviva Organização Feminista, 2002, p. 22.
35
48
MARX, Karl. Introdução à crítica à economia política. Trad. Florestan Fernandes. São Paulo:
Expressão Popular, 2008.
49
NICHOLSON, LINDA. Chapter 6: Karl Marx: the theoretical separation os the domestic and the
economic. In: Gender & History. Columbia University Press, Columbia, 1986.
36
50
Intrigante, no sentido da crítica de Nicholson, que Marx também aqui lance mão de um trabalho
material, isto é, a confecção de uma calça, como paradigma de trabalho, ainda que Marx mais adiante
afirme indiferente para todos efeitos o conteúdo desse trabalho. Outrossim, a prestação domiciliar tem
centralidade no paradigma exposto, de modo que o texto citado se apresenta como peça fundamental
para a crítica do conceito clássico de improdutividade à luz do estudo do trabalho doméstico.
37
51
Consideramos uma falsa solução aquela que busca resolver as insuficiências de tal tipologia
marxiana mediante a consideração da utilidade indireta do trabalho doméstico para a acumulação.
Sobre tal solução Marx argumentaria, com o faz no interior do texto de referência sobre o tema: “Um
daqueles sabichões de Paul de Kock pode dizer-me que sem essa compra, como sem a compra de
pão, não posso viver e, em conseqüência, não posso enriquecer-me; que ela portanto é um meio
indireto ou pelo menos uma condição para meu enriquecimento. Da mesma maneira, a circulação do
meu sangue e meu processo respiratório são condições para me enriquecer. Mas, por isso, nem a
circulação do sangue nem o processo respiratório, por si mesmos, me enriquecem, e ambos, ao
contrário, pressupõem um metabolismo que requer despesas elevadas, e não haveria pobres-diabos,
caso ele não fosse necessário. A mera troca direta de dinheiro por trabalho, portanto, não transforma
o dinheiro em capital ou o trabalho em trabalho produtivo.”
38
Com tais reflexões, a autora estabelece a crítica à teoria do sistema dual, ela-
borado por algumas feministas diante de tais insuficiências do marxismo clássico.
Segundo tal teoria, seria tarefa das feministas modificar o modelo sócio histórico cu-
nhado por Marx de modo a inscrever em seu interior duas subestruturas opostas, a
da produção e a da reprodução. Segundo Nicholson, a oposição de tais subestrutu-
ras não conduz imediatamente à síntese de um modelo sócio histórico total, ou seja,
não solucionando as cegueiras de gênero do modelo original. A seu ver, a solução
dual seguia tratando a opressão feminina como mero tópico suplementar da opres-
são do trabalho.53
52
NICHOLSON, LINDA. Chapter 6: Karl Marx: the theoretical separation os the domestic and the
economic. In: Gender & History. Columbia University Press, Columbia, 1986
53
A crítica frontal à cegueira de gênero do pensamento de Marx se escora, principalmente, na
naturalização feira pelo autor quanto à divisão sexual do trabalho. Quanto às sociedades tribais, diz
Marx: “A divisão do trabalho está nesta fase ainda muito pouco desenvolvida e limita-se a um
prolongamento da divisão natural do trabalho existente na família.” Ou quando diz: “Deste modo se
desenvolve a divisão do trabalho, que originalmente nada era senão a divisão do trabalho no acto
sexual, e depois a divisão espontânea ou "natural" do trabalho em virtude da disposição natural (p.
