Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
DISCIPLINA: Didática de Licenciatura - TB
ALUNO(A): Iris Gomes Segundo
FICHAMENTO:: TOLENTINO, Luana. Outra Educação é possível : feminismo,
anti-racismo e inclusão em sala de aula. 1ed. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2018.
Introdução
Rap da Felicidade
Como parte de seu projeto #NovemNegro, Luana trouxe para sala de aula o funk
carioca para elucidar questões raciais e dialogar com as experiências de vida dos estudantes.
“Considero a composição dos funkeiros cariocas Cidinho e Doca uma verdadeira aula de
História. Atemporal. Está tudo lá: a segregação da população preta e pobre desde o período
pós-abolição, os privilégios das elites e das classes médias (...)” (p. 23)
Isso demonstra a variedade de formas de se ensinar através da arte e outros meios,
independente de suas origens.
“Podemos aprender com o funk e com as letras do Chico Buarque. Com o jornal e a com a
novela. Com os livros e com o cinema. Com o teatro, com a pintura, com as redes sociais,
com a literatura.” (p. 25)
“Que nós professores possamos aceitar o desafio de empreender novas pedagogias, que
propiciem a descolonização dos currículos, dos saberes e também de nossas mentes.” (p. 25)
Encurtando distâncias
“Quando eu falo de África, qual é a primeira palavra que vem à cabeça de vocês?
(...)Fome, pobreza, miséria e doenças são as palavras mais lembradas pelos estudantes.
Infelizmente, essa visão estreita é resultado das imagens amplamente disseminadas pela
mídias, nas quais são priorizadas apenas as mazelas decorrentes de séculos de exploração
colonial.” (p. 41)
A partir dessa indagação, Luana buscou aproximar a realidade de seus estudantes à de
outros estudantes, africanos, através de uma partida de futebol. Esse intercâmbio possibilitou
uma troca direta, repleta de curiosidade, afeto, descontração e espírito esportivo; “O jogo nos
deu a oportunidade de lançar novos olhares sobre o continente africano e sobre nós mesmos.
Aprendemos um pouco mais sobre união, respeito, solidariedade e amizade.” (p. 44)
“Após aprendermos um pouco sobre a História da África, como trabalho final, pedi a
cada um que realizasse uma pesquisa sobre personalidades africanas. Nelson e Winnie
Mandela, Paulina Chiziane, Mia Couto, José Craveirinha, Chimamanda Ngozi Adichie e
Samora Machel foram alguns dos nomes sugeridos.” (p. 45)
“Não concordo com a afirmação de que os ‘jovens de hoje não gostam de ler’.
Entendo que há mais uma falta de estímulo do que qualquer outra coisa. De acordo com os
dados do Censo Escolar 2017, apenas metade das escolas brasileiras possuem bibliotecas.
Muitas delas funcionam como verdadeiros depósitos de livros e também como locais em que
os alunos devem cumprir castigos e punições.” (p. 46)
“Passados alguns dias, a Anna me contou que depois de ler Sejamos todos feministas
(ADICHIE, 2015) percebeu que não é justo que ela e a mãe cuidem da limpeza da casa
enquanto o irmão joga futebol na rua.” (p. 48)
Luana, também em processo de descoberta, realiza uma extensa pesquisa para incluir
em suas aulas as Histórias e Culturas indígenas, chegando a compor uma apostila para os
alunos “No que diz respeito às trajetórias dos índios no Brasil, recorri a teses de doutorado e
dissertações de mestrado, o que fez com que eu tivesse que adaptar alguns textos, tornando a
linguagem acessível aos meus alunos. De jornais, revistas e páginas da internet, separei
informações sobre a presença dos povos nativos no território brasileiro na atualidade, sobre a
luta pela demarcação de suas terras e também sobre a violência cometida por latifundiários e
por grupos religiosos.” (p. 50)
Após diversas atividades e debates sobre o tema, ela conseguiu ainda convidar para
uma apresentação Adana Kambeba, aluna da Faculdade de Medicina da UFMG, atriz e filha
da etnia Kambeba, mobilizando a comunidade escolar e local para realização do evento no
salão de uma igreja evangélica próxima.
