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02/04/2020 Liderar em tempos de crise

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Liderar em tempos de crise


27 de Março de 2020 por Miguel Pina e Cunha

O Covid-19 é uma anomalia assustadora. Mas é mais assustadora do que


“anomalia”. A norma, ou o novo normal, parece ser a da ameaça epidémica
permanente: a Organização Mundial de Saúde acompanhou 1438 epidemias entre
2011 e 2018. A hiper-urbanização e as alterações climáticas tornam mais
prementes as pandemias e outros perigos ecológicos. Importa, pois, que nos
preparemos, coletivamente, para esta realidade – a que as organizações,
incluindo as empresariais, continuarão a estar naturalmente submetidas. O
otimismo que se desenvolveu após ter sido “vencida” a crise anterior está agora a
ser vencido pelo pessimismo oriundo de mais uma crise, esta porventura mais
preocupante para a nossa existência.

Artigo de Arménio Rego e Miguel Pina e Cunha | Leitura de 17 minutos

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02/04/2020 Liderar em tempos de crise

Christin Hume

Artigo publicado, também, na revista "Líder"

Se fôssemos simplesmente racionais, estaríamos conscientes de que a vida dos humanos


sempre decorreu com altos e baixos. A história está repleta de demonstrações desse teor –
que todos conhecemos. Mas fomos adquirindo um sentido de progresso linear: o futuro será
melhor que o passado, e o poder da tecnologia e da ciência conduzir-nos-á na senda desse
futuro risonho. Ninguém pode a rmar perentoriamente que assim será – ou não será. Mas
mesmo assumindo que assim será – e os factos das últimas décadas mostram que o
progresso humano, nos planos da saúde, da economia, da longevidade e da vivência
democrática sustentam esse otimismo – é imperioso admitir que o progresso de mais longo
prazo pode ser, de quando em vez, suspenso.

Sejamos otimistas e admitamos que é essa linearidade que, agora, está a ser suspensa. O
que poderão fazer os líderes perante a crise atual? Antes de prosseguir, um parêntesis: o
que seguidamente se expõe é aplicável a todos nós. O foco nos líderes deve-se, apenas, à
responsabilidade que lhes (nos) cabe como detentores de poder e in uência. Como poderão,
então, agir? Poderão, antes de mais, consciencializar-se de que o mundo que rodeia os
negócios não é totalmente controlável – e que necessitam de lidar, sabiamente, com esse
sentimento que requer humildade. O que se lhes requer é que sejam dotados de uma
mentalidade “in nita” que lhes permita reconhecer o seguinte: (a) as regras do jogo mudam
com o decurso do jogo; (2) o jogo é in nito, sendo jogado por entidades conhecidas e
desconhecidas que vão mudando com o decurso do tempo.

Neste quadro de ação, aos líderes cabe, também, respeitar uma regra essencial da liderança:
os frutos do desempenho das equipas e das organizações resultam dos contributos,
não só dos líderes, mas também – ou mesmo sobretudo – dos liderados. Só desse modo

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se pode edi car um clima de con ança que permite a líderes e liderados abraçarem os
desa os com determinação, coragem e espírito cooperativo.

Crises pandémicas ajudam a compreender que a omnipotência dos líderes é uma falácia.
Mas daí não deve decorrer, simplesmente, o sentimento de completa impotência. As
adversidades não são apenas isso – também são oportunidades de aprendizagem com a
nossa nitude, as nossas limitações e a nossa potencial capacidade de crescermos, humana e
socialmente. Medidas podem ser tomadas para lidar de modo mais sensato com a dura
realidade. Em tempo de crise, convém que pensemos sobre essas possibilidades (sublinhe-
se: possibilidades – não adivinhações nem receitas de sapiência). Retomamos, aqui, algumas
ideias que exploramos de modo mais detalhado num artigo que publicámos há uma década
na revista “Dirigir”.

