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A IMPORTÂNCIA DA RETRAÇÃO HIDRÁULICA NA DURABILIDADE DAS

ESTRUTURAS DE CONCRETO

Engº MSc. Paulo Fernando Araujo Silva


Engº Antonio Carlos Pitta
Concremat Engenharia e Tecnologia S/A
(*) Prof. de Patologia das Construções da FAAP (SP)

RESUMO

A retração do concreto consiste na redução de seu volume. Há duas hipóteses a serem


consideradas: quando não há restrição a este encurtamento, e quando existe um impedimento
a redução de volume do concreto.
No primeiro caso (sem restrição) não há problema, enquanto no segundo (com
restrição), que é o caso mais comum, o concreto poderá trincar.
As fissuras ou trincas aparecerão sempre que a tensão de tração do concreto (σt) for
maior que a resistência à tração do concreto (ft).
Existem cinco tipos de retração, que são: plástica, hidráulica (por secagem), autógena,
por carbonatação e térmica.
O presente trabalho tem por finalidade avaliar a importância da retração hidráulica na
durabilidade das estruturas de concreto. Esta avaliação está relacionada com a possibilidade
da retração hidráulica causar fissuras nos elementos estruturais e empenamento nas placas de
concreto e pisos industriais.
As fissuras são caminhos abertos para a entrada de agentes agressivos, enquanto que o
empenamento das placas de concreto poderá gerar trincas, as quais reduzirão a vida útil das
estruturas.
Serão discutidos neste trabalho: a principal causa da retração hidráulica, como
minimizá-la (a influência dos materiais, das práticas construtivas, do meio ambiente, da
espessura do elemento estrutural), os tipos de concreto e seus prováveis valores de
retração, as metodologias empregadas internacionalmente e uma possível classificação
do concreto, quanto a retração.
1 – INTRODUÇÃO
A retração do concreto consiste na redução de seu volume.
Existem cinco tipos de retração, que são:
• retração plástica;
• retração hidráulica (ou por secagem);
• retração autógena;
• retração por carbonatação; e
• retração térmica.
Há duas hipóteses a serem consideradas, que são:
• 1ª Hipótese: quando não há restrição ao encurtamento do concreto;
• 2ª Hipótese: quando há restrição ao encurtamento do concreto.
Na 1ª hipótese (sem restrição) não há problema, enquanto que na 2ª hipótese (com
restrição), que é o caso mais comum, o concreto poderá fissurar / trincar. As fissuras/ trincas
aparecerão sempre que a tensão de tração no concreto (σt) for maior que a resistência à tração
do concreto (ft). As fissuras são caminhos abertos para a entrada de agentes agressivos,
enquanto que o empenamento das placas de concreto poderá gerar trincas de canto e
transversais às placas de pisos e pavimentos de concreto. Estas fissuras/ trincas reduzirão a
vida útil das estruturas.
A retração hidráulica é a causa mais comum destas patologias.
A retração hidráulica consiste na perda da água adsorvida, por evaporação, depois
do endurecimento do concreto. Esta retração é inevitável, a menos que o concreto esteja
submerso ou em um ambiente cuja umidade relativa seja de 100%. Quanto maior a
quantidade de água por metro cúbico de concreto maior será a espessura da camada de água
adsorvida e maior a retração hidráulica (1,2).
Os tipos de água existentes no concreto são:
• água livre; e
• água ligada (água combinada e água adsorvida).
Quando a umidade relativa cai abaixo de 100% a água livre, que fica retida nos
grandes poros capilares (>500 Å) começa a ser evaporada para o meio ambiente. Como a água
livre não está presa à estrutura dos produtos hidratados por ligações físico-químicas fortes, a
sua perda não seria acompanhada de retração significativa (2).
Quando a maior parte da água livre foi perdida, prosseguindo a secagem observa-se que
uma perda adicional de água passa a resultar em retração considerável. Isto se deve
principalmente à perda de água adsorvida e da água retida em pequenos capilares (2).
A água combinada é parte integrante da estrutura de vários produtos hidratados do
cimento. Ela não é perdida na secagem, sendo somente liberada quando os produtos
hidratados são decompostos por aquecimento (2).

2 - HIPÓTESES A SEREM CONSIDERADAS


São duas as hipótese a serem consideradas: sem restrição e com restrição externa.
2.1. – PRIMEIRA HIPÓTESE

Suponhamos uma peça de concreto, cujo comprimento l seja igual a 6m, e que não haja

impedimento a sua movimentação.


Admitindo-se que a retração R do concreto utilizado seja de 550µs (=550 x 10-6),

teremos um encurtamento ∆l igual a:

∆l = l.R

∆l = 6000 . 550 . 10
-6
∴ ∆l = 3,3mm

concreto

l = 6 m (= 6000mm)

concreto

l -∆l

Fig. 1 – Encurtamento do concreto sem restrição.

