Você está na página 1de 68

Publicação da Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural

Edição 6 | ano 2 | outubro de 2018 | R$ 15,90

Edifício

AQWA
Corporate
Linhas futuristas de um
projeto arquitetônico arrojado
que se insere no conjunto
de obras que tem alterado
urbanisticamente a zona
portuária do Rio de Janeiro

ENTREVISTA
CAPELA DE
Rubens Menin, da MRV, conta
como criou uma das maiores SANTA LUZIA
construtoras do País A engenharia sustentando
o sagrado
ÍNDICE | REVISTA ESTRUTUR A

AQWA
CORPORATE ÍNDICE
04 | EDITORIAL 40 | ARTIGO RETRO
CONTINUIDADE ASSOCIADA A NOVAS IDEIAS PROTENSÃO PARCIAL: UMA FASCINAÇÃO!

05 | PALAVRA DO PRESIDENTE 48 | ESPAÇO ABERTO


NOVA GESTÃO INCÊNDIO EM EDIFÍCIOS ALTOS NO BRASIL
NOVOS CAMINHOS...
50 | NOSSO CRAQUE
22 | BOAS PRÁTICAS DE PROJETO A TRAJETÓRIA DE UM MESTRE DAS
NOVAS FUNDAÇÕES PARA CAPELA OBRAS ENTERRADAS
DE SANTA LUZIA
58 | VALORIZAÇÃO PROFISSIONAL
06 | ENTREVISTA ESTÁ NA HORA DA VIRADA

A APOSTA DA MRV NO SIMPLES, 59 | NOTAS E EVENTOS


FUNCIONAL E NO BAIXO CUSTO
64 | O QUE ELES QUEREM DE NÓS
30 | ARTIGO TÉCNICO INTERAÇÃO ENTRE PROJETISTA E CONSTRUTOR
EMENDAS POR LUVAS EM ANÁLISE É FUNDAMENTAL

36 | CASE INTERNACIONAL 66 | JOGO DE SETE ERROS


OS DESAFIOS DA PONTE CHACAO DESCUBRA AS FALHAS

53 | INOVAÇÃO
A IGREJA DE ATLÂNTIDA
E SUA PROPOSTA
ESTRUTURAL

CONCEPÇÃO FUTURISTA

10

EXPEDIENTE
A Revista Estrutura é uma publicação da ABECE – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
ENGENHARIA E CONSULTORIA ESTRUTURAL, dirigida aos escritórios de engenharia e
engenheiros projetistas, construtoras, arquitetos e demais profissionais do setor.
PRESIDENTE: Jefferson Dias de Souza Junior SECRETARIA GERAL: Elaine C. M. Silva PUBLICIDADE: ABECE
VICE-PRESIDENTE DE RELACIONAMENTO: COMITÊ EDITORIAL: Alexandre Duarte Av. Brigadeiro Faria Lima, 1.993 - cj. 61 -
João Alberto de Abreu Vendramini Gusmão, Antonio Laranjeiras, Augusto CEP: 01452-001 - São Paulo/SP
C. Vasconcelos, Augusto G. Pedreira de abece@abece.com.br
VICE-PRESIDENTE DE TECNOLOGIA E Tel.: (11) 3938-9400
QUALIDADE: Enio Canavello Barbosa Freitas, Carlos Britez, Cesar Pinto, Daniel
Domingues Loriggio, Eduardo Barros Millen, IMPRESSÃO: Maistype
VICE-PRESIDENTE DE MARKETING:
Guilherme A. Parsekian, Guilherme Covas, TIRAGEM: 5.000
José Luiz V.C. Varela
Inês L. S. Battagin, Joaquim Mota, José Celso
DIRETOR ADMINISTRATIVO FINANCEIRO: FOTO DE CAPA: André Nazareth
da Cunha, Leonardo Braga Passos, Márcio
Roberto Dias Leme Roberto Silva Correa, Mario Cepollina, Milton
DIRETORA DE NORMAS TÉCNICAS: Golombek, Nelson Covas, Ricardo Leopoldo Os artigos assinados ou as entrevistas concedi-
Suely Bacchereti Bueno e Silva França, Selmo C. Kuperman, Sergio das refletem as análises e opinião dos autores
Hampshire, Valdir Pignatta e Silva. ou entrevistados e não necessariamente do Co-
DIRETOR DE METÁLICAS: Tomás Vieira mitê Editorial da revista.
DIRETOR DE PONTES E ESTRUTURAS: EDIÇÃO: Lázaro Evair de Souza, Sylvia Mie –
João Luis Casagrande Mecânica de Comunicação
www.meccanica.com.br
DIRETOR DE PRÉ-MOLDADOS:
Fabricio Tomo JORNALISTA RESPONSÁVEL:
Enio Campoi – MTB 19.194
DIRETORES: Claudio Adler, José Martins
Laginha Neto, Leonardo Braga Passos, Luiz PRODUÇÃO GRÁFICA: MGDesign Cadastre-se no
Aurélio Fortes da Silva, Ricardo Borges Kerr, www.mgdesign.art.br site da ABECE para
Thomas Carmona, Túlio Nogueira Bittencourt DIAGRAMAÇÃO: Alcibiades Godoy receber a revista.

03
EDITORIAL

CONTINUIDADE
ASSOCIADA A
NOVAS IDEIAS

A
credito que, após os últimos três Auxilia e facilita esse processo de pres-
anos de intensa recessão viven- tação de serviços, o fato de a ABECE ser
ciada por todos os brasileiros, uma entidade na qual não há disputa
a ABECE, enquanto entidade eleitoral, pois há muitos anos formamos
representativa de um setor importante um grupo que vem se renovando na dire-
da economia que sofreu diretamente os ção da entidade, sempre de forma volun-
impactos deste período, necessitará reto- tária e através de um trabalho de doação
mar e intensificar iniciativas na direção de à categoria dos engenheiros estruturais.
uma maior valorização dos profissionais Neste sentido, ascender ao cargo de pre-
das diversas áreas de projeto de estrutu- sidente é uma sucessão natural, que faz
ra. Precisamos também aprimorar e am- parte de todo um processo de parceria
pliar os contatos com nossos associados e com os colegas que me antecederam e
colaboradores, assim como a relação com com os que me sucederão. Contudo, esta
entidades e associações parceiras, com as oportunidade de dar um toque pessoal
quais sempre mantivemos um profícuo às ações já iniciadas e de implementar
relacionamento. Não devemos, ainda, nos outras ideias que desenvolvemos junto
esquecer de estreitar os laços com todos com os parceiros da nova diretoria, cer-
os demais players da extensa cadeia da tamente nos envaidece e se apresenta
construção civil brasileira. rabilidade das edificações, além de menor como um desafio tentador.
Entendo que uma das principais preo- custo inicial e de manutenção das obras. Talvez este seja um dos motivos do gran-
cupações e demandas dos associados Como uma entidade que já construiu um de sucesso da ABECE ao longo de sua exis-
seja trabalhar no sentido da recuperação conceito elevado no meio técnico e que, tência de décadas. A continuidade das ações
do nosso mercado de trabalho, com o ne- ao mesmo tempo, tem o compromisso em associada a novas ideias e motivações, com
cessário aumento do volume de negócios defender os interesses dos seus associa- energias renovadas a cada nova gestão,
e a imprescindível recuperação dos valores dos, a ABECE procura sempre zelar pelo proporciona uma entidade vibrante e com
dos nossos honorários, que ficaram es- bem-estar da sociedade de uma forma garra para defender nossos associados e as
tagnados nestes últimos tempos. E como, geral. Tal atitude tem se traduzido por um boas práticas da profissão que abraçamos,
concretamente, fazer isso? A missão da trabalho desenvolvido pelos profissionais oferecendo à sociedade produtos e servi-
ABECE, nesse aspecto, vai na direção de associados à nossa categoria que seja va- ços de grande qualidade e confiabilidade.
desenvolver um intenso trabalho de cons- lorizado, tenha qualidade e que possibilita Pessoalmente, é um grande desafio, que
cientização das empresas contratantes obras duráveis, seguras, econômicas e de tive que negociar intensamente com minha
dos nossos serviços de que o projeto de baixo custo de manutenção. Para assegu- família, que muito nos honra e que espero
uma obra não deve ser colocado na coluna rar tudo isso, a entidade tem procurado poder desempenhar satisfatoriamente,
de “custo” dos seus orçamentos. Temos de orientar e capacitar seus associados e com a ajuda de Deus e dos demais colegas
atuar de maneira que o mercado, de uma demais profissionais que atuam na área da nova diretoria.
forma geral, compreenda que o projeto sobre a utilização das mais modernas e
é um “importante investimento”, que ne- melhores técnicas executivas, de forma a João Alberto de Abreu Vendramini
cessariamente significará maior qualidade propiciar aos clientes finais a maximização presidente eleito para a gestão
final das construções, confiabilidade e du- e a otimização de resultados. 2018 - 2020

04 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


PAL AVR A DO PRESIDENTE | JEFFERSON DIAS DE SOUZ A JUNIOR

NOVA GESTÃO
NOVOS CAMINHOS...

D
urante estes dois anos em que se aqui e gerasse uma verdadeira revolu-
estive à frente da ABECE, procu- ção na economia.
rei, incessantemente, aproximar Deixando as perigosas visões políticas
construtores e projetistas. Nes- de lado, as quais muito do que aconteceu
te momento, precisamos nos unir e dar- nessa época eu também não concordo, a
mos as mãos para superar a maior crise parte econômica cumpriu seu papel de
político-econômica que já atravessamos. estabilizar o país e passar uma imagem
No Brasil, mais do que na maioria dos de segurança aos investidores externos.
países desenvolvidos, temos uma relação E investimento estrangeiro, sem dúvida,
muita estreita entre produção e política... pode alavancar a economia brasileira de
entre a construção civil e os desmandos e uma maneira substancial.
desatinos de seus dirigentes... Quando esta revista chegar a ser distri-
Independentemente da economia ir buída, estaremos encerrando o 2º turno
bem ou mal, quando da substituição de das eleições no Brasil. Espero que a equi-
dirigentes, obras são paralisadas, paga- pe que esteja assumindo a presidência
mentos e faturas são suspensos, priorida- desta Nação possa tranquilizar o mercado
des alteradas etc. A lista é extensa... e passar a mensagem de credibilidade do
Isso não poderia acontecer. Nos países Brasil para os mercados interno e, princi-
mais desenvolvidos, quando há altera- palmente, ao externo.
ções de dirigentes, apenas pequenas cor- externo. Com os fundos de investimentos Que o Brasil suba de forma considerá-
reções de rumo são realizadas. estrangeiros, existem trilhões disponíveis vel no ranking de investimento. E, para
Precisamos ter um plano a médio e para aplicações em quaisquer países e que isto aconteça, teremos que passar
longo prazo, apenas com ajustes a se- um pequeno percentual desse montante por diversas reformas e ajustes, fiscais e
rem feitos no curto prazo. Não podemos causaria uma enorme euforia em nossa estruturais.
continuar vendo este país sendo levado economia. Com um governo que atue nessa linha,
por planos mirabolantes que se alteram Mas, para que isso realmente aconte- esperamos bons ventos para a Constru-
ao sabor das demagógicas promessas ça, os países que estão bem classificados ção Civil e a melhora da economia de
de políticos sem embasamento técnico a nesse ranking de supostas postulantes a uma maneira geral. Com esse pensamen-
procura de votos rasteiros por interesses investimentos, têm que se mostrar segu- to, com certeza, a ABECE/Construtoras/
menores. ros, política e economicamente. Incorporadoras e empresas de projeto
Políticos que, na sua grande maioria, Quando lembramos do milagre brasilei- como um todo devem estar alinhadas.
estão interessados prioritariamente no ro na década de 70, falamos de uma épo- Boa sorte à nova equipe da ABECE, lide-
seu próprio saldo bancário e, em segun- ca em que, externamente, o Brasil passou rada pelo eng. João Vendramini!
do lugar, com a próxima eleição. Com essa a ser visto com bons olhos e este fato fez Espero que naveguem em águas que
visão, a prioridade passa a ser apenas de com que muito capital estrangeiro entras- corram para um novo horizonte, mais co-
curto prazo. lorido e com céu de brigadeiro...
Para um pleno desenvolvimento de
nosso país, uma das melhores alterna- Boa sorte, Brasil!
tivas seria, sem dúvida, o investimento

05
ENTRE VISTA | RUBENS MENIN

A APOSTA DA MRV NO
SIMPLES, FUNCIONAL E
NO BAIXO CUSTO
O
O ENGENHEIRO RUBENS MENIN, UM DOS FUNDADORES começo de tudo foi a constru-
ção de uma casa simples na
DA MRV, DETALHA SUA TRAJETÓRIA EMPRESARIAL, zona Norte de Belo Horizon-
CONTA COMO FOI CRIADA UMA DAS MAIORES te, concluída pela metade do
CONSTRUTORAS DO PAÍS E FALA DA NECESSIDADE valor orçado inicialmente. Com a venda
desta casa, foram construídas outras
DE SE MANTER CUSTOS CONTROLADOS, três, igualmente populares e a custos
FOCO NA INOVAÇÃO E INVESTIMENTO EM PESSOAS baixos, cuja venda resultou na compra de
PARA TER SUCESSO um terreno na periferia da capital minei-
ra, onde foram erguidas outras 10 casas.
O resto é história. Embalado pelo suces-
so dessa experiência inicial, concretizada
na segunda metade dos anos de 1970,
o engenheiro Rubens Menin Teixeira
de Souza, se associou ao primo e a um

06 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


ex-chefe para fundar a MRV Engenharia, receita decorrente de sua venda construi escala, a empresa ganhou maior poder de
hoje um colosso nacional que já entre- mais três novas habitações populares nos barganha com os fornecedores. Houve ou-
gou, até o final de 2017, cerca de 320 mil mesmos moldes. A venda das três casas tras melhorias. O processo de “construção
casas e apartamentos em todo o Brasil. gerou recursos para a compra de dois lo- industrializada” permitiu que a MRV en-
“Atualmente administramos um total tes para a construção de outras 10 habi- tregasse, atualmente, a chave de um novo
de 214 canteiros de obra, com uma mé- tações, em um bairro da periferia de Belo apartamento a uma família no Brasil a cada
dia de 398 unidades em cada canteiro. Horizonte. Foi em meio a esse crescimento dois minutos e meio. Com uma média de
A MRV está presente em 150 municípios exponencial que, em 1979, ao se associar 18 mil empregados nas obras, entregamos
de 22 estados. Nestas cidades, uma em ao primo Mário Menin, e a um ex-chefe mais de 320 mil casas e apartamentos no
cada 80 pessoas é cliente da MRV”, conta na Vega Engenharia, Homero Matos, que Brasil até 2017, realizando o sonho da casa
Menin, um dos fundadores e presidente fundamos a MRV Engenharia, empresa própria de mais de um milhão de pessoas.
do Conselho de Administração da MRV que transformaria o segmento imobiliário Atualmente administramos um total de 214
Engenharia. A receita do sucesso: custos brasileiro nas décadas seguintes. MRV é a canteiros de obra, com uma média de 398
controlados como no exemplo da primei- inicial dos três sócios fundadores. unidades em cada canteiro. A MRV está
ra casa, garantia de escala de produção, presente hoje em 150 municípios em 22
padronização de itens, construções in- estados. Nestas cidades, uma em cada 80


dustrializada, inovação tecnológica e forte pessoas é cliente da MRV. Então posso di-
investimento em capacitação profissional zer que, apesar das crises, fomos vitoriosos
para formar um time envolvido, dedicado em nossa empreitada.
e “apaixonado pelo que faz”. Acompanhe A construção
a seguir, na entrevista à revista ESTRUTU- ABECE – Quais os principais fatores
RA, outras opiniões e avaliações de Menin industrializada tem que levaram a empresa a se manter
sobre engenharia, construção e negócios:
permitido que a atuante e com um elevado volume de
obras?
ABECE – O que o fez decidir pelo curso MRV entregue um Rubens Menin – Além de manter os
de engenharia civil? custos sob controle, para garantir escala
Rubens Menin – A engenharia corria em novo apartamento apostamos em grandes obras e na cons-
minhas veias desde cedo. Meu avô pater- trução de prédios padronizados, com
no, Asdrubal Teixeira de Souza, era enge- a cada dois os mesmos materiais e acabamentos


nheiro e comandava uma empresa que
montava barragens e Pequenas Centrais
minutos e meio nas diferentes unidades. O processo de
construção industrializada nos permitiu
Hidrelétricas (PCHs). Meus pais, Geraldo crescer exponencialmente.  Outro ponto
e Maura, começaram a namorar ainda na importante é que uma grande empresa
faculdade de engenharia, em Belo Hori- só se faz com gente e estou convencido
zonte – no caso de minha mãe era um de que o sucesso da companhia se deve
fato incomum no Brasil, especialmente ABECE – Já na casa dos 40 anos de ati- ao time diferenciado de mais de 20 mil
na década de 50. Minha mãe foi a ter- vidade e tendo passado por todas as colaboradores envolvidos com o proje-
ceira mulher a se formar em engenharia oscilações da economia brasileira, to da MRV. Uma equipe dedicada, ética
no Estado de Minas Gerais. Minha base qual balanço que faz da MRV? e apaixonada pelo que faz. Verdadeiros
familiar moldou minha educação e, con- Rubens Menin – Apesar dos desafios im- realizadores de sonhos.
sequentemente, meu futuro. Fui treinado postos pelas inúmeras crises econômicas
desde cedo para ser engenheiro. A enge- enfrentadas ao longo dos anos, como a de ABECE – Quantos m2 construído a
nharia sempre fez parte da minha vida. 1982, o foco na população de baixa ren- empresa já acumula ao longo de sua
da nunca deixou de ser prioridade para a história?
ABECE – Como nasceu a MRV? MRV. Sempre enxerguei nas crises as opor- Rubens Menin – Somente nos últimos
Rubens Menin – Antes mesmo de me for- tunidades para enxugar gastos desneces- seis anos construímos 40.395.855 m 2 .
mar, identifiquei uma oportunidade não sários e investir em inovação e tecnologia, Em nossa história temos 340 mil clientes
apenas de ganhar algum dinheiro, mas de tornando os processos ainda mais eficien- ativos o equivale a um milhão de brasilei-
começar a concretizar o sonho pessoal tes. Além de manter os custos sob con- ros, sendo que um a cada 200 brasileiros
de construir um Brasil mais justo e so- trole, para garantir escala apostamos em mora em um imóvel construído pela MRV.
cialmente inclusivo: a construção de uma grandes obras e na construção de prédios
casa popular, aquela mesma localizada na padronizados, com os mesmos materiais ABECE – Como uma empresa que sem-
Rua dos Maçaricos, 96, e que continua em e acabamentos nas diferentes unidades. pre inova, observa os modernos avan-
pé até hoje.  Sem dinheiro no bolso, fiz o Dessa forma, conseguimos desenvolver ços do setor de construção? Como
que muitos empreendedores novatos e uma estruturada cadeia de fornecedores avalia, por exemplo, os avanços em
sem recursos estão acostumados: recorri de aço, tinta, tubos, metais e outros ma- termos de industrialização do proces-
a meu pai. Construí a casa com metade teriais oferecendo um produto de baixo so construtivo? O que acha do BIM? Já
do valor solicitado inicialmente e como a custo e alta qualidade para o cliente. Com o emprega nos seus projetos?

07
ENTRE VISTA | RUBENS MENIN

Rubens Menin – A busca pela inovação ser visto como parte do plano de comuni- uma retomada gradual no curto a médio
sempre foi uma obsessão. Desde os pri- cação da empresa, garantindo o repasse prazo, sustentada pela demanda consis-
mórdios da MRV, buscamos oferecer à de informações, tarefas e a produtividade tente por imóveis, pela continuidade do
classe de baixa renda um produto que não de toda a equipe envolvida e não é o que Minha Casa Minha Vida (MCMV) e pela
apenas coubesse no bolso, mas superasse vemos em grande parte das empresas. oferta de financiamentos, ainda que o
as expectativas do comprador, ditando as setor precise de ajustes regulatórios. O
tendências do mercado e estabelecendo ABECE – Qual sua percepção em rela- Brasil ainda conserva um crescimento de-
parâmetros inovadores. Adotamos o BIM, ção ao estágio técnico atual da enge- mográfico significativo, o que implicará na
sistema que integra as etapas da constru- nharia de estrutura brasileira em re- necessidade de produção de 35 milhões
ção (projeto executivo, instalações, estrutu- lação ao que existe em outros países? de moradias ao longo dos próximos 20
ral e arquitetônico) de um empreendimen- Rubens Menin – Precisamos evoluir mui- anos. Isso faz do Brasil o quarto maior
to em um ambiente colaborativo. A MRV é to. A comparação internacional, em geral, mercado de habitação do mundo em ter-
uma das pioneiras na adoção do programa é muito desfavorável ao Brasil. Os países mos de demanda que só é superado por
que é considerado o futuro da construção. emergentes da Ásia, incluindo a China, o China, Índia e Estados Unidos. Além dis-
Vietnã, a Coréia do Sul e a Tailândia, têm so, contamos com boa disponibilidade de
ABECE – Como a MRV encara as novas conseguido investir em infraestrutura, crédito, embora seja preciso diversificar
tecnologias do concreto? Tem utiliza- algo próximo a 10% dos respectivos PIBs. as fontes de financiamento para se evitar
do essas inovações em suas obras? Perifericamente a esse núcleo mais ativo, escassez de recursos futuramente, quan-
Rubens Menin – Na MRV temos um de- outros países como as Filipinas, a Índia e do o setor estiver novamente aquecido.
partamento específico para inovação, que o Japão também têm conseguido taxas Acho que pode faltar funding na retoma-
fica responsável por gerenciar os novos de investimento elevadas, quase todas da, por isso a importância de novas fontes
projetos e trabalhar para aprimorar os de financiamento.
processos construtivos, atendimento ao
cliente, desenvolvimento de alternativas ABECE – A seu ver, que medidas se-


sustentáveis para escritórios, canteiros de riam necessárias para acelerar a re-
obras e empreendimentos, entre outras cuperação?
ações inovadoras estamos usando em
mais de 80% das nossas obras o concreto
Um projeto Rubens Menin – As empresas brasilei-
ras tiram de seus resultados quase 40%
auto adensável nas formas de parede de executivo bem de tudo o que ganham ou produzem para
concreto e o desempenho das obras em pagar, na forma de tributos, os elevadíssi-
que usamos essa tecnologia é fantástico. detalhado garante mos custos da ineficiente máquina pública
O concreto utilizado para a produção das brasileira. Com uma carga deste padrão,
unidades residenciais obedece a critérios
a fluidez dos não há competitividade que resista. Já
rigorosos na sua formulação. Um laborató-
rio montado nos canteiros de obras realiza
trabalhos nos a burocracia parece ter saído definitiva-
mente de controle e pressiona, mais do


os ensaios de concreto auto adensável a canteiros que qualquer outro fator, a elevação final
partir de amostragens obtidas no próprio e persistente do Custo Brasil.  No setor de
local para garantir a qualidade do produto. construção: com o impacto da burocracia
associada ao licenciamento de obras e à
ABECE – Qual sua opinião sobre os aprovação de projetos, os custos já alcan-
projetos executivos elaborados hoje çam, em média, 10% do preço final de ven-
no Brasil? Eles são de padrão de ex- superiores a 5% do PIB. Na América Lati- da dos imóveis. O absurdo decorre do fato
celência? na, alguns dos nossos vizinhos também de que, em quase todas as regiões do Bra-
Rubens Menin – Acredito que o projeto se destacam, merecendo menção os ca- sil, essas atividades burocráticas estão de-
executivo  constitui a parte mais impor- sos da Colômbia, do Peru, do Chile e do mandando tempo da ordem de três anos
tante de uma obra de engenharia e pode México. Nesse panorama geral, é preocu- para a obtenção de todas as licenças e al-
garantir o sucesso ou a falha total de um pante registrar a situação brasileira, cuja varás. Não há competitividade que resista
empreendimento – como vemos em mui- infraestrutura deficiente e deteriorada a um desperdício desse tamanho. O Brasil
tas obras públicas e em projetos de gran- está sendo objeto de investimentos limi- precisa destravar com urgência estes dois
des construtoras e incorporadoras. Um tadíssimos, já há quase três décadas. gargalos. A reforma tributária está na pau-
projeto executivo bem detalhado garante ta há muitos anos, mas há enorme dificul-
a fluidez dos trabalhos nos canteiros. Os ABECE – Como avalia as perspectivas dade para a obtenção de consenso para
funcionários não precisam parar para tirar do mercado da construção civil brasi- que ela avance. No caso da burocracia, po-
dúvidas, corrigir problemas que surgem leira no médio prazo? Acredita numa rém, a tarefa não é tão complicada: basta
inesperadamente e todas as decisões re- recuperação efetiva das obras nos vontade política e um bom planejamento
lativas à construção estão claras. Além de próximos anos? para reduzir de forma rápida e vigorosa
ser um detalhamento de como a obra de- Rubens Menin – Sou um otimista e acre- este tipo de entrave ao desenvolvimento
verá funcionar, o projeto executivo deve dito que o mercado imobiliário mostrará mais robusto do nosso país.

08 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


9
ESTRUTUR A EM DESTAQUE | AQWA CORPOR ATE

UM MARCO
NA ARTE DE
PROJETAR

EDIFÍCIO CORPORTATIVO CONSTRUÍDO


NO COMPLEXO DE OBRAS QUE
MODERNIZARAM A ZONA PORTUÁRIA
DO RIO DE JANEIRO, O AQWA
CORPORATE DEMANDOU DIVERSAS
SOLUÇÕES DE ENGENHARIA, DENTRE
AS QUAIS DESTACAM-SE: USO DE
CONCRETO DE 80 MPa; CONSTRUÇÃO
DE MEGACOLUNAS INCLINADAS, QUE
PERMITIRAM COLOCAR OS PILARES
CIRCULARES NOS ANDARES ACIMA, ETC.

O
POR SUELY BACCHERETI BUENO* AQWA Corporate é um projeto 1900 vagas de estacionamento, distri-
bastante arrojado, localizado na buídas em cinco subsolos, o complexo
região em renovação do Porto corporativo será executado em duas fa-
Maravilha, no Rio de Janeiro. As- ses e quando finalizado 14.000 pessoas
sinado pela Fosters+Partnes, foi concebido trabalharão nos edifícios. São 21 pavi-
para ser um marco na região. Na época um mentos com lajes amplas de 3.200 m² a
dos mais importantes empreendimentos 3.700 m² e 4.800 m² de área de lojas e
da Tishman Speyer no Brasil. restaurantes. Edifício Classe AAA, quali-
Localizado em uma área de 140.000 dade mais alta tendo inclusive certifica-
m², com 134.000 m² de área locável e ção LEED Gold.