Um mar calmo nunca faz um bom marinheiro

Sempre haverá crises na vida dos negócios e da gestão. O que distingue os líderes e cazes
dos menos e cazes não é a capacidade de evitá-las ou escapar-lhes – é a capacidade de
enfrentá-las com vigor, coragem e espírito de aprendizagem com os erros. É em
momentos críticos que os líderes se deixam envenenar ou, corajosamente, transformam o
“veneno em remédio”. Ou, para glosar um provérbio inglês, “um mar calmo nunca faz um
bom marinheiro”.

O que ocorreu após o 11 de Setembro, nos EUA, é elucidativo: várias empresas instaladas no
World Trade Center tornaram-se mais vigorosas após os ataques às torres gémeas. Devido a
processos de ajuda e compaixão, desenvolvidos entre empregados (líderes e liderados)
sobreviventes, mas também entre estes e os familiares dos empregados perecidos, essas
empresas desenvolveram hiper-resiliência; tornaram-se mais fortes. Nestes momentos
críticos, o comportamento e as atitudes dos líderes são bússolas importantes para a criação
dessa hiper-resiliência.

Bill George sintetizou as orientações essenciais para a “liderança em tempos de crise”,


propondo sete lições:

(1) encare a realidade;

(2) construa laços de cooperação e ajuda, em vez de carregar sozinho o mundo às costas;

(3) atue sobre a causa profunda dos problemas, em vez de buscar soluções rápidas e
pontuais;

(4) prepare-se para uma longa caminhada;

(5) nunca perca a oportunidade de aprender com uma boa crise;

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(6) no meio da tempestade, mantenha-se norteado por valores essenciais de con ança,
transparência e integridade;

(7) seja proativo, em vez de simplesmente supor que, depois da tempestade, a bonança
surgirá naturalmente.

Nas linhas seguintes, exploramos algumas dessas orientações, que nos parecem condizentes
com o momento atual.

Preze a equipa – ninguém é líder sozinho

Perante crises ou fracassos, alguns líderes (pelo menos os mais responsáveis, pois os hiper-
narcisistas cam mais preocupados em proteger ou afagar o ego) remetem-se ao gabinete,
concentram-se nos seus pensamentos e, em alguns casos, atribuem-se o exclusivo da
defrontação do problema. Assumem a “solidão do poder”. Esta retração impede-os de
conhecerem devidamente a realidade e afasta-os do contacto com os colaboradores. Os
membros organizacionais preenchem, então, o vazio de informação e de explicações, criando
e alimentando rumores.

Diferentemente, alguns líderes assumem uma postura simultaneamente mais humilde e


corajosa, procurando auxílio dos colaboradores. Em 2000, com a Xerox perto do precipício,
envolta numa grave crise nanceira, Anne Mulcahy não se deixou sucumbir pelas próprias
fragilidades em competências nanceiras (havia feito carreira nas vendas e marketing) e, com
humildade, procurou ajuda dos especialistas. Reuniu-se pessoalmente com a centena de
executivos de topo da empresa, indagando-os sobre se permaneceriam na empresa apesar
das di culdades (que não teve acanhamento de claramente expor-lhes). Apenas dois
executivos decidiram abandonar. Com os que permaneceram, Mulcahy criou uma equipa
que lhe foi intensamente leal. Rejeitando a “solidão da liderança”, resistiu a declarar a
falência da empresa, tendo-a salvo e restaurando-lhe a grandeza de outrora. A NYSE
Magazine de Janeiro/Fevereiro de 2005 viria a sublinhar, em título de capa, que “Anne
Mulcahy prova que é o trabalho em equipa que faz o líder”. Jim Collins referiu-se à executiva
do seguinte modo:

“Não escondeu o jogo de ninguém e, em pouco tempo, colocou a empresa no


caminho do sucesso. Nunca cou com os louros apenas para si. Os grandes
líderes não se veem como deuses, acreditam no esforço de toda a equipa. Têm
uma dedicação desmesurada por aquilo que fazem, o seu trabalho é a sua missão,
mais do que uma questão de sucesso”.