Conclusão: o concreto retrairia 3,3mm sem que aparecesse trincas / fissuras de retração por
secagem.
2.2. SEGUNDA HIPÓTESE

Suponhamos a mesma peça de concreto (l = 6m e R = 550µs) só que agora ela está

impedida de retrair-se livremente. Logo, aparecerão tensões de tração (σt) devido ao


impedimento dos vínculos, para a que a peça possa retrair-se livremente.

O valor de ∆l é o mesmo da PRIMEIRA HIPÓTESE (∆l = 3,3mm), pois os parâmetros

l e R são os mesmos. A figura 2 exemplifica o explicado.

σtç concreto è σt

è ç ∆l

Fig. 2 – Encurtamento do concreto com restrição.

Se σt for maior que ft (resistência à tração do concreto) aparecerá uma fissura / trinca,

cuja abertura será igual a ∆l.

O valor de σt neste caso será:

σt = E. α. ∆l
σt = 20000 . 8 . 10-6 . 100
σt = 16Mpa

3 – VALORES DE RETRAÇÃO DOS DIFERENTES TIPOS DE CONCRETO


Os diferentes tipos de concreto têm valores de retração compreendidos entre os
intervalos (3).

• Concreto leve : 520µs 1040µs

• Concreto Projetado : 600µs 1000µs

• Concreto sem Armadura : 400µs 800µs

• Concreto Armado : 200µs 300µs


Baseando-se nos valores acima apresentados pode-se observar a influência dos materiais
(agregados, água, etc. ) e métodos de aplicação sobre a Retração do Concreto.

4 – COMO MINIMIZAR A RETRAÇÃO HIDRÁULICA?


Para reduzirmos a Retração Hidráulica do concreto faz-se necessário conhecer a
influência dos materiais, dos fatores ambientais e das práticas construtivas.
4.1. MATERIAIS
a) Água
O principal responsável pela retração hidráulica do concreto é quantidade de
água/m³. Isto pode ser visualizado através da figura 3 (3).
Segundo o “Massachusets Institute of Technology” para cada acréscimo de
1% de água de amassamento, teremos um aumento de 2% na retração.
Retração
(%)

0,12

0,10

0,08

0,06

0,04

0,02

12 15 20 25 27
17 22
5 0 0 0 H52O (ll/m³)
5 5
Fig. 3 – Consumo de água (l/m³) x Retração (%)

A difusão da água adsorvida e da água mantida por tensão capilar nos poros
pequenos da pasta de cimento endurecida é mais rápida em peças de concreto mais
finas, as quais apresentam maior retração hidráulica e maior probabilidade de
fissuração, mantidas constantes as demais condições de contorno.
Esta difusão é um processo que depende do tempo e que acontece ao longo
(2)
dos anos. Segundo Troxell et al., citado por Metha , em relação a retração
hidráulica total aos 20 anos, em 14 dias temos de 20% a 25%, em 3 meses temos
de 50% a 60% e em 1 ano de 75% a 80%.
b) Agregados
Depois da água, os agregados são os principais responsáveis pela retração
hidráulica.
Os agregados mais duros impedem a retração (efeito de restrição à retração).
São eles: Quartzo, Granito, Calcáreo, Feldspato e dolomita.
Os agregados isentos de argila pedem menos água, para mesma consistência, e
portanto, geram menor retração. O mesmo se aplica ao teor de material
pulverulento. A argila não impede a retração (ela reduz o efeito de restrição do
agregado).
Agregados com maior dimensão máxima característica e com curva
granulométrica contínua pedem menos água e portanto, menor retração.
Quanto menor for a absorção de água pelo agregado menor será a retração.
c) Cimento
(3)
Segundo o estudo apresentado pela “ Portland Cement Association ” , ao
contrário do que a maioria pensa, o tipo, composição e finura do cimento tem um
pequeno efeito sobre a retração por secagem. A tabela 1 ilustra o explicado.

C (kg/m³) (a/c) “ slump” µ s)


R (µ H2O (ll/m³)
280 0,72 85 330 202
336 0,62 90 330 208
392 0,54 95 289 211
450 0,46 100 300 207

Tab. 1 – Consumo de cimento (kg/m³) x Retração (µs)

Pode-se observar que a retração hidráulica é mais ou menos igual, para o


consumo de cimento variando de 280kg/m³ a 450 kg/m³, mantido
aproximadamente constante o consumo de água.

d) Adições e Aditivos
As adições tais como escória e pozolana, as quais aumentam o número de
poros pequenos da pasta de cimento endurecida aumentam a retração por
secagem.
Os aditivos aceleradores, retardadores e redutores de água a base de
lignina aumentam a retração por secagem. Já os aditivos à base de melamina,
naftaleno e policarboxylatos, os quais agem sobre os grãos de cimento (além de
reduzir o consumo de água e facilitar a dispersão), gerando uma pasta de cimento
de baixa permeabilidade com uma estrutura muito compacta, reduzem a retração
por secagem. (A tabela 2 ilustra o explicado).
Os aditivos incorporadores de ar tem um efeito muito pequeno ou nulo sobre a
retração hidráulica (3).

