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CIVILIZAÇÃO BRASKEIRA
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M Um Livra.IÇlarç), Preciso,:Oportuno
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J Vivemos, hoj'é mais do que em qualquer outra. época, Perdidos
na densa: floresta daé conceituações semânticas quando'apli-
cadas .à .qênl:ia política.
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M Democracia, podo: progressista, reacianáriq,--imperialismo,.desen
m polpímenfo são palavras .que, de tal maneira abu-sadag, .signifi-
cam muitas coisas distintas óu, o..que'é ainda pior, deixafan]
0 de l;er. sentido' para muitas pegsoab:

< A 0PÇÃ:o I'M P.E K..IA L'l S T A.:.,


J do pensador político, . crítico : de ante e; hotnem :.ÍúcídoÍ..quç: .é
MAnTo. PEOROSA,é êüáhãlíse clara, precisa,l serena, de um dos
> marcantes ':' fenómenos sociais 1?desta época : tumultuada que
Q vivemos i

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A OP l:M :P:É:R l A L l S 'l' A


é um livro para estudantes de: ciências sociais,:: as$ím :éomol=eg- H
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« timulante poderoso à. intehgência#de qualquer leitor qu.e deseje


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0 acompanhar, com objetividade .crítica, o11drama do quotidiana
H naciona! eflnternaCional.
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A OPÇÃO A OPÇÃOIMPERIALISTA
IMPERIALISTA

Um dos mais sérios problemas com


que hoje se. defronta a investigação
política é o da imprecisãoterminológi-
ca e conceptual que vem envolven;ia
muitos de seus instrumentos de análise
Uma série de conceitos-chaveforam de
tal maneira empapados de ideologia
que.a discussão como que tem sÜo . ''''''- .\J
levada muito mais a se fixar de ma-
neira. estática no conceito, seja para
manto-loou para nega-lo ín fofa/n, do Jogo M
que a desenvolver o esforço de exami-
nar dínâmícamente a sua adequação
(ou operar o seu refinamento) face às
novas realidades históricas e sociais
existentes.
/mpería/ísnzo é um dos mais acabados
exemplos disso, onde a fronteira entre
a abordagem científica e o s/ogarz nem
sempre se torna clara e discernível até
mesmo para o próprio analista. Mais
portante ainda: onde a ênfase que se
reduz à .negação ou afirmação pura e
simples (e.nem sempre inteÚgenle) do
fenómenofaz com que se perca de vis-
ta o essencial, isto é, as conseqüências
e projeções históricas e sociais do pró-
prio desenvolvimento dos modernos sis-
t.amas económicos. Considere-se êles
ímpería/iscas" ou não.
Sob êste último aspecto. .A Opção
/mperíaZís(a é um livro em que,.de uma
Complementa êste livro maneira muito própria e particular, ten-
ta-se uma reflexão de conjunto, atra-
uma obra. de igual importância vés de cortes em temas específicos,sô-
e não menos atualizada bre uma série de problemas de nosso
intitulada tempo, e, principalmente, sôbre os des-
tinos. as formas e as dinâmicasda evo-
lução..do modo de .produção capitalista
A OPÇÃO BRASILEIRA. de nossos dias.
ouer dizer: discute-se menos aqui,
como o título da obra poderia sugerir,
um conceito do que tôda uma situação.
Recomenda-se ao leitor de E é esta a chave que o leitor deve ter
em mente ao debruçar-se sôbre o livro.
Por isso mesmoé que encontraráao
A OPÇÃO IMPERIALISTA' lado de um relato sôbre a evolução da
política externa norte-americana em re-
a sua aquisição lação às nações periféricas, uma dis-
cussão sôbre a estrutura social mesma
das grandes corporafíons, sôbre as mu-
danças no comportamento da classe
operária, sôbre as estruturas de poder
nos EstadosUnidos ou na União So-
viética; sôbre o impacto da automação
nas relações de produção e nos meca-
nismos de tomada de decisão.
.4 opção /mperíaZísfa é um livro sim-
ultâneamente teórico e po/íffco, em que
a análise às vezes passa de um nível am-
plo de abstração para uma referência
quotidiana e particular, mas no . qual.
subjacente a um ou a outra, está sem-
pre presente aquêle enfoque humanista
das melhores tradições do socialismo
clássico. Coisa que há algum tempo
não se via no Brasil.
ESTA OBRA poi ExEcuTADA WASoficiNAS OA COMPANHA GRÁficA LUX,
RUA FREI CANECA, 224 -- RIO DE JANEIRO -- GUANABARA BRASIL Luciano !Uartins

.dJ
Mário Pedrosa

A
OPÇÃO
IMPERIALISTA

civilização
brasileira
desenho de capa.
ALOÍSiO CARVÃO

IN DIC E
Prefácio /

Dinâmica Imperialista .7/


Exemplar
Reformas Contra-Revolucionárias 268
Os órgãos Supremos do Imperialismo 327

Direitos desta edição reservados à


EDITÕRA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA S.A
Rua 7 de Setembro,97
RIO DE JANEIRO
1966

«
Impresso nos Estados Unidos do Brasil
Printed {n the Unifed Status of Brazit
Prefácio

Êste livro nasceu do impacto causado pelos aí;ontecimentos


que cutmirmram com a deposição do Govêrno ]oão(;outart e a
subida cm poder, a l de abril de 1964, sob rlova conjugaçãode
terças, de um Govêrno discricionário. O autor tentou mas ttão
conseguiu situar aquêles acontecimentos dentro dum contexto
.imitado ao âmbito tTaciona!.Cedo veriticotl que ttão se explica-
ram.,isoladamente,e que mesmoo Brasit todo, como t\ação,
como Estada, como economia e sociedade, não era produto ex-
clusivo de si mesmo, da evolução de sua simpks históri,ü, da Des-
coberta à República.
Era cada vez mais, ao contrário, como que resultantede
um paralelogramo de terças que o impele paira uma direção d!-
gerente,exterYm,que não resulta, por õua vez, da dinâmica de
suas tõTxçasinteriores, autênticas. Do contrunto dessa mecânica
le terças depende, entretanto, o tuíuro do País. O presente livro,
concebidocom outro que trota espeâticamettteda situaçãobra-
sa!eira,tal como se formou e se veio desenvotvei,ldo,desde 31 de
'marçoou l de abril de 1964i constituíaa primeirapartede uma
)bra só, 'chia epílogo se apresenta aBaFa -em livro independente.

+
yob a /íí IZode A Opção Brasileira. Co/zm conseqüê/zcíalógica, a

/
primeira parte, de que ora fazemoso prefácio para ser publicada montante de 54 milhões de dólares, iú em disponibilidcMe em
em /ívro reparada, é A Opção Imperialista. Neste, fe/z/aP..ie
fPüi- párias instituições privadas das Estados Utttdos além, daqueles
car a tinha de terças que impõe ao Brmit uma distorção que o bancosiá mencioYtados. Não poíieria haver transição mais sim-
desn(dura, se não o taz.detirthar ol{ mesmo perecer; na outra, ten-
)óttca do espírito das comemoraçõesqilinqilenais do que êssefa-
ta-sê definir aos brasiteiros*a ratificação que se impõe para tazê-to buloso negócio de instalação de um novo satélite de transmissão
reencontrar seu próprio destiTlo.
ie lv, reputado Feto ilustre negocüdor "c(}mo potencia! de edu-
:ação inédito através da televisão; além de teor grandioso(?)
ie divulgação de acontecimentos culturais e esportivof.(Pma
No plano dêstetivroj que não é UM livro de erudiçãonem quetn conhece os programas comerciais da lv nw Esüdos U?tidos,
Lempretensõesà originalidade, nada q)ossoacrescentar.Visou êle -b 4ue viriam assim se acrescentar tios twssog, a perspectiva é .antes
a «iescrevdr o processo de formação de umü politica ecanâmico- moral e cuttura#mente desatentadora). Como 'contrapartida, sem
lmperial dos Estados Unhas da Awtérica e sua expant-sãoquase :lívida, ao negócio dc} novo satélite pw-a a sua 'lx, o senhor de-
fisiológica, primeiramente pelo seu leito por assim dizer tmturat 'noCiUta comunicou, lm sua entrevista coletiva à imprensa ca-
io Mar das Caraíbase, em seguida;por um espraiametiltO
não 'toca, que, ao visitar uma taveh em Parada de Lacas, deu cc>m
rlTQis"natural'' mas deliberadamente comercial, deliberadamente xm grupo de senhorasa veruteremcamisaspan'aajudar os tave-
!dinâmico, deliberadalniente político pelo continente sul-ameri- .idos. Êssesartigos pra;vinhamde UHXQ fábrica de camisastüan-
cano. Do porfete " tenda!'' do primeiro Roosevett *andott-se até ciada por uma organização privada americatta: tanto bastou pai'a
a czípu/a neoc/ásiíca da Aliança para o Progresso do/i/lado obriga-to a comer-artrês camisa paf'a o- filho:' FdhYldo direta.
E'residenteKenne(b. Houve, sem dúvida, um progressolias re- 'rténEe.sabre a Ati.anca, o senador por Nova l(h'que começou
lações do gigante anglo-salão do Norte com os turbulentos !a- suas dectaFações pedindo qüe compreendêsgemos 'a lamentável
:indamericattosdo Sttt. Civiliwram.se, de algum modo, aquelas ;ituação do Govêrno Johnson na Swieste asiático, para onde "ca-
relações,apesardo timco trágico da Praia Girou e'via volta dos latiza boa pa*rte dos recursos norte-americanos" .' Os jornalistas
'marit$eg' a São Domingos,para só calar nas recaídasmais )rasiteiros, compungidos, ouviram da Ymbre senador a infor-
recentes.
mação de que a anual iyd\ação nos Estados Unidos atinge cêrca
E'or uma coincidêncianão calculada (Comotoda. boa coin- ie 14 bilhões de dólares, embora correspomn ainda a uma
;idência), êste livro sai a público quando nw Àméricas do Norte. ;i ra equivalentea dois par cento do prodmo nacional bruto. De
rla do CeH.troe na do Sut) se comemorao primeiro qilinqilênio :lüalquer torna, disse o senador, como se tios quisesse estimular
ia ''Revolução'' da Atiattça parca o Progresso. Nessas come- ) povo norte-americano "está pronto a ajudar o Govêrno a con-
morações tomos encontrar, iiwspera'lamente, como uma atua- :er a espiral inttacionária" . Em retaçãa à contribuição especíticin
.ilação das própria.sconclusõesda tino. Foram elas irMuguradw, ie seu pais para a Aliança, depois de assitmtar terem os Estados
pode-se dizer, Feto vetc} americano, l reunião do Patmmá, às
jantasim !atino-americanas elaboradas na reunião al-lterior de Detidos.iá entrado mo Acordo InternacioTt.aldo Cdó, toi claro:
'Á única coisa com qtle os Estados Unidos concordaram na
xlgunts meses, de onde caiu a "Ata do Rio de Janeiro''. Depois, Conferência \da OEh, no' Rio de Janeiro, toi sabre a. reunião da
; visita pela mesma época do senxadoramericcmo Jacob iavils
Panamá." Mas, adverte: "a reunião do Panamá não toi convoca-
io Bi\ágil entra também no âmbito dessas comemorações, não da para debater temas como u melhoria do comércio intern.acto-
só pelo que aqui lhos disse coma pela própria tittatidade da visi-
ldl, .a abolição de tarifas preterenciais ou a obrigatoriedade na
:a. Êle veio, com efeito, negoctw dentro do contexto da Aliattça, nucítio mu\titaferal, como querem cra'J' "Os Estados Unidos não
=om um bom tittaitciawbemto
pelo B\n e pelo Exp.-lmp. Band. ?odes dar à América Latina tarifas pr4erenciais sem estend&tas,
I'ralava-se da obter aprovação dos go'Pernas.latirBo-americanos simultaneamente,
a todos(# paísesexceda
os comunistas:'
E.
paraa tnst.ntação
de nâ'PO
satélitede transmissão
de I''f, num J peremptório: "Os Est.idas Unidas não pedem, obviamente, asse
2
+ 3
IQr qualquer pedaçode papel que os tatitto-americanosates es- zeram-se
400 mit casaspor ano, tabtando19 milhõesa constrül
tenderem'' .t
para tecllar o deticü. As papulaçõea nossas contirwam\ mais po'
Agora vejamos como participou das comemorações uma )res do qug nunca, sem casa,sem saúde, sem comida, sem esco-
autoridade decisiva na questão, o Banco Interamleriaano de De-
senvolvimento,em seu relatório anual sôbre.a.s..operaçõesdo
$ u. Os milhões e milllões de dó\ares gastos não se perderam;
:om êles.se fizeram excelentes negócios, com pingues lucros para
Fur\do do ProgressoSocial. Qual é a situação,depoisde cinco n empresasamericanas que torrteceram material, equipametüos.
anos de Aliança? Lamentável, diz o relatório, a situação de vi- :ransportes, serviços para ds obras benerrtéritas de assistência
vendas, educação e saúde tw continente, apesar de iá esgotado o } América Lattrw. Sejamosjustos: tiveram também sua parte nos
lutüo socialde 500 milhõesde dólares,constituído
pelogo- negócios, embora parte menor, empresas taliw-americattas e
vêrno americano e administrado pelo nln. E !á vem a crõnicú -$ xtravessadoresde ambas as'regiões. Os 500 milhões sempre aju-
descrição do estado de miséria em que vivem as poputaçõet daram a aumentar a renda nacional bruta dos Estados Unidos.
latino-americanas. Deficit de vivendas de 15 a 19 tnilhões de
Montantes de dinheiro ntesFaescala nunca se perdem. ]ohnson
:lllidadespoi alto, m.uivointerior ao aumentoda populaçãoe que : sem banqueirossabemdisso, e estão prontos a recomeç.ar.O
pede, para.ser eliminado em trinta anos. com atendimento das
lue +tão admüem é que os latinos venham com "pedaço de
'tecesstdadesdo crescimento popuhciopmt, a construção de 2,5 )allel" para que assinem, concordando com "a melhoria do co-
l 3,3 milhõesde unidadespor a.rto,em facede um ritmo de
construção que é a.penasde 400 mit unidades anuais. Em m:a- Mrcio internacional, a abolição de t.arifas preferemiais oü a
obrigatoriedade lm auxílio multilateral". Nesse ponto a senador
.ária de saitde, a situação aiYldaé mais precária, pois no próximo fa:viésrepresenta fielmente o ponta de vista dos homens de ne-
qilittqikênio são mais de }S9 milhões de latina...americanos.entee
:acto americanas e do seu govêrno.
:idade e campo, necessit.idos de água e wgâto, e o re\atório,
erttoarüo, }io fardo, o 'canto fúnebre da .4 fiança, arrebata: "Ci- . Falta-tms, agora, airilda que com o risca de prolongar êste
ÍT'asde ta! magnitude perdem setasignificado em vista das diti- )relácio, comentar'a parte que teve rias comemorações,'comoo
=uldadesem rehcioná-tas com .a experiência comurd' . E quanto epresenantebraaiteirono Comitê da Aliança, o' Dr. Roberto
It educação?"A situação airüa é mais explosiva, dado o cresci- mãos Sua participação em Buenos AbresnaiComitê Interame-
:mento populacional:'(Cêrcct de 49 a 45qo (M população tatino- icano Económico e Sacia! da AtianKul toi notável. ;'Nãa se reali-
americana são menores de quinze anos). Mias a retorna agrária, :arara ambições originlnis de converter a Ali(xmça numa "mística
) cavalo de batalha da revoMção atiarbcista?O relatório: a pto- taciortal" dos paíseslatino-americanos" , começou êle. sem se des-
iução agrícolada .AméricaLatina registrouuns últimos quatro :oncertar, no etttartto, pote logo depois está consolado: "isso pa-
anos um aumento de apenm'2 a 3% , quando a reunião de Pirata !ce .hoje pews urgente, ante u recente experiência da Ária e
det Este prevê, modestamente,um aumento de 4 a 5% . índice
ia Atraca de crescentedewpontamMo com fórmulas ideológicas
atingido apenas par quatro países: Médico, Venezuela. Botívi:a
3 Nicarágua. .Assim, ao tim do qilinqüênio da Aliança, a Amértca
Latiam se cncorttra num círculo vicioso, -em que o descontenta-
mento social desestimuta o desenvolvimento económico e a es-
tagnação provoca a tensão saca(d';? r'
n m$üwzãói!
Hêli
/essede cima. Hoje, porém, que -- segundoa conlutttura atuat
-- foram aquêles atirados do poder ou estão degprestigiados, eis
O govêrno americano deu ao Bln 590 milhões para em- &

iue o Dr. Cawnpos,aliviado, afrouxa o cinturão, e se refresca no


préstimosa obras de "progresso'social'' na nossaAmérica. Fi- iue chama de "ecletismo operacional". Agora, tenda de "um
iA entrevista coletivaapareceuem todosos jornaisdo Rio de 2 de avançodramático e glorioso" com que acenavam lideres mes-
abril de 1966. O texto aqui usadoé o do .íor/zaJdo Braif/. siânicas,pois os povos subdesenvolvidos,tendo aprendido a \ição
2 Jorna! do Brasi1, 19/3/1966.
l íntegrado discursono Correioda Ã/an/zã,30 de marçode 1966
4
5
dúvida raciona!. Para quem? Sem subterfúgios o diz: "0 propó-
sito dessas observações é irldicar 'a necessidade de compreensão,
por parte dos Governos que outorgam ajLlda e dm agências fi-
anceiras interttacionais, da complexidade e angústia dessasop-
ções". Apesar do plural referente a "goverttos" , todos sabem de.
que Govêrno se trata. E re-ndendo-se
a uma evi(tênciajá de há
muito reconhecida, declara: "Algumas m\edidas têctzicameníe
(sic) carretase legítimas,tais como a diminuição de.tarifas sub-
vencionadas ou a desvalorização cambial, ilquestionàvelmente
sadias,a longoprazo(sic) caMêltl,a curtoprazo,o perigo.
de
íópios(M cup e finalmentea Ata óo Rio de'Jamiro) só saviü ieativar expectativas illflacianistas ou pressões salariais" . ''Cabe" ,
}ta realidade para que políticos e governaPttes!atino-americanos explica aos chefes da fina-taça intern.acional, "a cada um dos
se vissem forçados -a'aceitar o cattdicionamenío imposto pela ra' governos, sem rigidez. dogmática, etetuar as opções concretas {i
cionalidaie . . . dn política dos governantes norte-americanos. luz da circunstância política e ecanõmica. O que importa é um
Na verdade,essa"elevação"no coeficienteda racionalidadelati- sentido de fumo e uma compreettsãocura dos problemas subja-
no-americattaainda é muita relativa, do contrário não sairiam centes e das alterna'!ovasde ação". E, principalmente, "uma ati-
êssesWWesentantes latinos pa'a o Pantamá awnxl(bs de um ''prin- tude mais flexível cle parte das .agênciasinternacionaisque po-
cípio" (da Ata do Rio dê J?Retro)dito de''respomabilidadeco- dem dar-se ao !uxo de aconselhar e teorizar, sem a angústia dos
letivm". O veto utti]aterat (lias Estados Unidos era inwitável, e qtle têm a tare+üde tomar decisõesnum contexto político em:
êste, sim, fundado em real rmionatidade de decisões. contínua mutação:' Agora é o caso de se perguYttar:a "angústia
Não se infira, entretanto, dat ter o Dr. Campos se. negado nas decisões não provém do nível pouco eles'ado da racionalidade
a algum esforço de racionalidade não dizemos "was. decisões" delas, em face da situação tat como se armava no País, quando
(seria pedir demaisde algum ministro brasileiro ou tüvez latino' os Campos & Cia. as tomaram? A "angústia" não é sintoma de
americano) mas no 'exame dos efeitos da política económica,:que má con,sciân.cia?
.i
dirige no wu país Buscando, condessa,. iomciliar combate de de-,
lli- Depois de comptncentemente compddecer-se dos mates da
luEà.I';;;l;b:nãÜl; ;lJ.etárÚ, refÓlmainte'na e te«{ativ? Atnérica Latina e das "incompreensões" ingratas, o l)t\. Cam-
senvotvimeMo-- quer dizer,' o ecletismo operaciorul em lxleno! pos, tornando a abrir portas iú abertas, descobre que em todo o
- admite não ter sida o resultado muito promissor, dada que "os sistema intcramericano só existe f'um grande financiador, os Es-
avançose retrocessos,a alteraçãodas prioridadesao longo do tados Unidos dn América". Dêsse monopólio do financiamento,
tempo" tornaram "difícil uma programaçãoserenae contínitd êteé obrigadoa inferir, e ractonialmente=
"A \acepçãodü Alian-
E o qüe se viu foi em 1965 aInDa
;'ucpansão monetária bem su- ça para o Progresso coincidiu(?) com o agravameMo da posi-
rior à planeiada, num ritmo de in$tclção superior ao progra- ção da balança de pagamentos norte-'americana". Embora con-
mado" para, ao final do ano, deparar-secom "um supera:vtt.no testável a coincidência, serviu de pretexto para. jwtificar, perc&nte
balattço de pagamentos", "êxito ittesperado", qtmndo o objetivo cls "países recipientes", o talo de "o propósito generoso do au-
procurado cra outro. Perpluco diante. dos percalços de. um-ara- )tília ter sofrido logo (?) impacto de restrições, traduzidas }la
volta(sic) à prática dos empréstimosvinculados (.lied loans) , no
excessivaproteciottismo à Marinha Mercante, tta I'estrição ao
financiamento de despesasem moeda !oral, na preferência por
empréstimos para proletos especlticos, comparativo ao tipo mais
flexíve! de empréstimos globais oü por programa. Elites últimos
7
Ó
tinentatismd' . No episódio do foguete russo em Cubo, quarto
o cotejo era diretamente traxQdocom a Ut$ião Soviética? Em
São Domittgos?Mas, a$inat, que significa êste continentalismo
(iue rios abarcaAmérica do Norte e .Américado Sul, mito Rega-
lo pela ciência, desmentidodiàriamente pela economia, ewa-
ciado potüicamente? Ataram'lado com seus problemas internos,
atormentada com seu contrito com a China e. upreemiva com a
gtlerra americana contra o Vietnã, a União Soviética, por seus
anuais prudentes burocr.citas, de há muito reconhece, de certa
modo, a primazia norte-americana nas vizinlüanças geográficas
dos Estados Unidos e pelos confins afastadosda América do
Sut. Wa.shingtono sabe, e age em conseqilência. E qualldo veta,
sózinho, papéis catetivos latino-americanos, não é por mal, obe-
=leceaos ditames do Poder Naciottat Americano. ' (O marechal
Castelo conhece êsse mecanismo.)
Fado o decurso do mirlistro Campos -- curioso -- é um.]
pós-guerra, com o Pleito Z[4arshall. )scitação entre o devaneio e a racionalidade. Quando pende
l)ara a última, seu diagYtósticosabre a situação latino-america-
tt© é bom: a taxa de crescimento económico, sendo muito ànti-
namenteligada às vicissitudesdo comércio exterior, infere-sea
lecessidlide de ''uma politica fetais agressiva de promoção, de
exportações por parte dos países latino-americanos" . Tal atirma-
;ãa, porém, nada quer diz.er se não campletadn por uma con-
trapartida ittdispensabilissima, isto é, " u17w atitude menos prote-
=ionista por parte dos países industrializados, quer admitindo
Mais amplamente a importação de manutaturas, quer diminuindo
as iubve/zçõei à sala própria pr(Mação agrícola, competitiva da-
:lueta dos países subdesenvolvidos" . Os "países industrializados"
l que se refere tão pi#dioamenKe o Dr. Campos são, em primei-
'o lugar, os Estados Unidos. Isto é quase tudo, com efeito, o que
querem os signatários latinos da Ata do Rio de lareira. na sua
'longa e pen09a evolução", ou, melhor, -atribulação. Mas os
Estados Unidos, na cheia ou nü vazante, continuam impticàvet-
/ne/zfe "noi! commital"
Se o delegado brasileiro no Comité Interamericano Econõ-
.Rico e Social da Aliança, com seus colegas latinos, tossem con-
seqüen!es nos acessos de racionalidade, deltunciariam. a A fiança
pat'a o Progresso como um mito furado. Mas não é só a intexe-
3üibilidade compro'poda dêsse mito que torna frustradas todos
)s esforços latino-americanos e alguma ajuda norte-americana

9
8
"excesso" de n-ascimentos nla nossa América, preconizam um
ptanqamento familiar' para .qüe "se encare. realbtic:amertte os
eleitos de taxas exageradasde crescimento demográfico". Que-
rem diwr: Há jovem demais pelos nossos poses lebres! (.E.
l
note-se: é a única espéciede planejamento global que sugerem!)
E de onde vem a outra receita para o mal? Do velho prontuá-
rio das agências internacionais fiadas em dogmas evolutivos de-
volutos. Se pudesse, com efeito, a Dr. Campos daria "contornos
de alta prioridade.'ao incremento da produção e prodtltividade Dinâmica
agrícola' e não "à promoção do deietlvotvimento .üdmtrial' ;
mas, "üfelizmente'' , lamenta ête, o último "egârça oferece maior
alar-prestígio (?) e pode se basear, muito mais que no tocante
à agricultura, em técnicas e .métodosde trabalho iYTRportados
exterior". Assim, o fundo do pensamentoreformador do nosso
do Imperialista
Ministro é o penscsmentoim'pedal metropolitana, que vê com
impaciência mal disfarçada a insistência com qüe os nossos povos
da perderia teimam em qulererelevar-setambém à civilização in-
dustrial moderna. Jé era tempo de ver que a opção Campos, a
opção das citas e corlferências da onA. é, na .realidade, a opção
Impera(alista,e os nossos pobres povo periféricos não a podetn
aceitar.

Abril, 1966
./"lo ESCREVER
êste trabalho -- dedicado ao estudo das
raízesdo movimentomilitar de l.o de abril de 1964, que depôs
o govêrnolegal do Brasil e em seulugar instituiu uma ditadura
militar -- não co-nsigo
furtar-mo à tentação,para meu próprio
esclarecimento e o esclarecimento do possível leitor, de voltar
atrás à história sabida das relaçõesentre os paíseslatinos do he-
misfério e os EstadosUnidos da América do Norte, isto é, ao
período crítico de seu arranque imperial entre fins e comêço do
século. E daí partir, dêssemomento decisivo da aparição do po-
der imperial americanono mundo, para buscar situar na devida
perspectiva e luz o conflito central com Cuba, qu-e é e sempre
foi o nó górdio daquelas relações.
Cuba foi sempreuma predestinaçãopara a América do
Norte e que vem mesmodos alboresda independência
america-
na. Já nas épocas felizes da democracia rural de Jefferson, a péro-
la das Antilhas e.raobjeto, diz-nos um grandehistoriador ame-
ricano, T. H. Morrison, do particular interêssedos EstadosUni-
dos. E John Quincy Adams, por isso mesmo, podia fazer esta
confissão significativa: ''Olhando o provável curso futuro dos
acontecimentos,é quase impossível resistir à convicção de que a
anexação de Cuba à nossa República Federal será indispensável
à continuidade e à integridade da própria União". Ainda às vés-
britânica de ultrapassa-la. Em anexo à dita mensagem,.era tam-

:l Wã $:E8FEE%gele:
lados Unidos". . . .
bém publicada a nota de seu Secretáriode Estado, Olney, na
qual se dizia: "Hoje, os Estados Unidos são pràticamenteso-
beranos neste co.atinente e suas ordens são lei pai.a os assuntos
aos quais limita sua interferência. . A distância e três milhas
Mas isso é apenasum levantar de cortina do drama de do- de ocea:no intermediário tomam inatural e inviável qualquer
minaçãodo Mar ãas Caraíbaspela formidável potênciaimporia' união política permanenteentre um Estado americanoe uln
lista em crescimento.O sonhodos fundadoresda Repúblicasó
europeu". (Hisfórícz dos Estados t//lidas, Morrison-Commages).
começa, na verdade, a realizar-se (sob aspectos, que deveriam
assustarum Jefferson, o próprio Adams e iem dúvida, o último Estav.aassimdefinida para sempre a posição a que almejam
dêles, Lincoln) na derra(jeira década do século dezenove: quan- os EstadosUnidos no nosso Continente: plena soberaniaconti-
do a economia norte-americana se transforma num poderoso con- nental e que sejam lei seusinterêsses. Indo-se ao fundo das coisas,
sórcio industrial financeiro. verifica-se, ao longo dos anos e das peripécias históricas, que tudo
O senador Henry Capot Lodge (pai da embaixador ameri- o que a política externa estadunidensese tem proposto até hoje
cano em Saigon) não via mais sob aquela.atmosfera.de sonho, não tem variado: alcançar,de algum modo, algum dia, a dita
soberania.
de aspiração vaga, dos primeiros tempos da República? :a mis-
são dita histórica e, já agora, na sua'época, muito precisa,.de Ao sair da Guerra Civil que foi a continuação na tempo,
anexar Cuba: "Quando o canal de Nicarágua estiver construído ou o acabamento
da primeira devolução,a Revoluçãoda Inde-
a ilha de Cubo se tornará uma necessidade".E como se fosse.o pendência, a grande nação se entregou, de corpo e alma, à ta-
dono do futuro: "os pequenos Estados pertencem ao passado refa de desenvolversuasforças produtivas a(fmáximo e a todo
". . . agora que o continente está dominado, estamosà procura vapor e constituir-se num poder nacional capitalista de primeira
de novos mundos a conquistar". (Na geração seguinte, .com ordem, para cuja formação Dão houve, por isso mesmo, pou'
efeito,o filho estariano Sudesteda Ásia, na missãoprofetizada pança nem de recursos materiais nem de energias intelectuais,
pelo pai). . . . , . nem de dinheiro. Dem de músculos e braços, nem de suor, nem
Um estado de espírito novo surgia, empolgando os círculos de lágrimas, nem de sangue,mas apenasde escrúpulos.Enfim,
dirigentes da jovem e borbulhante nação. O WasAingfonPost, às poderosoe rico, ao curso de uma geração,com os seus multi-
vésperasda guerra contra.a Espalha, muito bem o exprimia: ao milionários novinhos em falha, o país sentiu crescer em si, como
escrever: " . '. uma consciêncianova nos invadiu -- a consciên- disse o jornalista, "uma consciência nova", "a consciência de sua
cia da larga -- e com ela um apetit! novo. . . o sabor do.im- força e' com ela um apetite novo. . . o sabor do império na
perio na baça do povo: . . Isso significa uma política imperial" baça do povo"
(Morrison). . . . .. .
Em 1895, o presidenteCleveland vê chegadaa oportunidade Êsse apetite novo vai ser primeiro saciado -- é natural --
de repor em moda a antiquada doutrina de Monroe, dando-lhe nos mares adjacentes: o golfo ão México e as Caraíbas. Outro
Garesmais revigoradas.Surge o conflito de fronteiras entre a grande historiador descreve êsse despertar do jovem impejlialis-
Guiada Inglêsa e Venezuela,mas que s? afasta. Sùbitamente, mo, de apetite aceso e dentes arregallhados: "Pelo amanhecer
descobrem-se na região minas de ouro. O Govêrno britânico es- do novo século, as inversões, pretensões e esperanças dos capi-
tende sem perda de tempo suas pretensõesterritoriais atê o .co- talistas americanos na região das Caraíbas haviam subido tão
ração da Venezuela e recusa a arbitragem. A 17 de setembro alto que nenhuma querela poderia surgir agora entre uma po'
do mesmo ano, Cleveland infomla, em mensagem ao Congresso, a tência européia e os governos latino-americanos, sem atrair for-
recusa de Lard Salisbury e, concomitantemente! sua decisão, çosamente a atenção de Washington para a existência de inte-
dêle, de determinar, por conta própria, a linha de.fronteiras e rêssespositivos além das vagas responsabilidadessob a Doutrina
obstar, por qualquer 'meio ao alcance da nação, toda tentativa
Monroe. Como a agulha.segueo magneto,a,política oficial se-
guiu o curso dosbeconlramentos economicos ' ' no nasceu pre'
.J.

mercantilistae só agora as revestiam das características


.impe-
rialistas modernas, os Estados Unidos não esper?m envelhecer,
nem como nação nem como capitalistas,.parasaltar ao estágio
:mperialistade sua evolução.epolítica. Mais vigmososque os
rivais mais velhos, contaram êles, ainda, com a vantagem do iso-
lamento geográfico que fêz, .pràticamente, de toda o resto dc Dezoito Estados Americanos comparei?ram à convocação?.em
hemisfério uma área reservada por Deus à expansão e exercício Washington. Blaine teve, enfim, ocasião de propor .?ya grau'
de seupoder e à satisfaçãode seuapetite.Por isso mesmo,Mor-
;ãon dize "os Estados Unidos encaravam os negócios dêste he-
misfério) como um assuntoparticular, como sua provmcia ex-
clusiva
Dentro dêssecontexto é que o antigo "pan-am?ricaDismo'
passou al s-ar "interanmericanismÓ". Impunha:se, com efeito, a mu-
dança de designação a fim de evitar as desagradáveis conota- cia]. perder qualquer poder de barganha com que ainda pudes-
ções do nome antigo, principalmente a. ouvidos batido:americanos. semsonhar, no futuro. Na realidade,havia algo naquelapropo'
' Com efeito, as origens pan-americanistasdo sistema intera- siçao que fazia lembrar as sujeiçõestarifárias que tratados !omo
mericano atual encontram-se na época mesma eM que.se.inicia- o 'de Methuen, da Inglaterra com Polltugal -- sob cuja iHluên-

ibãHB BÊ%*ü:E.TEl:;E
aquêle que era tido, no tempcl, como "o .sumo sacerdote do pro-
cia o projeção viveu, aliás, o Brasil bastante tempo, como im-
pério e já desde antes da independência --
às antigas colónias ibera-americanas. .. .
haviam imposto
. x-
Por êssetempo, Cuba ainda era colónia esp?nnoia:nao .[ai'
...
tecionismo americano". A idéia teve, assim, caráter.predominan-
temente económico, na opinião insuspeita.de S.. E: ,Mornson,
que não é marxista, nem adepto do "materialismo histórico" nem
de nada dessas coi.sas exóticas. debatia
ção económica do país.era .sem escrúpulos e. a ilha se
numa crise de suas indústrias principais, a do açúcar e a.do
umo ambas anuinadas por determinadas operações de tarifas
r
tanto por parte da velha metrópole.de Espalha como da pt\rte
de suafutura metrópole.O comércio americaly com Cubo ha-
via ultrapassado a casa dos cem milhões do dólares e as iDver-
soes tanques na indústria açucareiro orçavam em mais de cin-
aüenta milhões.

l Charles A. Beard, T/ze Rfse of ,4l?zerican Civilízafío/z.


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propaganda e vendendo bónus, com dezenas de ações flibus- gresso, por iniciativa dos advogados do ataque à Espanha:
ieiras saindodos portos americanos"visava a forçar o govêrno jurando perante todo o mundo que o-sEUA não tinham nenhu-
americano a intervir. ''Americanos com interêsses em proprie- ma intençãode exercersoberaniaou jurisdição sabre Cuba, mas
dades em Cuba clamavam pela interve.nção para proteger tais }
apenas restaurar a paz?" A questão era realmente angustiosa:
interêsses". "Cubanos com papéis de.cidadania suspeitosamente ''se o Govêrno da ilha fosse transferido sem restrições aos peões
frescosreclamavam a proteção do Govêmo dos Estados Unidos' insurrectose proletariado que tripudiavam triunfalmente sabre ?s
Tal e qual como hoje o senador Cullon, de llLinois, levanta-se classes dominantes espanht)las, ãcaria a salvo a propriedade da
no Capitóliopara dizer: ''Já é tempo de alguémacordare com- terra e do capital? A questãonão era de modo algumaca-
preender a necessidade de anexar alguma propriedade". ''Daí dêmica". E Beard conclui: "Todo mundo sabia que a Junta re-
por diante um incidente após outra agravamas relações entre volucionária em Hava-na estava de maus bofes, decididamente
os EstadosUnidos e Espanha.. . e quando havia escassezdês- inclinada a tratar sem muita preferência os espanhóis residentes,
ses incidentes, eram descaradamente fabricados . . . ": os quais, além de terem continuado leais a Madri durante a re-
cente guerra social, nunca deixaram de desprezar as pretensões
Como se esperava,três a'nosapósiniciada a sublevaçãodo
do populacho. Se com a retirada das tropas dos Estados l.Jnidos
povo cubano contra a dominação estrangeira,os Estados Unidos
as coisas chegassem a uma situação perigosa, os interêsses dos
entram, afinal, em guerra contra a Espanha, vencem fàcilmente
a velha potência decadente, ocupam a ilha cobiçada. Solenemen- negociantes americanos na ilha assim como as proprieda-
des imobiliárias dos antigos dominadores ficariam sèriamen-
te, ao declarar-se a guerra, o Congresso aprovava uma resolução
te ameaçados'
pela qual "os EstadosUnidos renunciam a qualquer disposição
ou intenção de exercer soberania, jurisdição ou coDtrâle sabre Foi precisamente dêsse impasse que nasceu a .engenhoca
"emenda }'latt" à nova Constituição soberana da recém-nascida
a ilha, exceto para sua pacificação e asseguramsua determina-
república, emenda cujos "princípios" consistiam em ''restrição
ção, quando aquela fâr alcançada,de deixar o Govêrno e o con- nas relações de Cubo com governos estrangeiros, limitações na.
trole da ilha a seupovo"
sua faculdade de contrair dívidas, coices-são de estações de abas-
Em muito pouco tempo, porém, os guerreiros americanos se tecimentopara a Marinha (Guantánamo) americanao procla-
viram senhoresde Cuba. Então, que fazer, agora que estão vi- mação do direito dos Estados Unidos de interferir nos negócios
toriosos? "Abandonar a ilha, como mandava, ín resple/zdenf da ilha a fim de proteger a vida e a propriedade
dicríon, diz Charles Beard, ''a soleneresolução aditada pelo Con- Fundado na camada emenda Platt, não demorou muito o
primeiro Roosevelt, em mensagem presidencial ao Congresso,
l (Morrisson-Commages,
Hfslóría dos Estados t//lidos.) Nada é
original, como se vê, na campanha dos exilados cubanos de hoje em 1903, -:m estender a jurisdição dela a todo o Continente:
que, queiram ou não queiram, têm por aliados os gr?ides interêsses "Erros crónicos, desordens que resultam em afrouxamento ge-
capitalistas
feridospela revoluçãode Fidel Castra;uns e outrosre- ral dos laçosda sociedadecivilizadae a falta de pagamentode
clamavam intervenção americana na ilha. Isso mesmo é denun- dívidas forçarão os Estados Unidos a exercer seu poder inter-
ciadopelo }l''aihíngrorz
Post de 15 de maio último. O grandejornal nacional de polícia"
liberal, comentando as atividades daqueles exilados, "pede a interfe- Nem bem três anos haviam passado desde que cessara
rência do govêrno norte-americano para impedir os ataques dêssesan-
ticastristasa Cuba, como o da urina açucareirode Pilon, alegandoque o govêrnomilitar americano,
a ordeminternada ilha tevede
tais ataquesaproveitam o regime cubano, prejudicando,além disso, novo de ser restaurada pelo porrete do Presidente lbheodore
os Estados Unidos". Disse o jornal que, "embora não se possa duvidar Roosevelt. Em adver'tênciaaos cubanos, moradores de End
do desmentido do Departamento de Estado sabre qualquer participa-
ção norte-americana no ataque, o grupo que executou o ataque e que Street, o presidente lhes diz: "se os hábitos de insurreição forem
se vangloriou do fato, numa entrevista à imprensa em Miami, é muito confirmados. . . será absolutamente impossível que a ilha per-
ligado à c.i.A. (Serviço Secreto de Informações) ." (.rar/zaZ do Brasíl, maneça independente; e os Estados Unidos, que assumiram pe-
16 de maio de 1964). rante o mundo civilizado o patrocínio da carreira de Cuba coma
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nação, terão novamentede intervir e fazer com que o govêrno gerida pelos banqueiros de Nova lorque, a fim de que se "estu-
sejaexercidode manchaa garantir a segurançada vida e pro- dasseatravésde um tratado negociadocom o Govêrno de Hon-
priedade de seus habitantes". E à sua maneira sumária e expe- duras, a autoridade que devia prevalecer naquela república"
dita, fêz que à palavra se seguisseimediatamente a ação, desem- $ Precedido de novo envio d-e maré/us, que restaura os negócios
em seu ''curso normal", estipula-seentre 1914-1916 um tratado
barcando na ilha os fuzileiros para restabelecerum regime
militar. em que a Nicaráguacede, até que enfim, uma faixa del.seu
A ordem interna, o bom govêrno, o respeita à propriedade terTit8rio para um canal e bases americanas, por três milhões
estrangeirapassama exigir de Washingtonuma vigilância quase de dólares para serem gastos em produtos americanos em coo-
anual, ou melhor, uma "batida policial", de vez em quando, peração com autoridades americanas.
pelos povos mestiços ou latinos do Continente, intrinsecamente, Eis que de novo os fuzileiros são obrigados a desembarcar
radialmente, biologicamente turbulentos e desonestos, sobretu- '+ em Haiti, mas desta vez. infelizmente, são compelidos a matam:
do nas vizinhanças caribeana-sdos Estados Unidos. mais de dois mil negrosque, por êsseou aquêlemotivo, diz
A cronologia dessas''batidas" policiais é longa. Iniciaram- Beard, se viram no caminho dos pobres fuzileiros. No ano se-
se elas depois da célebre declaração do Presidente Cleveland, guinte, "para mante.r a tranqüilidade doméstica", o almirante
a propósito da questãode fronteirasentre a possessão inglêsa Knapp apossou-se do toda a São Domingos, declarando a re-
Das Guianas e a Venezuela, segu'ndo a qual todo e qualquer pública sujeita ao govêrno militar dos Estados Unidos. Em.1920,
acordo ou união entre um país europeue outro da América La- :'a Marinha americana foi empregada para ajudar a estabilizar a
tina era "inatural e inviável". A última pretensãode potência Guatemala";foi esta, creio, a primeira estabilizaçãoque os mi-
européia de resolver seus casoscom país latino-americano dire- litares americanosfizeram naquela república. 1921: .4 7ribu za
tamentefoi a da Alemanhaainda contra a Ve-nezuela. mas in- de Manágua publica artigo-s contrários aos fuzileiros americanos
sufladadiscretamentepela ]Dglaterra,em 1903: teve de retirar- ali instalãdosl A redação do jornal é empastelada. O ministro
se do rico país sul-americano e submeter-se a uma arbitragem. americano residente intervém e requisita um teneno adequado
Feita assim a limpeza do hemisfério,consideradocaça fora da Capital para exercícios de treinamento, um /za//-dancírzg
privada dos norte-americanos, de qualquer gringo europeu (res- e um cinema reservados às forças americanas, além de alguns
peitado o srafu-qaa colonial, graças a acordo secretocom a Grã- locais (salões) de bebida à conveniênciadelas. Em 1924: os
Bretanha), tudo o mais que ocorreu nas Antilhas e adjacências marinesmais'uma vez em auxílio da ordem pública em Hon-
não passoupara Washington de meras açõespoliciais. (A-ssim, duras. 1927: de neva voltam à Nicarágua (pobre Sandino!). Eis
em 1905, Roosevelt ocupa sumariamentea Alfândega da Re- aí "uma crónica parcial" do que o Secretál.ioKnox chamoude
pública Dominicana e seus navios de guerra estacionam nas "doZ/ar d;pZomaW"(Charles Beard).
águas do pequeno país. Em 1906, desembarcaram outra vez os Ao longa de tantos anos, na paz e na guena, de expansão
fuzileiros em Cuba para acabar com novas desordens "prejudi- imperialista, principalmente no nosso continente, a técnica da
ciais à vida e à propriedade dos americanos". Em 1907, estabe- retórica americananão muda numa escalade valores que vai
lece-se,graçasa um tratado formal livremente negociado,o "pro- dos altos conceitos abstratos de idealismo, democracia, pro-
tecionismo pecuniário" na mesma pequena República Domini- gresso, felicidade, às noções mai-s vulgares de pi.opriedade e
cana, a qual, aliás, como hoje se verifica, só viveu mesmo sem negócios.E por isso mesmo de permeio às expressõesmais bru-
necessidade das visita-s periódicas dos maré/zes ao tempo da dita- tais de avidez, egoísmo e violência surgem as do um idealismo
dura "ordeira'' de Trujillo. Em 1908, nova ope.raçãopolicial quaseapostólicocomo em Woodrow Wilson, Fi'anklin Delano
em Nicarágua, com rompimento de relaçõese envio de navio Roosevelt, John Fitzgerald Kennedy, sem falar DOpróprio Theo-
de guerra para proibir aos nicaraguenses brigarem em Bluefields, dore Roosevelt, em Herbert Houver e outros.
"protegendo assim preponderantemente os interêsses americanos Toda gente sabecomo, em nome dos direitos divinos do
e es-trangeiros". Em 1911, a operação foi antes financeira, su- povo americano,o primeiro Rooseveltcriou um país "indepen-
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dente" tirado à força das costelasda Colâmbia e lá mandou suas infeliz, o país para capturar o caudilho popular Pancho Villa,
equipes jurarem um canal para que os americanospudessemdo- sem o conseguir, todavia. Veio a grande guerra mundial, os Es-
minar as comunicaçõesentre o Atlântico e o Pacífico e estender tados Unidos esquecempor um momento seu turbulento vizinho.
suas asas até o Extremo Oriente. Por um ''tratado assinado Eis, porém, que outro general no poder é ali assassinado.
entre as altas partes contratantes", os Estados l.Jnidos ficaram O problemado reconhecimentodo novo Govêrno para Washing-
senhores da zona indefinidamente, apesar de vez por outra, como to.n é reposto. Como se Wilson não ocupassea Casa Branca,
comichão c.rúnica, o Panamá, afinal república constituída, pro- é a velha tradição de ir cobrar dívidas, propriedades e vidas
testar contra as condiçõesque Ihe foram feitas e uma soberania que decide do reconhecimento. Os capitalista-samericanos que-
estrangeira eterna em seu próprio território. rem indenizaçãopara as perdas matei'iais que sofreram com a
Exala tal atitude uma dose de hipocrisia tão profunda e na- revolução, além da revogação dos decretos revolucionários de
tural, de que não é capaz n,enhum dos estouvados e irresponsá- naturezaconfiscatória. (É como o Departamento de Estado para
veis povoslatinos do continente.Justiça lhes seja feita. Mas os Fidel Castro: Acabem com a revolução e eu os reconheço). O
nossos amigo-s americanos con-seguem manter, em meio aos mais Govêrno mexicano evoca o exemplo da União americana que
sujos negóciose ambições, êsse imperturbável sentimento de recusou,ao têrmo da GuerraCivil, qualquerreclamação
es-
inocência, de quem se conduz pelo mundo na mais espontânea trangeira pelas propriedades perdidas ou deterio-rada-sem virtude
das gratuidades.O PresidenteWoodrow Wilson, que Rui Bat- da guerra.Wilson, impotente,não manda nova expediçãomilitar
bosachamoude "apóstoloda CasaBranca",cantavana rua os contra o país recalcitrante, nem estabelecerelaçõesnormais com
hi-nosdo Exércitoda Salvação,com o mais sublim-efervor, en- êle. E assim deixa a presidência.
quanto ao redor dêle os mais vorazes tubarões imperialistas tra- Quando o seu sucessorchega,é ainda mais tremendaa
mavam sórdidas operações do mais rasteiro interêsse pecuniário. pressão de poderoso-sgrupos interessados no petróleo mexicano.
Alegam, para justificar a intervenção, um prejuízo da ordem de
Os pobres e desgovernados países das Caraíbas foram, pre- meio bilhão de dólares. A serviço dêles, um-acomissão senato-
cisamente sob sua presidência, vítimas dos piores momelltos e rial, depois de ouvir os interessados na questão, como que con-
inUigas da mesma feroz gente de negócios. Em ]912, no entanto, solida as múltiplas reclamaçõesde toda sorte de americanose
ao assumir o govêrno, em À4obíZe,dirigindo-se aos povos da Amé- aconselhaa ocupaçãomilitar do México, casoo Govêrnodêste
rica Latina, lhesfêz Wilson um discursoque ficou célebree es- país não atenda às reclamações. Morre Harding já bem em tem-
pantou todo o mundo diplomático, dêste e do velho mundo po; chega Coolidge. Para êste tudo se resume nesta simples
Com efeito, nessemesmodiscursoprometeuêle, na sua verá questão: "Serão as propriedades de cidadãos americanos con-
expressão, "um dos milagresdo mundo moderno",ou a ''eman- fiscadas sem pagamento?" (Até parece pergunta de hoje). Mas
cipação daqueles povos dos capitalistas estrangeiros". os temposmudaram.Agora até o Senado-americanoquer a
Ora, sucede que às suas portas esto-urara a revolução para questão resolvida por negociação entre os dois Governos. Ou
emancipar precisamenteo México dos capitalistas estrangeiros e pela arbitragem.O Presidente,entretanto, não cede: os Estados
da oligarquia fundiária espanholareinante, em terno' do dita- Unido-s continuam preparados a estender sua proteção às recla-
dor Pediria Diaz, alastrando-se por todo o- país. O presidente, mações de seus cidadãos no estrangeho, até pelas armas. Mesmo
à cata de mi]agre,tenta ]evar suassimpatiaspara o lado do dentro de seu Govêrno, já havia quem preferisse resolver o con-
povo. O milagre, porém, não se deu e até hoje os capitalistas flito por negociações. O Govêrno mexicano não quere-aoutra
estrangeiros co.ntinuam .a oprimir os povos subdesenvolvidos do coisa. Em vão representantes oficiais do México informam Wa-
Continente, em aliança com as oligarquias agrárias de cada país. shington que apenasum sétimo das companhias petrolíferas .re-
Quanto à situação no México, o apóstolo acabou mandan- presentando um vigésimo das propriedades questionadas (os
do também desembarcar seus marines em Verá Cruz, espingar- grupos Dohemy-Mellon) continuava insistindo em furtar-se às
deando cs peões revoltados, invadindo, numa expedição punitiva leis agráriasem vigor, decretadaspela revolução.Mellon era,
22 23
dheito de ser proprietário de terra. Os americanosviram-se ma-
nietados pela cláusula restritiva constitucional. Impunha-se? pois,
rever a velha Carta. Constitucionalistas eméritos em Washington
$
redigiram um novo profeta de Constituição e trouxeram-no para
a aprovaçãoda AssembleiaNacional. Em face de antidemocrá-
tica pressão sabre o Congresso por parte de elementos certamente
demagógicos,a Assembleia não ousou adorar o projeto apresen-
tado. Os admi-nistradores americanos, em nome da democracia
representativa,dissolveram a assembléiae, como o velho Crom-
como fâr. o pretexto da ameaçacomunista começavaprometendo well dos inglêses,chamaram seussoldadospara expulsar, um a
tornar-se' manejabilíssima arma para encobrir, .como um celo- um, os representantesrecalcitrantes (uma forma mais bruta e
fane defensivo, os secretos desígnios da política externa de rápida -- menos polida ou brasileira -- de cassar mandatos) e
Washhgton. decretaram. num verdadeiro Ato IJlstitucional, a nova Consti-
'0 milagre que verdadeiramente produziu o idealismo de tuição com a boa cláu-sulademocrática,que permitiu a estran-
Wilson foi o avêssodaquele que pensou- Talvez o exempl? me- geiros possuírem terras no Haiti. Um plebiscito, sob a supervisão
lhor dêsse milagre inveiltido, iob a gestão dêle, seja .o.do Haiti. americana, se realizou, de resultados perfeitamente favor:áveis
Em 1916, banqueiros e homens de negócio, .em conivência com à nova Carta Magna, mas, contudo, com duzentosou trezentos
a Marinha de Guerra, apoderaram-senão só dos dinheiros pú- votos contrários, dados, ao que se diz, pelos próprios fuzileiros,
blicos d-apequena república comc} de suas terras. l.Jm dia os fu- a fim de que em matéria tão séria não houvesse unanimidade.
zileiros to'nam as reservas de ouro do Banco Nacional e as O episódiopassou-seao fim do período de Wilson.
mandam,em barco de guerra, para Nova lorque, onde são de- Seu sucessorque, como candidato, havia deblaterado con-
positadasnum banco, a juros baratos.Como o presidenteda pe tra a farsa. uma véz na CasaBranca sancionou-a.O DavaSe-
queda ilha reclamasse a volta do ouro, acontece ser ,assassinado cretário de Estado, Charles Hughes, não podendo, disse, estar
por um rival na política inte.rna. Novo- presidente é escolhido, acobertando hcriminações contra bancos americanos, -conside-
da conveniência do almirante americano para lá mandado a rava mais prático aproveitar a oportunidade para, sem sentimen-
fím de preservara ordem e defenderos bensdos concidadãos
. talismo, "promove; a tranqüilidade e o bem-estar do Haiti",
A Assembléia Nacional adrede convocada elege o candidato es-
enquanto uma comissão senatorial voltava de uma investigação
colhido e, sem perda de tempo, o nosso almhante o chama para
com êlo assinarum "Tratado de Amizade".Por êssetratado, ín loco com opinião semelhante,ou de que o dever dos Estados
Unidos -sei'iacontinuar sua obra de "instituir um govêrno local
os americanos ocupam a alfândega do país, passam a adminis-
tra-la e um conselheirovem de Washingtonpara dirigir os negó- tão próximo quanto possível do representativo"
Outro exemploé o da Nicarágua,Onde,em face da estra-
cios financeirosdo país. Os negóciosamericanosprosperam na nha e, ao que parece,perenevocaçãopara a desordemde quc
ilha. "Não pouca destreza", diz Beard, "e alguma demonstra- sofria o país (até tornar-seprop:riedadeda ilustre família So-
ção de força sãonecessáriaspara assegurara .ratificaçãodo Tra: moza) , o Presidente Coolidge teve de mandar seus marMei outra
tado de Amizade pelo Congressohaitiano. Num período de 5 vez, em obediência à lei não escrita da constituição imperialista
anos, mais de dois mil nativos foram mortos." Não poucos es- americana que regulava as relações entre êles e as pequenas na-
trangeiros residentes, inclusive americanos, levantaram seu p:de- ções das Caraíbas. Isto foi pouco depois da assinatura do Pacto
testo contra o estado de .coisas impõsto, entre os quais um mis-
antibélico Kellog-Briand que, em artigo expresso,afastavaa prior!
sionário, que acabou na pi.isão, e um especulador de terrenos, a guerra como meio de solução de conflitos entre Estados. Inter-
mais infeliz, pois que perdeu a vida. pelado pelo desrespeito ao espírito e à letra do famoso Pacto,
A história não acaba aqui. Vigorava na ilha velha constitui- o Presidente Coolidge apenas replicou: "Não estamos fazendo
ção que, num de seus artigos, excluía qualquer estrangeiro do
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maisguerraà Nicaraguaque um políciade rua a faz a uni tensõesdo poder marítimo britânico de exercer a sua velha mis-
transeunte. Lá estamos para ."proteger", etc., conforme a velha são de polícia dos mares e, a seguir, garantir ao mais jovem dos
fórmula. Assim, o pacto era válido só para o mundo lá fora; imperialismos
umafatia da Chinaeternamente
a partir e a re-
cá para dentro, na zona sempre perturbada da América Latina, partir entre os podêres brancos do Ocidente.
o que valia mesmo eram as velhas operações"policiais". Já em novembro de 1921 a Inglaterra fala destituída de
Enquantono terreiro da América Latina os EstadosUni- seu cerro de rainha dos mares. O PresidenteHarding, ao con-
dos prosseguiam nas suas operações "policiais", tratavam de pre- vocar de súbito as grandes potências marítimas para uma con-
servar no Extremo Oriente basespara suas operaçõescomer- ferência expressamente destilada a reduzir os armamentos, im-
ciais e políticas, a partir das Filipinas, que haviam recebido da pôs, e sem muita diplomacia, a política de "porta aberta". Logo
Espalha, como preço da vitória. Em 1926,i uma comissão,a à suaabertura,
Hardingconvidou
a Inglaterra,
o Japão,a
Comissão Harding-])augherty, mandada às Filipinas por Coo- França e a ltália a assinaremum tratado -: o Tratado dai 5 po-
lidge para hspecíonar z.n/aco a situação,relatava ao presidente, tências-- pelo qual se impunha ao orgulho britânico a paridade
em famoso telegrama, o que ali se passava e, sobretudo, a im-
periosa necessidade de os americanos lá ficarem: "Se nos re-
em força.naval com o jovem rival americano,enquantose des-
logva o imperialismo japonês a um segundo lugar obrigatório, e
tirarmos dessas ilhas tropicais férteis, estrategicamente situadas ).trança e ltália a um -t-erceiro.
Nessaconferência-.a Grã-Breta-
nos portões do Oriente, teremos de desistir de nossa posição nha perdia, na realidade, talvez a sua maior batalha naval.
como um poder asiático. Sem as Filipinas como base comercial
e militar, não poderíamosreforçar a política de porta aberta,
de oportuúdades iguais de comércio para todas as nações da Estamos por assim dizer na primeira mocidade do Dava int-
China, não poderíamos abrir ilimitadas oportunidades económi- perialismo. Os Estados Unido-s crescem em força e em irradia-
cas que vão acompanharcertamenteo despertardo Leste e não ção, ganham a Primeira Guerra Mundial e seus interêsses. a
poderíamos fazer eficazmente a guerra para proteger nossos in- partir de então, se estendemao mundo inteiro. Ascendem'ao
terêsses. . . As Filipinas são esUaÊêgicamente o único lugar dis-
ponível para os Estados Unidos como base. . . são parte de grupo pasto de primeira potência mundial. E o grande paradoxo é que
de ilhas, do Japão ao norte a Bornéu ao sul, que forma uma nessa hora mesma é que os arautos l:ib isolacioni-smoiriam
triunfar, internamente, sôbre o idealismo internacionalizante de
cortina através do Pacífico à costa da Agia, constituindo a porta Woodrow Wilson. Em nome, com efeito, do isolacionismo.os
para as futuras possibilidades do Extremo Oriente. Enquanto a
América segurar essa posição estratégica. . . continuará a ser um Estados IJnidos se retiram da Liga das Nações, mas é precisa-
mente então que o capitalismo amei'icano cria uma mariniia mer-
poderosofator na vida económicae internacionaldo Oriente" cante capaz de singrar .os .sete mares, levando a toda parte os
(Cit. por Beard.) produtos de sua indústria, já em série.
O plano de expansão marítima daquela época necessitava Depois de. se ter exercitado nos mares provincianos das
de vastacoberturapolítica tambémde âmbito mundial: para que Caraíbas, varado o canal do Atlântico ao Pacífico, passava o
a bandeira pudessecobrir a mercadoria era preciso ter os mares jovem imperialismoa operar por todos os mares do mundo.
livres aos navios mercantes.Daí surgiu a política de ''porta Contràriamente à inspiração oiigina], autênticamente democrá-
aberta" cujo objetivo precípuoera liquidar as últimas pre- tica, do primeiro isolacionismo,(; isolacionismodo Middle West
l Nesse mesmo ano o Congresso dos Estados Unidos aprovava a lei e do progressista La Follette, o novo é nitidamente imperialista.
que permitiu à Marinha de Guerra americanafazer acordoscom go- Serve como fómiula para .encobrir a política dos monopolistas
lrBFDOS
estrangeiros. Foi sob fundamento dessa lei que o Brasil pede tanquese livra-los de quaisquercompromissosque, atr;vés da
concluir com a Marinha americanaseu acordonaval, objeto de projeto Liga das Nações e outras.convençõesinternacionais, lhes pudes-
legislativo velho de muitos anos e s6 em abril de 1964 aprovado na sem.atar mãos, pés e.canhões, na conquista de sua parte, parto
Câmara dos Deputados em Brasília.
condigna, nos mercados mundiais que' começavam a redividir-