10 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


FIG. 1 – VÁRIAS OPÇÕES ESTUDADAS ATÉ SE CHEGAR A EQUAÇÃO FINAL SOBRE A DISPOSIÇÃO
DOS PILARES.

reuniam em São Paulo ou no Rio de Ja- veitamento dos andares de garagens. O


neiro num grande workshop onde eram fato dos pilares estarem afastados da
discutidos os projetos desenvolvidos até fachada leva a um aumento do efeito
então e apresentadas as novas propos- de 2ª ordem e consequentemente a um
tas de arquitetura. O desenvolvimento, aumento de largura. Como a proposta
a coordenação, projeto dos subsolos e o inicial apresentava os pilares com 50 cm
projeto executivo esteve a cargo da RAF esta solução se tornou inviável.
Arquitetura. A ideia era a criação de uma estrutura
Foi um longo e árduo trabalho de toda modular composta por triângulos que
a equipe até chegarmos à geometria final. pudesse ser combinada, conforme a ne-
A apresentação inicial do estudo preli- cessidade de área a ser ocupada, como
minar mostrava uma estrutura pré-mol- retail, tanto na cobertura como no térreo.
dada. Os pilares na face externa afasta- As cores no modelo do edifico mostram as
dos da fachada. diferentes combinações de módulos para
A modulação dos pilares era a cada atender todo tipo de lojas e restaurantes
8,75 m, o que não resultou um bom apro- para apoio à população dos escritórios.

O projeto foi iniciado em agosto de


2012 com uma dinâmica bastante dife-
rente dos projetos desenvolvidos pela
Tishman Speyer no Brasil, até então. Os
projetos do AQWA CORPORATE eram de-
senvolvidos por todas as especialidades
durante três semanas, com uma reunião
semanal de coordenação e a participa-
ção online das equipes de fora do Brasil.
Na quarta semana todas as equipes se FIG. 2 – AS DIFERENTES COMBINAÇÕES DOS DIVERSOS MÓDULOS DO PROJETO.

11
ESTRUTUR A EM DESTAQUE | AQWA CORPOR ATE

Nos detalhes da fachada pode se ver


a estrutura dos pilares afastados da fa-
chada e também a estrutura de vigas,
formando triângulos na cobertura que
receberiam estes módulos.
Seguindo nossa orientação de apro-
ximar ao máximo os pilares da fachada,
foram surgindo novas formas. Outra su-
gestão da estrutura, que foi acatada pe-
los arquitetos, foi a mudança da distância
entre eixos de 8,75m para 10,00m inicial-
mente, para um melhor aproveitamento
das vagas. Com o estudo da dimensão
dos pilares nos pisos inferiores, fixada em
60 cm, e para eliminar a interferência dos
pilares o vão adotado seria de 10,60m.
Sugerimos então adotar 10,625m para
que tivéssemos um múltiplo de 62,5cm,
que é a modulação de forro e piso ele-
vado. FIG. 3 – PILARES AFASTADOS DA FACHADA RESULTARAM NA FORMAÇÃO DE TRIÂNGULOS NA
A largura total do terreno, com 41,50m COBERTURA.
aproximadamente estava sendo ocupa-
da praticamente por todo o edifício. O
trecho ocupado pelo núcleo de 14,0m ao
centro e mais dois panos de 12,75m do
núcleo até a fachada.
A forma em planta do edifício, no en-
tanto, não sugeria uma estrutura modu-
lar, mais adequada para o pré-moldado, e
sim para uma estrutura moldada in loco.
Foram então surgindo outras formas
para o edifício que solucionasse inclusi-
ve o grande balanço das laterais do piso.
Havia a necessidade de se criar pilares in-
termediários nas duas laterais pois o final
do núcleo ainda deixava um vão muito
grande até a fachada.
Pode-se observar que os pilares ver-
ticais, com a fachada variável, geravam
enormes balanços à medida que íamos
para os andares superiores. Para que
fosse possível estruturar estes balanços
teríamos que aumentar a altura da viga
da fachada, o que diminuiria o vão livre
do caixilho, e consequentemente a vista
para o mar. Sugerimos então a introdu- FIG. 4 – DETALHAMENTO GERAL DA CONCEPÇÃO DA OBRA.

FIG. 5 – DETALHAMENTO GERAL DA CONCEPÇÃO DA OBRA.

12 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


FIG. 6 – O AQWA CORPORATE OCUPA UMA ÁREA TOTAL DE 140.000M2 COM 21 ANDARES.

ção de um pilar inclinado, no canto da fa-


chada, que se uniria ao pilar vertical.
A geometria era composta de pilares
verticais e pilares inclinados nos cantos
da fachada. Para a estrutura ainda era
necessário termos alguns pilares inter-
mediários pois, mesmo com o pilar in-
clinado no canto, o vão ainda era muito
grande para mantermos a viga de facha-
da com 72 cm de altura. As fachadas la-
terais teriam vigas protendidas com 135
cm de altura semi invertidas, para manter
a altura ao teto igual em todo contorno.
No primeiro pavimento tipo estas vigas
teriam que vencer um vão de pouco mais FIG. 7 – PILARES VERTICAIS E INCLINADOS NOS CANTOS DAS FACHADAS FORAM
de 31 m. COMPLEMENTADOS POR OUTROS INTERMEDIÁRIOS.
Após chegarmos a esta forma, com a
introdução das colunas inclinadas, foi fei-
ta uma nova proposta, na tarde anterior
ao próximo workshop no Rio de janeiro,
recebemos do arquiteto uma solicitação
para termos todos os pilares da fachada
inclinados. Tínhamos que nos posicionar
sobre a viabilidade da proposta na reu-
nião que se iniciaria no começo da ma-
nhã seguinte. Dessa forma teríamos uma
fachada mais homogênea pois o fato de
termos pilares verticais e inclinados ex-
ternos não agradava os arquitetos.
Como não dispúnhamos de tempo
para modelar o edifico todo, com os pi-
lares inclinados, optamos por comparar
a deformação das duas fachadas e as FIG. 8 – OPTOU-SE POR COMPARAR A DEFORMAÇÃO DAS DUAS FACHADAS PARA ENTÃO MODELAR
COMO UM PÓRTICO PLANO.
modelamos como um pórtico plano. Ve-

13
ESTRUTUR A EM DESTAQUE | AQWA CORPOR ATE

FIG. 9 – FOI UM LONGO E ÁRDUO TRABALHO DE TODA A EQUIPE ATÉ CHEGAR À GEOMETRIA FINAL.

rificamos que a fachada com os pilares


inclinados apresentava uma deformação
dez vezes maior que a outra, com os pi-
lares inclinados somente na borda. Isto
aumentaria enormemente a torção do
edifício que já não era pequena.
Com estes argumentos, a arquitetura
decidiu colocar os pilares para dentro do
edifício, de forma que os pilares verticais
não fossem visíveis, deixando na parte
externa os pilares inclinados das quinas.
Para se manter os vão das vigas de
fachada, os pilares nasciam nos anda- FIG. 10 – O AQWA CORPORATE ESTÁ CLASSIFICADO COMO EDIFÍCIO CLASSE AAA, QUALIDADE
res mais altos sobre a coluna inclinada, MAIS ALTA, TENDO INCLUSIVE CERTIFICAÇÃO LEED GOLD.
conforme o vão ficava inviável, com a
viga de 72cm.
As enormes colunas inclinadas e a viga
de coroamento do topo da edificação
formavam uma moldura perfeitamente
definida.
A geometria das colunas inclinadas foi
cuidadosamente definida, para que fosse
possível nascer os pilares circulares nos
andares acima, e para atender as neces-
sidades da estrutura. Foram chamadas
de Megacolunas devido à grande dimen-
são e importância. Nas figuras 12 a 15 os
detalhes da forma da Megacoluna e da
viga de coroamento que forma a moldura
do edifício. A viga de coroamento recebe
o equipamento de limpeza de fachada.
Foi definida a axonometria do edifício a
ser seguida por todos os projetos.
As linhas em azul representam as
colunas inclinadas e as vigas de co-
roamento. As linhas em vermelho das
elevações, os pilares que nascem nas FIG. 11 – SÃO 21 PAVIMENTOS COM LAJES AMPLAS DE 3.200M2 A 3.700M2 .

14 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


FIG. 12 – GEOMETRIA DA MEGACOLUNA EM
CONCRETO.

colunas e as linhas em planta de cada


pavimento. A coluna de maior inclina-
ção tem um deslocamento de 33 m no
topo para uma altura de 95 m, forman-
do um ângulo de quase 20 graus de in-
clinação. As outras colunas formam um
ângulo de 13 graus.
As fachadas inclinadas geram um efei-
to de torção importante no edifício.
Os esforços de 2ª ordem do edifício de- FIG. 13 – GEOMETRIA DA VIGA DE COROAMENTO.
vem ser determinados por processo mais
exato como P-delta.
A deformação máxima teórica obtida
no topo do edifício foi de 10,5cm para o
peso próprio, cargas permanentes mais
sobrecargas e a deformação devido ao
vento de 2cm.
Devido à forma do edifício, os esforços
provenientes da ação do vento, foram de-
terminados através de ensaios em túnel
de vento, onde foram ensaiadas as duas
fases de execução, uma com o edifico
somente da fase 1 e outra com os dois
edifícios. O projeto levou em considera-
ção os esforços na Fase 1 e os esforços
resultantes do efeito da construção da
segunda edificação sobre a Fase 1.
Para a estrutura do embasamento foi
adotada uma laje protendida com 22
cm, com capitéis de 40 cm, apoiada na
estrutura do núcleo e nos pilares junto
à parede diafragma. O uso de uma es-
trutura em laje protendida permitiu a FIG. 14 – DETALHAMENTO.
diminuição do piso a piso, que foi muito
importante para elevar a cota da funda-
ção, reduzindo dessa forma a escavação
em rocha.
O projeto de fundação, elaborado pela
Consultrix, especificou taxas no solo, ado-
tadas para as sapatas, de 25 kgf/cm² para
os pilares da torre e de 10 kgf/cm² para os
pilares do perímetro. As paredes diafrag- FIG. 15 – DETALHAMENTO.

15
ESTRUTUR A EM DESTAQUE | AQWA CORPOR ATE

ma com uso de tirantes foram engastadas


na rocha e executadas com o uso de fresa.
Como os pilares estão bem próximos
à parede diafragma, não havia necessi-
dade que as lajes estivessem apoiadas
nelas. A estrutura foi então concebida
independente da parede. As paredes se
apoiam horizontalmente na laje, com a
utilização de neoprenes fretados, de
forma que não temos nenhuma ligação
posterior o que facilitou muito a execu-
ção. A locação dos neoprenes foi cui-
dadosamente estudada, bem como a
execução dos shafts junto à parede, de
forma que tivéssemos nas lamelas me-
nores, pelo menos dois apoios. A coor-
denação com a MHA, responsável pelos
projetos de instalação, foi bastante im-
portante para viabilizar a solução.
Nesta ocasião a CODEME apresentou
um estudo para a nova solução. Foi desen-
volvido então um novo modelo da estru-
tura mista trabalhando em conjunto com
o núcleo de concreto. Ficou então definido
que o projeto executivo seria desenvolvi-
do com esta configuração: estrutura até o
térreo em concreto e a torre com núcleo
em concreto e demais áreas em estrutura
mista. Todas as escadas da fundação à co-
bertura seriam também metálicas.
O custo da estrutura embora fosse
acima do valor da solução em concreto,
traria uma redução de 5 meses no prazo
de execução e garantiria uma tolerância
de execução de 25 mm, muito difícil de se
conseguir em concreto.
Como o conceito da estrutura já estava
bastante definido e aprovado por todos,
a decisão foi transformar as peças de
concreto em peças metálicas. As colunas
que os arquitetos gostariam que fossem
feitas em concreto aparente, agora rece- FIGS. 16 E 17 – A ESTRUTURA DE TODO NÚCLEO DA FUNDAÇÃO À COBERTURA FOI FEITA COM
PILARES PAREDE COM O USO DE FORMA TREPANTE, PILARES, LAJES E VIGAS.
beriam um revestimento em alumínio.

FIG. 18 – A ESTRUTURA EM TORNO DO NÚCLEO NOS SUBSOLOS É UMA LAJE PROTENDIDA COM 22CM DE ALTURA APOIADA NOS PILARES
UTILIZANDO CAPTÉIS DE 40CM.

16
FIGS. 19 E 20 – A ESTRUTURA DO TÉRREO FOI FEITA COM LAJES, VIGAS E BLOCOS PARA TRANSIÇÃO DOS PILARES.

FIG. 21 – A ESTRUTURA DOS ANDARES TIPO TAMBÉM ERA EM LAJES PROTENDIDAS COM 22 CM DE ALTURA APOIADA NAS VIGAS DA FACHADA E NAS
VIGAS LOCALIZADAS NOS LIMITES DO NÚCLEO.

FIG. 22 – POR OCASIÃO DO PROJETO EXECUTIVO, A TISHMAN RESOLVEU ESTUDAR A OPÇÃO EM ESTRUTURA MISTA.
ESTRUTUR A EM DESTAQUE | AQWA CORPOR ATE

FIG. 24 – MODELO DO EDIFÍCIO EM ESTRUTURA MISTA COM NÚCLEO E


FIG. 23 – MODELO DO EDIFÍCIO EM CONCRETO. EMBASAMENTO EM CONCRETO.

Podemos ver o modelo da estrutura de


concreto e o da estrutura mista dentro
da mesma concepção.
Como a estrutura em concreto era uma
laje de 22cm, tínhamos no entre forro
uma liberdade muito maior para a passa-
gem das instalações. Na solução com vi-
gas mistas foi necessário fazer passagens
nas almas das vigas metálicas para que
pudéssemos acomodar a instalação. O
esforço de coordenação para que todas
as interferências fossem contempladas
no edifício com plantas diferentes a cada FIG. 25 – ABERTURAS NAS VIGAS PARA PASSAGEM DAS INSTALAÇÕES.
andar foi imenso.
As Megacolunas inicialmente iriam ser sem trabalhar como uma peça única es- Foram também criadas soluções es-
substituídas por dois pilares circulares, tava ficando muito complexa. A CODEME peciais para as transições de pilares nas-
porém esta solução não parecia ser ade- então viabilizou a fabricação de uma co- cendo nas Megacolunas da fachada. Uma
quada pois a estrutura de travamento luna no formato de uma falsa elipse que peça bastante elaborada, que recebeu o
necessária para que as colunas pudes- resolveria esta questão. nome de “Y” durante o projeto permitia

FIG. 26 – VISTA INTERNA AINDA EM FASE DE CONSTRUÇÃO. FIG. 27 – SEÇÕES DOS PILARES.

18 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


que o pilar circular da fachada inclinada
nascesse no 7º Pavimento.

FIG. 28 – SOLUÇÃO EM CONCRETO.


FIG. 32 – DETALHE DO CÁLICE NO MODELO.

FIG. 29 – SOLUÇÃO EM PILAR MISTO.

Para as bases da Megacolunas também


foram desenvolvidas soluções especiais
para que os pilares pudessem nascer no
mesmo ponto no térreo e ir abrindo em
“V” conforme a arquitetura. Foi criado um
cálice de onde saiam as duas colunas.

FIG. 33 – CÁLICE JÁ COM ARMADURA PARA RECEBER O CONCRETO.

FIG. 30 – SOLUÇÃO EM CONCRETO.

FIG. 31 – SOLUÇÃO EM PILAR MISTO.

Os pilares tinham 12,0 m de compri-


mento, 3 pavimentos, de forma que a es-
trutura era montada a cada 3 pavimentos FIG. 34 – VISÃO EXTERNA DA OBRA EM ANDAMENTO.

19
ESTRUTUR A EM DESTAQUE | AQWA CORPOR ATE

e depois disso a montagem podia avançar


para os andares superiores enquanto os
andares abaixo eram finalizados. Devido
ao efeito significativo de torção, que a for-
ma da estrutura impôs ao edifício, ficou
definido que a estrutura metálica, na sua
parte reta, de geometria regular, poderia
avançar na frente das laterais, mas as la-
terais seriam feitas de forma simultânea.
Foi dada uma atenção especial, no de-
talhamento da estrutura de concreto, em
relação a interferência da ferragem, tanto
com os inserts metálicos, que deveriam
estar rigorosamente posicionados, a fim FIG. 35 – DETALHAMENTO DO PROJETO ESTRUTURAL.
de garantir a precisão da montagem da
estrutura metálica, quanto com os cones garantir o correto posicionamento dos um comprimento de arranque que possi-
da forma trepante. chumbadores foi feito um estudo bastante bilitava a emenda por transpasse. Após a
O ponto mais importante, para a obten- detalhado de toda a ferragem que chegava concretagem da laje do primeiro subsolo,
ção de um resultado preciso na monta- no bloco como vigas, pilares inferiores, fer- foi feito um levantamento topográfico das
gem, foi a saída dos pilares no térreo. As ragem do pilar misto e chumbadores, de barras de arranque e as barras que esta-
colunas nasciam sobre blocos com 2,50m forma que houvesse inclusive uma possi- vam em posição um pouco diferente do
de altura, no caso das Megacolunas. Para bilidade de correção. Os pilares retangu- projeto, foram corrigidas através da emen-
lares dos subsolos da por transpasse. As barras das vigas,
que recebiam estes pilares e do próprio bloco foram cotadas,
blocos, embora es- em projeto, uma a uma para que a posição
tivessem detalha- fosse respeitada na execução. O resultado
dos utilizando-se foi excelente, tanto na precisão do posicio-
emendas com luva, namento quanto na velocidade de monta-
tinham também gem. Os pilares e os blocos de transição

FIG. 36 – DETALHE DO BLOCO DA MEGACOLUNA. FIG. 37 – DETALHE DO PILAR CIRCULAR.

20 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


foram concretados com fck de 60 MPa de
forma a reduzir a ferragem necessária e
consequentemente as interferências.
Outro desafio importante, para o su-
cesso da geometria da fachada, foi a
execução das abas. Havia desde o início
uma grande preocupação de como iriam
ser concretadas estas abas inclinadas.
Foram estudadas diversas soluções em
concreto moldado no local e também uti-
lizando peças pré-moldadas.
Com a adoção da estrutura mista, foi
criada uma estrutura que seria concreta-
da na horizontal e depois basculada para
a posição final. Dessa forma com o uso da
topografia seriam feitos os ajustes neces-
sários para o alinhamento de toda aba
em cada andar e após todos os ajustes
ela poderia ser solidarizada.
A estrutura do Edifício AQWA foi um
grande desafio em todos os aspectos.
Uma geometria desafiadora tanto para
as soluções estruturais quanto para a
execução. As dimensões pouco usuais
em um único pavimento, cerca de 3.500
m² com um comprimento de até 125 m,
fachadas com inclinações importantes,
levaram a soluções especiais de todas as
disciplinas envolvidas. Um marco na arte
de projetar.

* Diretora de Normas Técnicas e ex-presi-


dente da ABECE (2012-2014)

FICHA TÉCNICA
Área: 110.560 m2- Subsolos, Térreo e
Núcleo da Torre
FIG. 38 – ARMADURAS E CHUMBADORES POSICIONADOS PARA CONCRETAGEM. Concreto (50 MPa): 22.363 m3
Armadura frouxa: 3.281.382 kg
Armadura Protendida: 85.879 kg
ESTRUTURA MISTA
Aço: 4.500 ton
Concreto:
- Steel deck 35 MPa: 8.063 m3
- Pilares: 50 MPa: 1.137 m3 (AUTO
ADENSÁVEL – CONCRETAGEM
12m DE ALTURA)
80 MPa: 71 m3
Armadura frouxa: 762.624 kg
Área locável: 74.231 m2
4.806 m2 de área para lo-
jas e restaurantes
21 andares
19 pavimentos de escritórios
18 elevadores
5 pavimentos de estacionamento
com 929 vagas
4 elevadores de estacionamento,
FIGS. 39 E 40 – ESTRUTURA DA FACHADA EM SUA POSIÇÃO FINAL. 1 de emergência e 1 de serviços

21
BOAS PR ÁTICAS DE PROJE TO | CAPEL A DE SANTA LUZIA

NOVAS FUNDAÇÕES
PARA A CAPELA
DE SANTA LUZIA
AS SOLUÇÕES PROPOSTAS PARA COLOCAR A
CAPELA DE SANTA LUZIA SOBRE UM PRÉDIO DE
APROXIMADAMENTE 32 M DE ALTURA. ENTRE OUTRAS
SAÍDAS ENCONTRADAS ESTÁ A UTILIZAÇÃO DE ESTACAS
DE GRANDES DIÂMETROS COLOCADAS COM USO DE
FLUÍDO ESTABILIZANTE. ALÉM DISSO, FOI FUNDAMENTAL
O HIDROJATEAMENTO PARA REMOVER LENTA E
GRADUALMENTE A TERRA SOB A FUNDAÇÃO ORIGINAL

POR CARLOS EDUADO MOREIRA MAFFEI E


RODOLFO ANDRÊO SIMONI
1. BREVE HISTÓRICO
Certamente o mais simples a se fazer
para assegurar a preservação da capela
de Santa Luzia, localizada próxima à ave-
nida Paulista, em São Paulo – construída
há quase 100 anos e apoiada sobre funda-
ções diretas – seria a execução de quatro
paredes de contenção em seu entorno,
devidamente atirantadas, de modo a criar
o equivalente a um vaso de terra capaz
CARLOS EDUARDO de sustentar a construção existente, sem
MOREIRA MAFFEI * qualquer intervenção estrutural.
Todavia, a consequente inutilização da
área situada abaixo da capela causaria
grande impacto ao projeto arquitetô-
nico, especialmente em se tratando da
implantação de oito subsolos, haja vista
a elevada perda no número de vagas de redor da mesma, oito subsolos. Em outras
RODOLFO ANDRÊO estacionamento. palavras, o desafio era equivalente a colo-
SIMONI **
Dessa forma, com o intuito de maximizar car a capela de Santa Luzia sobre um pré-
o aproveitamento da área a ser escavada dio de aproximadamente 32m de altura.
e conseguir comportar a quantidade total
de vagas de estacionamento exigidas pela 2. ESCOLHA DAS FUNDAÇÕES
(*) Professor Doutor Carlos Eduardo Moreira
Maffei, do Departamento de Engenharia de Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), O primeiro passo consistiu na inves-
Estruturas e Geotécnica da Escola Politécni- foi proposto pelo cliente este desafio de tigação das fundações existentes da
ca da USP.
(**) Engenheiro Rodolfo Andrêo Simoni, gradua-
subfundar uma construção tombada pelo capela através da abertura de alguns
do pela Escola Politécnica da USP. patrimônio histórico e escavar, abaixo e ao pontos de inspeção. Observou-se que,

22 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


apesar do piso da construção estar na ções existentes fossem mais rasas, seria tacas que poderiam ser empregadas para
cota ~815,40m, as fundações encontra- necessário aprofundar a cota de apoio das a subfundação da capela de Santa Luzia,
das, que consistiam em sapatas corridas mesmas, o que poderia ser feito através de considerando-se a profundidade de esca-
e pequenos blocos para os pilares inter- submuração ou de estacas tipo mega. vação e a elevada competência do maciço,
nos, estavam assentes na cota ~813,00m. Uma vez definida a metodologia cons- optou-se pela utilização de estacões (es-
Tal descoberta foi uma grata surpresa, trutiva das estruturas de subfundação da tacas de grande diâmetro, escavadas com
pois percebeu-se que haveria altura sufi- capela, procedeu-se à escolha das estacas o uso de fluido estabilizante), devido aos
ciente para a construção da estrutura de de fundação (que também funcionariam seguintes fatores:
transição sem qualquer descalçamento como pilares após o início das escava- • Exequibilidade: estacões são capa-
das fundações da capela. Caso as funda- ções). Dentre as poucas tipologias de es- zes de atingir profundidades supe-

23
BOAS PR ÁTICAS DE PROJE TO | CAPEL A DE SANTA LUZIA

riores a 60m e permitem a instalação


de armadura integral, algo impres-
cindível para a obra em questão, ten-
do em vista que as estacas também
funcionam como pilares. Neste pon-
to, descartou-se a possibilidade de
uso de estacas tipo hélice contínua.
• Vibração: como a capela é estrutu-
rada, basicamente, por alvenarias
de tijolos maciços e possui grandes
vidraças, considerou-se importante
a mitigação da vibração que poderia
ser causada no maciço durante a per-
furação das estacas. Neste ponto, os
estacões levaram vantagem sobre es-
tacas tipo barrete, especialmente em
função da necessidade de trepana-
ção do “clam-shell” para a escavação
de camadas mais duras do solo.
• Desaprumos: uma vez que as esta-
cas também funcionam como pila-
res, é fundamental que os desapru-
mos sejam os menores possíveis.
Neste ponto, os estacões novamente
levaram vantagem sobre as barretes,
algo que pôde ser observado em
campo na execução das paredes de
contenção dos oito subsolos da Tor-
re (setor vizinho do empreendimen-
to Cidade Matarazzo). FIG. 1 – LOCAÇÃO DOS ESTACÕES EM RELAÇÃO À CAPELA (VISTA EM PLANTA).

24 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


Por fim, a quantidade de estacões foi
definida em função das cargas de fun-
dação calculadas pela JKMF. A capela de
Santa Luzia possui cerca de 14m de lar-
gura e 19m de comprimento, de modo
que o menor vão possível de se obter
entre as estacas de fundação foi de 16m,
conforme mostrado na Figura 1:
Em função da largura do vão e do peso
próprio do conjunto formado pela ca-
pela e pela laje de transição, as cargas
de fundação resultaram em 1900tf. No
entanto, para evitar a flambagem dos
estacões-pilares, a JKMF definiu a execu-
ção de algumas lajes intermediárias, as
quais totalizaram cargas de fundação da
ordem de 3700tf. Deste modo, optou-se
pelo emprego de oito estacões de 100cm
de diâmetro, os quais devem, ao final da
escavação, suportar um carregamento
vertical de quase 470tf.
Deve-se ressaltar que as cargas de fun-
dação acima mencionadas representam
somente uma parcela das cargas definiti-
vas (entre 32 e 63%), as quais devem con-
templar a execução dos demais subsolos e a aplicação das
sobrecargas de utilização. Dessa forma, os estacões foram
dimensionados para suportar as cargas finais como pila-
res, o que era viável em termos estruturais, mas não para
suportar tais cargas como fundações definitivas, pois não
seria possível atingir as capacidades geotécnicas deman-
dadas. Para tal, o projeto prevê a execução de blocos de
fundação direta abaixo do piso do último subsolo, os quais
devem incorporar os estacões e transferir as cargas defini-
tivas ao terreno, com tensões inferiores a 5,5 kgf/cm2.