Como proceder, então? Em momentos críticos, cultive relações cooperativas com a equipa.
Procure também apoio social fora do contexto de trabalho – entre amigos e família.
Enfrentará as adversidades com maior vigor e poderá obter conselhos e aconchego

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emocional. Assuma as suas vulnerabilidades – e solicite ajuda. Seja honesto. Mantenha-se em


forma física e psicológica. Não se tome completamente a sério – aproveite os benefícios de
uma vida relaxante e alegre.

Atue sobre a raiz dos problemas – quanto antes

A unidade de aviação militar da Honeywell, em 1987, foi confrontada com custos ocultos
avultados. Um montante que parecia ascender a 25 milhões veio a revelar-se quase vinte
vezes superior. O problema fora escondido durante anos – tendo-se avolumando
progressivamente, sem que medida corretiva alguma tivesse sido tomada. Durante décadas,
a gestão da General Motors recusou aceitar que os seus automóveis haviam perdido
competitividade relativamente aos veículos estrangeiros. As perdas de quota de mercado
foram sendo interpretadas como fenómenos de curta duração. Em vez de reconhecer erros,
a gestão da empresa apontou o dedo a fatores externos e esperou que, com o decurso do
tempo ou a proteção governamental, os problemas fossem sanados. A incapacidade para
atuar sobre a raiz dos problemas agravou o declínio, e a empresa entrou em agonia – como
um doente que morre porque não debela um tumor na fase inicial. Jim Collins foi perentório:
“o caso da GM mostra que uma empresa pode estar doente muito antes de aparentar
fraqueza”.

A IBM atravessou um processo similar no nal dos anos 1980. Um analista interno
apresentou um relatório preocupante sobre as perspetivas de negócio. Mas um executivo de
topo da empresa ignorou a mensagem, argumentando que os dados estariam errados. O
analista, ciente do declínio, abandonou a organização e criou a sua própria start up. Poucos
anos volvidos, as quebras nas vendas eram de tal ordem de grandeza que o rombo deixou
de poder ser negado. Não fora esta negação, o declínio poderia ter sido invertido. E não fora
a sensatez de Lou Gerstner e a sua capacidade para enfrentar a “brutalidade” dos factos, se
“apaixonar” pela empresa e transformar uma cultura burocrática numa cultura de disciplina –
a empresa poderia realmente ter sucumbido nos anos subsequentes.

Esses comportamentos contrastam com os de líderes que preferem trabalhar no interior de


uma redoma, acolitados por quem lhe transmite apenas boas notícias, e circunscritos à
informação que lhe chega através de relatórios. Desse modo, enfrentam um colossal risco: o
de descobrirem os reais problemas apenas quando os mesmos assumem dimensões
di cilmente governáveis.

Um risco não menor é o de identi carem apenas os sintomas dos problemas, aplicando
então paliativos, em vez de instrumentos de cura. Pior: negam a realidade e “matam os
mensageiros das más notícias”. A catástrofe que se abateu sobre a Boeing, após os acidentes
fatais ocorridos com o Boeing 737 Max, é elucidativa. O gérmen do problema há muito havia
nascido. Os perigos gerados pelo sistema de segurança eram conhecidos e haviam sido
expostos por alguns membros organizacionais. Mas estas vozes críticas foram abafadas.
Quem se atrevesse a “abrir o bico” para dar conta dos erros de construção cava em apuros.

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Amy Edmondson resumiu as origens da maleita do seguinte modo:

“Este é mais um caso de estudo de como a ausência de segurança psicológica – a


segurança de que se pode falar, apresentar ideias, apontar problemas, ou
comunicar más notícias sem receio de punição – pode conduzir a resultados
desastrosos”.