27
imperialismo "darwiniano", foi chamado de imperialismo ''mes-
se e a ser ampliados,em conseqüênciamesmo da mudançanas siânico''.l
relações dc forças entre as grandes potências imperialistas.
Seja como fâr, de ''messiânico" com Wilson, vai o im
Quanto à Europa, ficasse a entredevorar-se como o etemo ba- perialismo americano tomar para o mundo sua feição por assim
laio de caranguejos que sempre fera. (SÓ depois da Segunda dizer de maturidadecom o segundoRoosevelt.A partir dêste,
Guerra Mundial 'é que os Estados Unidos iriam concentrar-se
o que se chama de imperialismo americano é uma.contradição
sabre ela, numa espécie de inédita operação de recolonização). pemlanente entre o mecani-smoimanente de suas forças econó-
A obra de mundialização
do imperialismo
americano
foi micas que exigem constante ajustamento do Poder Público a.seu
levada adiante pelo Presidente Calvin Coolidge, ou a medio- sei.viço,interna e externamentee o papel cada vez mais deci-
cridade provinciana coroada em mito, o mito áureo da prospe- sivo do Estadoamericanopara a Hiãói'ia e o destinodo mun-
ridade com "normali.dado". A máscara isolacionista também do inteiro, inclusive para a sua própria nação
Franklin D. Rios-evelt fai,' històricamente, a encruzilhada
tinha serventiainterna; era a ideologia que molho.rpodia tran-
patética dessas direções contraditórias qle já há .qua-se uma.ge-
qüilizar os pequenos burgueses essencialmente provincianos, as ração esmagavamo ocupante da Casa Branca d! então, Woo-
classesmédias das localidades rurais, assegurar-lhesque o país, drow Wilson. Roosevelt'faz a SegundaGrande Guerra violan-
saído da guerra, não iria meter-se nunca mais nos complicados e do tôdas as tradições amei.icanas,inclusive a estabelecida pelo
infindáveis conflitos de interêssese intrigas do velho. mundo. supremo pai da Pátria, George Washington, quando . recusou
Mas, ao contrário -- e para isso mesmo estava Coolidge n.a o terceiro'têrmo presidencial. Ma-s não foi por mera ambição ou
Casa Branca -- iria a nação usufruir em paz e sossêgodas ri- mesmo prévia decisão pessoal que chegou. a disputar pela quarta
quezasacumuladasque a guerra e a vitória trouxeram. vez a própria sucessão.O momento histórico .impusera ao pais
uma nova política, destinada a superar a catástrofe.económica
O acúmulo de capitais, as tremendas potencialidades de seu de 1929 e a prolongadadepressãoque se seguiu.até.a entrada
aparelho produtivo precisavam do mundo .para re#izar-se em do paí-sna guerra. Exigiu também que a nova potência suprema
plenitude.' Limitar-se à eterna exploração das Caraíbas e adja- exercesse a plenitude dê seu papel responsável, pela primeira vez,
cênciasnão era mais suficiente;era querer confinar um leão no âmbito mundial.
numa gaiola de passarinho. Investimentos de capitais e comércio Forçado a uma série de reformas no plano económicoin-
exterior tinham de ampliar-se ao máximo, para dar saída ao que terno, em busca de uma saída ã depressão e de alcançar o tempo
se chamou de "ininterrupta corrente de mercadorias" perdido em matéria de legislação social para dar à classe opera'
Ao lado do "direito" de intervenção criado por Theodore ria em pleno vigor da mocidade um estatuto digno de sua força
Roosevelt, o Presidente Wilson acrescentara um nõvo "prin- e de seupapelno conjuntosocialda nação,Rooseveltvi!-se
cípio", o do não reconhecimentode governos!em tais ou quais também obrigado a olhar os horizontes internado-nauscom olhos
condições, intro.duzindo com isso mais uma fonte de contradi- menos ortodoxos que os de seus antecessores.Havia no pano-
ções e atritos com os países latino-americanos: A co'ndição para
rama internacional'dos anos de 30 a mesma nota sombria do
o reconhecimento era o compromisso com os interêssesprivados panoramainterno de seu país; uma Europa e um mundo de-
americanos. Com êsse acrescentamento de ordem político-eco-
nómica nada mudava, entretanto, na natureza das relações entre 4 ] Citando Bemis (Tbe l,afim Hmerican Polícy o/ rhe .U:S.), .'êsses
missionários da diplomacia (Wilson, Bryan) criticam a diplom?cia do
os EstadosUnidos e os outros paísesdo Continente. No entanto, dólar, mas seus piedososesforços não são nunca em contradição com
para algunso seu Govêrnofera uma espécie. de precurlsorda o interêsse estratégico dos Estados Unidos". Xavier de Chamisso diz:
política do bom vizinho do segundoRoosevelt; na realidade, o "Wilson transformou o imperialismo daiwiniano em imperialismo mes-
que passou a ser .algo diferente foi a linguagem...Houve certa siânico". (U/ze Po/fríqz/e Êconomíque d'Hemísp/zêre,.Pauis, ]953, pág.
125). A tonalidadereligiosados Bryan e Wilson, observavacom jus-
modificação na qualificação conceitual do imperialismo que, de
29
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vastado pelos desastres da inflação, da depressão, do recesso Centro Monetário Latino-Americano no México, dá as razões
económico, dos milhões e milhões de desempregados,e milhões pelas quais tudo aquilo se passou, .então, me-smo sob.o segundo
de fru-strações familiares e individuais. Ao mesmo tempo, em Roosevelt: ''Havia' uma enfática diferença: os Estados Unidos
face do sistema capitalista em colapso, com suas classes dirigen- não contavam com uma Aliança para o Progressoem 1933. Na-
tes nos principais países da Europa impotentes, alarmadas, sem queles dias, Washington não demonstravaqualquer preocupa-
forças e energia para romper o círculo mágico da depre-ssão, ção oficial com a sorte dos camponeses,
nenhumatentativade
das limitaçõesimpostaspelo tabu da não intervençãodo Es- "bater os comunistas no seu próprio jogo", promovendo uma
tado na economia,à esperade um espontaneísmo milagroso que revolução económica (sic). "CastiÕ foi 'creditado pela ajuda dos
repusesse em funcionamentoas eternasleis do mercado,ao lado EstadosUnidos à América Latina e com justiça", anemata o
de uma ascensãorevolucionáriana têmperadas ma-smas prole- professor americano, com certo sentimento de equidade.
tárias descontentes,novos grupos com métodos bárbaros e inor- Deixemos, porém, de lado a interpretação tão otimista do
todoxos se erguiam em várias nações,para alcançar o poder simpático economista superdesenvolvidoquanto às diferenças de
através de votos, se fosse possível, mas também de punhos, de comportamento em Washington entre 1933 e 1961. Seja-nos,no
dentese de balas, com a promessade arrancar seuspaísesdo entanto, permitido lembrar que mesmo antes da Aliança, em-
atoleiro da crise. bora depois do episódio de Grau San Mártir, o segundo Roo-
Na extremidade oriental da Europa, um inédito poder per- sevelt lançava sua política de Boa Vizinhança, pràticamente com
seguiauma experiêncianova, a de conduzir as forças até então a ab-rotação da emendaPlatt.
caóticasda economiasob a disciplina de um plana: a União So- Com efeito, em 1934, no campo "interno", êle negocia si-
viética que olhava os acontecimentos prudentemente, de fora, lenciosamente um tratado com a administração Mendieta em
temerosadas consequências de uma vitória da extremadireita Cuba para a ab-rogação da emendaPlatt. Toda a América Latina
da Alemanha, com os nazistas,e pouco esperançosade uma vi- saudouo ato como uma prova positiva no sentidode melhorar
tória da esquerda, sob a hegemonia ou não dos comunistas. suasrelaçõescom os Estados Unidos. Até que enfim Washington
Com efeito, a política de Stalin diante da ascensãode Hitler dava mostras de renunciar a intervir em Cuba. A propósito,
na Alemanlia caracterizou-se pelo entreguismo ou capitulacio- um historiador diz: "Mas, ao mesmo tempo que se retiravam po-
nismo.: No Extremo Oriente, o Japão engajadona éhha era l)ticamentede Cuba", os Estados Unidos haviam ali "amplia-
como um cão faminto que não tem dentes nem garras bastan- do vastamente seus interêsseseconómicos. Na verdade, Cuba é
tes para destruir e devorar toda a sua prêsa, ou simplesmente hoje uma dependênciaeconómica das utilidades americanas, es-
o continentechinês.Não podia devorar a China, nem podia ttadas de ferro, mineração, açúcar e fumo. Os interêsses ame.ri-
desprender-se dela caços em Cuba que, nas vésperas da guena espanhola,totaliza-
O resto da periferia do mundo olhava aflito em tardo de vam apenas cêrca de 50 milhões de dólares, elevavam-se, nos
si: na América do Sul e mesmo latina a influência totalitária quarenta anos seguintes, a mais de 1,2 bilhões de dólares. Êsses
fa-scistae nazista ganhava terreno, constantemente.Vários go- enomies investimentos eram em grande parte controlados por
vernos ditatoriais, inclusive no Brasil, passarama inspirar-se uns poucos bancos, sendo o mais poderoso dêles o NatioDal City
antes nessas forças totalitárias, antidemocráticas européias do BaDk of New York".i
Já é Cuba agora apenas um episódio no drama mundia],
teza Bemis, tinha o dom de exasperar ainda mais os latino-americanos ondevai agir o imperialismoamericano.Mas eis que de novo,
que sentiampor trás das palavrasevangélicasa crua realidadedos em 1938, essapolítica era posta em provação,qllando do de-
negóciosou "a mão de ferro em luva de pelica"
l Sabre a política soviéticarussa em face da ascensãode Hitler ao creto do presidenteLázaro Cárdenasque nacionalizouas com-
poder na Alemanha, ver L. Trotsky: Rapo/ ção e Co/zfra-Revolzzçãa panhiasde petróleo anglo-americanas. Pela primeira vez, em
lza .4/emanAR,
ed. Unitas, São Paulo, 1933, e .face/zsãoe Qzledado
Terceiro Refcã, de W. Schirer. l Morrisson-Commages, /lísfóría dos Enfados t/nídoi, pág. 465
que nas d-emocracias ocidentais "decadentes" ou mesmo na ocasião tão desafiadora aos negócios de súditos americanos. um
grande república do Norte do Continente. É nesse ambiente presidentedos EstadosUnidos não intervinha, não mandavaos
tenso que, em 1933, Franklin Delano Roosevelt entra para a seus marines, mantendo-se fiel aos compromissos de não inter-
Casa Branca, quase ao mesmo tempo que Hitler sobe, ellfim. ao
> venção incondicional, assinados na Conferência americana d3
poder na Alemanha. Buenos Abres, em 1936, onde o presidente em pessoa com-
A partir de Franklin DecanoRooseveltas relaçõesda Amé- pareceu. Pode-se argumentar: se Roosevelt não interveio em
rica Latina com os Estados Unidos vão entrar em Dava capítulo. 1938, foi pelas mesmasrazões por que Wilson acabou não vol-
Mas aqui convém lembrar que a inauguração do grande presi- tando, com os seusmar;nzei,ao Médico em 1916: a aproxima-
dente na Casa Branca não se deu como um sinal verde para a y ção da Primeira Grande Guerra, então, e a aproximaçãoda Se-
América Latina. Antes da revogaçãoda emendaPlatt, houve gunda Grande Guerra, depois. Mas será um mero argumento
ainda uma intervençãona amarguradailha de Cuja, ao velho abstrato. As companhias de petróleo, naturalmente, não gos-
estilo caribeano.Porque não agradasseaos interêssesali inves- taram da abstençãorooseveltianae teriam preferido a velha
tidos o novo govêrno reformador de Grau SaDMartin, não foi praxe i:ntervencionista que sempre dera bon-s resultados no pas-
êste reconhecido por Washington. Antes pelo con-traria, quer sado. Mas isso não quer dizer que não continuaram a fazer toda
dizer, foi deposto. Deposto .sob as bênçãos generosasdo Sr. Sum- sorte de pressões sabre Washington. Afinal, um madzzxvive/za'l
ner Welles, Embaixador americano em Havana. O professor foi encontrado entre o Govêmo mexicano e as companhias ameri-
John P. Powelson, a propósito, escreve: "Quando Grau San canas, sem levar em conta qualquer aéomodamento com o truste
Martin tornou-se presidente de Cuba, em 1933, o D'epartamen« anglo-holandês.
to de Estado ficou horrorizado.Aqui estavaum líder que ad- Já estávamos então nos pródromos da Segunda Grande
vogava os ''direitos" dos camponeses,permitia a trabalhadores Guerra, é verdade. Ao estourar, o impacto económico sabre o
tomarem as u-sinasde açúcar e era um desabusadodefensor do mundo transformou. f5i6pletamente as perspectivas de desen-
nacionalismo cubano. O Embaixador dos Estados Unidos. Sum- volvimento para toda' a América Latina. Novas relações eco-
ner Welles, classificou-o de "urra-radical", com "idéias fran- nómicas e políticas surgiram quase pela força das coisas antes
camente comunistas". "A resposta norte-americana foi de re- de o serem por decisão deliberada dos homens. O destino eco-
cusar reconhecimento e trabalhar consistentemente para derru- nómico da América do Sul mudou, radicalmen-te.O ano crucial
ba-lo, objetivo realizado no comêço de 1934 com a ajuda de dessa transformação foi 1940.
um oficial subalterno de nome Batista". O mesmo pi'ofessor
aindacomenta:"QuandoFidel Castãose tomou o chefedo Go-
vêrno cubano em 1959, os EstadosUnidos ficaram igualmente Depois dêsse golpe de vista pelo passado rec.entedo intera-
perturbados. As relações diplomáticas foram estabelecidas, mas
mericanismo, talvez possamos encarar em verdadeira perspecti-
depois rompidas. Mesmo antes da dominação russa em Cuja, o va, na sualuz própria, a política de Washingtonem relaçãoao
Govêr;no em Washington iniciou sanções económicas e ajudou Brasil e aos outros países latinos do Continente. No seu pano
uma invasão por refugiados cubanos anticastristas. Para aquêles de fundo histórico, podemosmelhor compreendê-laem todas as
que se lembram dos dias de Grau, a respostaa Castra parecia suas voltas e tentar delinear o envolvimento que ela nos pre-
como um velho disco de gramofone.''l T
para, em face do provinciano anacronismo com que os homensda
O Sr. Powelson, que foi economista assistentejunto ao Fun- contra-revolução brasikira traçam, na arena intemacional, os
do Mk)notário Internacional, conselheiro do Govêrno da Bolívia destinos do nosso País.
e atualmenteé diretor do programade contabilidadee contasdc,
l John P. Powelson, 7o4ay'i Z?co/zonzíc aKd Sacia! Revolutíon
McGraw Hall Co., New Ydrk, 1964. b
32 33
mércio ex.tenor,.numa concorrência sem quartel aos rivais já an-
teriormente.!ntrincheirados em excelentes posições, lançaram-se
os EstadosUnidos à ofensiva. Já em ]920, por exemplo dera-se
um verdadeiro dename de dólares sôbre a 'América Latina, prin-
cipalmenn sabre a América do Sul, região até então deixada
de lado, ou aos.inglêses,salvo a fímbria norte, às margensdo
Caribe, sob a firme tutela de Tio Sam. ''' '-''
Aparentemente, aquêle derrame foi condenado e com boas
+
razões, como pura especulação inescrupulosa por parte de ban-
D' queiros, corretores e aventureiros americanos. No entanto. teve
compensadoresresultados económicos e, sobretudo, políticos, no
seu pruneiro teste sério com o seu rival britânico, até então chefe
mconteste.
do terreiro sul-americano.De qualquermaneira,aos
fins de 20 as exportações americanas para o nosso Continente
setinham elevadoa mais de um bilhãoãe dólares.É o início da
luta para arrancarà Inglaterra a hegemoniafinanceirae econó-
mica que ali exercia, desde a independência de seus Estados.
.LiM BUSCAde razões intrínsecas que expliquem o com Hoje podemos chamar de provincianos êsses primeiros en-
portamento político e económicodos Estados Unidos da América saios de capitais de sabem das suas fronteiras nacionais para
para com a América Latina, convém tentarmos acompanhar o colocar-se no .estrangeir.g.
cessa primeira expansão de capitais,
aparecimentodo movimento imperialista americano como que ao ao .fim da Primeira'(lg;nde Guerra, foi precedida apenasde
ao nascer.Êssemomentose deu quandono interior do país se tímidas tentativas, algo no espírito pioneim dos abridores de
formavam grandes trustes e corporações de tendências intrinse- fronteiras! por parte de empresafios isolados pela América Cen-
camente monopolistas e intrinsecamente expansionistas. O Es- tral e o Oeste do Continente.
tado ultraliberal americanofoi o instrumento indispensável,a IJm dêssespioneiros, o engenheiro Fred Lavas, ao fazer o
serviço dos grandes capitães de indústria de então, àquela for- histórico dessasincursões iniciais do capitalismo do 'seu país no
mação imperialista. Se a vitória do Norte sabre o Sul foi a liber- estrangeiro, e-screveu: "Naqueles dias estávamos tão ocupados
dade total do capitalismo para apoderar-sede todo o território com o nosso próprio desenvolvimento que dávamos pouca
nacional, sempeiasnem freios; separa os fins do séculopassado atenção ao comércio externo, aos negócios externos ou as re-
e começosdêstea descoberta
do petróleo,os progressos
da lações externas e nenhuma a investimen-tos no estrangeiro. E isso
grande indústria pesada e a invenção revolucionária do auto- continuou assim até tão tarde como 1915".t
móvel levaram os capitalistas americanos a expandir-se além- Se a-s primeiras experiências inversionistas americanas não
fronteiras, primeiramente na região das Caraíbas, transforma- tiveram muita duração, dêssesprimeiros investidores, diz o Sr.
da em terreno de caça dêles; a Primeira Grande Guerra levou
Fred Lavis, çom certa melancolia e bastante ingenuidade, pois
aos primeiros ensaiossistemáticosde conquista do mundo. Foi '}

que era um dêles,que "vieram mostrar que muito antes do iZo-


então que, graças à ação do Estado, os órgãos e instrumentos gan do Bom Vizi:nho tornar-se popular" já o estavam aplicando
políticos e económicosindispensáveisà ação imperialista foram
criados.
l XThe Economia Defende of the Western Hemisphere, lttc Law\s
Assim, ao cabo da Primeira Grande Guerra, depois de ter A businessprogram", The American Councit on Public Affairs
adquirido o equipamento necessárioa atirar-se à disputa do co- WasHngton,D. C., 1941.
'b
34 35
no México e adjacências.
E êle nos dá o exemplode uma fer-
Essa ki é a chave da política americana de comércio ext:-
rovia de 800 milhas de ex®nsão que era, então, construída
dor. Depois dela é que começa realmente uma política sistemá-
entre Guatemala e EI Salvador, por uma sociedade americana.
com parte considerável de capital inglês.i tica de inversõesde capitais americanosno estrangeiroe de con-
Todos êsses empreendimentos eram, porém, de iniciativa
# quista dos mercadosexternos. No relatório da Comissãoque a
preparou recomenda-se "uma legislação que melhor pos-sibijite
de.indivíduos isolados,ou de pequenosgrupos de "instinto pio- aos ma:nufatureiros e produtores americanos pelo menos con-
neiro". Seus projetos não representavam senão parte extre;la- servarem
o tureno na ferozluta comercialquepareceimi-
mente pequena da economia nacional americana, com exceção nente ao término da guerra". Redigido em têmlos quase de uzn
no caso da ferrovia mexicana.Emi-ssõesde títulos e açõescom manista ortodoxo, em suasconcepçõesleninianasde imperialis-
participação do público eram rmíssimas. E principalmente não
contavamcom a colaboraçãodo seuGovêrno. + mo, diz o relatório, numa do suaspassagensmais significativas;
''O mapa eco.nâmicodo mundo está sendo rdeifo.x Os homens
Com 3 Primeira Guerra, o mercado monetário mundial foi de negócios do mundo estão procurando prever as futuras con-
desmantelado.Pedidos de créditos e capitais acorreram aos Es- dições de reajustamento dos negócios em seu maior proveito.
tados Unidos, de cujas instituições bancárias não se podia es- Os próximos anos apresentam possibilidades de conseqüências
perar. assistência, pois não estavam preparadas para emprestar de tão grandealcancee tão duradoiraspara a indústria, o co-
o dinheirode seusdepositantesem ciédiios ou investimentosna mércio e as finanças americanas como talvez em nenhum outro
estrangeiro, a longo prazo. O público em geral ainda desconhe- ano da história do país."a Produtoras, industriais, financistas,
engenheiros, publicitários, age:nte-s,importadores, contratantes,
cia tais operaçõesinversionistasfora do país. Foi então que se
reuniram finâncistas ]íderes do país para' constituir uma Socie- economistas, todos êles, diz o Relatório, consultados ''foram
dade Internacional Americana, com tim capital integralizado de unânimes em mostrar a disparidade de condições entre êles,
50 milhões de dólares. Entre os seusprincipais diretores estavam desprotegidospe[o EstfHÓ, que lhes amarra os movimentos com
nomes de grande projeção pessoal ou através das famílias, ver- a Lei Antitruste e og felizardos rivais (síc) dos outros países,
dadeiros protagonistas na história do capitalismo americano. assistidos a cada pa-sso por seus governos. E é contra êsses gru-
A sociedade, organizada nos .moldes inglêses, visava a fi- ! "Aos velhos 'motivos' da política colonial, o capital financeiro acres-
nanciar a construçãode emprêsasem paísesestrangeiros,a ser centou a luta pelas fontes de matérias-primas, pela exportação de ca-
levada a efeito por engenheiros americanos e usando maquina- pitais, pelas 'esferasde influência'... ín fine, pelo território económico
em geral. . . quando o mundo todo já está inteiramente dividido, é-se
rias e equipamentos americanos. Seu campo de atividades era inevitàvelmente conduzido a um período de intensa luta pela divisão
vastíssimo-- o mundo inteiro -- e seu propósito era mandar B redivisão do mundo" (Lênin, Imperiaiism, the Highest Sfage of Ca-
engenheiros e economistas em viagens de prospecção e investiga- pífalísm, pág. 256, ex. by E. Varga, L. Mendelsohn, International
ção pela Rússia, China, Espanhã, ltália, Colâmbia e "outros Publishers, New York) .
quarteirões do globo". Pouco resultou, entretanto, da iniciativa. 2 TNEC, n.o 9, Exporf PTÍces a/zd Exporf Cerrei; pág. 114.
Para se ter idéia do que realmenteaquêles"próximos anos" de
Para o fim da guerra de 14, a sociedade dis-sorvia-se, embora que fala o relatório, a partir de 1918,continham de possibilidadesde-
reiniciassesuas atividades,pouco mais tarde, mas já agora ex- cisivas na história do expansionismocapitalista americano, basta correr
clusivamente como "truste de investimentos".z os olhos por êssesnúmeros,que dizem respeitoapenasà nossaAmé-
rica do Sul: Os investimentos
inglêses,então ainda rivais dos norte-
Por mera coincidência,ao tempo em que a sociedadese +

americanos, somavam, em 1913, 3 383 bilhões de dólares; em 1929,


dissolvia, uma lei era aprovada no Congresso: ".4n ,4cf /o Pro- 4 486 bilhões. Agora, os Estados IJnidos: em 1913, era ainda paroquial
mete Expert Trade aYü Other Purposes". de seu capitalismo, somavam os seus investimentos apenas uns 173
milhões de dólares; em 1929 (dez anos depois da Lei Webb-Pomerane)
l Fred Lavas,obra citada,pág 87 haviam subido a 2294 bilhões. Em têrmos absolutos e em termos
relativos, o crescimento das inversões americanas era infinitamente
2 Idem, idem, pág. 88.


L maior

37
pos associadosem cartéis e /zomílzgsque os americanostêm de O relatório ainda aponta os vários cartéis e organizações
competir la fora. Na Alemanha, ltália, .Holanda, Suíça, Bélgica, estrangeirasque controlam o mercado internacional'de vários
Japão, os homensde negóciossão muito mais livres para coo= produtos importantes, obrigando companhias americanasa se
parar e combinarque nestepaís. Êles desenvolveram numero- sujeitarem aos preços que impõem. Assim, por exemplo, o caso
sas e amplas.combinações,por vêzes ajudados por seus gover- do mercadode cobre,Jjue antes de ser controladopela Anacon-
nos que, efetivamente, os apoiam em suas atividades, tanto no da e a Kennecot, ambasfigurando entre as duzentasmaiores
comércio interno como externo."i
corparagoesnão financeiras americanas,era contmlado por um
A Grã-Bretanha que havia podido, até então, graçasàs suas grande .Konzern alemão, a Metalbank und Metallurgische'Gesell-
posições pioneiras,. ao. prestígio de suas velhas casas exportado- schaft A. G., de Francforte sabre o Mente. Através (]Ésubsidiárias
ras, à .superioridadede suaslinhas de navegaçãoe facilidades e filiais em muitos paíseseuropeuse da África e Austrália, ela
bancárias, poupar-w .o grau e escala de combinaçõesa que se controlava as minas e fundições de cobre e chumbo nos Estados
viu arrastada a indústria alemã, para vencer na concorrênãa inl: Unidos, México e .outros países, fazendo ainda os produtores
ternacignal, acabava também põr entrar na via das combina- individuais competirem entre si' e forçando-os a baixarem os
ções No ramo da.produção e exportação de carvão, ela a orga- preços. A$ companhias americanas de cobre, conta o relatório,
nizou de. alto a baixo, desde as operações de mineração'às ficam desamiadasdiante da rêde do combinaçõestecidas na Al:-
comp?nhiasdo mercado.exportador,'às linhas de transporte e manha e "com tais táticas", queixava-se um dos presidentes dessas
às agências de .distribuição no estrangeiro. "Isso, diz o Relato. companhias americanas, "inclusive a da manipulação de nascentes
rio: dá aos inglêseso predomínio que -têmno importante mer- mercados .externos! consegue o truste alemão comprar milhões
cado sul-americano. Os fabricantes de cimento britânico também de toneladas de cobre americano a preços que em média, numa
estão unidos,numa.poderosa e feliz organização para a extensão sériede anos, saem a perto de um centavopor libra abaixo dos
de .seu comércio de ultramar".. Menciona ainda o documento preços pagos.pelo co!»qmidor americano.';i Naturalmente, os
varias outras associações para promover uma agressivapolítica americanos não gostal$m dessa.experiência antecipada do eter-
de conquista de .mercador exte;nos por parte dos manufaturei- no qui1lhão reservado aos subdesenvolvidos. '
ros britânicos, sobretudo nas indústrias elétricas, de a godão, têx- Em face de tão deprimentescondiçõespara os produtores
til, de louça, .fumo, papel de parede,:feno e aço e muitas outras. norte-americanos. a Comissão terminava por recomendar ao
O relatório conclui: "É'contra .tais organizações que unifi- Congresso investi-los de condições para "competir nos merca-
cam poderosos grupos. de combinações, sustentadas por grandes dos estrangeirosem têrmos mais aproximadamente iguais aos
bancos, ajudadas por linhas féneas e marítimas e assistidaspelos dos competidores..estrangeiros".Pairavam, entretanto: dúvidas
governos que centenas de manufatureiros americanos e produto- quanto à aplicabilidade da lei nacional antitruste aos mesmos
res relativamente pequenos têm de .competir, se se entregam ao exportadores. Tais dúvidas vinham, segundo as queixas dos in-
c(mlércio exterior. .. Em conseqüência, defrontando-se com a teressados, até então sustando "qualquer desenvolvimento. do
rude concorrência por parte de poderosas combinações estran- mercado externo'' do país na base da cooperação entre produ-
geiras e dependentes de barcos, bancos, cabos, telégrafos estran- tores e manufatureiros americanos. Respondendo às queixas, o
geiros.,correndo pois o risco de revelarem os segredosde seus Relatório esclarece:"Não é razoável supor tenha sido intenção
negócios..de .ultramar a .seus competidores estrangeiros e de so- do Congresso obstruir o desenvolvimentodo comércio exterior.
frerem discriminações efetivas contra o próprio negócio, os ma- proibindo o uso no comércio ostra.ngehode métodos de organiza-
nufatureiros americanos e espacialmente os pequenos'pmdutores ção que nâo .operamem prejuízo do público americano. . . e que
estão frequentemente numa 'decisiva desvantagem no comércio sao necessáriospara que uma maior igualdadede oportunidade
exportador".2 seja oferecidaaos americanosno lidar' com os concorrenteses-
1 LNEC 9, pág. 115.
2 Obra citada, pág. 116. l Obra citada, pág. 116
$ 39
f

trangeiros". "A Comas-são, por conseguinte, . recomenda respei-


tosamente ao Congresso promover uma legislação declarat8ria
que permita remover a presentedúvida quanto à ]ei antitruste,
estabelecendo claramente a legalidade do tal cooperação."
O resultadofoi a aprovaçãopelo Congressoa 10 de abril
de 1918 da Lei Webb-Pomerane. Em seuparágrafo2, a lei de-
clara expressamentenão conkr a Lei Sherman (lei antitmste)
nada que proíba qualquer combinaçãodestinada a atuar ]á fo--a.
no mercado exterior, por parte de homens de negócios ameril-
canos. "Tudo pode ser feito", menos "restringir o comércio den-
tro dos EstadosUnidos. . . tal associaçãonão entra nem nos
EstadosUnidos ou onde íõ11em qualquer convênio,arranjo ou
conspiração (sfc), para qualquer ato que, artificial ou intencio-
nalmente, reforce ou deprima preços dentro dos Estados l.Jnidos
de mercadorias da classe exportada pela tal associação, ou que
diminua substancialmente a conconêiicia dentro dos Estados
Unidos.ou por qualqueroutro meioque ah restrinjao co-
mercio' ' .'
Livres que ficaram os homens de negócios americanos das
peiasda lei antitrusteno trata do comérciocom o exterior.coE]
carta.branca para.lançar mão de todos os recursospossíveise
imagináveis, de "qualquer arranjo ou conspiração", contanto
que tudo .se passassefora dos EstadosUnidos e só produzisse
efeito lá fora, semque se restrinja o comérciodentro dos Es.
tados l.Jnidos ou.se reforcem ou' deprimam os preço's no país
de mercadorias da classe exportada, foram aquêles homens à
conquista dos mercados externos, dispostos a. bater os concor-
rentes onde os encontrasseme com quaisquer armas. (ó, as loas
que o nobre Cordell Hull cantou ao'limo comércio do mundo!)
Não seria "razoável" proibisse o Congresso "o uso, no coméÍ.
cio estrangeiro?.demétodosorganizatórios que, não operando em
prejuízo do público americano, são, todavia, necessários a me-
lhor colocaros americanosno enfrentardos concorrentes
es-
trangeiros".
E, assim foi feito: dentro de relativamente pouco tempo
o comércio do mundo era quase uma cancha dêles. Com efeito.
o's exportadores americanos não se fizeram de rogados e as prá=
ticas estrangeiras de restringir a produção, manipular preços,
como no caso do cobre pela Metallbank da Alemã;iha imperial, York, 1927. illiams, Foreíg/z PaZlcy of /àe Uzzí/ed Sfafes, New
l Relatório,pág. 120. 2 Ainda sôbre os episódios tragicâmicos da "orgia" de empréstimos,
um jornalistae escritoramericano,
Arthur Pincus,autor de Terror f/z
Foi, queixa-se o pioneiro, "uma das coisas mais infelizes tualidade foi quase universal e vai prosseguindo. . . nosso Go-
quepudessem
ter acontecido
aoslatino-americanos,
a nós e à vêrno (trata-se do segundoRooseveli) insiste em não ser coletor
continuação de relações frutíferas. Emprestamos sem prudência de .dívidas", queixa-se o tradicional homem de negócios que
e o .dia da ajunte.foi um.triste. despertar para todos. (:onfiaDça, trafica nos paíseslatinos do Continente. A queixa cresce: "Nosso
crédito, amizadeforam destruídosde ambos os lados. . . Êsses Govêrno adotou uma política punitiva para com Wall Street e o
títulos governamentaiseram vendidos nos Estados IJnidos, o di- resultado é que os pequenos investidores são como um rebanho
nheiro entregue .aos governos estrangeiros sem o menor esforça disl»rso sem o seu pastora'. "Para to;rDar as coisas ainda piores",
para impor qualquer restrição prática sabre o seu uso". (Era continua.o Sr. Frei Layis, numa crescente oposição à política
então a .época em que. no.Brasil qualquer Estado da Federação de Boa .Vizinhança. de..Roosevelt: "suas reclamações (dos pe-
ou município, por insignificante que fôsse, podia fazer direta- quenos investidores) são agora (1940) subordinadas a novos
mente empréstimo no exterior. A revolução de 1930 acaboli dinheiros que o Govêrno está presentementefornecendo à Amé-
com êsseprivilégio,t quando foi preciso pâr um paradeiro ao rica Latina. . . Demasiadamente interessado numa luta triangu-
abusoe tentar, pela undécimavez, "consolidar", ''escalonar" as lar entre êle,.a finança e a indústria, não vai(o Govêmoj dar
dívidasexternas). Como os empréstimoseram feitos a várias qualquerauxílio efetivo iio sentido de definir a 'situaçãoda'dívi-
entidades de um mesmo país, não sq.consideravasequer a rela- da extei'na. . . Será talvez esperar demais", pergunta, sarcástico,
ção da somatotal dos empréstimos lteitosou a fazer pelo país o engenheiroinvestidor na América Latina, fique o Govêrno não
com a. capacidadetotal da nação em pagar ou encontrar câmbio venha agora propor aumentar essas.complicações,fazendo-se
na balança de comércio nacional. mero emprestadorde mais dinheiro?"t
A orgia dos empréstimos passou. A inflação conseqüente Ao depoimento de Lavis é preciso pâr alguma caução, em
trouxe o esperadoclímax. E com a depressãode 1930 "a iãlpon- virtude de seu unilateralismo evidente. Se era fato a má vontade
CzzZpd
e outros estudos sabre a América Latina, nos idos de 40, escrevia da parte de capitais estrangeirosem face das falhas de pagamen-
na revista de Dwight Macdonald,Polírícs(abril de 1944), num artigo to de juros ou de capitais, freqüentemente essa omissão era de-
sob o título 7we/zO One, TÀe New /mpería/f m í/z Z,afim ..4meríca, essa vida a circunstâncias económicas. De qualquer modo, o problema
passagem:"Por toda a América Latina a memória ainda está viva da impontualidade das dívidas ganha)u {ãi importância que a
dos abusos perpetrados pelos finançistas americanos nos idos de 20. tornou "a causaprincipal de uma transformaçãode método)s:Je
Um industrial ou banqueironativo em um país como o México, Brasil
ou Child clamacomoum stalinistado "terceiroperíodo"em suade- investimentosdos EstadosUnidos na América Latina", pois for-
núncia da exploração e voracidade imperialista. . . O nacionalismo eco- çou, com efeito, o capital público (empréstimo govemãmontal)
nómico o apóia; e o Dava capital americanoprivado ou era totalmente a suprir o.capital privado que hesitava em conseqüência dessas
(?) impedido de entrar na AméricaLatina, ou então era tão amarrado decepções."' A afimlação acima pede contudo certas explicações.
por tantas restrições e taxas antiestrangeiras que muito poucos dêles
tomariam o risco". Na realidade as transações financeiras decorrentes Entre.estas, não se pode e-squeêeras implicaçõespoéticas da
dos emprésti:nos não foram saldadas à satisfação nem dos credores, situaçãomundial em geral e as que envolviam as relações dos
isto é, da maioria dos tomadoresde títulos -- como sói acontecer.de EstadosUnidos com a América Latina em particular. Tratar da
acordo com as leis da acumulaçãocapitalista em operaçõesdessaordem questão da impontualidade das dívidas como pura operação fi-
-- nem dos devedores que pouco viram do dinheiro. Naturalmente.
nanceira, da natureza de negócios privados entre capitalistas e
o resto .das operações pesou durante muito tempo sabre as relações
do Govêrno americano e governos latino-americanos,principalmente o banqueims norte-americanose freguesesao Sul de seu país, era
brasileiro. tira-la do contexto político-económico internacional de então.
l Consequência da Federação descentralizada da primeira República, As proporçõesdo caso,no entanto, foram de molde a pro-
cujo objetivo político-económico central era dar precisamentemãos li:
ares aos negóciosfinanceiros externos dos banqueiros e fazendeiros de v'orar enormes dificuldades diplomáticas e políticas. Em 31 de
café. de São Paulo. Por extensãonatural, o princípio também servia l Obra citada, pág. 91 .
ao "golpe" das.oligarquiasestaduaise municipaispelo Brasil de "tomar
dinheiro ao gringo", $em pensarmuito em pagar de volta a dívida. lp53,a:ler. de Chamisso, t/ne Paliríqae Eco/zo/níq re d'Hemísp/?êre,

42 43
dezembro.de 1934, num total de US$ 1.041.331.260,00 de
emissões de governos nacionais latino-americanos no mercado Em face.da gravidadee permanênciada decalagemde pre-
dos Estados l.Jnidos,.$ 707 . 887. 300:00 estavamem falta quan- !:s, o PTq?rio Govêrno . americano. resolveu intervir para 'en-
to ! juros.Em 31 de dezembro
de 1940,a situaçãonãohavia contrar sobretudo os meios dos latino-americanos continuarem
melhorado: sabre $ 1. 147.363.253,00 emitidos' em idênticas p:lo menos a comprar produtos dor:te-americanos. ])essa época,
condições: $ 817 . 465 . 726,00 estavam em falta também quanto aliás, é que se iniciou 6 sistema dos convênios de comércio re-
a juros. Pior era a situação das municipalidades,Estados federa- cíproco (recÜrmaZ frade agreeme/z/s)que reanimou"o comé;l-
tivos -o sociedadesgarantidas pelos governos: nessas categorias, c o interamericano. e foi também, como veremos, o princip-al ins-
a impontualidade era mais ou menos igual à totalidade das emis- trumento de luta dos EstadosUnidos para expulsar da América
sões.Eis de que se queixavanossoamigo Fred Lavis. Mas se Latina os alemãescom .seucomércio bilateral':
êle pede acusar de leviandade criminosa os corretores e ban- Aliás, cantràriamenteàs aparências,nem tudo foi perda
queiros americanos .no lançamento dêsse-stítulos de governos e para os interêsses.americanos nessa impontualidade geral. Já
governichos da América Latia.a no mercado financeiro america- vimos que foram êsses investimento-s americanos da época que
no,.nao pi'ocultou outras causas para a impontualidade geral 9 abriram os mercadose fontes de matérias-primas das regiões do
prolongada dos devedores senão a velhacaria. Na realidade. o Sul do Continenteaos capitais americanos.A propósito Bemis
fenómeno é mais profundo, conseqüênciada anemia económica esclareceu!.''Os Estados unidos emprestaram cêrca de dois bi-
crónica,dospaísesexportadoresde um ou de mais de um produ- lhões de dólares às repúblicas latino-americanas entre 1920 e
to primário. A crise de 1929 causou, como se sabe,o desmorona- ]928. Antes de findar 1938, já haviam recebido um bilhão e
mento de dois terços em valor e de um torço em peso das expor- quatrocentos milhões de dólares como pagamento de juros e
tações latino-americanas. Daí se seguiu, em encadeamentona- principal .da.dívida, ao mesmo tempo que se estimava o merca-
tural, a suspensão dos serviçosdasdívidas(juros e dividendos) do das dívidas em suspensoem quinhentos milhões de dólares.
verificadaem país apósoutro na América Latina. O diabo, Uma perda líquida de capitais se'deu, p-ois,de cem milhões de
porém, é que essa suspensãose prolongou até às vésperasda aõlares.( 1,5 por cento). Bom resultado, comparado à contração
guerra, em 1939. Joan Raushenbush, em Cooperacíón Financiara. da renda.nacional provocada nos Estados Unidos pela crise 'u
Chicago, 1948, estudandoo problema dos investimentos estran- Na década.de1921-31, ainda segundoBemis, dois bilhões
geiros, mostra a queda em preço-curo das matérias-primas crít!- e oitocentos milhões de dólares em títulos de emissões estran-
cas produzidas pela América do Sul. Tomando o nível de 1929, geirasforam lançadosno mercado dos EstadosUnidos, em sua
vê-se o preço da ]ã encontrar-se, em 1933, 28 por cento abaixo malona empréstimosgovernamentais, dois terços dos quais pro-
daquele nível mas em 1937 ainda era mais baixo, 54 por cento. venientes de governa's ]atin(»americanos.a A parte de responsa-
O cobre: em 1933, 30 por cento abaixo; em 1937, 42 por cento bilidade do Departamento de Estado foi, no lançamento dessas
abaixo. O milho: 1933 -- 31 por cento abaixo; 1937, 40 por operaloes, acusada de ter sido equívoca. Com efeito, graças a
cento.O trigo: 1933,35 por cento;1937,53 por cento.O uma fórmula tipicamente diplomática, o Departamentc>de Es-
café: 1933, 36 por cento abaixo; 1937, 31 por cento. O algo-
dão: 1933, 37 por cento; 1937, 36 por cento. Petróleo: 1933,
40 por cento; 1937, 38 por cento.Carne frigorificada: 1933,
45 por cento; 1937, 51 por cento.Açúcar: 1933, 45 por cento;
,i' ; eK:Hhãgl;=1=
:1:=::=11'==
1937, 33 por conta. Estanho: 1933, 63 por cento; 1937, 70 por
cento.i
e

l Chamisso -- obra citada, pág. 89.