3. DIMENSIONAMENTO GEOTÉCNICO
DAS ESTACAS
Para o dimensionamento da capacidade de fundação
dos estacões, foi considerado somente o substrato situa-
do abaixo da cota 781,00m, a qual consiste na cota de as-
sentamento dos blocos de fundação definitiva.
A estratigrafia encontrada na região da capela é mos-
trada na Figura 2:
Nota-se que há uma alternância entre camadas de ar-
gila siltosa dura e areia argilosa compacta a muito com-
pacta, ou seja, solos com elevada competência e baixa
deformabilidade.
A maior preocupação que um projeto de fundações des-
te tipo deve ter é o controle dos recalques (principalmente
diferenciais), uma vez que a estrutura da capela é bastante
antiga e relativamente frágil.
Destarte, a favor da segurança, optou-se pelo dimen-
sionamento dos estacões como estacas flutuantes, isto é,
estacas que suportam a carga de trabalho primordialmen-
te por atrito lateral (vale ressaltar que a norma brasileira
ABNT NBR 6122 exige, para estacas escavadas, um mínimo
de 80% da carga de trabalho resistida por atrito lateral). Sa- FIG. 2 – PERFIL DE SONDAGEM ADOTADO PARA OS CÁLCULOS.

25
BOAS PR ÁTICAS DE PROJE TO | CAPEL A DE SANTA LUZIA

be-se que o atrito lateral tende a ser mo-


bilizado com pequenos deslocamentos,
o que tende a minimizar a grandeza dos
eventuais recalques diferenciais.
Além da abordagem teórica, foram uti-
lizados dados obtidos de ensaios bidire-
cionais de carregamento estático realiza-
dos em estacas próximas, também com
o intuito de atender a norma brasileira
ABNT NBR 6122.
Diferentemente do ensaio estático tra-
dicional, que demanda a execução de uma
estrutura de reação para a aplicação do
carregamento gradual no topo da estaca,
o ensaio bidirecional utiliza a própria esta-
ca como elemento de reação, tornando-se
uma opção interessante para o ensaio de FIG. 3 – CURVAS “CARGAS X DESLOCAMENTOS” OBTIDAS A PARTIR DO ENSAIO ESTÁTICO
estacas com elevadas cargas de trabalho. BIDIRECIONAL DO ESTACÃO ET-095, REALIZADO EM UM SETOR PRÓXIMO À CAPELA.

DESCRITIVO DAS OBRAS


POR MINOR NAGAO E
MARIO FRANCO
INTRODUÇÃO desenvolveu este trabalho durante qua-
A Capela de Santa Luzia foi inaugurada tro anos, entre 2012 a 2017.
em 1922 nas dependências do Hospital e Foi avaliada a solução em executar a
Maternidade Umberto I, antigo Hospital estrutura suporte definitiva e deslocá-la
Matarazzo, localizada entre a Rua Itape- para outra localidade na própria área
va e a Alameda Rio Claro, nas imediações do empreendimento e posteriormente
da  Avenida Paulista, próximo ao Museu retorná-la, porém concluiu-se que por
de Arte de São Paulo-Masp. várias questões e principalmente pela lo-
A Capela, assim como a Maternidade gística e operacional esta foi descartada.
Condessa Filomena Matarazzo e edifica- A solução adotada e executada, con-
MINOR NAGAO * ções dos Hospitais estão sob o mais alto siste em uma estrutura de transição,
grau de preservação de edificações tom- idealizada pelo Prof. Dr. Mario Franco
badas como “bem cultural de interesse e pelo Prof. Dr. Carlos Eduardo Moreira
histórico-arquitetônico” em São Paulo. A Maffei, da Maffei Engenharia, consultor
preservação das fachadas é integral e in- em geotecnia.
ternamente admitida pequenas reformas.
Estas edificações farão parte do futuro CONCEPÇÃO DA ESTRUTURA
empreendimento Cidade Matarazzo, idea-
lizado pelo empresário francês Alexandre SUPORTE
Allard, dono do grupo Francês Allard. Solução adotada: consiste em estru-
MARIO FRANCO **
A Capela será integrada à grande es- tura de transição projetada no nível do
trutura de 8 subsolo, onde serão instala- alicerce que se encontrava a aproximada-
das vagas para estacionamento, espaços mente 2,00 de profundidade, permitindo
de apoio ao Hotel Jean Nouvel e uma tor- lançar vigas robustas com seguintes ca-
re comercial de 5 pavimentos. racterísticas:
Duas vigas principais paralelas, dis-
CAPELA E OITO SUBSOLOS tantes 1,00 m das paredes longitudi-
Diante da restritiva condição em utili- nais, apoiadas sobre quatro estacas
zar os oito subsolos na projeção da Cape- escavadas ø=1,00, serão lapidadas e
la foi uma das evidencias estrutural mais posteriormente transformadas em pila-
(*) Minor Nagao: Formado em 1969 - Escola de
Engenharia da Universidade Mackenzie, en- desafiante deste empreendimento. res. Estas estacas estão dimensionadas
genheiro da JKMF desde 1971, tornou sócio O autor intelectual dos estudos e con- para suportar apenas peso da Capela
em 1980 e atualmente sócio diretor.
solidação da concepção estrutural foi + transição + peso do pórtico múltiplo
(**) Mario Franco: Formado em 1951 - Escola Po-
litécnica da Universidade de São Paulo. Prof. Dr. Mario Franco, que arduamente de 5 andares. Após escavação serão

26 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


De maneira sucinta, a prova de carga bidi- didade com os estacões da capela. Nesta
recional consiste na instalação de uma ou curva, pode-se notar que o recalque da
mais células expansivas ao longo do fus- estaca foi praticamente nulo até a apli-
te da estaca e na aplicação de cargas em cação de cargas verticais da ordem de Dessa forma, adotou-se um compri-
sentidos opostos (ação e reação), buscan- 152tf. Uma vez que a resistência de ponta mento de ficha de 17m (cota de fundo:
do-se um equilíbrio entre o atrito lateral demanda deslocamentos mínimos para 764,00m) para os oito estacões da cape-
mobilizado acima do ponto de aplicação começar a ser mobilizada, pode-se dizer la, o que resultou nas seguintes capacida-
de cargas e o somatório de atrito lateral e que houve, essencialmente, apenas a mo- des estimadas de fundação:
resistência de ponta abaixo deste. bilização de atrito lateral, o que resulta em Os resultados apresentados na Tabela
A Figura 3 mostra as curvas “cargas x uma tensão de atrito admissível dada por: 1 indicam que os estacões devem mobi-
deslocamentos” obtidas no ensaio está-
tico bidirecional – para uma carga de tra- TABELA 1 – RESUMO DAS CAPACIDADES DE FUNDAÇÃO ESTIMADAS PARA OS ESTACÕES DA CAPELA.
balho de 400tf – realizado em um estacão QLATERAL,ADM
MÉTODO QLATERAL,RUP QTOTAL,RUP FSGLOBAL
próximo, o qual possui 100cm de diâme- (FSLATERAL = 1,3)
tro e cerca de 35m de comprimento: DÉCOURT & QUARESMA 596 TF 458 TF 940 TF 2,00
A curva vermelha refere-se à porção
AOKI & VELLOSO 611 TF 470 TF 878 TF 1,87
inferior ao ponto de aplicação da carga, a
PROVA DE CARGA - 461 TF - -
qual possui maior correlação de profun-

executadas as sapatas, devidamente terísticas da estrutura da capela foram não transmitir nenhum impacto nocivo
dimensionadas para as cargas rema- cuidadosamente vistoriadas e avaliadas às paredes. Prèviamente estas travessas
nescentes. através de ensaios de resistência e pros- de concreto armado, perpendiculares à
Sete vigas transversais apoiadas nas pecções. Constatou-se que as espessa parede foram executadas ao longo, em
duas principais. Estas dão condições de paredes de 30 a 50 cm de espessura não aberturas realizadas com extrator. Estes
receber todas as vigas duplas secundá- há reforço de concreto ou aço. Os tijo- elementos garantiram a transferência
rias (sanduíche) ou bloco abraçadeira e los e paredes foram classificadas de boa de carga à estrutura sem nenhuma mo-
lajes do piso. qualidade, porém para garantir total in- vimentação de acomodação “estrutura x
Transferência de carga da parede tegridade destas foi criado um elemen- parede”. A pequena deformação da es-
às novas vigas: As condições e carac- to especial inovador (travessa), visando trutura após a remoção do solo através
BOAS PR ÁTICAS DE PROJE TO | CAPEL A DE SANTA LUZIA

lizar quase que somente o atrito lateral deslocamentos à medida que as escava-
para suportar os carregamentos calcula- ções avançam.
dos pela JKMF. Além disso, tem-se fatores A Figura 4 mostra o histórico de leitura
de segurança globais superiores a 1,60, dos recalques dos quatro pinos fixados nas
respeitando-se as exigências da norma paredes da capela (um em cada canto):
brasileira ABNT NBR 6122. Até a presente data, já foram escavados
cerca de 24m de terreno abaixo da capela,
4. MONITORAMENTO com a execução de três lajes intermediá-
Como em toda obra de interação solo- rias além da laje de transição. Para esta Em função das dimensões da estrutura
-estrutura que envolve grande respon- situação, os recalques acumulados medi- de transição, a máxima distorção provo-
sabilidade, foi previsto em projeto um dos estão variando entre 2,7 e 6,0mm. cada pelos recalques diferenciais está
monitoramento semanal dos desloca- Uma vez que o recalque elástico das em cerca de 1/4500, a qual não possui
mentos verticais e horizontais do topo estacas estimado para essa fase de exe- impacto relevante na estrutura da capela
da estrutura de subfundação (base da cução é de 2,9mm, pode-se dizer que as de Santa Luzia.
capela), o qual foi realizado a partir da fichas sofreram recalques variando entre Em termos de deslocamentos horizon-
instalação de marcos reflexivos e pinos zero e 3,1mm, o que está condizente com tais, foram instalados marcos reflexivos
de recalque. Assim, com o auxílio de uma as premissas adotadas no dimensiona- no topo dos estacões, cujas leituras são
estação total, é possível acompanhar os mento geotécnico. mostradas na Figura 5:

do hidrojateameto, aparentemente não cau-


sou nenhuma patologia prejudicial.
Desafio e Desempenho: Depoimento do
Dr. Mario Franco
No Brasil, certamente é pioneiro. O que é
importante é que a capela é muito pesada e a
escavação, muito funda. Se você escava dois
andares, é uma coisa, se você escava oito…
Nunca tinha visto isso em lugar nenhum.
Haveria outras técnicas para executar a
obra sob o templo – uma delas seria colocar
trilhos sob a edificação e tirá-la do lugar, para
depois recolocá-la onde esteve nos últimos
96 anos. Ele pondera, contudo, que mantê-
-la no lugar, transferir sua fundação e cavar
abaixo dela foi a solução mais segura para a
capela. Outras obras já usaram trilhos para
mudar um edifício de lugar, mas, estudando
as várias possibilidades, a melhor, a que tinha
menos risco, sobretudo menos risco de es-
tragar a capela, foi essa.
A chave ao sucesso da empreitada abaixo
da capela a utilização dos jatos de água de
alta pressão que removeram, lenta e gradual-
mente, a terra sob a fundação original. O hi-
drojatemento eu inventei na minha cabeça,
depois de muitas noites de insônia, brinca.

METOLOGIA CONSTRUTIVA
• Execução das quatro estacas escavadas
de cada lado externo das duas paredes
longitudinais.
• Demolição do piso existente executado
sobre contra piso.

28 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


FIG. 4 – LEITURAS DOS DESLOCAMENTOS VERTICAIS DOS PINOS DE
RECALQUE DA CAPELA. FIG. 5 – DESLOCAMENTOS HORIZONTAIS DOS TOPOS DOS ESTACÕES.

Observa-se que tais deslocamentos qualquer preocupação, haja vista que os mento das trincas e fissuras que já exis-
têm variado, há vários meses, dentro de efeitos do vento foram contemplados nos tiam na capela antes da realização da
uma amplitude de 3,5mm, o que possi- cálculos da JKMF. subfundação, as quais apresentam-se
velmente tem relação com a atuação de Por fim, deve-se salientar as inspe- passivas desde a acomodação estrutu-
esforços devidos ao vento. Tal oscilação, ções visuais que são realizadas a cada ral ocorrida na etapa de transferência
no entanto, também não representa duas semanas, incluindo o monitora- das fundações.

• Escavação até o nível inferior dos alicerces


das paredes.
• Execução das vigas e lajes da estrutura do
suporte.
• Remoção das formas e escavação até 50 cm
abaixo do nível inferior dos alicerces das pa-
redes.
• Demolir as bermas por meio de hidrojatea-
mento na seguinte sequência: pilares inter-
nos, paredes internas e paredes periféricas.
• Demolir as paredes e alicerces abaixo da es-
trutura suporte.
• Escavar até o nível construtivo seguinte.
• Executar todas as fundações diretas.
• Execução da estrutura de baixo para cima.

ANDAMENTO DA EXECUÇAO
Atualmente está na final de escavação, restan-
do os 6,00 m finais surge outra questão crucial,
a transferência de carga da estaca-pilar para a
sapata. Após estudo e cálculo minucioso foi
definido um modelo que consiste em mobilizar
a força através do atrito devido a retração e da
componente vertical gerada pela superfície tron-
co de cone preparado através de escarificação
da superfíci.
A etapa seguinte se torna um processo con-
vencional de execução, porém face ao desapru-
mo das estacas-pilar, estas serão escarificadas
até uma profundidade limitada.
Prevendo esta patologia e necessidade de lapi-
dação foi previsto no projeto cobrimento maior
da armadura, tal que possibilite corte mais pro-
fundo no concreto.

29
ARTIGO TÉCNICO | AVALIAÇÃO EXPERIMENTAL DE LUVAS PAR A EMENDAS MECÂNICAS

EMENDAS POR LUVAS


EM ANÁLISE

AVALIAÇÃO EXPERIMENTAL DE LUVAS PARA EMENDAS MECÂNICAS DE BARRAS


DE AÇO EM ESTRUTURAS DE CONCRETO ARMADO

POR VICTOR GUSTAVO CHIARI E INTRODUÇÃO • Controle da propagação das fissuras


ARMANDO LOPES MORENO JUNIOR
A região das emendas de barras de aço no concreto;
é sempre tratada com atenção em todas • Melhoria da continuidade estrutural
as diretrizes, códigos de práticas e códi- entre as barras, gerando maior se-
gos normativos que especificam parâme- gurança;
tros para o dimensionamento de elemen- • Redução de mão-de-obra e o con-
tos estruturais em concreto armado. Há sequentemente custo global da es-
que se garantir, como exemplo, que estas trutura;
emendas sejam executadas de modo a • Possibilidade de união de barras de
não interferir no comportamento origi- qualquer comprimento e diâmetro.
nalmente previsto do elemento estrutu- Atualmente, é possível encontrar no
ral na região onde se localizam. mercado brasileiro uma grande varieda-
Basicamente, as emendas das barras de de luvas e, dentre as mais utilizadas,
de aço são realizadas por traspasse, por estão a de rosca cônica, parafusada,
soldagem, ou com o emprego de sis- prensada, rosqueada tipo paralela e sol-
temas mecânicos por luvas de aço. As dável. Poucas são, atualmente, as publi-
emendas mecânicas são utilizadas no cações nacionais destinadas à avaliação
Brasil desde a década de 70 e foram em- de luvas como material para emenda
pregadas em obras bastante relevantes de barras de aço, sobretudo testadas
no cenário brasileiro e internacional (usi- de maneira isolada. Mesmo no âmbito
nas nucleares Angra I e II e usina hidrelé- internacional, o tema é bastante novo e
trica de Itaipu). Entretanto, as emendas somente nos últimos 20 anos as emen-
mecânicas de barras de aço ainda são das mecânicas passaram a ser estuda-
pouco utilizadas se comparadas ao mé- das com mais frequência devido à de-
todo convencional por traspasse. manda mundial por este tipo de solução
Deve-se ressaltar a reconhecida eficá- em grandes obras de infraestrutura. Por
cia do sistema de emendas por luva que, fim, resta destacar a importância deste
têm como principais vantagens: tipo de emenda na ligação de elemen-
• Redução dos problemas de conges- tos pré-fabricados de concreto, sendo,
tionamento na armadura; inclusive, especificadas na revisão da

30 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


ABNT NBR 9062 (2017), recentemente com e sem a aplicação de luvas como ele- pesquisa, foi composta pelos ensaios de
publicada. mento de união de barras de aço, deve resistência à tração e deslizamento des-
Neste caminho, insere-se o artigo em atender os requisitos mínimos definidos tas mesmas barras emendadas mecani-
questão, detalhando os resultados e pela norma ABNT NBR 7480 (2007), ou camente, e foi procedida no Laboratório
conclusões de uma pesquisa de mestra- seja, para as barras tipo CA 50, o fy deve de Estruturas e Materiais da Universida-
do defendida em Fevereiro de 2018 na ser de 500 MPa, enquanto que o fst deve de Estadual de Campinas (UNICAMP).
UNICAMP, com o intuito de apresentar ser 540 MPa (1,08 fy). Face ao objetivo deste trabalho de ana-
ao meio técnico nacional uma necessária Apesar de não especificado no escopo lisar e comparar, de maneira abrangente,
avaliação de desempenho de alguns ti- da ABNT NBR 8548 (1984) e raramente o comportamento das barras emendadas
pos de emendas mecânicas em uso pela considerado nos projetos estruturais no por luvas frente a diferentes procedimen-
indústria da construção civil nacional e, Brasil (exceção às usinas nucleares), o tos de ensaio e instrumentação descritos
igualmente, de apresentar subsídios para deslizamento relativo entre barra e luva na literatura nacional e internacional,
discussão de procedimentos (de dimen- é igualmente importante na avaliação es- três métodos de ensaio distintos foram
sionamento e de avaliação de desempe- trutural, pois serve para aferir a tendên- empregados nos referidos ensaios das
nho em laboratório) na futura revisão da cia do deslocamento da barra de aço em barras emendadas.
norma ABNT NBR 8548 (1984), ao com- relação à luva em condições extremas
parar procedimentos indicados por esta de carregamento e, consequentemente, DIMENSÃO DAS AMOSTRAS
norma nacional com os estabelecidos por a confiabilidade da continuidade estru- Para verificação das propriedades físi-
norma internacional ISO 15835 (2009). tural. A norma internacional ISO 15835 cas e mecânicas das barras de aço em-
(2009), utilizada como referência princi- pregadas nesta pesquisa, foram seguidas
PARÂMETROS DE pal desta pesquisa, recomenda um limite as prescrições descritas na norma nacio-
máximo de deslizamento de 0,10 mm. O nal ABNT NBR 6152 (2002) e ABNT NBR
DESEMPENHO DA EMENDA valor limite prescrito para o deslizamento 7480 (2007), inclusive no que diz respeito
MECÂNICA está relacionado, também, ao controle ao tamanho das amostras.
A avaliação de desempenho do siste- da fissuração do concreto na região da A norma nacional ABNT NBR 8548
ma mecânico de emenda de barras de emenda. (1984) especifica que a barra de aço deve
aço no Brasil deve seguir o padrão esta- ser separada em três segmentos distin-
belecido pela ABNT NBR 8548 (1984) que, PROGRAMA EXPERIMENTAL tos (l1 e 2l) de acordo com a Figura 1,
vale ressaltar, carece de revisão, inserin- O programa experimental desta pes- devendo-se avaliar o desempenho me-
do parâmetros e metodologias de ensaio quisa teve por premissa a avaliação dos cânico de barra isolada de comprimento
de desempenho específico para os vários procedimentos propostos na ISO 15835 l1, cuja dimensão minima deve ser 1000
tipos de luvas atualmente em uso na in- (2009) à luz dos procedimentos nacionais mm, e da barra emendada de compri-
dústria da construção civil nacional. da ABNT NBR 8548 (1984), com instru- mento 2l. Destaca-se que os comprimen-
Internacionalmente, dentre as mais uti- mentação adaptada segundo indicações tos dos seguimentos de barra indicados
lizadas na avaliação do desempenho de constantes em Haber et al. (2015) e Ngu- dependem, unicamente, do diâmetro
emendas mecânicas de barras de aço, yen & Mutusuyoshi (2015), para emendas da barra de aço (d) por avaliar e, desta
encontra-se a ISO 15835 (2009) que, em- mecânicas de barras de aço com luvas maneira, são independentes do tipo de
bora bem mais completa que a equiva- de rosca cônica e parafusadas de 20 e 25 emenda empregado.
lente nacional, ainda carece de melhorias mm de diâmetro. De maneira similar, a dimensão das
no que concerne ao padrão de instru- Os ensaios de caracterização das bar- amostras de barras emendadas, segun-
mentação dos modelos na obtenção de ras de aço antes de emendadas, aqui do recomendação da norma internacio-
parâmetros de desempenho desejados. denominadas “barras de controle” (BC), nal ISO 15835 (2009) (Figura 2) deve ser
Neste sentido, ressalta-se a adaptação foram procedidos no Laboratório de Ma- calculada em função do diâmetro da
nesse padrão de instrumentação pro- teriais de Construção e Concreto do Ins- barra, d, a ser emendada. Entretanto,
posta por Haber et al. (2015) e Nguyen & tituto Militar de Engenharia (IME) no Rio o comprimento da luva (L1) empregada
Mutusuyoshi (2015). de Janeiro. A segunda parte do programa deve ser considerado no cálculo deste
Dois parâmetros de desempenho são experimental, e objeto principal desta segmento.
essenciais na avaliação dos sistemas
mecânicos de emenda de barras de aço:
resistência à tração (resistência ao escoa-
mento, fy, e limite de resistência à tração,
fst) e deslizamento relativo entre barra
e luva. O valor mínimo requerido para a
resistência ao escoamento de uma bar-
ra unida por emenda mecânica é aque-
le prescrito pela ABNT NBR 8548 (1984),
que estabelece que os resultados obti- FIG. 1 – AMOSTRA PARA ENSAIO DE QUALIFICAÇÃO DE EMENDAS MECÂNICAS, MODIFICADO DA
dos nos ensaios de resistência à tração, ABNT NBR 8548 (1984)

31
ARTIGO TÉCNICO | AVALIAÇÃO EXPERIMENTAL DE LUVAS PAR A EMENDAS MECÂNICAS

no caso das barras desta pesquisa) e,


então, descarregada. Após a determina-
ção do parâmetro deslizamento relativo,
as amostras foram carregadas até sua
ruptura para a determinação dos parâ-
metros de resistência à tração e conse-
quente aferição.
FIG. 2 – DIMENSÕES DA AMOSTRA PARA AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DE EMENDA MECÂNICA,
MODIFICADA DA ISO 15835 (2009)
RESULTADOS E ANÁLISES
A Tabela 1 apresenta os resultados da
ENSAIOS DE aço, e compará-la com a deformação da resistência ao escoamento, fy, e o limite
própria luva, durante o ensaio. Como ins- de resistência à tração, fst, das barras de
CARACTERIZAÇÃO DAS trumentos de medição adicionais e com controle, enquanto a Tabela 2 exibe os
BARRAS DE AÇO SEM EMENDA o intuito de aferir o deslizamento relativo resultados destes mesmos parâmetros
(BARRAS DE CONTROLE) entre barra e luva, em cada ensaio, foram para as barras emendadas mecanica-
ainda posicionados transdutores de des- mente com luvas, além do valor do des-
Através da metodologia proposta pela locamento. Aos Métodos 1 e 2, os trans- lizamento relativo entre barra de aço e
ABNT NBR 6152 (2002), foram ensaiadas dutores foram dispostos individualmente luva de emenda. Todas as amostras ava-
seis barras de aço tipo CA 50, sendo três e conectados diretamente à nervura da liadas, com e sem emendas mecânicas,
de 20 mm e outras três de 25 mm de diâ- barra de aço e à emenda mecânica, en- atingiram a resistência ao escoamento,
metro, de maneira isolada, com a finalida- quanto que ao Método 3 os transduto- fy, mínima de 500 MPa, assim como o li-
de de caracterizá-las com relação ao seu res foram montados em grupos de três, mite de resistência à tração, mínimo, fst,
alongamento e estricção, além de verificar atrelados a um aparato especialmente de 540 MPa, ambos os valores estabele-
se estavam de acordo com os valores mí- desenvolvido para a presente pesquisa. cidos pela ABNT NBR 7480 (2007).
nimos da resistência ao escoamento, fy, e Para a aferição do parâmetro desliza-
Tabela 1 – Resultados dos
limite de resistência à tração à tração, fst mento relativo entre barra e emenda,
ensaios de caracterização
impostos pela ABNT NBR 7480 (2007). A neste trabalho foi adotada a recomenda-
das barras de controle.
instrumentação das barras de controle foi ção da ISO 15835 (2009), adaptada pela
Escoamento Limite
realizada instalando-se dois extensôme- DS-G-6647-029202 (2011), que estabe-
Ensaio - fy último - fst
tros elétricos exatamente no centro das lece o limite máximo de deslizamento
(MPa) (MPa)
barras, em lados opostos, com a finalidade de 0,10 mm. A aferição deste parâmetro
BC-20mm-1 555 659
de medir a deformação da barra de aço, ocorreu ao final de um ciclo de carga (Mé-
neste ponto central, ao longo do ensaio. todo 1) ou ao final de três ciclos de carga BC-20mm-2 555 655
(Métodos 2 e 3) da barra emendada. Em BC-20mm-3 540 671
BC-25mm-1 545 638
ENSAIOS PRINCIPAIS: cada ciclo a amostra foi carregada até a
BC-25mm-2 542 663
tensão nominal de serviço especificada
COMPORTAMENTO À TRAÇÃO para a barra de aço emendada (300 MPa, BC-25mm-3 550 716
DAS BARRAS COM EMENDAS
MECÂNICAS
Foram realizados três ensaios para
cada diâmetro, tipo de luva e método de
instrumentação empregado, totalizando
trinta e seis ensaios, que tiveram como
finalidade medir a resistência à tração e o
deslizamento das amostras com emendas
mecânicas. Apesar da norma Brasileira
ABNT NBR 8548 (1984) não especificar o
parâmetro de deslizamento em seu esco-
po, este foi medido em todos os ensaios.
Como sugerido por Haber et al. (2015)
e Nguyen & Mutusuyoshi (2015), em cada
barra emendada foram instalados quatro
extensômetros elétricos, dois deles na
barra de aço a uma distância de 2d das
faces externas da luva e dois no centro da
própria emenda mecânica com a finalida- FIG. 3. A - CURVAS FORÇA VERSUS DEFORMAÇÃO DOS ENSAIOS DAS EMENDAS MECÂNICAS.
de de medir a deformação da barra de A-RC-20MM, B-RC-25MM, C-PAR-20MM E D-PAR-25MM

32 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


Tabela 2 – Resultados dos ensaios de barras de aço luva após rompimento dos frisos da rosca
com emenda mecânica rosqueada tipo cônica. pela combinação de tensões de flexão e
Escoamento - fy Limite último - fst Deslizamento cisalhamento. Quanto às luvas parafusa-
Ensaio Método das, verifica-se claramente a ocorrência
(MPa) (MPa) (mm)
de ruptura dos parafusos da emenda por
RC-20mm-1 528 641 0,10
cisalhamento. A Figura 4 e Figura 5 ilus-
RC-20mm-2 Método 1 536 648 0,10 tram, respectivamente, o modo típico de
RC-20mm-3 535 641 0,02 ruptura observado para as emendas com
RC-20mm-4 541 646 0,11 luvas rosqueadas e parafusadas.