“Adana abriu a atividade com uma linda canção da língua Kambeba (...) Sua trajetória de vida
foi uma verdadeira fonte de inspiração para os meus alunos, uma vez que, em razão da
pobreza, das falhas do ensino público e das diversas formas de violência que os cercam,
muitos não conseguem vislumbrar outros horizontes.” (p. 52)
Inspirada por uma colega professora de língua portuguesa, Luana busca realizar aulas
seguindo uma proposta similar; “Cícera estabeleceu um diálogo entre os saberes considerados
canônicos e os produzidos nas ‘periferias do saber’ (SANTOS, 2009, p.41), o que é
fundamental para o estabelecimento de uma educação inclusiva, cidadã e democrática.” (p.
54). Consistia em, concomitante às aulas sobre o Renascimento na Europa e seus principais
artistas, ensinar sobre a arte produzida na Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. Alguns
alunos se demonstraram felizes por serem da região, e outros, pela proximidade do local,
como Iago: “ - Pois é! A gente fica o ano todo aprendendo sobre a Europa e sobre os Estados
Unidos, mas sobre as nossas coisas, sobre o nosso país, a gente não sabe nada!” (p. 55)
Além de buscar o respeito aos saberes tradicionais e de classes populares, com a
contribuição do professor de Arte, os alunos aprenderam a produzir seus próprios oratórios
(objeto comum no artesanato do Vale), demonstrando assim habilidades artísticas individuais.
Funk Cordélico
Ao trazer princípios da educação holística para suas aulas, Luana busca “promover um
ambiente em que prevaleça o reconhecimento mútuo (...) caminhos que proporcionem formas
de aprender que contemplem o nosso corpo, a nossa mente e o nosso intelecto.” (p. 62)
Como parte dessas práticas pedagógicas, ela traz a meditação para a sala de aula
(inicialmente sem utilizar essa palavra, pedindo que todos passassem um minuto em silêncio,
agradecendo) sendo capaz de melhorar a concentração de uma turma cheia de dificuldades,
que ainda relatou ao final do ano uma impressão bastante positiva da prática, como Inácio:
“Desde que começou, a sala ficou melhor graças à meditação. Eu agradeço muito a professora
Luana! Obrigada, professora Luana! Os alunos estão prestando atenção nas matérias.” (p. 65).
Por fim, “(...) a meditação não impacta somente nos aspectos comportamentais, mas
também promove o equilíbrio das emoções, contribuindo para a mudança da percepção que os
alunos têm de si mesmos e dos que estão a sua volta.” (p. 68)
Queremos estudar e aprender!
Cartas de amor
“Na tentativa de despertar em meus alunos o prazer pela escrita, há alguns anos utilizo
um recurso bastante antigo para alcançar esse objetivo: a elaboração de cartas (...) A
oportunidade de expressar sentimentos por si só já é uma motivação para que o estudantes
escrevam. O processo da escrita flui melhor, deixando de ser uma verdadeira “tortura”. Eles
sempre têm muito a dizer. Sempre! As cartas possibilitam ainda a melhoria dos níveis de
leitura e escrita (...)” (p. 71)
O projeto “Cartas de amor” consistiu na escrita de cartas para os pacientes do Hospital
Mário Penna, especializado no tratamento do câncer. A experiência gerou grande empolgação
nos alunos; “(...)além de escrever da melhor maneira possível, havia uma preocupação sincera
de enviar aos pacientes mensagens cheias de afeto, amor e esperança.”
Dentro da temática de suas aulas, Luana tenta sempre que possível introduzir práticas
e discussões feministas, como quando, ao ensinar sobre Revolução Industrial, optou por
apresentar a perspectiva feminina do evento. Não obstante, em meio aos debates, temas como
violência e cultura do estupro tomaram espaço, claro, com a mediação da professora.