ex., a força física), de necessidades, acasos, etc., etc. A divisão do trabalho só se torna realmente
divisão a partir do momento em que surge uma divisão do trabalho material e espiritual.” No entanto,
importante considerar que Saffioti, em seu texto supracitado de 1985, faz outra interpretação de A
ideologia alemã (fonte de todos excertos marxianos desta nota). Aqui, em Marx, o “natural”, bem
como o “produtivo”, teria duplamente um significado universal e um significado específico, que não se
confunde com a naturalização ahistórica das relações sociais, como vemos no início do capítulo II da
mesma obra:
“Com a divisão do trabalho, na qual estão dadas todas estas contradições, e a qual por sua vez
assenta na divisão natural do trabalho na família e na separação da sociedade em famílias individuais
e opostas umas às outras, está ao mesmo tempo dada também a repartição, e precisamente a
repartição desigual, tanto quantitativa como qualitativa, do trabalho e dos seus produtos, e portanto a
propriedade, a qual já tem o seu embrião, a sua primeira forma, na família, onde a mulher e os filhos
são os escravos do homem. A escravatura latente na família, se bem que ainda muito rudimentar, é a
primeira propriedade, que de resto já aqui corresponde perfeitamente à definição dos modernos
economistas, segundo a qual ela é o dispor de força de trabalho alheia. (...)
Precisamente porque os indivíduos procuram apenas o seu interesse particular, o qual para eles
39
não coincide com o seu interesse comunitário — a verdade é que o geral é a forma ilusória da
existência na comunidade -, este é feito valer como um interesse que lhes é "alheio" [18] e
"independe" deles, como um interesse "geral" que é também ele, por seu turno, particular e peculiar,
ou eles próprios têm de se mover nesta discórdia, como na democracia. Por outro lado, também a
luta prática destes interesses particulares, que realmente se opõem constantemente aos interesses
comunitários e aos interesses comunitários ilusórios, torna necessários a intervenção e o refreamento
práticos pelo interesse "geral" ilusório como Estado.
E, finalmente, a divisão do trabalho oferece-nos logo o primeiro exemplo de como, enquanto os
homens se encontram na sociedade natural, ou seja, enquanto existir a cisão entre o interesse
particular e o comum, enquanto, por conseguinte, a atividade não é dividida voluntariamente, mas sim
naturalmente, a própria ação do homem se torna para este um poder alheio e oposto que o subjuga,
em vez de ser ele a dominá-la. E que assim que o trabalho começa a ser distribuído, cada homem
tem um círculo de atividade determinado e exclusivo que lhe é imposto e do qual não pode sair; será
caçador, pescador ou pastor ou crítico crítico, e terá de continuar a sê-lo se não quiser perder os
meios de subsistência. (...)
O poder social, isto é, a força de produção multiplicada que surge pela cooperação dos diferentes
indivíduos condicionada na divisão do trabalho, aparece a estes indivíduos — porque a própria
cooperação não é voluntária, mas natural — não como o seu próprio poder unido, mas como uma
força alheia que existe fora deles, da qual não sabem donde vem e a que se destina, que eles,
portanto, já não podem dominar e que, pelo contrário, percorre uma série peculiar de fases e etapas
de desenvolvimento independente da vontade e do esforço dos homens, e que em primeiro lugar
dirige essa vontade e esse esforço.”
54
FREITAS, Taís Viudes de. O cenário atual da divisão sexual do trabalho. In. FREITAS, Taís Vi-
udes de; SILVEIRA, Maria Lúcia. (org.). Trabalho, corpo e vida das mulheres: crítica à sociedade de
mercado. Sempreviva Organização Feminista, São Paulo, 2007, p. 11.
40
55
MELO, Hildete Pereira de; CASTILHO, Marta. Trabalho reprodutivo no Brasil: quem faz? São
Paulo: R. Econ. Contemp., v. 13, n. 1, p 135-158, 2009.
56
PEDRO, Joana Maria; MELLO, Soraia Carolina de; OLIVERIA, Veridiana Bertelli Ferreira de. O
feminismo marxista e o trabalho doméstico: discutindo com Heleieth Saffioti e Zuleika Alambert. In:
Revista História Unisinos, v. 9, nº 2, São Leopoldo, 2005. Disponível em: http://bit.ly/1pxDFD3. Acesso
em: 04/09/2014.
41
57
“Por sua vez, a utilização do conceito de divisão sexual do trabalho, consolidado desde a
industrialização, possibilita a subestimação das atividades realizadas pelas mulheres da família.