RC-20mm-5 Método 2 541 633 0,02


RC-20mm-6 535 630 0,12
RC-20mm-7 541 635 0,03
RC-20mm-8 Método 3 – 637 0,02
RC-20mm-9 533 637 0,00
RC-25mm-1 565 702 0,03
RC-25mm-2 Método 1 553 688 0,05
RC-25mm-3 570 693 0,01
RC-25mm-4 566 682 0,03
RC-25mm-5 Método 2 567 677 0,28
RC-25mm-6 556 675 0,10
RC-25mm-7 565 681 0,02
RC-25mm-8 Método 3 565 679 0,01
RC-25mm-9 565 674 0,03
PAR-20mm-1 532 621 0,02
PAR-20mm-2 Método 1 535 649 0,07 FIG. 4 – DETALHE PÓS-RUPTURA DE BARRA
EMENDADA COM LUVA DE ROSCA CÔNICA
PAR -20mm-3 532 657 0,01
PAR -20mm-4 535 627 0,05
PAR -20mm-5 Método 2 532 605 0,15
PAR -20mm-6 535 653 0,19
PAR -20mm-7 533 654 0,01
PAR-20mm-8 Método 3 538 641 0,05
PAR -20mm-9 616 710 0,02
PAR -25mm-1 559 670 0,10
PAR -25mm-2 Método 1 560 661 0,10
PAR -25mm-3 559 693 0,07
PAR -25mm-4 558 667 0,14
PAR -25mm-5 Método 2 564 640 0,30
PAR -25mm-6 564 704 0,05
PAR -25mm-7 565 672 0,07
PAR -25mm-8 Método 3 564 642 0,06
PAR -25mm-9 556 646 0,06
FIG. 5 – DETALHE PÓS-RUPTURA DE BARRA
A Figura 3 ilustra a evolução das defor- ensaiada (20 e 25 mm) e, posteriormente, EMENDADA COM LUVA PARAFUSADA
mações específicas, em função da força, pelo número da amostra ensaiada. Nota-
nas barras emendadas denominadas -se comportamento esperado das defor- No que tange o parâmetro deslizamen-
como RC-20mm (Figura 3A), RC-25mm mações nas barras e luvas. to, da maneira como proposto, e com base
(Figura 3B), PAR-20mm (Figura 3C) e PAR- A ruptura das barras emendadas ocor- nas prescrições estabelecidas pela norma
-25mm (Figura 3D), sendo “RC” corres- reu, quase que em sua totalidade, na re- internacional ISO 15835 (2009), e no do-
pondente às luvas rosqueadas tipo côni- gião da emenda, sem afetar, contudo, a in- cumento interno da Eletrobrás Eletronu-
ca e “PAR” às luvas parafusadas, ambas tegridade das luvas avaliadas. No caso das clear, DS-G-6647-029202 (2011), 83% das
sucedidas pelo diâmetro da barra de aço luvas rosqueadas, a barra é arrancada da amostras analisadas apresentaram valo-

33
ARTIGO TÉCNICO | AVALIAÇÃO EXPERIMENTAL DE LUVAS PAR A EMENDAS MECÂNICAS

res de deslizamento inferiores ao limite caso de emendas com luvas deve-se parâmetro deslizamento e seu res-
máximo de 0,10 mm. As amostras que considerar o comprimento da luva pectivo método de ensaio.
estavam em desacordo com as normas e o diâmetro da barra de aço. Por- Conclusivamente, este artigo possui,
supracitadas tiveram seus procedimentos tanto, propõe-se que procedimento portanto, a intenção de contribuir com o
de ensaio baseados no Método 2 de en- similar ao da ISO 15835 (2009) seja conhecimento das premissas e requisitos
saio, ou seja, utilizaram transdutores indi- devidamente apreciado e posterior- necessários para o desenvolvimento de no-
viduais para a medição do deslizamento, mente implementado na futura revi- vos estudos experimentais que envolvam
medido ao final de três ciclos de carrega- são da ABNT NBR 8548 (1984). as emendas mecânicas, além de oferecer
mento. Os valores finais de deslizamentos 3. O uso de extensômetros elétricos subsídios para discussão de procedimentos
obtidos, muito diferentes, evidenciam, cla- em vários pontos da amostra foi de de avaliação de desempenho e instrumen-
ramente, eventuais problemas em relação grande importância para registro tação de luvas de aço nas futuras revisões
à instrumentação utilizada. das leituras de deformação e, con- da norma brasileira ABNT NBR 8548 (1984).
Considerando que o tipo de instalação sequentemente, de garantia de com-
dos transdutores, conectados individual- portamento mecânico adequado, na REFERÊNCIAS
mente à barra emendada, é o mesmo nos pretendida avaliação de desempe- ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS
Métodos 1 e 2, pode-se concluir que este nho do sistema de emenda mecâni- TÉCNICAS NBR 8548 – Barras de aço des-
tipo de conexão pode estar sujeito a even- co de barras de aço para concreto. tinadas a armaduras de concreto armado
tuais movimentações dos transdutores ao 4. O procedimento de ensaio denomi- com emenda mecânica ou por solda – De-
final de cada ciclo de carga. Já os ensaios nado neste trabalho como “Método terminação da resistência à tração, Rio de
pelo Método 3, empregando aparato es- 3”, com instrumentação baseada Janeiro, 1984.
pecial para medição dos deslizamentos, em Haber et al. (2015) e Nguyen & ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉC-
resultou em valores de idênticos de des- Mutusuyoshi (2015), mostrou-se NICAS NBR 6152 – Materiais metálicos –
lizamento ao final de cada ciclo de carre- bastante eficiente para a obtenção Ensaio de tração à temperatura ambiente,
gamento da barra emendada. Este resul- dos parâmetros de interesse: resis- Rio de Janeiro, 2002.
tado só seria possível, caso não existisse tência à tração e deslizamento. Com ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉC-
nenhuma movimentação dos transduto- a inserção de quatro extensôme- NICAS NBR 7480 – Aço destinado a arma-
res ao final de cada ciclo de carga, o que tros elétricos, sendo dois nas barras duras para estruturas de concreto arma-
pode comprovar a eficiência do Método 3 de aço e outros dois nas luvas de do - Especificação, Rio de Janeiro, 2007
de ensaio proposto. emenda, além dos transdutores de ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉC-
deslocamento, em grupo de 3 e co- NICAS NBR 9062 - Projeto e execução de
CONCLUSÕES nectados a um aparato especial, foi estruturas de concreto pré-moldado. Rio
1. Em conformidade com os resultados possível monitorar minuciosa e de- de Janeiro, 2017.
do programa experimental desen- talhadamente deformações e desli- ELETROBRÁS ELETRONUCLEAR - Docu-
volvido nesta pesquisa, entende-se zamentos nas amostras ao longo de mento n° DS-G-6647-029202, 2000, 25 p.
que as emendas mecânicas por luvas todo o ensaio. HABER, Z.B., Saiidi, M.S., Sanders, D.H. Beha-
de rosca cônica e parafusadas esta- 5. Quanto ao número de ciclos de carga, vior and simplified modeling of mechanical
riam aptas a serem utilizadas como a constância nos resultados de des- reinforcing bar splices. ACI Structural Jour-
solução para prover continuidade e lizamento, ao final de cada um dos nal March/April 2015, 179-189 pp.
integridade estrutural em constru- três ciclos, obtidas para o Método 3 INTERNATIONAL ORGANIZATION STANDA-
ções de concreto armado, uma vez de ensaio, pode indicar a suficiência RIZATION. Steel for the reinforcement and
que seu comportamento atendeu de apenas 1 ciclo de carga para a prestressing of concrete - Test methods -
a todas as prescrições normativas obtenção do deslizamento final. En- Part 1: Reinforcing bars, wire rod and wire.
pré-estabelecidas. É importante re- tretanto, este fato deve ser melhor ISO 15630-1. Genebra, Suiça, 2009.
gistrar que essas constatações são avaliado em trabalhos futuros, onde INTERNATIONAL ORGANIZATION STANDARI-
limitadas ao experimento realizado outros tipos de emendas mecânicas ZATION. Steels for the reinforcement of con-
e aos materiais empregados nesta e outros diâmetros de barras emen- crete — Reinforcement couplers for mecha-
pesquisa. A generalização das con- dadas devem ser ensaiados. nical splices of bars — Part 2: Test methods.
clusões só é possível com a conti- 6. De maneira efetiva, a norma ABNT ISO 15835-2. Genebra, Suiça, 2009.
nuidade dos estudos, envolvendo NBR 8548 (1984) está defasada e LENTON Taper Threaded Rebar Splicing Sys-
obviamente outros tipos de luvas de necessita de revisão quanto aos tems, Cleveland, EUA, 2011, 20 p.
aço disponíveis no Brasil (prensada, processos de ensaio e parâmetros LENTON LOCK Especificação Técnica Cleve-
rosca paralela, soldável, etc.). de interesse a serem obtidos. Re- land, EUA, 2011, 1 p.
2. Apesar de não ter sido um parâme- comenda-se, portanto, considerar NGUYEN, D. P., MUTSUYOSHI, H. Influence
tro de avaliação neste trabalho, é em seu escopo todos os métodos e of Quality of Mechanical Splices on Beha-
de suma importância que o compri- tipos de emenda de barras de aço vior of Reinforced Concrete Members. Re-
mento efetivo de ensaio da amostra em estruturas de concreto armado search Report of Department of Civil and
emendada seja baseado no tipo de disponíveis no cenário nacional, in- Environmental Engineering, Saitama Univ.,
emenda a ser avaliado, ou seja, no cluindo em uma futura revisão, o Vol.41, 2015, 32-43 pp.

34 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


35
CASE INTERNACIONAL | PROJETO ESTRUTUR AL CONTEMPLOU RISCOS SÍSMICOS

OS DESAFIOS DA
PONTE CHACAO

INICIADO NOS ANOS DE 1970, O PROJETO DA PONTE SOBRE O CANAL DE CHACO,


NO CHILE, VENCEU VÁRIOS DESAFIOS DE ENGENHARIA E DE OUTRAS NATUREZAS E
COMEÇOU A SE MATERIALIZAR NO INÍCIO DE 2018, COM AS OBRAS DO PILAR CENTRAL

POR MATÍAS A. VALENZUELA SAAVEDRA RESUMO


MARCELO MARQUEZ MARAMBIO
LEONARDO MUÑOZ ROCA A crescente expansão urbana nas maiores áreas metropolitanas do México está
começando a ter um impacto negativo na forma com que as pessoas trabalham e
vivem. O desejo de estar mais perto do trabalho e das amenidades públicas resulta
da necessidade de construções mais altas em centros urbanos. Muitas cidades no
México estão vendo um aumento no número de edifícios altos, inclusive Monterrey, a
segunda maior cidade do país, em termos econômicos. A Torre Koi, um arranha-céu de
uso misto em Monterrey, com seus 279,5 metros de altura, se tornou o edifício mais
alto do México, é um exemplo recente dessa tendência.
Até um terremoto de pequena intensidade ter sido sentido em 2013, Monterrey era
considerada como uma região livre de abalos sísmicos. O código local de construção
em Monterrey não cobre o projeto de estruturas resistentes a terremotos, sem falar
do projeto sísmico de edifícios altos. A equipe de projeto consultou o Manual de Diseño
de Obras Civiles (Manual da Comissão Federal de Eletricidade - CFE) com relação aos
procedimentos relativos aos projetos de prevenção contra abalos sísmicos como uma
maneira prudente de abordar terremotos em potencial. Foi realizado um estudo com
o uso de um túnel de vento para o projeto do edifício. Este artigo vai abordar os proce-
dimentos do projeto empregado no sistema estrutural virtual do núcleo de concreto
de alta resistência utilizado no edifício mais alto do México.
Palavras-chave: Edifícios Altos; Projeto em Túnel de Vento; Sistema Estrutural de Estabili-
zação Virtual; Concreto de Alta Resistência.

1 – INTRODUÇÃO 1.000 km da capital Santiago. Esse ob-


Os estudos do projeto da ponte so- jetivo começou a se materializar, após
bre o Canal de Chacao foram iniciados muitos anos de avaliações e alternati-
na década de 1970 com um objetivo cla- vas, no ano de 2011 com a reavaliação
ro: unir a Ilha Grande de Chiloé com o do projeto e definição da tipologia da
Chile continental, localizado a mais de estrutura como uma ponte suspensa

36 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


com muitos vãos assimétricos, com
três pilares e um comprimento total de
2.750 metros.

2 – PROCESS5O DE
LICITAÇÃO DO PROJETO
O Projeto vai se materializar através de FIG. 1 – VISTA ESQUEMÁTICA DA PONTE
três contratos e suas respectivas Asses-
sorias de Inspeção: A fundação do pilar central (em cons- co código de projeto que englobe todos
• Projeto e Construção da Ponte Cha- trução durante o ano de 2018) consta os aspectos da estrutura. Justamente
cao, acessos imediatos e área de ser- de 36 pilotis de concreto armado de por isso foi gerado um Manual de Projeto
viços (administrado pela Dirección 2,65 metros de diâmetro de ou com um próprio para a Ponte Chacao, baseado no
Nacional de Vialidad). revestimento de aço permanente que AASHTO LRFD, Manual de Estradas (códi-
• Construção do Acesso Sul (adminis- oferece resistência estrutural e recobre go chileno para pontes) e complementa-
trado pela Departamento Regional o elemento. Essa fundação contempla do com normas e estudos que abrangem
de Estrada). um volume de concreto que supera as condições particulares do projeto e
• Construção do Acesso Norte (admi- 9.500 metros cúbicos e cerca de 1.700 seu entorno.
nistrado pela Coordenadoria de Con- toneladas de aço. O Pilar Sul, por outro Os objetivos do projeto são a seguran-
cesões de Obras Públicas). lado, contempla a utilização de mais ça, funcionalidade, viabilidade de cons-
Na data de 4 de novembro de 2013 de 3.600 metros cúbicos de concreto e trução e estética da ponte. Para esses
foi realizado o recebimento das ofer- 300 toneladas de aço, enquanto que o objetivos é considerada uma vida útil de
tas técnicas e econômicas, tendo sido Pilar Norte será formado por 5.300 me- 100 anos.
recebida apenas uma oferta. Tendo tros cúbicos de concreto e 850 tonela- O processo do projeto seguiu o seguin-
sido qualificada tecnicamente a ofer- das de aço. te esquema:
ta recebida, na data de 9 de dezem- A ponte terá uma placa ortotrópica • Requisitos de projeto proporciona-
bro de 2013 foi realizada a abertura do tipo caixa com 4 pistas de circulação dos pelas Bases de Licitação (BALI).
econômica dessa oferta, resultando com uma largura mínima de 3,5 metros • Requisitos de códigos de projeto
em um valor de $360.134.000.000 e cada uma (Figura 2). As estruturas de an- AASHTO e Manual de Estradas.
por um prazo de 2.379 dias. Tanto o coragem norte e sul terão um volume de • Execução de Engenharias Básicas:
orçamento quanto o prazo oferecido concreto armado de 26720 [m3] e 24212 Estudos de vento, Estudos sísmicos,
cumprem rigorosamente os requisitos [m3], respectivamente. Topografia, Batimetria, entre outros.
estabelecidos nas Bases da Licitação. • Elaboração de Manual de Projeto.
O contrato “Contrato e Construção da • Elaboração de Especificações Técni-
Ponte Chacao – Região dos Lagos” con-
4 – PROCESSO DO cas.
siste no projeto e a construção de uma PROJETO • Desenvolvimento de Análise Global:
ponte suspensa entre o continente e a Por tratar-se de uma ponte singular de Análise estática e dinâmica, Análise
Ilha de Chiloé. Além disso, contempla grande envergadura, não existe um úni- de vento, entre outros.
a construção dos Acessos Imediatos,
do Edifício Mirador e de Operações.
O projeto foi concedido ao Consórcio
OAS-HYUNDAI-SYSTRA-A AS JAKOBSEN
(CPC). A data de início do contrato foi
18 de fevereiro de 2014.

3 – DESCRIÇÃO DO
PROJETO
A Ponte Chacao apresenta trechos de
acesso de 339 metros no Acesso Norte e
140 metros no Acesso Sul, além de dois
vãos centrais de 1.155 e 1.055 metros nos
dois lados norte e sul, respectivamente.
Além disso, considera a construção de 3
pilares com alturas de 157 metros (Pilar
Sul), 175 metros (Pilar Central) e com 199
metros (Pilar Norte). FIG. 2 – DISPOSIÇÃO DE CALÇADAS, ACOSTAMENTOS E POSTES DE ILUMINAÇÃO
DA PONTE CHACAO
(Ver Figura 1).

37
CASE INTERNACIONAL | PROJETO ESTRUTUR AL CONTEMPLOU RISCOS SÍSMICOS

• Desenvolvimento de documentos de nicos avançados) foram realizadas nas • Avaliação determinística do risco,
projeto: Projeto geotécnico, Projeto amostras de solo recuperado em amos- considerando o cenário sísmico da
definitivo, Análise estrutural de ele- tras de rocha. Falha do Golfo de Ancud
mentos, entre outros. • Registros de tempo de rocha para
5.4. Estudos de erosão análises sísmicas
e escavação • Análise 1D de resposta do local
5 – ENGENHARIAS O objetivo principal dos Estudos de • Análise 2D de resposta do local
BÁSICAS Erosão e Escavação é estimar a escava- • Impedâncias dinâmicas y movimen-
ção e a erosão ao longo do fundo maríti- tações de entrada para fundações
5.1. Topografia mo onde serão construídos os pilotis dos • Seleção de históricos de tempo para
Com a finalidade de estabelecer um pilares Norte e Central. cenários específicos de terremotos
prazo para o Projeto e obter a situação Para esse fim, foi realizado um estudo • Duração efetiva para análise de re-
real do terreno em que será construído hidrodinâmico da área do Canal de Cha- gistro de tempo sísmico no linear -
o projeto, o CPC realizou um Sistema cao para diferentes cenários de corren- SMP
de Transporte de Coordenada (CTS), de tes de maré e eventos extremos. Foi de- Parte 3 – Projeto e avaliação sísmica geo-
acordo com o Manual de Estradas Vol. 2 terminada a magnitude desses campos a técnica:
e as Bases Técnicas, o qual foi aprovado partir de simulações numéricas realiza- • Forças de interação cinemática dos
pelo Ministério de Obras Públicas. das com o código livre OpenFOAM. pilotis e forças internas – Pilar central
Com esse CTS, o CPC estabeleceu um e Pilar Norte.
sistema de coordenadas geodésicas e 5.5. Estudos geológicos • Estabilidade de taludes sob cargas
uma rede de pontos topográficos em Os estudos geológicos proporcionam sísmicas.
PTL. Com isso, o CPC realizou levanta- o antecedente do Informe de Interpre- • Blocos de ancoragem – Acelerações
mentos topográficos das áreas impor- tação Geotécnica no que se refere à ma- máximas sob o Sismo Máximo.
tantes do projeto e foram feitos planos neira com que a área atual do projeto foi • Impedâncias de fundação sob cargas
topográficos com curvas de nível e perfis formada e o estudo de Erosão e Escava- • Deslocamentos permanentes devido
longitudinais e transversais. ção nas áreas dos Pilares Norte e Cen- à Falha do Golfo de Ancud
tral, no que se refere às características
5.2. Batimetria do fundo marítimo onde serão construí- 5.7. Estudos de vento
Para a coleta de dados, mediante um dos os pilares. Para os estudos de vento, o CPC levou
mareógrafo localizado em Punta Co- Foram realizadas pesquisas dos es- a cabo medições de vento em três esta-
ronel, foram realizados os modelos do tudos prévios, levantamentos multiface ções climáticas, nas proximidades das lo-
fundo marítimo, e segundo normativa e 3D detalhados e subsequentes levanta- calizações dos Pilares Norte e Sul e perto
as especificações do SHOA, o CPC exe- mentos ROV, e exames da escavação re- da Roca Remolinos, onde foi construído
cutou uma Batimetria Geral de Precisão cente das sondagens de 2015 por parte o Pilar Central. Além disso, foram consi-
dentro da faixa de expropriação onde de um geólogo projetista de CPC. derados também os dados de vento com
será construída a ponte, e três batime- Os principais pontos estudados foram: longa história, medidos no Aeroporto El
trias multiface de controle na localização • Modelo geomorfológico: Tepual e no Farol Corona, que estão loca-
dos pilares Norte e Central e ao longo do • Modelo Geológico: lizados perto do lugar.
eixo longitudinal da ponte. • Erosão
• Rebaixamento da Roca Remolinos 5.8. Túnel de vento
5.3. Estudos geotécnicos • Falha no Golfo de Ancud (FGA) Foram realizadas as seguintes provas
O objetivo dos Estudos Geotécnicos é de túnel de vento de seções e da ponte
oferecer os resultados das campanhas 5.6. Estudos sísmicos em escala completa em um laboratório
geotécnicas para caracterizar os mate- Os estudos sísmicos foram divididos Coreano:
riais do subsolo na localização do pro- em três tópicos principais: • modelo topográfico
jeto (Informe Geotécnico Fático), e ofe- Parte 1 – Medições e instrumentação • modelo de seção preliminar da placa
recer informações para definir as curvas sísmica: Oito estações de sismômetros • modelo de seção da placa
p-y, os parâmetros de resistência ao e três acelerômetros. A partir dessas • modelo de tela de vento
corte, o comportamento e os parâme- medições são obtidos dados desde o • modelo de seção do pilar
tros de deformação do solo sob carga início do contrato. • modelo aeroelástico do pilar
dinâmica para a análise sísmica (Informe Parte 2 – Dados sísmicos de entrada • modelo completo da ponte
Geotécnico Interpretativo). para Análise e Projeto: • modelo do cabo do pêndulo
A campanha geotécnica foi realizada • Análise probabilística de risco para o
pelo CPC (Fugro) de fevereiro a setembro projeto da ponte de canal de Chacao 5.9. Estudos marítimos
de 2015. A campanha de pesquisa consis- (Chile) Os estudos marítimos da estimativa
tiu de pesquisas geotécnicas com testes • Avaliação qualitativa do risco vulcâni- das condições do meio ambiente para o
in situ. As provas de laboratório (ensaio co para o projeto da ponte do Canal projeto da ponte são:
de índice, ensaios mecânicos e mecâ- de Chacao • Modelo de maré

38 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


• Modelo de tsunami que ultrapassam os parâmetros tradicio- a atuação do sistema de redução da
• Modelo de onda nais para projetos de pontes. umidade relativa para o fluxo de ar seco.
Junto a essas disposições, outro ponto
5.10. Estudos de temperatura Projeto Sísmico: importante a considerar é a manutenção
Os dados de temperatura para o lu- Devido à alta ocorrência de sismos no dos elementos que não serão projetados
gar derivam de medições realizadas nas Chile, a presencia da Falha do Golfo de para ter uma vida de serviço de 100 anos,
proximidades do lugar, Puerto Montt Ancud (FGA) e as características topográ- contemplando no projeto e na estrutura-
(Aeroporto El Tepual) e Ancud (Pulpede). ficas abruptas no espaço de localização ção a fácil manutenção e substituição de
Foi adaptada a função de densidade acu- da ponte, foram realizados estudos de tais elementos.
mulativa de Gumbel às medições. A par- risco sísmico probabilístico e determinís-
tir daí, foram estimadas as temperaturas tico para verificar a demanda sísmica na Viabilidade de Construção:
máxima e mínima com um período de re- fase de construção e no período de vida Devido à particularidade de ter uma
torno de 100 anos. útil da ponte. ponte suspensa de grandes luzes, três pi-
O projeto sísmico foi baseado no lares e assimétrica (a maior nesse estilo)
5.11. Análise de risco AASHTO LRFD, considerando um sismo isso implica em desafios construtivos em
Foi analisado o período de retorno das de projeto com 10% de afastamentos em nível mundial. Adicionalmente, as condi-
seguintes fontes de risco: 100 anos (período de retorno de 1.000 ções particulares do terreno e as caracte-
• Colisão de nave anos) e uma categoria de importância de rísticas ambientais da zona representam
• Colisão de veículos ponte essencial. complexos ainda maiores nas obras de
• Fogo Cabe indicar que, para conseguir construção.
• Explosão maior robustez estrutural, foi utilizada Foi com o objetivo de assegurar a ade-
• Colisão de aeronaves a metodologia de projeto elástico, con- quada qualidade das obras e obedecer
siderando aquelas zonas de possíveis aos prazos estabelecidos, que o contrato
rótulas plásticas, um fator de seguran- foi gerido como projeto e construção uni-
6 – PRINCIPAIS DESAFIOS ça para uma falha frágil (Brittle Failure dos, de maneira a considerar os aspectos
TÉCNICOS Factor) de 1,4, além de considerar um de viabilidade da construção no projeto.
Os principais desafios técnicos que o adequado detalhamento sísmico nas re- Por outro lado, foi elaborado um docu-
projeto apresentou consideram os se- feridas zonas. Foi realizada uma análise mento de metodologia construtiva, que
guintes aspectos: não linear Pushover para determinar as demonstrará que os elementos projeta-
zonas de rótulas plásticas. dos podem ser construídos adequada-
Experiência: mente nos prazos acordados.
No Chile se tem muito pouca experiên- Durabilidade: Complementarmente, foram empre-
cia sobre pontes suspensas de grandes Este tema não é tratado no Manual gados variados software que geralmen-
luzes. Até o dia de hoje existem 42 estru- de Estradas, nem na Normativa chilena te são utilizados para pontes singulares,
turas suspensas no país, e somente 10 INN. No entanto, é um ponto importan- que permitiram fazer estudos de análise
delas excedem os 100 m de luz principal, te a considerar na ponte, devido à vida estrutural estática, dinâmica, push over,
sendo a maior delas a ponte Presidente útil projetada de 100 anos. A durabili- bem como estudo de solo e interação
Ibáñez, com 210 m de luz. Para contornar dade foi considerada como um ponto com a estrutura.
esse problema foi contratada uma Asses- essencial no projeto, onde são identi-
soria Técnica reconhecida mundialmente ficados os mecanismos potenciais de
no projeto de pontes singulares de gran- deterioração. Levou-se também em
7 – COMENTÁRIOS FINAIS E
des luzes. conta o efeito dos agentes agressivos ESTADO ATUAL DO PROJETO
Foram realizadas reuniões de coorde- que podem provocar a deterioração do Dentro do projeto já estão totalmente
nação e consenso técnico entre o Con- concreto (tanto externo quanto interno) terminados os acessos viários que ligam
sórcio Puente Chacao (CPC), a Assessoria e os mecanismos que podem conduzir à rota Panamérica (Rota 5) tanto no lado
de Inspeção Fiscal (AIF) e o Ministério de à corrosão do reforço. Dessa maneira da ilha de Chiloe como no continente.
Obras Públicas (MOP). Como tais reu- serão utilizadas proteções necessárias As obras temporais de apoio à logística
niões são mensais, são realizadas outras, dos elementos de concreto para garan- construtiva (cais de acesso na zona norte,
denominadas tripartites de distinta pe- tir sua vida útil. Por outro lado, o cabo plataformas marítimas, instalações e es-
riodicidade. De maneira adicional, foram principal tem um sistema de proteção critórios) já se encontram finalizadas.
realizados workshops de distinta índole, mista que contempla: cabos principais Finalmente, desde fevereiro de 2018
com o objetivo de transferência de co- galvanizados com capa de zinco de 250 estão sendo executadas as obras das
nhecimento. ~300g/m2 ou com uma espessura de fundações do pilar central, começando
filme seco de 40 µ; após a compacta- pelo piloti de prova. Atualmente estão
Engenharias Básicas: ção. Os cabos principais serão protegi- sendo construídos os pilotis definitivos
Como foi apresentado anteriormente, dos por sistema de enrolamento mais a do pilar central, sendo o começo de um
as engenharias básicas desse projeto são adição de epóxi elástico ou um revesti- importante desafio em nível de engenha-
de uma envergadura e nível de precisão mento elastomérico; finalmente, haverá ria e construção no Chile.