A Medtronic assumiu uma postura diferente, em 1984, perante problemas de carga nos
pacemakers. Adotou uma política de completa transparência, tanto interna como
externamente (incluindo com as autoridades reguladoras). Não se bastou com alertas que
apenas são emitidos quando se ultrapassam determinados patamares estatísticos de
erros/falhas. Antes promoveu uma cultura de discussão aberta dos problemas e de
identi cação da raiz dos mesmos, logo à nascença – de modo que os mesmos não voltassem
a emergir.

Algumas medidas podem, pois, ajudar os líderes a atuar sobre a raiz dos problemas numa
fase inicial. Coloque as “mãos na massa”. Aborde as pessoas diretamente nos locais de
trabalho (mesmo que estejam em regime de teletrabalho!). Obtenha informações onde os
problemas emergem. Acolha os pontos de vista das pessoas com quem interage nesses
encontros – além de obter informação mais dedigna, aumenta a sua respeitabilidade. Não
se baste com os relatórios que lhe chegam ao gabinete pela via hierárquica. Promova uma
cultura onde as pessoas assumem os seus erros – caso contrário, os mesmos não emergirão,
não será possível aprender com eles, e os problemas subjacentes repetir-se-ão. Se tem
experimentado sucesso continuado ao longo de anos, não seja negligentemente arrogante,
presumindo que o sucesso é “obviamente merecido”. Não subestime pequenos sinais de
quebra, como se fossem passageiros. Tome-os seriamente como possíveis indicadores de
algum problema que começa a emergir.

Lembre-se: um dos maiores inimigos do sucesso futuro é o sucesso passado.

Não se iluda com a ideia de que “o pior já passou”

Por vezes, no epicentro de uma crise, os líderes presumem que “o pior já passou” e que, com
o decurso do tempo, tudo regressará à normalidade. Esquecem que a crise pode ter raízes
profundas e longínquas – que se manifestaram apenas no tipping point, na atualidade o
suscitado pelo COVID-19. Outras vezes, os primeiros sinais da crise são desvalorizados – e a
empresa persiste nas soluções bem sucedidas do passado. Algo deste teor ocorreu com
várias empresas do sector nanceiro, que negligenciaram os primeiros sinais perigosos
provindos do mercado subprime.

Todavia, a mudança e a defrontação da realidade são, por vezes, eventos desconfortáveis. Os


líderes, em vez de mudarem de paradigma, continuam a acreditar que a crise se desvanecerá
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e que tudo voltará à normalidade. Mas esta expectativa nem sempre é prudente. A Intel
demorou anos até compreender a necessidade de abandonar o negócio das memórias para
enveredar pelo dos microprocessadores. O envolvimento emocional com o negócio outrora
bem sucedido impedia a empresa de mudar de paradigma. Algo do mesmo teor ocorreu com
fabricantes de automóveis norte-americanos (como a General Motors) que desvalorizaram o
potencial contido nos fabricantes estrangeiros, sobretudo japoneses e europeus.

É, pois, fundamental que os líderes não desvalorizem os primeiros sinais da crise e que se
preparem para uma longa jornada. As grandes crises costumam ter raízes que começaram a
emergir dez ou mais anos antes. O facto de emergirem abruptamente apenas signi ca que a
con uência de vários fatores chegara ao seu estado maduro. Não declare vitória
demasiadamente cedo.

Não perca a oportunidade de aprender com uma crise

Num pequeno e notável livro intitulado "The Ten Commandments of Business Failure",
Daniel Keough (ex-CEO da Coca-Cola Company) recomendou:

“Para começar, nunca admita um problema ou erro. Se alguma coisa parece ir na


direção errada, dissimule-a ou, melhor ainda, espere até que tenha uma crise a
sério, e então culpabilize alguma força externa – ou quem quer que seja. Os
clientes costumam ser incómodos. Pode sempre culpabilizá-los por algo de mal
neles.”