Em outro momento, conta de um trabalho sobre feminicídio, realizado pouco antes do
assassinato da advogada Tatiane Spitzner, cujas imagens violentas da agressão foram
amplamente divulgadas, “Partindo dos estudos sobre o Iluminismo (...) organizamos um
trabalho sobre o feminicídio, no qual os alunos e as alunas do 8° ano deveriam realizar
pesquisas a respeito desse tema.” (p. 86)
Ao final, “Aprendemos com o funk, com as estatísticas e com cada palavra que elas
disseram (...) A escola não pode ser indiferente a essa luta. Promover pedagogias feministas
que empoderem as meninas e liberte os meninos da masculinidade tóxica e de todos os males
que ela provoca é mais que um dever. É uma obrigação.” (p. 89)
Educação em Direitos Humanos
“Alguns professores questionam “como faço para cumprir o conteúdo” ao incluir esses temas
em minhas aulas. Cria-se a falsa impressão de que eu passo o ano inteiro sem ensina nada do
que é estabelecido pelo currículo de História (...) A grade curricular adotada pelas instituições
de ensino pode servir de norte para o trato dessas questões. Basta aceitar o desafio de
ressignificá-la com o compromisso de promover uma educação cidadã.” (p. 92)
Uma das alunas de Luana sofre de uma doença que compromete sua visão e,
observando a falta de recursos da escola, ela faz o que está em seu alcance e mostra para Clara
exemplos de superação.
“Como na maioria das escolas, na nossa não havia lupas, pranchas, carteiras e livros
adaptados, recursos essenciais para a superação das dificuldades impostas pela perda da visão.
Dessa forma, adaptei o tinha em mãos. As aulas passaram a ser majoritariamente orais. Passei
a escrever cada vez menos no quadro. Ao levar um texto para discussão, fiz duas matrizes.
Uma com letras maiores para a Clara, e outra para os demais alunos.” (p. 94)
No capítulo seguinte, a mesma jovem é introduzida à história de Malala Yousafzai,
ativista baleada em seu país por querer estudar e para quem Clara escreve uma carta cheia de
afeto e esperança: “Se Malala tem forças para lutar, eu também vou ter. Se ela luta para a
liberdade e a igualdade, e já passou por tantas coisas, e está conseguindo, por qual motivo não
lutarei?” (p. 98)
“Eles [alunos] sabem que, ao organizar um círculo, não tenho a intenção de impor a
minha opinião, mas orientar, ouvir e refletir.” (p. 101)
Pensando em se aproximar de seus alunos e ouvir suas opiniões, Luana adota o uso do
diário, pedindo que reservem um caderno para sua escrita. “A correção tinha por objetivo
conhecê-los, além de melhorar as habilidades de leitura e escrita.” (p. 107). A professora
chega a presentear um de seus alunos com o caderno e acompanhá-lo mais de perto, em vista
das dificuldades que ele estava passando.
“Não tenho condições de resolver todos os problemas dos meus alunos. Estabeleço um
limite entre o que vejo, o que chega até os meus ouvidos e o que posso fazer para amenizar o
sofrimento e as dificuldades experimentadas por alguns. Caso contrário, seria vítima de um
colapso emocional.” (p. 107)
O que eu gostaria que minha professora soubesse?
Mais uma vez, na tentativa de escutar e conhecer melhor seus alunos - melhorando
também a convivência em sala de aula e o prazer em aprender - Luana propõe uma atividade
em que eles respondam a pergunta “O que eu gostaria que minha professora soubesse?”. As
respostas foram bem diversas, expondo uma realidade de muita dor em virtude da pobreza e
da violência, mas também repleta de “sonhos, esperanças e as mais sinceras demonstrações de
afeto (...)” (p. 110), desde sérios problemas familiares, dificuldade de realizar as atividades
escolares até a crença nas própria inteligência e coragem.
Nisso, ela conclui: “(...) é necessário repensar a escola e propor algo que vá além do
modelo homogeneizante vigente, que desconsidera os saberes, as habilidades e a trajetória de
cada estudante (...) mesmo com as políticas de universalização do acesso à educação, o
ambiente escolar muitas vezes é um espaço de exclusão e de opressão principalmente para os
negros, para os mais pobres, para os homossexuais, para todos que não se enquadram nos
padrões tidos como ideais pela escola.” (p. 111)