39
ARTIGO RE TRÔ | EDIÇÃO 106

PROTENSÃO PARCIAL:
UMA FASCINAÇÃO!

POR AUGUSTO CARLOS DE VASCONCELOS


Com forma de rememorar alguns dos importantes temas tratados pela predecessora
da revista Estrutura, vamos reeditar alguns artigos publicado no passado. A ideia é
revisitar assuntos e conceitos técnicos, de forma a que o leitor possa ter uma noção da
situação existente no passado e também perceber as alterações ocorridas ao longo do
tempo. Vale observar que os conteúdos técnicos já sofreram alterações significativas ao
longo do tempo.

1 – SIGNIFICADO. necessário, então, abrir mão da chama-


EVOLUÇÃO HISTÓRICA da protensão completa na qual não se
permitiam tensões de tração na fase
A protensão surgiu com o objetivo de final. Admitiu-se a “protensão limitada”,
eliminar tensões de tração no concreto. a chamada “beschraenter Verspannung”
Criou-se, portanto, a mentalidade de que da norma alemã DIN 42227 de 1951/53.
o concreto pretendido era um material Os valores das tensões de tração no
diferente (Freyssinet): tratava-se de um concreto não poderiam ultrapassar
concreto especial que resistia tão bem à determinadas frações da resistência
tração como à compressão. Adicionava- à compressão do concreto na data de
-se uma armadura não pretendida que se aplicação da protensão, ou na data de
chamava “armadura frouxa” e que mais carregamento máximo, conforme a re-
tarde passou a ser denominada “arma- gião onde ocorram. As tensões de tra-
dura suplementar” e “armadura passiva”, ção permitidas dependiam do tipo de
cuja finalidade era proporcionar melhor carregamento: tensões de tração “em
implantação das forças de protensão, vazio” sob carregamento de protensão
complementar a resistência à ruptura ou inicial + fração atuante da carga perma-
absorver pequenas tensões de tração nente, ocorrendo na zona de compres-
que pudessem surgir em fases interme- são previamente tracionada; tensões
diárias de construção. de tração “em serviço” sob carrega-
Para evitar totalmente as tensões de mento máximo, ocorrendo na zona de
tração sob carregamento máximo, a tração previamente comprimida.
pré-compressão do concreto tornava- Quando a carga permanente con-
-se muitas vezes excessiva. O concreto comitante com a aplicação da preten-
deveria possuir uma elevada resistên- são é grande e os cabos de protensão
cia inicial, o que dificultava a aplicação possuem a configuração parabólica,
da protensão em pouca idade. A es- não surgem tensões de tração em va-
pera de muitos dias atrasava a obra e zio. Quando, porém, os cabos são retos
tornava a protensão desvantajosa. Foi como sói acontecer nas peças pré-mol-

40 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


dadas do fio aderente, fabricadas em 1972! O Brasil, com o fabuloso acervo 2 – GRAU DE PROTENSÃO.
pistas de protensão, sempre aparecem de obras importantes realizadas, pode-
tensões de tração na região oposta aos ria ter tomado essa dianteira também
PROTENSÃO RELATIVA
cabos, junto às extremidades (onde o no concreto pretendido, oficializando a Há diversas maneiras de definir o grau
momento devido à carga permanente é protensão parcial ou o concreto armado de protensão. A definição deve ser tal
diminuto). pretendido, como se quiser denominar, que, para protensão completa, resulte
De tudo isto resultou a necessidade de desde a nossa P-NB-116 de 1962. O Brasil igual a 1, e para o concreto armado, igual
se aceitar a protensão limitada desde o está perdendo a capacidade de inovação a O. De preferência, a definição deve dar
princípio do concreto pretendido. Foram, com a “febre” de copiar o que os teóricos imediatamente ao engenheiro a infor-
entretanto, tomadas precauções em ex- europeus recomendam. mação de qual a fração da carga total a
cesso. Em pontes ferroviárias, por exem- O bom senso, entretanto, prevaleceu e protensão é capaz de absorver: somente
plo, não se permitiu a pretensão limitada. a pretensão parcial tem tido maior acei- a carga permanente, apenas uma par-
Mesmo para pontes rodoviárias não se tação no mundo, principalmente, por te desta, ou, além dela, mais uma parte
permitiu na NB-116 a protensão limitada incrível que pareça, na Holanda, Suíça substancial da carga acidental.
para menos de 50% da carga acidental. e Suécia. Os países que têm feito maio- Bechmann se serve do momento de
Quando as tensões ultrapassavam res objeções são Alemanha, Yugoslávia, descompressão Mdes para definir o grau
os limites estabelecidos, a protensão Tchecoslováquia e Índia. de protensão k :
era chamada “moderada” ou “parcial” Os impulsos brasileiros devem, entre- Mdes
k = _______
(na literatura alemã encontram-se as tanto, ser refreados tendo em vista as Mg+q
denominações “maessige Vorspannung”, conseqüências nocivas da deformação Mg+q – é o momento de todas as cargas
“teilweise V.” ou ainda “schwache V.”). Essa excessiva e limitação da durabilidade externas em serviço.
pretensão não era considerada nos pela fissuração exagerada. Mdes – é o momento externo capaz de
cálculos. Paul W. Abeles, austríaco de Quando se fala em protensão limitada anular a máxima tensão de pré-
nascimento mas radicado na Inglaterra, ou em protensão parcial não se imagi- -compressão no concreto.
sugeriu repetidas vezes o uso da preten- na aplicar aos cabos tensões de tração Bachmann não esclarece se nas estru-
são parcial, encontrando sempre forte inferiores ao limite permitido. Se assim turas hiperestáticas pretendidas (com
oposição no grupo francês. fizéssemos, acabaríamos perdendo uma hiperestáticos de protensão) em Mg+q
No Brasil, o saudoso engenheiro Ro- fração vultosa da protensão pelos fenô- está incluído o efeito da protensão. Su-
berto Rossi Zuccolo, seguindo de perto a menos de relaxação e fluência. O aço bentende-se que o momento hiperes-
escola francesa de Freyssinet, não aceita- deve ser sempre protendido com a má- tático (sem considerar a parcela devida
va, como os europeus em geral, a preten- xima tensão permitida. O que se diminui às tensões equilibradas entre concreto
são parcial. O Prof. Aderson Moreira da é a área de aço de protensão e, portanto, e aço) deva ser considerado com o valor
Rocha, por outro lado, já havia publica- a força de protensão aplicada, compen- final da protensão. Supõe-se também
do na revista “Estrutura nº 38” em 1961, sando-se com adição de armadura não que o momento de descompressão seja
um artigo onde introduzia o conceito de protendida em quantidade adequada. determinado após todas as perdas pro-
“concreto armado pretendido.” O mesmo É sabido que duas peças absoluta- gressivas.
engenheiro fez em 1973 uma palestra no mente idênticas nos materiais concreto Brendum-Nielsen define praticamente
Simpósio de Estruturas no DNER do Rio, e aço, diferindo entre si exclusivamente do mesmo modo o grau de protensão,
publicada integralmente na revista “Es- pela existência de protensão numa de- considerando, porém, o Mdes correspon-
trutura nº 67” com o título “Conceito do las, apresentam praticamente a mesma dente à descompressão na posição do
Concreto Armado Pretendido”. carga de ruptura. As perdas de proten- cabo resultante, desprezando as peque-
Repudiava à mente humana aceitar o são ao longo do tempo pouco influen- nas tensões de tração que aparecem na
concreto armado sem qualquer limita- ciam, portanto, a resistência à ruptura. região do cabrimento do cabo. Explícita,
ção das tensões de tração e recusá-lo no Em serviço, entretanto, a peça não pro- entretanto, a inclusão do momento hipe-
caso de lhe ser acrescentado um cabo tendida deve apresentar flecha e grau restático de protensão no denominador.
com uma diminuta pretensão. O brasi- de fissuração maiores. É escolhido, entretanto, outro nome para
leiro só começou a aceitar a protensão Num ensaio até a ruptura, o aspecto essa relação de momentos: protensão
parcial depois que o CEB resolveu uni- da peça não protendida é muito diferen- relativa.
ficar o concreto armado e o pretendido te da outra, tanto pela quantidade como Thürlimann (e conseqüentemente a
num único “Código Modelo.” Acabaram- pela abertura das fissuras e pelo valor F.I.P., influenciada por ele) prefere definir
-se as exigências de limitações de ten- da flecha nos vários estágios de carrega- o grau de protensão de maneira inde-
sões, devendo-se em contrapartida dar mento. Ao se definir o estado-limite últi- pendente do carregamento, como um ca-
muita atenção à fissuração e à deforma- mo como sendo aquele correspondente racterístico geométrico e físico da seção
ção das peças. ao aparecimento de fissuras equivalen- transversal. Tem sido utilizada a notação
O Brasil foi o primeiro país a adotar tes a 10 trincas de abertura 1 mm em 1 À definida pela fórmula:
numa Norma (a Norma da ABCP de 1937) m de extensão (E = 10%), verifica-se que A p • fpvk
l = _____________________
o cálculo no Estádio 111, que os alemães a peça não protendida atinge antes esse A p • fpyk +A s • f sk
só vieram a oficializar na DIN 1045 em estado-limite.

41
ARTIGO RE TRÔ | EDIÇÃO 106

O numerador representa a força de es- determinação da armadura passiva para que se aceitem aberturas de fissuras até
coamento da armadura de protensão e o valores preestabelecidos da seção de w = 0,3 mm.
denominador a força total de escoamen- concreto , da armadura pretendida e do Em resumo:
to de todas as armaduras de tração. momento máximo. PL = 1,27 PP = 2,16 PC = 1,70
Como k , l vale 0 para o concreto ar- Para melhor compreensão dos proble- Holanda: Índia = 2,67 (relação de momen-
mado e 1 para protensão sem armadura mas propostos é transcrita a seguir a Fig. tos)
passiva. Não se faz referência à proten- 1 da referida publicação, que fornece os
são total, limitada ou parcial. l não de- dados: tipo de estrutura e de carrega- b) Protensão forte
pende do carregamento e mesmo para mento, seções transversais e materiais No caso de armadura de protensão
protensão completa pode ser inferior a 1. disponíveis. maior e diminuição de armadura passiva
A justificativa de se dar preferência a
uma definição que independa do carre-
gamento está em se poder referir a um
coeficiente não vinculado às normas dos
diversos países. Será, então, possível re-
ferir-se ao graú de protensão, indepen-
dentemente do país ou de qualquer nor-
ma. Não dá, entretanto, ao engenheiro,
imediatamente, a idéia de que parte do
carregamento total está sendo equilibra-
do pela protensão. Este fato é considera-
do fundamental por Leonhardt.
Neste trabalho referir-nos-emos aos
dois coeficientes k e l com os seguintes
nomes:
k = protensão relativa (Bachmann)
l = grau de protensão (Thürlimann)

3 – COMPORTAMENTO DOS
DIVERSOS PAÍSES
Hugo Bachmann escreveu um traba-
lho notável denominado “Partial Pres-
tressing of Concrete Structures” (IABSE
Surveys S-11/79 e também na revista
Beton - und Stahlbetonbau 1980, Cad.
2, Teilweise Vorspannung: Erfahrungen
in der Schweiz und Fragen der Bemes-
sung). Nesse trabalho, ele analisa o com- Somente 11 países responderam. Os (foi mantida aproximadamente constante
portamento de 11 países com relação resultados são bastante discrepantes e a força total de escoamento das armadu-
ao uso da protensão parcial. Isto foi o convém fazer uma análise minuciosa. ras) as proporções são parecidas:
resultado de uma “enquete” internacio- Índia (só PC): 430 kNm
nal na qual eram propostos 9 proble- SEÇÃO RETANGULAR Holanda: 820 kNm (= 520 PC, 620 PL,
mas simples de dimensionamento para a) Protensão fraca 820 PP)
averiguar como as normas dos diversos O menor momento admissível foi indica-
países encaravam a protensão parcial. do pela Índia com cerca de 300 kNm e o Aceitando-se fissuras w = 0,3, pode-se
Esses 9 problemas se referem a 3 tipos maior pela Holanda com 800 kNm . A Índia atingir momento 32% acima da PL. Em
de seção transversal: retangular, Te I. só admite protensão completa, ao passo resumo:
As áreas das armaduras, protendida Ap que a Holanda é mais liberal: 370 kNm para PL = 1, 19 PC PP = 1,58 PC = 1,32 PL
e passiva As, assim como a respectiva protensão completa, 470 para protensão Holanda: Índia = 1,91
posição, são fornecidas nos 6 primeiros limitada e 800 para pretensão parcial. Mes-
problemas. Abrangem 2 casos: mo que se considere apenas a PC a Holan- SEÇAO T
da admite cerca de 23% mais do que a Ín- a) Protensão fraca
a) Protensão fraca: Ap pequena + As grande
dia, o que faz supor limites 23% a mais para Ainda neste caso, os extremos são re-
b) Protensão forte: Ap grande + As pequena
a tensão de tração no aço de protensão. presentados pela Índia e pela Holanda.
Para cada um dos casos pergunta-se Da PC para a PL há um aumento de Índia (só PC): 740 kNm
qual o momento fletor máximo admissí- 27% e para a PP, de 216%. Isto significa Holanda: 1 600 kNm (= 940 PC, 1 060 PL,
vel. Os 3 últimos problemas consistem na que se pode ir até 70% além da PL desde 1 600PP)

42 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2017


PL = 1,13PC PP = 1,70 PC = 1,51 PL Não está especificada a fração de carga Para situar nosso país no contexto in-
Holanda: Índia = 2,16 permanente. A relação entre o momento ternacional, o autor decidiu responder
de carga permanente e o momento to- às mesmas perguntas de Bachmann
b) Protensão forte tal influencia as perdas progressivas de segundo a NB-116 vigente nesta data
Índia (só PC): 960 kNm proteção e, portanto, a armadura passiva (outubro de 1983) e segundo a Revisão
Holanda: 1 600 kNm (= 1 180 PC, que deve absorver a força total de tração NB-116 em vias de conclusão, da qual
1 280 PL, 1 600 PP) no concreto. Supõe-se que se tenha ad- faz parte como Secretário da Comissão
PL = 1,08 PC PP = 1,36 PC= 1,25 PL mitido um valor fixo para as perdas de de Estudos.
Holanda: Índia = 1,67 protensão, que não se afaste significati- A NB -116 em vigor, não obstante estar
vamente da realidade. obsoleta e desatualizada fornece ainda
SEÇÃO I Os países que representam o menor resultados bastante coerentes em re-
a) Protensão fraca e o maior consumo de armadura passi- lação ao resto do mundo. Entretanto,
Índia (só PC): 740 kNm va são, neste caso, a Holanda e a Suécia, como estabelece limitações para as
Holanda: 1 600 kNm (= 900 PC, 1 280 PL, respectivamente: tensões de tração no concreto, impõe
1 600 PP) Holanda A s = 3,0 cm2 (12,6 cm2 para determinadas limitações semelhantes
PL = 1,42PC PP = 1,78 PC = 1,25 PL w = 0,1 mm) às da Alemanha, Yugoslavia, Tchecoslo-
Holanda: Índia = 2,16 Suécia A s = 32,0 cm2 vaquia e Índia. Para que a comparação
se torne mais ilustrativa, os resultados
b) Protensão forte SEÇÃO T são apresentados juntos, segundo a
Índia (só PC): 920 kNm Momento em serviço de 1000 kNm NB-116 e segundo a Rev. NB- 116, decla-
Holanda: 1 600 kNm (= 1 110 PC, Países extremos: Holanda e Inglaterra rando, contudo, que os últimos resulta-
1 460 PL, 1 600 PP) Holanda: 7,2 cm2 (24,2 cm2 para dos são ainda provisórios, dependendo
PL = 1,32 PC PP = 1,44 PC = 1,10 P w = 0,1 mm) da homologação da norma após sua
Holanda: Índia = 1,74 Inglaterra: 21,0 cm2 redação final.
Os cálculos feitos referem-se exclusiva-
Neste último caso, a Áustria pratica- Vê-se, portanto, que, no caso de ser mente à flexão, nada se mencionando a
mente empata com a Holanda, admitindo exigida abertura máxima de fissura de 0,1 respeito do cizalhamento.
1 560 kNm. mm, o consumo de armadura passiva na
Percebe-se por estes números que as Holanda se torna superior ao da Inglater- Explicações preliminares
normas de um país diferem muito das ra. Não foi, entretanto, especificada qual 1. Materiais
de outro, existindo uma relação de mo- a hipótese de cálculo formulada pela In- O concreto previsto por Bachmann
mentos admissíveis de até 2,67: Além glaterra. possui uma resistência média de 27 MPa
disso a PP permite avançar até 70% e um coeficiente de variação de 10%. O
além da PL. SEÇÃO I desvio padrão vale pois
Nos 3 problemas de dimensionamento Momento de serviço de 1000 kNm
s = 27 • 0,10 = 2,7 MPa
da armadura passiva 4 países Alemanha, Países extremos: Holanda e Suécia (se-
Yugoslávia, Tchecoslováquia e Índia) res- guida de perto pela Suíça e Inglaterra) Para um quantil de 5%, a resistência ca-
ponderam pela impossibilidade segundo Holanda: 7,2 cm2 racterística desse concreto vale
suas normas. Suécia: 17,0 cm2
fck = 27 – 1,65 • 2,7 = 22,6 MPa
Tendo sido fornecida a armadura de Suíça: 15,8 cm2
protensão, restava apenas para determi- Inglaterra: 15,5 cm2 A norma NB-116, entretanto, referindo-
nar, a armadura passiva, sendo eventual- -se à NB-1, não permite adotar valor su-
mente também utilizada a armadura de A Austria, com valores intermediários, perior a 80% da média, ou seja, usando
protensão para a limitação das fissuras. mencionou o fato de que a variação de anotação da época de sua publicação:
A armadura passiva encontrada de- tensão não satisfaz a exigência de fadiga:
0,8 • 27 = 21 ,6 MPa
pende do grau de limitação das abertu- Dss < 150 MPa sR
27 (1 – 1,65 • 0,10) = 22,6 MPa
ras de fissuras e também do acréscimo Os demais países não fazem qualquer
tolerado de tensão na armadura pro­ten- referência a este fato e, portanto, não se prevalecendo o 1º limite.
dida (fadiga!). sabe se a fadiga foi levada em conside-
Vejamos as respostas para os 3 proble- ração. A diferença sendo pequena, para não
mas de dimensionamento da armadura dificultar a comparação entre os resulta-
passiva. 4 – COMPORTAMENTO dos obtidos com a norma antiga e a pro-
vável futura norma, decidiu o autor uni-
SEÇÃO RETANGULAR ESPECÍFICO DO BRASIL formizar os cálculos com 21,6 MPa:
A seção é a mesma dos problemas Não sabemos se o Brasil foi consultado
fck = sR = 21,6 MPa
anteriores. Trata-se de determinar a ar- na enquete internacional. O fato é que
madura passiva necessária para um mo- não existe referência ao nosso país no A resistência à t ração do concreto é
mento de serviço de 600 kNm. mencionado trabalho de Bachmann. dada por

43
ARTIGO RE TRÔ | EDIÇÃO 106

f tk = 0,06 • fck + 0,7 = 2 MPa Em serviço com carga máxima Concreto Ec =


Pela NB-116, entretanto, é usada uma 2 s
___ 0,9 • 6600 • fck + 3,5 = 30.300 MPa
• at = 1100 MPa
fórmula dimensional aplicável somente sa 3 Aço de protensão Ep =
para tensões em kgf/cm2, que fornece sT: 0,8 • sae = 1176 MPa 200.000 MPa ap = 6,6
Na armadura passiva deve-se ter sf = Aço armadura passiva Es =
1 220 MPa (ou variação máxima de tensão 210 .000 MPa as = 6,9
sT = ___ • sR = 0,5 • 216 =
2/3 2/3

2 na armadura de protensão).
18 kgf /cm2 = 1,8 MPa Na Revisão não há limitação de ten- Devido à pequena influência, adotare-
Já existem, portanto, diferenças de sões no concreto em serviço. Entretanto, mos para ambos os aços o mesmo valor
interpretação de resultados de ensaios em vazio, sob ação de protensão inicial e da NB-116:
para determinação da resistência do con- mais as parcelas então atuantes de carga a = 6,8
creto. Resumindo: permanente, deve-se tomar cuidado con-
NB-116 (NB-1/60) tra uma microfissuração por excesso de 4 – Cálculos exigidos
sR = 21,6 MPa compressão (que aniquila sua resistên- Os cálculos desenvolvidos em obe-
sT = 1,8 MPa cia a tração no futuro, sob carga máxima diência à NB-116 referem-se a:
após as perda progressivas de proten- a) Verificação de tensões
Rev ·NB-116 ( NB-1/78) são). b) Segurança à ruptura
fck = 22,6 MPa (adot. 21,6) |sc,max| = 0,70 • fckj = 0,70 • 17 = 11,9 MPa c) Absorção da cunha de tensões de
f tk = 2,0 MPa sendo fckj = 0,75 • fck = 17 MPa tração por armadura passiva ou de
protensão.
Quanto ao aço de protensão, Ba- A máxima tensão de tração em vazio,
chmann fornece a resistência média de na região oposta aos cabos principais O cálculo de verificação de tensões é
1800 MPa, tensão média de escoamento de protensão, é a única tensão de tração feito nos diversos estágios de carrega-
de 1600 MPa e coeficiente de variação de que não pode ultrapassar um limite pre- mento. A armadura passiva existente
5%. Resultam, tanto pela NB-116 como viamente estabelecido : pode ser incorporada nos caracteristi-
pela Revisão: sc,max = 1,2 • fctk = 1,2 (0,06 • 17 + 0,7) = cos da seção (seção homogeneisada). A
sat = fptk = 1800 (1 – 1,65 • 0,05) = 2 MPa armadura de protensão só pode ser in-
1650 MPa corporada para todos os carregamentos
sae = fpyk = 1600 (1 – 1,65 • 0,05) = No aço de protensão as limitações são no caso de pré-tração. Para pós-tração
1470 MPa diferentes para pré-tração e para pós- só pode ser considerada para os carre-
-tração: gamentos que se aplicam após a injeção.
Para o aço da armadura passiva, ob- No ato da protensão Como não é dada a distribuição de car-
tém-se analogamente : PRE POS gas permanentes e acidentais, admitiu-
f sk = sf = 560 (1 – 1,65 • 0,05) = 514 MPa 0,85 • fptk = 1403 0,80 • fptk = 1320 -se apenas a armadura passiva na homo-
f yk = se = 500 (1 – 1,65 • 0,05) = 459 MPa spi geneisação, com o: = 6,8.
0,95 • fpyk = 1396 0,90 • fpyk = 1323
A segurança à ruptura foi determinada
Esses aços não constam das normas 0,77 • fptk = 1270 com coeficiente de segurança global 1,65,
spo
brasileiras, de maneira que faremos 0,85 • fpyk = 1250 tendo sido usada a fórmula simplificada
adaptações especiais para esses valores
sae se
de resistências e escoamentos. Na armadura passiva a tensão máxima é sar = 1,2 • sae 1,0 – 0,5 ma ___ + m ___ sat
siR sR
ss = 150 MPa (valor a ser discutido)
2. Tensões admissíveis valor que também se aplica para a va- adotando-se um valor bmed quando a
Na NB-116 são estabelecidas diversas riação ss da tensão na armadura de pro- linha neutra corta a alma. Foi sempre
tensões admissíveis no aço e no concreto tensão (fadiga ). observada a condição de que o momen-
dependendo da fase de carregamento. to fletor de ruptura não supera o que
Admitiremos que no ato da protensão 3. Módulos de deformação se obtém com zona de compressão de
o concreto tenha atingido a resistência Pela NB-116 os módulos de deforma- altura h/3.
sRp = 0,75 • sR= 16,2 MPa ção longitudinal são: A verificação da fissuração foi feita tan-
Concreto to no estádio I (calculando-se a cunha de
As tensões máximas iniciais (em vazio, Ec= 500 (sR + 400) kgf/cm2 = 500 tensões de tração determinada na seção
item 3.1.1): (sR + 40) MPa = 30.800 MPa homogênea) como no es­tadia 11. Não foi
sC 0,5 • sR = 10,8 MPa Aços aplicada na armadura passiva (ou acrés-
=C 2 • sT = 3,6 MPa (PL)
s Ea = Ef = 210.000 MPa cimo na armadura de protensão) tensão
Relação modular superior a 220 MPa e não foi feita verifi-
No aço de protensão temos: n = 210.000/30.800 = 6,8 cação de fadiga.
Em vazio (protensão inicial + g) Foram determinados os seguintes mo-
0,75 • sat = 1238 MPa Na Revisão são adotados os valores da mentos limites:
sa
0,90 • sae = 1323 MPa NB- 1/78, EB-780 e da EB-781.