Sem ironias, os líderes mais e cazes recusam a recomendação. Em 1993, como consequência
de medidas da Administração Clinton, a Medtronic viu-se confrontada com riscos de declínio
dos preços de alguns produtos (e.g., pacemakers e des briladores) mais rentáveis. Se fosse
concretizada, a medida di cultaria os investimentos (estratégicos) da empresa em
investigação e desenvolvimento, e prejudicaria as medidas de apoio aos médicos durante os
implantes. A liderança da empresa encarou o cenário proactivamente – eliminou custos,
reestruturou-se, reduziu os níveis hierárquicos e removeu benefícios atribuídos aos seus
executivos. A redução de preços acabou por não ocorrer, mas a queda nos custos
concretizou-se. A empresa foi então capaz de aumentar as margens e incrementar os gastos
em investigação e desenvolvimento. Ou seja: transformou o (putativo) veneno em remédio. O
“salvamento” da IBM por Lou Gerstner representa, também, um exemplo lapidar de como
uma crise (neste caso, dramática) pode ser um estímulo para a recuperação.

A um dos autores deste texto foi relatado um caso, alegadamente verídico, que sublinha
exemplarmente a lição. Perante o forte declínio das taxas de ocupação do hotel, e com uma
massa crescente de empregados desnecessários às operações, a liderança descortinou uma
medida sagaz: restaurar as instalações mediante o trabalho dos funcionários. Cozinheiros
transformaram-se em pintores – e funcionários de limpeza ocuparam-se da remoção dos

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lixos gerados pelas obras. A restauração, cuja execução poderia ser problemática para o
funcionamento do hotel em época alta, pôde então ser concretizada sem incómodo para os
hóspedes. Não foi necessário implementar despedimentos. E, no termo da crise, o hotel
estava mais preparado do que os concorrentes – com colaboradores empenhados,
motivados e leais. Re ita o leitor sobre empresas portuguesas que, após catástrofes como
incêndios, se tornaram mais fortes.

Entre os fatores explicativos desse fortalecimento encontrará os seguintes:

(1) os líderes, dotados de resiliência e tenacidade, assumiram uma postura de proteção dos
trabalhadores e dos postos de trabalho, denotando respeito;

(2) os liderados desenvolveram um sentido de gratidão que resultou em comportamentos de


reciprocidade e empenhamento;

(3) outros stakeholders, perante a conduta de líderes e liderados, apostaram na empresa e


apoiaram-na nos esforços de recuperação.

Prepare o futuro

Liderar consiste em conduzir pessoas para o futuro. Frequentemente, no seio de uma


crise, os líderes empresariais presumem que, desvanecida a mesma, tudo voltará ao normal
– e o percurso bem sucedido do passado será retomado. Ignoram, porém, que as condições
de mercado se alteraram, que os clientes desenvolveram novas opções de compra, que os
concorrentes modi caram condutas e estratégias – e que as atuações das autoridades foram
refeitas. Distintamente, outras empresas assumem uma postura proativa e preparam,
durante a crise, a construção de um novo futuro.

A Toyota, após grave crise experimentada nos anos 1950, que a impeliu a despedir
empregados (contrariando a cultura da empresa), assumiu como lema a necessidade de criar
condições para que o mesmo jamais voltasse a ocorrer. A estratégia de longo prazo tem-lhe
permitido atravessar crises mais e cazmente do que os concorrentes – para o que tem
contribuído uma prática típica da cigarra: acumular em épocas favoráveis para resistir
durante as desfavoráveis.

Também Sam Palmisano, CEO da IBM entre 2003 e 2011, erigiu uma nova visão para a
empresa – de modo a transformar-se numa prestadora de sistemas globais que satisfaçam
necessidades de clientes globais. A liderança da Intel decidiu investir fortemente nos
microprocessadores Pentium, nos anos 1980 – quando então se vivia uma situação
económica crítica que levou a Motorola a desinvestir, devido à carência de liquidez. Aquando
da retoma e do aumento da procura de microprocessadores, a Motorola viu-se rapidamente
ultrapassada pela Intel – que mantém hoje a liderança do sector.

