Explorar E-books
Categorias
Explorar Audiolivros
Categorias
Explorar Revistas
Categorias
Explorar Documentos
Categorias
ISSN 1414-7378
Antropolítica Niterói n. 17 p. 1-291 2. sem. 2004
© 2005 Programa de Pós-Graduação em Antropologia e Ciência Política da UFF
Direitos desta edição reservados à EdUFF - Editora da Universidade Federal Fluminense -
Rua Miguel de Frias, 9 - anexo - sobreloja - Icaraí - CEP 24220-000 - Niterói, RJ - Brasil -
Tel.: (21) 2629-5287 - Telefax: (21) 22629-5288 - http://www.uff.br/eduff -E-mail: eduff@vm.uff.br
É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Editora.
Normalização: Caroline Brito de Oliveira
Edição de texto: Sônia Peçanha
Projeto gráfico, capa e editoração eletrônica: José Luiz Stalleiken Martins
Revisão: Rosely Barrôco e Icléia Freixinho
Diagramação e supervisão gráfica: Káthia M. P. Macedo
Coordenação editorial: Ricardo B. Borges
Sumário em inglês: Agatha Barcelar
Tiragem: 500 exemplares
Catalogação-na-fonte (CIP)
ARTIGOS
A ANTROPOLOGIA E AS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO: ALGUMAS ORIENTAÇÕES, 99
JEAN-FRANÇOIS BARÉ
ARQUIVO PÚBLICO: UM SEGREDO BEM GUARDADO?, 123
ANA PAULA MENDES DE MIRANDA
A CONCEPÇÃO DA DESIGUALDADE EM HOBBES, LOCKE E ROUSSEAU, 151
MARCELO PEREIRA DE MELLO
ASSOCIATIVISMO EM REDE: UMA CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA
EM TERRITÓRIOS DE AGRICULTURA FAMILIAR, 167
ZILÁ MESQUITA E MÁRCIO BAUER
DEPOIS DE BOURDIEU: AS CLASSES POPULARES EM ALGUMAS ABORDAGENS
SOCIOLÓGICAS CONTEMPORÂNEAS, 191
ANTONÁDIA BORGES
RESENHAS
LIVRO: MODÉRATION ET SOBRIÉTÉ. ÉTUDES SUR LES
USAGES SOCIAUX DE L’ALCOOL, 213
LUDOVIC GAUSSOT
AUTOR DA RESENHA: FERNANDO CORDEIRO BARBOSA
LIVRO: GOVERNANÇA DEMOCRÁTICA E PODER LOCAL: A EXPERIÊNCIA
DOS CONSELHOS MUNICIPAIS NO BRASIL, 217
ORLANDO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR, L. C. DE Q. RIBEIRO E
SÉRGIO AZEVEDO (ORGS.)
AUTORA DA RESENHA: DEBORA CRISTINA REZENDE DE ALMEIDA
NOTÍCIAS DO PPGACP
NEST – NÚCLEO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS, 227
DISCURSO DO PROFESSOR EURICO DE LIMA FIGUEIREDO, 231
RELAÇÃO DE DISSERTAÇÕES DEFENDIDAS NO PPGACP, 245
REVISTA ANTROPOLÍTICA: NÚMEROS E ARTIGOS PUBLICADOS, 273
COLEÇÃO ANTROPOLOGIA E CIÊNCIA POLÍTICA (LIVROS PUBLICADOS), 285
ARTICLES
ANTHROPOLOGY AND THE POLITICS OF DEVELOPMENT: SOME DIRECTIONS, 99
JEAN-FRANÇOIS BARÉ
PUBLIC ARCHIVES: A WELL KEPT SECRET?, 123
ANA PAULA MENDES DE MIRANDA
THE CONCEPTION OF INEQUALITY IN HOBBES, LOCKE AND ROUSSEAU, 151
MARCELO PEREIRA DE MELLO
A CHAIN OF ASSOCIATIVISM: IDENTITY CONSTRUCTION
IN FAMILY FARMING LANDS, 167
ZILÁ MESQUITA E MÁRCIO BAUER
AFTER BOURDIEU: CONTEMPORARY SOCIOLOGICAL
APPROACHES TO POPULAR CLASSES, 191
ANTONÁDIA BORGES
D A N I E L M I L L E R*
P OBREZA DA M ORALIDADE **
O CONSUMO É MATERIALISTA ?