44 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2017


FIG. 2B – PERMISSIBLE MOMENTS ON CROSS-SECTIONS FIG. 2A – PERMISSIBLE MOMENTS ON CROSS-SECTIONS
S1. S2 AND S3 FOR GIVEN VALUES OF A P END A S – WITH A HIGH S1. S2 AND S3 FOR GIVEN VALUES OF A P END A S – WITH A HIGH
PROPORTION OF NON-PRESTRESSED REINFORCEMENT A P PROPORTION OF NON-PRESTRESSED REINFORCEMENT A S
(*) NÃO CONSIDERADA A FADIGA. (*) NÃO CONSIDERADA A FADIGA.

– Momento capaz de provocar


|sc,su| = sC = 10,8 MPa
– Momento capaz de provocar
sc,su = 0 (PC)
=C = 3,6 MPa (PL)
– Momento capaz de provocar sc,in = s
– Momento capaz de provocar na armadura passiva (ou au-
mento na armadura de pretensão) tensão igual a 220 MPa
– Momento capaz de provocar de ruptura dividido por 1,6

De todos estes momentos, o momento admissível é o me-


nor deles para PC. Eliminando-se o segundo, o menor dos de-
mais é o momento admissível para PL.

Na Revisão, sendo os coeficientes de segurança fraciona-


dos, o momento admissível é o momento no estado-limite
último dividido por g f = 1,4. Este momento último deve ser
calculado com fcd = fck /1,4 e com as resistências dos aços divi-
didos por 1,15.
Deve ser verificada a máxima tensão de compressão em va-
zio, que não deve ultrapassar 11,9 MPa. Não se conhecendo
a fração da carga permanente concomitante com a pretensão
e também o andamento dos cabos, não se pode verificar a
condição de a tensão de tração em vazio não ultrapassar o
valor 2,0 MPa. Essas verificações foram feitas com carga per-
manente nula.
Nos 3 últimos problemas, verificou-se primeiramente se, com FIG. 3 REINFORCEMENT REQUIRED IN CROSS-SECTIONS S1, S2 AND
o momento fletor dado, as tensões no concreto em serviço ultra- S3 FOR A GIVEN VALUE OF MG+Q [VALUES OF A P SPECIFIED)

45
ARTIGO RE TRÔ | EDIÇÃO 106

passavam os limites preestabelecidos. Se- Os resultados junto com os da enquete os característicos geométricos das seções
gundo a NB-116 a limitação das tensões de internacional estão todos agrupados nas ideais tendo sido ‘incorporada na seção
tração no concreto na PL impede o dimen- figuras 2a , 2b e 3 extraídas da publicação homogeneisada apenas a armadura pas-
sionamento da armadura passiva. Apenas mencionada de Bachmann. siva ou ambas. A diferença máxima nos
no caso da seção I, com a grande área exis- módulos de resistência foi de 7%. Isto
tente na zona tracionada, a tensão de tra- Análise dos resultados pode não representar muita coisa, mas
ção ficou abaixo do limite 3,6 MPa e assim Os quadros anexos número 1, 2, 3, 4 na hora de se aceitar ou rejeitar uma peça
foi possível dimensionar A s. Não se levou, contém todos os resultados dos cálculos por excesso de tração pode constituir um
entretanto, em conta o efeito de fadiga. efetuados. O Quadro Nº 1 mostra todos fator decisivo. A maior diferença encontra-

46 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2017


da se deu na seção T com forte armadura O Quadro Nº 3 apresenta todos os mo- seções retangular e T, sendo a diferença
pretendida. Resulta, portanto, alguma di- mentos máximos determinados segundo a mais pronunciada nos casos de protensão
ferença no cálculo ao se consi derar a pré- NB-116 e segundo a Revisão conforme os fraca. Nas seções I praticamente não houve
-tração ou a pós-tração em vigas T. O cál- diversos fatores de limitação. Verifica-se aumento do momento admissível.
culo presente foi conduzido apenas para o nas figuras 2a e 2b que o Brasil se situa mui- Impondo-se restrição no aumento de
caso de pós-tração. Assim, as tensões de to bem em relação aos outros países, mes- tensão em serviço nas armaduras, por
pretensão que constam do Quadro Nº 2 mo considerando a norma antiga. Nota-se causa da fadiga, os momentos admissí-
são todas relativas à consideração de so- um aumento significativo dos momentos veis cairão significativamente em relação
mente a armadura passiva na seção ideal. admissíveis segundo a Revisão apenas nas aos resultados dos outros países.

47
ESPAÇO ABERTO | CBCA

INCÊNDIO EM EDIFÍCIOS
ALTOS NO BRASIL
REDUNDÂNCIA ESTRUTURAL, COMPARTIMENTAÇÃO VERTICAL E OBSERVAÇÃO
DE NORMAS E ESPECIFICAÇÕES DE MATERIAIS DE REVESTIMENTOS SÃO
MEDIDAS QUE EVITAM TRAGÉDIAS*

E
m 1° de maio de 2018, um incên- timentação vertical pelas fachadas, pelo Cabe à engenharia de instalações, os
dio de grandes proporções no edi- poço do elevador, pelas escadas não en- projetos de chuveiros automáticos, hi-
fício Wilton Paes de Almeida sur- clausuradas e, provavelmente, por outras drantes, sistemas de iluminação de emer-
preendeu todo o País. O edifício vias. A compartimentação vertical é impor- gência e sistemas de detecção e alarme.
de concreto armado com 24 pavimentos, tante justamente para impedir a propaga- Acrescentam-se a isso a ABNT NBR
localizado na região do Largo do Paissan- ção vertical do incêndio de um pavimento 14432:2001 e as Instruções Técnicas
du, em São Paulo, teve o seu colapso e para o imediatamente superior, sendo uma (IT8, em São Paulo), que indicam o TRRF
infelizmente vidas foram levadas. das medidas mais eficientes para a segu- (tempo requerido de resistência ao fogo)
Da mesma forma que em outros trági- rança contra incêndio e também essencial para o qual as estruturas devem ser
cos incêndios ocorridos também em edi- para o dimensionamento das estruturas. projetadas. É importante lembrar que o
fícios localizados na cidade de São Paulo Quanto à questão de redundância es- TRRF não é tempo real, mas um tempo
– Joelma, Andraus, Cesp e Grande Avenida trutural, em edifícios altos, significa dizer padrão utilizado para ensaios em for-
- o caso do edifício Wilton Paes de Almeida que caso um elemento estrutural falhe nos. Quanto mais alta a edificação, maior
tem a característica de ser uma constru- por conta do incêndio, o projeto estrutu- será esse TRRF. Conhecido esse tempo,
ção do meado do século passado, com ral prevê caminhos alternativos para os o engenheiro dimensionará os elementos
projeto arquitetônico, estrutural e de ins- carregamentos chegarem à fundação. estruturais com base nas normas ABNT
talação, que não considerava a segurança De uma maneira geral, cabe a arquitetura NBR 15200:2012 “Projeto de estruturas
contra incêndio. São várias as edificações garantir a compartimentação vertical e pro- de concreto em situação de incêndio” ou
nessa condição no Brasil, e isso represen- jetar adequadamente as saídas de emer- ABNT NBR 14323:2013 “Dimensionamen-
ta um grande risco para as pessoas. gência, por meio de escadas de segurança, to de estruturas de aço de edifícios em
Os incêndios nesses edifícios propa- por exemplo, cujo número, largura e locali- situação de incêndio - Procedimento”.
garam-se com muita facilidade e envol- zação devem ser projetadas com base na Fica claro que a segurança contra in-
veram toda a edificação, dificultando ABNT NBR 9077:2001 - Saída de emergên- cêndio é multidisciplinar, dependendo da
as operações de combate ao incêndio cia em edifícios ou nas instruções técnicas arquitetura e da engenharia, tendo como
e provocando sérios danos à estrutura. dos Corpos de Bombeiros estaduais. guia as Instruções Técnicas dos Corpos
A ocupação original do edifício também Outras medidas do escopo da arquite- de Bombeiros estaduais e as Normas
precisa ser respeitada. Um edifício ba- tura são as especificações de materiais Brasileiras, que devem estar sempre em
sicamente feito para abrigar escritórios de revestimento e acabamento colo- contínuo aprimoramento com base nos
não pode ser modificado para um edifício cados em tetos, paredes e pisos. Esses erros detectados em incêndios ocorridos
habitacional sem o devido cuidado. devem possuir características de reação no Brasil e no exterior. Além disso, sem-
No caso mais recente, do já menciona- ao fogo adequadas, levando-se em con- pre é importante considerar as pesquisas
do edifício Wilton Paes de Almeida, a falta ta a propagação superficial das chamas científicas desenvolvidas pela Engenharia
de compartimentação vertical, a estrutura e a quantidade e densidade de fumaça de Segurança contra Incêndio.
pouco redundante e um projeto antigo em desenvolvidas. Acessibilidade aos equi-
(*) Centro Brasileiro da Construção em Aço
termos de segurança contra incêndio foram pamentos para combate ao incêndio e (CBCA), com a colaboração de Valdir Pignat-
as principais razões para o desabamento. o distanciamento seguro entre edifícios ta e Silva (professor doutor da Escola Poli-
técnica da Universidade de São Paulo) e do
Nele, assim como nos outros edifícios também são de responsabilidade dos engenheiro Mauri Resende Vargas (Tecsteel
mencionados, havia quebra de compar- projetos de arquitetura. Engenharia)

48 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


49
NOSSO CR AQUE | CARLOS EDUARDO MOREIR A MAFFEI

A TRAJETÓRIA DE
UM MESTRE DAS OBRAS
ENTERRADAS
O DESAFIO SEMPRE FEZ PARTE DA CARREIRA DO PROFESSOR CARLOS EDUARDO
MOREIRA MAFFEI. JOVEM AINDA, JÁ ATUOU NO PROJETO DE UM DOS TRECHOS MAIS
COMPLEXOS DO METRÔ PAULISTANO. COM ISSO, SE TORNOU ESPECIALISTA EM OBRAS
ENTERRADAS, ALÉM DE TER DADO AULA PARA CERCA DE 1.600 ALUNOS

A
trajetória profissional do en-
genheiro e professor Carlos


Eduardo Moreira Maffei sem-
pre foi pautada por desafios.
Já na graduação, ele decidiu fazer parte
de um seleto grupo de estudantes – 9
O professor
numa turma de 200 – que optou pela es-
pecialização em Engenharia de Estrutura,
das escolas
uma novidade nos cursos de engenharia de engenharia
do início dos anos de 1960, quando se
graduou engenheiro pela POLI. Após se tem de,
formar e passar por um estágio no escri-
tório do engenheiro Paulo Franco Rocha,
necessariamente,
Maffei enfrentou outro desafio, ao fazer
parte da equipe de que construiu um dos
ter doutorado.
trechos mais complexos da primeira linha Ele tem de saber
de metrô do Brasil, o Trecho 3 da Linha 1
Azul do Metrô de São Paulo, na qual foi muito mais do que
utilizado, também pela primeira vez no
país, o chamado Tatuzão.
está ensinando


Foi nessa obra que ele aprimorou as
pesquisas e estudos que viriam a resultar
CARLOS EDUARDO MOREIR A MAFFEI na elaboração do conceito de interação
solo-estrutura, o qual se transformou
num curso ministrado por ele no Brasil e
também em Portugal. Na época, concilia-
va sua atuação nas obras com aulas de permaneceu por 41 anos, tendo leciona-
Resistência de Material que começou a do para aproximadamente 1.600 alunos,
dar na POLI em 1970. A carreira acadêmi- segundo suas estimativas. Atualmente,
ca foi outro desafio vencido e na qual ele apesar de já ter aposentado, continua

50 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


dando uma aula sobre estruturas enter- sumisse a coordenação do projeto exe- ração solo estrutura. Foi muito bacana.
radas, área onde é considerado um dos cutivo de todas as obras do Trecho 3. Nessa altura fui crescendo nessa área
maiores especialistas brasileiros. Na se- de interação solo-estrutura, fazendo os
quência, acompanhe alguns pontos da ABECE – Como enfrentou esse desa- meus artigos e desenvolvendo melhor a
entrevista concedida por Maffei à revista fio? teoria, inclusive na Poli.
ESTRUTURA. MAFFEI – Eu tinha pouco mais de 30
anos, então esse trabalho foi de extrema ABECE – Baseado em sua experiência
ABECE – Como foi o início da sua car- importância, inclusive do ponto de vista acadêmica, como avalia as escolas de
reira profissional? acadêmico, pois nessa época eu já tinha engenharia no Brasil?
MAFFEI – Logo que me formei, em 1963, começado a dar aula de Resistência de MAFFEI – Não conheço todas as esco-
fui ser estagiário do Paulo Franco Ro- Material na Poli. Em função dos estu- las de engenharia do país, mas conhe-
cha. Aprendi muito lá. Considero o Paulo dos para as obras do Metrô comecei a ço os alunos que saem delas. Por essa
meu pai para a engenharia, pois ele gos- perceber que o problema desse tipo de medida, posso dizer que os conceitos
tava de ensinar e ensinava tudo. Como obra, as chamadas “obras enterradas”, deles são muito fracos. Muitas escolas
estagiário atuei em grandes projetos, não se trata apenas de uma questão de engenharia dão métodos e prática. A
como o das instalações da Cosipa, na que envolve a melhor compreensão de escola deve ensinar teoria. Não adianta
Baixada Santista e também na constru- estrutura ou de mecânica do solo, mas eu te ensinar como calcular para cons-
ção da cobertura da Basílica de Nossa
Senhora Aparecida, no Vale do Paraíba.
Fiquei como estagiário até 1966, quan-
do montamos, eu e o Orlando Botelho,
um pequeno escritório de projetos no
Conjunto Nacional, onde ficavam todos


os grandes escritórios de arquitetura e
de engenharia na época. Fizemos diver-
sos projetos interessantes, sobretudo
em edifícios residenciais. Isso durou até O computador agrega demais,
1969, quando o Paulo Franco Rocha foi
trabalhar na Promon Engenharia e nos
mas acho que temos de
convidou, a mim e ao Orlando, para tra-
balhar na empresa. Foi então que come-
desconfiar dele. Há empresas que
çaram os grandes desafios. criaram um grupo de profissionais
ABECE – Poderia relembrar alguns encarregado de checar se o que o
desses desafios.


MAFFEI – Um dos primeiros projetos
computador definiu é correto
em que nos envolvemos foi o trecho 3
da futura Linha 1 Azul do Metrô de São
Paulo, que começava um ponto antes do
Vale do Anhangabaú e ia até perto da
Liberdade. Comecei a trabalhar no pro-
jeto básico desse trecho que, por passar
pelo centro da cidade, local de grande
concentração de edifício, foi feito todo
por meio dos chamados Tatuzões. Em sim um problema de interação entre as truir uma viga. É melhor eu, através da
função disso, foram necessárias várias duas áreas. Foi então que passei a estu- teoria, dizer se o método que você está
obras de reforço para que o equipa- dar solos com mais dedicação. Comecei usando para calcular é válido ou não no
mento pudesse fazer a perfuração dos a juntar as duas coisas. Tanto que depois seu exemplo prático. E teoria é ler muito.
tuneis sem comprometer as edificações até criei um curso de interação solo-es- Por outro lado, acho que o professor das
na superfície, principalmente na parte trutura de pós-graduação, pois entendia escolas de engenharia tem de, necessa-
próxima do Mosteiro de São Bento, que que não podemos tratar as duas áreas riamente, ter doutorado. Ele tem de sa-
exigiu a construção e uma grande laje. de forma independente. Os cálculos ber muito mais do que está ensinando.
Eu acabei me destacando na elaboração para a estrutura dependem do compor-
desses projetos. Chegou numa determi- tamento e do tipo de solo. Hoje é uma ABECE – O que mudou na forma de
nada fase da obra que os americanos, coisa fácil de fazer, pois temos compu- elaborar projetos?
com os quais a Promon tinha feito uma tadores que facilitam nos cálculos des- MAFFEI – Hoje não existe mais tempo
parceria técnica para executar a obra, sa interação. Na época, teve muito de para assimilar o projeto. No passado, eu
me chamaram e propuseram que eu as- criatividade para desenvolver essa inte- ficava um mês ou até dois meses calcu-

51
NOSSO CR AQUE | CARLOS EDUARDO MOREIR A MAFFEI

lando um prédio. Nós íamos até a tercei- cortava e colocava o macaco. Repetimos ção ocorrida no concreto foi um negó-
ra casa para chegar ao cálculo de uma esse modelo em outros edifícios em cio fantástico. Você tem hoje concreto
viga. Se desse um número do qual des- Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul resistente, duráveis, concreto projetado,
confiava, fazia tudo de novo. Nós tínha- e no Recife. evoluiu muito mesmo. Tanto que a pes-
mos uma certa sensibilidade para isso. soa que ficar três anos sem participar de
Refazíamos os cálculos. É claro que hoje ABECE – Quanto tempo demorou a uma obra vai cometer gafe. Os sistemas
o computador facilitou enormemente o obra? de drenagem, de rebaixamento, sistema
trabalho. Com ele, eu posso desenvol- MAFFEI – A obra em si demorou três ou de melhoria de solo, tudo isso está em
ver vários esquemas e refazer com rapi- quatro meses. A preparação e os cálcu- franca evolução. Os aditivos, é outra área
dez o que não está batendo. Por outro los, no entanto, demandaram dois anos de grande melhoria. E a gente tem que fi-
lado, ninguém sabe exatamente o que de trabalho e diversas reuniões com téc- car por dentro. De vez em quando, peço a
está fazendo, pois, o computador até te nicos, engenheiros e com o síndico do um pessoal de chumbadora de rocha, vir
dá o desenho pronto. Ele permite fazer edifício. É uma obra que tem que pensar aqui fazer uma explanação para a gente
experimentos virtuais: vamos tirar esse em tudo. Os moradores não tiveram de saber das recentes inovações.
pilar daqui e colocar para lá e ver se
melhora. Isso o computador agrega de- ABECE – Qual sua avaliação sobre o
mais, mas acho que temos de descon- momento atual da engenharia es-
fiar um pouco dele. Tem até uma empre- trutural brasileira do ponto de vista
sa que possui um grupo de profissionais técnico?


encarregado de checar e verificar se o MAFFEI – Poucos profissionais têm con-
que o programa do computador definiu dições de fazer projetos de edifícios com
é realmente o correto. 100 andares, mas os poucos que fazem
Ao estudante de têm a mesma capacidade técnica dos de
ABECE – Destaque uma obra desafia- fora do país. Até porque hoje o mundo é
dora que o senhor participou do pro- engenharia: leia uma aldeia global no que diz respeito a
jeto. troca de informações e de conhecimento.
MAFFEI – A obra de nivelamento de dois muito. Estude. Uma coisa que eu sinto muito é o pessoal
edifícios que estavam inclinados em
Santos foi a mais desafiadora. Em um
Se dedique e trazer arquitetos de fora, trazer o Cala-
trava, esses caras mais famosos, quando
deles, fizemos umas estacas cavadas aprimore sua eu acho que temos arquitetos aqui com a
dos dois lados indo até a parte mais só- mesma capacidade e criatividade. O de-
lida do solo e, em seguida, fizemos umas memória, pois senvolvimento está aqui, mas o nome do
vigas vierendeel ocupando parte do arquiteto é de fora. Eu duvido que não te-
primeiro andar e também da fundação. quem não tem nha arquitetos aqui com capacidade para
Depois de prontas as vigas, que abraça-
vam os pilares, colocamos macacos para
memória também desenvolver os projetos. Tem prédios be-
líssimos aqui no Brasil.
em seguida cortamos os pilares e com não terá um
isso conseguimos renivelar o edifício. ABECE – O que o jovem que pensa em


Antes disso tivemos um problema com futuro bom cursar engenharia deve analisar ao
o efeito sucção por causa do acúmulo optar pela carreira?
de água na areia. Tivemos de fazer um MAFFEI – Em qualquer profissão, o que
trabalho com a areia para deixar a fun- deve ser considerado é não se deixar
dação suspensa e só então renivelar o levar por ninguém, por maior que seja
edifício que tinha 2,2 graus de desnível. a fama ou o grau da pessoa, que não
No outro prédio, que fica atrás do pri- apresente um argumento racional e
meiro, como era mais largo e não dava lógico sobre qualquer tema. Em segun-
para fazer as estacas cavadas ao lado do sair dos apartamentos. Só saiam quan- do lugar é ser dedicado e ler muito, o
prédio, optamos por usar estaca raiz. E do estava macaqueando, porque tínha- que não é o caso hoje da maioria dos
aí fizemos outro sistema: cortei os pila- mos de ouvir algum estalido da estrutu- estudantes. Vou te dizer que muita
res e colocamos o macaco auxiliar. A di- ra e pedíamos para que todos saíssem gente que hoje trabalha na área de tu-
ficuldade era descobrir a carga correta. durante uma hora e depois voltavam. neis nunca leu um livro sobre o tema.
Fizemos então o seguinte: pegava cada Se você não tem memória também não
pilar e jogava uma determinada carga no ABECE – Considerando normas técni- terá um futuro bom. E nesse aspecto,
macaco. Se fosse fácil cortar o pilar, sig- cas, materiais e outros itens da cons- hoje as coisas estão piorando em razão
nificava que a carga colocada no macaco trução, o que mais evoluiu? Avança- do computador, pois ele te dará o re-
era grande demais. Se fosse difícil cortar mos mais em que? sultado da conta a partir das hipóteses
o pilar, significava que a carga colocada MAFFEI – Sem dúvida nenhuma que o apresentadas. O que precisamos ver é
era pequena. A gente acertava a carga, maior avanço foi em materiais. A evolu- se essas hipóteses são válidas.