Essas atividades são consideradas como não-trabalho, porque se confundem “produção” com
“produção de mercadorias” e “trabalho” com “emprego”. MELO, Hildete Pereira de; CASTILHO, Marta.
Trabalho reprodutivo no Brasil: quem faz? São Paulo: R. Econ. Contemp., v. 13, n. 1, p 135-158,
2009, p.139.
58
NOBRE, Miriam. Introdução à economia feminista. In: FARIA, Nalu; NOBRE, Miriam. Economia
feminista. São Paulo: Sempreviva Organização Feminista, 2002, p. 14.
42
59
GOLDMAN, Wendey. Mulher, estado e revolução: política familiar e vida social soviética, 1917-
1936. Trad. Natália Angyalossy Alfonso. São Paulo: Editora Boitempo, 2014
60
MARX, Karl. Livro 4 – Teorias da mais-valia. São Paulo: Bertrand, v. 1, 1987.
61
MARX, Karl. Livro 4 – Teorias da mais-valia. São Paulo: Bertrand, v. 1, 1987.
62
NOBRE, Miriam. Introdução à economia feminista. In: FARIA, Nalu; NOBRE, Miriam. Economia
feminista. São Paulo: Sempreviva Organização Feminista, 2002, p. 10.
63
Ver CODAS, Gustavo. Economia neoclássica e economia marxista: dois campos teóricos e as
possibilidades das analises de gênero. In: FARIA, Nalu; NOBRE, Miriam. Economia feminista. São
Paulo: Sempreviva Organização Feminista, 2002, p. 18. Ver também MARX, Karl. Livro 4 – Teorias
da mais-valia. São Paulo: Bertrand, v. 1, 1987:
“A produtividade do capital, antes de mais nada, consiste, mesmo considerando-se apenas a
subsunção formal do trabalho ao capital, na coerção para se obter trabalho excedente trabalho acima
da necessidade imediata.[...]
Assim, enquanto o capital representa perante o trabalhador a força produtiva social do trabalho,
o trabalho produtivo representa sempre perante o capital nada mais que o trabalho do trabalhador
isolado. [...]
A produtividade do capital consiste em contrapor-se ele ao trabalho convertido em trabalho
assalariado, e a do trabalho, em contrapor-se aos meios de trabalho convertidos em capital.”
64
“O contraste na família entre o marido como proprietário e a mulher como não proprietária se
tornou a base da dependência econômica e da ilegalidade social do sexo feminino. Essa ilegalidade
social representa, de acordo com Engels, uma das primeiras e mais antigas formas da exploração de
classes. Ele afirma: “Na família, o marido representa a burguesia e a esposa o proletariado”.
No entanto, a questão das mulheres não era questionada neste sentido específico do mundo
moderno. Somente o modo de produção capitalista, o modo de produção que criou a transformação
social, que levantou a questão feminina destruindo o antigo sistema econômico e familiar, trazendo
substância e sentido de vida para a grande massa de mulheres, durante o período pré-capitalista.”
ZETKIN, Clara. Apenas junto com as mulheres proletárias os socialismo será vitorioso. Trad.
Fernando A. S. Araújo. Discurso ao congresso do Partido da Social Democracia da Alemanha, Gotha,
16 de outubro de 1896.
65
“Embora muitos adeptos do materialismo histórico tenham compreendido o conceito de modo
43
de produção de forma economicista, as obras de Marx e Engels não autorizam este tipo de
entendimento.” SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. São
Paulo: Editora Perspectiva, 1985.
66
“Sobre o pensamento de Roswitha Scholz, nele se destaca “a referência teórica da Crítica do
Valor, cujo centro está no ‘outro Marx’ e não no seus interpretes marxistas ou no ‘Marx vulga’”.
CARMO, Íris Nery do. Gênero e trabalho revisitados: o “trabalho doméstico” hoje sobre as lentes de
Helena Hirata e Roswitha Scholz. Revista Sinal de Menos, ano 3, n. 7, 2011, p. 112.