44
lado "não oferecia objeção" ao empréstimo. Os banqueiros, bém não se mostra, no fundo, muito convencidoda legitimidade
parece, utilizavam-na no sentido de que suas operaçõeseram da soberaniadessasnaçõeslatino-americanas, em face de dívi-
aprovadas pelo Govêrno americano, condição Jiecessáriapara dasnão de todo pagasa patrícios seus.
que o\tomadores de títulos americanosse considerassemgaran- Seja como fâr, os 11ontosde vista dos credoresparticulares
tidos. Bemb descreve.a gama dos emprestadores: "Os compra- e os pontos de vista oficiais discrepantesdificilmente se iriam
dores de títulos em dólares englobavam. . . homens ecos e po- ajustar em face de problemas políticos mais graves que se apre-
bres, doutores, magistrados, negociantes, ladrões, universidades, sentavam ao .Presidente dos Estados Unidos. Tal discrepância
hospitais, igrejas, fundações e instituições de caridade, sem es: fêz saltar muitos proletos dé maior alcance que presidentes dos
querer as :tradicionais viúvas, órfãos, professores e membros Estados Unidos, em certas horas graves da história de seu país
do clero."x O.govêrno de Washington que se iniciava na polí- ou do mundo, puderam .alimentar.'Entre êsses ressalta aqui COH
tica de boa vizinhança,resistiaà pressãocrescentedos p;leju- toda a nitidez a distância entre a política de boa vizinhança de
dicados para que encetasserepresálias económicas, limitando:se Roosevelt -- a primeira a dar qualquer satisfação a governos e
a aprovar a criação de uma comissão privada para a defesa dos povos da América Latina -- e a do homem de negócioscom
:mprestadores (.Foreign Band Holders Protective Coüncil). seus interêsses investidos, como era o caso do aliás muito sim-
Washington ressalvava,porém, sua responsabilidade pelas ações pj!!co Sr. Fred Lavas.Na realidade?a discrepâncianão é espo-
privadas da Comissão, co.nsiderando-asnão assunto diplomá- rádica. É um fenómeno a acompanhar.toda a história 'das rela-
tico. Por essaépocao princípio da não intewençãonos negócios ções externas dos Estados Unidos com o mundo subdesenvol-
internos e externos dos outros Estados era vigente nas confe- vido da periferia ou com a Europa, desdesobretudoos anos
rências pan-americanas..A lição histórica foi aprendida pelo de 40. Todos talvez ainda se recordem do "milagre" anunciado
capital privado. Agora ia-se passar aos empréstimosdiremosde por Woodrow Wilson, ao assumir a Presidênciados Estados
Govêrno a Govêrno.
Unidos,.quando pretendeu tirar o caráter de negócio privado
Para essanova política financeira estatal,o Govêrno ame- às relaçõesde seu país com o resto da América Latina. O mila-
ricano cria várias agências oficiais, a mais importante delas gre frustrou-se .e êle. se viu obrigado a enlear-se nas intrigas
sendoo Export Import Bank, fundadoem 1934, além de um privatistas do b;g business
Fundo de Estabilizaçãocriado tambémem 1934, com "lucros
De todos os prnidentes de república americanos de nossa
de reavaliação da lei sabre a depreciação do dólar. Em 1939,
tempo, o segundo Roosevelt foi o único a levar para a Casa
cria ainda o Govêrno a Agência Federal dos Empréstimos. Branca um programa de refomias capaz de atingir as estruturas
O Govêrno americano põe suas exigências para abrir a
balsa: o país pretendente a créditos deve ter regulado o estado sociaise económicasdo país. Talvez por isso tenha levantado
de suas dívidas ou feito alguma indenização de princípio em contra si a hostilidade de sinceros homens de negócios como o
contrapartida por. suas ''expropriaçõesabusivas".'Cumprida a Sr. Lavis que jamais se conformou com a desconfiançado pró-
fomialidade,. Washingtan cõncbrda em que o Expert 'lmport prio Govêrno de sua terra na ação de Wall Street. Sua oposição
Bank concedaseu empréstimo. Num perfeito Pe/zdunfa Frei foi clara ao inquérito aberto então no Congresso (Comissão
Lavis, Bemis tem isto a dizer sabre o comportamentodo Go- de Títulos e Câmbios) para investigar o Comitê de proteção
vêrno americano: "São (não os latino-americanos) mas antes dos.portadoresde títulos estrangeiros.Para êle, "o que fêz a
os Estados Unidos que foram explorados pelos latino-america- comissão investigadora não foi mais do que, ao fim, convencer
canos.. . com bastante indiscrição, por ter deixado sua p'ro; as nações devedoras que Wall Street era um poço de iniqüidada
priedade prêsa na armadilha da autoridade soberana dessas e que,por conseguinte,
a impontualidade
era justificada"."0
nações."Como verificamos,o perito financeiro americanotam- remate é que o Govêrno entrou no negócio de emprestar di-
l Bemis, obra citada, págs. 331 e sega.
nheiro por sua própria conta, lançando mão de mais fundos

47
dinheiro antes"iadãos que haviam emprestadoe perdido seu l?ala esta, de perto de setecentos e setenta e nove milhões do
Êste era realmente o crime maior, pois punha de lado no dólares, pelo.Expert-lmport Bank, dos quais o grosso foi em-
mercado do dinheiro os investidores p;ivados para os quais,
penhadodesde.1940 e 'o projeto para a constr;ção de Volta
.b' Redonda, etc. Para o desenvolvimentodas novas fontes de su-
entretanto, tinha sido elaborada a Lei Webb-Pomerane. E êsses
pnmeDto em matérias-primas vitais para a guerra, de novo
investidores, êles mesmos em pessoa, ou por seus limos ou
q- netos, prote:tapam então como prolelitam agora. Não se cansam, vemoso Govêrno dos Estados Unidos substituindoquase que
completamente o empree/dador privado capitalista. Mais de um
realmente, de protestar contra ã idéia de empréstimos públicos,
a longo :têrmo,.peloEstado mesmoou sobretudopara invest!- ano antes de Pearl Harbor, o Govêrno americanoorganizou a
Metais Reserve Company e a Rubber ])evelopment Corporation.
h
/

Desde aquêle tempo,jomm .organizadas a Defende Supplies Cor


poration,a DefendePlant Corporation e a United StatusCom-
plataforma de toda a poderosa.confraria dos homens de negó- mercial Corporalion.. O total expandido. na América Latina por
elos americanos que acabou virando em obsessão, à medida todas essassubsidiárias.da Reconstruction Finance Corpomüon
(até novembrode 1943) ia bem acima de um bilião de dólares".
que o fiasco financ?iro dos empréstimosde 20, a depressãoque Em,face dessa maciça intervenção do Estado diretamente nos
se aoateu sobre tôda a economia americana, os desastrespolí-
icos que se sucederam interna -e extemamente e, por fim, as negócios, o autor do artigo, não,escondendo sua surprêsa, indaga
se se trata.de uma ameaçade "liquidação" de toda a estrutl;a
ameaças.f.contingênciasde guerra, mantinham ininterruptamen- do imperialismo capitalista. privado. "Muito longe disso", ras-
te afastados os capitais privados dos.grandesmercados ou opor-
tunidades .de investimentos, sistemàticamente 'substituídos desde
aproximadamente
a crise de 20 pelo Govêrno.
A propósito, Pincus, aqui já citado, testemunha: ". . .des-
fie iv4u todos os empréstimosà América Latina para tais pro- antes.da guerra, qüe em quasenenhuma outra grandeseçãodo
mundo os recursos naturais de tráfico e comércio estão tã;'com-
plStamente. sob o controle estrangeiro como na' América L,atina.
Não; a ênfase não é sabre a liquidação mas sabre a tendência

Corporation; o que qlier dizer, fomm 'feitos pelo próprio poder


estatall" E acrescenta, como que já teorizando sôbre o novíssi-
proyílvelmentereverterãoà propriedadeprivada depor! da mJCl-
ra. Um é em Çuba e o outro no Peru. Em ambosos casosos
capitalistas privados americanos se têm mostrado muito nervo-

W
l Obra citada,pág. 91
r sos sabre a possibilidade de .o Govêrno pensar em :ntregar
essaspropriedades aos dois. países em questão depois da gUeiTa
f, nesse sentido, têm êles feito uma campanha junto aos s;nado-
res interessadospara prevenir tal possiblidade. O projeto cubano
e uma mina de níquel para'.a.qual a R. F. C. despendeuperto
de trinta e três milhões'de dólares e que a Defmse Plant C'or-
pc!a'ion, da R. F. C., arrendou à Nicaro Nickel Co., subsidiária
de Freeport Sulphur Ca., por dez anos. A propriedade está cla-
ramente no nome da DefensePlant Corporation. O mesmo se com os homens de negócio, as finanças com os financistas e o
passacom o pmjeto de mina de vanádio no Peru, para o qual Govêrno com os funcionários". Essas palavras foram escritas
o Govêrno despendeuquatro milhões de dólares e que c'stá em 1940, num simpósiopara estudaros melhoresmeiosde
arrendada à Vanadium Corporation of America." "Por outra r defender economicamente o hemisfério ocidental. entrosando as
relações económicas norte-americanas com as latino-americanas.
lado, o partido de levar por diante o novo Imperialismo de
Estado -- pelo menos por um considerável período depois da Não há nada a fazer; a filosofia do homemde negóciosé
invariável, independenteno tempo e no espaço, acima da histó-
guerra -- é seguramenteo mais forte. No ponto em que a ques-
tão se acha, o Estado americano detém um tal controle finan- ria e dogrnàticamente proclamada e repetida, como uma reza,
ceiro e militar sabre a América. Latina que pode fàcilmente, através de todos êsseslongos e penosos anos de interamericanis-
com uma administração
inteligente,
ditar o futuro do canti- .+ mo, de guerra e de crises. Mas onde os resultados?Não se vêem.
iieiite."I
e apesar das promessas-- sempre as mesmas-- que se repetem
na sucessão de presidentes em Washington e de presidente,; semi-
O interêssedo ponto levantadopelo jornalista acima citado presidentes, marechais, generais, ditadores pela América Latina
está em que põe concretamente a questão fundamental que o Não se pense,na entanto, ser o velho homem de negóciospor
mundo de negócios em pêso levantava-se contra a tendência nós tantas vêzes aqui citado um retrógrado, sem visão. Assim,
estatizante da economia daqueles tempos. O nosso velho Lavas considerandoos convênios que por volta de 1940 e-atavamsendo
não podia compreender o de que se tratava. E por isso atribuía negociados, diz.êle com todo bom senso e isenção: "Podem ter
ainda àquelas infelizes experiências financeiras dos idos de 20 alguma influência em promover o comércio e o intercâmbio de
a má fama granjeada pelos bancos norte-americanos nos cír- produtos entre a América Latina e os Estados Unidos, mas"
culos latinos continentais, inclusive oficiais. Os bancos, lamen-
tava. são acusadosde cobrar taxas anormalmentealtas e de --- e aqui põe êle o dedo na ferida -- "uma diferença funda-
mental permanece: os países da América Latina produzem mer-
terem ganho somas enormes,acusaçõesainda ligadas às tran- cadorias para exportações que nós mesmos também produzimos.
sações dos empréstimos de 1920. Seja como fâr, já êle reconhe-
cia então necessitara América Latina de ajuda (como, hoje, o Em condiçõesordinárias, êles só podem vender êssesprodutos
na Europa, mas mesmo ali competem conosco. E como vendem
Sr. David Rockefeller). Reclamavaapenasque a ajuda resul- ali têm também de comprar ali e o que querem comprar são
tasse em "cooperação efetiva"; entretanto, ponderava inconso- produtos manufaturados similares ao-s que desejamos vender."
lado, "o Govêrno está não sòmente fazendo empréstimos, mas Se o Brasil escapa a essa destruidora concorrência ao menos
também fornecendo empregados,contabilistas,peritos eln tarifas,
quanto ao seu principal produto de exportação,o café, que
engenheirosj'.Diante de tão solícita intervençãooficial de seu dizer dos outros paíseslatinos do Continente, como a Argentina
país, o homem de negócios de boa vontade é categórico: ''De e o Uruguai,comsuascarnese seutrigo, o Childcomo seu
qualquer ponto de vista isento, isto é o qzze/zá de mais frzdese- cobre, o Peru e o México com o seu algodão? Na realidade, os
jliveZ."2 O ângulo de visão dêsseexemplar investidor privado Estados Unidos, com os seus superexcedentes de produtos agrí-
americanona América Latina é o oposto do que a própria si- colas, brutos ou gemi-elaborados, estacados permanentemente em
tuaçãoeconómicae política mundial exigia. Não havia, pois, quantidades imensas, são uma permanente ameaça de con-
conciliação. Apoiando, diz-nos êle, sua "firme convicção na
corrência à grande maioria da humanidade produtora de artigos
basede um conhecimentoíntimo de cinqüenta anosde América {

primários e gêneros alimentícios. E seus homens de negócios,


Latina", a ''situação só pode ser satisfatoriamente resolvida, nos
seus exportadores e investidores, seus agentes oficiais, seus eco-
negócioscom o nosso Continente. . . se se deixarem os negócios nomistas oficiosos, seus brilhantes diplomatas, seus Secretários
l de Estado, seus Presidentes, não -se cansam de expor aos nossos
A. Pincus, Poliríc$, abril 1944, Nova lorque.
2
Obra citada, pág. 92. povos as vantagense a desejabilidade de continuarmos a vender
&. e a comprar nossos recíprocos produtos ''livremente", em plena
50
igualdade, através das fronteiras e dos mares, pois ao fim das seus povos ?.os nossos". Há assim mais de vinte anos que se
transações,.prometem-nos aquêles conspícuos americanos de ouvemde toda parte, onde quer que se encontremhomensdc
óculos mais róseos que os de Pangloss, estaremos tão ricos boa vontade -- e nos Estados Unidos são legiões -- projetos
quanto êles:
e mais projetos de "desenvolvimento com democracia" (de 'pre-
'

ferência .a "democracia com desenvolvimento") para os nossos


Os povos latino-americanos, os povos do "tercoiro mundo países.Antes ou até 1940, com os Estados Unidos em guerra
começam .a.não acreditar. Os próprios americanos, pelo- menos contra o Eixo e o Eixo ameaçandoos mares adjace.ntese mesmo
as costas atlânticas continentais, a linguagem das relações eco-
nómicas entre os paíseslatinos da América e o gigante anglo-
4 saxão ao Norte era simples, direta, franca: fazer negócios lucra-
tivos, para contentode todo mundo. Era a fala clara de Fred
mercadosdo mundo, não tardarammuito a levar êssefamoso civis
comércio a um beco sem saída, isto é, ao esgotamento.Com
efei.to, de "arranjos e conspiração" para enfrentar os concor- O Estado americano, .que. guardava para si um só poder,
o da intervenção,para cobrar dívidas a'devedoresrelapsose
restaurar a ordem entre latinos congenitaJmente arruaceiros.
mantinha-se no seu papel tradicional .de Estado liberal, apenas
com acessosordeiros.pclr vêzes mais impetuosos e violentos quc
aquêle mercado, .quando então se viram obrigados a realimentá- de costume. No máximo co.nsiderava-se também árbitro em fuacc
lo a poder de donativospara que o seu própria regime eco- de uma justiça, de uma ordem jurídica -= nessesEstadosturbu-
nómico não soçobrasse.Tal evoluçãomostra que a máquina lentos da América Latina -- que nem sempre merecia confiança,
magnífica de comerciar não pode funcionar indefinidamente lá quer dos investidores e comerciantes americanos, quer de seu
Govêrno.
fora com os seus métodos e processosditos liberais, sem tornar
sáfaras a produtividade e a rentabilidade estrangeiras, especial- A partir de 1940, tudo é condicionado
a uma terrível
mente do mundo; imenso dos subdese.nvolvidos.
A máquina glo- guerra a conduzir. O Estado é arrastado ao .exame direto dos
bal capitalistaentãoemperrae verifica-sea necessidade
de sus- negociou, a intervir nestes, tanto no próprio país como. no estran,
pender seu funcionamento para reabrir a troca, a comunicação, genro, tornando-se êle mesmo protagonista de negócios e inves-
a resposta por meias inteiramente inortodoxos, isto é, fazendo timentos. .E a fase de Franklin Decano Roosevelt. É por natu-
presentes -- dar. (Eminentes economistas e mais do que eco- reza ambivalente. O Estado negaceia entre a pressão i.ntema
nomistas,homens de pensamento,como Gunnar Myrdal, Fran- dos grandeshomensde negócios dos trustes, das grandescor-
poraçõesque.dominam todos os ramos da produção e do comér-
çois Perroux, Koechlin e outros inclinam-se a ver na doação
cio, desde minérios ao .comércio exportador e a pressão externa
fenómeno novo mão transitório, mas tendendo a permanecer, das naçõeslatino-americanasque, na conjuntura da guerra, sen-
institucionalizar-se na nova economia. . . política.)
tem seupoder'de barganha crescer,em virtude de suaspossibi-
lidades em vários dos materiais estratégicos indispensáveis à
Não acreditando Dem na possibilidade nem na desejabili-
dade de, ao cabo da Segunda Grande Guerra, produtores' e fi- condução da guerra, por parte de Washingtorl Elas, porasso
mesmo, esperam.da Casa Branca não sòmente belas palavras,
nancistas americanos açambarcarem para si toda a América La- de .que a Casa é fértil, ou uma proteção militar na eventuali-
tina (cogitava-seda hipótese:ver A. Pincus),o nossoSr. Lavis
dade de uma anibada -- hoje, se sabe, bem longínqua-- às
tinha tambémseuprogramaa propor, um programade "cons- suas placas de tropas de assalto nazistas, mas cooperação mesmo
truir novas emprêsas,abrir novos canais de comércio entre os no plano económico, no plano do progresso social e nacional
52
53
No plano das relações puramente económicas a decalagem
Coréia e, com esta, também uma reanimaçãoizzl gerzerisno
continuava i-ntransponível entre as pretensões das repúblicas
mundo dos negócios, inclusive nas regiões periféricas como o
latinas e as concepções económicas rígidas e justificadamente Brasil. O perigo do comunismotransfere-se,como ave de arri-
egoístas dos governantes norte-americanos. Mas o segundo
bação,à Ásia. E a América Latina ficou outra vez isolada,no
Roosevelt, keynesiano decidido, internamente, no plana das seu canto, a matutar frustrações que acabam se exteriorizando
medidas económicas e financeiras de combate à depressão e em graves demonstrações públicas antiamericanas, como em
reformista no estilo da social democracia europeia, lutando por Caraças, por ocasião da visita do Vice-Presidente Nixon, ou,
criar contra as grandescorporações toda uma legislaçãosocial
ainda mais grave do que aquêle testemunho da neurose popular,
(ainda ali pràticamente inexistente) adequada às reivindicações na formidável figura de FiZlel Castra ao levantar-sesàzinilo na
e ao pêso social alcançadopela classeoperária de seu país, só Sierra Maestra e conquistar Cuja, desfraldando sabre o seu
muito dificilmente poderia fugir-lhes às reivindicações.Ê assim povo a bandeira da Revolução. O Presidente Eisenhower, em
que foi oportuno tentou ateDdê-las,embora violando os preceitos
liberais, em nome dos quais clamavam os interêssesdoi investi- pânico, e seu Secretário do Tesouro, o frio homem de negócios
dores privados norte-americanos. que é Douglas Dillon, também em pânico, deliberaram ieexa-
mmar a situação em deterioração crescente entre os súditos
Nesse contexto, alguns empréstimos de capitais públicos e latinos do Continente.Dêssepânico saíram o Banco Interame-
convêniosde estabilização
de preçosforam feitos por êle. Mas ricano de Desenvolvime.ntoe, logo depois, já sob a direção meio
sempreem nome de uma circunstância excepcional,ãe uma Con-
rooseveltianade John Kennedy, a Carta de Punta del Este, onde,
juntura extra-económica, de considerações,
em suma,de ordem
política. O princípio da legitimidadedos empréstimospúblicos pela.primeira vez, o Govêrno americanoreconhecea' plena
legitimidade, ?m tempo de paz, dos grandes empréstimos públi-
para .grandes empreendimentos de ordem estrutural e produtiva cos, de Estado para Estado, visando expressamenteao desen-
jamais foi aceito por Washington. Mas a guerra temlinÓu e, com volvimento económico estrutural nos nossos países latinos. Seria
ela, o condicionamento político militar das relações económicas,
dos negóciosao nível de Estadose governos. Punta del Este .uma outra data quase tão 'importante para o
futuro das relações interamericanas' quanto a que, na Argentina,
Veio Truman, sucessor de Roosevelt, e inaugurou outro levou em 1936 o Presidente Roosévelt a apor' sua assinatura
capítulo da história política e económicados EstadosUnidos.
num .documento que barrava incondicionalmente a htervençãa
A América Latina é relegadade Dava à sua condiçãoperifé-
na vida dos outros. Estados americanos. O princípio da não
rica. As inextricáveis complicações do fim da guerra, quando
intervenção. foi depois violado várias vêzes enquanto o princípio
se tratou, entre vitoriosos, de dividir o espólio e organizar a da legitimidadedos empréstimospúblicos, de Estado para Esta-
paz, levaram-no a concentrar todo o esforça de seu Govêrno
sabre a Europa (Plano Marshall). Truman torna-se,em contra- da, para fin-sprodutivos não chegou a tomar corpo.
dição flagrante à sua política económica, tôda ainda fu.ndada
Exagerandoum pouco a sua retórica, o PresidenteKenne-
na instrumentalidade
inelutáveldo Estadopara repor as forças dy chamou sua Aliança para o Progressode "revolução", num
evidente uso político das flamejantes conotações do' vocábulo
económicas e produtivas então em pa/ze em funcionamento, a
cruzado da livre emprêsa e do capitalismo privado. A ameaça a ouvidos, pela miséria, pelas aspirações e pelas tradições, re-
ceptivos àqueles apelos. Nos nossos países abro-latidos, indo-
d? uma avançada das tropas russas na Europa que o Plano
latinos, a "revolução" consistiria em desmontar o monopólio
Marshall visa a deter por meios indiretos, transfomiã-se já numa das riquezas de grupos privilegiados, instituindo ca/z/ra' êles
obsessão anticomunista.
certas reformas estruturais, afetando relações de propriedade;
Depoisde Truman,Eisenhower
é a volta direta ao bíg nos Estados Unidos, a revolução consistiria em enganarpesados
bmãness,ou à tentativa, com os republicanos,de Ihe entregar créditos do Estado em empreendimentos demandando capitais
a direção da coisa pública. Os tempos passam.A Europa oci- de risco. Para tanto, a basede trabalho da Aliança kennediana
dentalreergue-se. Mas não é a paz, pois surgea guerra da eram os vinte bilhões de dólares prometidos pelo presidente
dos EstadosUnidos por dez anos e o resto constantede fundos
cobertos por investimentos privados latino-americanos e sobre- lelismo entre os dois é significativo: há, porém, uma diferença
tudo norte-america-nos. Segundo os seu-s planejadores, caberia que logo salta: a visão do Sr. Rockefeller 'em 1962 é pessimista
aos investimentos privados entrar com pelo menos trezentos enquantoque a de Lavis, em 1940, era otimista.
milhões de dólarespor ano para a Aliança. Em terno dessa Para o Sr. Rockefeller três obstáculos se opõem ao desen-
distribuição de fundos e recursos,a polêmica se acendeuentre volvimento da América Latina. O primeiro é relativo à decala-
os favoráveis e os desfavoráveis a meter nessa vasta emprêsa gem..de preços de produtos primários de exportação de nossa
capitais públicos. Os investidoresprivados, descontentesdesde família. latino-americana para com os dos produtos manufatu-
o i;vício com a orientação demasiadamentepública, para o gasta rados de importação. "Reconhecer a importância dêsseproble-
privatista dos capitalistasque seus projetoies oficiais, tanto do ma de preço das mercador'iasé naturalmentemuito mais fácil
lado latino-americano como do lado governamental norte-ame- que descobrir contramedidas eficazes."x Tratam.do dessas "con-
ricano, teriam dado ao projeto, se retraíram. O Time de 15 tramedidas" classificadas de antemão por êle como "ineficazn",
de fevereiro de 1963 dava do retraimento dos investidoresesta afasta a mais importante delas, ou os canvênios de estabilização
infonnação: "em lugar de um plaPzging í/z os investidores dos de preçosl os "realizados no passado não provaram ter tido
Estados Unidos estão saindo da América Latina: nos primeiros notável êxito". "Temos uma grande monta de experiência a êsse
mesesde 1962, êles trouxeram para casa tj'inta e sete milhões respeito nos Estados Unidos, inclusive com os programas agrí-
de dólares a mais do que investiram". Em pleno nascimen- colas de sustentaçãodos preços, ela. mostra que tôda tentativa
to da Aliança, sob a inspiração entusiasta do jovem Ken- de segurarpreços acima ao nível ditado pela oferta e a procura
nedy, e-stanão conseguia, diz o Time, ''despertar o entusiasmo revela-se excessivamente custosa." Assim, quanto à depreciação
entre os homensde negócios". Ao contrário, só despertouma- crónica dos preços dos produtos primári(is de exportação'dc
nossos países em face dos manufaturados nada bá a fazer.
nifestações de desconfiança ou hostilidade por parte dêles.
Assim, a velha questão de 1940 retomava atualidade, pre- senão continuar o esforço, mesmo sabendo-o frustrado de ante-
cisamente quando vinha para a Casa Branca o ex-Senador mão, de vendê-losno exterior, ."livremente", sem amparo. No
Johnson: Agora, .o porta-voz dos capitalistase hvostidores pri- entanto, o próprio RcKkefeller forneceu na ocasião êstelquadro:
vados não é mais o nosso saudoso amigo de 1940, mas uma 'Um determinadovolume de exportaçãocompra agora (1962)
grande personagemde 1964, o Sr. David Rockefe]]er. ].nter- sòmente 89%o do que comprava nas regiões industriais da Amé-
vindo em uma Conferência sabre Tensões no Desenvolvimento rica do Norte e da Europa em 1957."
do Hemisfério Ocidental, realizada na Bahia em 1962, o emi- Quanto ao segundo obstáculo, ainda é mais acabrunhados,
nente magnatafalou franco, claro e sem as mi-stificações do pois ultrapassa -- nas condições sociais e culturais prevalecen-
estilo. Êle soprou com força nos vapores ideológicos que cos- tes -- nossa capacidade de reagir contra êle. Tratasse, diz-nos
tumam envolver a entidadeabstratachamadaAliança para o êle, do crescimentoespetacuiar'da população da América La-
Progresso.. Numa linguagem muito mais desabusada e comple- tina, o mais rápido do mundo,chegandoa 2,4qo ao aDOcom-
xa, de acordocom as sofisticadasde nos.sos
dias. fêz êle.'no parado aos da Agia, de 1,8%o, e Africa, de'1,9%. Durante a
entanto, ecoarem por ali idéias modestamente expostas nas idos década de 5Q, ''a renda dos países em desenvolvimento aumen-
de 40 pelo seu honrado precursor. No simpósio de 1940 em tou a 3% ao ano. Mas dali terços dêsse ganho foram can.ca-
Washington,com efeito, a comunicaçãodo Sr. Fred Lavasinti- lados pelos duzentos milhões de novas bôcas a alimentar''. E
tulava-se: t/ü programa de /comem de lzegócios. No de 1962, para completar o quadro sombrio, o magnata traz testemunho
na Bahia, sob o patrocínio do Conselho de Tensões Mundiais ainda mais sombrio de outra figura não menos eminente no
(o patrocíniodo de 40 era do Conselhosabre NegóciosPúbli- mundo dos altos negócios, o Sr. Eugenio R. Blanc, presidente
cos), a intervenção do Sr. David Rockefeller intitulava-se
Desenvolvimento
Eaarúmico; As !içõese um desafio. O para- i(Zafín 4meríca.' Evolafío or Exploifo/z? ed. por Mildred Adams,
Dodd, Mead & Co., New York, 1962, pág. 71-)' '

57
do Ba.ncoMundia]: "Estamoschegandoa uma situaçãona qual derância portuguêsa no comércio local. (Não falamos aqui nos
otimista será o homem que pensar que os atuais níveis de vida movimentos históricos nativistas até a independência, quando
a direção dêles se manifestava fatalmente contra o colonizador
poderão ser mantidos." Diante disso é de. perguntar:se.se não À português.) Êsses surtos contra o estrangeiro tinham também
há nisso tudo como que uma farsa macabra montada-por um
punhado de oligarcas e dirigentes do. mundo ocidental, com outra mira e essaera mais importante: o inglês.xÊste era o
teus apêndices de regiões subdesenvolvidas, para encher-lhes "gringo" temido e algo ridicularizado, sobretudono sentido do
o vazio da existência, ocupar burocratas e entreter multidões? que qualquer "golpe" que a malandragembrasileira Ihe apli-
Implacàvelmente, busí/zesiZí#e,o Sr. Rockefeller passa ao casseera em si mesmojustificadoe bem recebido.Por trás
terceiro obstáculo. Êste é o obstáculo por. assim dizer à mão, dêssesentimentohavia a idéia não muito explícita de que sendo
o político, aquêle sabre o qual se dispõe a agir ou fazer pressão $
"o bife" o mais forte, não podia o "nacional" lutar com êle
e que depende certamente "da atitude e responsabilidade das em camporaso: daí Ihe ser pemlitido o uso de qualquerarma,
próprias áreas". Sob êsseitem geral, vários obstáculosmenores, truque ou tática -- o negaceio, a capoeiragem, a rasteira, armas
parciais, são enumerados, relacionando-se às atitudes e polí- nacionais por excelência.
ticas das próprias naçõesemergentes.Êle os reputa como "mais Entre os estrangeirosque por aqui traficavam e trafegavam
difíceis".. ''Em alguns casos", explica o banqueiro, ."a instabili- eram os americanosos que gozavam de malares simpatias. Eram
dade política e económica tem criado um clima sufocante ao de saída os mais simples, os mais afáveis, os menos pretensiosos.
crescimento económico. Em outros, um Rácio/za/esmoemocio- O povo os compreendeumelhor eül face do inglês correto e
rza/ (s;c) tem conduzido a ações domésticas que desencorajam distante. E d-epois, tinham os americanos por êles o privilégio
o fluxo da assistênciaexterna de fontes privadas.": Aqui de representar, aos olhos de nos-sospopulares, uma jovem nação
já é históriaantiga,históriada geração
passada.
Não se robusta, sem orgulhos atávicos nem pretensões aristocráticas e
lembram do velho bom vizinho, tão cheio de experiência no que contra as ve]harias europeias levantava, risonha e confiante,
convívio: dos latino-americanos, durante anos? Também, já na- o pavilhãodo moder.nissoe do progressoEssajovialidademo-
queles tempos, queixava-se êle de algo "desagradável aos norte- demizadora encontrava ressonância nas comunidades urbanas
americanos" que .estava "aparecendo" nos nossos países: "Os mais adiantadas,consumidorasjá dos produtos típicos da civi-
países da América Latina estão em vias de desenvolver com- lização moderna, simbolizados principalmente no automóvel e
p/ecos macio/zaZísfm;êles estão olhando de través a chegada dc no cinema. Hojlywood com seu endeusamento do conforto, suas
estrangeiros."2Decididamente, os investidores americanos do proposições sedutoras à classe média, seu culto do ''herói posi-
passado ou do presente detestam o nacionalismo dos latino- tivo" -- antes de ter sido descoberto pelo "realismo socialista"
americanos.Qual a razão?e sua origem?Pode-seafirmar sem russo --, ''seus ãappy ends, suas imagens, suas estrêlas, seus
maiores ver#icações que êle começou a aparecer nos nossos mitos, foi o porta-estandarte incomparável da imperialismo
países,com caracteresgeneralizados,
a partir da maior pene- americano, no Brasil e adjacências. Então, até a maneira de
tração imperialista norte-americana. Muito antes disso, é claro, vestir masculina,frouxa, cómoda, permitindo todos os movi-
conhecemos vagas xenófoba-s no nosso e nos outros países da mentos e trejeitos descerimoniosos, foi uma revelação -- contra
família latina continental. os modelos ainda empertigados, algo ar/ nc} veazzparisienses ou
Nk) Brasi], na época imperial e aos primeiros anos da Re- i mesmo inglêses -- para a mocidade brasileira da época.
pública houve surtos de movimentos contra o estrangeiro, sim-
bolizado, por vêzes, no lusitano, isto é, o comerciante típico l Floriano Peixoto tornou-seo ídolo dos primeirosjacobinosbrasi-
dos centros consumidoresdo País, principalmente no Rio de leiros, os republicanosde 1889,pela frase com que responderaao em-
baixador britânico que o fera interpelar sabre como receberia a esqua-
Janeiro e outros portos brasileiros, onde se afirmava a prepon- dra inglêsa, durante a revolta da esquadra brasileira: "A bala". Du-
l Obra citada, pág. 73
rante muito tempo a frase encheude orgulho e de satisfaçãoideológica
2 Obra citada, pág. 94 os nacionalistas brasileiros dos primeiros anos da República.

1. 59
k.
/

A luta interimperialista na América Latina, se frequente- mais característicos da orientação nacionalista da revolução de
mente provocou, direta ou indiretamente, violentos choques po- 1930. Uma das grandes questões conflitantes entre investidores
líticos internos nos nossos países, quando interêsses inglêses ins- estrangeiros e exportadores de capitais e os países importadores
talados em certos setores e encurralados a uma defesa em des- .+

l dêlesfoi e tem lido sempre,com efeito, a da propriedadedas


canso contra a penetração americana se agarravam a facções riquezas do subsolo. A questão é tão naturalmente espinhosa
e grupos políticos nacionais dominantes para não ser desalo- que ao economista liberal Bemis "a autoridad-e soberana dessas
jados de suas posições, por outro lado !oncorreu poderosa- nações"pareceu "uma armadilha" para a propriedade americana
mente para despertar entre os jovens intelectuais da te.rra os ali adquirida. Muitos americanos mais do que liberais chegavam
primeiros sintomas de uma consciência antiimperialista, quer a atribuir o zêlo latino-americano pelo subsolo de seusterritórios
dizer, nacional. A primeira geração mamista do Brasil divulgou t
a tradiçõescoloniaisno tempo dos reis de Espalha. Não era
essasnoções. O Partido Comunista, balbuciante, teve nesse sen- preciso ir tão longe, pois os povos colonais ou subdesenvolvidos,
tido papel saliente na esquematização do problema, denunciando da América ou de outros continente-s, sabem, de ciência prática,
a luta política que se travava no Brasil em 1930 e ia desem- quanto lhes tem custado a no/zc/laia-'zceem matéria de proprie-
bocar em guerra civil como uma luta entre imperialistas ameri- dade do solo. O México, com o seu antigo Texas, o México
canose ingleses. da Revolução,que o diga. Que o digam a Venezuelae Colâm-
Qualquer que seja a interpretação a dar à revolução de bia, Haiti e Nicarágua,
Paraguaie Bolívia,o Child,ou o rasa
30, o fato incontestávelé que pela primeira vez as.classesdo- ao ouro na Califómia e a guerra dos 'óóeresna África do Sul. A
minantes no País $e dividiram com bastante antagonismo para guerra, ou quase guerra, de 1915-1916 que os Estados Unidos
serem atiradas à luta pelas armas na disputa do poder. A poderosa empreenderam contra o México girava em lama do direito da
oligarquia do café e grupos correlatos, rurais e financeiros, nação mexicana e sua revolução; poder excluir estrangeiros da
apesarde lerem aderido à revoluçãoem represáliaà negativa propriedade do subsolo, exclu-sãoi.nstitucionalizada em artigo
do Presidente Washington Luas de sustentar os preços do café da Constituição. Antes da aceitação solene por Roosevelt do
em colapso em face da crise geral do mercado internacional quc princípio da não intervençãoDos outros paísesda América
arrastou o capitalismo mundial à sua maior depressão,sofreram Latina, o Departamento de Estado nunca se conformou ccnn
com o movimentovitorioso de 30 o seuprimeiro revés,desde as pretensões latino-americanas de obrigar os concessionários
que exerciam a hegemonia política sabre a Federação, a partir estrangeiros
a sujeitarem-seà cláusulade contrato que os obri-
do fim da monarquia. O poder ce.ntral na Federação passava, gava a não procurar a intervenção de seu próprio Departamento
com Vargas, a atender melhor a outros interêsse-s regionais, de Estado, caso entrassem em dificuldades no exercício de suas
estranhosou hostis aos da oligarquia paulista. É também ver- concessõese negócios.
dade que até então o comando financeiro do Brasil era exer- Desde a aprovação da doutrina latino-americana de não
cido da City de Londres, embora fossem cada vez maiores, a intervenção,não faltaram os conflitos entre interêssesprivados
partir dos anos de 20, as incursões da finança ame.ricanaatra- americanos que detêm concessõespoderosas, algumas em posição
vés de empréstimosprivados ao Brasil. Ainda em 1930 quem monopolizadora e os interêssesnacionais dos paísesconcedenies.
apareceu logo depois da tormenta não foi, como se dá atual- Em 1938,o maiordêsses
conflitosfoi o dasexpropriações
das
mente, nenhum representante da Tesouro americano, mas au- companíhias petrolíferas no México, pelo Presa(ante Cárdenas.
têntico representante da City, um Sir Otto Niemeyer. Roosevelt ladeou o conflito e não interveio. Mas o problema
Com o movimento de 1930, o jovem chefe tenentista que é semprecandente
e, no Brasi],recentemente,
foi precisoum
encabeçoua revoluçãono norte do País,hoje MarechalJuarez movimentocanspirativo.insurrecional vitorioso para salvar as
Távora, foi, como Ministro da Agricultura do primeiro Govêrno emprêsas concessionárias de serviços públicos, de propriedade
de Vargas, o primeiro a nacionalizar as riquezas do subsolo, americana,de um tratamento mais ou menosjusto, embora não
quando fêz promulgar o código das minas, um dos institutos do agrado delas, por parte do Estado brasileiro. A reação nativa

óo
aos privilégios de que gozam em geral. essasemprêsasconces- qüência da pe.rda dos mercados europeus de importação como
sionárias, tôdas elas filiadas ou subordi.nadas,dij'eta ou indire- de exportação com a guerra e fundados ideologicamente no surto
tamente, a /zo/díngs, corporações internacionais ou americanas nacionalista que empolgava as suas classesmédias e intelectuais
que manejam os preços nos mercados mundiais, não é fato iso- -- na realidade visava principalmente a fazer da economia lati-
lado dêste ou daquele país, mas pemlanente e comum a tôda no-americana um apêndice, ou melhor, um complemento das
a América Latina. Aikman, em 7'Ae 4/Z 4/n2ericnnFrom/,para fôrças éconâmicas norte-americanas mobilizadas para a guerra.
mostrar a irreversibilidadedo movimento para expulsar a pro'- No fundo, a América Latina e os Estados Unidos falavam duas
línguas: a primeira falava industrialização -- desenvolvimento
priedade estrangeira das riquezas do subsolo,-apesar de aqui e
acolá sofrer o movimento alguns contratempos (como no Brasil -- nacionalismo, üdependência. Os segundos falavam colabo-
em 1964), dá contada resoluçãotomadanuma Conferênciade ração, integração, defesa do hemisfério.
Prefeitosdas Américasque se realizou em Havana por volta de Hoje, pe]a primeira vez no Brasi], desde1930, o movi-
1938. Então, foi aprovadoali que todos os serviçospúblicos mento vitorioso ãe l de abril de 1964, que se diz "revolucio-
deviam ser de propriedade dos nacionais do país em que esti- nário", iniciou uma política deliberadade retrocessoantinacio-
vessem situados. Que as novas regulamentações foram dirigidas nalista,no sentidoda reprivatização,
da desnacionalização,
da
contra os Estados Unidos e que com toda a probabilidade seriam reintegração da política económica e financeira do País no sis-
revigoradas contra os Estados Unidos como o principal perigo temafinanceirointernacional,quer dizer, americano.É uma
imperialista, é também afimiado por vários observadores,in- volta, no plano jurídico, ao regimeliberal económicoe finan-
clusive Aikman, na obra mencionada. ceiro da primeira Constituição republicana de 1891. O curioso
Por aí se verifica que a "demagogia contra a-s emprêsas é que mesmo a UDN, tque liderou a restauração democrática
estrangeiras", de que tanto se escandalizou o Marechal Castelo, de 1945 e foi a principal responsávelpela estatizaçãocompleta
não foi do tempo de João Goulart, nem inventadapelo seu da Petrobrás no Parlamento, foi o grupo que liderou no Clon-
cunhado, o engenheiro Brizola, quando Governador do Estado gresso essa política de retrocesso desnacionalizador e repriva-
do Rio Grandedo Sul. Vejam bem: em 1938, em savana, os tizador. Que se passou?O clima ideológico de 45 para cá mu-
prefeitosdas cidadesda América inteira, norte, centro e sul, dou. Ao invés das reformas sociais e anticapitalistasque se
reunidos em conferência, se manifestaram, em resolução tomada, esperavam,o i/afz{ que, a cruzada da chamada"livre emprêsa",
em nome do anticomunismo e de um neocapitalismo liberal.
contra a que súditos de naçõw estrangeirasfossem proprietários
de concessões de serviçospúblicosem paísesque não os seus. Se o imperialismo americano tomou parte, ajudou ou comandou
O Marechal Castelo pode estar certa de que não eram comu- a guerra civil de 1930, o seu partido deveria ter saído vitorioso
então; na realidade, através de todas as tergiversações,recuos e
nistas os prefeitos americano-sque em 1938 se reuniam em
Havana. O precedente autorizadíssimo dêles poderia e deveria avanços, governos autoritários ou democráticos que encheram
ser levado em consideraçãopelos atuais organismos interameri- essa etapa da história do Brasil, antes da guerra, durante e
canos e seus governos (entre os quais o de Washington). E o depois da guerra, com Vargas e sem Vargas, sóiecentemente,
motivo dêsseveto ''nacionalista" não é de ordem técnica, coma com o movimento triunfante em primeiro do abril de 1964 é que
íaz crer o Dr. Campos (Roberto), em função de câmbio desva- conseguiu aqtlêle imperialismo i.nstalar no Brasil um govêrno
lorizado e elevaçãode tarifas impossível.É uma questãomais inteiramente a seu gasto, às suas ordens e à sua imagem e quc
profunda: preservação da autonomia da ação pública das auto- faz depender, conscientemente, deliberadamnte, a sua sorte e a
ridades nacional-s.O Govêrno americano, apesar de por vozes sorte ão País da boa vontadede Washingtone dos olímpicos
encontrar-seem choque com os interêssesdos homensde negó- oligarcas das grandes corporações financeiras e não financeiras
americanas.
cios (sobretudo na era rooseveltiana do .New l)eaZ e do }yar
Z)eaZ) e pretender ao mesmo tempo apoiar até certo ponto No ideário de circulação oficial, aditado no Brasil desde
movimentos de industrialização na América Latina -- conse-
o adventodo Marechal Casteloao Palácio da Alvorada e em