52 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


INOVAÇÃO | IGREJA CRISTO OBRERO

A IGREJA DE ATLÂNTIDA
E SUA PROPOSTA
ESTRUTURAL.
O FASCÍNIO PELO LIMITE
HISTÓRICO DA CONSTRUÇÃO, NO FINAL DOS ANOS DE 1950,
E DOS ESTUDOS E ESFORÇOS PARA RECUPERAÇÃO E MANUTENÇÃO
DA IGREJA CRISTO OBRERO, LOCALIZADA NO URUGUAI

CARABALLO, CIRO;
LARRAMBEBERE, GONZALO;
PESCI, LUCÍA

DIVULGAÇÃO

53
INOVAÇÃO | IGREJA CRISTO OBRERO

A
arquitetura moderna atual-

DIVULGAÇÃO
mente está passando por um
processo de revisão, grande
parte dele baseado em planos
e documentos de pesquisas históricas
que explicam o processo como um todo.
Especialmente orientados para entender
o processo do pensamento e as circuns-
tâncias sociais por trás de sua gestação.
Um dos tópicos mais trabalhados é o que
está relacionado ao projeto estrutural
das superfícies em concha e lisas, nivela-
das com o uso de régua, construídas em
meados da década de 1950.
Uma recente concessão do programa1
Keeping It Modern – Fundação Getty – per-
mitiu uma profunda investigação sobre a FIG. 2 – OS TIJOLOS CERÂMICOS SÃO UNIDOS COM ARGAMASSA DE CIMENTO E AREIA
REFORÇADO ESTRUTURALMENTE COM BARRAS DE AÇO.
história e o projeto da Igreja2 Cristo Obrero,
A obra mais icônica do engenheiro uru-
guaio Eladio Dieste, realizada no ano pas- do dinheiro para sua construção não é das pelos engenheiros Dieste e Montañez,
sado. Para entender as características de fácil para uma modesta cidade operária. antes mesmo da fundação da empresa:
seu projeto, especialmente as estruturais, é Enquanto a captação de recursos é provi- Armazém Frugoni em Montevidéu (1955),
necessário responder a duas perguntas bá- denciada, com pequenas doações, sorteios Posto de Gasolina Cooper em Montevidéu
sicas: Por que essa igreja no pequeno povo- e loterias, o casal Giúdice-Urioste começa a (1957), Lavanderia Jung Lanas em Monte-
ado de Estación Atlántida? E por que Dieste? procurar um construtor capaz de erigir uma vidéu (1957), Clube de Remadores Merce-
construção bonita, porém não muito cara. des (1957), Armazéns Graneleiros BROU
em Colônia (1958), e o Depósito Carrau em
ANTECEDENTES DA Montevidéu (1959). Além disso, Dieste rea-
CONSTRUÇÃO


liza a TEM Factory S.A. em Montevidéu, o
O desenvolvimento de Atlântida como Ginásio Municipal de Dolores e o armazém
um resort praiano teve início em 1908 para rolos de papel do jornal El País, cuja
com um programa de reflorestamento A igreja Cristo foto estava na primeira página em 1956. Ao
impulsionado por uma corporação parti- mesmo tempo, está sendo desenvolvida3
cular: La Arborícora Uruguaya, que ativa a Obrero y Nuestra a projeção da igreja do Cristo Obrero. Con-
estação ferroviária local. Em 1911 a região vém mencionar que a Berlingieri House em
ao redor da estação era um projeto imo- Señora de Punta Ballena (1946) constituiu a primeira
biliário, quando teve início a construção
do hotel Atlântida e dos primeiros chalés
Lourdes se abóbada de tijolos reforçados (vão livre
de 6m). Ela foi construída em colaboração
no passeio à beira-mar. Entre as primeiras destaca por com o arquiteto catalão Antonio Bonet.
famílias estão os sobrenomes Urioste e O envolvimento de Dieste nesse pro-
Giúdice, figuras principais posteriormente sua resolução jeto é resultado de seu relacionamento
relacionadas com a Igreja Cristo Obrero. com o engenheiro Mario Bonaldi, e com
Em pouco tempo, a pequena cidade ao criativa estrutural, outros profissionais católicos, que haviam
redor da estação ferroviária passou a ter
uma escola, uma padaria e serviço médi-
construtiva, participado do projeto anterior da capela
de 1946 na Estación Atlántida. Em 1955 a
co. Uma população estável de trabalhado- formal e relação complexa com Dieste começa e
res fez desse seu espaço vital. No início da continua com altos e baixos, até a finali-


década de 1940, o casal Alberto Giúdice e espacial zação das contas administrativas da igreja
Adela Urioste compra o terreno e a casa em 1962. Dieste, que recentemente havia
onde é construída uma pequena capela. se convertido ao catolicismo4, considera
O casal Giúdice já estava transmitindo a esse projeto como um desafio pessoal, e
doutrina cristã na região e, em 1946, foi acaba se envolvendo em cada detalhe da
construída uma capela básica. No dia 25 Dieste é nomeado em 1955 por outros concepção planimétrica, do projeto estru-
de dezembro de 1949 a capela foi elevada engenheiros, para a construção de arma- tural, da supervisão da construção e da
a paróquia, o que impulsionou uma mu- zéns de tijolos de baixo custo, com um novo participação financeira. Ele se aprofunda
dança na pequena construção existente. sistema estrutural: telhados de cerâmica no projeto dos quatro componentes do
Uma nova igreja passa a ser um pensa- reforçada. Pelo menos seis construções complexo: A igreja, o batistério subterrâ-
mento constante, no entanto a obtenção em concha com dupla curvatura são erigi- neo, a torre do sino e a casa paroquial,

54 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


hoje demolida5. A concepção simbólica as menores elevações. Note que as traje- lisas niveladas com o uso de régua têm
de cada uma dessas peças é desenvolvida tórias desses membros elásticos não são uma espessura de 30cm. Elas são for-
em seus textos posteriores. linhas retas, mas catenárias com elevações madas por duas camadas contíguas de
A igreja Cristo Obrero y Nuestra Señora muito pequenas (7cm). Isso assegura que alvenaria sólida, que são unidas por uma
de Lourdes se destaca por sua resolução os membros elásticos permaneçam ocul- folha de argamassa estrutural.
criativa estrutural, construtiva, formal e tos dentro da abóbada. Como os impulsos As paredes laterais são fundamentadas
espacial. horizontais simétricos pressionam igual- sobre pequenos pilares (0,15m de diâme-
mente ambos os lados de cada membro tro) concretados in situ. Na área superior
DESCRIÇÃO DA IGREJA elástico, um neutraliza o outro. das paredes, onde a ondulação é mais
A igreja consiste de um templo, cuja Três camadas de alvenaria constituem profunda, pequenas janelas retangulares,
planta baixa é aproximadamente retan- a espessura das abóbadas. Cada camada com vidros coloridos, levam a luz natural
gular, um batistério subterrâneo circular tem seu tipo particular de alvenaria e sua por todo o altar. A partir da última onda
e uma torre do sino cilíndrica, três estru- função. A camada interior (intrados) tem na parede lateral esquerda, um nicho com
turas que foram construídas com cerâmi- tijolos sólidos e finos (12cm x 25cm, 2cm a forma de uma pirâmide truncada é pro-
ca reforçada, que é um ramo da alvenaria de espessura). A camada intermediária jetado para fora da construção: a Capela
reforçada, onde as unidades são tijolos tem tijolos ocos (25cm x 25cm, 8cm de es- Nossa Senhora de Lourdes.
cerâmicos sólidos ou ocos. Os tijolos pessura). Barras de aço reforçado são alo- As paredes da frente e de trás são es-
são unidos por argamassa estrutural de jadas nas juntas da argamassa, entre os truturalmente livres da cobertura e das
cimento e areia. O reforço estrutural do tijolos dessas duas camadas. A primeira paredes laterais. Elas apresentam uma
material composto é feito de barras de
aço colocadas nas juntas da argamassa.


Não foi encontrado o conjunto com-
pleto das plantas baixas originais da
construção. Portanto, não existem infor-
mações sobre alguns elementos estrutu- As três estruturas de igreja foram
rais. A descrição a seguir é baseada em
relatórios escritos ou orais de Dieste, nas construídas com tijolos cerâmicos
narrações do engenheiro Marcelo Sasson
(o principal assistente de Dieste por oca- unidos por argamassa estrutural
sião da obra), e em desenhos, fotos e tex-
tos disponíveis, além de algumas poucas
de cimento e areia, com reforço
amostras e pesquisas das estruturas. de barra de aço colocadas nas


A CONSTRUÇÃO PRINCIPAL juntas da argamassa
O templo tem apenas uma nave. Sua
planta baixa, aproximadamente retangu-
lar, tem 33m de comprimento e 16m de
largura. A altura da nave varia entre 7m
nas paredes laterais e 8,40m nos pontos e a segunda camadas de tijolos têm uma tipologia variada, com diferentes geo-
mais altos do eixo. finalidade estrutural. As duas são unidas metrias. A parede da frente, com a por-
Um conjunto contínuo de abóbadas de por meio de uma camada de argamassa. ta principal, tem trechos retos e curvos
dupla curvatura de cerâmica reforçada A camada externa (extrados) tem tijolos localizadas sob o nível do coro (mezani-
forma a parte superior. Essas abóbadas sólidos (12cm x 25cm, 2cm de espessura), no). Nesse nível existem três trechos de
têm diretriz catenária (curva plana). Seus de baixa densidade. Ela opera como iso- parede com protetores solares que se
vãos livres variam entre 13,20m e 18,80m ladora térmica e protetora mecânica. Ela alternam com janelas estreitas de ônix,
e suas elevações entre 0,07m e 1,40m. não tem qualquer papel estrutural. que permitem a passagem da luz solar do
Cada abóbada individual (barra) tem 6m Na pedra chave na abóbada que coin- norte para o templo. Dentro, os confes-
de largura. As cargas verticais das abó- cide com o presbitério um conjunto de sionários são colocados sob o menciona-
badas são suportadas por paredes em apenas janelas circulares deixam que a do mezanino, perto da parede da frente.
ambos os lados. Os impulsos horizontais luz natural recaia sobre o altar. Uma escada, construída com cerâmica
das abóbadas são transportados por duas As duas paredes laterais têm 7m de al- reforçada, leva ao coro, que tem um guar-
vigas horizontais curvas (placas curvas), tura. Elas são superfícies lisas niveladas da-corpo de tijolos perfurados.
que são presas à linha da mola das abóba- com o uso de régua, geradas pelo movi- A parede de trás é, em sua maior parte,
das. Ao mesmo tempo, essas vigas curvas mento de uma linha reta (geratriz) repou- lisa. Sua face interna apresenta tijolos de
transferem as cargas horizontais às barras sando sobre duas diretrizes: uma diretriz tipos diferentes. A área do altar, hierarqui-
de aço (membros elásticos) que estão alo- horizontal em linha reta ao nível do solo e zada por um Cristo de madeira entalhada,
jados dentro das abóbadas, nas catenárias uma diretriz horizontal ondulante coloca- é parcialmente circundada por uma pa-
mais baixas, ou seja, naquelas que têm da a uma altura de 7m. Essas superfícies rede baixa de tijolos reforçados. Atrás do

55
INOVAÇÃO | IGREJA CRISTO OBRERO

altar há duas salas que correspondem à mente sobre rodas e verticalmente por
PAREDES LATERAIS
sacristia e à sala anterior à sacristia. meio de macacos mecânicos. O molde
ONDULADAS tinha quatro torres que seguravam uma
O BATISTÉRIO As duas paredes são de superfícies estrutura curva coberta por uma camada
O batistério é uma construção subter- lisas, niveladas com o uso de régua, o de madeira.
rânea localizada do lado de fora da nave. que normalmente é gerado por uma li- Os tijolos da cúpula foram posiciona-
Uma parede circular (com 4,52m de diâme- nha reta móvel (geratriz) em contato com dos na camada de madeira, cada um em
tro e 2,26m de altura) é coberta por uma duas diretrizes. Durante seu movimento, seu lugar planejado. Após o término da
cúpula esférica de tijolos reforçados. No a geratriz mantém um pequeno ângulo construção da barra, a cúpula atingiu a
alto da cúpula uma claraboia cilíndrica per- variável com a direção vertical. Portanto, resistência exigida em algumas horas
mite que a luz natural recaia sobre a pia ba- as paredes poderiam ser erigidas sem o (entre 12 e 24 horas, conforme a tempe-
tismal. A estrutura é fundamentada sobre uso de formas. Para isso, as diretrizes fo- ratura). Então o molde podia ser baixado
pequenos pilares de concreto colocados ram dispostas e construídas com estru- para ser movimentado horizontalmente
sob a parede redonda. Vindo de fora, você turas de madeira: a parede lisa ao nível (sem colidir com a nova barra de tijolos).
pode entrar no batistério passando por do solo e a ondulada a uma altura de 7m. Até a posição da próxima barra. Ali, o
uma escada e um corredor subterrâneo.
Desde o batistério, um segundo corredor


e uma escada levam ao interior da igreja.

A TORRE DO SINO O plano de preservação da Cristo


Uma torre de tijolos perfurados re-
forçados (2,80m de diâmetro e cerca de Obrero exige um entendimento
15m de altura) é coroada por uma cúpula
cônica a partir da qual é instalado o sino. prévio da complexidade das
Uma escada interna helicoidal com de-
graus de tijolos em balanço une a parte estruturas e de como elas foram
interior ao sino.
projetadas e construídas, assim como
PROCEDIMENTOS DA
um diagnóstico do atual estado de
CONSTRUÇÃO


A construção da igreja foi realizada du- preservação dos componentes
rante os anos de 1958 e 1960. Não existem
informações em detalhes sobre alguns dos
métodos usados. No entanto, recorrendo
às mencionadas fontes de informação, en-
contramos as características básicas das Os pontos respectivos das duas diretri- molde era levantado para iniciar um novo
técnicas de construção. A seguir, são apre- zes foram ligados com fios. Finalmente, ciclo. O molde tem dois ailerons dobrá-
sentados alguns dos processos.6 as paredes foram erigidas tangencial- veis nas duas extremidades para evitar
As estruturas são fundadas sobre pe- mente em relação às superfícies geradas colidir com as ondulações da parede du-
quenos pilares concretados in situ (0,15m pelos fios. Cada parede ondulada consis- rante seu deslocamento horizontal.
de diâmetro e uma profundidade efetiva te de duas camadas adjacentes de tijolos
entre 4m e 6,5m). Não é possível termos que foram construídas ao mesmo tempo. TORRE DO SINO
certeza sobre o tipo de equipamento de A torre tem tanto paredes de superfície
empilhamento que foi empregado. Não COBERTURA lisa niveladas com o uso de régua quanto
obstante, não há dúvida sobre o fato Cinco faixas e meia de tiras de cúpulas de revolução. Ela foi construída sem mol-
de que o equipamento foi projetado e de dupla curvatura formam a cobertura des, seguindo um procedimento similar
desenvolvido por Dieste, que tinha uma do templo. A ideia central era: executar ao usado nas paredes laterais onduladas.
grande experiência em projetar e realizar uma cúpula (barra), cujo molde pudes- Uma diretriz circular foi colocada ao nível
pilhas e equipamento de empilhamento. se ser retirado rapidamente e reusado chão (na barra de fundação circular). Uma
para formar a barra seguinte. Isso foi segunda diretriz circular, com o mesmo
BATISTÉRIO realmente possível porque um arco cate- diâmetro, estava sendo posicionada em
Uma escavação circular foi executada nário (curva plana) apoiado em suas ex- níveis crescentes, de acordo com a ele-
para alojar o batistério subterrâneo. Então tremidades e sujeito a seu próprio peso vação da torre. Pontos apropriados de
foi construída uma parede cilíndrica de ti- suporta tensões de pura compressão, o diretrizes inferiores e superiores foram
jolos, sem o uso de moldes. A cúpula foi que estabiliza a estrutura e permite a re- ligados a um conjunto de fios, que forma-
construída em uma forma de madeira. A su- moção precoce do molde. Com esse ob- ram uma superfície auxiliar. Os tijolos da
perfície do piso foi feita com um conjunto de jetivo foi construído um molde itinerante. torre foram colocados tangencialmente à
círculos concêntricos de tijolos trapezoidais. Ele podia ser movimentado horizontal- superfície auxiliar.

56 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


DESAFIOS DA DETERIORAÇÃO tes sintomas de patologias e deteriorações rio, foi identificado um sério problema,
existentes. De acordo com a pesquisa visual, que foi o vazamento da água subterrânea
A igreja Cristo Obrero y Nuestra Señora foram planejados testes de campo e a reti- que inunda o local. Isso produz corrosão
de Lourdes faz parte da herança arquite- rada de amostras. Embora os testes, em sua e também destacamentos na argamassa
tônica. A obra foi reconhecida por seus maioria, não fossem destrutivos, também e nos tijolos. No caso do nicho a corrosão
atributos técnicos, estéticos e simbólicos foram realizados alguns testes destrutivos, do reforço de aço causou um severo en-
que a distinguem de outras construções como a determinação da resistividade elé- fraquecimento da estrutura e, portanto,
com a mesma funcionalidade. Como uma trica, (essenciais para o diagnóstico). Neste exige uma restauração urgente.
valiosa construção que é uma herança último caso o número de testes que seriam
arquitetônica, há um forte interesse e um realizados foi limitado a um mínimo, em lo-
MEDIDAS PARA A
grande desafio em sua preservação. cais específicos, para preservar a constru- PRESERVAÇÃO
A implantação de um plano de preser- ção estruturalmente e esteticamente. Após o término do estágio do diag-
vação para assegurar a materialidade físi- nóstico e da análise dos resultados, foi
ca da igreja exige um entendimento prévio RESULTADOS implantado um plano de medidas para a
da complexidade das estruturas, como Observações relativas às característi- preservação. Um projeto de restauração
elas foram projetadas e construídas, bem cas físicas e mecânicas dos materiais: com um objetivo específico foi associa-
como um diagnóstico do estado atual de • Forte presença de reforço de aço em do a cada problema detectado. Foram
preservação dos componentes da cons- todos os componentes da estrutura estabelecidas as prioridades (possibi-
trução. No caso da Igreja Cristo Obrero, • Coberturas de reforço de má qua- lidade de execução a curto, médio ou
medidas de pesquisa, diagnóstico e pla- lidade que permitem a entrada de longo prazo) e foram especificadas as
nejamento de preservação foram reali- umidade e a consequente corrosão atividades, os recursos necessários e as
zados por uma equipe multidisciplinar, • Existência de algumas argamassas exigências financeiras. Foi redigido um
trabalhando para o Programa “Keeping It porosas que também facilitam o in- manual de manutenção, especificando o
Modern” da Fundação Getty. gresso da umidade e o progresso do ciclo de manutenção para cada compo-
O primeiro estágio do plano de preser- aumento de carbono nente da construção. Esse manual tam-
vação consistiu de uma pesquisa documen- • Os tijolos da construção têm uma den- bém estabelece a frequência da execu-
tária da igreja. Seu objetivo foi conhecer a sidade mais alta, menos absorção de ção e as responsabilidades.
fundo o projeto e o processo da constru- água e menos sucção capilar do que os As principais medidas para a preser-
ção. A pesquisa foi baseada em registros fo- tijolosquesão,frequentemente,ofereci- vação são atribuídas à restauração da
tográficos, desenhos, anotações, fragmen- dos atualmente no mercado. cobertura e das paredes laterais, da
tos de relatórios de cálculos, publicações e Observações relativas à identificação, frente e de trás. Foram propostos tam-
entrevistas com técnicos e operários, que ao registro e à análise de patologias de bém projetos para solucionar a drena-
haviam participado no projeto e na cons- materiais, componentes e estrutura: gem do batistério e restaurar o nicho e
trução. O novo desenho de plantas baixas • Erosão da argamassa, desgaste do ti- os degraus da torre do sino. A formula-
e da construção de modelos provou ser um jolo, eflorescência, corrosão, exposi- ção dessas recomendações é essencial
apoio essencial para as fases seguintes. ção dos reforços de aço, vazamento para assegurar a implantação de méto-
de umidade. dos racionais de preservação, específi-
DIAGNÓSTICO • Rupturas da camada impermeável cos para esse projeto.
Era necessária uma pesquisa sobre os • Existência de musgo, liquens, fungos,
processos naturais de decadência e suas mofo, umidade capilar. NOTAS FINAIS
causas. Os resultados permitiriam sugerir • Danos na superfície dos tijolos, si- 1 http://www.getty.edu/foundation/ini-
medidas preventivas para manter a he- nais de perda de resistência à com- tiatives/current/keeping_it_modern/
rança arquitetônica em bom estado. Esse pressão. 2 Estación Atlántida, Departamento.
estágio foi desenvolvido por professores Com base nos resultados obtidos, con- Canelones, entre 40 km a leste de
das Faculdades de Arquitetura e Engenha- cluiu-se que os materiais e os sistemas Montevidéu.
ria da Universidad de la República. Consul- construtivos aplicados à igreja apresenta- 3 “Bóveda nervada de ladrillos de espe-
tores estrangeiros também participaram vam um desempenho adequado. Eles, de jo”. Revista de ingeniería, 473 (1947):
na pesquisa, visitaram a igreja e comparti- modo geral, atendem às exigências mecâ- 510-112; Revista de ingeniería, 583
lharam experiências valiosas O estágio do nicas e de durabilidade às quais são sub- (1956): capa.
diagnóstico foi organizado em duas fases: metidos. No que diz respeito aos reforços 4 Dieste veio de uma família de ateus
• Análise das características físicas e de aço, foram verificados diferentes casos e foi batizado na fé católica em sua
mecânicas dos materiais de acordo com suas localizações na cons- meia idade.
• Identificação, registro e análise de trução: em alguns locais eles não mostram 5 A casa paroquial foi demolida alguns
patologias, componentes e estrutura sinais de corrosão, mas são susceptíveis anos mais tarde para a construção de
do material. a ser corroídos enquanto que em outras uma escola católica.
Inicialmente foram realizados uma pes- áreas a corrosão já pode ser observada. 6 Para um melhor entendimento, a des-
quisa visual e um registro fotográfico das es- O batistério e o nicho mostraram os crição mantém a mesma ordem cro-
truturas. O objetivo era identificar diferen- danos mais severos. No caso do batisté- nológica da construção.

57
VALORIZ AÇÃO PROFISSIONAL | CAPACITAÇÃO PAR A EL ABOR AÇÃO DE ORÇAMENTO

ESTÁ NA HORA
DA VIRADA
É FUNDAMENTAL CAPACITAR O PROFISSIONAL DA ÁREA DE
PROJETOS A APRIMORAR SUAS HABILIDADES NA HORA DE
AVALIAR SEUS CUSTOS E FAZER ORÇAMENTOS. ELE PRECISA
APRENDER A GANHAR DINHEIRO

A
POR ROBERTO DIAS LEME * o longo de sua trajetória, a A discussão se arrasta pelos meus
ABECE vem conseguindo uma mais de 30 anos de profissão e sempre se
expressiva valorização, sendo diz que só a “lei da oferta e procura” pode
nossa associação reconhecida solucionar a questão e, como temos vis-
nacionalmente por sua atuação na va- to nos últimos anos, a situação melhorou
lorização da atividade de projeto de es- um pouco, mas está longe do patamar
trutura. Produzimos palestras técnicas, que seria adequado.
seminários e workshops para atualização Os engenheiros, em especial o proje-
de nossos engenheiros; atuamos em re- tista estrutural, é um ser extremamente
visões de normas, premiamos, em con- técnico e não consegue aliar a técnica ao
junto com a Gerdau, o arrojo e a técnica seu bem-estar financeiro mínimo para,
do projetista por intermédio do Prêmio pelo menos, ter uma velhice tranquila.
Talento Engenharia Estrutural; represen- Devemos repensar e fazer palestras
tamos nossa classe durante discussões e workshops para ensinar o projetista a
sobre vários problemas nacionais; forma- avaliar seus custos e fazer orçamentos;
mos parcerias com universidades e com enfim, aprender a ganhar dinheiro.
diversas entidades representativas da Não podemos esperar qualquer reco-
cadeia construtiva, entre diversas outras nhecimento por parte de nossos contra-
ações. tantes, pois, para estes, nosso serviço é
Está na hora de darmos uma virada e custo de obra, sendo a obra o fardo que
mudarmos o patamar de remuneração nossos contratantes têm de arcar e seu
de nossos projetos e, consequentemen- investimento prioritário é em vendas e
te, valorizar o engenheiro estrutural, que propaganda, onde não se discute “centa-
cada vez mais assume responsabilidades vos”, como é em nosso caso.
e trabalho e não consegue uma remune- Imaginemos um grande absurdo como
ração adequada para seu serviço. uma greve dos projetistas estruturais;
A ABECE produziu tabelas de referên- isto é, sem entregas de projeto por três
cia para honorários mínimos, mas o que meses. Seria o caos. Pararia toda a cadeia
observamos é uma disparidade mons- da construção civil, seriamos recebidos
truosa de preços pelo Brasil afora, com para negociar até pelo Presidente da Re-
variações de 10 vezes e, em alguns casos, pública no Palácio do Planalto.
(*) Diretor Administrativo e Financeiro da chegando até 20 vezes a diferença entre Está na hora de refletirmos e tentar-
ABECE orçamentos. mos uma mudança de patamar.

58 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


NOTAS E E VENTOS

NOVA DIRETORIA DA ABECE

F
ormado na turma de 1985 da FESP Engenharia Estrutural 2004, Prêmio Des- seus associados e do bem-estar da so-
– Faculdade de Engenharia São taques ABECE 2012, menção honrosa do ciedade, procurando que o produto do
Paulo, o engenheiro João Alberto de Prêmio “Obra do Ano 2013” da ABCIC (As- trabalho desenvolvido por nossa cate-
Abreu Vendramini assume a dire- sociação Brasileira da Construção Indus- goria seja valorizado, desenvolvido com
ção da ABECE para o período 2018-2020. trializada em Concreto) e Prêmio Tilt-Up qualidade, possibilitando obras duráveis,
Iniciou sua carreira na área industrial e Achievement Award pela TCA – Tilt-Up seguras, econômicas e de baixo custo de
de processos, onde acumulou sólido co- Concrete Association em 2014. manutenção, associadas às melhores e
nhecimento sobre rotinas de produção e Ao assumir a direção da entidade, mais modernas técnicas executivas, pro-
do funcionamento das indústrias. Desde salientou que a ABECE deve sempre piciando a nossos clientes maximização
1989 é diretor técnico da Vendramini En- “trabalhar na defesa dos interesses dos e otimização de resultados”.
genharia. É professor do cur-
so de pós-graduação em Es- COMPOSIÇÃO DA DIRETORIA COMPOSIÇÃO DA DIRETORIA
truturas de Concreto Armado PRESIDENTE FINANCEIRO
para Edifícios da FESP e tam- JOÃO ALBERTO DE ABREU VENDRAMINI DIRETOR – ROBERTO DIAS LEME
bém possui especialização em RELACIONAMENTO CONSELHO DELIBERATIVO 2018 A 2022
estruturas pré-moldadas de VICE-PRESIDENTE – ÊNIO CANAVELLO BARBOSA FLÁVIO CORREA D'ALAMBERT
DIRETOR – TÚLIO NOGUEIRA BITTENCOURT MARCELO ROZENBERG
concreto pela Universidade DIRETOR – RICARDO BORGES KERR MARCOS DE MELLO VELLETRI
Federal de São Carlos. DIRETOR ADJUNTO – RAFAEL TIMERMAN MARCOS MONTEIRO
Atuou como Coordena- TECNOLOGIA VALDIR SILVA DA CRUZ
dor da Comissão de Estudo VICE-PRESIDENTE – LUIZ AURÉLIO FORTES DA SILVA JEFFERSON DIAS DE SOUZA
DIRETOR – CLÁUDIO ADLER RICARDO FRANÇA
de Cargas para o Cálculo de
DIRETOR – TOMAS VIEIRA JOÃO LUIZ CASAGRANDE
Estruturas de Edifícios (CE-
DIRETOR ADJUNTO – RODRIGO NURNBERG CONSELHEIRO DELIBERATIVO 2016 A 2020
02:124.11), tendo sido respon-
MARKETING AUGUSTO G. PEDREIRA DE FREITAS
sável por produzir o texto-ba- BRUNO CONTARINI
VICE-PRESIDENTE – LEONARDO BRAGA PASSOS
se da revisão da ABNT NBR DIRETOR – JOSÉ MARTINS LAGINHA NETO EDUARDO BARROS MILLEN
6120:1980 Cargas para o cál- DIRETOR – TIAGO GARCIA CARMONA FRANCISCO PAULO GRAZIANO
DIRETOR ADJUNTO – JOSÉ AUGUSTO ÁVILA JULIO TIMERMAN
culo de estruturas de edifica-
JOSÉ AUGUSTO DE ÁVILA
ções. Ganhou vários prêmios DIRETORIA DE NORMAS TÉCNICAS NATAN JACOBSOHN LEVENTAL
e homenagens, como menção DIRETORA – SUELY B. BUENO NELSON COVAS
DIRETOR ADJUNTO: ALIO KIMURA VIRGÍLIO AUGUSTO RAMOS
honrosa do Prêmio Talento

COMITÊ TÉCNICO ESTUDA RECOMENDAÇÕES


PARA FIXADORES QUÍMICOS

C
riado há cerca de dois anos pela os intervenientes de uma obra (proje- níveis. “As fixações com chumbadores
ABECE, o Comitê Técnico que tistas, fabricantes e aplicadores) são químicos se disseminaram na constru-
estuda questões relacionadas a evitados erros de especificação e de exe- ção de forma ampla em função de sua
regulamentação do uso de fixa- cução, por meio da definição de regras execução rápida, limpa e racional”, ob-
ção com chumbadores químicos em con- claras a serem observadas nas várias fa- serva Carmona.
creto, está finalizando um texto que fará ses do processo construtivos”, comenta De acordo com o engenheiro, o Brasil
uma série de recomendações técnicas Tiago Carmona, coordenador do Comitê vem acompanhando com agilidade a evo-
das melhores práticas para o uso destes da ABECE. lução dos sistemas de fixação com chum-
elementos em projetos e obras. Numa Na avaliação de vários projetistas, badores químicos. “Novos materiais são
etapa posterior, tais recomendações po- normatizar sistemas de ancoragem em apresentados ao mercado da construção
derão se transformar numa futura nor- concreto implica em aumentar o nível pelos representantes das multinacionais
ma técnica. de exigência no que diz respeito a qua- que pautam o desenvolvimento desta
“Uma provável e futura norma técni- lidade de produtos e na execução dos tecnologia”, diz. Nesse sentido, Carmona
ca representaria uma evolução técnica projetos. Para Carmona, com uma nor- salienta que, ao criar o Comitê Técnica, a
fundamental em processos construtivos ma, seria possível dimensionar e exigir ABECE reforça seu papel de disseminar
que, em alguma de suas etapas, utilizam mais dos fornecedores e instaladores, o tecnologia e boas práticas construtivas. “A
as fixações. Ao se consolidar premissas que manteria um nível mínimo de quali- constatação de erros construtivos, a falta
técnicas mediante um consenso entres dade de materiais e informações dispo- de critérios claros de projeto e até mesmo

59
NOTAS E E VENTOS

o registro de acidentes envolvendo este cuida da análise dos pontos as serem seu escopo é bem abrangente e ela se
tipo de fixação, motivaram a criação do revistos já definiu o cronograma de reu- relaciona com outras normas. Apenas
Comitê”, informa. niões. O objetivo, segundo o engenheiro em sua primeira parte, são listadas 63
Por fim, Carmona afirma que o traba- Augusto Pedreira de Freitas, relator da normas nacionais e 29 internacionais.
lho do Comitê contribuirá, de forma de- revisão na parte de estrutura da Norma, Primeira norma a tratar da qualidade
cisiva, na regulamentação da prática, de- é “avaliar todos os pontos da Norma que dos produtos da construção civil, bem
finindo tipologias de materiais, situações envolvam elementos estruturais”. como de sua utilização pelos usuários,
recomendáveis de aplicação e rotinas Ao longo do processo, o grupo fará um ela acabou se tornando um dos prin-
de cálculo/projeto. “Processos constru- criterioso estudo do que necessita ser cipais indicadores de desempenho de
tivos com respaldos normativos estabe- alterado, excluído ou acrescentado em uma edificação.
lecem requisitos mínimos de segurança todos os aspectos relativos a estrutura. Como a Norma incluiu em seu escopo
e desempenho em serviço, objetivando Além de Augusto, outro representante da exigências quanto a qualidade posterior
a qualidade final da construção e prote- ABECE na Comissão que elaborará a revi- a entrega da obra, isso demanda dos
gendo a sociedade”, conclui. são é o engenheiro Ricardo França, asso- profissionais da área de engenharia um
REVISÃO NORMA DE DESEMPENHO ciado e membro do Conselho da entidade, maior conhecimento e rigor na escolha
– Com a perspectiva de concluir até mea- que atua como consultor da Norma. Am- dos materiais utilizados na construção,
dos de 2019 os trabalhos de revisão da bos serão responsáveis pelos itens rela- maior cuidado na concepção dos proje-
ABNT – NBR 15.575 Norma de Desempe- cionados a parte de Estrutura da Norma. tos e, principalmente, adoção de crité-
nho de Edificações, em vigor desde julho O trabalho de revisão da 15.575 deve rios mínimos determinados pelas nor-
de 2013, o grupo de profissionais que ser longo e bem complexo, uma vez que mativas.