TRAÇO 1 TRAÇO 2
• C (kg/m³) 353 358

• Água (l/m³) 193 132

• Aditivo: Naftaleno condensado (ml) - 1170

• “ Slump” (mm) 225 245


• % ar 6,4 5,6

Idade (dias) Retração por secagem (%)


(ASTM C 157)
28 - -
35 0,020 0,014
42 0,031 0,022
49 0,035 0,024
56 0,036 0,024
84 0,045 0,031
Obs: Amostras curadas por 28 dias em câmara úmida e depois em câmara de secagem
(U.R. = 50% e T = 23±2ºC).
Tab. 2 – Efeito do aditivo superplastificante sobre a retração.

4.2. PRÁTICAS CONSTRUTIVAS


As práticas construtivas estão relacionadas com o tipo de cura, lançamento do concreto
e a colocação de armaduras.
Assim como o agregados, o aço impede, restringe, a retração da pasta de cimento,
devido a sua rigidez. Logo, se aumentarmos o consumo de aço iremos reduzir a retração por
secagem.
A cura úmida é o melhor tipo de cura existente, entretanto, ela não impede a retração
hidráulica, mas somente a retarda. Este retardamento é benéfico, porque a resistência à tração
do concreto será maior.
A cura a vapor também reduz a retração hidráulica.

4.3. CONDIÇÕES AMBIENTAIS


Em ambientes cuja umidade relativa (U.R.) seja de 100% não há retração por
secagem. Entretanto, na grande maioria das vezes a U.R. está compreendida entre 50% e
90%.
Noventa por cento da retração hidráulica e do empenamento ocorrem nos dois primeiros
anos.

4.4. ADITIVOS REDUTORES DE RETRAÇÃO


O primeiro aditivo redutor de retração foi desenvolvido no Japão em 1982 (3).
Estes aditivos são de baixa viscosidade, líquidos solúveis em água, os quais agem
reduzindo a tensão capilar que se desenvolve dentro dos poros do concreto, quando ele seca.
O consumo destes produtos varia de 6 kg/m³ a 10 kg/m³. O número mais recomendável é de
7,5 kg/m³.
O componente principal deste aditivo é um éter alkil polioxyalkileno.
Estes aditivos retardam o início de pega, reduzem a quantidade de água (para a mesma
consistência), têm pequeno efeito sobre o “slump”, o teor de ar aprisionado e resistência à
compressão axial. As tabelas 3 e 4, e fig. 4 exemplificam o explicado (3).

Redutor Resistência à Compressão


Cimento Slump Ar Aprisionado
a/c Retração (MPa)
kg/m³ (mm) (%)
kg/m³
7 dias 28 dias 91 dias
0 95 4,6 38,0 48,3 54,8
0,45 371
7,5 105 4,4 38,0 49,6 55,3
0 90 4,6 30,7 41,7 45,5
0,55 300
7,5 95 4,9 29,9 40,3 45,0
0 80 4,1 23,4 33,2 36,6
0,65 254
7,5 85 4,5 20,7 30,3 35,0

TABELA 3 - EFEITO DO ADITIVO REDUTOR DE RETRAÇÃO SOBRE O


“SLUMP”, % AR E RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO DO CONCRETO
REDUTOR
SEM ADITIVO
RETRAÇÃO
CPC
355 366
kg/m³
a/c 0,49 0,46
Aditivo Redutor
- 2
Retração
Slump
100 85
(mm)
Ar Aprisionado
1,5 2,1
(%)
Inicio de Pega
4:42 4:45
(h:min.)
Resistência à Compressão
(MPa)
3 dias 7 dias 28 dias
27,7 37,9 42,8
27,3 34,0 42,6

TABELA 4 – EFEITO DO ADITIVO REDUTOR DE RETRAÇÃO SOBRE O INÍCIO


DE PEGA

Sem redutor
R( µS)

800

600
Com redutor
(7,5 kg/m³)
400

200

28 84 + (dias)

FIG. 4 - REDUTOR DE RETRAÇÃO x RETRAÇÃO (R)


5 – MÉTODOS DE ENSAIO

As metodologias de ensaio existentes para determinação da retração por secagem são a


NBR 8490, ASTM C 157 e a ASTM C 157 modificada.
A diferença fundamental na ASTM C157 modificada é que o tempo de cura em ambiente
com U. R. > 95% é de 7 dias e não de 14 e 28 dias, conforme previsto em outras normas.
Isto nos parece ser mais realista.
O ensaio com os “ Anéis de Coutinho” (“Restrained Shrinkage Ring Test”) é um teste
qualitativo e nos mostra se aparece ou não fissuras de retração hidráulica.

6 – BIBLIOGRAFIA

1. Hondo, Fumiaki et all. Shrinkage – Reducing Admixtures. Concrete International,


1998.

2 . Metha, P. K. Concrete – Structure, Properties and Materials. Prentice – Hall, 1986.

3. Kosmatka, S. H., and Panarese, W. C. Design and Control of Concrete Mixture.


Portland Cement Association, 1988.

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