Ó2 63
outros paísesdos nossos,obrigados todos a cantar loas interame- Seja como fâr, a idéia de movimentos de reformas não
ricanas, êsses "complexos nacionalistas" de 1940, transforma- agradavaao delicadoolfato do Sr. Rockefeller:aniscavamuito
dos em 1962 em "nacionalismoemocional", não são mal congê trazei em seubojo bafo de .povo: com seu cortejo de "inquie-
mito ou endêmico.que passa de uma geração para outra, nl;s,
conforme as resoluções e resoluções'votadas' oficialmente n; tação social e .incertezas políticas". Mas conclui: '"Isso comple-
ta o círculo vicioso, pois que são precisamenteessasas condi-
OEA e suas múltiplas organizações, são de origem recente, ex-
trínseca, alienígena, mal de doutrinas exóticas, como o comu- çoes menos propícias..a prover um clima hospitaleiro à poupan-
nismo russo, ou sua variante chinesa ou mesmo cubana. ça.e a investimentos".
Quantoà própria reformatarifária'tão
Quandoo Sr. Rockefellerfalou em "nacionalismoemocio- preconizada, êle se contenta em que se organize um sistema de
cobrança de impostos i/reamZüed'e de combate à evasão fiscal:
nal" na Conferência sabre Tensões no Hemisfério Ocidental.
faltava à sua intervençãoo ardor burocráticopela Aliança de-l gemano e:ntantograve êno, .pondera, alterar a taxa dos impos-
monstrado pelo simpático Embaixador LincoÍn Gordon= não tos de modo a reduzir os incentivos aos negócios necessários
para aluir as poupanças pllivadas e investimentos.x E, por fim,
tinha também aquela proliferação cogumélica de pontos de vista
trazendo à. tona o fundo'do próprio pensamento, apresenta a
que o então Embaixador brasileiro em Washington, Dr. Roberto condição decisiy.a para que, com os seus, possa interessar-se
Campos, costumava derramar sabre tudo que'lhe' dá motivo a
discorrer.. Muito mais sóbrio que os dois funcionários na dita pela.Aliançae Ihe dar ui;ia mãozinha."Se",'adverte,':a Amé-
rica Latina não está apta para abraçar doutrinas que dão aos go-
conferência, o Sr. Rockefeller, tudo, condenava o am-
vernos centrais autoridade sabre os recursos naturais (o petróleo,
biente "nada .sadio". de nacionalismo emocional que se estendia .cara) e diminuem a liberdade individual, os incentivos
por toda a América Latina e envolvia a conferência. Depois,
devem desempenharum papel mais importante."
não ej'a aquela encaradacomo um vasto empreendimento
de
oportunidades para inversões ou negócios privados. Que o Es- A desconfiança, senão a condenação da Aliança para o
Progresso pelo mais autêntico representante do blg bmíness,
tado modere a sua participação no empreendimento. Seja árbi- não se disfarça. Isso foi em 19621 0 Vice-Presidente Johnson.
tro, garanta as inversões privadas e os compromissos governa-
mentais inevitáveis dos nunca assaz responsáveis latinos do ao vir assumir! inesperadamente,o cargo de Presidente tràgica:
mente vago, .já tinha, pois, conhecimento do veto das grandes
Continente. Assegure as perdas sempre possíveis. Êle é explí- corporações financeiras aos projetos por demais estatizantes de
cito: "Vimos. exemplos disto (nacionalismo desencorajador'de
seu antecessor. Em conseqüência dessa oposição, o Dava Presi-
recursos de fontes privadas externas) durante o primeiro ano dente não tardou em lhes dar satisfação e,' despedindo o assessor
da Aliança pai.a o Progresso. Em conceito, a Aliança põe ênfase
na primazia do investimentoprivado. Os arquitetos ãa Aliança de. Kennedy, o liberal (no sentido americano) Sr. Moscoso,
colocou em seu lugar um homem inteiramente dócil à confraria
sustentaram
que um bom têrço do capital proviria de áreas
externas à região e dois terços seriam gerados domêsticamente. da alta finança..Assim, desde 1962, em nome de todo o grupo
de detentores das finanças e do poder económico americano,
Os planejadores acreditavam ser isso um objetivo realizável. Ora. o Sr. David Rockefeller ditava na'Bahia ao futuro sucessorde
na prática, os programasestimuladosse têm ocupadoprincipal- John .Kennedy (e para o futuro sucessor de Jogo Goulaft)
mente com a ação governamental. Isso se deve em Fale a 'ati-
tudes governamentais tanto nos Estados Unidos como na Amé- sua platafomla de govêrno.
Corroborando o que disse o Sr. Rockefeller, no ano ante-
rica do Sul e em partea um climaeconómico
e políticoem rior, na Bahia, o Sr. J. Peter Grace, na presidência da Comissão
deterioração que não tem sido condutor de investimento privado. de investidores privados encarregada de dar parecer sabre a
Ao concentrar-se no setor governamental,a Aliança tem'tendido
a sublinhar movimentos de reforma que não podem ser levados 1 0 Sr. Rocketeller
é êle mesmomuito intel-estado
no estímuloà
a efeito maciamente,sem grande desassossêgo
social e incer- poupançana Amériça Latina e no Brasil, onde tem na CREscnNoo
in-
tezas políticas." corp. uma filial da International Basic Economia Corporation, por êla
controlada.
F
Aliança, tal como a tinha concebido e lançado o Presidente ajustes de contas, financiamentos compensatórios. Em 1940, o
Kennedy, prognosticava em 1963 : "A Aliança, na sua presente velho Lavis, não escondendo suas suspeitasem relação a ''em-
forma e dimensão,não pode ter êxito. . . o clima é desfavorá- préstimos", afirmava que "o mal de emprestar dinheiro é que
vel na América Latina." O Time (15 de fevereiro de 1963) '&
aconselhavaos Estados Unidos a adotarem o método do côro! não cria por si mesmointercâmbio". Dinheiro, insistia, "só para
implantar novos negócios, com pessoal preparado, com conhe-
amd sfíct approacA -- ou, em nosso vernáculo popular de sub- cimentos de negócios e da-s línguas que se falam" Da América
desenvolvidos,
''o feixe de capimna ponta de uma vara" à Latina. O Sr. Lavas revelava, pelos créditos oficiais de então, a
frente do burra para estimula-loa avançarna direçãoque se mesmasuspeitaque o Sr. Rockefeller revela, hoje, pelos vinte
quer. A]gumas doações ou empréstimos para animar os latinos bilhões de dólares prometidos por Kennedy. Ingênuamente,La-
"a elaborarem ]eis mais hospitaleiras ao investimento privado"
'P vastinha um modêlopara seuprogramade negóciospara a Amé-
(Revisão da lei de remessa de lucros pelo Marechal Castelo,
rica Latina: a experiência britânica. Na verdade, não precisava
logo depois de assumir o poder). Naturalmente, a Comissão êle estar apontando o exemplo da Inglaterra, nes-samatéria de
pedia ainda maiores incentivos fiscais, créditos e deduçõespara prendera exportação
de capitalcom a importação,
pelo país
proteger os investidores contra pesadas perdas. Mas mesmo
que recebe o dinheiro, de produtos industriais do país que expor-
assim -- o Marechal Castelo ainda não apontava no horizonte ta o capital, pois, "segundo o pesquisador alemãoG. Trade, entre
-- achava ela "improvável que condições nomiais atraentes ao 1925 e 1928, os Estados Unidos investiram em companhias
capital estrangeiro pudessem ser criadas por muitos anos" elétricasDa Argentina,Brasil e Chile uma somaigual a
Empréstimos de Govêrno a Govêrno são apenas um "tapa-bu- 1.027.000.000 de marcos alemães. ])ui.ante o mesmo perío-
raco da falênciada Aliança". Para qão falir, só um remédio: do, os Estados IJnidos exportaram aos mesmospaísesequipa-
''encorajamento à emprêsa privada, estrangeira e local", que mentos e materiais elétricos no valor ,de 242.900.000 mar-
deveráser "o fulcro principal da Aliança". Como estamoslonge cos, ou 24% da soma investida". "Os investimentos america-
da Aliança concebida por Kennedy e de quando saiu quentinha nos nos dez paísesda América do Sul aumentar8mde cento e
do forno de Punha del Este! E para findar esta indisfarçável
setenta e três milhões de dólares em 1913 para 2.293 bilhões de
advertência do grupo Rockefeller: "Os Estados Unidos deve-
dólares em 1929. Do total da soma investida nessespaísespela
riam concentrar seu programa de ajuda económica nos países
Gljã-BretaDhae os EstadosUnidos, a parte dos EstadosUnidos
que mostrem maior incli:nação a adorar medidas p-ara melhorar nas importações da América do Su[ cresceu de 16,1% em 19]3
o clima de investimento e suspender a ajuda aos outros países para 31,5% em 1929, quer dizer, quasedobrou".:
até que uma atuação -satisfatória tenha sido demonstrada.
Assim, o projeto de Aliança se transforma de uma "revolução" ])iante dêssesdados, de que chorava o nosso amigo Frei
nas estruturaseconómicasda América Latina num instrumento Lavis? Êle era injusto com o Gi)vêrno de Washington, coco hoje
de doação aos paísesque não se adaptem à vontade das grandes -- ou melhor, ontem, quando Kennedy era vivo -- o Sr. David
corporações e trustes americanos. A Aliança para o Progresso
Rockefeller se mostrava com relação aos governantesde Wa-
terá de ser uma operação financeira dirigida pela alta finança
shington.Parece,de qualquermodo, que o Sr. Lavasguardou
estadunidense,com alguma assistênciado Govêrno ou dos Go- certos ciúmeq2 ou ressentimentos das épocas pioneiras, de seus
vernos, para fins lucrativos. primeiros passos por nossos mundos sul-americanos.
A Aliança para o Progresso sendo precipuamente uma or-
l (Lênin, /mpe/'ialísm, etç., New Data, pág. 147, International Pu-
ganização de interêsses privados a serem estimulados, o que blishers, N.Y. )
conta é a soma de capitais privados que possam ser levantados. 2 Dêsses ciúmes do investidor americano daqueles tempos pioneiros
Nessas condições, os vinte bilhões de dólares, compromisso do temos êste surpreendente testemunho contemporâneo: "Os capitalistas
Estado americano, para serem colocadosna América Latina em americanos eram, por sua vez, invejosos dos inglêses e alemães". Lênin,
c\tardo The Ánnals of the .4merican .Academyof Politica! and Sacia!
dez anos, se transformam sobretudo em operações contabilistas, Sele/zce, Vol. IX, 1915.

Ó7
Mas, afinal, em. que.consistia. o velho progi'ama Lavas para responsabilidade do exportador". E, como se estivesse escreven-
salvar a América Latina? Não era difej'ente do do bom Sr. Rocke- do para hoje em dia,.quando o nosso Govêrno tem vastos pro-
feller, hoje. Era o do bom colonizadorpara o colonizado. Re- jetos.de construçãode casascomo meio de empregarforça de
presentava o eterna programa do? capitalistas e manopolktas 'rb trabalho ociosa e investir capitais, vindos dos EstadosUnidos,
exportadores metropolitanos em relação ao-spaíses da periferia. como processo de, vencer o receoso em face das medidas desin-
Todos êles, no íntimo, estão convencidos de que as relações entre flacionárias, êle lembra que ''o maquinaria de construção rodo-
os nossos países e os dêles são imutáveis. São conseqüênciade viáüa já está encontrando um importante mercado na América
uiva lei natural e, mais ainda, estão certos, contra a experiência Latina". "Nessecampo, é da maior conveniênciaarrolar uma
histórica, co=ntra as estatísticas, contra as expectativas e'os pmg- parte do capital doméstico de modo que a povo mesma fe/üa
nósticos, de que tenninarão por melhorar as condiçõe-sde vida
dos povos subdesenvolvidos
periféricos assimcomo num sistema
de vasos .comunicantes, o:líquido circulante acabará atingindo
nível igual em todos êles. Enquanto êssenivelamento não = der
t í/zferêsie.Os naturais deveriam ser membros dos conselhosdire-
tores, embora devamos re/er o co/zfrõ/e cM gerêrzcla,ao menos
até que a emprêsase torne bem estabelecida.E para garantir
o pagamentode juros e a amortizaçãodos empréstimos,ques-
virá a seu tempo -- continuaremos a ser produtores de ma- tão que reconheceser muito delicada, o remédio é que essas
térias e produtos primários, para fornecer às'estaçõesmatrizes. coisasirão fiquem a cargo das rendasgeraisdo país, mas que
às metrópoles,tudo de que precisama fim de que continuem pesem sôbre os rendimentos da próp$a emprêsa. Isso é talvez
a elaborar produtos, rabi:tear sintéticos e acumular riqueza-s uma das faces mais difíceis de todo' o problema. Mas é verda-
Dentro dessas concepções, o nosso amigo Lavas 'faz suas de que onde os encargossão para ser satisfeitospelas rendas
''sugestões" "Se: po!.exemplo, 'o estanho da Bolívia pudesse ser públicas gerais,deixa de haver a exigênciade tornar a emprêsa
levado aos Estados Unidos e ali refinada, em lugar de o ser na financeira e economicamentesatisfatória". E, para concluir, em
Inglaterra, estaríamos a pjlomove:l.o interêsse de ambos' os paí. matéria de participação do Govêrno americano nessas com-
ses (sic), criando o intercâmbio direto e não indireto. Se pudés- plicadas questões, de exclu-sividadedos negócios privados, é
semosdesenvolvera indústria de mineraçãodo estanhona Bo- claro: "Se os Estados Unidos são de alguma buda aos nossos
]ívia a ponto de poder suprir todas as nossas necessidades, sería- vizinhosem sua hora de necessidade,
que nossoauxílio seja
mos independentes do arquipélago malásio". É o caso' de se cooperativo, fornecido através de lzM laço de rzossogo'vêrnocom
perguntar: "Seríamos", quem? Oi Estados Unidos ou a Bolívia? ?s interêssesda indústria, do comércio e da finança''. E. vd\a
E também sugere que com "investimentos outros interêsses mi- a resumir toda a experiência passada: ''Em 1915,.uma poderosa
neiros poderiam ser desenvolvidospara produzir os metais de combinação das figuras mais notáveis da finança e da indústria
que necessitamos,o .que poderia tambémser bom para ambos" dos Estados Unidos, com pràticamente diiúeiro ilimitado à sua
Por êsseprocesso, diz, poder-se-ia restaurar a indústria de nitra- disposição,
. fracassouporque não soube apreciar os problemas
to do Child; Se se.estimulassemindústrias leves em certos paí- e opoHunidadesda América Latina. Mas pal'a os fins'de 1920,
ses, ou indústrias lácteas na Venezuela, para Dão ter que im- através de canais regulares de finança, derramamos tremendas se:
portar até manteiga, os Estados Unidos "poderiam fàcilmente mas na América Latina, geralmente com i.esultados desastro-
compensar a baixa de exportação de artigos acabados com o sos para ambos os lados. Perdemos nosso dinheiro e nossos
aumento.das exportaçõesde maquinaria. O'Govêrno poderia wr vizinhos do Sul ficaram ressabiadospelos débitos por dinheiro
muito eficaz no financiamento em larga escala do custo dessa à
que. produziu tão pouco e que. anualmentenão pedem pagar,
inaquin'aria, compartilhando dos riscos de algum modo com os totalmente. Estamosagora propondo emprestar,atravésdas agên-
manufatureiros, capacitando-osa conseguir pagamentos a longo cias governamentais,ainda mais de nosso dinheü'o.Não houve
têrmo". Embora reconheçater o Banco de Exportação e Im- no passado, como não há agora, muito sinal de plena coopera-
portação já feito alguma coisa nesse sentido, "ainda não com- ção entre o Govêrno como tal e o comércio regular, os canais
partilhou realmentedo risco que tem sido completamenteda financeiros estabelecidos e a indústria. Não teremos êxito em
''v
Ó9
nossa cooperação com a América Latina se não tivermos com-
pleta cooperação em casa. . ."x
A advertênciado Sr. Fred Lava.sem 1940 tem sido ouvida.
A advertência
do Sr. DavidRockefellerhoje é, no fundo,da
mesma substância, mas em tom mais enérgico. A emenda do
Senador Hickenlooper ao Foreiglz .4íd .4c/ a transformou, por
fim, em ]ei.
A compra das concessionárias
da American Foreign Power
o poderoso /mZdíngque controla a Bond & Share no Brasil, pelo
Govêrno do Marechal Castelo Branco, bem como o seu'de-
creto entregando à Hanna os meios necessários para dominar
os instrumentos de exportaç.ãodo ferro do País, são efeitos lon-
gínquos daquela advertência. As manobras e manipulações do
Sr. ThomasMana, à frente da Aliança para o Pri)grosso,de-
monstram também que as condições para sintonia entre o seu
Govêrno e os investidores.privadosque têm no Sr. David Rocke-
fell-er o seu representante máximo, R)ram, afinal, encon-iradas.
A cooperação ''em casa" entre o "comércio regular" e o "Go-
vêrno, como tal", está perfeita. O big bzzsiPzess
não tem mais
muitos motivos de se queixar quanto a atitudes governamentais ./'\ APROXIMAÇÃOda guerra transformou o New Z)eal
fora da linha. Os homens de negócio norte-americanos não rooseveltiano, sobretudo de natureza social interna, em arar
querem de modo algum ver seu Govêrno na esfera específica Z)eaZ,
ou novo trato do Estado americanocom os capitaispri-:
dêles, dando ou emprestandodinheiro às repúblicas do Sul; e, vados em favor da mobilização e da condução da guerra.
conseqüentemente, impõem a atenção do seu Govêrno para o Êsse novo trato ia fazer soltar as rédeas,outra vez, à$
fato de que o auxílio que prestar aos latinos do Continentesó grandescorporações e grandes capitalistas no esforço por ?çam-
pode ser ''cooperativo", quer dizer, fornecido através de um laço barcar os mercadoslatino-americanose monopolizar as fontes
que o prenda aos interêssesda indústria, do comércio e da finan- de suas riquezas minerais. Mas desta vez sem recurso a capi-
ça.americanos.E mais: que tal ajuda seja "retida" até que o tais prívad6s próprios, e sím do Estado. A isso chamou-se ''defesa
país em vias de ser ajudado demonstre melhor compreensão'Esta do ]iemisférioocidental".Em nome de uma necessidade
estra-
compreensão foi melhormeDte demonstrada com a ascensão ao tégica imposta pela guerra contra a-s potências do Eixo, aves
poderno Brasil,em l de abril do 1964,do grupomilitar dcl tou-se a hipótese de um ataque alemão na periferia continental
Marechal Castelo Branco. como etapa para o ataque ao coração meüopolitano, ao norte
do Continente.Na realidade,o a que se visava era a hipótese
inversa: a utilização da plataforma brasileira ao sul para saltar
através a África sabre o flanco inimigo na Europa. O que, aliás,
foi feito. Na prática corrente dos negócios,o princípio que co-
bria, agora,a velha política dos negóciosantes de tudo era o da
defesa do hemisfério". Não se enganara o professor Williams ao
escrever,em 1929(Economíc F'orelgnPo/í(7 of f/ze t/Mfed
Sfarei) : "na velha luta entre os defensores da propriedade e os
l Obra citada, pág. 102 que . . procuram proteger e promover os valores humanos e po-
70 71
l

[íticos por meio da legislação,a influência dos EstadosUnidos


nos paísesatrasadosse exercecadavez mais do lado da proprie- a interpretação, mas a posição de Beals era nova. Seja como
dade", cama também nao se enganava-,dezanoveanos mais tarde. fâr, a noção dos interêsses nacionais americanos passou a pre-
clomiDar até sabre espíritos liberais new-dealescos
Os choques de interêssesentre investidores estrangeirosnos
passe'sda América Latina vieram à tona depois da Primeira
Grande Guerra e alcançaram o nível aberto dai rivalidades entre
Estados com a vinda da Segunda Grande Guerra. Os ideólogos
e analistas americanos sentiram o impacto da consciência daque-
las rivalidades. Mas também, e comopo sentiram os próprios go-
vernos latino-americanos que passaram a acariciar a 'idéia de
poder negaceare manobrar entre êssesrivais. Com efeito. a
chegadaem massados capitais americanosna América do Sut,
depois da Primeira Guerra Mundial, acendeu essa luta ds
rivais estrangeirospela monopolização das riquezas naturais dos
países latino-americanos ou pela conquista dos mercados con-
sumidores.E, como era de se prever, a intensificaçãoda luta
acabou por despertar a consciência de capitalistas, industriais
e intelectuais nativos.i
As cifras de investimentosfinanceiros americanosna Amé-
rica Latina começarama elevar-sedesdemais ou menos]900.
Nesseano se repartiam êssesinvestimentos assim: cento e oitenta
e cinco milhões de dólares no México; cinqüenta em Cubo e cin-
qüenta e cinco em outros países. Em 1913 êssesinvestimentos
subiam a um bilhão duzentos e cinqüenta milhões. Em face des-
sa soma, no mesmo ano os inglêses tiiúam investido na mesma
o triplo ou o quádruplo.
Segundo Eugêne Pépin ('l,e {Pa/zarzzérü=aüx/nze,
Cola. Ar-
mand Colin, 1932, pág. 115 e segs.), a entrada do período é
marcada pela conferência financeira de 1915, convocada pelo
Sr. Mac Adio, Secretário do Tesouro do Presidente Wilson,

WPe:gaze'Üq3©l
l Dessa época foi o "arreglo" financeiro que o imperialismo ameri-
cano fêz com.a Colâmbia, ainda sangrando da extmção à força de
seuterritório de um canalpara as facilidadesà esquadrado Tio Sam
no Extremo Oriente. Os Estados Unidos subiram então a indenização
de umâ justa. influência política na América Latina se não lo- à Colâmbia para 25 milhões de dólares, mesmo assim sob protesto de
mamlos medidaspara asseguraro tipo de produç.ãoque venha eus"jingoistas",a fim de amainara ferida aberta. Concluídoo "arre-
sustentar nossos inhrêsses políticos o territoriais". Horace B. glo" por 2,5 milhões de dólares em 1921, retomadas as relações diplo-
máticas interrompidas, chegam os homens do petróleo e se apoderam
])avia, que o cita, üe atribui querer forçar as nações'latino' dos vastos depósitos colombianos, sob a forma da Tropical Oil Com-
americanas a entrarem na órbita económica americana, se ne- pany; concessão
mais nova está nas mãos.da SoconyVacuum and
cessano por meio de represálias económicas. Pode não ser exala Telas .Co. (Benjamin W. Willíams, ..Economlc Foreign PoZícy of fbe
U/zf/ed S/ares, N. Y., 1929; Guntber, //zsfde Z,afízz .4meríca, Cap . ' XL)
72
73
l

para "o estabelecimentode relaçõesfinanceiras mais íntimas en-


tre os Estados Unidos e as naçõesda América Central e do Sul" A natureza dos investimentos americanos talvez determine
Cinco anosdepois, abrangendoagora a América do Sul, o total em parte a maior irradiação de sua influência, sem falar, é claro,
no papel político crescenteque o Govêrno dos EstadosUnidos
dos investimento! (depor de tomadas mais íntimas as relações passaa exercer em todo o Conta.nente.O capital americano (em
financeiras) era de um bilhão, novecentose cinqüenta e três mi-
lhões, assim discriminados: México, oitocentos' milhões; Cubo, 1939) dirige a indústriado cobrena AméricaLatina (Chile,
México, Peru), influi na produção petrolífera de Venezuela,
quinhentos e vinte e cinco milhões; América Central, noventa e
três mi]hões e América do Su], quinhentose trinta e cinco mi- Colâmbia, México, Peru; nas minas de prata do México, nas
lhões. Em 1923, o Departamento de Comércio estima o total dos nitratos chilenos, do tungstênio boliviano, do vanádio do
dêssesinvestimentosem quatro bilhões e quarenta milhões. Em Peru, da bauxita das Guianas; no açúcar e nas frutas (United
percentagem, temos que por volta de 1930 os investimentos dos Fruit Co.) das índias Ocidentaise da América Central (85%
Estados IJnidos na América Latina crescem de 339% em re- das usinas de .açúcar de Cuba são de propriedade americana);
lação a 1913 e de ll 312% em relação a 1880.t Como se sabe. nos serviços públicos em geral (gás, telefone, eletricidade, água)
foi por volta de 1929-30qu-eem matéria de investimentosos Es- c nas indústriais da Argentina e do Brasil.i
tados l.Jnidos alcançavamem cifras o velho rival britânico e o Vários são os testemunhosque revelamcomo em alguns
ultrapassavam em ritmo. Foi também, coincidentemente, por países certos ramos de produção acabam passando completa-
essaépoca que a América do Sul se viu ab-aladapor uma mente a mãos estrangeiras.Assim, o dobre chileno estáem mãos
série de convulsõespolíticas internas nos seus principais países, de duas companhiasamericanas-- Kennecott e Anaconda; ct
a começarpelo Brasil e a Argentina. petróleo,.por toda parte, salvo, talvez, no Médico(expropria-
Os investimentosüglêses,de importância considerávelpara ção Cárdenas). Na Venezuela, três companhias, Standard' Od
a Grã-Bretanha, se colocam maciçamente na América do 'Sul, of New Jersey, Gula OU, ambas americanas e Royal Dutch Shell,
sobretudo na costa atlântica. A pi.eferência pela Argentina é tecnicamente uma corporação com sede em Delaware mas con-
esmagadora:50% dêlessão na Argentina e 25% no Brasil. Os troladapor interêsses
britânicose holandeses.
Na Colâmbia,o
25%o restantes se distribuem entra Uruguai, Venezuela, Child, petróleo.estácom os americanosda Tropical Oil Co., c(imo já
Peru, Cubo e México. Do total dos investimentos britânicos em vimos. Outra concessãopertence à Socony Vacuum and Te:
territórios não britânicos, mais de metade está representada na xas Co., etc., etc. Por essa época, o Peru, dentre os países lati-
América Latina.z A crise mundial de 1929 teve entre outros efei- nos, era o que apresentavao tipo mais acabadode uma econo-
tos o de fazer parar a !xpansão da capacidade investidora inglêsa mia semicolonial. Os americanoseram os donos db país.z
no nosso Continente. Para o fim da décadade 1930 os capitais Os investimentosdiretos dos Estados Unidos na América
britânicos na América Latina ainda representavam23% de todo Latina em 1930 eram, segundoCooperaclón /'i/za.lzciera/lzfera-
g capital inglês investido no exterior.'Comparadosaos dois mi- merfcama (Chicago, 1938), metade dos investimentos diretos
lhões de libras de investimentosbritânicos na Argentina, os tre- totais .efetuadosfora do seu território nacional. A proporção dos
zentose cinqüentae cinco milhõesde dólaresamericanos
ali investimentos
jndiretos era apenasde um quinto do total dos
investidos fazem medíocre figura. Contudo, a influência decor- investimentosdêssegrupo. Já então a maioria dêssesinvestimen-
rente dos capitais americanostende a ser maior que sua concen- tos, diretos e indiretos, se encontrava na América do Sul, em-
tração. Assim, a influência americana se faz sentir muito mais bora Cuba continuassea ser o país de maior quinhão, tomados
na Argentina do que, digamos,a inglêsa em Cuba, no México um a um. Cuba tem a primazia dos invostimelitosdiretos (666
ou mesmo no Child. milhões de dólares) . (Joan Raushenbusch,Headline Books, edi-
i. Chamisso,
obra citada,pág. 82.
z (.Recue de !a Chambre de Commerce, France-Ámérique l,atire. l V. JoanRaushenbusch,
l,ook al Za/f/z.4meríca,llle Role of Foreign
Vo1. 11, 1948, n.o 3.) Money, pág. 25. '
2 Ver Chamisso, obra citada.
74
75
r
ravam numa extensãode vinte milhas entre a América do Sul,
a. ltália e Alemanha.z
ção revista, Foreign Policy Association, n. 27, 1940-41 -- T/ze
Ro/e o# r'oreign /l/oney). A Argentina batia então o Brasil em Concomitanteme:nte com a era dos empréstimos privados
investimentos diretos americanos, com 348 milhões para 194 à nossaAméricapobre, o Estado apoia a instalaçãoali de um
milhões. Em relação a indiretos, porém, o Brasil estava na frente vasto aparelho bancário americano, abrangendo todos os países,
d! Arg:ntina e.de todos os outros países latino-americanos, com sob a liderançado NacionalCity Bank of New York. As agên-
cias dêste abriram-se no Brasil e no$ demais países latino-ameri-
273 milhões. Chamisso verifica cÕm surprêsa que até às vés-
peras de 1939 o Brasil continuava "muito menos dependente canos na época das maciças exportações de capital privado.
financeiramentedos EstadosUnidos do que se poderia supor". Com ã aproximação da guerra, o ritmo da penetração im-
Assim, o foa/IPzaPzfpara a completa dependênciase veria'cada perialista.americana acelerou-se, tornando-se premente a neces-
a partir daquele ano, quando o Brasil perde seusmercadoseuro- sidadede expulsar da América Lata.natodos os obstáculosà sua
peus(alemão) e é forçado a girar comercial e politicamente eni frente. Assim, o que se ia fazendo no campo da concorrência
função dos interêsses estratégicos dos Estados 'Unidos. comercial, estimulada pela Lei Webl>Pomerane, se transformou
numa política oficial deliberada. Por força das coisas, necessi-
A lut! pela conquista de mercados, iniciada já a partir da dades estratégicasinelutáveis, monopolização do mercado e das
promulgação da Lei Webb-Pomerane e pela monopolização das fontes de matérias-primas e minerais, o fato é que o Govêrno
fontes de matérias-primas, brutalmento agravada com a 'guerra, e homensde negóciosde qualquer modo se uniram para expul-
como que se completava,no curso desta, num processode absor- sar do resto do Continente os antigos competidores económicos,
ção muito mais complexo,pela política de alinhar a parte Sul amigos na guerra ou inimigos. Numa área, por exemplo --
do Continenteao esquema
político-socialamericano.
Um dos a da navegaçãocomercial extern.t -- os Estados Unidos não
mais poderosos agentespara isso foi a instalação em 1940 pela apareciam em 1914, mas em 1941 a bandeira americana em
Pan American Airways de seus serviçosnas regiões vizinhas e águas sul-americanas cobria uma frota mercante respeitável, de
cento e dezanove barcos. (H. B. Davis'.) (IR)mo sempre aconte-
periféricas da América do Norte, diretamente apoiadapelo Go- ce, precedendo ou seguindo-se a necessidadeseconómicas ou
vêrno de Washington.Com efeito, em maio de 1941,x adquiria políticasao nível das chancelarias,dos Estados-Maiores
e dos
todo um grupo de grandesaviõesde transporte para expelir dos altos conselhos das finanças e da economia, surgem os ide(}-
céus sul-americanosos aviões alemãese italianos que ainda ope- logos para, formular teoricamente aquelas necessidades, lhes dan-
do avisos de universalidade o de eternidade.
i. ."A grande companhiaamericanadesde 1939 procurou reduzir as
linhas de aviaçãoalemãsque subsistiramentão um pouco por toda Foi êsse o momento do sonho de integração económica e
parte ,e que iam causar durante a guerra sérios problemas.'. . O con- política de todo o setor latino do Continente ao sistema impe-
tato (com a Alemanha e ltália) se mantinha por vía aérea.... Existia rial norte-americano. Por essa mesma época, o problema das
toda uma rêde de linhas aéreasalemãs..Primeiramentea linha L.A.T.i..
transformações sociais e políticas do pós-guerra empolgava os
italiana, é bem verdade,a única que em 1941 manteveum serviço
efetivo entre.Berlim, Romã, Danar e Natal, pondo as capitais do Eira melhores espíritos e os cientistas sociais mais sérios. Discutis-
a 3 diasde d:stância
do Rio de Janeiroe a 4 de'Buenos
Abres".';Ela se a redivisãó do mundo em continentes ou regiões de âmbito
descarrega bagagem de diplomatas e impressos, e volta com espiões, mundial, nas quais os Estados nacionais isolados seriam absor-
platina e diamantes". (Gunther, obra cit., As Rotas Aéreas Alemãs). vidos. Um eminente economista americano, Alvin Hansen, de-
A rêde interi.or era notável: Condor do Brasil, teoricamentebrasilei-
ra mas cujos pilotos eram alemães,bem como os aparehos (Junkers), l 7;ze ]Vew york Tomes,28 de maio de 1941. "U. S. Program in
representando.umarêde de l0 093 quilómetrosmais ou menos,se ligava Latin America to Freeze out the Anis Airlines", transcrito por Davas,
à AeropostaArgentina(que cobria toda a zona até o Estreito de Ma-
ga[hães)
e parao Oesteseligavaao LóideAéreoBoliviano
eà obracit., pág. ll.
z The Éionomic Deferise of the Western Hemisphere, 'Wagbingtan,
Lufthansa, no Peru. . No Equador, os alemães controlavam 'a Sedta. D.C.. 1941.
cuja importância .provinha de sua proximidade do Canal. " (Chamisso.
obra cit., págs. 79 e 170.)
77
76
finoumuito bem tais concepçõesnum artigo em Foreíg/zd//drs: ricos da política e da economia, mas de um autêntico homem de
O crescimento do proteqionismo, dos .sistemas imperiais prece
renciaisl dos blocos económicose Estados totalitários (dominan-
do continentes inteims). proclamava a condenação das' pequenas
nações. As últimas são inevitàvelmente arrastadas para dentro da
H&He'Ê=:;ãHUU$
Virgil Jordan, presidente do Conselho Nacional da Indústria que
órbita dos gigantespelo jogo de fôrçasde penetração
política, em discurso de 10 de dezembro de 1940, dirigido à Associação
das relações comercliais e da estratégia militar. (Outubro de de Banqueiros para Investimentos, dizia : "Qualquer que seja o
rwultado da guerra, a América embarcou numa carreira de im
Pode-se discutir.a durabilidade do fenómeno verificado pelo perialisúo, tanto
'-- '"nos .
" legócios .. como
do mundo . .....os
em todos
economista. A realidade do mundo que o economia-tadescrevia outros aspectosde sua vida. . . No melhor dos casos,a Ingla-
erâ aquela mesma. Que .os Estados Unidos, por alguns de seus terra será um parceiro menor dentro de um .novo imp:ria'
dirigentes e mesmo teóricos, andaram pensando no sentido da- lismo anglo salão no qual os recursos económicos e a .força
quelas !oncepções, também não ]lá dúvida. Não era semente m fitar e naval dos Estados IJnidos serão o centro de gravidade.
Harry Wallace, o semilunáticovice'presidentede Franklin De- Para o Sul no nossohemisférioe para o Oesteno Pacíficosa
cano Roosevelt, .que fazia previsões segundo as quais, depois da marcha do império abre o seu caminho. O metro passa aos Es-
guerra, a América Latina iria compor um $ó bloco económico tados Unidos.'É possível que tenham mêdo da palavra pouco
com os Estados Unidos. Outros, também, como o professor Diet- familiar e temível: imperialismo. .. Muitos preferem,segundoa
atual moda morte-americana,disfarça-ia(sic) com uma fuso
vaga como 'defesa hemisférica'. Mas, consciente ou inconscien-
temente, a América do Norte está destinada a essa carreira, por
misférica, .teriam de encarar a questão de reorientar suas ener- seu temperamento,por suas capacidadese. seus recursos e pelo
gias económicas e, enquanto sobrasse tempo, designar de sua sentidotomado pelos acontecimentosmundiais,não só.gm anos
livre escolha os seus coparticipantes."I Ou' então, alargando a recentescomo no comêço do século. . . fomos impelidas para
êssecaminho e nos deram não só a oportunidade como os ins-
idéia. de união hemisférica ocidental, tentavam completa-la ou trumentos económicos, as atitudes sociais e, agora, o-smodos Q
ampliavam-na com mais sensoou realismo geopolítico num bloco
só, formado pelo Hemisfério Ocidental e o Império Britânico: os costumes do imperialismo moderno. . . Na verdade, nãa temos
outra alternativa senão avançar pelo caminho que vimos percor'
renda neste último quarto de século, na direção que tomamos
com a conquista de Cuba e as Filipinas e com a no-ssaparticipa-
autoridade eminente, o Dr. Brooks Emeny, desenvolvia por êsse ção na última guerra mundial."t . .
tempo concepçãosemelhante,uma vez que do ponto de vista A Inglaterra, contudo, não estava pelos autos, apesar de
dos materiais .estratégicos os Estados Unidos e o Império Bri. estar com água pela baga. E chegou mesmo a taxar .as exporta-
tâ.Dica farmatiam "um bloco natural".2 ' ções de matérias-primas destinadas aos Estados l.Jnidos, oriun-
Finalmente, coroando todas essasvistas de mais a mais das de seu império (T/ze New yor# Tomei,.9:2-1941.): Meses
mais tarde, porém, o mesmo jovial, a 8 de junho, noticiava ter
grandiosas sabre o papel universal e hegemónico que desempe- a Grã-Bretanha decidido suspender sua ofensiva comercial na
nhariam os Estados'Unidos nessas superformações continentais,
América Latina. O velho leão britânico tinha ainda energias
exprimia-sea visão não mais de professorese acadêmicos,t-eó.
para repelir o abraço de absorçãoque ]he era oferecido, como
l Citaçãode HoraceB. Davas,obra cit:, pagã.13,e de V Perto,
;«eh%.Z%'gaKK3:= 1='1""«"'"*: EZ /niperüZismo
]961
,amei'icano, pág. 175, Editorial Platina, Buenos Abres,

78 79
sócio integrante menor no novo "imperialismo anglo-saxão" para
r se deu uma espéciede divisão de trabalho magistral.entre o.Esta-
o qual contribuiria com os vastosrecursosde seupróprio'im- do americano, mediante seus grandes instrumentos .diplomáticos e
pério colonial; em compensação, prudentemente se 'retirava de de financiamento e umas dezenas de grandes empresas e corpora'
sua velha arena no sul do Continente americano, deixando-a ao ções privadas que faziam como que .o trabalho de campo. Desde
voraz leão mais Dava, na plena pujança de seus apetites os anos de 20 que o comércio americano com a América Latina
O mundo ti;nha.de ser redividido e recompartimentado, em dominado por trinta a quarenta fi.amas:Em geral, essasfirmas
fatias e porçõesmuito maiores,trans ou intercontinentais,'
por ocupam posições chave nos seus.respectivos.setores no mercado
número muito menor de grandes parceiros, à custa naturalnlên- nacional,'sobretudoem relação à manipulaçãodos preço: inter-
te do caráter intemacional da economia que desaparecia. Com
essaredivisão esvaía-setambém o comércio mundial livn, a úl-
tima lembrança do capitalismo liberal.
Os sonhosimperialistasse vão realizar, mas de outra ma-
neira. A América Latina em bloco, com o Canadá,ao norte, a General Electric, a Sears and Roebuck, a Anderson and Clay-
vai ser "integrada" no novo império. Ela começapor perder, ton. a W. ]i. GradeCo., a AiMFORP
e outras.
com a guerra, os mercadosusuaispara onde escoavaseuspro- Entre 1941 e 1942, a América Latina readaptamaciça-
dutos. Queira ou não, tem agorade comprar em massanos Es- mentesua economiapara produzir materiais estratégicospara a
tados Unidos. O Govêmo americano, por sua vez, passa a sub- máquina de guerra americana. Voltam os ]nitratos, até o cobre
sidiar diretamente seus . exportadores.' O Export=lmport 'Bank chileno a ser importado em grandes quantidadesnos Estados
vai ser um instrumento indispensável para êsse sistema de sub- Unidos. Conhece:semesmo então um aumentofebril no inter-
sídios. Segundo.o seu presidente, W. L. Pierce, vinha êle preen- câmbio com a Argentina. O alimento foi tão sensível que na-
cher o vácuo abeto pelo "estancar de créditos a longo prazo, queles mercados, tradicionalmente inglêses, .surgiu a esperança
o que tornava difícil aos.compradores estrangehos, especialmen= de que as compras americanas fossem continuar. O Brasil e a
te governos, adquirirem bens de capital americanos" Colâmbia, os principais produtores de café, à! voltas com ter-
Entre as.primeiras transaçõe!do Banco, estava uma ope- rível depressão nos 'preços do produto, confabulavam . ?om os
ração maior de dez milhões de dólares à Intemational Telepho- outros produtores para negocial com os Estados IJnidos+ym
ne and Telegt-aphCo., a fim de expandir seus negóciosna Amé- acordo de limitação das vendas no mercado americano..Êsse
rica do Sul.l E um trabalho sistemático se estabeleceu, condu- convênio acabaria por ser assinado e ratificado pelo Senado em
zida pelo Departamento.de Estado, para suprir os capitais pri- Washington,em fevereiro de 1941. O convênio inortodoxo as-
vados americanos retraídos, desde a crise, ci)m empré;timos' do sinado com o Brasil e os outros produtores latino-americanos
Estado a fim de completar a instalação, quase com exclusivida- serviu para alimentar na Argontina a. esperança de encontrar
de,.da máquina nonÕmica americananos vastosdomínios que se também em meio de escoar 'seus produtos hvendáveis, diante
abriam aos seusinterêssesdo Rio Grande, no México, à Patagâ- das precárias condições que se !fiaram para britânicos ,e euro-
nia, na emergência ou previsão da guerra. Houve caso, nessa épo- peus, em face da conjuntura militar. Não tardou?..porém, que
ca, de empréstimo concedido com o fito expresso de capacitar fir- ela 1lofresseamarga decepção. Com efeito, competitivos os seus
ma americana a obhr fomecimento contacto que não fosse para principais produtos agrícolas com os cultivados ou mesmoexpor'
competidor alemão. Foi ainda por essaépoca =- ou no curso da tados pelos Estados Unidos, a Ai.gentina não.tinha chance. E. o
década de 30 a 40 -- que para essa grande política de monopoli- se viu foi a brutal declaração do.Secretário de Estado assis-
zaçãa de mercados e fontes de matérias-pHmas da América Latina tente, Sr. Henry F. Grady, no sentido de parar com os boatos
alarmantes que circulavam nos meios agrícolas de seu país, segun-
do os quais Washington tencionava adquirir os excedentes agríco-
Sr.r", Nof:";:.:' Wm"-s, E""m/. F"'Íg" P.IÍ' ./ / t/ ír las argentinos.Grady declara, peremptoriamente,a 7 de janeiro
8/
A Europa ficava em 1937 com 48,3% das exportaçõesla-
tino-americanas,e fornecia 47,9% das importações.x Em 1938,
as exportações da América Latina para a Europa representavam
54,5@o,e as impor'tações daquela para esta, 43,6%. A Argen-
tina, Venezuela,Bolívia e Uruguai estavamacostumados
a en-
viar mais de 60qo de suasexportaçõespara a Europa e ilhas
britânicas. O Chi]e e a Repúb]ica ])ominicana, mais de 50qo; o
Brasi], mais ou menos 50%o. Analisando-se a natureza dos produ-
tos exportados por áreasgeográficas ou quanto a produtos de zona
temperada,produtos tropicais e produtos minerais, ressaltaainda
o brutal deslocamentodo comício exterior da América Latina
causadopela guerra. Assim, quanto aos primeiros, coordenan-
do dados de várias fontes, Chamisso encontra: em 1938, a Eu-
ropa comprava93% da carne latino-americana,869o do milho,
739o da lã, 74% do algodão, 66qo dos couros e peles. Os Es-
tados Unidos limitavam-se a comprar, em escalamuito limita-
da, carne de vaca em conserva, couros e peles, lã e linho. O
casomais graveera o da Argentina: o trigo em excedenteé con-
servável, mas o milho não. O govêrno argentino teve de com-
prar estoquesde milho (calculadosem 6 a 8 milhõesde tone-
ladas), a $10,8 a tonelada, e os vender como combustívela
$4,5 a tonelada, às estudas de ferro, e a $5,18 a tonelada,
para a indústria. Quanto aos produtos minerais, os Esta-
dos Unidos compravam alguns de importância: manganês,mi-
mais da América Latina estandoperdidos, resultava um grave nério de ferro e zinco, "mas os outros. como cobre (salvo o ad-
perJ$o de deterioração económica e política a ameaçar os Estados quirida sob cauçãopara exportação), o nitrato, o petróleo e o
Unidos.e estanho mal faziam parte de suas compras"- Caso típico aqui
é o Child: ''Normalmente,60%odo nitrato ia para a Europa e
perto de 100qo de seu cobre também, para a Europa e para o
Japãa. . ." A produção de cobre "caiu de cêrca de trinta e duas
mil toneladas um mês antes da guerra para quatorze mil em
julho de 1940". Quanto aos exportadores de produtos tropi-
cais, não obstante a preponderância incontestável da compra
dêstes pelos americanos, o problema dos excedentes projeta
tambémaí a sua sombra. "A República Dominicana perde
60% de seu comérciode exportação(açúcarpara a Grã-Bre-
tanha), do mesmo modo que o Haiti. O Brasil pei.deu uma

U'%?,Ü.'t'gCãáq.s';si:: Ê!.,==H'álgénmáR;Ê: l Dadosde Ethel B. Dietrich, EcolzomícReZafíons


o/ fAe t/. S. wíf/z
Z,afl/z ,4me/.íca. International Relations Series, abril de 1941.
82

.A
r

parte de seus mercados de café. Finalmente as bananas das Ca-


raíbas, de que os Estado-sUnidos são o mercadonormal, so- plinado, que estêve em estudo durante muito tempo no Depar-
frem a falta de tonelagem marítima".: tamento de Agricultura em Washington.Mas,. de qualquer ma-
A substituição da Europa pelos Estados Unidos nesse in-. ncha, o convênioínteramericanode café foi uma espéciede
tercâmbio Qão era tarefa fácil. A América Latina só em parte é substituto parcial e temporário daquelas idéias, ao mesmo tempcp
complementar econâmicamonte à América do Norte; de outra que vários arranjos financeiros foram então feitos através do
parte, ao contrário, é competitiva. Em cifras, o problema sc Éxport-lmport Bank, créditos,. etc.
apresenta assim: como fazer o mercado norte-americano subs- As crises iam sendo vencidas, como a Deus era servido e n
tituir o mercado europeu esvaecente em mais de quinhentos política de atalhar ao imediato se foi. uansformando numa po'
e vinte e seis milhões de dólares de matérias-primas? Ó Professor lítica sistemáticade fazer de toda a América Latina uma zona
Ethel B. Dietrich perguntava: "São os pactos comerciais dese- de produção de materiais estratégEos e críticos para abasteci-
jável-s como medida de solução?" mento da máquina de gue.rra dos Estados.Unidos E quando a
Embora em escala limitada, os Estados Unidos chegaram politica de boa vizinhança atingejeu. ápice, a PJ?nto,
de, nas
a compra.r queijo e vinho argentinos e chilenos, quando antes palavras insuspeitas de Horace Ê. Dava-s,."ter significado, numa
os compravameuropeus.Com efeito, pela primeira vez na his- extensãobem maior do que a maioria dos latinos da América
tória, os EstadosUnidos ocupavam a primeira fila dos crentes ousaram esperar, uma política de dipZomafic/zan(Zy off. . . na
e fornecedores à Argentina, no comêço de 1941, sobrepujando América Latina. . . ou, numa palavra, o oposto da diploma-
até o mais antigo, fiel e poderoso dos fregueses argentinos, isto cia do dólar", nessemesmo momento "a dominação dos Estados
é, os britânicos: 23,6qo das importaçõestotais argentinasvêm Unidos sabre a economia latino-americana vai acentuar-se'
dos Estados Unidos, 38,7% das exportações totais argentinas (Chamisso.)
para lá vão, criando-seo fato espantosode uma balançacomer- Primeiramente, a América Latina perdia com isso sua liber-
cial Argentina-EstadosUnidos favorável à primeira. Dessarevi- dade de comerciar com quem quisessee logo a de fazer a políti-
ravolta assombrosa no intercâmbio dos dois países nasceram os ca que entendesse. A crise económica e a ausência .do. condi-
boatos que tanto susto causaram aos fazendeiros e senadores das ções para uma contínua política expansionista no exterior tor-
regiões cerealíferas e algodoeiras do país, a ponto de obrigar navam mais brandas a$ relações entre o grande país imperialista
o Secretário assistentedo Presidente àquela declaração quc e o resto do Continente, e os negóciosse tratavam então sem
congelou as esperanças platinas. a costumeira arrogância tanque, em têrmos mais pacíficos e ma-
Dêsse estadode coisas ainda surgiu o convênio de café com nos ambiciosos. Charles Beard' evocou então a possibilidade da
o Brasi], Colâmbia e doze outros produtores latino-americanos. fase imperialista de seu país que denunciou com tanta isenção,
E enquanto a Argentina ficava roendo suas decepções,o Brasil ter silvo'':obradé uma minada graçasa uma combinação
de
ia conhecer a satisfação de ter sido protagonista do primeiro circunstâncias sem uma cadeia (iiret de causalidade econâ'
convênio sôbre excedentes que os Estados Unidos negociavam mica".t No entanto, outra voz, menos nobre e eloqüente que
fora de suas fronteiras. Um projeto ambicioso demais de um a sua, já se vê, mas talvez mais dentro daquela cadeia de acon-
pool interamericano de todos os excedentes, apresentado na tecimoDtos, -escrevia pela mesma época: "SÓ a reorganização
Conferência de Havana, chocou-se à desconfiança latino-ame- e o desenvolvimento
próp:.io do México ofereceriauma saída
ricana em face de um possível controle tanque sabre suas ex- para os nossos capitais e energia por algum tempo - - Penso que
portações.O paoZnão se fêz, assim coma não se levou adiante devemostomar claro e entendido que nenhum govêrno no Mé-
a idéia de fomiação de cartéis de matérias-primaspara susten- dico. na América Central e mospaíses sul-americanosdas Caraí-
tar os preços dos excedentese lhes assegurar escoamentodisci- as será tolerado se não fâr amigo dos Estados Unidos e que,