ABECE É A MAIS NOVA INTEGRANTE DA IABMAS

A
ABECE passa a fazer parte da engenheiro Túlio Nogueira Bittencourt, ção pelo Grupo Brasileiro IABMAS da 8ª
IABMAS – International Asso- diretor da ABECE e um dos fundadores, Conferência Internacional sobre Manu-
ciation for Bridges Maintenan- em 2013, do Grupo Brasileiro IABMAS tenção, Segurança e Gestão de Pontes,
ce and Safety, associação cujo (Brazilian IABMAS Group – BIG) organizada no ano de 2016, em Foz do
principal objetivo é promover a coopera- Segundo o engenheiro Túlio, com sua Iguaçu/PR e que foi promovida em nome
ção internacional na difusão de conheci- destacada atuação na área da engenha- da IABMAS. A expectativa dos dirigentes
mento e informações a respeito da ma- ria estrutural brasileira, a ABECE poderá da ABECE é que agora, por fazer parte da
nutenção, segurança e gestão de pontes. contribuir de forma decisiva para a dis- entidade, a entidade poderá intensificar
A iniciativa para o ingresso da ABECE, seminação de conhecimento na área de a promoção de eventos dessa natureza,
como membro coletivo, nessa impor- manutenção e segurança estrutura de auxiliando na disseminação de conheci-
tante entidade internacional partiu do pontes. Uma prova disso foi a realiza- mentos nessas áreas.

ABECE PARTICIPOU DO MINASCON 2018


COM DUAS PALESTRAS

A
valiação Técnica de Projetos – Fi- 6.118:2014, das recomendações da ABECE, tes do momento para a construção civil
nalidade, Conceitos, Diretrizes e além das razões, vantagens e custos de se e a sociedade em geral. Importantes te-
Recomendações ABECE para ATP fazer ATP. Já na segunda palestra, ele deta- mas como os ligados à sustentabilidade
e Ensaios não Destrutivos em lhou os métodos de ensaio, falou da utiliza- fazem parte dos debates, levando em
Estruturas de Concreto, foram as duas ção dos mesmo em estruturas novas e an- conta o cenário da construção e todas as
palestras proferidas pelo engenheiro tigas (retrofit), das limitações de utilização implicações do tema.
Leonardo Braga Passos na abertura do dos equipamentos, e como alguns ensaios Promovido pela FIEMG (Federação das
Seminário de Estruturas em Concreto, não destrutivos podem auxiliar no atendi- Indústrias do Estado de Minas Gerais), é
promovido pela ABECE durante o Minas- mento à Norma de Desempenho. aberto ao público em geral e tem como
con 2018, evento unificado da constru- O tradicional Minascon é um evento perfil de seus visitantes lojistas e atacadis-
ção civil promovido, no fim de setembro, unificado da Construção Civil e ponto de tas; arquitetos, engenheiros, administrado-
em Juiz de Fora-MG. encontro entre todos os envolvidos na res de condomínio, profissionais da cons-
Na primeira intervenção, o palestrante, cadeia produtiva do segmento. Envol- trução em geral, designers de interiores,
que é diretor da ABECE, tratou de aciden- ve um conjunto de mostras e palestras, decoradores e paisagistas; construtores,
tes estruturais, do item 5 da ABNT NBR que trazem os assuntos mais importan- empreiteiros e estudantes de áreas afins.

60 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


DIVULGAÇAO IBRACON
PLATEIA DO 60º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO, PROMOVIDO PELO INSTITUTO BRASILEIRA DO CONCRETO
E QUE REUNIU 1.189 PARTICIPANTES

60º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO


BATE RECORDE DE PARTICIPANTES

C
om a presença de 1189 partici- abertura pelo seu presidente Jefferson sidade de Leeds (Inglaterra), além de um
pantes de quase todos os esta- Dias de Souza Júnior. estudo do professor Roberto Stark, da
dos brasileiros e de 15 países, foi Segundo organizadores, o objetivo do Universidade Nacional do México, emba-
realizado, de 17 a 21 de setem- Congresso Brasileiro do Concreto é divul- sando a tese de que o concreto é o mate-
bro, o 60º Congresso Brasileiro do Con- gar as pesquisas científicas e tecnológicas rial construtivo do futuro.
creto, evento técnico-científica promovi- sobre a tecnologia do concreto e seus Já entre aos eventos paralelos realiza-
do pelo Instituto Brasileiro do Concreto sistemas construtivos. “É o fórum onde dos no CBC, destaque para: a Terceira
(IBRACON). “Os números corroboram se celebra a tecnologia e o conhecimen- Conferência sobre Barragem, realizada
ser o Congresso Brasileiro do Concreto o to sobre o concreto, material construtivo a cada três anos; segunda edição do
maior evento nacional de discussões so- mais consumido no mundo”, resumiu a Seminário sobre Segurança de Estrutu-
bre o concreto e seus sistemas construti- professora Edna Possan, da Universidade ras em Situação de Incêndio; Seminário
vos, ao bater, em sua sexagésima edição, Federal da Integração Latino-Americana sobre Laboratórios na Garantia da Qua-
os recordes das edições anteriores”, co- (Unila), e que faz parte da comissão orga- lidade Concreto e Construção; Mesa-Re-
mentou o presidente do IBRACON, enge- nizadora regional do evento. donda Centrais Dosadoras X Centrais
nheiro Julio Timerman, durante a soleni- Os destaques na programação do Misturadoras; Seminário Boas Práticas
dade de abertura do encontro, realizado encontro, que teve recorde de público, na Execução de Estruturas de Concreto;
em Foz do Iguaçu-PR. foram as conferências plenárias de pes- e Seminário de Novas Tecnologias, com
O 60º CBC teve a participação de en- quisadores estrangeiros e os eventos estudos de casos de produtos e obras
genheiros, profissionais técnicos de es- paralelos. Entre as pesquisas e estudos de várias empresas.
critório de projeto, laboratórios, constru- apresentados, destacam um estudo Fizeram parte ainda da extensa pro-
toras, empresas de energia, fabricantes sobre perfis de cloreto nas peças de gramação do Congresso do IBRACON
de equipamentos e componentes do concreto armado, feito pelo Centro de lançamentos de livros técnicos e da
concreto, concreteiras, indústrias de pré- Pesquisas Estudos Avançados do Ins- Prática Recomendada Guia da Preven-
-fabricação, pesquisadores, estudantes tituto Politécnico Nacional, do México; ção Álcali-Agregado, como também as
de engenharia, além de órgãos gover- mecanismo físico-químico de formação e reuniões dos comitês técnicos e das re-
namentais e representantes de associa- distribuição dos produtos hidratados do vistas do IBRACON, além de cursos de
ções ligadas à indústria da construção, principal componente do cimento, apre- atualização profissional, concursos es-
como a ABECE, representada na mesa de sentado por um pesquisador da Univer- tudantis e premiações.

61
NOTAS E E VENTOS

EM MEMÓRIA

JORGE ZAVEN KURKDJIAN

D
escendente de armênios, Jor- co de ativos do plano Collor, em 1990, Essas características pessoais, alia-
ge Zaven Kurkdjian sempre foi teve que buscar forças para manter o das a um profundo conhecimento
fiel às tradições de suas raí- escritório funcionando. Nessa época, técnico tanto de estruturas de aço
zes: formou-se em 1966 pela já contava com a colaboração eventual quanto de concreto e de madeira pos-
Faculdade de Engenharia Mackenzie, do amigo Julio Fruchtengarten, com sibilitaram que o escritório firmasse
abraçando a especialidade de cálculos quem acabou se associando em 2000, parcerias duradouras com os mais re-
estruturais na Engenharia Civil. tendo ingressado mais recentemente nomados arquitetos do Brasil; o resul-
Ainda estudante e assessorado pelo na sociedade os filhos Roberto e Jairo tado é uma série de obras marcantes
irmão Jorge Kurken Kurkdjian, então Fruchtengarten. que contaram com sua participação,
professor de estruturas de aço do Mac- O Jorge Zaven tinha uma personalida- sendo algumas mais recentes o San-
kenzie e engenheiro de projetos estru- de marcante; seu gênio alegre, sua vas- tuário Theotokos, a sede do SEBRAE
turais do Escritório Técnico Arthur Luiz ta cultura e a diversidade dos assuntos em Brasília, o Pórtico da Praça do Pa-
Pitta, já desenvolvia em casa alguns pro- que o interessavam (fotografia, música, triarca em São Paulo, as unidades do
jetos. Com o aumento do volume de tra- pintura,...) tornavam o convívio com ele SESC Belenzinho, Santo Amaro, 24 de
balho e após a conclusão do curso de muito fácil e as relações pessoais du- Maio e Jundiaí, o Teatro Cultura Artís-
engenharia, ambos decidiram criar um radouras. Amava a profissão e tratava tica, o Cais das Artes em Vitória e tan-
escritório próprio, situado à rua Bento com grande respeito e admiração os tas outras.
Freitas, próximo dos escritórios de mui- arquitetos com quem trabalhava, pro- Jorge Zaven faleceu no final de abril
tos arquitetos com os quais passaram curando sempre conciliar os requisitos de 2018, aos setenta e cinco anos, dei-
a trabalhar. O escritório foi crescendo estruturais com os arquitetônicos. Aca- xando muitos amigos e uma grande
e em 1978 mudou-se para uma nova bou formando uma vasta biblioteca, lacuna em nosso meio técnico.
sede no Morumbi, onde está até hoje. com ênfase na literatura voltada para
Com a morte do irmão em 1989 e a soluções estruturais inovadoras e sua Depoimento cedido por Julio Fruchtengarten,
subsequente crise gerada pelo confis- evolução ao longo dos anos. amigo e sócio de Jorge Zaven Kurkdjian

PÉRICLES BRASILIENSE FUSCO

C
omo ele mesmo disse em uma maior nessa direção veio com o con- considerado fundamental pelos pro-
de suas últimas entrevistas, vite para ser assistente do professor jetistas. Além disso, participou da for-
concedida à revista ESTRU- Nilo Amaral, na cadeira de concreto mulação de diversas normas técnicas
TURA: nasceu para ser enge- da Poli e, mais tarde, quando passou a ao longo de mais de 60 anos de ativi-
nheiro. Prova disso é que o professor dar aulas de estabilidade das constru- dade profissional. O professor Fusco
Péricles Brasiliense Fusco, antes mes- ções e de estruturas metálicas na FEI era um entusiasta das inovações – em
mo de concluir o curso na Escola Poli- (Faculdade de Engenharia Industrial). meados dos anos de 1980 estimulou a
técnica da Universidade de São Paulo Em paralelo, mantinha seu escritó- montagem de um curso de computa-
(turma de 1952), já havia projetado seu rio de projetos, atuando em diversas ção no Departamento de Engenharia
primeiro edifício, quando fazia estágio obras, tendo se especializado em en- Civil da Poli –, e tinha uma preocupa-
no escritório de engenharia estrutural genharia pesada para o setor indus- ção quase obsessiva com o ensino no
de Paulo Franco Rocha. trial. Comandou, entre outras obras, o país. Tanto que trabalhava num novo
A partir de então, a vida desse pau- projeto do segundo alto forno da Co- livro onde tratava, principalmente, da
listano, filho de pai médico e mãe pro- sipa – Companhia Siderúrgica Paulista, falta de uma atenção especial sobre
fessora, foi marcada por uma suces- construções para a CBA – Companhia a “arte de aprender”. Como sua inten-
são de conquistas, pois no mesmo ano Brasileira de Alumínio, estações da li- sa vida demonstra, o professor Fusco
em que se formou, também iniciava nha norte-sul do metrô paulistano e a deixou, ao falecer no final de julho des-
suas atividades acadêmicas, ao ser Usina Hidrelétrica de Itaipu. te ano, um legado não só para a En-
convidado para trabalhar na área de No plano acadêmico, além das aulas, genharia brasileira, mas ensinamentos
estruturas do Instituto de Pesquisas escreveu 13 livros, incluindo “Técnicas que ainda serão úteis para todos os
Tecnológicas (IPT). Um impulso ainda de Armar as Estruturas de Concreto”, brasileiros.

62 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


EM MEMÓRIA

GABRIEL OLIVA FEITOSA

N
ascido em 1926 e formado corado com inúmeros prêmios em re- cursos de aperfeiçoamento nos Esta-
em Engenharia Civil pela Es- conhecimento ao seu trabalho e atua- dos Unidos e Suíça. Trabalhou no Gru-
cola Politécnica da Universi- ção, entre eles as medalhas de ouro do po Paredes de Concreto, coordenando
dade de São Paulo em 1952, Instituto de Engenharia como coorde- a área de sustentabilidade. Foi respon-
Gabriel Oliva Feitosa especializou-se nador da Divisão Técnica (Estrutura) sável por mais de 15 milhões de m3 de
em cálculos estruturais. Após uma ex- mais atuante nos biênios 1967/1968 e concretos aplicados.
periência com alguns colegas de turma 1969/1970; Prêmio “Emílio Baumgart” Durante toda sua trajetória profissio-
montou o Escritório Técnico Feitosa e recebido do Ibracon (Instituto Brasilei- nal sempre teve participação ativa na
Cruz. Entrou na recém-criada Divisão ro do Concreto), no ano de 1993, além área de Normalizações técnicas, tendo
de Estruturas do Instituto de Engenha- do Prêmio Personalidade Engenharia coordenado a elaboração das Normas
ria, em São Paulo, e foi eleito por acla- Estrutural concedido pela ABECE em NBR 7212 e NBR 8953. Além disso, sem-
mação para a coordenação da Divisão, 2005. O engenheiro Feitosa faleceu dia pre foi um grande articulador das ati-
na qual permaneceu por 25 anos. Na 4 de setembro, aos 92 anos. vidades relacionadas com a engenharia
ABECE, foi conselheiro em sucessivas de forma geral em várias entidades,
gestões, de 1994 a 2008, tendo sido ARCINDO VAQUERO Y MAYOR – entre elas a ABECE, da qual era presen-
condecorado com o título de Associa- Também em setembro, a engenharia ça marcante em eventos e reuniões.
do Honorário em 2002. brasileira perdeu Arcindo Vaquero Y Teve atuação destacada também como
Como projetista, foi o responsável Mayor, consultor na área de tecnolo- consultor na Associação Brasileira das
pelos projetos de diversos shoppings gia do concreto dosado em central. Empresas de Serviços de Concretagem,
paulistanos, como West Plaza, Jardim Graduado em Engenharia Civil pela tendo sido ainda vice-presidente técni-
Sul e Paulista, e do Shopping Praia de Universidade Presbiteriana Mackenzie co da Federación Ibero Americana de
Belas, em Porto Alegre (RS). Foi conde- (1976), Arcindo participou de diversos Hormigón Premezclado.

63
O QUE ELES QUEREM DE NÓS | BUSCA PELO NOVO

INTERAÇÃO ENTRE
PROJETISTA E
CONSTRUTOR É
FUNDAMENTAL
A BUSCA POR FAZER DIFERENTE, DE IMAGINAR NOVAS
FORMAS E ESTAR ATENTO AO NOVO E ATUAL NO
MERCADO SÃO FATORES QUE LEVAM O PROFISSIONAL
A TER ORGULHO DE SUA OBRA

R
POR LUIS FERNANDO CINIELLO BUENO* efletindo um pouco sobre nossa
atividade de construtor, precisa-
mos pensar que ela é muito mais
ampla e, na maioria das vezes,
estamos concretizando um sonho dos
nossos clientes, o sonho de uma vida; e
que, na verdade, são sonhos dos clien-
tes de nossos clientes.
Por outro lado, não podemos esque-
cer que estamos no Brasil, um pais de
muitas desigualdades e com grandes
desafios a superar, aonde o merca-
do está constantemente saindo de
uma crise e os recursos são escas-
sos, o custo do dinheiro um dos
mais elevados do mundo; o que
nos levou a um déficit habitacio-
nal descomunal de 1, 2, ou 3 mi-
lhões de habitações. Não importa
a quantia. De toda forma é enorme
e na nossa atual situação não con-
seguiremos atender.
Outro aspecto fundamental para
considerarmos é que nossos clien-
tes já têm dificuldades enormes para
adquirir um imóvel, pagá-lo ao longo de
décadas, e certamente, com suor, fa-

64 RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018


rão as manutenções básicas e não terão amor. Julgamos que este seja o princi- Mas essa é a realidade de hoje, que
disponibilidade para reparos maiores. pal fator de sucesso de uma jornada tão pode mudar com muita rapidez, o que nos
Ou seja, por mais complexo e traba- complexa. leva a um outro ponto muito importante,
lhosa que seja nossa atividade ela não é Quando nós, construtores, iniciamos o que é a interação e integração entre proje-
fim nela mesma, e quando achamos que desenvolvimento de uma nova ideia, um tista e construtor, para termos as alterna-
a obra está pronta; na realidade é quan- projeto, precisamos do apoio do projetis- tivas, as variáveis atualizadas e mais que
do o empreendimento começa a existir, ta de estrutura para conseguirmos locar tudo, obter a mais eficiente opção adapta-
e vai ter vida útil de 30 / 40 / 60 anos! da melhor forma possível os futuros pila- da ao projeto ou ao construtor.
Com isto vem a nossa obrigação de res, termos o posicionamento e a espes- Temos que ter esta garra e vontade de
produzirmos uma estrutura segura, fir- sura das vigas e conseguirmos ver como buscar o diferencial, não fazer sempre
me e estável, “leve”, que permita flexi- vamos encaixar isto com as diversas tipo- do mesmo modo, imaginar novas formas
bilidade ao usuário, de fácil execução e logias de andares e subsolos. e dispor de alternativas, estar atento
com baixa manutenção, permitindo que
os demais sistemas tenham as mesmas
características.


Se acharam simples resolver esta
equação, temos ainda que acrescen-
tar mais uma variável: conseguir
concretizar a inspiração dos
Quando nós, construtores, iniciamos
arquitetos, para permitir que
tenhamos belos empreen-
o desenvolvimento de uma nova
dimentos, fazendo das ideia para um projeto, precisamos do
nossas cidades luga-
res mais bonitos, apoio do projetista de estrutura para
gostosos de morar
e trabalhar, aonde
conseguirmos locar da melhor forma
tenhamos prazer de
estar de e viver.
possível os futuros pilares e também


Com tudo isto fica saber a espessura das vigas
evidente que produ-
zir um Bom Proje-
to é uma tarefa
bastante difícil,
que exige de-
dicação, von- Passada a “conceituação”, entramos na ao que há de novo e atual no mercado,
tade, esforço, mais trabalhosa etapa, que é a definição quais os movimentos e anseios que te-
criatividade propriamente dita do modelo estrutural mos e não nos conformarmos de fazer
e diria muito que teremos, sendo que as metas só se- o mesmo de sempre, ou que a primeira
rão atingidas combinando criatividade e solução é a ideal, pois na maioria das ve-
muitos cálculos, pois nossa arquitetura zes é a mais rápida, mas dificilmente será
sempre é diferente produto a produto e a melhor. Nesse sentido, será a solução
a melhor forma do último projeto cer- que teremos orgulho de dizer que dela
tamente não será a melhor solução participamos e ajudamos a idealizar.
para o atual e provavelmente será
diferente no nosso próximo. * Luís Fernando Ciniello Bueno é en-
Além disso, o mercado de in- genheiro civil formado pela Escola Poli-
sumos e fornecedores também é técnica da Universidade de São Paulo, já
bastante dinâmico o que nos leva coordenou e executou obras de torres
novamente a estudar diferentes comerciais, hotéis e condomínios resi-
combinações. A realidade dos últi- denciais de diversos padrões. Possui MBA
mos anos apontando que ter uma Executivo pela FEA-USP e em Gestão Imo-
espessura media menor, mesmo biliária pela FAAP. Possui ainda especiali-
levando a taxas de aço maiores, era zação em Administração pela Fundação
a melhor opção, tem se mostrado Getulio Vargas. É coordenador do grupo
completamente errada, inclusive inver- de Normas Técnicas da ABNT – Associa-
tida, pois uma resistência do concreto ção Brasileira de Normas Técnicas, além
maior, ou até uma espessura maior é me- de integrar o Comitê de Tecnologia e Qua-
lhor se conseguirmos utilizar menos aço. lidade do Sinduscon.

65
RE VISTA ESTRUTUR A | OUTUBRO • 2018 66
RESPOSTAS
1 – Cobrimento da armadura igual a 10 mm: 4 – Agrupamento de cabos na pós-tração relação à face de aberturas nas lajes deve ser de
Comentário: segundo a tabela 7.2 da NBR igual a 6 unidades: 7,5 cm”.
6118:2014, o menor cobrimento nominal da ar- Comentário: segundo o item 18.6.2.2 da 7 – Desvio de cabo execessivo sem reforço:
madura para lajes deve ser de 20 mm podendo NBR 6118:2014, “os cabos alojados em bainhas Comentário: segundo o item 20.3.2.5 da NBR
ser reduzido em 5 mm em algumas situações. No podem constituir grupos de dois, três e quatro 6118:2014, “o desvio no plano da laje de um cabo
caso de concreto protendido o valor mínimo é de cabos nos treços retos, desde que não ocorram ou feixe de cabos deve produzir uma inclinação
25 mm para classe de agressividade I. disposições em linha com mais de dois cabos ad- máxima de 1/10 na corda imaginária que une o
2 – Concreto estrutural fck ≥ 15 MPa: jacentes”. início ao fim desse trecho, mantendo o seu desen-
Comentário: para estruturas em concreto 5 – Espaçamento entre cordoalhas igual a volvimento de acordo com uma curva parabólica
protendido o concreto estrutural deve possuir 200 cm: em planta”, “para os casos em que o desvio ex-
classe de resistência de no mínimo c25 (resistên- Comentário: segundo o item 20.3.2.1 da NBR ceda os limites especificados, deve ser prevista
cia característica à compressão de 25 MPa) con- 6118:2014, “para que uma faixa de laje seja tratada armadura capaz de resistir à força provocada por
forme tabela 7.1 da NBR 6118:2014. como uma região protendida, na direção conside- esse desvio.
3 – Laje maciça protendida apoiada direta- rada, o espaçamento entre cordoalhas, cabos ou Observação: como se trata de um exemplo e
mente sobre pilar com 12 cm de espessura: feixes de cabos deve ser no máximo de 6h, não não um projeto completo, diversos outros itens
Comentário: para lajes lisas e lajes - cogumelo excedendo 120 cm”. (carimbo, notas mais completas, legendas etc..)
(fora do capitel), segundo o item 13.2.4.1 da NBR 6 – Cobrimento de 1cm na região dos furos: e desenhos (cortes, detalhes construtivos etc...)
6118:2014, as espessuras mínimas a serem adota- Comentário: segundo o item 20.3.2.4 da NBR devem fazer parte de um projeto estrutural ade-
das devem ser de 16 cm e 14cm respectivamente. 6118:2014, “o cobrimento mínimo de cabos em quado as normas técnicas.
DIRETOR DA ABECE
POR LEONARDO BRAGA PASSOS
AS FALHAS
DESCUBRA
JOGO DE SE TE ERROS

Você também pode gostar