O CONSUMO É CAPITALISTA ?
superficial de sua vida sugere que ele estava muito longe de ser um tipo
de asceta (WHEEM, 1999).
Pelo contrário, o marxismo ocidental dos anos 1970 adotou uma ver-
são de asceticismo que tinha por pressuposto a idéia de que cultura
material contemporânea – por ter sido criada pelo capitalismo – é
maculada e irá conspurcar aqueles que vivem com e através dela. Esse
asceticismo se revelou a causa de seu fracasso. Permitiu que os políticos
de direita associassem o socialismo com a pobreza. A esquerda ascética
tornou-se extremamente impopular num mundo em que o verdadeiro
proletariado ainda se considerava engajado em uma luta por um pa-
drão básico de vida. Isso abriu o caminho para a vitória dos governos
de direita de Reagan, Thatcher e suas proles. Mais recentemente, uma
reação a esse asceticismo apareceu sob a forma de um ramo dos estu-
dos culturais que parecia celebrar o consumerismo moderno como o
extremo oposto – uma forma heróica de resistência ou apropriação
que era inevitavelmente benéfica. A profundidade de Thompson e
Williams não impediu o movimento através do qual a cultura de massa
se tornou cultura popular; e, pelo simples fato de ser praticada por
pessoas que trabalhavam, de algum modo esta passou a ser vista como
autêntica e nobre.
Materialismo, no sentido empregado por acadêmicos como Thompson,
é precisamente o que devemos abraçar. É um compromisso com a uni-
dade entre pensamento e experiência, com nossa existência concreta
(THOMPSON, 1978, p. 210). O problema em relação aos críticos do
consumo não está no fato de eles serem materialistas demais – o que
vêem como a condição nefasta do mundo. Aos meus olhos, o problema
central das pesquisas sobre o consumo é que a maioria dos pesquisado-
res simplesmente não é materialista o bastante. Eles mostram ter pouca
compreensão do tipo de materialismo mais profundo que investigações
acadêmicas genuinamente críticas tentaram sustentar no século passa-
do, exemplificadas por pesquisadores tais como E. P. Thompson. Eles
estão insuficientemente mergulhados na materialidade da experiência
comum e conduzem trabalhos de campo insuficientes sobre relações
sociais e cultura material como práxis humanas. Muito do que está sen-
do desenvolvido pela crítica contemporânea ao consumo repete, por-
tanto, tudo o que saiu errado no desenvolvimento da crítica ocidental
marxista ao capitalismo, fundada na Europa há 20 anos, correndo exa-
tamente o mesmo risco de que o verdadeiro resultado sobre as posições
morais se perca sob o desejo devastador por disposições morais.