1 Chamisso, ob. cit., pág. 156 e seguintes. l A Foralgn Poli(y for ..4merica, 1940, pág. 73. Cleveland em
2 Quem não se lembra da proclamação do presid. . ..
1895 "Hoje. os Estados Unidos são pràticamente soberanosneste Con-
85
caso necessário, estamos preparados a usar a fôrça 2 para al- canas,concebeu,ou melhor, pâs em prática antigo plano seu,
cançaraquêleobjetivo". (Discursoem 4 de outubro de 1940, de. através uma Comissão de ])eseDvolvimento Interamericano,
no Conselho de Relações Exteriores, em Chicago, pelo General incentivar e dirigir o comércio entre as repúblicas do sul e a sua.
Robert E. Wood, Presidente da Seara, Roebuck -- ]Vew À/msea, Precisamente pela mesma época, Washington passava a estudar
vo1. 111, 7 de janeiro de 1941). Sears, Roebuck é, como se sabe, sèriamenteos meios de transferir os investimentostotais britâ-
uma das grandes corporações comerciais que desde as priscas nicos da e para a América Latina, a fim de capacitar seus países
eras se interessampelo comércio latino-americano. Poucos anos a aumentaremas exportações.Com efeito, quandoda discus-
depois do discurso de seu diretor a grande emprêsase vinha são da ]ei de empréstimos e arrendamentos(Z.,e/zd a/zd /Caia .4cr),
instalar no Rio de Janeiroe em São Paulo. (Tira sido sob a o então Secretário do Tesouro, Sr. Morgenthau, chegou a pensar
direção do mesmo fogoso general?) em lançar mão dêssesinvestimentospara financiar as compras
britânicas nos Estados Unidos e na América Latina.x
A hora de qualquer país da América Latina, mesmo os mais
longhquos, isolar-se havia passado. O Presidente Roosevelt em Quando o Departamento de Estado criou um órgão para
pessoaé expresso: "Nós nos opomos a forçados isolacionismos controlar as exportações,vimos como o generalque o foi dirigir
pira nõs m-esmosou para qualquer outra parte das Américas" não perdeu tempo em reclamar o controle de todas as exporta-
(Janeiro de 1941 cita por HI. B. Davas.)'Todo o Continente. çõesInteram-tricanas de seu pasto em Washington, em nome da
defesado hemisfério". Ao que parece a ideia do pool ou cartel
norte, centro e sul, tinha de trabalhar para a guena, transfori
nado num arsenalprodutivoe políticopara a esüatégiadosEs- das exportações partiu do próprio presidente Roosevelt. Mas a
tados Unidos. Foi então que se criou, i;omo já vimos, o slogan oposição dos países latino-americanos não se fêz esperar, como
de defesa.económicado hemisfério.Em nome dêle, surgiu a já muito, muito anteriormentese havia levantado,
. nos últimos
necessidade de um Dava órgão no Departamentode Estado para dias do século passado, à idéia de unificação das tarifas proposta
o controle das.exportações.À sua frente foi pasto o Brigadeiro- pelo Secretário T. Blaine, ao convocar os .países do sul para
General Russel E. Maxwell, que passou a reivindicar o contrate
fundar a IJnião Pan-Americana.Ao calor da guerra, entre im-
das exportações a fim de promover os objetivos da "defesa do periali-star e idealistas se fazia crescente comunicação. .Os últi-
hemisfério".l mos pregavam idéias generosasque os primeiros acolhiam de
boa vontade, fazendo-as passar, porém, pelo seu alambique.
Antes.de entrarão! a indagar contra quem se quer armar Uma dessas idéias mal destinadas foi a de auto-suficiência he-
a "defesa do hemisfério", transformando-o numa fortaleza sitia- misférica.
da, de que o Pentágono em Washingt(m tem as chaves e o con- Clark Foreman e Joan Raushenbushderam, na seu livro,
trole da ponte levadiça, enquanto o Secretário do Tesouro e o Se..
o tipo de auto-suficiência com que sonhavam. Reorganizar-se
cretário do Comério americanosguardariam as chavesda casa-
forte e os armazénsde abastecimento,
devemosaindanos deter l Clark Foreman e Joan Raushenbush, TofaJ l)e/ezzie, N. Y., 1941, e
numa .fase .preliminar. Encarando-se a si mesmos sozinhos, com Ricardo Berger, advogado intemaciona], TAe ]Vew york Tomei, 2/2/1941..
Para se pagarem os países latino-americanos com os investimentos
uma América do Sul isolada do mu:ndoem guerra, os Estados inglêses naqueles países, em créditos de exportações, calculavam-se tais
Unidos acabam vendo formar-se, ou tomando consciência de uma investimentos
num valor nominal de l bilhão de libras. O secretáriodo
deliberada política de absorção total, financeira, económica e Tesoulrode Morgenthau, porém, calculou o valor mercantil dêssesinn
política da América toda na sua órbita imperial vestimentas em bem menos. Assim, as estudas de ferro mexicanas e
Nelson Rockefeller, ao ser escolhido por Roosevelt para empréstimos oficiais ao México foram calculados em 128 milhões de li-
bras; as ferrovias cubanasem 25 milhões; as uruguaias em 14 milhões.
Coordenador das Relações Culturais e Comerciais InteraÚeri- Aliás, os cálculos feitos, inclusive das depreciações,reduziam os investi-
mentos inglêses no Uruguai à metade do valor nominal; na Venezuela,
tenentee suas ordens são lei para os assuntosaos quais limita sua in a um pouco mais de metade; no Brasil, a apenasum quarto, enquanto
terferência"?' que no Peru a menos de um quinto, e assim por diante. (H. B. Davas,
l New' yor# 7ímeJ, 22/1/1941. obra citada, l)ág. 9.)
8Ó 87
e da melhor qualidade na Guatemala. Quanto ao estaDhd,a Me-
a economia ''pan-americana" de modo a cortar os americanos
tal Reserve Alloy Corp., subsidiária da Reconstruction Finance
(de cima e de baixo) não só do comérciocom Hitler e o Mi-
Corporation, já havia tomado as medidas mcessárias à constru-
kado mas também com os britânicos e holandeses.Na realida-
çãode uma refinaria daquelemetal nos EstadosIJnidos que po-
de, todo o. mundo ."não continental" seria excluído. As exporta- deria utilizar os seus próprios estoques ou um forneçimeàto
ções .americanas ficariam sem seus e-scoadouros habituais, no
interêssedo patriotismoe da "defesanacional". Stuart Chasee constante das minas bolivianas "independentes", quer dizer, não
controladas pela combinação Patino-britânica . Ainda segundo
depois o grupo da -4ma;ca r'iWr fizeram a promoção da ideia..
Carleton Beals, com maior senso da realidade, manifestou. se em o Dr. Brooks Emeny, quanto ao abastecimentode antimónio e
tungstênio, os outros materiais estratégicos realment-eimportan-
favor de se quebrarem quantos monopólios lasso possível, pelo tes, não haveria por que temer escassez,dwde que se lhes des-
desenvolvimento de nov(;s produtos na América Latina. (Como se uma atenção razoável.
se sabe, todos êssespublicistas eram conhecidos pelo seu anti-
anglicismo. ) Os EstadosUnidos são de longe a melhor equipadadas
grandes potências em questão de matérias-primas essenciais--
Na verdade,leãoera preciso apoderar-sede toda a Amé-
ferro, carvão, alumínio, produtos químicos, energia e a maioria
rica Latina para assegurar o abastecimonta necessário dos vinte
e seis materiais de guerra reputados estratégicos.No fundo, não dos minérios. E toda a perspectiva do desenvolvimentoé tor-
nar o grandepaís cada vez menos dependentedos outros paí-
mais de cinco ou seis eram de necessidade
vital. Por exemplo, ses. O desenvo]vimento dos sintéticos vai dispensando, ou liber-
a borracha, que provinha da Ária. Era "imperativo" obtê-la no
hemisfério, já que a sintética em uso comente na Alemanha tando os Estados Unidos da dependência de matérias-primas
nãa produzidas internamente.É hoje mais fácil, mais cómodo,
não a fabricavam os Estados Unidos. E a da Ásia estava perdida.
De fato, observa Davis, breve poderá a borracha sintética subs- mais barato obter produtos sintéticos como a borracha do que
tituir o .lafex natural, comercialmente,em tempo de paz, mas tentar desenvolvera produção de várias matérias-prima-svege-
produza:la presentementenos Estados IJnidos será dispendioso. tais; a experiênciade Ford na Amazânia e a expediçãoJoão
Albelto durante a guerra foram conclusivas nesse sentido. A
Na realidade, se os EstadosUnidos não produziam então uma
administração Rooseve[t, de algum modo ]ançadora da idéia,
espéciede borrachasintéticabarata de que a StandardOil de
Nova .Jersey tinha a patente, o fato se deve aos compmmissos contudo jamais quis -com ela comprometer-se numa política de-
assumidospor esta com o grande truste alemão da 1. 'G.. con. finida. E o Coordenadordos NegóciosInteramericanos.Sr. Nel-
son Rockefeller, quase o único entre os representantesoficiais,
forme se veio a saber. Graçasàs investigaçõesdo Comitê Tru-
se pmnunciou claramente sabre a idéia para combatê-la: ''Igual-
man, no Senado, sabre os. contratos de produção para a guerra
entre as grandes corporações e o Estado americano. Trata remos mente desconcertante",disse êle, então, em discurso, "é o wis/z-
dêste ponto em outro capítulo. /z{// //zín#i/zg dêsses otimistas que descrevem um abençoado Novo
Mundo nitidamente isolado por meio de um sistema de auto-
Entre outros materiais estratégicos de mais difícil acesso
suficiência absoluta do hemisfério". ('JVew york Timex, 9 de fe-
contavam-se o manganês! a cromita, o estallho, que faltavam
vereiro de 1941.)
a. economia americana. Num estudo sabre .d E;zraf íg&z das
Êsse problema de propalada unidade hemisférica veremos
Ã4aíérím-Prípnzas
(N.Y., 1934) o Dr. Brooks Emeny calculou que mais adiante e mais demoradamente. Por ora, assinalemosa in-
por uma soma em dinheiro equivalente à renda derivada das tari-
fas de então sabre manganês,durante dois ou três anos. seria consistência governamental em relação ao mesmo. Enquanto
possível comprar .toda a quantidade neçessária para estacar. seus peritos económicos, os homens de negócios ligados ao De-
Ainda não se. havia descoberto as grandes jazidas' de manganês partamento de Estado, não podem senão mostram.a inconsistên-
de boa qualidade no Brasil; conheciam-se as reservas de baixo cia da idéia, politicamente ela é não só mantida nos altos cír-
teor de Cuba, além de algumas nos Estados Unidos mesmo. culos governamentais como proclamada. Econõmicamemte ha-
sem falar nas de cromita, não de boa qualidade, ainda em Cuba veria graves implicações que os economistas e os homens de
89
negóciosnão podem nem têm interêsseem ocultar. O Dr. Brooks
Emeny que, como já mostramos anteriormente, estudou o pro-
blema, ê taxativo e conclusivo. Para realizar a unidade ou in«
tegração económica hemisférica seria preciso, afirma, que os
Estados Unidos estivessempreparados para colocar a Ainérica
Latina na P.W.A. (Administração de Obras Públicas), orga-
nização. instituída pelo Govêrno Roosevelt para dar trabalho
aos milhões de desempregados americanos nã crise de depres-
são dos anos de 30. (Depoimento perante a Comissão de Rela-
ções.Exterions da.Cânlgra dos Representantes, 22 de janeiro
de 1941. -- ]Vew yor# limes, 24-1-41). '

./"'\ NOVAp-OLÍTrcAamericana em relação a América La-


tina como um todo -- e não apenas como uma compartimenta-
ção em lotes de vários tamanhos, tomados por uma gente colo-
rida e pobre, onde súditos americanos chegavam, compravam,
vendiam e partiam em seguida -- inaugurava-se,pode-se dizer,
com aquilo que se veio a chamar de Declaraçãode Solidarieda-
de Interamericana. Era importante e dizia: "As Altas Partes
Contratantes dec/arara i.z zdmfs heZ a irz/ervençãa de qualquer
uma delas, direta ou hdiretamemte,e por qualquer que seja a
razão, nos negócios internos e externos de qualquer das outras
Partes. . ." A declaração foi assinada na Conferência de Buenos
Abres, em 1936.
Sem ela, o Presidente Franklin Delano Roosevelt teria en-
contrado,como os antecessores,
a porta da desconfiança
latino-
americana fechadíssima para seus desígnios. Roosevelt havia
preparado o terreno, com alguns gestos unilaterais de sua parte,
com a ab-rogaçãoda Emenda Platt, em 1934, o abandonodos di-
reitos de intervençãodos E-atadosUnidos nas pequenasrepú-
blicas do Panamá, Haiti e República Dominicana. Tinha razão
Samuel F. Bemis (7/ze Z,a//n .,{merlcan Po/í(y of //ze t/.S. ) em
afirmar: ''Assinando-a, os Estados Unidos pavimentavam o ca-

9/
minha para diafrente de todas as Américas durante a Segunda acôrdo franco, político e comercial, com a Rússia, bem dali-
mitado. teria talvez mudado o curso dos acontecimentosinter-
No mesmoano, a 14 de agosto,-emC:hatauqua, Nova lor- nacionais.Ao início de seu Govêrno,não teria Roosevelt,com
que, êle relembra solenemente
sua declaraçãode 4 de março o seu brazh /rzlsf, pensado em algo nesses têrmos para sua po-
de 1933, de que "no domínio da palírüa 'llzm/düZ, desejaria lítica mundial?
dedicar esta nação a política .do bom vizinho -- o"vizinho quc
resolutamente se respeita a si mesmo e porque assim fm. res- Um curiosoinquérito mandadofazer, no curso de 1939,
peita os direitos dos outms -- o vizinho que'respeita suas'obri- por várias regiões dos Estados Unidos sabre a política a seguir
gaçoese respeitaa santidade
de seusacordosem e com um La América Latina em relação à guerra que estalavana Europa,
mundo de vizinhos". Já foi por diversasvêzesassinaladoque a traz respostas muito reveladoras dos sentimentos am-ericanos a
famosa política do bom vizinho, ao ser definida, se destinava respeito. O inquérito. é organizado por Estados e em cada um
ao mundointeiro e não propriamenteaosvizinhosdo sul. Diri- dêlesum comitêo dirige. Os resultadosdo inquérito foram pu-
blicados, em publicação oficial, ao que parece, num opúsculo,
gia-se à Rússia, .talvez,.em primeiro lugar, com quem reatava as
relações.djplopáticas de seu país, interrompidas desde a revo- Some Regia/zaZríewi oiH our I'orelgpz Políclei, sem data. Na ques-
lução, cheio, aliás,de esperançasde que se lasso entendermuito tão estratégica, o conjunto dos Comitês, segundo Chamisso que
bem com o Kremlin, ta:ntono domínio político como no das dá a informação,põe o acentona Doutrina de Monroe, torna-
relações comerciais.xNa realidade -- agora o vemos -- um da "multilateral" depois da declaração de 1936, destacando a
idéia de que "a proteçãodos EstadosUnidos não está asse-
! O Expert-lmport Bank foi, como se sabe,fundado em 2/2/34. Tor- gurada apenas em suas margem?". (Comitê .de Nova lorque)
nou-se o organismo mais importante para os empréstimos governamen- O de Des Moines precisa: "Os Estados Unidos são vulneráveis
tais. Visavaa suprir os investimentos
prlyados.retraídos.A lei que o pela América L,atina.. O Mar.das Caraíb-as.é a nossa fronteira
criou o destinavaa prestar assistênciaao financiamento das importações mais fraca. A Doutrina de Monroe exprimiu um interêssecla-
e exp.ortaçõesdos Estados Unidos, em geral. Não tinha nenhum vínculo
ramente percebido que pão se torna menos vital hoje". Quanto
=BB:lH«ZB$=$eZ''
W#M
ras de créditos o desenvolvimento do comércio russo-americano, sabre o
aos materiais estratégicos, outro comitê (de Saint Louis) assi-
nala haver ainda muito que fazer para "animar as naçõessul-
americanas a produzirem mercadorias-chaves para as quais uni
qual os Estados Unidos punham muitas esperançasdesde o seu reconhe-
cimento do govêrno soviético". A 13 de março do mesmo ano, um mercado poderia ser encontrado nos Estados l.Jnidos". E se
segundoExport-lmportBank foi criado para o comérciocom juba. citavam, naturalmente, a borracha cultivada em substituição à
Em .junho seguinte, êste último banco é aiitorizadu a estender suas traí.
sacões com todos os países, salvo a Rússia. Já em 1936. em conse- do Extremo Ode:nte e o estanho da Bolívia para substituir o da
qüêricia do fracasso das negociaçõessabre as dívidas russas. os dois ban- Malária. Em relação ao problema financeiro tratava-se de "com-
cos são reunidos num só, com a liquidação do segundoe se torna o im-
portante estabelecimentoque é hoje. Que era nas origens um estabele- binar a política dos empréstimos com a ideia de deseltvalvimenlo
cimento bancário de funções especiais,não há dúvida. O comércio da dos recursos da América Latina utilizáveis os Estctdos Unidos
Rússia é uma função estatal como qualquer outra. Era natural que Wash- O grupo de Nova lorque, ao parecer o mais sofisticado dêles,
ington pen:asse.em criar um instrumento de comércio szzigenerís, tam-
bém .estatal,.embora com métodos operatórios e finalidades capitalistas. preconiza: "Os riscos precedentemente a cargo dos banqueiros
Era êle um instituto novo de um capitalismo de Estado que se ia desen- ltmericartos serão suportados pelo contribuinte americano. Isso,
volver, enormemente,no curso dos anos. O capital dêle provinha de
outra organizaçãoestatal, a Reco/z.çfracfíoH
Fina/zceCorporafíon; sua di- tido ao Congressoe aprovado pelo presidente.Sua função essencialcon-
reçãoé de natweza governamental,na qual o Departamentode Estado siste de fato no financiamento das importações de um país estrangeiro
e. outras agências.federais estão representados. O banco estava e está provenientesdos Estados Unidos e, então, o transporte das mercadorias
a,serviço da política .económicaamericanaque o Estado aprovar. Êle americanas
tem de ser feito em barcosamericanos.
O mecanismo
e
não emprestasem o beneplácitodo govêrno. Seu orçamento é subme- funcionamento de um banco russo não é muito diferente.

92 93

l
lum certo sentido, é um compromisso e,tttre o canjtqljsmo nr;],n
do e o capiMlismo de Estado") ' ' ' ----''''- t'''-"' gravemente e sua .balança de pagamentos, em conseqüência. Sù-
bitamente, a América Latina se via sem os seus mercados eu-
ropeus tradicionais, mercados ande comprava, mercados onde
vendia. Os Estados Unidos, sòzinhos, tinham de comprar e ven-
der o que ela sempre comprou e vendeu na Europa. Sob pena,
ou de a América Latina merguhar no caos e Da ruína, ou
de passar-separa o ou os inimigos dos EstadosUnidos: o Ja-
pão, à espreita, a Alemanha, apesar de a braços com um
continente a ocupar, organizar, digerir, etc
Na guerra, os problema-seconómicos -- não se pode dizer
que desapareçam-- mas deixam de ser preponderantescomo
tais. A economia é politizada. Sendo politizada ou, sobretudo,
"política", deixa de ser privada. As grandesguerras modernas
fizeram mais para politizar as economias privadas nacionais, fi-
zeram mais danos à expre-suãomáxima da economiaprivada, que
é o capitalismo, que tôdas as manobras, propagandas socialis-
tas e comunistas reunidas.
A Alemanha, na Primeira Grande Guerra, sitiada, sufoca-
da pelo bloqueio naval britânico, tornou-seum capitalismode
Estado que fêz milagres de organização, de planejamento no uso
de recursos limitados para uma utilização máxima; de prodi-
gioso esforço produtivo através de uma rev-olução tecnológica
pais e nâs fronteiras periféricas e extracontinentais. Havia tam (a hidrogenização do carvão) sem equivalente nos outros países
bém que. livra-las de lodos os inimigos, potenciais ou reais. Tâ- adiantados e que a dispensou parcialmente das fontes de maté-
ua e qualquer outra consideraçãodevia estar stlbordinada àquele rias-primas naturais das quais estava militarmente afastada; com
extrema racionalização do consumo inclusive alimentar, manteve
n" ls;' upli:: eA!!ÊP? ot;'ig'çõ9. d.; E;àà;''Ü;ii='1=1; seupovo nutrido durantevários anosde bloqueio, a ponto de
de ordem política ças aoalxo deles: üe ordem económica, causara admiração
e a invejade Lênin que a tomoupor pa-
drão quando se viu, depois da vitória, com uma Rússia em situa-
ção económica semelhante à da Alemanha sitiada, as frontei-
ras invadidas, a fome no interior com a guerra civil e o bloqueio
externoinflexível até para deixar passaros recursosmédicos
mais cunezinhos. Sem a guerra, a economia capitalista não se
teria modificadoe, nas circunstânciasdadas,teria perecidoou
se transformado "em seu contrário", ou em um modo- econó-
mico público, coletivista,' socialista, em suma. Foi pela guerra e
com a guerra que, no interior de suas fronteiras, o Estado pôde
A guerra agravou em geral essas mazelas e, de repente, intervir, forçar os investimentos lá mesmo onde só iam quando a
como vimos, desequilibrou$ua balança comercial ainda mais rentabilidadeera alta e assegui'ada, controlar mercados,estabili-
zar preços, abrir novas fronteiras à produção e i:ecomporo poder
l Obra cit. pág. 8.
público -- nas democracias-- com certa participação da classe
95
trabalhadora, como contrapêso à exce-ssivapredominância nêle edifício parece começar a dar sinais de fenda. Se assim é, terá
das oligarquias do dinheiro, dos trustes e monopólios. Formas provado que se destinava sobretudo às tarefas da reconstrução
mais ou medos democráticas,em maior ou menor grau, de após a guerra.
capitalismo de Estado nos Estados Unidos e Grã-Bretanha e to- ' Entre 1929 e 1939, êssesprocessos não estavam senão em-
talitárias na Alemanha, foram os modelos mais generalizados, brionários. Enquanto os países capitalistas se debatiam nas mais
embora, ante.sde qualquer projeção, resultantes empíricas da diversas formas de depresuão, desemprêgo, ensaios de reformas,
evoluçãode acontecimentose situações.Foi a guerraainda que contra-reformas, convulsões políticas, a Rússia, através sacri-
permitiu, depois dela, na luta pelo pleno emprêgo, alcançar-se fícios sem nome de seu povo enquadrado e at:rrorizado, construía
em suas diversas modalidades o chamado "neoliberalismo" na por toda parte milhares de fábricas e urinas, mmpia canais, des-
conhecia o desemprêgo, explorava minas e florestas na região
Europa (a Alemanha) ou "neocapitalismo" americano.i Aquêle
polar(inclusive, no auge da era staliniana: pelo trabalho for
l "A economiacapitalistado após-guerradeu prova de uma vitali- çado) , elevava aos saltos suas forças produtivas, criava a-sba?es
dade e de uma elasticidadeque o marxismo jamais previu. Lukács nacionaisde uma nova economia,um Dava modo de produ-
escreve, em 1923, que a crença na possibilidade' de um' domínio cons- ção, fundado, intànsecamente,nomlativamente, no plano. e na
cientedo fato económicoera um dos aspectosda falsa consciência
da
burguesia. Ora, êsse "domínio consciente" está em vias de efetuar-se. propriedadepública dos meios de.produção Para o mundo in
O economista capitalista não se encontra mais na posição do "especta- leira, amigose inimigos,a experiência
de uma economia
não
dor importante" .diante das leis de aço da economia que apareciam competitivamas de piano, sem apropriaçãoprivatlsta dos meios
como leis naturais: uma verdadeira praxis sócio-económicaexiste dora- odutivos essenciais sem .o móvel normativo do lucro privado,
vante independentede toda intervençãopolítica do proletariado. Que era algo inédito na história social e cultural .da humanidadee
esta evolução -- feliz em seu conjunto -- tenha sido poderosamente
estimulada pelo desafio do campo adverso, é provável, mas isso não a hipótese não sàmonte sobrevivia como resistia a t(Elos os con-
meda grande coisa à sua significação. Em conjunto a economia capi- tratempos, funcionava e chegava a crescer em forças e acumular
talista do pós-guerra é me/zoi cofsí/içada (reificada) que a de outrora riquezas.'
e esta diminuição da reificaçãc económica constitui a nosso ver a Os capitalistasdo mundo inteim se viam jogadosna defl3n-
principal justificação sociológica do emprêgo do têrmo de neocapf/a-
/limo". ('4rgwmepzr, n.o 25-26, 1962, Joseph Gabf], ]b4arxfsme ef 'Dy-
lzamfq e de Grozlpe, pág. 128, Paria.) Em Sacia/ísme ef Barbárie. D.o
32, 1961, Paul Cadran, num magnífico ensaio sabre l,e mozlvemení
révolzdion/zaíre sozis /e capífalísme mover/ze, assim o descreve: "A luta
operária no plano económico exprimiu-se sobretudo pelas reivindica- l Isso não significa que tudo o que se fêz na Rússiaestavacerto ou
ções de salário, às quais o capitalismo opas uma resistência encarniçada era inevitável . Corifeus e epígonos podem, còmodamente, de fora do
durante muito tempo. Tendo perdido a batalha nesseplano, êle acabou processo, sustentar' tal posiçãol que lhes tranquiliza a. consciência. Os
por adaptar-se
a uma economiacujo fato dominante,do ponto de vista russos mesmosque, dentro do' país, viveram o' terror staliniano, conhe-
da procura, é o acréscimoregular da massados saláriostornada base ceram a miséria, não pensamdêssemodo. )qem tampoucol naturalmen-
de um mercado constantementeampliado de bens de consumo. Êsse te, as vozesoposicionistas,
leaisao regime,à hipótese
comunista
ou
tipo de economiaem expansão
em que vivemosé, no essencial,
pro- socialista até ; morte, tôdas elas liquidadas, fisicamente, nas. eras. do
duto da pressão incessante exercida pela classe operária sabre os sa- 'culto' da pergbnalidade", e não moral ou ideologicamente.. À lucidez
lários -- e seus problemas principais resultam dêsse fato. .. Assim, revolucionária, marxista 'ou científica, se devem algumas das críticas
(e também em função de outros fatâres) depois de ter resistido muito maispertinentes,e feitas a tempo, aos erros.da política e.do regime,
tempo à ideia da intromissão do Estado nos negócioseconómicos(con- com soluçõesreparadoras;de terem sido ouvidasentão: muitas das de-
siderada como revolucionária" e "socialista") o capitalismo chega fi- formações,'desastres,denunciados muito depois nos altos círculos di
nalmente a adotá-la, e a desviar em seu proveito a pressão operária regentesdo Partido, teriam sido poupadosao povo russo.e à .própria
co/zfra as çonseqüências do funcionamento espontâneo da economia, hipótese socialista. ' Os stalinistas' de' outrora, . os comunistas de hoje,
para instaurar, através o Estado, um controle da economia e da so- estão convidadosa estudar o passadosoviético com olhos de hoje,
ciedade, servindo em fim de contas seus interêsses". (Sacia/íxme ef experiência de hoje, consciência' limpa e objetiv-idade. É a condição
Barbarfe, pág. 93. ) da vitória do socialismo.

9Ó 97
entre êsseshomens do alto grupo social a que fizemos menção
que, de volta, ainda em 1937, de uma excursãoa negóciospela
América do Sul (quando organizou uma Companhiade Desen-
volvimento na Venezuela, para ."mostrar, pelo exemplo, as pos-
sibilidades de desenvolvimento agrícola e industrial do paí-s"),
submeteuaos círculos chegadosà Casa Branca idéias sabre "um
programa interamericano de desenvolvimento no qual o Govêr-
no e os negóciosprivados fossem partes".x Em 1940, volta o
jovem Rockefeller a suâ idéia; desta vez o presidente vai trans-
forma-la em ato e o chama a executa-la.
O papel do Escritório do Coordenadordos NegóciosCultu-
rais e Comerciais Interamericanos foi considerável durante os
os anos de guerra. Os itens principais de seu programa eram:
1) auxílio direto às Repúblicas americanaspara aapacifá-Zasa
preservar izla es/abíZ;dado ínrerna; 2) reduzir as necessidades de
câmbio externo das Repúblicas latino-americanaspor meio de
um ajuste de seus serviços de dívidas à sua capacidade de paga-
mento, e isso até poder-se empreender uma a/ívüade desahvaZ-
vímenfisfa izzscefíveide aumentar a capacidade de fazer frente
a obrigações
financeiras,
antigas
e novas;3) utilizara Co-
missão Interamericana de Desenvolvimento para estimular o co-
mércio e.ntre as diversas repúblicas, desenvolver-lhes os recur-
sose prestar assistênciaà suü induxstrialização,
por meio de em-
présfí#zoi a Zango preza, e ''harmonizar.o pessoal e a política
ou publicidade das diversas agênciasoficiais encarregadasde ob-
l jetivos de de/esa do /zemísféria''.a O fulcro de suas atividades era
a ''defesado hemisfério".Mas anteshavia que atendera pro-
blemas económicos e financeiros muito mais imediatos da Amé-
rica Latina. Assim, a necessidade
prementede créditos.Estes,
porém, na circunstância, de onde podiam provir? Do Govêrno
americano. nata.ralmente. E foi um dos empenhos imediatos do
Coordenador. junto aos círculos competentes de Washington.
Outro problema imediato que se Ihe apresentoufoi o do blo-
queio inglês, desde a declaração de guerra em setembro de 1939,
ao comércioda Alemanha,que agravavaa questãojá crónica
dos excedentes. O Coordenador teria sido, então, como uma
espécie de procurador dos países latino-americanos junto aos
1 Ver Chamisso, obra citada,pág. 135.
2 Relatório da História do Escritório do Coordenador dos Negócios
/nreramerfcan'oi, Washíngton, D. C., 1947.

99
meadospor êle e outros. Em 1941, dá-se nos meios fina-nceiros
um fato extraordinário: o primeiro empréstimoprivado de um
banco americano a um pais latino, a :V'enezuelã,desde 1920-
1930, a era das orgias financeiras de que já falamos. O Natio-
nal City Bank of New York é o bancoque interrompeo re'
traimento, emprestando dez milhões de dólares para atender às
dificuldades conseqüentesa um comêço de queda nas exporta-
ções do petróleo daquele país. (A fonte da informação é John
Gunther, /mija l,afim .4merlca.) Em compensação, no mesmo
ano se dá outra surprêsatalvez ainda maisisensacional:o Ex-
pert-lmport Bank ab.reum crédito de dez milhões de dólares ao
México para a construção de seu trecho na Estrada Pan-ameri-
cana e ainda anuncia sua disposição de atender a outros pedidos
de crédito mexicanos, desde que garantidos pelo Govêrno do
México. Que houve? Qual o motivo dêsseliberalismo, dessaque-
bra da norma por parte do Tesouro americano? O caso- dcu
muito a comentar, e Bemis ('l,a://n .41nze/k'unPoZicyof l/ze t/.S.,)
assim o faz: ''Um b-anco quase oficial dos Estados Unidos em-
prestou dinheiro do Govêrno a um Govêrno (estrangeiro) do
qual nenhum banqueiro privado individual teria sonhado em
comprar os títulos, depois das espetaculares 'impontualidades'
(]o México."
O caso era realmente extraordinário. Emprestar dinheiro
ao México depois das expropriações das companhias de petró-
leo, três anos antes? Bemis tinha razão em seus comentários.
lulas. . . houve condições prévias, postas por Washington, a se-
rem preenchidas. E o foram. Chamisso escreve: "As agências
oficiais de empréstimose o Eximbank em particular não foram
menos reticente-s de comêço por motivo das dívidas em falta e
das expropriações,de que tantas queixashouve na décadapre-
cedente.O Méxicotevede passarprimeiramente por um frafa-
do com os Esfcadost/nados(l de abril de 1941), cujas ratifi-
caçõesforam ràpidamentetrocadasa 25 de abril; basesnavais
e aéreasforam concedidasaos Estados Unidos."i O caso das
expropriações foi resolvido parcialmente. . . depois do tratado
e dos empréstimos assegurados ou "justamente três semanas an-
tes de PearlHarbor". acrescentao mesmoautor, isto é, a 19
de novembro do mesmo ano.