67
Nesse sentido, importante o posicionamento de Saffioti sobre a polêmica, citado no ponto
anterior. Em PEDRO, Joana Maria; MELLO, Soraia Carolina de; OLIVERIA, Veridiana Bertelli Ferreira
de. O feminismo marxista e o trabalho doméstico: discutindo com Heleieth Saffioti e Zuleika Alambert.
In: Revista História Unisinos, v. 9, nº 2, São Leopoldo, 2005. Disponível em: http://bit.ly/1pxDFD3.
Acesso em: 04/09/2014.
44
68
âmbito da produção “pública” .
68
SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. São Paulo:
Editora Perspectiva, 1985, p. 98.
69
ENGELS, Friederich, A origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. São Paulo:
Expressão Popular, 2012.
70
SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. São Paulo:
Editora Perspectiva, 1985, p. 100.
71
Outra crítica possível do economicismo produtivista que pode derivar do marxismo se expressa
na Teoria do Valor-Dissociação, de Roswitha Scholz. CARMO, Íris Nery do. Gênero e trabalho
revisitados: o “trabalho doméstico” hoje sobre as lentes de Helena Hirata e Roswitha Scholz. Revista
Sinal de Menos, ano 3, n. 7, 2011.
45
72
Apud CARMO, Íris Nery do. Gênero e trabalho revisitados: o “trabalho doméstico” hoje sobr as
lentes de Helena Hirata e Roswitha Scholz. Revista Sinal de Menos, ano 3, n. 7, 2011, p. 98.
46
73
FERRAZ, Fernando Basto; RANGEL, Helano Márcio Vieira. A discriminação sociojurídica ao
emprego doméstico na sociedade brasileira contemporânea: uma projeção do passado colonial.
Fortaleza: Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI, 2010, p. 8646.
47
74
O mesmo vale para o trabalho público de saúde e educação, o qual pouco aprofundamos
nessa pesquisa. Ainda sim, acreditamos que faça sentido situar no campo da reprodução o trabalho
de educação e saúde. Para um estudo mais aprofundado, no caso da saúde, ver BARBOSA, Regiena
Helena Simões, MENEZES, Clarissa Alves Fernandes de et al. Gênero e trabalho em saúde: um
olhar crítico sobre o trabalho de agentes comunitárias/os de saúde. Botucatu: Revista Interface v.16,
48
n.42, 2012.
75
Em tal ponto outras abordagens, ainda que se utilizem da explicação da contribuição do
trabalho doméstico para a acumulação capitalista como sendo indireta, com a qual já afirmamos
discordar, nos oferecem análises interessantes. “O problema que o direito jamais conseguirá resolver
é ínsito à seguinte proposição: trabalho gera valor para o capitalista, mas não pode ser
considerado, em si mesmo, como um valor, sob pena de inviabilizar a primeira parte da
proposição. [...] Quando se diz que o trabalho da empregada doméstica coincide com aquele que se
realiza no âmbito residencial e sem fins econômicos (...), essa assertiva deve ser vista no contexto da
tensão anterior, com prevalência do econômico sobre o jurídico claramente evidenciado – atribuição
de não-valor ao trabalho para geração de valor para o capitalista”. CORREIA, Marcus Orione
Gonçalves; BIONDI, Pablo. Uma leitura marxista do trabalho doméstico. São Paulo: LTr, 2011, v. 75, p.
312.
76
ENGELS, Friederich, A origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. São Paulo:
Expressão Popular, 2012, p. 97
.
77
BRUSCHINI, Cristina. Trabalho doméstico: inatividade econômica ou trabalho não-
remunerado? Revista Brasileira de Estudos da População, São Paulo, v. 23, n. 2, p. 331-353, jul./dez.,
2006.
49
78
SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. São Paulo:
Editora Perspectiva, 1985, p. 107.
79
CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; BIONDI, Pablo. Uma leitura marxista do trabalho
doméstico. São Paulo: LTr, 2011, v. 75, p. 311-317.),
80
SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. São Paulo:
Editora Perspectiva, 1985, p. 106.