rendas seja ludibriada. Meu problema é, antes, definir por que o ramo
de investigação acadêmica do qual me ocupo parece partir da premissa
de que bens são prejudiciais a seus donos. Só posso explicar isso pela
seguinte lógica. Primeiro, que muitos desses acadêmicos pertencem ao
minúsculo grupo que realmente tem a impressão de possuir o suficien-
te. Em segundo lugar, que muitos deles vêm de uma tradição histórica
em que a produção empresarial de riquezas se desenvolveu em e através
de uma ideologia protestante de asceticismo. Que Weber continue sen-
do o melhor fundamento para analisar a ideologia dominante desses
acadêmicos, Horowitz o confirma historicamente e isso permanece evi-
dente hoje em dia. Além disso, ainda há raízes mais antigas no medo do
consumo como uma atividade intrinsecamente destrutiva, o lugar em
que os objetos são exauridos. Em terceiro lugar, parece justo acrescen-
tar que o medo do materialismo é compartilhado pela maior parte das
pessoas mundo afora, mesmo durante suas procuras por posses. O que
tem sido ignorado são as medidas que a maioria das pessoas toma para
agir contra o potencial anti-social de sua cultura material.7 Contraria-
mente, eu argumentaria que o ponto de partida apropriado ao estudo
do consumo é precisamente esta e inúmeras outras contradições que
parecem fundamentais tanto para o consumo quanto para as relações
sociais modernas. O que a riqueza traz consigo não é apenas um efeito
bom ou ruim, mas o aparecimento claro de contradições históricas, por
exemplo, a incompatibilidade entre um sentimento de liberdade e o
desejo por reciprocidade social, ou a substituição dos interesses do con-
sumidor por uma multidão de consumidores “virtuais” tais como audi-
tores, consultores, economistas e grupos litigiosos que reivindicam ser
os representantes dos consumidores mas usurpam seus interesses. Aos
meus olhos, essas contradições estão muito próximas das verdadeiras
lutas dos consumidores contemporâneos.8
Neste artigo, não abordei em qualquer detalhe as críticas ambientalistas,
basicamente porque as reconheço como uma preocupação oportuna
pelo bem-estar de nossos descendentes e por nossa própria responsabi-
lidade em relação ao ambiente em que vivemos. Mas até essa crítica é
enfraquecida quando fica claro que ela se torna a linha de frente de um
repúdio ascético da necessidade de bens. A essa altura, pode se tornar
um inimigo em vez de um aliado na luta contra a desigualdade e a
pobreza, como quando a necessidade de mostrar de que modo os resul-
tados de regulamentações estruturais na transferência de provisões para
o bem-estar dos pobres se perde em uma maré de preocupações verdes
sobre a Organização Mundial do Comércio, ou quando os defensores
ABSTRACT
This article contends that the study of consumption is often subsumed within
an ideological concern to castigate society for its materialism at the expense
of an alternative morality that emerges from an empathetic concern with
poverty and the desire for greater access to material resources. Examples are
given of the benefits that accrue to populations from an increased quantity
of goods in certain circumstances. An anti-materialism ideology is favoured
by associating consumption with production rather than studying consumers
themselves and their struggles to discriminate between the positive and nega-
tive consequences of commodities. The Americanization thesis also tends to
ignore the contribution of much of the rest of the word to the production of
consumer culture and contemporary capitalism, and to deny the authenti-
city of regional consumer culture. Parallels are drawn with E. P. Thompson’s
essay The Poverty of Theory and its critique of similarly disengaged ideo-
logical critiques that led academics away from the study of experience.
Keywords: Americanization; consumer culture; materialism; morality;
poverty.
REFERÊNCIAS
BOURDIEU, P. Outline of a theory of poractice. Cambridge: Cambridge
University Press, 1977.
CLARK, G. Pension fund capitalism. Oxford: Oxford University, 2000.
CROCKER, D.; LIDEN, T. (Ed.). The ethics of consumption. Lanham:
Rowman and Littelfield, 1998. p. 176-97.
CROSS, G. Time and money. London: Routledge, 1993.
GELL, A. Newcomers to the world of goods. In: APPADURAI, A. (Ed.)
The social life of things. Cambridge: Cambridge University Press, 1986.
p. 110-138.
HABERMAS, J. Knowledge and human interests. London: Heinemann,
1972.
HENWOOD, D. Wall street. New York: Verso, 1997.
HOROWITZ, D. The morality of spending. Baltimore: Johns Hopkins
University Press, 1985.
HUTTON, W. The state we’re in. London: Vintage, 1996.
KLEIN, N. No logo. London: Flamingo, 2001.
MAUSS, M. The gift. London: Cohen and West, 1954.
N OTAS
1
Sobre o vocábulo “consumerismo”, ver nota da tradutora ao texto de Franck Cochoy supra p. XXX.
2
Acknowledging Consumption.
3
Ver HOROWITZ (1985).
4
Cf. NOVE, 1993.
5
Cf. HENWOOD (1997) e HUTTON (1996).
6
Ver também WATSON (1997).
7
Ver GELL (1986) e WILK (1989), sobre o papel da casa a respeito disso.
8
Ver MILLER (2001).