l Obra citada, pág. 180


r'
ma: "Esta Conferência e as Comas-iõesfornecem um canal par- 11

ticularmenteefetivo para fazer intervir a participação direta dos


negóciosprivados no progresso económico da hemisfério". Cor-
dell Hulli Na formulaçãodos planos de desenvolvimento eco-
nómico depois da guerra "é altamente desejável que o-srepresen-
tantes dos' negócios privados e dos interêsses financeiros das
repúblicas americanas se consultem (sfc) reciprocamente sabre
as soluções importantes e façam conhner suas opiniões aos Go-
vernos e de um modo geral'ao público. . ." Nelson Rockefeller
diz: é preciso "i raiz r um quzadra de frabaZ/zo inferamerícalzo
no interior da qual t(Mo }iomem de negóchs tdlüa possibilidade
de opera' com estabilidade, segurança e corÚiançaJ':
O mesmoautor que descrevea Conferênciae do qual ex-
traímos as passagensaqui transpostas comenta: "E].a deve pois
esforçar-separa fazer sobreviver a cooperação econõmic! numa
atmosferade risco e de iniciativa.'l E a propósito cita Warren
Pierson, Presidente do Eximport Baiik, falando em nome de
JesseJones, Secretário do Cohiércio, nesta frase expressiva: "A
transposição repousará essencialmente na iniciativa dos homens
de negócios para 'retomar a bola'." Entre os vários delegados
falaram,' o Sr. Valentim Bouças{ pelo Brasil, .assinalou,de
passagem: "No curso dêsses anos, a indústria dos Estados Uni-
dos se virou como nunca dantes para os recursosmineiros do
Brasil, do México, dos paísesandinos da América da Sul e
de Cuba". Um Sr. William Benton, vice-presidente
da Univer-
sidade de Chicago, depois de uma tirada retórica, segundo..a
qual a guerra total de'1939. produziu o. mesmo efeito de.soli-
dariedade da declaração de independência de 1776, reconhece,
satisfeito: "A política de boa vizinhança pagou". E como! Para
o Sr. Warren Pierce,falando aindacom entusiasmode seuspa'
res, sem a vitalidade, a experiência, a competência técnica das
etnprêsasprivadas de negócios que serviram de base:.o finan-
ciamentoe a.direção governamentalnão teriam podido asse-
americano e coroadas por uma Comissão Interamericana de De- gurar uma mobilização tão intensiva." Em meio a todos êsses
hosanas à emprêsa privada e às bonemerências patrióticas dos
homens de negócios, uma voz pequeno-burguesa, simpática : po-
pular na vasta cidade de Nova lorque, de que era Prefeito:
La Guardiã, se ergue para levantar a questão que todos tinham
por trás da'testa:' 'Deve-se voltar à concorrência do tempo da
l Cit. de Chamisso, obra citada, pág. 276
/02 /03
paz?" "Assim se deve !rer", observa Chamisso, "pois que Rocke- prêsa privada seja encorajada a empreender e continuar o de-
feller põe o acento do desenvolvimento na tarefa essencial da senvolvimento eéonâmico' dos países do hemisfério ocidental;
iniciativa privada e dos homens de negócios".x Subentend-e-se, 3) que em princípio os governos não entRm em concorrência,
todo mundo estáde acordo: o investimentoprivado na América de maneiradireta ou indireta, com a empresaprivada, a menos
Latina vai prosseguir.E o próprio RockefeÜer,em tom de de- que uma tal ação seja claramente necessáriano interêssepú-
safio, pergunta: "Deveremos nós concordar que a necessidade blico; 4) que os governos aócdrüa/zemsida: arar :õei comerciais
de cooperação interamericana passe com a derrota da Alema- do tempo de guerr.a e Os corbWõles, tão ràpidamente quanto pos-
nha e do Japão?" Claro que não, a América Latina ainda peleja sível, em conformid(üe com o interêssepúblico. Na questãoca-
com problemas imediatos -- que são, aliás, os permanentes. Mas pital para corporaçõescomo a Standard Oil of New Jersey,por
agora .há realmente alguns novos, criados pela guerra: readap- exemplo, esta recomendaçãoda Comissão dos Recursos Petro-
tação.industrial, término dos contratos de guerra e a eterna ins- lífems: 1) que animem uma política de sísfêncla mzí/zza (?) .e
tabilidade monetária. Os contratos de guerra feitos entre o Go- de cooperaçãcp
no desenvolvimentodos depósitosde petróleo do
vêrno. americano e os diversos países produtores de materiais hemisférioocidental,etc.; 2) que uma tal assistência
e coo-
estratégicos estavam a terminar. Vão prosseguir? Por que subs- peração seja tornada efetiva por in/ermédia de zzm/annecímelzfo
tituí-los? Os capitais estrangeiros,por sua vez, têm problemas de capital, colaboração técnica, tttaquinaria e equipamentospata
de reinvestimento:Volta-se a falar na conferêncianos proble- fazer explorações em campo, perfurações e exploração comer-
masde desenvolvimento a longo prazo: para tanto é preciso o cial das poçosde petróleo. Em outra resoluçãosabre "produtos
estímulo à iniciativa privada por parte dos Governos, etc. Tra- sintéticos" há um curioso parágrafo 3 : que as instalaçõesjá exis-
tando dos meios para oblter aquêle resultado, a Conferência re- tentesno interior ou no exterior das Amériças, postasa funcio-
clama, antes de tudo, que se crie a devida "atmosfera". Esta. nar pelos governos, se não forem abandonadas ou empregadas
com efeito, como já assinalavaSchumpeterem 1942, num es- para outros usos ou guardadasem reserva DOinterêsw da defesa
tudo sabre CapífaZfsmín f/ze Posfwar }l'orM, estava faltando e bacianal, não sejam abandonadasa interêssesprivados; mas que
sem ela minguavam os incentivos e o senso das responsabilida- se essasinstalaçõesforem vendidas ou alugadas, os preços e
dese sobretudo
a basenecessária
à sua liberdadede ação.O condições deveriam ser suficientes para não constituírem, direta
tempo, com efeito, não estavaclaro na América Latina para ou i.ndiretamente,um subsídioem favor do comprador ou arren-
novas atividades dos homens de negócios americanos. Ao têrmo datário, em detrimento dos interêss-esprivados na exploração dos
da guerra as esperanças da América Latina não estavamnas ar- recursos
do soloe do subsolodos paísesamericanos".
No que
quiconhecidasiniciativas dos capitais privados dos Estados IJni- diz respeito à energia hidrelétrica, ã resolução Xlll recomenda
os "encorajar a iniciativa privada (em grande parte. estrangeira) ,
fazendo-lheconcessõese facilidades adequadas"e "regularizar as
Segundo a ata final da Conferência,: na Resolução 11, sabre taxas com o fito de proteger o consumidor e permitir uma renda
NOVTQS
indústrias, expansão ou ajustamento das exbtentes. re- satisfatória ao capital investido". Quanto a Ã4é/aços de ízzvesfí-
comenda-se"a criação das condições de bme eco/cómicae po- menZO,recomendaa Conferência "a participação conjunta do
/íríca. que estimulem. a iniciativa individual e a emprêsa privada capital estrangeiro e capital doméstico no desenvolvimento de
em livre conconência na indústria e no comércio. . ." Sabre o todos os tipos de emprêsas".Em relação a FacíZfdadeie Condi-
quarto item da lidem do dia -- Empresa privada e operaçõesde ções de crédíío, Dum item se recomenda que "a extensão do
Gavén'zo -- a resolução aprovada recomenda: 1)- que a em- crédito governamental,exceto lá onde o interêssepúblico es-
tiver em lago, seja confinada aos domínios não convenien.tespam
1 Obra citada, páS. 278. o capital'privado ou por êle não servidas".Uma resoluçãoXVI,
2 Ver Chamisso,
obra citada,pág. 541 e seguintes, que transmite sõbie Igualdade de tratamento do investimento estrangeiro, re-
os textos oficiais, em francês.
comenda endossar-seo princípio da igualdade -de tratamento dos
investimentos estrangeiros e domésticos em seus respectivos paí- nacionais, na solução dos problemas resultantes da acumulação
ses e.que êsseprincípio wja melhor tratado pelo Governos, dc de exce(lentes de produtos nas naçõ.es americanas; nos acordos
maneira prática e efetiva". Naturalmente a E.;fabiZ/caçãomone- internacionais que' possa ser necessário concluir. . . tomem em
fárfa foi objeto de.uma resolução que pede uma sã política fiscal consideração os interêsses dos consumidores e com êste objetivo
e políticas financeiras e comerciais que conduzam à /2mnu/eWão eH vista,'dêem ocasião completa (?) aos países consumidores
da ei/abf/Made eco/zó/Mca, à eií.abí/izaçãa monefárla e à eZI/zzinia- de participarem de tais acordos e que. . . um acordo internacio-
=ão 110mais curto prazo possível das barreiras comerciais e dns nal concluídonão seja limitado às naçõesamericanas,ma! in-
discriminaçõescontth o capital estrangeiro''. Cantrâle {le câm- clua os países produtores e consumidores através o mundo"
Z)ía: ":.. os governos americanos adotem medidas cooperativas Aqui, a pressão'latino-americana sabre os representantesnorte-
entre êles e com outros governos, no domínio da estabilização americanosestá evidente na redação que procura acentuara
monetária que reduzirão a necessidadede controle dos câmbios defesa do consumidor.
e das .transações comerciais correntes; mas se se provar ser o No encenamento,há um voto de louvor a Nelson Rocke-
controle inevüável como expediente temporário, então deveria feller e uma mensagem ao Presidente dos Estados Unidos em
ser administrado de maneira não discriminatória, de modo a que os homensde negóciosde toda a América Latina ali reu-
permitir. o maior desenvolvimentopossível do comércio inter- nidos na defesade seusinterêsseseconómicos, ao têrmo da gue'-
nacional". (Já sabemos o que isso significa) . Seguros: Resolução ra, declaram: "Sentimos, Senhor Presidente, que foi.uma ocasião
para pemiitir, "dentro dos quadros kgais de cada país, 'às única na nossa história transformar em realidade viva e perma-
companhias de seguros privados de cada uma das nações ame- nente a união psicológica,ecoDâmicae moral que um perigo
ricanas efetuarem seus negócios de seguros no interior de to- comum criou''
das..." Barref/u: comerciais: "Redução rápida e eliminação Issofoi em maio de 1944, em Nova lorque. Em agostode
das bateiras comerciais, aproveitando-se a ocasião excepcio 1962, em Punta del Este, no Uruguai, .todos, dirigentes do "he-
nal que se oferece (?) para uma tal ação, na reorganiza- misfério" e também homens de negóciosse reuniam para pro-
ção geral do pós , sabre os problemas económicos; os clamara mesma"união psicológica,económicae moral (1.) qua
Governos americanos reduzam as tardas ou taxas . . . se abste- um perigo comum criou;' e "a ocasião única na nossa história
nham geralmente do uso de quotas, uma das práticas mais des- de transforma-la em realidade viva". Nada mudou, como vemos.
truidoras do comércio,se abstenhamdo uso das taxas de ex- O tempo corre, os anos passam,a situação muda,.os homens.são
poüaçãa" , etç. Preferência comerciais e discriminações: '' . . . as outros, os problemas, porém, que atormentam a América .Lalini
são os me1lmos.Por quê? Porque os interêssesinvestidos que os
relações económicas entre as nações americanas devem ser ba-
nutrem, mantendo-os'insolúvel, são os mesmos, hoje, que eram
seadasno princípio do tratamentode naçãomais favorecida,in- há vinte anos.
condicional e não limitado." Prémios: ". . . os Governos ameri- A conferênciaoficial de homens de negócios,de cujas re-
canos. . . eliminem tão cedo quanto possível os prêmios diremos soluções acabamos de fazer um extrato, não. tara da iniciativa
à exportação. . . " Resolução Xi)(XV -- Camércb de Ex/ado: dêles. A da ilaiciativa dêles foi outra, reunida quatro dias an-
"Que os Governos americanos evitem o esfabeZecime/zfode em- tes. tambémem Nova lorque, provàvelmenteno mesmolocal,
prêsai do .Ex/tidopara a condução de seu comércio e que as enti- entre4 e 8 de maiode 1944-- a reuniãodo Cansei/zo
/n-
dades govemamentais ou semigovernamentais sejam guiadas -- reramericarzo de Comércio e Pradtzção, organização privada
em caso de suas operações caírem, apesar de tudo, no domínio dos homensde negócios,fundada em Montevidéu a 25 de maio
comercial - por considerações comerciais. . ." (Boa medida)
de 1941. Naquele a:nojá longínquo, na reunião de sua funda-
ção, o delegado das associaçõescomerciais e de produç?o dos
Finalmente, mais uma vez, os Co/zvêníosióbre excede/tias.de Estados Unidos, Sr. James Kemper, ex-presidenteda Câmara
produção: "Os Governoscooperem,por meio de acordos inter- de Comércio americana e então presidente da Lombermans
i06 /07
Mutual Casualty Company de Chicago, falando aos delegados de circunstância estabelecidas pelas condições excepcionais de
presentes,lançou as,,oito bases "de uma ação unificada para guerra". O Conselho recomenda: "Nq pr.oteger senão as .in-
todos os .americanos ',. representantes do mundo" dos negiilios dústrias de vitalidade suficiente", etc. Quinta questão -- /Pzfer-
do hemisfério ocidental. Entre as .banalidades costumeiras, pre- venção da Ex da: "Limitar a ação .das agências governamen-
servação das soberanias?independência, prosperidade, paz, etc., tais; soltar progressivamente os obstáculos ao comércio estran-
uma aiz: "Queremosseja mantida,e preservadaa iniciativa pri geims. . . volta à emprêsa privada. . reforçar as organizaçoes
fiada que.já provou ser de benefíciomáximo para o máximo dos homens de negócios"
de indivíduos e outra assim: que "o povo e nao"o Estado seja Vemos aqui o paralelismo. dos problemas e .das soluções
o mandante. supremo'. (Teleg;amas de Montevidéu ''e Nova oronostas pela homens de üncgúios em sua associação privada
lorque, dando conta da inauguração da nova entidade, no Cor- e na reunião da Comissão Interamericana de Desenvolvimento.
reio da ]14an/zã
de l de junho de 1941). Pois em maio de 1944
ela se reunia em assembléia plenária para tratar prèviamente
dos assuntossabre os quais a outra, a oficial, ia deliberar no
dfa. iegziin/e ao do encerramento de seus trabalhos. Essa assem-
bléia, realizada por proposta do delegado americano na reunião
da Comissão Executiva do Conselho Permanente da mesma
associação,em Montevidéu,l tinha por tema Propor/iões Eco-
nómicas para o Hemisféría Oc;denfal. Eis uma súmula das re-
soluções que iriam se.r aprovadas na outra assembléia. ccm
'-' ''' '
vençãodoEstadoeco m .. liberdade. franca
. dos
.,.. capitais
. ---....estran-.
pequenas. diferenças redacionais. Para atender ao jogo diplo-
mático: O plano da CYcip propõe à reunião oficial: 'Primeira geims investidos no petróleo.e minerais .metálicos, em geral, e
questão -- U/í/lzaçãa doi reczzrsos nafarais: "0 progresso nos outros ramos de produção monopolizáveis. . .
económico depende, em sua base, da descoberta e utilização No domínio das .relações com a América Latina as coisas
dos ]'cursos naturais. . . É apropriado acelerar a continuação parecem marchar a. ?ontento,dêles. Estão dirigindo o rumo
ordenada e sistemática de uma tal prospecção e investigação, dos governos, especialmente, é claros do Govêrno norte-ameri-
completamente independente das circunstâncias fortuitas ' da cano. Tudo parece marchar na direção que.querem. Com efei-
guerra. . .. O .govêrno deve dar sgu apoio: . . e evitar a explo- to, ao cabo da guerra, como ver-amos,as .soluções.que propõe.nl
ração malevolente dos recursos de base de uma nação. . . 'to- sao as que o Govêrno am-ericano vem defendendo nas múlti-
mar disposições convenientes para a conservação da riqueza plas reuniõesem todos os escalõesinteramericanosque se 11:a-
nacional. . . O Conselho recomenda. . . preparar (com parti- lizam. cada vez mais amiúde, um pouco por todas as capitais
cipação prepondethnte dos interêsses privados ) -unnl 'ptag:ama latino-americanas e de preferência em seus lugares de veraneio.
para. . . 3) exploração e desenvolvimento da-s I'eservai dé car- No plano, porém,'das relações internas nos Estados Uni-
vão e petróleo; 4) exploração e desenvolvam-ento dos min.orais
metálicos." Entre Recorre/z(Zaçõei anzexas está -- "Atração do
capital estrangeira". Segunda questão -- Os pub/amai
dúsfrias ma/zu/afzzreirui: " . :. Êsse
dm f.u-
desenvolvimento (indus-
;H$%ã='ÜMÇ:ÜIZUWH
:::tu'" sma do Es-
trial) tem seuslimites; é preciso fazer uma distinçãoentre os
países capazes de um estabelecimento nor/zmZ e as indústrias
ãÜ=âÊiÜ:13.!T=.i.e:=:e=S:?!"W3
É que nessa revisão os problemas políticos e estratégicos conn-
nuam a pesar nas altas' cogitações oficiais. Ao mesmo tempo,
- Vet La Conferenciade Montevideo) el Cumplimientode sus Reco- internamente osl trabalhadores 'ollganizados em seus sindicatos
nze/zdacío/zei, Montevidéu, 1944, pág. 312. continuam pretendendo dar também sua palavra nos Conse-
/09
lhos do Estado. O m(M i vive/M/ entre b;g Zpzziílzexs,
aparelho alta direção do Estado, desde a crise do regime em 1930 e a
subida de Roosevelt, quando começou a se processar a trans-
sindical e burocracia do Estado só foi encontrado -- para
funcionar depois da guerra -- na administração Truman. Tan- formação do Estado americano de. um c]ássico Estado ]it»ral
to é assimque, se quanto à política económicana América La- em um Estado imperial, atuante, intervencionista,.reformador.
tina os homensde negóciossaem das conferênciasoficiais mais De um ponto de vista político imedialista a transíormaçijo:lo
ou menos satisfeitos, com moções de aplausos e de satisfação,
fêz às custasdo alto capitalismoque resistia ao .New.Dual,
quanto aos EstadosUnidos mesmos,ainda em novembro de identüicado política e socialmente' com a época. do liberalis-
1946, meses depois de Nelson Rockefeller deixar a esfera pú- mo: não se :onformava em perder o poder.absolutona usilla
blica, com a dissoluçãode seu Escritório de Coordenadordos e na fábrica. Por sua vez, ;a' mudança'havida no aparelho es-
Negócios Interamericanos, outro arando homem de negócios, tatal requeriauma nova camadade burocratas,.de técnicos,de
provàvelmente seu amigo ou pelo menos intimamente a êle li- políticos novos. Eleito contra.a vontade dos.altos grupos finan-
gado pelos elos dos interêsses pessoais comuns como associa- ceiros e capitalistas,Roosevelttrouxe com êle toda uma equi-
dos à mesma emprêsa, o Sr. Leo Welch, tesoureiro da Standard pe de professâresj economistas,. políticos, .etc:, Precisamente
Oil of New Jersey,em discursoaos homens de sua grei, falava
outra linguagem. Com efeito, na convenção nacional do Comér-
cio Exterior,a 14 de novembrode 1946, traçava-se,
afinal, man. Welch reclama o lugar eminente.perdido de algum modo
uma política para a classe: "0 dirigente sindical, o político
liberal, o propagandista de esquerda subsf//uíram o #o/nz-emde
com a crise e a guerra :l- ou a crise em seu.ponto máximo
-- ao apartar-se a fim de que a seu lado se instalasse. uma
negócios e sua inttuêmcia no avanço das coisas, aqui, no plano
burocracia técnico-político-sil;tíical em terno do Presidente.
ZocaZ,da teima moda qzfe lzo ex/Criar. . . Em nossa busca de
Com toda a coerênciade pensamento,Welch tira.as con-
soluções para o capital norte-americano no exterior, comece-
mos no p/aria ín/er/zoe elejamoscomo primeira passo a reori- clusões''edita a políticaa seguirpelosseuspares:"lstó im-
entação da mentalidade e dos objetivos do homem de negócios
norte-americano
para que reassumeo lugar que Ihe cones-
ponde por direito na vida social e política, assim como na vida
rconâmiça de nosso país".i narto dos empregadores, de oferecer essas possibilidades a seus
homens mais'dwtacados(Nelson RockefeUer já tinha, na pra-
É uma voz nova que se ouve. O marxista de cujo livro tica, inauguradoessapolítica), ocupandolugar, sejapor W-
tiramos a citação pretendeque, em face de certa "estratégia pos ou isoladamente,em que possamdobrar unanceuameuw u
da expansão ilimitada" do imperialismo americano, "os círculos
temporal Em outras palavras,'como nosso,pais começou a de-
dirigentes do capital financeiro que em têrmos gerais aceita- senvolversua política exterior geral de .pós-guerra,
. as empfe'
ram aqula estratégia-,tiveram que aumentar(?) seu domínio sas privadas devem começar a' desenvolver sua politica exte-
sôbre o aparelho do Estado. Welch expressouo problema". rior, começando pela maior contribuição que podem fazer:
Na realidade a explicação não explica nada, senão o embaraço "os homens nt) governo''. , . .. ,
do Autor, ao ver um autênticorepresentante da alta oligarquia
financeira reclamar o direito de seu grupo a reassumir o lugar
que ]he cabe na direção social e política do país. O problema
não existe. Welch, falando por seus pares, mostra não estarem
satisfeitoscom o papel apagado,lateral, que vinham tendo na
l Cit. de Vjçtor Pcrlo: Z?Zímperfalí:mo zzorfe-americano, Editorial
Platina, B. A., 1961, pág. 184.
a épocaem que a "democraciarepresentativa"estavano apo- soais. Senão o Estado será uma abstração em face da realidade
geu. À medida, porém, que os monopólios se espalhamios dêles,concreta, dinâmica. Com efeito, Welch, o tesoureiro da
principais ramos de produção; que, sob pressãoda classetra- Standard Oil of New Jersey, quer que as emprêsas privadas
balhadora, o Estado intervém tentando arbitrar o mercado de comecem -- estamos no dia seguinte da guerra -- a desen-
trabalho; nessa medida a simples "representação" parlamentar, volver sua política externa paralelamente à .política exterior
quer dizer, por terceiros ou pela via indireta, perde terreno. É geral que o Estado passou a desenvolver no pós-guerra. E para
importa;nte,.também, ®r os homens necessários,não mais ape- ãsseguiar-sede que essa política se faça como elas querem,
nas no parlamento(ou no seu apêndice,o /obbyJ onde se 'to- as êmprêsas prii'adas devem começar. . . pela maior contri-
mam decisõespo[ítlcas, se fazem leis e se votam favores e pro- buição que podem fazer: (seus) homens no .govêrno"
teções,mas no própria corpo da Administração:estavai dei- Diferentementeda política exterior oficial para a Europa
P e os outros continentesque só então começavaa se delinear,
xando de ser apenas o velho aparelho burocrático de estam-
pilhas ou carimbar papéis, para compor-setambém de estabe- coMorme testemunha Welch, na realidade para a América La-
lecimentos autónomos, empreendimentos industriais, sobretudo tina tal política já e-stâva perfeitamente delineada e posta em
no domínio das illfra-estruturas . execução,desdeantesde terminar a guerra (já em 19441),sob
A era "representativa" para os homens de negócios pas- a direçãode um dos que Welch tanto exortavaa irem ocupar
sou; agoraé a ela, digamos9
da "democraciadireta" ou, como postos de govêrno. Assim é que, no curso dos anos que se
quer Welch, num verdadeüo iZogan político: "os homens (de seguiram imediatamente à guerm, por' mais que clamassem di-
negócios) ao govêrno!" O controle do Estado deve ser direto, rigentes e responsáveispelos destinos econâinicos da América
pois que êssecontrole é disputado por grupos rivais cada vez Latina no sentido de que a política externa norte-americana
mais numerosos, inclusive pelos trabalhadores organizados, continuasse a ser ditada por largas consideraçõespolíticas e
pelo próprio aparelho técnico-burocrático tendendo a crescente estratégicas,a fim de que se desatassemas amarras para o
autonomização,
com o seu lado civil e o seulado militar. nem desenvolvimento industrial dos seus países, conforme as pro-
sempreunidos mas, ao contrário, freqüentementeem desaven- messasfagueiras dos anos incertos e cheios de anwaça à inte-
ça, às turras. Durante o apogeu do capitalismo liberal, êsse gridade da América do Norte, os dirigentes de Washington
poder não era disputado senão, de modo cada vez mais débil, eram surdos a êsse clamor. Mediante duas outras instituições
pela velha aristocracia territorial que, ou se fundia na nova oficiais criadaspara manejar as dificuldades, a América Latina
burguesialiberal industrial (Inglaterra) ou com ela se compu- foi entregue,após a guerra, aos homens de negócios já .com
nha Dum modzzivívelzdíque acabavafuncionando, sob as bên- largosinvestimentosnela. E ao cabo de todo o formidáveles-
çãos da monarquia imperial, como na Alemanha até o comêço forço de promoção pela política económica de guer.ra desen-
do século,ou fará liquidadacomona Fiançanapoleónica
ou volvido por Washington para a América Latina, com a inelu-
nos Estados Unidos após a guerra de secessão.Na época mo- tável aqiiiescência desta, por volta de 1946 já demonstravam
derna, quando o imperialismo surge, sob a hegemoniado ca- os Estados Unidos estar desinteressados
dela. Suas atençõese
pital financeiro,o mundo entra em guerra,em crise, em revo- apreensões viravam-se então para a Europa. A América La-
lução, contra-revolução, revolução até a hora presente, no ter- tina fará perfeitamente c(x)rdenada para ser entregue aos Ro-
ceiro quartel do século. E terá acabadoêsseprocessocon- ckefellers,aos Grades,aos homensde negóciosda grei de
vulsivo? Welch. IJm autor aqui por muitas vêzes citado, o Sr. .Chamis-
A oligarquia dos grandeshomens de negócios passou a so, ao tentar hasteara formação de uma política económicade
disputar o Estado a outros grupos, sobretudo os da alta buro- integração
da AméricaLatina na outra anglo-saxã,
ao termo
cracia. Êles insistem em dar aos negóciosdo Estado a tónica da guerra,com certa ingenuidadede expressãomas.com certa
de seus negócios. O Estado é dêles, lhes deve lealdade e não pertinência, assim definiu a situação : "A responsabilidade mun-
por meios indiretos, representativos, mas diretos, quase pes- ilial do-sEstados Unidos -- ia fazê-los hesitaram entre a co-
//2
T
operação iDteramericanae uma cooperação mundial (?). Para restavam s.eu descontentamento contra a administração demo-
êles o quadro do Aemfi/brio jó /zâo bmfd. Mas a América La- crática responsável pelas gestões de paz, .!eputadas desastrosas
tina fica como um laboratório de experiênciaseconómicasden- para os interêssesdo pari. Truman não lhes merecia a confi-
tro do qual evoluemcom mais facilidade que alhures.i ança; viam nêle um remanescenteda época reformista do New
A América do Sul voltava a ser, acabadoo drama da 't Z)ea/ e mesmo do )yar DeaZ rooseveltiaüo que se fazia necessá-
guerra, um recanto do mundo. Geográfica, cultural, economi- rio acabar: ainda havia pelos gabinetes e repartiçõesda Casa
camente provinciano. Não se tratava mais de evitar que a Branca muitos "dirigentes sindicais, políticos liberais e propa-
Akmanha pudesse chegar às plagas do Brasil. Não se tratava gandistas de esqu-farda".Nelson Rockefeller deixa a adminis-
mais de tranqüilizar o País, pagar os serviços feitos com algu- tração democrática não para voltar ao setor privado, mas para
ma ajuda po-sitiva. Mal ou bem já se havia feito. Cuidava-se iniciar uma carreira política no Partido Republicano que, com a
agora de aplacar o resto do mundos alinhar a Europa ociden- ? vitória de Eisenhower,o leva alguns anos mais tarde à gover-
tal. Mais uma vez Welch é claro e lumÜoso.ao mostrar o ca- nançado Estadode Nova lorque, e quasea candidatoà Presi-
minho a seus confrades: ''Portanto, a emprêsaprivada norte- dência da República pelo seu Partido em 1964.
americanase vê em frente a estaalternativa: pode atacar e
O Presidente Truman já vinha desde o fim da guerra sob
salvar sua posição em todo o mundo,aou permanecersentada crescente pressão do Bfg 'Busi/zess para soltar as rédeas da
e presenciarseu próprio funeral. Nossa política exterior da'e economia nacional às mãos dêles. Ainda em 27 de ju-nhodc
preocupar-se mais com a estabilidade e segurança de nossa
inversões estrangeiras e para o futuro mais do que nunca. O 1946, em declaraçãoà imprensa êle afirmava, com os olhos
adequado respeito ao nosso capita! no exteHor é tão importante postos nêles: apara bem servir êste país e a economia mundial,
nosso comércio externo, exportações, importações, deve ?er en-
como o respeito aos nossos princípios políticos, e se dwe de-
mos.suartanto cuidcüoe habilidadeem obter um como o tregue às mãos privadas e financiado pela emprêsa privada. De-
out'ro:B sejo ardentemente que haja a mais completa cooperação entre
a volta de nosso comércio exterior e de nossos investimentos à
A linguagem, como se vê, é a me-smados velhos tempos
em que se tiiüa o vêzo de confundir honra nacional com negó- iniciativa privada --- assim qu-efâr possível"
cios,' propriedade com bandeira, .jntlrêsses..privados com altos Mas os grandes homens de negócio estavam impacientes,
princípios políticos e quando Coolidge dizia que a bandeira e não queriam mais esperar. Dias depois da declaração concilia-
norte.'ameriiiana cobria ã propriedade americana, onde quer tória de Truman, o Presidentedo ChaseNational Bank de então,
que fôsse prejudicada. (do mesmo grupo, da mesma família do atual Presidente ( 1965),
Os homens de negóciosfalavam agora sem rebuços: "ata-
Sr. David Rockefeller),Sr. Winthrop W. Aldrich, declaravaà
car e salvar sua posição em todo o mundo, ou. . . presenciar
seu próprio funeral". A alternativaera grave. Para tanto? ti- imprensa: "Se os empréstimos do Govêrno aos países eram .ne-
nham de ocupar os pastos decisivos da vida po'lítica! económi- cessáriosdurante ou imediatamente depois da guerra, deviam
ca da nação'L ."postos de govêrno, em grupo ou isoladamente, ter por complemento o financiamento internacional privado e de-
para que pudessemdobrar financeiramentea tempestade.. Na viam finalmente ser substituídos por êste úlima" (declaração d:
;ealidáae, êles se sentiam ameaçados.Davam o alarma. Maná. 8 de julho de 1946 da Presidentedo comitê encarregadode
1 Obra citada, pág. 304.
formular a política dos empréstimosao estrangeiro).E-ra evi-
2 Schumpeterainda testemunhavaem 1942: "0 espírito público re- dentem-enteuma resposta a Truman. Mas o mesmo conspícuo
tirou lealdade ao esquema capitalista de valores. A riqueza privada cidadão estava impaciente, pois em outubro da mesmo ano, em
está sob quarentena moral. " '(Poifwar Economia Problema, ed . Seymur nova declaração, afirmava chegado o momonta de "substituir os
E. Harris, McGraw-Hill Book Co., New York, 1943, pág. 121.)
3 Obra citada, pág. 182. empréstimospúblicos pelos empréstimos privados", e que era de

}14
se esperar que os empréstimos privados, ''à medida de seu de- logo aqui na nossa América sentimos os efeitos dessa nova
senvolvimento, tomassem a forma de investimentos diretos".i linha
n
O pobre Prosidente Truman, positivamente, não mere- Foi, com efeito, por essamesma época que na reunião de
cia a c?afiança. das grandes corporações B, particularmente, do encerramentoda ConÜrênciado Rio de Janeiro (Quitandinha)
grupo Rockefeller-Aldrich (Standard-Chame). Em novembro, o PresidenteTruman,em pessoa,liquidou as esperanças que
vem o grito de guerra de Leo Welch. "perigosamente"(assim eram elas tidas nos EstadosUnidos)
Em 1947, Truman tenta enfim desarma-loscom sua cé- se haviam acendidona América Latina em virtude das promes-
lebre declaraçãoaos estudantesde uma universidadedo Taxas sas de 1940 e 1941, ao rebentar da guerra. No seu discurso de
em que afinal.define a nova política exterior de seu país, que encerramento, Truman falou: "Na medida em que estão em
passa a ser conhecida como Doutrina Truman. EJa é definida exa-
causa os problemas económicos comuns, as.n.açõesda América
tamente como reclamavam Aldrich e Welch. Segundo o último, do Norte 'e da América do Sul, estamosperfeitamenteconscien-
cabe ao Govêrno "preocupar-se mais com a estabilidade e segu: tes desdemuito tempo que ainda resta muito a fazer. . . Fomos
rança de nossas inversões estrangeiras e para o futuro mais obrigados, no exame das questões, a diferençar entre a necessi-
do que nunca". Ou esta outra fórmu]a lapidar: "0 adequado dade urgente da reabilitação das zonas devastadaspela guerra
respeitoa nossocapitalno exterioré tão importantecomoo e os problemas de desenvolvimento alhures. . ."i
respeito IS)s nossa?s
princípios políticos". Bíg Base/zess
passa à Assim, a América Latina fica aí classificada num vago
ofensiva. Diante disso, que faz o Presidente dos Estados Unidos?
Menos de três mesesdepois do alarma e do ultimato de Welch, algures.Mas naquela reunião, outra voz se erguia, esta saída
diretamente da tubo latino-americana. Era a do então Senador
responde, a 6 de março de 1947, dirigindo-se à mocidade uni.
versitária de se! paí!, advertindo-a dos "perigos que corria a ini- Roberto Simonsen,para dizer que a necessidadeque se sente
ciativa privada": ''O sistema americano da iniciativa privada aqui é de uma colaboração económica a longo prazo. Chamisso
faz face à concorrência desesperada de economias estríhgeiras
o chamoude "o mais célebredos campeões de um PlanoMar-
e controladas pelos Governos de seuspaíses". "As pobres (afc) shall para a América Latina". Mas os americanos.. . do Norte
e isoladas emprêsas americanas não podiam competir com os não o ouviram. E quando, no ano seguinte, êsses]atinos incor-
prelos. estabelecidos.pelo Govêmo dessas economias estrangei- rigível-s do "hemisfério" se largaram a Bogotá dispostos, como
ras". E conclui patética, dogmáticae perigosamentepara a paz colegiais, aos gritos, batendo com a tampa das .carteiras, a pe-
do mundo: "Todo o mundo deveria ãdotar o sistema america- dir ãum plano Marshall para a América Latina" foram proibi-
no. . . o sistema americano só poderia sobreviver na América dos pelo autor do plano, o General Marshall em pessoa,de
se se tornasse num sistema mundial". Para Truman, Presidente tocar no assunto.
da República dos Estados Unidos, e para Welch, tesoureiro da A escala de prioridades havia sido estabelecida em Wa-
StandardOil of New Jersey,não há alternativa, a política exter- shington;agora,pela nova prioridade, a América Latina, com
na americana tem de passar ao ataque para "salvar a emprêsa Brasil e tudo, fará rebaixadade vários pontos: nem no segundo,
privada" em perigo de desaparecer.A luta, não esqueçam,é no nem ho te.rceirolugar, pois depois da Europa ocidental (por um
plano internacional, pois lá é que há Governos tão malignos triz a Central e p-arie da Oriental não entrava também no plano) ,'
que "gerem e controlam as economias de seus países"
Sem êsse pano de fundo não se pode compreender o que 1 ]Vew york Tomes, 19 de setembro de 1947.
foi e o que é a guerra fria. O sistema americano da empresa 2 "Em 4 de julho de 1947, o gabinete tchecoslovaco decidiu. unani-
memente aceitar o convite a comparecer à conferência prelimina31da
privada será a norma para o mundo. Terá que ser imposto. E Plano Marshall em Paria. Cinco dias depois, convocadopor Stalin a
ir vê-lo em Moscou,o ministro das RelaçõesExteriorestcheco,Jan
l Agence Economique, 15 de outubro de 1946, citação de Henri Masaryk, então membro do govêrno tcheco, obedeceuàs ordens do
Claude (NozfyeZ ..4va/zrGz/erre, T. 11, cicia, Paras, 1949, pág. 55). ditador e recusouo convite". O mesmo jornalista internacional que
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havia ainda o Oriente Médio, e o Extremo Oriente, e a Coréia Nacional de Economia, em exposição sabre a situação econó-
do Sul, e o Sudesteda Ásia, conformeas reverberações da po- mica do Brasi[ em 1963, (Correio da ]Wan/zã,de 5-8-64) os in-
lítica internacional americana para barrar a Rússia e a China, vestimentosprivados americanosDa América Latin :: haviam
mas também p-ara impor o "sistema americano da emprêsa pri- chegado a quatro bilhões e duzentos milhões de dólares, con-
vada", sob pena de não "sobreviver"nem mesmonos Estados centradosnã Venezuela,México, Child, Brasil e Argentina,na
Unidos. Nem ao menos "uma colaboraçãoa longo prazo", fór- exploração da mineração, petróleo e serviços públicos.
mula do Senador Simonsen, foi concedida. A América Latina Contràriamente às esperanças e sobretudo promessas do
que ficassepara uás. E em Bogotá, na Nona ConferênciaInter- tempo de guerra (vede ainda Roosevelt, Cordell Hull, Nelson
nacional dos Estados Americanos -- comemorada por terrível Rockefe[[er. na Conferência das Comissões de ])esenvo]vimento
levante popular qua quase tudo destruiu, à vista dos delegados Económicode maio de 1944 em Nova lorque), a famosaco-
latino-americanos inteiramente perplexos, sem nada compreen- laboração americana, não mais para atendimentos de contin-
derem do que se estava passando, em conseqüência do assassí- gência, fornecimento de matérias críticas necessitadaspela guer-
nio de um líder popular local, Dr. Jorge Eliacer Gaitán -- o ra, algum facilitar de contas, etc., mas para projetos a longo
General Marshall, do alto de sua autoridade de Secretário de têrmo, foi encerrada bastante abruptamente em Bogotá, com
Estado, rude, franco, cortante, maiüou a América Latina apren- toda a pompa de sua Carta (com maiúscula).Em seulugar,
der a esperar; se contentasse com um acréscimo na capacidade os capitais privados tornaram a chegar para as velhas opera-
de créditos do Banco Internacional; tratasse,porém, de tirar ções exploratórias. Resultado, como sempre: a decalagem entro
os Estados Unidos e a Amél.ica Latina não diminuiu; ao con-
partido das compras que o Plano Marshall ia provocar nos seus
países. Mas, ainda depois, os latinos continuaram a expressar trário, cresceu. Em relação à expansão da produção nas Amé-
suas preferências por créditos e financiamentos por vias gover- ricas, estimativa em grosso de Seymour E. Harris, citado por
namentais, já que eram as únicas possíveis e suscetíveis de aten- Behrendt, calculava uma expansão de 20 por cento no máximc}
der a obras de fôlego, no sentido ektivameDte desenvolvimen- para a América em geral, de 1939 a 1944, anos de guerra, con-
tista, sabre que tanto insistiam. Na realidade, houve em Bogotá, tra uma expansão de 759o ocorrida no mesmo espaço de tem-
da parte de muitos delegadoslatino-americanos,com talvez Ro- po, DosEstados Unidos. No curso dos anos de guerra, com todas
berto Simonsen à frente, um vaga bruxuleio de ação coletiva as suas' conferênciase reuniões oeaizadas,a América Latina
como só muito mais tarde se pede realizar, embora fora do havia sido devidamente
preparada,ou domesticada,
para os
homens do bíg bzzsiness.
contexto OEA,em Alta Garcia, Argentina, por exemplo. Os tem-
pos não estavammadurospara tanto. Sobretudopor parte de Washington podia agora virar-se para a Europa e Ásia,
seus Govemos. a fim de ''.salva-las do comunismo russo"(ainda não havia o
Mas se a ajuda americanacessara,de fato e em pro- modêlo chinês e muito menos o cubano) e assegurar ali a vi-
messas,os investimentos privados retomam, depois de interrom- tória do sistema americano da emprêsa privada. Havia, porém,
ainda muitas voltas a dar e, sobretudo, muitas violações a fazer
pidos desde antes da guerra, com exceção do famoso emprésti-
mo privado que o City Bank of New York fêz à Venezuela,em ao sagrado princípio da iniciativa privada capitalista. No entanto,
1941, para defenderpreços cambaleantesde petróleo exportado a despeito da impaciência dos seus grandes homens de negócios,
-- o velho caminho da América Latina. Por dados do Conselho o Govêrnoem Washingtoliainda não lhes pede entregaro
campo livre na frente económica. Quando esperavam assumir
dá a notícia acima acrescenta:"Sob a mesmapressãode ferro os go- a direçãototal do Estado para impor a política de defesados
vernos jugoslavo e polonês revogaram suas decisões de aderir ao Plano interêssesprivados, não o conseguiram: Washington tinha ainda
Marshall. Stalin sabia que a colaboraçãoentre a América e os saté-
lites enfraqueceria seu monopólio sabre êles e Ihe abriria uma escolha algumas operações inortodoxas a ex-ecutar. Desta vez, tudo o.que
de mercadose lealdades". (Lcuis Fischer, rh= 1,í/e and Z)eaf/zof fizera na América Latina, nos idos de 40-41, parecia mesquinho
S/alfa, Harpa' & Brothers, Publishers, New York, 1952, pág. 235.) e aleatória, diante das maciças transferências de. capitais, por
//9

Ja l& .l. lb
cima das fronteiras, de Govêrno a Governos -- Q Plano Mar-
shall. Algo de pior, entretanto, aconteceu; iniciativa que pare-
cia extemporânea, só para atender a conjunturas excepcionais,
ç .;'"uuüx;:i$i H:l$
mentemesesdepoisdo artigo do New york Tlmegincriminado
se prolonga de aDOpara an?, de orçamento a orçamento, isto oelo' Sr. Henri Claude e depois das declarações impertinentes
é, acabainstitucionalizada.
Na ausênciade uma guerramesmo do Presidentedo ChaseNational Bank, W. A. Aldrich, de,que
contra as fontes do mal comunista -- a única saída lógica para ]a era diegado o m(nnenta de substituir os empréstimospubli-
a cruzada lançada por Truman pela sobrevivência do sistema cas pelos privados, que o Govêrno Truman se atirou nos inu-
da emprêsaprivada, à americana-- se viram os EstadosUni- sitados donativos, supremamente inortodoxos, .do Plano Mar-
dos ar;astados a responsabilizar-se financeiramente por todo re- shaU. A iniciativa governamental não era ditada por interêsses
gime que, pela periferia da Europa, pelasfímbrias da Rússiaou económico-fiiiancçims imediatos mas por motivos de alta p.o-
da China, se declarasseem luta contra o comunismo ou por êste
ameaçado. Os Estados Unidos, com o acordo do bfg busfnz:es
ou não, tinham, com efeito, de pagar o tributo pelas conse-
qüênciasdo fato incontestede se ter concentradoem um só país vo[ta da Nrp ]enmianade 1921, na URSS,.embora
as duaspolí-
(êles mesmos) todo o capital exportável. Isto os obrigava, qui-
sessem ou não, a defender o equilíbrio mesmo da economia
mundial. Já antes do Plano Marshall êles haviam aberto ao
Govêrno britânico créditos no valor de oito bilhões de dólares.i
E êsses empréstimos permaneciam em ordem do dia durante
ainda vários anos. Comunicação do Departamento do Comér-
cio calculavaque tais empréstimosiriam prosseguiraté alcan-
çar o montante máximo em 1950, no valor de mais de trinta
bilhões de dólares.2 O autor ora citado, economistamarxista, por
uma ortodoxia mal avisadarecusava-sea admitir a prática que
Washington ia inaugurar, dos grandes -empréstimospúblicos,. de
Estado a Estado. Para êle os Estados Unidos ''só concederiam
empréstimos de Estado de .grande envergadura a um. Govêrno
estrangeiro : a G-rã-Bretanha'i -- emplléstimo êste justificado am-
plamente pela importância primordial. que representava para: a
11:=%:ã=:.:,'g:nm:.: Bm$g'Çl$;
como o Plano Marshall e a estranhezados homens do blg bu-
realização dos planos americanosa evolução económica e política sizussamericanoem faca do Plano Marshall que não entrava
do império britânico no imediato pós-guerra. Mas, .acrescentava, nos seusplanos.la-se recomeçar,outra vez, as experiênciasroo-
'já na assinatura dêle insistia-se do carater e?pedal dêsses acor- seveltianas e o Estado continuaria a substituir os investidores
dos que não deviam constituir 'precedentes',pois. que os go-
vernos estrangeirosDão teriam mais recorrido aos bancos ame-
ricanos". Êle 'também acalmavade estupidezfalar-se como fêz
o ]Vew york Timef (6-9-1946), "de uma concorrência possí-
vel ent:.eo capital privado e os créditos do Estado. Washington
l FederalReserveBand,Monthty View of Credit alto BusinessCon-
dífion, agosto de 1946.
2 Ver Henri C]aude, ]VazzveZ.4va/zf Gzferre, T. 11, ocíA, ed., Paria, l Obra citada,pág. 55
1947, pág. 54.
]2/
/20
l

ram-se todos, então, contra a sua reeleição. O fato o obrigou a va em inquietaçõesde alto a baixo. Afinal, Fidel Castro surge
lutar pela reeleição numa campanha.eleitoral (mal apoiado pelos em Cuba. Era a revolução mesma que chegava ao chamado he-
bonzos de seu partido mas entusiàsticamente
sustentadopelo misfério ocidental,por cuja defesatanto se fêz e tanto se falou
movimento sindical da c. 1.0., ainda em ascensão no selo nos anos de guerra. O resto se sabe. A revolução em Cuba, des-
da massatrabalhadora)de extremoteor demagógico
no seu pertando esperanças por toda a América Latina, sobressaltou
radicalismo verbal; apreciem esta mostra, ainda de 1948: ''E os dirigentes dos Estados Unidos, abalando-lhesa convicção ou
agora contemplemoso grupo de homens que põem em perigo a crençaarraigadade que na América Latina tudo se resolvia
o futuro da democracia
nos EstadosUnidos,por meiode seu com palavras, jeito, alguns safanões e pouco dinheiro, e ela
poder económico concentrado". (Discurso de 25-10-1948.) : Sua continuava a ser o terreno fechado dos Estados Unidos. Kenne-
administração foi quase toda ela ocupada com os problemas da dy passoucomo um meteoro. A fase crítica da revolução cuba-
reconversão e empenhadanuma pré-guerra política, para a qual na também passou, desde o acordo para evitar a guerra ató-
considerações de ordem estratégica dominavam outra vez con-
mica entre Kruchev e Kennedy. A Europa restabeleceu-secom
siderações puramente financeiras ou económicas, de rotina. os maciços capitais governamentais americanos nela investidos,
A confraria dos Welch perdeu o rozzndcontra Truman. Mas voltando a ser uma dás regiõesprósperas do mundo. As tensões
continuou na luta e, fazendo o Partido Republicano de escudo, sociais e políticas dos primeiros anos que se seguiram à guerra
encontrou no generalíssimo vitorioso, Dwight Eisenhower, o seu amainaram. Nenhum país europeu ocidental teme o "perigo"
porta-bandeira:Com êle, enfim, voltava .ao poder, no qual, se comunistaou russo. (A não ser, talvez, a Espalha de Franco
não foram postos de lado com a chegadadc Roosevelt-- o e Portugal salazarino.) Os capitalistas americanos, afinal, a par-
que seria inconcebívelou de difícil explicação-- tiJlhamper' tir dos primehos êxitos do Plano Marshall, viram chegaro tão
dado a influência determinante. Kennedy galgou o poder numa esperadomomentode investir seus próprios capitaisna cobi-
nova hora de desassassêgo mas a duras penas. Roendo frustlla- çada península eurásica e se apoderaram de quanta indústria de
ções de todos êssesanos de pós-guerra, apesar da coplosíssima le- produção em massapudessem.Os capitais americanos ali inves-
gislação consultiva, deliberativa, optativa de seu sistema OEA, tidos hoje sobema pano de cinqüentabilhõesde dólares.E o
pelo qual os Estados Unidos passaram a poder interferir ."legal- fluxo de investimentosnão cessou.Agora, ao contrário,os ca-
mente' em todos os domínios da vida política, econâmiça,fi- pitalistas europeus temem ser despojados de seus próprios mer-
nanceira, diplomática, administrativa, militar, de c?da um dos cados pela força expansiva do capitalismo americano. Johnson
países latino-americanos, a América subdesenvolvida fermenta- pede que seuscapitalistas parem os investimentos, por motivo de
desequilíbrio no balanço de pagamentos dos Estados Unidos.
l Em seu discursode posse,no início do seu segundotêrmo,.a 20 Eis a normalidade,afinal, a normalidadetão esperadadesdeos
de janeiro de 1949,Truman, messiânico.
e vitorioso, usa uma lingua- dias abençoado.s de Calvin Coolidge, antes da catástrofe de
gem que lembra a do Dortavozdo big bzzsí/zes$
". . .os povos da.terra..
esperam dos Estados Unidos, como nunca o hão esperado, a boa von- ]929.t Eisenhower, sob vários aspectos, foi o Coolidge dos
tade, a força e uma chefia prudente.. ." Agora, ouça-sea voz de Leo
Welçh, em' 1946, a qual, sob vários aspectos-- tom, expressão,idéia IA normalidade para êles é quantificável. Em uma década, os in-
-- como que se antecipa à do próprio presidente ao tomar posse: vestimentos americanos na Europa sobem de 1,7 a 11,5 bilhões de
Esta responsabilidade é uma chefia. positiva e rigorosa nos assuntos dólares. Das mil firmas principais dos Estados Unidos, 800 têm filiais
do mundo -- políticos, sociais e económicos -- e deve ser assumida no europeias. A General Motora destinou 500 milhões de dólares para
mais amplo sentido do têrmo. Como o produtor máximo, a fonte investir na Europa. Ela quer aumentar sua participação no mercado
maior de capitaise o maior contribuintepara o...mecanismo
global, europeu de automóveis de 13% para 17% . Sobem a 525 milhões de
devemos marcar o ritmo e assumir a responsabilidade de acionista dólaresos investimentos
americanos
em produtosquímicos.Os fabri-
maioritário nessacorporaçãoque se conhececom o nomede mundo.= cantes de alimentos vendem agora na Europa 4 bilhões de dólares por
E isso não é por um determinadotempo de funções. É uma obrigação ano. A maioriaabsoluta(60%) dasanõessemdireito a voto de firma
permanente". (Cit. de Victor Perto, obra citada, pág. 180.) inglêsade automóveisestá agora nas mãos de Clnysler; mas também
122 /23

.â.
se sistema. como consumidor e como investidor. A defesa na-
nossostempos.Com a sucessão
de Kennedypor Lyndoii John- ciona! é nâo só um mercado ilimitado, mas um financiador ili-
son é, pràticamente, um novo republicano que sobe..à Casa mitado. O Estado consome,o Estado financia, financia e con-
Branca. 'Blg bzzsílzess
está satisfeito com o seu novo presidente. A
some, cumprindo a sua parte no mecanismo capitalista, inde-
América Latina, porém, não tem nenhumarazão de o estar. E
o Brasil, com a MarechalCasteloe tudo, não encontratambém finidamente, permanentemente,como no mofa corzf//zua. Dos
vinte bilhõesde dólaresgastos,anualmente,em investigações
e
motivos para estar. A "normalidade" dos grandes homens de ne- pesquisas de desenvolvimento pelas emprêsas privadas, uma par-
gócios dos Estados Unidos é o negócio .sem grandes homens
no Brasil e nos outros paíseslatino-americanos. Quer dizer, o te absoluta é proveniente de programas de financiamento do Es-
tado. As emprêsasinvestigam, produzem, enriquecem continua-
negócio mesmo. A Europa "!ormalizada" de hoje mostra, afinal, mente porque o Estado fornece grande parte dos capitais e con-
que mesmo o Plano Marshall acabou,sendo o.maior e o .melhor some grande parte dos capitais e consome grande parte dos pro-
investimento,a longo prazo, que já se conheceuna história
dutos. EssasemprêsassãÕ privadas quanto às finalidades lucra-
mundial do capitalismo.'0 Estadoé o principal instrumentodês- tivas. Diante dela-s,as emprêsasprivadas europeiassão peque-
nas organizaçõescapitalistas, como se ainda de uma época de
capitalismo de produtor-capitalista, ou no máximo de . monopó-
lio privado. Elas não podem sequer pensar em competir com os
grandes trustes para-estatais americanos. A competição de preços
é perdida de antemãoem campo. A competiçãoquanto à su-
aiiiericano. . .. .. . . .-.. perioridade tecnológica, quanto às inovações, não pode sequer
A vassalização da economia europeia ocidental vai em marcha ter início, tão intransponívela distância entre a criação de pa-
crescente. A França gaullista -- a mais sensível entre as nações. euro-
tentesno campoda produçãoamericanae a do campode pro-
dução européia. Em face daquela, esta é, nesse plano, uma pro-
dução po-r assim dizer indivÜua], artesanal. A Comissão fran-
cesa do Centro Nacional de Pesquisas que, de retarda à França
de uma viagemaos EstadosUnidos, pairou a estudaro proble-
ma, chegouà conclusãode que o ritmo das inovaçõesé ali tão
aceleradoque nenhumafirma nacional privada de qualquerpaís
diz: "Não podemos sobreviver a essa competição unilateral. Nossos
rivais norte-americanos
dispõemde mais de mil patentesmais do que
nós. A longo prazo, estamosfadadosa ser abs3rviiíos". E na ltália?
Os investimentossubiram nos últimos três anos de 50qo e atingem
agora 800 milhões de dólares. Das 100 maiores companhias italianas,
dez são controladas por americanos. A General Electric adquiriu toda
a divisão de computadores da Olivetti. A Espalha de Franco, antes
dêste passar suas insígnias ditatoriais a um príncipe. qualquer da.velha
dinastia. terá sido transformada numa estação subsidiária europeia do
capitalismo americano . Em suma, nunca hotlve negócios mais normais
que êsses investimentos, pois, ao que indicam estatísticas de. amostra-
gem, êles produzem retorno de 12%, ao passo que .no próprio país
atravessar umas poucas milhas na Bélgica .sem passar por uma..fábrica de origem é de 9% apenas. O grau de "normalidade"pode ainda ser
norte=americana.
' Benelux é o campo de investimento per capífa mais mais perfeito, já que em alguns casos tais investimentos chegam a
elevadoda Europa,com l bilhãode dólaresnumapopulaçãode .19 35qo ãe retorno. (Ver também Z)faria Cazíocízde 21/12/1965, José
milhões de habitantes. A Greyhound comprou.a .VAVO,uma companhia U
Auto .)
de ânibus holandesa. O chefe de uma indústria petroquímicabelga
}2S
/24
pode pensar em competir: Na competição, só firmas de dimen-
;ões internacionais, isto é, americanas, sobreviveriam. No ano
passado, a Fiança despendeu cêrca de quatrocentos e cinqüenta
milhões de dólares a mais por licenças industriais do que recebeu
por suaspatentes; a Alemanha, seiscentosmilhões; a ltália, cento
e setenta e seis milhões. As companhias americanas despendem
em pesquisase desenvolvimento,anualmente, dez vozes mais do
que toda a Europa ocidental. O /7afen/ gap não poderá tão cedo
ser vencido. Por isso mesmo, homens como Louis Amaud, o
perito reorganizador das estudas de feno da Fiança, dizem:
:'No ritmo atual as indústrias européiasfuncionarão cada vez
mais sob o regime de acordos com licenças estrangeiras,pa-
gando direitos; tornar-se-ãosubsidiáriasdas companhiasma-
trizes norte-americanas,
que lhes venderãoo seu #/zow/zow
(conhecimentotecnológico) e administrarão a produção êuro-
péia". Não há por onde fugir à supremacia americana, senão
içando à Europa uma estrutura sobrenacional em que haja pres-
sõesempresariais capazesde dar à Europa continental sua uni-
dade de produção indispensável pelas proporções e pela as- \.../ povo AMERICANO vivia alheado aos problemas inter-
sistência e participação direta do Estado europeu numa política nacionais, amargurado com as próprias dificuldades da depres-
económica global planejada e racionalmente social. A Europa são, avêssoa qualquer ideia de intervenção política no embrog7fo
não tem escolha entre ser vassalapolítica e social e economica- europeu, enquanto Frank]in ])dano Roosevelt preparava o país
mente subsidiária dos Estados Unidos ou um sistema autónomo, para entrar em guena contra o Eixo. Por isso mesmo, êle dedi-
na b-asede uma economia superior suscetível de ser a ponte en- cou seusprimeiros esforços a garantir entre os vizinhos do sul
tre a -economiacapitalista ainda privativa americana e a econo- do Continenteum flanco seguro ante qualquer surprêsa,sobre-
mia pública socialistada Rússia e aliados. Esta é a verdadeira tudo da Alemanha.Apresentou-seentão como o bom vizinho.
tarefa "ocidental", e não fazer guerra ao Vietnã (do Sul ou Êle tinha consciência,desdea ascensãode Hitler, que o destino
do Norte) , perseguir Cuba e colonizar o Brasil. das Estados Unidos era participar da guerra ainda mais uma
vez. Aliás, antes de pegar em armas contra Hitler, pregou pela
palavra, incessantemente,uma espécie de cruzada antitotalitária.
À medida que o mundo ocidental ia sendo avassaladopela vaga
nazi-fascista,quase que país por país, a palavra do Presidente
dos Estados Unidos se tornava mais patética. A Espalha foi a
última batalha'-- e decisiva-- perdida pelas forças democrá-
ticas de esquerda e do mundo todo que para lá acorreram lutar
ao lado dos republicanos,do povo trabalhador,.em suma,contra
a frente única de nazistas, fascistas, conservadores e mercenáirios
de Franco. A guerra, como era-de esperar, se seguiu quase que
naturalmente à derrota da revolução espanhola. A situação, como
que marcada pelo destino, se encaminhava inexoràvelmentepara
o desastre final.