81
MELO, Hildete Pereira de; CASTILHO, Marta. Trabalho reprodutivo no Brasil: quem faz? São
Paulo: R. Econ. Contemp., v. 13, n. 1, p 135-158, 2009, p.139.
50
82
PINTO, Célia Regina Jardim. Uma história do feminismo no Brasil. São Paulo: Editora
Fundação Perseu Abramo, 2003.
83
FERRAZ, Fernando Basto; RANGEL, Helano Márcio Vieira. A discriminação sociojurídica ao
emprego doméstico na sociedade brasileira contemporânea: uma projeção do passado colonial.
Fortaleza: Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI, 2010, p. 8651.
51
Autora feminista marxista (de matiz althusseriano) 85 sobre a qual não nos
detivemos, um estudo mais detalhado do pensamento de Juliet Mitchell possibilitaria
uma melhor compreensão da totalidade da posição do direito frente ao trabalho
reprodutivo.
Segundo Saffioti, a autora indica “os domínios nos quais as mulheres
desempenhavam suas funções, ou seja, a produção, reprodução, sexualidade e
socialização das gerações imaturas, esferas estas que a autora denomina de
estruturas”.
A formulação em questão muito tem de aportar à crítica da improdutividade,
principalmente pelo destacamento da sexualidade e socialização como funções
distintas da reprodução.
Ao separar estas duas categorias86, a grande contribuição se situa em definir a
tarefa de cuidados e a própria atividade sexual como trabalhos distintos do
reprodutivo, mas ainda sim inseridos nas atribuições femininas, ou seja, no trabalho
reprodutivo latu sensu.
Isso põe toda a crítica esboçada quanto à forma jurídica do emprego doméstico
numa perspectiva muito estreita para encerrar o debate sobre a relação entre o
84
ENGELS, Friederich, A origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. São Paulo:
Expressão Popular, 2012, p. 99.
85
Sobre a autora, ver citação em SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no
interior das cifras. São Paulo: Editora Perspectiva, 1985. Ademais, temos como centrais na autora os
obras: MITCHELL, Juliet. Women’s estate. London: Penguin, 1971; e MITCHELL, Juliet. Women: The
Longest Revolution. London: New Left Review, no. 40, 1966. Ambas obras parcialmente disponíveis
em: http://bit.ly/1rQw5c4 e http://bit.ly/1AkcRfP . Acesso em: 09/09/2014.
86
Mitchell acreditava que era no campo da sexualidade que a luta das mulheres mais tinha
avanços a obter, no estágio de desenvolvimento de forças em que se inseria.
55
CONCLUSÃO
87
ENGELS, Friedrich. Introdução à edição de 1895 de As lutas de classes na França de 1848 a
1850. In MARX, KARL. As lutas de classes na França de 1848 a 1850. Trad, Nélio Schneide São
Paulo: Boitempo, 2012.
57
ela, como busca a literatura liberal nos fazer crer. Podemos fazer jus à assertiva que
dá título a esta pesquisa: o trabalho feminino nem sempre foi restrito ao mundo da
reprodução, senão quando operada a mudança produtiva capitalista e a perda do
papel produtivo da família. Assim como o trabalho servil camponês foi cercado pelo
capitalismo nascente, o trabalho feminino foi domesticado.
Em nossa pesquisa nos defrontamos, finalmente, com três dificuldades:
Primeiramente, partirmos do conceito jurídico de emprego doméstico para a
reflexão sobre o trabalho reprodutivo ocultou diversos segmentos das trabalhadoras,
notadamente as diaristas, as trabalhadoras terceirizadas de serviços de limpeza e
cuidados, quando não as próprias donas-de-casa.
Quanto a isso, sustentamos ainda sim que a tomada da categoria jurídica do
emprego doméstico como ponto de partida tem grande relevo para a crítica da
divisão social e sexual do trabalho: por um lado, permite nos debruçarmos sobre o
processo social de formação do trabalho reprodutivo como um não-trabalho; por
outro, permite um ponto de partida intrigante para o estudo da formação do emprego
em geral como um não-valor. 88 Assim, figura como conceito cujo estudo se faz
necessário para a síntese entre a crítica feminista e o materialismo histórico.