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Comentários nais

As crises, os fracassos e os problemas são parte integrante da vida das organizações e dos
negócios. A globalização, as redes de comunicação globais, e a integração das cadeias de
produção criaram sistemas interligados que fazem circular oportunidades mas também
ameaças. Cabe aos líderes enfrentar essas realidades com tenacidade, coragem, integridade
e espírito de aprendizagem com os erros – e não negá-las ou procurar bodes expiatórios.
Podem fazê-lo, nomeadamente, preparando as competências necessárias para a próxima
crise – bacteriológica, de cibersegurança, geopolítica, nanceira. As crises são (também)
oportunidades. Por conseguinte, se é o mar revolto que faz os bons marinheiros da
liderança, a principal lição é: faça bom uso da onda de oportunidade. Lembre-se de que não
é o centro do mundo – e de que precisa dos seus liderados para enfrentar o futuro. É nos
momentos críticos que a sua liderança será testada. É fácil denotar compaixão em período
de vacas gordas – mas é em períodos críticos que essa virtude é testada. Naturalmente,
também dos liderados se esperam condutas responsáveis.

A questão porventura mais pertinente, que líderes e liderados devem colocar nestes
momentos críticos é: “o que me cabe fazer para que a nossa empresa seja uma
comunidade de pessoas realistas, cooperativas, sensatas e empenhadas?”.

Posfácio

Quando se escreve, re ete-se. E re ete-se especialmente quando se recebe feedback valioso.


Pedro Brito, a quem estamos gratos pelos comentários que nos facultou, partilhou connosco
o seguinte: nos últimos dias recebera mensagens dando conta de que o “susto” criara “um
certo equilíbrio das coisas”. Eis o teor dessas mensagens:

Numa era em que as alterações climáticas  estão a atingir níveis preocupantes, a


poluição diminui consideravelmente em poucos dias;

Perante o reaparecimento de políticas e ideologias discriminatórias, surge uma


“criatura” mostrando que todos podemos ser discriminados;

Tão focados na produtividade e no consumo, sem descanso e sem pausas, somos


obrigados a parar e re etir;

Numa época em que a educação é delegada a instituições de ensino, o contexto volta a


juntar as famílias e a dar uma oportunidade à educação no seio das mesmas;

Numa era em que muitos relacionamentos interpessoais se desenrolam através de


redes sociais (o que, perante o “susto”, passa a ser uma necessidade), voltamos a
compreender a importância do contacto pessoal, do tato, dos abraços.

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Estes pensamentos relembram-nos da nossa nitude, da precaridade da vida, e da nossa


essência de seres sociais. E reforçam uma ideia que tem vindo a revigorar-se nos meios
académicos, socioeconómicos e empresariais: é necessário que as empresas sejam
encaradas como construtoras do progresso humano, desa o que se avoluma em momentos
críticos. As que se movem em prol desse propósito serão porventura mais agregadoras e,
por isso, mais resilientes.

Artigo de Arménio Rego - Católica Porto Business School & Miguel Pina e Cunha - Professor
Fundação Amélia de Mello, Nova SBE - Publicado também na revista "Líder"

Referências

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Collins, J. (2009). How the mighty fall: And why some companies never give in. Arrow.

Edmondson, A. C. (2008). The competitive imperative of learning. Harvard Business Review, July-August, 60-
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Sinek, S. (2019). The in nite game. Penguin.

Takeuchi, H., Osono, E. & Shimizu, N. (2008). The contradictions that drive Toyota’s success. Harvard
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Tópicos: Artigos de Opinião , Liderança & Pessoas

Publicado por: Miguel Pina e Cunha

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