}26 /27
O nazi-fascismo não levantava a cabeça apenasna Europa, Brasil que, em compensação,era o País continental com balança
mas também na Amédca Latina. A Alemanha era uma amea- comercial mais favorável em relação aos Estados Unidos. Nessa
ça não só militar mas sobretudo política a vários países latino- atmosfera, reulliam-se em Washington, para conversações, ex-
amedcanos,à frente dos quais o Brasil. portadores norte-americanos, representantes brasileiros e o De-
partamentode Estado. Ainda era março de 1939. O Export-
Quando Getúlio . Vargas decretou o chamado "Estado
Novo", em 10 de novembro de 1937, já em 23 de dezembro,em Import Bank põe à disposiçãodo Banco do Brasil uma soma
que não devia excedera $ 19 200 000, destinadosa pagar
face das dificuldades cambiais e da queda dos preços do café, saldos congelados devidos a exportadores norte-americanos.
instituía, com a suspensãodas dívidas (para negociar depois seus
Os americanos pareciam de uma generosidade surpreendente,
reaju-stes), o monopólio do câmbio. As medidas tomadas desa-
gradavam profundamente a Washington, ainda mais somadas
L pois, além do empréstimo mencionado, estudariam a possibili-
dade de outro crédito de cinqüenta milhões de dólares, emprés-
às excelentes relações políticas e comerciais que o Govêmo bra-
sileiro mantinhacom a Alemanhahitleriana.O Ministro cousa timo a cinco ou dez anos para promover o desenvolvimentoeco-
nómico do Brasil. Prometiam ainda, caso o Brasil o desejasse,
Costa explica: "Em fhs de 1937, dava-se a depressãoeconó- pedir ao Congresso autorização para pâr à disposição do Go-
mica mundial (?). Com ela coincidiu, no nossoPaís, a inadiá- vêmo b:.asileirooutros cinqüen(a milhões em ouro a serempagos
vel necessidade de alteraçãoda política do café. A situaçãode com a futura produçãobrasileira dêssemetal.a Tambémse
câmbio agravava-se, forçando a suspensãoda dívida externa.
chegava a acordo para liquidar os fundos bloqueados e devidos
Em neiüuma hipótese,o Govêrno agiu exclusivamente(síc) por a norte-americanoscom inversõesdiretas no Brasil, nc} valor de
influxo de doutrina, mas com o alto escopode evitar o sacrifício dezoito milhões de dólares. O acordo ver-sovaprincipalmente sa-
dos interêsses do País".t
bre as relações comerciais e sabre o estímulo às inversões diretas.
Em junho de 1939, Roosevelt pedia em mensagemao Con- A parte relativa aos compromissosdas dívidas públicas do Es-
gresso um crédito de quinhentos milhões de dólares, a curto e tado brasileiro, além de uma forma de ajuste permanentedelas,
longo prazos, a governos estrangeirospara promover o comércio deixava ao Conselho de portadores de títulos entenderem-sedi-
intemacional, a serem "gastos nos Estados Unidos e empre- rêtamente com o Govêrno brasileiro.
gados no desenvolvimento e reconstrução dos países tomadores Osvaldo Aranha, então Ministro das Relações Exteriores,
do empréstimo'l. Nessa mensagem,êíe opas aos empréstimoses- de volta da reunião, declaravanão ter o Brasil nada prometido
trangeiros da década de 20 a sua proposta de empréstimos co-
merciais "sólidos", a fim de aumentar a exportação para a Amé- nem o Govêrno americano pedido alguma coisa. É o caso de
rica Latina, taxandode "velhasfraudes" os títulos em dólares se perguntar: para quem Osvaldo Aranha fazia essasdeclara-
ções?Para a opinião brasileira inquieta? Quanto às velhas dí-
que se achavam em mofa.2 O Congressonão atendeuao pedi- vidas, comunicou a disposição do Govêrno brasileiro de reatar
do; muitos de seus membros defendiam as velhas dívidas. SÓ
o pagamento de juros em escala reduzida e mediant-enegocia-
bem mais tarde, quando a Alemanha ia dominando a Europa, o
çõesdietas com os portadoresde títulos. "Todo mundo sabe"
Congressocorreu a aprovar as proposiçõespresidenciais.Já era acrescentava, :que sou partidário, em princípio, do pagamento
a guerra plena -- 1940. Sob inspiração do Secretário de Estado das dívidas públicas e creio serem os comunistas os únicos par-
CÓrdell Hull que se furtava a qualquer ação bilateral na solu-
ção do problema das dívidas, foi estabelecidoo Programa dc r tidários de repudiar as dívidas."z
Acordos Comerciais.Entre os devedoresmais difíceis estava o O Ministro da Fazendado PresidenteVarias, em seulivro,
conta, por sua vez, um pouco saltitantemente,êssesepisódios.
l Sonsa Coaxa, Panorama Financeiro e Económico da República,
n.l.p., 1941, pág. 98. l Feuerlein e Hannan, obra citada, pág. 60. Êles dão como fonte
2 W.-Feuerlein e E. Hannan, DÓ/arese/z la .4merica l,afí/za, Fondo de Foreign Bondholders Protective Council, Annual Report, 1938, pág. 166.
Cultura, Méxíco, 1944, pág. 64. 2 Z.afí/z .4merfcan Fina/zcía/ News -- 14 de abril de 1939.
}

128 /29
"Em compensaçãocom muitos dos principais bancos america- que comer produtos sul-ammicanos e não somos bastantespara
nos, o Expert-lmport Bank nos proporcionou, desde logo, uma comê-los". E para que isso se tomasse possível propunha abri-
operação de US$ 19 200 000 a cur'to prazo -- como mais nos rem-se as portas de seu país a nova vaga de imigrantes europeus
convinha: dois anose a juros módicosde 3,6% ao ano O líqui-
do dessaop'oração,
hoje reduzidaa US$ 7 681000, cuja últi-
+ que viriam executar uma nova industrialização, para que dessa
nova industrialização surgisse um novo mercado mais abundan-
ma prestação se vence em novembro de 1941, foi empregado em te, capaz de "comer" os produtos latino-americanos. Feuerlein
consolidar definitivamente nossa situação de comércio importa- e Han:nan,que con.tamo episódiocom todo bom sonsa,obser-
dor, principalmente porque antecipamos todos os contratos de vam: "seria mais prático fazer a corrente imigratória dirigir-se
de câmbio a vencer-se''.: A operação foi assentada em março diretamente à América Latina, eliminando o intermediário no
de 1939 emWashington.A 8 de abril do mesmoano,o Govêrno 'q} programa de "coma você em benefício da solidariedade".i
brasileiro decretava"a volta ao regime de câmbio livre", ''tão Washington tem um objetivo: impedir que a Continente la-
pronto", explica o ministro, ''se modificaram as condiçõesque tino continue ligado a "potências estranhas" (Alemanha), e por
nos obrigaram a estabelecero monopólio".2 Ainda em setembro isso faz frent-e aos problemas dos excedentes de exportação, pro-
do mesmo ano, visitando o Brasil, nana o ministro, o Presidente curando facilitar as relações monetárias e cambiais com as re-
do Export-lmport Bank, Sr. Wanen Pierson, "concedeuao Ban- pública-slatinas e se esforça em cooperar com elas para lhes de-
co do Brasil novo crédüo de vinte e cinco milhõesde dólares, senvolver os recursos.
rotativo, utilizável em parcelasde cinco milhões e .juros Je Em setembro de 1940, o Govêmó consegue, vencidas as re-
3,6%o" para "acaso viéssemos no futuro necessitar para manter sistênciasprivatistas do Congresso,remodelar o Export-lmport
e consolidar a situação". A respeito, todo eufórico, o Ministro da Bank, aumentando-lhe a capacidade de crédito e autorizando-o
Fazendado Estado Novo diz: "operaçãoque sabre todas as a estender os créditos para além da-s exportações americanas,
vantagens vale como expressão da boa vontade e espírito de quer dizer, para financiar também o desenvolvimentoda produ-
cooperação do país amigo".3 Assim, graças ao Exp-ort-lmport ção industrial da América Latina. Sintomáticoé que -- bem o
Bank o Banco do Brasil "liquida todos os atrasadosdecorrentes salientam os autores aqui já mencionados -- no mesmo dia
de remessasem suspenso de lucros e dividendos". A posição mo- em que Roosevelt anunciava a remodelação do banco, o Admi-
netária do Brasil torna-sesólida, arremataêle, pois além de dis- nistrador dos Empréstimos Federais, Sr. Jesse Jonos, comuni-
por no exteriorde vinte e uma toneladasde ouro, semcontar cava o acôrdo com o Govêrno brasileiro para explorar os depó-
os saldospertencentesao Banco do Brasil, "depositadas em ban- sitos de feno do Brasil. Já é o empréstimo para Volta Redonda.
queiros" (?), conta, depositadosno Banco do Brasil e na Casa É o primeiro financiamento que o Govêrno americano faz para
da Moeda,com trinta e uma toneladas,701 quilogramase 495 fundar uma indústria de aço em país estrangeiroe nãa para
gramas d-e ouro."' americanosprivados, ma-spara um empreiteiro público, o Govêr-
Em 1940, os EstadasUnidos tinham que absorvermilhões no brasileiro.É sensacional.
As jazidasde ferro do Brasil sem-
de toneladasde trigo, milho, sementede linhaça, centenasde pre mereceram as atenções de potências estrangeiras. Já em
milhares de toneladas de carne, lã, couro, dos quais já são pro- 1937 a Alemanha e o Japão, demonstrandopositivo interêsso
dutores, de outros vizinhos bons do sul, quando já não podem estratégicopor' elas, teriam chegado a propor ao Govêrno bra-
sequer absorver todos os excedentesde produtos tropicais como sileiro de então assumir os encargos para a construção de urinas
café e açúcar. Por e-ssaépoca, a grande jomalista americana Do- de aço no B.rasil,em troca, porém, do monopólio do aço.aVar-
rothy Thompson,perplexaem face do problema,dizia: "temos 1 Feuerleine Hannan,obracitada,pág. 132.
l Sousa Costa, obra citada, pág. 105 2 Behrendt, em 7/ze Tofalífarfan 4ggresioriP a respeito informa: "A
2 Idem, pág. 97. despeito de um isolamento forçado pelo bloqueio, a Alemanha mostrou
3 Idem, pág. 106. interesseativo nas negociações
para instalar urinas de aço no Brasil em
4 Idem, pág. llO. 1940. Primeiramente, os nazistas se ofereceram a iüontar uma urina e

130 /3/
gas não ousa aceitar a proposta. SegundoChamisso, que dá essas Êsse simples motivo é mais plausível. Foí, provàvelmente,
informações, em seguida à recusa, procurou o mesmo. Govêrno, dia=nte das tentativas infrutíferas do Govêrno b.rasileiro e de
em 1938 (ano mesmo em qud Vargas esmagou o golpe inte- alto.sfuncionários americanos de encontrarem capitais privados
gralista), a United StatusSteel Corp. convidando-aa vir an
Brasil. O próprio Sr. Stettiniusaqui estêve. Peritosda empre- t dispostosao risco que o Govêrno dos Estados Unidos assumiu
os encargospara a vasta operação.Como se sabe, o Govêrno
sa estiveram in loco a examinar as jazidas e, segundo o mesmo americana concedia o crédito de vinte milhões de dólares a se-
informante, teriam mostrado grande entu-siasmo pela qualidade rem somadosà parte do Govêrno brasileiro, de vinte e cinco
do nossominério, chegandoaté a admitir que o carvão santaca- milhões.O Export-lmport Bank ficava com a prioridadesabre
tarinense, embora de qualidade inferior, poderia ser utilizado. o haver da emprêsae com a faculdade de supervi-sarsuas opera-
"No último momento, porém, a U. S. Steel recusou em razão ções. A assistênciatécnica americana deveria ser dada. Todo o
da situação internacional".x
''F
equipamen'tonecessárioteria de ser adquirido nos EstadosUni-
Na realidadea U.S. Steelnão estavainteressadaem um dos. O empreendimentomarca uma data nas relaçõesinterame-
empreendimento dêsses, nem nos Estados IJnidos nem muito ricanas. A cooperação entre Estados para a con-struçãode uma
menos no estrangeiro, no longínquo Brasil. Às voltas internamen-
te como problemade excedente
de capacidade
produtiva,re- já era evidente cedo no outono de 1940. Uma escassez de 4 milhões
sistindo à pressão de seu próprio Govêrno para que aumentas- de ferro guia, lâminas de aço e estruturasera prevista no relatório do
Escritório de Pesquisase Estatísticas,de StacyMay, na N.D.A.c.As pla-
se essa capacidade de produção a fim de poder atender às novas cas de aço e as estruturaspesadaseram um'l necessidadepara um pro;
encomendas governamentais para as necessidadesde armamento, gramanaval de dois oceanos. A indústria de aça opunha-seentretanto
não tinha ela realmentenenhum motivo para investir no Brasil. à expansão". Seu porta-voz na Comissão de Defesa do Senado, um Sr.
Feuerlein e Hannan dão versão ligeiramente diferente de sua re- Tower, afirmava: "A indústria de aço não prevê nenhuma necessidade
cusa. O Govêrno brasileiro tentara durante meses encontrar ca- de qualquer adição extensiva na sua capacidade". Se apareceremmu-
danças nas condições e surgir "uma necessidade urgente de entregas
pitais nos EstadosUnidos para monta:ruma urina de aço, na aceleradas . . . poderia superficialmente parecer necessário expandir a ca
base das jazidas de ferro de Minas Gerais. A U.S. Stee], depois pacidadeprodutiva como medida de emergência". Mas, acrescentava,só
de realizar uma investigaçãosabre a idéia, chegaraà conclusão superficialmente,
pois que "em tais circunstânciasseria muito mais prá-
de que os riscos implicados num investimento do tipo requerido tico suprir as necessidades do govêrno cortando temporàriamente nas
formas menos vitais de consumo". O Sr. Stettinius que deixara a pre-
eram demmíado gra/zdesapara que uma emprêsaprivada pudesse sidência da U. S. Stee] $ãra ser chefe da ])ivisão de Prioridades, acei-
corrê-los. tou o relatório Tower, rejeitando o do Bureau de PesquisasEstatísticas.
Stettinius foi, porém, compelido a encomendar novo relatório a um
depois propuseram transferir parte das urinas de armamento Skoda da elemento de sua repartição, Sr. Melvin de Chazair, que concluiu haver
Tchecoslováquia para o Brasil, em troca de matérias-primas". (TÀe escasseziminente. Stettinius ordena um quarto relatório pelo Sr. Gana
Economia De/e/zsc of fÀe }resfern ]lemíspAere, Washington, D. C., pág. Dunn, a respeitode quem o }raJ/ Sfreer Jozlnzal,a ll de janeiro de
128.) Assim, a Alemanha volta à carga em 1940, talvez para sabotar 1941, escrevia: "Os representantesda indústria !!qui exprimiram a - es-
o gesto dos Estados Unidos. perançade que o relatório do Sr. Dunn será mais favorável ao ponto
1 Chamisso, obra citada, pág. 181. de vista da indústria que os relatórios anteriores". E, finalmente, os
2 A U. S . Steel provàvelmente nunca estêveinteressada em criar qual- jornalistas Alsop e Kintner, pelo J7era/d TNZ)z/ze de New York, expressa-
quer usína de aço no Brasa, ou algures. Sobretudo tendo-seem conta vam o verdadeiroponto de vista da indústria de aço, nessestêrmos:
a preocupação que a dominava desde 1929: não voltar a ter capacidade "Os homens mais práticos do aço preferem esperar no futuro por um
produtiva sem mercado . Desde a crise, sua filosofia, como a das outras tempo de escasseze de preço inflacionário". (Cit.: por 1. F. Stone,
grandes corporações, passou a cultivar a escassez e não a superprodução Busf/zess
as Usual, Ã/odern 4ge Books, New York, 1941,pág. 149).
relativa. Êssefato, que causou escândalono país, provocou a formação Assim, quando o mesmo Sr. Stettinius estêve no Brasil para examinar
da comissãode investigaçãopresididapelo senadorTruman, para estu- o projeto de construir uma urina de aço no País, em sua mente,tudo
dar a necessidade
da mobilizaçãoda produçãode guerra.A propósito,o indica, concepção diferente Ihe ia trabalhando, em correspondência,
jornalista 1. F. Stone, que estudao problema a fundo, escreveu: "Que a porém, com a de seus outros colegas mais práticos, que alimentavam
capacidade de aço seria inadequada para a defesa e as necessidadescivis antes a expectativade escassez,com inflação de preços

132
urina de aço, até então dogmàticamenteconsideradacomo pre- acordo de quatro anos. O Equador estava, ao que parece, perto
cípua iniciativa de.capitais privados, abre um precedente perigoso demaisdo Canal do Panamá,o que para os americanosnão era
para as futuras i'eivindicaçõeslatino-americanas. A brecha aber- então confortável.
ta no muro do capitalismo
privadoé inegável.
Ela indicacom "Os latino-americanos, pret-ende Horace B. Davas, estão me-
clareza meridiana que só capitais públicos, iniçiativas públicas, nos persuadidos que os americanos do norte dos perigos do Eixo.
a que por vezes $e associam capitais privados, podem romper o É que, demonstra êle, se Natal é relativamente perto de Dakar,
subdesenvolvimento e instalar a grande indústria pesada na Amé- não é contudo mais perto dos EstadosIJnidos que a Espalha.
rica Latina. A propósito dessa transação única e generalizando Um poder hostil em Natal, ou mesmono Para, que pretenda
sabre .a situação, Chamisso observava: "Na época mais pro- atacar o Canal do Panamá, terá uma tarefa dificílima. Um exér-
fícua de cooperaçãofinanceira americana, 1939-1942, o emprés- cito invasor teria de galgar as montallhas ocidentaisda América
timo privado ficou atastcido;os empréstimosintergavertumatltais do Sul e poderia ser fixado e detido por um poder militar de
precbmfnzicmde modo abw/üío, trate-se do sustento monetário segundaordem. Em outras palavras, qualquer poder que quiser
a curto prazo ou de desenvolvimentoa longo prazo (Volta Re- invadir os EstadosUnidos terá de vír primeiramentepor água.
de)nda).No último, é de notar o laço estreitoentre a coopera- Enquanto a Marinha americana fâr forte bastante para prevenir
ção financ.eira e técnica". E acrescenta: "A cooperação finan- um desembarque hostil tanto ao norte quanto à América Cen-
ceira .apareceu freqüentemente ligada a uma contrapropaganda tral e às Caraíbas, o :terütório continental dos Estados Unidos
que visava ao Eixo".l Percy W. Bidwell, no prefácio aolivio de nenhum perigo cone".i
Feuerleine Hannan, acentuavacomo "o fato novo de mais im- Essas conclusões militar e geogràficamonteexatas não
portância que afetará a corrente de capital para a América Lati- esgotavamas implicaçõespolíticas e sociais da questão. Era
na.nos anos de pós-guerra será a participação dos governos dos claro que os Estados Unidos só podiam ser invadidos por água.
passe-s credores nas atividades de empréstimos. . . Mas serão Aliás, nessesentido um eminente cientista, insuspeito aos ameri-
necessáriasinversões muito maiores em campos que não dão canos e ao Govêrno de Washington, o Sr. Eugan Staley, ao de-
provàvelmente um rendimento imediato capaz de atrair capital molir a ''mito do Continente" e o "complexo de Hemisfério
privado": Até hoje, além de Volta Redondapouco se fêz em Ocidental'', corrobora o que diz Davas. O problema da unidade
virtude da mesma causa: sabotagem dos capitais privados desin- mítica do hemisfério merece tratamento à parte. É o que faremos
tere!.gados: A propria veleidade da Aliança para o Progresso mais adiante.
de Kennedy. foi dissolvida pela ação dos mesmos grandes inte- Ü
rêssesprivados.
Se Washington começavaa abrir a balsa para créditos e Na época da guerra houve verdadeira excitação, nos círculos
empréstimos, em compensação pedia alinhamento dos governos oficiais e interessadosdos Estados Unidos, para assegurar a in-
a quem servia em dólares; pedia bases, bases aéreas e navais; tegraçãoda América Latina ao complexo continental americano:
as missões militares americanas se instalaram por todo o Conti- a Alemanha desafiava WashiDgton, camercüZmam/e,politicamen-
nente, principalmente na América do Sul e notadamente no Bra- te, em toda a 4mérica Latina. Não havia tempo a perder. Sob
sil. A tragode créditos,o Equadoré convidadoa substituira
litüa aéreaalemãque Ihe serve,a Sedta,por uma linha ame- linha aérea a organizar-se na América do Sul. A Condor operava no
ricana,2e a aceitarforçasamericanas
para a suadefesa,num Child, Argentina, Uruguai, Brasa. O Lóide Aéreo Boliviano, na Bolívia,
a Lufthansa, no Peru, e a Sedta, no Equador, propiciaram à América do
1 Chamisso, obra citada, pág. 186. Sul uma rêde aérea que, através a Lufthansa, se estendia.à Europa. A
2 "Os alemães foram de decisiva imporâtncia no desenvolvimento dos maioria dessas linhas eram subsidiárias da Lufthansa.(Commercfal
transportesaéreosna América do Sul. A Scadtafoi fundada por antigos ,{viafion in file Repubiics of l.atin .America, Commercia! Pan Ámericalt,
pilotos de guerra alemãesque, logo após a Primeira Grande Guerra, n.o 89, outubro de 1939.)
iniciaram um serviço comercia! aéreo na Colâmbia. Foi a primeira l Horaçe B. Davas,obra citada, pág. 30.

134
a pressãodos acontecimentos,
o Cone.tesoaprovouuma lei que Os Estados Unidos tomam cedo consciência do perigo.
autor.izava
o Presidente
a mandara GuardaNacionala qual- SegundoPepin, os americanos resolvem contra-atacar a ofensi-
quer. parte das Américas onde houves-se perigo de penetração va comercialalemã,no Brasil, já em meadosde julho de 1937,
nazista. A lei, como era de se esperar, chocou a opinião de toda quando abrem ao País um crédito de 60 milhões de dólare-s,para
a América Latina. Na realidade,o Presidentenão poderia fazer restaurar suas finanças e fazer estancar a expansão do comércio
uso da lei, que violava em cheio os convênios pan-americanos de trocas com a Alemanha. Essa operação se realizava precisa-
aprovados e a solene declaração de não intervenção por parte mente no momento em que a Alemanha tomava o primeiro lugar,
de Tio Sam. Os alemãesativosno extremosul do Continente
levantavam protestos e conseguiam algumas simpatias em gru- 8%, enquanto a importância dêsse. comércio .global, permanecia esta-
pos restritos militares e oficiais. Chegou-sea dizer, em várias cionária 'em 6.7%: 'xna Grã-Bretanha decrescia fortemente, de 7,9%
a 4.99u e nos Estados Unidos subia de 8,5% a 11,4%. (J. F. Normano,
capitais latinas e em Washington, que a política nazista na Amé- T/ze SrrüggZe/or Soldra.4meríca, Boston e Nova lorque, 1931, pág. 32).
rica Latina visava a provocar a intervenção americana ali.' Behrendt, comentando êsse esforço da Alemanha após a derrota
Davasdá a informação citando o ]Vew york Tf/7&s de 9 de feve- na Primeira Guerra, de conquistar o comércio com a América Latina,
reiro. A política alemãcontinentalnão se limitava, é claro, a observajustamenteque é tanto mais de admirar -- considera-oespe-
tacular -- quanto não era apoiado numa política de empréstimosa
gestosde provocaçãonem a influir o-sEstadosUnidos a toma- longo prazo, como era o caso dos Estados Unidos, cujas exportações
rem medidas unilaterais capazes de ipcompatibilizá-los com a paraa AméricaLatinano correrdo períodode prosperidade
foram
opinião latino-americana. Graças à técnica do comércio bilate- amplamente ajudadas pelas concessões mtlito freqüentemente liberais
ral de trocas, os alemãesconseguiramem 1938 absorver l0,5qo demais de empréstimos para fins públicos às repúblicas latino-ameri-
do conjuntodas exportações
da AméricaLatina, em face de canas.(Richard F. Behrendt, T&e Toralfrarían .4ggresiors, pág. 114.)
16.89o da Grã-Bretanha. E forneceram no mesmo aDOcêrca de Depois do colapso geral de 1930, a Alemanha conheceoutro "re-
nascimentoespetacular"(Behrendt) do comércio com a América La-
17,1% do conjunto das importações latino-americanas, contra tina, a partir de 1934, já sob o regime nazista. Behrendt dá essas
a Grã-Bretanha que exportou 11%o das compras externas dos cifras em percentagens
dos paíseslatino-americanos
em relaçãoàs im-
nossos países.' portações e exportações totais com a Alemanha, entre 1912 e 1938:
importações de origem alemã por países -- Brasil, 1910-1912, 17; 1938,
l Os alemães, como era de se esperar, nunca perderam uma ocasião 25. Child, 1927, 14; 1938, 25,8. Colõmbia, 1913, 16; 1927, 9,5; 1938,
para soprar nos ressentimentos latino-americanos contra os Estados Uni- 17,3. Uruguai, 1912, 15; 1925, 11,5; 1938, 16,4. Quanto às exporta-
dos e nem sempre o que diziam era falso. A propagandadêles era in- çõespara a Alemanha:Brasil, 1912, 14; 1938,19,1. Child, 1927,6;
tensa em toda a América Latina, através jornais, revistas, clubes, fes- 1938, 10. Colâmbia,1913, 8; 1928, 1; 1938, 12,9. Uruguai, 1912,
tas, filmes. Seu ponto central era mostrar que aquela nada tinha a 18,4; 1925, ]5,6; 1938, 23,5. (])ados: Clarence F. cones, Commeme
ganhar numa aliança(subordinação) com Washington. A Alemanha o/ Soam ..4merfca (Boston, 1928) e t/ptíão Pa/z-.4meríca/za.) (Behrendt,
tinha mais a dar que os EstadosUnidos. Behrendtcita, a propósito, obra citada, pág. 114.) Em 1913, a Alemanha fornecia 16,55qodo
uma declaraçãoem }l/elfwírfsc/za/f,publicação mensal de Wirtsçhaftliche total das importações da América Latina, enquanto a Grã-Bretanha
Geselschaft, Berlim, dezembro de 1938, muito típica: "É segrêdo aberto fornecia 24,42%. De 1921 a 1930, a Alemanhíl forneceuuma média
que os norte-americanos sempre consideraram os Estados vizinhos do de 10,01%.Nos anosde 1936-1938,
pela primeiravez na história,e
sul como região colonial. A dominação americana, atualmente desman- durante três anos de rivalidade comercial sem quartel, a Alemanha
telada graças ao nacionalismo despertadodaqueles Estados,tem agora conservatenazmenteo segundolugar, fornecendo 15,4, 15,4 e 17,1%
de ser reconstruída. Êste propósito se revela por uma consideração obje- das compras latino-americanas,enquanto a Inglaterra recuava.de 14,5
tiva do desenvolvimento real das relações comerciais entre os Estados em 1936 a 12,6 em 1937 e a 11,6qa em 1938. (Lew B. Clark, Com-
Unidos e a América Latina. O programa do secretário de Estado HuJI peting for hein American Market, Annals of the Ámerican. .4cade.my
tem sido tal que as compras dos EstadosUnidos no Continente sul-ame- o/ Po/Ifica/ and Social ScfePzces, vo1. 21, setembro de 1940.)
ricano nem mesmo igualaram as vendas dos EstadosUnidos naquela (Behrendt,obra citada,pág; 115.)
região. Isso significa na prática um débito continuamente crescenteda Os ganhos da Alemanha foram feitos à custa da Inglaterra e. da
América Latina aos Estados Unidos". (Behrendt, obra çit. , pág. 125.) Fiança. O.s dos EstadosUnidos não foram afetadose, ao contrário,
2 De 1913 a 1928 o volume de negócios com a América Latina em continuavam a subir e quase na mesma proporção que os dos alemães.
relaçãoao comércioexternototal da Alemanhacrescerade 6,8% a De 1932 a 1938, a Alemanha exportava para a América Latina, em
}36 /37
isto é, o lugar. dos Estados Unidos, como fornecedor do Brasil. mente, senhora das r\las no Rio de Janeiro,t numa imitação,
O Ministra cousa Costa, no seu livro aqui já citado, informa do uniforme aos processos, iZogans e gestos, do nacional-socia-
que chefiada em meadosde 1937 uma missão económicaa lismo alemão. Há paralelismos curiosos entre os movimentos na-
Washington, onde firmara com o Govêrno americano "um acor- zistasnas ruas de Berlim que precederama subida de Hitler e
do pelo qual êstese comprometiaa venderouro metálicoao os movimentos integralistas que precederam o golpe getuliano
Govêma brasileiro, podendo à base de garantia dêsseouro serem de 10 de novembrode 1937. Os integralistasdesfilaramfarda-
realizadas operações de crédito quando o entendêssemos con- dos diante do Palácio Guanabara, em frente a Getúlio Vargas,
veniente. Utilizando a faculdade dêsse acorda, o Banco do Bra- que lhes fêz a saudação integralista.z Em Berlim, dias antes da
sil converteuuma parte de suasdisponibilidadesem poder dos ascençãoao poder dos nazistas, suas milícias penetraram o Wed-
bancos seus correspondentes em ouro metálico que se acha de- ding, o famoso i-eduto operário vermelho, desfilando na própria
positado no Federal Reserve Bank."i Deve ser essa a operação Alexander Platz, onde se situava a sededo Partido Comunista
a que Pepin se refere. A posição mais importante da Alemanha
na América Latina era o Brasil, ao lado da pequena Guatemala, l Em São Paulo uma frente única de todas as esquerdasconvocoua
cujo comérciosubia 265% em cinco anos,conformeinforma massa
trabalh?.dou
parao Largoda Séa 7 de outubrode 1934e
Guenther em in.çfde Z,aff# .4merica. Durante alguns anos a Ale- dispersouas milícias integralistas em parada militar armada visando a
manha estêve à frente na lista das importações brasileiras, coisa intimidar os operários e sindicatos, segundo a técnica usada pelas mi-
lícias fascistas e nazistas da ltália e da Alemanha. Houve então mor-
que se deu tambémcom o Child. Já na segunda
metadede tos e feridos. Desdeaquêledia, porém, os integralistasnunca mais
1938, depois da posição da Alemanha ter melhorado na primei- ousaram desfilar pelas ruas de São Paulo. (Ver jornais da época, so-
ra metade do ano, os americanos retomavam o primeira; lugar bretudo de São Paulo.)
(os empréstimosdo ano anterior e do início do ano explicam 2 Hélio Sirva, a propósito do episódio, testemunha:
em parte a reviravolta verificada em favor dêles). "Em seu encontro com Plínio, Vargas teria pedido uma demons-
O momento político vivido pelo Brasil então na e.sferana- tração a seu favor. Ou Plínio espontâneamente Iha oferecera. Porque
ambos procuravam iludir-se reciprocamente. É dessa intenção que
cional corresponde na esfera internacional a uma luta de acesa nasce ! parada dos cinqüenta mil. É possível que Getúlio contasse çom
rivalidade entre a Alemanha nazista e os Estados Unidos roo.- o desfile para impressionar os seus generais, mostrando-lhesque no
seveltianos. Há coincidências perturbadoras. Quando a influên- Exército e na.Marinha alguns milhares de oficiais saíam dos quartéis
e vinham saudá-lo, como um César, à varanda do Palácio Guanabara,
cia alemãem ascensão ganhapmição hegemónicano intercâm- onde se postavama seu lado o chefe militar da Presidência,general
bio com o Brasi], a estrêla da Ação Integralista sobe em flecha José.Francisco Pinto, e o fiador do integralismo, general Newton Ca-
nos céus políticos do País. Em 1937, a Alemanha ocupa o pri- valcânti, comandante da Vila Militar. Um observador arguto notaria
meiro lugar entre os exportadorespara o Brasil. A 10 de no- que não tinham comparecidoos generaisEurico Dutra e' róis Mon-
vembro do mesmo ano é o golpe instaurador do Estado Novo, teiro. . . Era.o ].o de novembro de ]937. O contingente da Marinha aguar-
dará o desfileenchendotodo o largo trecho que vai do Arsenalda
de inspiração ideológica francamente nazi-fascista. A prepara- Marinha à Avenida Rio Branco com o azul dos seusuniformes. Os
ção do golpe de Estado foi sustentada,publicamente, pela Ação militares desfilaram fardados e o restante dos integralistas, enquadrados
Integralista, militarizada, uniformizada, mobilizada permanente- nas suas classificações:Câmara dos Quarenta, Câmara dos(quatrocen-
tos, Núcleos, etc. etc. Homens e mulheres, velhos e jovens. Pareciam
os donos da terra.
marcos (Reichmarks) 235000000 no primeiro ano e 625000000 no O desfile integralista, enchendo a cidade da onda verde e sonora,
último. Na n'esmo época, os Estados Unidos exportaram para o mes- tornou-se um episódio do passado. . . Vergas o utilizara como o back-
mo destino: $220200000 e $564000000. A propósito dêsse desen-
groz/ndde uma nova-realização -- o 10 de novembro. Enquanto o País
volvimento, Beh'endt transcreve,aprovando-a,essa afirmação de amanhecia
surprêsasob o domínio de uma ditadura que duraria oito
Clark: "0 recorde da competição alemã na luta das nações do mundo anos e os mandatários do povo viam desvanecer-se,como a fumaça de
industrialpela rica prêsados mercadosda AméricaLatina é mais es- um cigarro,. os seus mandatos de deputados e senadores, os homens de
petacular que o de qualqueroutro país". (Obra citada,pág. 115.) camisa verde desiludiam-se de tomar o poder." Flélio Salva, "Rapsó-
l cousa Costa, obra citada, pág. 102. dia Verde em Cinco Ates'', Tríóüzzada /mprelzia,janeiro 1960.
138
dente de uma república parlamentar, ainda estilo alemão, é afi-
alemão e por ela passavam em desafio, sentindo-se já pràtica- nal chamadoa palácio, onde Getúlio Varias o convida.. . a
mente vitoriosos. ocupar uma Pasta de Ministro, a da Educação. O r'zzeArerna-
Como se sabe,foi o Gen-oralNewton Cavalcântio executor cional, entre desapontadoe ainda assim seduzida com a pers-
de um estranho"estado de guerra'' votado pelo Congressopara pectiva de ser ministro, voltou ao seu centro de operaçõese con-
dar ao Govêrno as condições necessárias a esmagar o comu- sultou os lugares-tenentes,recusando em seguida o convite. Em
nismo, também já então de complâ armado. (Tudo isso se ba- abril do ano seguinte, um punhado de integralistas combatentes,
seou Dum documento Cohen forjado po.r não outra ilustre perso- com Belmiro Valverde à frente, tentou o golpe fraca.ssado
do
nalidade que o General Mourão, um dos grandes chefes demo- assalto ao Palácio Guanabara. Depois disso, o r'ae/crer escreveu
cratas da "revolução" vitoriosa a l.o de abril, desencadeada
para um livro sôbre Crista e refugiou-seno abrigo de Salazar.
mais uma vez salvar o Brasil do comunismo.) O General New- Enquanto a conspiração se armava e as intrigas e confa-
ton Cavalcânti, integralistade quatro costados,promoveu a liga- bulações se faziam entre os pretendentes a chefe fascista, es
ção secreta entre o Chefe Nacional, Plínio Salgado,e o Presi- americanos intervinham junto aos canais competentes no senti-
dente da República, e ambos conspiraram francame:nte contra do de pâr um paradeiro ao avanço constante,desde 1934, do
as eleiçõesem marcha. Dessaconexãonasceuo acordo que se comércio alemão no País. O Dr. Chamisso, a proposito, per-
teria foral-ado entre Getúlio Vergas e Plinto Salgado; a parte guntava em seu livro se os Estados Unidos estariam conscien-
dos integralistas nesse acordo seria de ganhar as ruas e separar tes dêsseperigo. E respondia afirmativamente, "a julgar-se pela
abertura de um crédito de sessentamilhões de dólares ao Go-
as massasdas esquerdas,com a Aliança Nacional Libertadora
já dissolvida e jogada à ilegalidade. Enquanto as milícias inte- vêrnobrasileiro,com a promessade, em contrapartida,fazer
gralistas faziam o trabalho de intimidação das massasproletárias parar a expansãodo comércioalemão(julho de 1937), e isso,
com os seus desfiles, suas armas à mostra, suas violências ocasio- segundo Pepin, no momento em que a Alemanha tomava dos
nal.s -- tudo no mais puro estilo de fascistas e nazistas -- os EstadosUnidos o lugar de primeiro fornecedor do Brasil".i
agitadores integralistas tentavam mobilizar as massas pequeno- Na realidade,com a guerra e os êxitos iniciais de Hitler, a
burguesas contra as liberdades democráticas e as reivindicações ditadura brasileira vacilou bastante antes de alinhar-secom as
proletárias, ou ditas de e-squerda.Quando se.considerou chegado potências aliadas. Típico foi o discurso de Varias a ll de junho
i) momento do golpe, Vargas o dava com toda a tranqüilidade, de 1940, no cruzador Barroco. Nossa fala, que causou sensação
apoiado nos chefesmilitares de então, tendo à frente o General e mal-estar aos Estados Unidos, Vargas não mediu palavras
(róis Monteiro, como arquiteto militar do golpe e chefe do Es- para atacar as "democracias decadentes". F. Borkenau, no seu
tado-Maior, e o GeneralEurico GasparDutra, como seu es- livro T/e German Empire,8 cita declaração de oficiais brasilei-
cudeiro, na qualidade de Mi-nistro da Guerra. ros, em que se acusavaa Alemanha de ter'ajudado a montar o
leva-nte,"e certo número de representantesde firmas alemãsfo-
O desenvolvimento da situação não se processou como
pensara o Chefe Nacional Plínio Salgada: Getúlio Varias não
ram presossob acusaçãode traição. Intervençãodiplom-áticade
Berlim obrigou o Govêrno a libertar os alemãespresose a negar
seria o Marecha] Hindenburg do Brasi], nem Plínio Salgado o
nosso Hitler. Tendo o golpe sido dado sem pertubações, nem re- a participação' da Alemanha no levante. Em compensação uma
série de medidas contra a comunidade alemã no Brasil foi
sistências populares ou de esquerda, já destroçadas desde o fe-
tomada. Sob o impacto dessasmedidas, teve início significativo
chamento da Aliança Nacional Libertadora, Vargas dispensou movimento de alemães de nacionalidade brasileira de volta à
o apoio incomodo dos integralistas, vetado também p.or..pressão Alemanha"
militar. Como consolação,Salgado,que ficara de vigília, com
o seu estado-maior, no quartel-general do Partido, noite adentro, l Chamisso, obra citada, pág. 103
à espera do convite para ser colocado à frente do novo regime, 2 Penguin Books, Londres, 1939
enqlianto Vargas passariaa uma espéciede sinecura como Presi-

140

a
"As consequências no campo comercial não foram menos nesse país. Conseqüentemente, nesse caso, formação de saldos
sérias. Apesar de sua brilhante posição no comércio brasileiro, em favor do Brasil é vantajosa,o que já não sucederiacom
ou antes em conseqüênciados métodos pelos quais ela adqui- país em que pouco tivéssemos a adquirir ou quase nada a pagar
riu tal posição, a Alemanha despertou boa dose de má vontade a títulos de dívidas".i Trata-se, é claro, da Alemanha.
entre os líderes económicos do País. Foi fácil, por isso, para Borkenau conta ligeiramente os trâmites do acordo para a
Vargas contrarrestar a Alemanha na esfera das finanças. Em recobertura dos débitos alemães. "Depois de um mês de ne-
junho de 1938, a Alemanhadevia ao Brasil não menosde qua- gociações nervosas, um novo acordo foi realizado. O Brasil, afi-
renta a quarenta e cinco milhões de marcos (askl-marés) de dé- nal de contas,não podia dispensaro mercadoalemão.Não é
bitos consideráveis.(Como de uso, é impossível converter essa tanto o café. . . que importa nas relações comerciais alemãs-
quantia em libras esterlinas,uma vez que os m#i-marés só po- brasileiras, mas algodão e camz{. O Brasil. . . só muito dificil-
dem ser usados na Alemanha para compra de produto-salemães, mente poderia ter desenvolvido outras lavouras, especialmente
sem qualquer valor no mercado aberto). Nesse momento, o algodão, sem um escoamento na Alemanha. Contudo. no acor-
Banco do Brasil suspendeutodas as transaçõesfinanceiras com do de comércio renovado o Brasil conseguiu isenção do sistema
a Alemanha até a recobertura dos débitos alemães".l de aiç#f-mar#x para seu algodão e cacau. Êsses doi-s produtos
Essa é a época precisamente das grandes transações do têm sido pagos, desdo então, mo câmbio livre". "Assim, o Bra-
Expert-lmport Bank com o Tesouro Brasileiro e o Banco do sil é um dos poucos países que até aqui repeliram o avanço ale-
Brasil para regularizar os vaivéns do câmbio e problemas das mão com êxito. Enquanto se aproveita plenamentedo mercado
dívidas atrasadas com os exportadores americanos e os crédi- alemão, o Brasil evita tornar-se economicamente subserviente
tos com os paísesde moeda bloqueada. O Ministro cousa Costa, à Alemanha. No campo dos negócios internacionais, os Estados
como já vimos, fala, mas muito por cima, dêssesaperreios. As (Jnidos são os principais beneficiários dêsse desenvolvimento".z
dificuldades cambiais, diz êle, não eram "privilégio do Brasil",
e "grandes países,de grande influência no comércio do mundo, A descriçãodos acontecimentos
que dá Borkenaué certa,
forneceram exemplo de pressãoexercida por essasdificuldades' mas com algunssenões.Êle desconheciaentão a parte ameri-
E confusamente acrescentava: ''UDS, utilizando processos de cana no estimular o Brasil a reagir contra o comércio de troca
compensação, ei/rí/adie/z/e comercial (?) ou económico-finan- alemão. Sem os empréstimos e arranjos financeiros de que nos
ceira (?)". E explica: "À primeira hipótese se ajusta o nosso falam Sousa Costa, E. Pepin e o Dr. Chamisso, não é provável
tivesse o Govêrno brasileiro os trunfos financeiros necessários
intercâmbio com os paísesde moedasbloqueadas(quer dizer, a
Alemanha. M.P.); à segunda, as nossas relações com a In- para barganhar. Os alemãescederam, para não perder de todo
glaterra -e a França." Mais adiante, ao dar conta- dos acordos a partida. O algodãolhes era matéria-primaestratégicae fora
com o Expert-lmport Bank, refere-sea "outras reservas"que do Brasil não tinham, então, onde abastecer-senas quantidades
"permitiram fizéssemos o me-smo para a liquidação completa e com as facilidades necessárias.No empréstimo de sessentami-
das importações de outros países (sic) e assim em condições de lhões para as finanças desequilibradase comprometidas,inclusi-
ve pelos débitos alemães descobertos e condicionados a serem
mais perfeito equilíbrio e segurança,enfrentamos a situação ca-
pagos em compras nossas na Alemanha, se continha também a
lamitosa que pesa sabre o mundo".' E ainda a propósito do
acordo financeiro com a Inglaterra, numa linguagem tenivel- promessa do Govêrno brasileiro de suspender o sistema de co-
mércio por troca. E isso foi feito.
mente esopiana,em que a palavra tabu ''Alemanha'' não é men-
cionada, escreve: "A probabilidade de utilização do saldo bra- Vê-se claramente como às vésperas de entrar na guerra
sileiro na Inglaterra é evidente,dado o vulto de nossasdívidas contra o Eixo o Govêrno americano sentia que para poder ex-
l Obra citada, pág. 207. l Idem, pág. 109.
2 2
Borkenau, obra citada, págs. 207-208
Sousa Costa, obra citada, pág. 106

/42 143
aluir a Alemanha do comércio com o Brasil, sei'ia preciso dar dos, ajustes de dívidas e atrasados. E com a Alemanha um novo
ao país qualquer compensação. Roosevelt não regateava os meios sistemade comerciar.Tinha êle, com efeito, muito mais com
para mobilizar o Brasil a seulado. E o Ministro SousaCosta que barganhar que os senhoresmilitares ora no poder neste País.
podia por isso mesmo escrever: ''Sem falar no empreendimento Não só poeticamente a situação era favorável ao Brasil; tam-
máximo de nossa história económica -- a execução do plano # bém financeiramente a posiçãço brasileira era bem mais sólida,
siderúrgico cujo aspecto financeiro já é conhecida do País -- por contar então com substanciais reservas metálicas a garantir
exclusivamente para empreendimentos reprodutivos e com o suas transações financeiras e $ua moeda. Teve ainda durante bas-
fim de aparelhar as nossas fontes de riqueza, temos comprado tante tempo a possibilidadede jogar em relaçãoà Inglaterra e
a prazos médios de dois a ci:nco anos materiais financiador pelo aos Estados Unidos, com a ameaça da concorrência alemã no
Expert-lmport Bank, no valor de 12 731 900 dólares (14 na- P. seumercado.E tinha a seguiruma guena mundialde cujo des-
vios para o Lóide Brasileiro; 1 000 vagões e 17 1acomativas fecho não se tinha certeza para que lado penderia. E, final-
para a Central, 3 navios-tanques
e outros materiaisferroviários mente,com o desenrolarda guerra,a expulsãoda Inglaterrado
para a Central.)".: Continente,o seu virtual cêrco e bombardeio, a Europa domi-
Êsses materiais, como se vê, são destinados a reaparelhar nada pelas forças da Alemanha, os Estados Unidos que, afinal,
o País para os transpor.tesde materiais estratégicospara a pro- entravam nela, não .tinham outro caminho para alcançar o ini-
dução de guerra americana.A ditadura estadonovistaprocura- miga senãopela África, via Brasil. A posiçãoestratégicado País
va adaptar-se às exigências económicas da grande potência de- se revelava assim indispensável à defesa dos Estados Unidos, mas
mocrática, senhora cada vez mais do campo económico, na sua sobretudo a seu plano ofensivo contra o Eixo.
preparação franca para a guerra e ressalvar ao mesmo tempo Quanto aos americanosdo tempo da guerra, não ficaram
sua fidelidade à ideologia fascista em que se fundava. Em se- nessesempréstimosde ajuda, mas de alguma forma ainda com-
tembro de 1939, a guerra afinal -sedeclara na Eui.opa com a patíveis com certas regras de !inaiiciamento regular entre Es-
invasão da Polânia pelas tropas de Hitler, depois de terem asse- tados. Mas, como disse Chamisso, "êles se viram constrangidos
gurada sua retaguarda a leste graças ao pacto Stalin-Hitler, mal a empregar contra o Eixo, como contramedidas, os mesmospro-
acabado de assinar-se. Pois também em setembro do mesmo ano. cessosdiplomáticos
e estratégicos
de que o Eixo era useiroe
Roosevelt despachavaao Brasil o Sr. Warren Pierce, Presidente vezeiro''
oze a
do EJlport-lmport Bank. O Ministro Sousa Costa falou dessa Um dos recursos de maior significação usados por Wash-
presença iia Rio como se tudo fôsse obra do acaso, mera "visita' ington para afastar c concorrente alemão dos materiais estra-
(de cortesia? férias?) daquela eminentíssima personagem dos tégicos foi o que ficou denominado com os "acordos preclu-
altos círculosda CasaBranca: "Em setembroúltimo. visitou sivos". Com êssesacâi.dosos Estados Unidos ficavam com o
o nosso País. . ." é assim que escreve o Ministro em seu livro. direito exclusivo à compra dêste ou daquele material interes-
Aliás, é preciso convir que o chamado Estado Novo tinha sante.Entre maio de 1941 e janeiro de 1942, Washingtonassi-
então muito com que barganhar ju-nta às grandes potências que nou acordosdêssescom o Brasil, Bolívia, México e Child. Com
com o Brasil faziam negócios.Vimos como a Alemanha hitleria- o Brasil a exclusividade, por dois anos, ficou sabre o manganês,
na tevede se sujeitar à condiçãode continuar a adquirir o nosso titânio, diamantesindustriais e mica, bauxita e quartzo. O acor-
algodão e cacau não pagando em marcos compensados mas em do com a Bolívia foi feito com o grupo Hochschielde Aramayo
câmbio livre. Dias depois do golpe do Estado Novo, o Govêrno }

em terno do estanho, com duração de cinco anos. A compra


suspendeo pagamentodas dívidasexternase institui o mono- pela Metal ReserveCorporation, sucursalda R. F. C., de 18 000
pólio do câmbio. Depois dessasmedidas vai barganhar à direita toneladas de estanho, representava então metade da produção
e à esquerda,com a Inglaterra, a Suíça, a França, os EstadosUni- mundial. Antes, os Estados Unidos adquiriam o estanho na
Malária, ou ainda em Liverpool, onde era fundido o minério
l cousa Costa, obra citada, pág. 107. do grupo Patina; os interêssesdêste grupo não tomaram parte
b
144 /45
nessecontrato. O primeiro acôrdo nessesentido remonta ao fim própriasarmasdo inimigo. Olivier Long que estudouexata-
de 1940. O curiosoda.operaçãoé que a Metal ReserveCorpo- mente o problema em seu livro Z,ex Efa/s U/zfs e//a Gralzde
ration adquire o estanho, estaca-o, constrói uma fundição em Bre úaglzedevamf Ze /// ReícÀ, publicações da Faculta des Sciences
Taxas City (e não.na Bolívia mesmo) para transformar o esta- Economiques et Socialas de I'Université de Genêve. 1943,
nho boliviano (valor: 3 500 000 dólares), tudo por conta do + mostra como os americanos fizeram dos acordos recíprocos de
Govêrno. Com êsseprojeto, visava-sea fundir l/i do consumo comércio(regiomZ /rede agreemenfx)uma arma eficaz contra
dos EstadosUnidos de minério boliviano. Outro acordo interes- os processosdiscriminatórios de comércio instituídos pelo lll
santefoi o de maio de 1941 em terno do tungstênio (indispensá- Reich. Vários foram os casos em que dessa forma conseguiram
vel à fabricaçãode aço de alto teor para armamentosj.Seu impedir a expansãoalemã. O outro meio de barrar essaexpan-
objetivo político.foi afastar o Japão que tudo fêz para ante- são foi, como já vimos, o dos empréstimos de Govêrno a Go-
por-se aos Estados Unidos, oferecendo;melhor preço. Não o vêrno, como se deu com o Brasil. A Alemanha fazia com os seus
conseguiu por não poder assumir um compromisso de exclusi- clientes sul-americanos acordos de compensação (cZear/lzg). O
vidade por três anos. AÍ estava o nó do problema dos contratos acôrdo recíproco americano, em contraposição, visava a livrar
exclusivistas. Os japonêles compravam 'vastas quantidades de os mesmospaísesdos laços das contas bloqueadas. E Long cita
nitrato e de cobre ao Child que e;am, em parte, distribuídos com o acordo recíproco Estados Unidos-Equador que visava a evi-
a Alemanha. Os Estados unidos entraram no mercado e em tar as contas bloqueadas e também a evitar que a cláusula de
pouco tempo sua percentagem Das exportações chilenas dêsses nação mai-s favorecida concedida pelos Estados Unidos fosse
produtospassavade 15% ém 1938 a 58qo em 1940.Em 1941 beneficiar os paísescom os quais o Equador tinha acordos de
suas compras crescem.am
ainda para atender ao consumo interno clealqng}
em expansão e se fêz necessário ao próprio Child aumentar sua Graças aos acordos recíprocos os Estados IJnidos conse-
produção de cobre. Os contratos exãusivistas são o meio de os guiram reforçar sua.posição na América Latina já antes de
amuicanos açambarcarem a produção dos materiais estratégicos 1939Z enquanto a Alemanha atingia o auge de sua open-sovano
dos países latino-americanos, pois que babavam as relações sentido de açambarcar o mercado latino-americano em 1937.
comerciais dêssescom qualquer país'de. fora. As potências do Onde a luta comercial foi talvez mais ásperaentre Alemanha,
Eixo eram assim eliminadas, uma a uma, do acessoàs matérias- EstadosIJnidos.! Inglaterra foi m-esmono Brasil. A propósito,
primas da América Latina.. O Japão foi o último a sê-lo. A Long escrevem ''Pode-se afirmar sem mêdo de exagerar 'que a
mudança na pauta do intercâmbio comercial é característica oposição fundamental e estrutural dos métodos comerciais dos
das necessidades
da época. Os EstadosUnidos, ao invés de Estados Unidos e da Alemanha provocou entre êssesdois países
continuarem a importar quantias cada vez maiores de bananas, verdadeira guerra económica que causou o maior mal a seus
h'utas, cacau, importam manganês,tungstênio,quartzo. Com i:ntercâmbioscomerciais e aos que entretinham com certos ter-
êsses acordos exclusivistas de absorção da produção latino-ame- ceiros países." (Notadamenteda América Latina.)
ricana necessáriaà máquina de guena e os acordos recíprocos A expansão paralela e competitiva comercial dos Estados
os Estados Unidos fizeram também, diz Lona, desde a origem Unidos e da Alemanha na Amériça Latina se deveu em parte
um instrumentode luta contraas discriminações,
quer dizer, ao declínio relativo, verificado por essaépoca, do comércio com
de fato, contra a economiadirigida tal qual a praticava a a Inglaterra. O recuo comercial britânico intensificou, com efei-
Alemanha.i ')

r to, a luta alemã-americana


pelo controledo mercado
latino-
O problema do comércio alemão discriminatório não se americano. Os alemães, pela fôrça das coisas, estavam conde-
extinguiu com o impasse brasileiro; prosseguiu pela América nados a perder na luta. Não foi tanto a necessidadede se retirar
Latina, obrigando america:nos e inglêses a reagirem com as do campo para concentrar-sena guerra na Europa que os con-
l Chamisso,
obra citada,pág. 203 l Idem, págs.92-93
4
/47
denou. Seus movimentos podiam ser mais ou menos livres no
Continenteeuropeu.Fora daí estavabarrado pelo poder maríti- ciavam Cardenas,ao procurar ajuda-lo no grave conflito com
mo inglês o acesso dos barcos comerciais alemães aos nossos os trlstqs petrolíferos.). O desenvolvimento do conflito, prosse-
portos. Assim, a Inglaterra cedia na competição comercial na gue Borkenau, trouxe à tona quão perigosa era (para o; Esta-
América Latina aos dois outros competidores.Mas seu poder
marítimo de algumaforma protegia ou cobria parcialmentea
+ dos Unidos) naquele momento qualquer ação enérgica contra
os pequenos vizinhos do Continente. A conseqüência seria con-
mercadoria americana nos nossos países da concorrência alemã. vidaros alemães
a entraremno México.As taxasimpostasàs
O declínio comercial britânico ao cabo favorecia a vitória comer- companhias petrolíferas, escreve nosso autor, poderiam ser insu-
cial americana sabre o concorrente alemão. Os alemãestinham portáveis às mesmas.De qualquer modo Sà' Henry Deterding
porém outros cartuchos a queimar. BI'ardiam a arma ideológica e colegastinham a certeza de que em caso de ruptura não
e a intriga política com mestria.Não havia incidente político ou ''+ seriam êles os perdedores, já que o Govêrno mexicano não en-
económico que surgisse nas relações latino-americanas com os contram'iaonde colocar o petróleo expropriado. E assim seria
EstadosUnidos de que não se aproveitassempara abrir brechas se..ainda existisse de fato a solidariedade entre os podêres "capi-
nessasrelações. Uma das grandesoportunidades para essainter- talistas" que quinze anos antes haviam impedido os russosde
venção foi .aberta pelas expropriações do petróleo anglo-ameri- obterem empréstimos estla:ngeiros em têrmos aceitáveis. É que
cano pelo PresidenteCardenai, no México, em 1938' A opor- nesse ínterim o fascismo havia aparecido.x
tunidade era de ouro
À Alemanha não interessavam' as reclamações inglêsas e
Borkenau, em seu livro já aqui citado, conta os episódios americanas,pois precisava terrivelmente de petróleo. Estava em
do acontecimento: "Os esforços alemães no México prosseguem condiçõesde fazer uma boa barganha com o México e com isso
desde o advento dos nazistas ao poder." A propaganda alemã tirava o Govêrno mexicano de dificuldades, assumindo uma
descartava o caráter "marxista" da revolução mexicana, susten- posição simpática junto a êle: provisão de petróleo e excelente
tando haverem a Alemanha e o México acabado sua revolução posição pam aduar no hemisfério ocidental. As companhias,
nacional, e que portanto deveriam ser aliados. O forte senti- porém, ainda contavam com um trunfo: os navios de trans:
mento antiianque em certos setoresda opinião pública mexicana porte. Onde acha-los? Eis que uma firma americana. W. R.
dava uma chance a essapropaganda. No contexto de inimizade Davies,z aparece e contrata com o Govêrno mexicano uma vasta
contra os estrangeiros até mesmo a propaganda alemã anti- parltda de transporte de petróleo, em sua grande maioria para
semítica causava efeito. No conflito com os podêres aiiglo- a Alemanhae o resto para a ltália. Outra parte foi também
saxões,o México aceitaria de bom grado qualquer aliado. O transportada por.tanques japonêses e assim é que a esquadra
efeito, entretanto, dessapropaganda,era limitado, porque na alemã foi em 1938 abastecida com o petróleo expropriado pelo
esfera puramente política o Govêrno mexicano inteiro era acen- México. O acordo, começado com dois milhões de barris, logo
tuadamenteantifascistapara ter a Alemanha como aliado pró- passou.a doze e depois a dezesseismilhões. Dêsses,quinze mi-
ximo. Os nazistas passam também a apoiar os adversários do lhões foram entregues à Alemanha em 1938. Assim, só dez
Govêrno, sobretudo um caudilho, Governador de San Luas de milhões,num total de vinte e cinco milhõesda produção,fica-
Potosi, General Cedillo, suspeito de preparar um levante e ins- ram no Méxiéo, que pede enviar uma parte à ltália e a outros
talar no México um regime próximo ao de Fra-nco. Cardenas ise
países
contra-atacoue a opinião pública ficou convencidade que os $ O plano das companhias expropriadas fracassava.O resul-
alemães estavam envolvidos no caso. (Como no Brasi], mas
com diferenças radicais. Aqui integralistas, alemãese Govêrno tado foi o que se esperava:em 1939, a Alemanha manteria o
eram aliados ideológicos. No Médico, política e ideologicamente 1 Obracitada,pág. 210.
o Govêrno de Cardenasera o oposto do de Getúlio Vargas. No 2 Ao que pareceessafirma era controladapela Ford Corp., cujas
México, emboraconspirandocom Cedillo, os nazi-starinfluen- ramificações internacionais iam dar nos trastes alemães que. iriam de-
t sempenhar papel tão importante na guerra.