A segunda dificuldade encontrada no curso de nossa pesquisa se refere ao
aprofundamento teórico. Já esboçamos a crença em que um maior acúmulo acerca
da formulação de Juliet Mitchell poderia pôr o debate sobre a divisão sexual do
trabalho e o Direito em outro patamar, onde a regulamentação penal das relações de
gênero assumiria centralidade. Também nos foi impossível aprofundar os estudos da
Teoria do Valor-Dissociação. A própria afirmação titular de que “O Valor é o Homem”,
contida em Scholz, e alguma leitura superficial de sua obra faz crer que muito teria a
se aprofundar nossa formulação com o debate da autora, tendo a crítica da
improdutividade econômica como ponto nevrálgico da síntese entre o feminismo e o
marxismo para a compreensão do patriarcado capitalista.
Não obstante as duas dificuldades já expostas, uma terceira e última se coloca:
nos momentos finais de nossa crítica ao Direito do Trabalho Doméstico, pudemos
diagnosticar o abissal não reconhecimento do lar como mundo do trabalho para o
ordenamento jurídico. Assim, resta em aberto a tarefa de buscar não no Direito do
88
CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; BIONDI, Pablo. Uma leitura marxista do trabalho
doméstico. São Paulo: LTr, 2011, v. 75, p. 311-317.
58
Trabalho, mas no Direito de Família (na pista deixada pela jurisprudência recolhida)
os elementos da forma trabalho, oculta na forma jurídica, na regulamentação mais
próxima da divisão do trabalho entre os gêneros no interior da família. Tal esforço,
porém, está aquém de nossas possibilidades momentâneas: requereria o estudo de
uma coleção infinitamente superior de legislação em sua sucessão histórica, recurso
à doutrina para organização de tal normativa e elaboração de uma metodologia de
mais fôlego de aproximação com o próprio arcabouço teórico do feminismo
materialista histórico.
De qualquer forma, conclusivamente, acreditamos dada nossa contribuição à
crítica feminista materialista histórica do emprego doméstico.
59
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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sobr as lentes de Helena Hirata e Roswitha Scholz. Revista Sinal de Menos, ano 3, n.
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FIRESTONE, Shulamith. The dialetic of sex. Londres: The Women’s Press, 1979
Fundação Perseu Abramo. Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e pri-
vado. Agosto de 2010. Disponível em: http://bit.ly/1txtztk. Acesso em: 06/09/2014.
FREITAS, Taís Viudes de. O cenário atual da divisão sexual do trabalho. In. FREI-
TAS, Taís Viudes de; SILVEIRA, Maria Lúcia. (org.). Trabalho, corpo e vida das mu-
lheres: crítica à sociedade de mercado. Sempreviva Organização Feminista, São
Paulo, 2007.
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MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. Trad. Álvaro Pina. São Paulo:
Expressão Popular, 2009.
MELO, Hildete Pereira de; CASTILHO, Marta. Trabalho reprodutivo no Brasil: quem
faz? São Paulo: R. Econ. Contemp., v. 13, n. 1, p 135-158, 2009.
PEDRO, Joana Maria; MELLO, Soraia Carolina de; OLIVERIA, Veridiana Bertelli
Ferreira de. O feminismo marxista e o trabalho doméstico: discutindo com Heleieth
Saffioti e Zuleika Alambert. In: Revista História Unisinos, v. 9, nº 2, São Leopoldo,
2005. Disponível em: http://bit.ly/1pxDFD3. Acesso em: 04/09/2014.
PINTO, Célia Regina Jardim. Uma história do feminismo no Brasil. São Paulo:
Editora Fundação Perseu Abramo, 2003.
SAFFIOTI, Heleieth. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. São
Paulo: Editora Perspectiva, 1985.
63