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primeiro lugar nas exportaçõespam o México. Entregavaao muito forte e perigosa.Presentemente,isto é apenasum sonho."2
México, em troca do petróleo, maquinaria pesada, equipamentos Alguns.mesa! depois de escritas essaslinhas, parecia que êsse
para irrigação, agricultura e refinarias, máquinas de escrever, .+ sonho ia realizar-se. Em maio de 1940 já se lüvia quase com-
instalaçõespara escritório, máquinas fotográficas, etc. A influên-
cia alemã, apesar da-s divergênciasideológicas e de filosofia
r n' pletado:. a Fiança caída, a Europa ocupada, a Inglaterra com
água pela baça, sitiada: só a esquadra inglêsa ainda estava
política, começava a ser ameaçadora. Borkenau escreve: "0 pràticamente intata e protegia a América Latina da penetração
México é talvez o único caso em que, graças à política especial alemã. Os Estados Unidos, naquela época despreparados'ou
das companhias de petróleo, os métodos alemãesde coméi'cio semidesarmados, não tinham ainda as fôrças navais necessárias
atearam inteiramente em favor da política alemã."i para substituir a esquadra hglêsa nessa tarefa.
No México não terminava essa influência, pois se fazia A guerra económica que a Alemanha vinha levando a efei-
sentir ainda maior em certas áreasda América Central. Guate- to não consistia apenas em vencer a concorrência, através dos
mala devia ser consideradazona de influência alemã. diz Bor- ask!-p?zarkse das contas bloqueadas em alguns mercados da
kenau, com um ditador local a imitar o nazismo o melhor que matérias-primase gênerosprimários. Ela a levava a efeito em
pode e a Alemanha preponderando no comércio. Para o autor, muito maior profu=ndidade no interior mesmo dos países que
a Alemanhaera ainda em tôda a América Latina um sério iriam ser seus inimigos na guerra. Seja-nos permitido pequena
competidor comercial da Inglaterra, embora de pequeno efeito digre?sãopara situar êsse esforço alemão em profundidade'den-
sabre os Estados IJnidos. Em política, porém, dava-se o inverso. tro duma certa perspectiva histórica. A Alemanha nunca se
A influência ideológica permanecia, enquanto a económica de- distinguiu, na sua categoria de potência imperialista, como
clinava. No entanto, a influência alemã declinava na América grande exportadora de capitais ou investidora no exterior, pela
Latina, I'econheceêle, tanto no comércio como na política, em menos em escala comparável à da Grã-Bretanha, Fiança,
geral ''quando e onde os grandes países democráticos faziam Estados Unidos. Em 1914, estimavam-se os investimentos ale:
um contra-ataque". "Isso será, contudo, diferente", conclui, ''se mães na América Latina em $836.000.000. em face dos
a Alemanha conseguir dominar o Continente europeu e quebrar $ 3.672.000.000 da Grã-Bretanha e $ 1.649.000.000 dos Esta-
o impériobritânico". (Não esquecerque êleescreviaem 1939.) dos Unidos.i Calculava-se,então, que 16,2% de todos os in-
"Então, a ameaça à América Latina tornar-se-á sem dúvida vestimentos alemães no estrangeiro estavam na América Latina,
comparados a 20,1qo da Grã-Bretanha e 36%o dos Estados
l Numa carta publicada em Bo/e/ím Fízzalzceíro,
México, D. F., de Unidos. Depois da Primeira Grande Gue.rra, os investimentos
30 de julho de 1939,o adidocomercialda Legaçãoalemãdizia aos -+
na América Latina de cidadãosalemãesnão residentescaíram
mexicanosquc deviam ser gratos à Alemanhu por tê-los capacitado
a sustentar sua política de petróleo enquanto o comércio com outras quasea zelo e anda nos idos de 20 não pareciaterem recupe-
nações caiu por causa das expropriações das terras petrolíferas. Não uma vez que a Alemanha não aparecia entre os quauo
se deve esquecerque o México, em face da situaçãomais caóticapara principais países inversionistas depois da guerra. (Behrentlt dá
sua economia devido às exportaçõesde petróleo, só encontrou apoio !aãmeA. Zuloaga, em The Internacional Economic Retatiom of
eficaz no mercadoalemão(e em menor extensãono mercadoitalia-
no), e por isso mesmofoi capaz de manter sua política de petróleo" Z:afí/z .dmerlc#, Com/zzercüZ Pan .4merfca, janeiro de 1941,
(Vida Behrendt,obra citada, pág. 124.) Pode-sedizer o que se quiser como fonte da ülformação.) Assim, os investimentos alemães
a respeito dessa declaração, menos que não fosse verdadeira. Se a nunca foram muito importantes. O pêso do esforço alemão em
Venezuela de Bittencourt, na crise da expropriação das companhias
petrolíferas americanas pelo govêrno revolucionário cubano, tivesse po- 2 Borkenau, obra citada, pág. 213.
dido ou querido pâr à disposição das refinarias cubanas o petróleo l Fontes: Pablo M. Minelli, i:as //zversío/zes //zfer/zacío/lajes e/t Ja
que os trustes passarama negar a Cuja, a situação seria outra. Cubo Hmerlca l,afina(La cabana, 1939) ; 7Ae RepwbJ/cs of Soldra .4meríca,
não teria sido "expulsa" do Continente e a América Latina subdesen- The Roya[.]nstitute of ]nternationa] Affairs, Londres, 1937; J. F.
volvida não estaria humilhada, dividida, impotente e subjugada à von- Normano: Tlzc. Srrugg/e /or Sozí/à ,4meríca, Bcston e' Nova' lorque,
tade de Washington. 1931. (Ver i3ehrendt,obra citada, pág. 120.) ' '
e a Alemanha,dizia ainda a me-smafonte, ''gozavamem con-
geral se concentrou no plano comercial, na conquista dos junto 46%odo total do comérciodêssestrês países".Com a
exportação dos capitais vieram os bancos. Naquele ano, a Amé-
mercados. premi, o grande investimento alemão no Brasil era rica do Sul contava com cinco banco-s inglêses e setenta agências
o seu imigrante, o colono que aqui chegavapara estabeleceruma e cinco bancos alemães com quarenta agências. Mas eram essas
nova sociedadee não como ave de arribação?para enriquecer ligações, digamos, de superfície.
e partir.: Foi êsseimigrante-colonoque.contribuiu para a for A Alemanha, diferentemente de inglêses e americanos, iria
mação de uma indústria regional no' $ul .do País, na base do contar com laços menos imediatamente poderosos, mas que des-
artesanato, aperfeiçoando-se, progredindo, à medida de sua acei- ciam em ramificações as mais longínquas pelo País. Nesse sen-
tação progressiva. Ela nasceu pnncipalment11pelo esforço orgâ- tido, um admirável estudo de Ernst Wagemann sabre a Coloni-
nico, sem ser "por obra e graça de grupos financeiros, .armados zação Alemã no Espírito Santos mostra até que recantosde
de concessões" . . (Limeir; 'pejo, citado por F. Carneiro). AÍ
colonização aquêles laços podiam alcançar. Descrevendo com
estavam os verdadeiros investimentos alemães. Êsses núcleos de precisãoe minúcia a vida de colonosalemãesem sítiosde café
civilização na terra virgem, criadores das primeiras riquezas da de zonas ainda económica e culturalmente isoladas daquele pe-
sociedade, resistiam às intempéries políticas que desabavam.:dos queno Estado, Wagemann revela o papel do vendeiro nas'li-
altos centros internacionais. Quando estas passavam, os antigos gações do -colono perdido com o Úuiido germânico exterior:
colonos, os filhos dêles e os novos colonos continuavam a mou pois que entre êssesvendeiros diversos ''eram alemãesdo Reich
rojar com desenganos a mais,. possivelmente e preconceitos com boa instrução", e que entre a venda e a casa comercialde
te;luzes difíceis de serem dosarraigados, sobretudo nessesnúcleos prim?ira classe nos centros u-rbanos, "nos pontos chaves estavam
regionais culturais separados, nos quais. a permanência ê a regra, alemães do Reich ou alemães nativos". Os pequenos sitiantes,
as mudanças a exceçãoe as divergênciassociais e .políticas ten- desprotegido! pelos cafundós do País, que não procuravam en:
dem a fixar-se, irracionalmente, em temíveis idiossincrasias pes-
riquecer, acabavam achando quem velaãe por êles. Pastores de
comunidadesprotestantes organizavam comitês económicos por-
que se interessavam"firmas trutas do Rio de Janeiro e da Ale-
manha", .destinadosa ajudar o pequeno sitiante isolado e sem
recursos "e salvar, nacional e culturalmente, os alemãesno Es-
me ll,'atirava se ela também à conquista de mercados e de pírito Santo'.: Para a formação do Comitê Económico, informa
zonas de influência, a uma política marítima colonial, em suma; Wagemann, "o Sindicato de Potassa alemão tem prestado gran-
Em a épocado nascimento
do imperialismo
moderno,comojá des serviços à causa"
vimos. Em 1896, o Reich suspendia a velha ordem de pmibição
Assim, o.braço dos grandes trustes alemães chegavade
de imigraçãopara o Brasil, ainda da Época,da esc.ravidão; :a um. modo ou de outro até os mais longínquosrecantosdo País,
Alemanha então se entregava,com o novo Kaiser, a construir
uma frota de guerra capazde rivalizar com a inglêsa.Por essa onde pudessemrefugiar-se teutos desprendidosda mãe pátria
em geraçõesou recentemente. Os episódiosacimadescrit(;ssãa
época ainda se iniciam os grandes investimentos: alemães no de antes da Primeira Grande Gueri.a. A guerra veio, a Alema-
exterior. Acompanhandoos inglêses,capa!aisalemãeseram in- nha perdeu-a. E retrocede. Pelo Tratado de Versalhesela é

H ãiüuuisnuiiauú:!= excluída do mundo colonial. Mas isso vai força-la, fundando-se


na superioridadeabsolutade sua indústria químicae na sua alta
qualificação tecnológica, a organizar seus grandes trustes nacio-

M lg: Ug S:MÍB gU(lg


nal de Geografia) . f
l Ver Boletim Geográfico, dezembro de 1948, Conselho Nacional de
Geografia .

/52
nauspara serviremde rêdepara alcançaros mercadosdo mundo. um lado, e, de outro, pela penetração comercial propriamente
Agora os objetivos económicose comerciais são postos à frente. dita, ou uma política deliberada,em que se envolviamcomer-
Ela tem a refazer seus capitais, suas bases de penetração comer-
ciantesprivadose o Estado,na conquistade mercados.
Antes
cial pelo mundo todo e pela América Latina em 'particular. de Hitler, o que havia de pròpriamente "político" no esforço
Depois, quando o nazismo sobe ao poder, os objetivos de domi-
{

emigratório e colonizador era uma assistênciageral do Govêrno


nação política ressurgem,agravadoscom uma vontade totali-
do Reich no sentido dêssesnúcleos Dão perderem nem os con-
tária de "coordenar",de "integrar"no sistemaaté o mais es- tatos nem os laços de toda ordem, esphituais, materiais, com
condido, isolado, já caboclo,entre os velhos e pequenossitian- a Alemanha. Que êsse-snúcleos mantivessem, apesar da dis-
tes do mais obscuro e perdido núcleo colonial.
Dentro do País, as inversõesdietas dos súditos alemães tância, do isolamento,a lealdadepara com a velha matriz ger-
mânica, era o que importava. Disso se nutriam os sonhos da.
residentes pemianentes, ainda cidadãos do Reich ou já cidadãos Deutschtum no estrangeiro.
brasileiros, mas guardando as características e sentimentos de
Dentro das comunidades e colâDias germânicas no estran
suas origens, .eram.os naturais entrepostos para as importações
da mãe pátria. Além das indústrias nascidas de artesanatos genroos súditos podiam alimentar outras lealdadesparticulares,
como ser desta ou daquela seita religiosa, dêste ou daquele par
locais ou de atividadesagropecuárias
que foram as que deram tido, etc. Com o advento do nacional-socialismo tudo mudou.
o traço peculiar e saudável ao desenvolvimento industrial e
Os laços foram apertados e precisados, as diversas lealdades
cultural do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, os alemães particularesforam condenadas,para bó restar uma lealdade: ao
tenderam também a espalhar-seprimeiro pelas áreas adjacentes Reich, ao /'ae/crer, ao Partido. 'lodo cidadão do Reich residente
e depois pelo !esta .do País, trabalhando não já em áreas da no estrangeiro,todo descendentede alemãesfixados nos velhos
indústria.manufatureira pròpriamente dita, mas no que os ame-
ricanos chamam de "serviços", especialmente hotéis, restaurantes, núcleos de.imigração, tinha uma sujeição direta, política, ideoló-
pensõespelas cidades e subúrbios das capitais e pelos lugares gica, racial, não à Alemanha, mãe espiritual, cultural, abstrata,
mas ao Estado alemão, personificado em Adolf Hitler. A com:
de veraneio e pitorescos dos países latino-americanos. Encon-
quieta de mercados, os interêsse.s capitalistas dos investidores
tram-se .pequenos hotéis, restaurantes, pensões alemãs por toda
a América Latina. Constituem êssespequenoscentros de ativi- ficavam subordinados à política de coordenação, de integração
dades consumidores naturais de produtos da Alemanha. A totalitária ao Estado alemão -- nãa sistema político-jurídico,
importância em dinheiro dêssesinvestimentos alemãe.snão se mas organismo por assim dizer biológico.
conhece; não .figuram êles nas cifras das grandes inversões dire- Outrora, se a insuficiência de capitais era substituída pela
"organização exemplar", esta alcançava sua máxima exempla-
tas de capital estrangeironos nossospaíses.Normano, a pro- !idade na conquistade mercadospara os produtos da metrópole.
pósito, observou muito bem que "a Alemanha tem substituído
Nessecampo,.vimos como antes mesmo de se tornar uma polí-
em geral sua falta de capitais por uma organização exemplar",
chamando também a atenção para o fato de que os bancos tica oficializada do Estado, de ser coordenadapelo Estadotota-
litário nacional-socialista, a conquista dos mercados extemos
a[emães costumavam recorrer, ém larga medida,' aos depósitos
e capital's nativos para financiamento de emprêsas na América pela grandeindústria alemã foi na realidade toda uma política,
0 U obra, inspiração dos grandes trustes e cartéis alemães,os quais,
como vastas bacias de formiga, espalhavam .ramificações em
Assim a penetraçãoalemã na América Latina distinguiu-se todos os países,inclusive pelas grandes corporações americanas-
sempreda dos seusoutros rivais por dois traços fundamentais: Foi a formação dêles que caracterizou o surgimento da fase
pelo transplante através da emigração e colonização de verda- imperialista do capitalismo alemão.
deiras"mudas"de civilizaçãoe de culturada mãepátria,de Nesse terreno, a arma absoluta dêste foram êssescartéis
l J. F Normano, obra citada, pág. 224 nacionais com suas rêdes e associaçõesinternacionais. Como
já vimos, através da obra de Joseph Borkin e Cha-rlesA. Welsh,
154
Gera-a/zy's À/aszer P/an (Duell, Slo.an and Peace, N. Y., 1945),
a Alemanha havia organizadouma espéciede central de cartéis arranjo para o reembolsoà 1. G. do dinheiro adiantado à Du-
que nas mãos do ditador alemão se transformou num formidável perial para compra de açõesna última companhia,visto ser im-
instrumentonão mais para obter lucro apenas,mas para alcan- praticável para 1.C. 1. estar em relações de participação com
çar vastosfins políticc>s
e sociais.ThurmanA. Arnold, famoso a companhia alemã. A Companhia Dupont informou à 1. G.
procurador-geral da época de Roosevelt, denunciou em prefácio que ela tenciona usar seus bons ofícios depois da guerra para
restaurar a participação da 1. G."i
dessa mesma obra a cumplicidade das grandes corporações
Outro episódio marcante foi o da cartelização de toda a
americanascom os cartéis alemãesinstrumentadospor Hitler.
Êsse amaciamento das grandes corporações americanas pelos indústria de anilha do mundo. As interconexõesmais impor-
tantes foram feitas entre Dupont e a InternatioDale Gesellschaft
cartéis chegou a um ponto em que o procurador as acusarapelo
fracasso da expansão industrial americana antes de Pearl Harbor. quer Chemische Unternehmungen (subsidiária da 1. G. Farben
[ndustrie A.C.), entre ].C.]. e ].G., entre esta e o Cartel
As coi.porações viam nos cartéis alemães um aliado e não um
Europeu de Anilha e entre todas essase os interêssesdo grupo
inimigo, empenhadas que estavam em perseguir uma política
imediatista de produção restrita e altos custos. Interessailas em Mitsui no Japão.Pouco depois da formaçãoda 1.C. 1. repre-
sentantes da Dupont conduziram conversações de 1927 a 1929
estabilizar preços e restringir a produção, às corporações dever-
se-ia a escassezde materiais básicos que então se verificava. que resultaram num convênio que afinal importava numa com-
pleta aliança da Dupont e a l.C.l.. DO mundo da indústria
Ainda o pmcurador afirmava ter a Alemanha construído através química. "Êsse convênio, redigido em frases que lembram as de
os cartéis internacionais a sua própria produção, ao mesma tem-
um grande tratado político, dispunha sabre o intercâmbio de
po queinduziaasdemocracias
a restringirem
a delasem equi- informações sabre todas as invenções secretas ou patenteadas,
pamento elétrico, em drogas, em produtos químicos, materiais
de guerra básicos como magnésioe alumínio. "Os cartéis inter- a troca de licenças exclusivas sôbre patentes de um ou do outro
grupo e sabre a distribuição dos mercadosmundiais. De uma ma-
nado.mais, com aviva assistência de interêsses americanos, opera-
vam no sentido de pr/var-nos de merccüoi no nosso próprio neira verdadeiramenteimperial, o convênio provê que a Dupont
hemisfério:'\ terá direitos exclusivos nos países da América do Norte e Central,
De qualquer modo, enquantoo Govêrno americanoexer- com exceção do Canadá, Tema Nova e possessõesbritânicas e
cia pressões sabre os governos latino-americanos, de toda es- que a 1. C. 1. terá direitos exclusivosdentro do Império Britâ-
pécie, inclusive as suaves como os empréstimos e as duras como nico. No caso da índia, Dupont tinha a permissãoãe continuar
a imposição de acordos de reciprocidade para evitar contas blo- suas atividades, sujeitas porém a futuro acordo." Em 1931,
queadas e a transferência a terceiros países da cláusula de com efeito, Dupont concordavaem retirar-se da Índia, deixando
nação mais favorecida concedida pelos Estado-sUnidos, as gran- todo o seu ativo para a 1. C. 1., recebendoem troca toda a
des corporaçõesdos EstadosUnidos usufruíamde tranqüilos propriedadede uma subsidiária da 1.C. 1., nos EstadosUnidos,
acordos com os cartéis alemães e os renovavam em plena hosti- DyestuffsCorporation of America. O convênio original entre
lidade, acumpliciando-semesmocom os alemãesna distribuição Duponte l.C.l., de 1929,terminavaautomàticamente a 3 do
do mercadolatino-americano. Assim, a 9 de fevereirode 1940, junho de. 1939, quandonovo contrato entraria em vigor. Um
dos problemasmais difíceis no mundo das anilhas foi o de
no relatório semi-anualde seu departamentode relaçõesexte-
acomodar os gen//eme.'zdo Japão. Desde 1931, o cartel abran-
riores, Dupont afirmava: "I. G. deu evidência de adotar uma
política de desenvolvimento industrial na .América do Sul atra- gendo a National Anijine Corp. (subsidiária da AUied Chemical
vés da compra da fábrica fluminense.de cáustica-clorinano & Dye), Dupont, l.C.l., e os europeuscontrolava o mercado
Brasil e de açõesda Cia. Eletrocolo.rda Argentina. Fêz-seum da China, numa base formal, de acordo com o que se conhecia
por ''The China Six Party Agreement". Tratava-se agora de
l ThurmanA. Arnold, obra citada,págs.XIV-XV.
Germe/zy'i Ã/as/er P/an, liearing's SR 77, pág 1 099
!56
/57

.[
enquadrar D grupo Mitsui do Japão, cujos planos e aspirações quer Chemische Unternehmungen A. G. (l. G. Chemie) e trans-
eram maiores do que êles haviam previsto. (Por essa época, feriu para ela seus /io/díngs na American 1. G. Proclamou-se,
precisamente, o Japão fazia sua invasão da China e se apode- então, alto e bom som ser a American 1. G. de propriedade
rava, para começar, da Manchúria.) Depois de ameaçasde suíça, sem qualquer conexão alemã, não obstante o fato tlo chefe
guerra e propostas de apaziguamento, Mitsui acabou membro da 1. G. Farbenindustríe, l=lerman Schmitz, ser o presidente
do Comité Internacional'sabre A.nilina e Sulfido Negro. Em da 1. G. Chemie,Suíça,e de a diretoria da American1. G. estar
1938, a segunda invasão do lapão na China (já na qualidade sob o controle de antigosfuncionários da 1. G. Farbenindustrie,
de membro das potê.nciasdo Eixo) reforça o grupo japonêsque inclusive de seu presidente, Dietrich Scllmitz, por coincidência
gostaria de consolidar sua posição hegemónica naquele Conti- irmão de Herman Schmitz.A 1. G. Farben fazia questãofe'
nente, em virtude da ocupação em processo de realização pelo chada de reter sua fachada americana. Para tanto encontrou
Govêrno do Mikado, excluindo dali os demais membros, com fôrças suficientes para impedir que o Sr. Walter Teagler resig-
a possívelexceçãoda própria l.G. alemã. Os autoresde T/le nasse,como teria mostrado desejo, ao Conselho da American
/wm/er pün descrevem a nova situação: "Ao rever a nova ope- 1. G. Advertido das implicações que sua presença naquele Con-
raçãodo cartel de anilha, às vésperasda guena, há algunstra- selho poderia acari.etar, o presidente da Standard de New Jersey
çosa acentuar.. . É evidenteque o mundointeho, com exceção tentou incessantemente resignar ao pasto, dizem que desde
da Rússia, foi organizado de um modo mais ou menos completo. 1933. Mas o controle do cartel erá poderoso bastante para
Toda a Europa, toda a América do Norte, todos os principais conservar o Sr. Teagler no Conselho contra a sua própria
vontade.
paísesda América do Sul e toda a Ária estavam divididos entre
os principais produtores de anilha. Distrit)unçãode territórios, Quando afinal estourou a guerra entre a Grã-Brqtanha e
tropa de patentes, informações técnicas, fixação de produção a Alemanha, a American 1. G. foi reorganizada e Ihe mudaram
e de preços e todas as outras característicascomponentesde um o.nome para Aniline & Film Company. A acusação por várias
perfeito cartel intemacioDal se encontravam na teia de convê- vozes.ap.areceude que a Aniline & Fiam Co. era de piopriedadc
nios e entendimentos então esboçados.No centro da 'tela, tecen- alemã. A resposta à acusação por parte de seus diligentes era
do um fio para cada direção,estáa 1.G.t só uma: e.ra !uíça. Mesmo com os países respectivosem guerra,
A teia tecida pela 1. G. era poderosa e atravessava todos as agências da 1. G. espalhadas pelo Império Britânico conti-
os países,principalmente os Estados Unidos. Ainda em 1929, nuaram a fazer seusnegócios.A 19 de setembrode 1939, de-
conseguiufundir todosos interêsses
da 1.G. FarbennosEstados zesseisdias depois de a Alemanha e Inglaterra se encontrarem
Unidos, formando a American 1. G., poderoso truste de que em estado de guerra, a 1. G. telegrafava à Aniline & Fiam;
faziam parte as principais organizações químicas americanas, ". . .em adição ao Ca:nada nós vos isentamos das restrições de
inclusivea ALCOA, em.combinaçãocom a 1.G. em terno de exportação relativamente aos seguintes países: Grã-Bretanha,
interêsses investidos em metais ligeiros. Também a Standard índia Britânica, Austrália, Nova Zelândia, mas só pelo presente
Oil of New Jersey forneceu o seu presidente, Walter Teagler, estado de.guerra. . ." e dava, a seguir, os nomes dai firmas
para membro do Conselho da American 1. G., enquanto Edsel que devia a organização americana suprir em Manchester,Bom-
Ford era tambémincorporadoao Conselho.
Os interêsses
da baim, Melbournee WellingtoD.Como as agênciasda 1. G. na
anilha alemã conseguiram atrair para a direção da American Colõmbia estavam sentindo os efeitos do bloqueio, a 16 de outu-
1. G. aquelas eminentes figuras do alto mundo dos negócios, ao bro de 1939a GeneralAnilin & Fiamrecebiacabograma
da
mesmo tempo em que a propriedade alemã da mesma organi- l .G., dand(olhe permissão para vender naquele país, mas só
zação era oculta. Para êste fim, a l.G. Farben organizou na através o agente da 1. G. Em 28 de janeho do ano seguinte,
Suíça uma companhia conhecida por Internationalo Gesellschaft ainda a subsidiária americana recebia vice.nçapara vender a
toda a América Latina, na base de uma lista dos agentesda 1. G.
l Obra citada, pág. 113 As vendas só podiam ser feitas através daqueles agentes. Comen-

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\

tando o fato, Borkin e Welsh escreviam: "Êsse simples truque rios. . . ficando a Alemanha com a parte de leão. . . O sistema
de proteger as saídasda 1.G. na América Latina pode ter sérias de comérciode troca quando os nazistaschegaramao poder. .
conseqüências militares algum dia. De importância imediata, dera à Alemanha mão relativamenk livre para instalar. . . vasto
porém, era o fato de que o bloqueio britânico estava sendo #' e inteligentemente manipulado sistema de distribuição. Especial-
rompido.": mente eficaz e importante foi essarêde na América do Sul. O
"Quando a guerra inompeu," escrevemainda os dois auto- tamanho da lista negra. . . consta agora de 7 500 nomes, mos-
res, "os Estados Unidos tinham de encarar duas sombrias pers- tra a dimensão
da ponte.A Alcmanhãx
não tevede lutar pelo
pectivas: a esquadra inglêsa podia ser dostruída e a América mercado da América do Sul. Todo o Continente foi entregue
do Sul invadida. . . Quando a G.G. ll estalou,a arma decisiva aos cartéis alemães pelos homens de negócio americanos
.
f
da Inglaterra era o bloqueio naval. . . os mercados mundiais Sùbitamente tomamos consciência de que economicamente havía-
para a Ajemanha estariamperdidos. . . A Alemanha, entretan- mos sido flanqueadose de que tal fato era uma ameaçaà nossa
to, estava preparada para êsse ataque. . . uma rêde distribui- segurançamilitar. A força de garra dos interêssesalemães..
dora para os produtos alemães foi estabelecida através o mundo. foi demonstradatanto na Argentina como no Brasil"
Excluída de colónias pelo Tratado de Versalhes, a Alemaiüa . .
contorna o obstáculo mediante inteligente manipulação de pa- l Quandoficou senhorade toda a Europa, suamperspectivas
de reatar
o comércio com a América do Sul poderiam até ter melhorado. Assim
tentes, convênios com competidorespara divisão de territó- pensavam muitos dos líderes alemães nó campo económico. SÓ havia
por aí um empecilho:a esquadrainglêsaque fazia o bloqueioda Eu-
l Obra citada, pág. 118. Segundo Behrendt, "muitas casas de negócios rop% ocupada pelas forças alemãs. Mas os alemãesnão só se utiliza-
dos Estados Unidos na América Latina eram representadaspor ram de Falsasneutrosque restavam,dos bonsofíciosda Espantae
alemães.. . Particularmente depois do irromper da presente gz/errcz Portugal, como, ao que constava então, de uma combinação com a
(grifo do Autor) muitos comerciantesalemãesna Améric Latina obtive- Rússia de Stalin. Behrendt dá a respeito essas indicações: os russos
ram representaçãode firmas americanas,que até então pouco ou nenhum estariam ansicÉospor desenvolver relações comerciais com a América
negócio tinham feito com a América Latina. Os alemães desejavam, Latina e particularmentecom a Ai'gentina. Slispeítava-se
em certos
naturalmente, substituir, pelo menos temporàriamente, suas conexões círculos amor;canos e inglêses que parte dessas compras russas seriam
.lemas pelas americanas. Esta situação levou finalmente Nelson Rocke- destinadas à Alemanha. Telegrama da Associated Press, procedente de
feller, Coordenadordas RelaçõesComerciaise Culturais Interamerica- Buenos Abres, de 10 de janeiro de 1941, noticiava estar a chegar ali
nas, em jane:ro de 1941, a instar com as firmas americanas a elimi- uma delegação para abrir negociações para "um gigantesco convênió
narem pessoal antiameriçano ou pr6-alemão de seus ramos latino-ame- comercial baqcado primacialmente em exportações de cereais argenti-
ricanos. Descobriu-se que em vários casos êsses empregados haviam nos com destinoà Rússia". Behrendtacrescentaterem essasnotícias
utilizado os fundos e a influência de que haviam gozado como repre- aparecido quando, po: êsse tempo, Berlim ünunc.lava a conclusão com
sentantes das casas americanas para exercer prf'suão sabre jornais na- a Rússia "do maior canvênio de trigo da história do mundo". O mi-
tivos e firmas em favor dos objetivos do Eixo". (Obra citada, pág nistro britânico da Economia de Guerra, Sír Hugh Dalton, também
112) .. ."Algemas companhias relutavam em despedir êsses agentes, declarava estai investigando a veracidade de um relatório segundo o
sob o pretexto de que não tinham pessoalcompetentepara substituí- qual a Rússiaestavaplanejandoa organizaçãode uma frota mercante
dos'l. Bellrendt acres;ente que em muitos casos em que os. represen- de 200 barcos,para transportarprodutosda América para a Rússia.
tantes "pro-nazi ou antiamericanos" foram substituídos por empregados Outra indica;$o estava no fato de que a Rússia andava comprando
leais houve um forte aumento nos regístros de vendas das firmas ame- consideráveis' quantidades de couro e lã nos países do Prata: Outra
ricanas. Segundoo New yor# Tomei de 8 de maio de 1941,um ma- notícia pela mesmaépocarevelava que numa semanadois navios dei-
i.ufatureiro americano declarava terem descoberto que "estavam ga- T
/ xaram Buenos Abres para Vladivostok. Essa transação se fêz apesar
nhando menos de dois terços do volume que deveriam ter obtido nos de q Argentina
nãoter aindareconhecido
o govêrno
soviético
e de
países onde agentes antiamericanos tinham dirigido suas vendas nos nunca ter havido relações comerciais entre os dois países. O ministro
últimos dez anos" da Agricu[tui:l de entoa, Sr. ])anie] Amadeo Vide]a, não hesitou em
O contra:e da lista de agentes do Eixo no comércio interamerica- declarar serem os russosbem-vindos,pois a Argentina seria feliz de
no absorveu grande parte das atividades da Ccordenação de Relações vender qual.luar coisa a qualquer um", em face dos crescentesexce-
Interamericanps,dirigida por Nelson Rockefelier durante a guerra. Êle dentes acumulados de sua produção agrícola.(Behrendt, obra citada,
devia saber de que se tratava. l
}-
pag 127.)
O que se deve compreender,diziam os autores de The em cada detalhee junta "uma lista de embarquesque já manda-
Master PIAR, é que a proeminência alemã nos mercados sul- ram para Bogotá, Lama e Rio". E para dar a idéia da eficiência
americanos foi .possível sòmente porque as organizações ame- com que o sistemada rêde funcionava,os homensde Filadélfia
ricanas concordaramem Dão competir naquela ái:ea.. . Em assinalam terem aquelas ordens lhes ichegado sem solicita-
quase todos os casos em que a Aiãérica do Sul foi reservada ção dêles;no entanto, atenderam''pensandoser do seu (l.G. )
pelos convênios de cartéis e monopólios alemães, as subsidiá- melhor interêsse". E por fim asseguram à l.G. que não im-
rias.e agentes dêstes constituíam a cunha pe]a qual esperava porta quem estejafazendo os embarques;"reverteremosao iüuzll
(a .Alemanha) realizar seusobjetivos na Suga'aproxima, o con- que an/em assim que as condições normais estejamrestauradas'
trole económico para furar o bloqueio das exportações alemãs Decididamente para os homens de negócios, da Alemanha
e manter, à vista dos países latino-americanos, o fluxo dos bens cama dos Estados Unidos ou de alhures, a guerra, quando não
alemães ali, importante ao prestígio comercial alemão. Daí re- é negócio vantajoso, é apenas um condicionamento mais abor-
sultará? a queda da influência inglêsa e americana. recidoou difícil para a continuidadedos negóciospor cima das
Nas indústrias de plástico, p&xigãagx,etc., também foram fronteirasnacionaisinimigas. Como disserambem Borkin e
divididos os mercadosdo mundo entre duas firmas de um imenso Welsh, "na visão dos cartéis, toda a economia mundial é uma
/zoZdingalemão.Uma firma em Filadélfia, outra em Damlstadt área de exploração". Os cartéis são forçosamentesemprese-
na Alemanha. Quando a fabricação de pZexig/absse desenvolveu cretos. É que "os cartéis Ira pendem.qualquer norma de interês-
comercialmente,por volta de 1934, nova divisão territorial do se nacional. Com efeito, Duma certa medida os contratos exe-
mundo .foi feita entre Darmstadt e Filadélfia. A emprêsade Fila- cutadospor cartéis são mais fortes e mais duradouros que qual-
délfia ficava com os Estados Unidos e o Canadá, Roam & Hass que.r tratado entre governos, pois cartéis através de combina-
de Darmstadt ficavam com o resto do mundo. Quando a guerra ções prévias descontam as contingências da guerra. Nenhum
estourou,os associadosde Darmstadt notificaram os Rohm &
govêmo democrático poderia dar-se a êste luxo."
Hass de Filadélfia que podiam.agoranegociarcom o México, a A Alemanha foi de novo esmagada, destroçada fisicamen-
América Central e do Sul. Na correspondência entre a l.ê. te, dividida. Graçasà ajuda e capitaisamericanose à fomiidá-
Farbenindustrie (Francforte sabre o pleno) e sua subsidiária
de Filadélfia, Rohm & Hass,entregueao exameda comissãodo vel capacidadede organizaçãoe de recuperaçãode seupovo é
outra vez um país rico e próspero. Mas o que não recobrou,
Senadona época,há umacartade 22 de dezembro
de 1939. realmente, foi a autonomia política, nem a unidade territorial.
em que a matriz alemã, referindo-se aos mercados sul-america:
Seus trustes foram restaurados, reorganizados. Os americanos
nos, diz: "A maioria dêssesmercadospode presentementenão restauraram a dinastia imperial dos Krupp no Rufar, impedindo
ser suprida por nós regularmente; a fim de 'permitir a nossos
amigos nessesmercados conservarem suas posições, muito apre-
quetodoo complexo
de açoe do carvão,
quesempre
foi a
alavanca do militarismo e do imperialismo alemães, fôsse reor-
ciaríamos se os senhorespudessem supri-los, o que certamente ganizadocomo propriedadepública, como por isso se bateram
seria também do in'terêssegeral dos negócios.. . Demos ins- os social-democratas alemães, franceses, belgas, inglêses, os sin-
trução por isso aos nossosamigosnos Estados americanosdo dicatos operários, os liberais, democratas e pacifistas da Ale-
su] e central para procurar os senhoresatravésda ..dava,lzre,So/- manha e da Europa. Em compensação, embora exercendo, junto
ve/z./s
C/K/7ücaiCklrp. de Nova lorque, DOcaso em que tenham a áreasde seu Govêrno, influência considerável,não redobraram
necessidade do produtos sintéticos como o /amai e esperamo: a antiga autonomia (ou soberania) . Não redobraram -- não sa-
que os senhoresestejamem condiçõesde supri-los. Sementeno bre o seu Govêrno, em relação ao qual gozam até de considerá-
caso do México, onde os nossos amigos já se dirigiam aos se- vel grau de independência -- mas sabre os americanos, as
nhores por meio de Koreon, as senhores receberão encomendas
grandes corporações. Os Estados Unidos, como se sabe, quebra-
di.retamente."Assinado: W. E. Kemp. Em sua resposta,Otto ram o monopólio das patentes em química e sintéticos dos trus-
Hass, de Filadélfia, afirma que obedecerãoaos desejosexpostos 4 tes alemães (l.G.) de antes da guerra e delas se apropriaram
/Ó2 163
(os russos fizeram outro tanto, pondo a mão sabre as que pu- de outorga:las aos americanos, as garantias prévias que pediam,
deram) . Hoje, as grandes corporações é que têm tal moiiopõlio como con.dição do-s investimentos, contra o exercíci'o sÉ)berano
c usam essas.patentes,aprendamos direitos, fazem delas o que d3 nação brasileira, dentro das limitações de suasleis, em rela-
entendem. Aliás, o que adquiriram, na verdade, foi a suprema- ção a eml?rêsas.eexploraçõesprivadas lucrativas estrangeirasno
cia das pesquisas e conhecimentos tecnológicos. A Alemaiüa seu território: Essas garantias superconstitucionaisserão, pro-
Ocidentalé, hoje, como a parte Oriental, apesarde sua pros- vàvelmente,dadas aos capitais alemães,depois de terem :lido
peridade, um país política e' economicamente dependente. Com asseguradasaos americanos,que pode.rãoinvestir-se no Nordeste
efeito, a política exterior da Alemanha Ocidental.é traçada an- em porção cângrua.t
tes em Washington que em Bonn. Os Estados IJnidos têm de-
termin-ado,inclusive no Brasil, onde, quando e como os alemães
do Oeste devem investir seuscapitais. O Govêrno brasileiro atual
lhes negou o direito de investir no Nordeste brasileiro -- ter-
reno de caça privada dos americanosl -- e já lhes negara, antes
l A exclusão do Nordeste a capitais que nãp sejam americanos é,
parece, uma norma geral e nãc apenasdirigida contra alemães.Dir:
se-ia também contra capitais brasileiros. Pelo menos, a reclamação
dos capitais paulistas contra a tendência a exclui-los dos trabalhos
organizatórios.da criação da Fundação para o Desenvolvimento In-
dustrial do Nordeste (FUNDIDOR),
instituição inspirada pela USAiDe
SUDENE, é pública e.notória. Quando da' reunião geral 'para debater
os problemas dessaFundação, realizada sob a presidência do Sr. Mi-
guel Vila, pr('vidente da Confederação das Indúsrias de Pernambuco.
quase todos os .presidentes das confederações estavam presentes", jun:
tamente com o Sr. George Gelhorn, representante da USAiD,que além
de financiar 40%o dos custos operacionais da PUNDWOareservou ainda
fundos para treinar o pessoaltécnico da fundação. Presentetambém
estava um. representante de J. Walter Thompson que vai fazer a pro-
moção publicitária do empreendimento, etc.: O jornal que noticiou a
reunião diz ter causado "estranheza, na reunião, a ausência do general
Macedo Soarem,candidato por São Paulo à Presidência da c.N.i. e do
Sr . Rafael Noschese, presidente da Federação daquele Estado, uma vez do Nordeste. .(Jonza] do Brmí11. 1-]0-1965.) Essas condições que os
que as classesprodutoras paulistas são, em tese, as que teriam maior Industriais paulistas pr?tendiam fossem revogadas-- e para isso obti-
interêsse na criação da FUNniNOR".Além disso, pelo esquema finan- veram o assentimentodo superintendenteda Sudene,Sr. João Gonçalves,
ceiro esboçado para a Fundação, São Paulo, com o Rio Grande do Sul que lhes prometeu . esforçar-se .para que "fossem ' aceitas pela usam"
e Guanabara, teria grande participação no negócio, também com 40% -- não foram suprimidas, em face do embargo desta última organiza-
de financiamento, enquanto as federações nordestinas ficariam com ção: (Jor/lal do Brasíl, de 18 de novembro de 1964.)
20% restantes. (Jor/zaJdo BraiíZ, 30/9/64) . Ainda no mesmo dia. 1 0 Globode 23 de julho de 1964noticiavao adiamentoda con-
em São Paulo, o deputadoestadualHilário Torloni denunciavana clusão de um acordo sabre garantias de investimentos privados ale-
Assembléia Legislativa daquele Estado algumas cláusulas do convénio q mães em .nosso País, em virtude de "divergências" de conceito ilyanto
usam-sunEWEcomo "altamente lesivas" aos interêssesnacionais. Entre ãs garantias de compensação em caso de desapropríação. Os brasilei-
essascláusulas, o parlamentar apontou o emprêgo exclusivo de técni- ros se negavam a formalizar tais garantias no acordo, por já estarem
cos norte-americanosna construçãodas estudas, transporte por navios expressas taxativamente na Constituição brasileira de 1946. ' Os nego-
americanos de pelo menos 50%u da tonelagem importada, obrigatorie- ciadores nacionais alegavam que seria repetir dispositivo' constitucio-
dade de seguros em companhias daquele país e compra de material nal no preâmbulo do acôrdo. '0 Jor/za/ do Brasfl, pela mesma época
produzido nos.Estados Unidos. O convênio prevê o empréstimo de 20 (?.'9-;1964) . salientava eq ..telegrama
alemães pelas mesmas dificuldades.
de Berlim
'
o desapontamento
' '' -'
dos
milhões de dólares e 4 bilhões de cruzeiros para o Plano Rodoviário
{

164
velar para que os legítimos interêssesamericanosno exterior
sejam resguardadosde gritantes injustiças (Expropriação à la
Cardenas?) da parte de governos estrangeiros. . . A'nação como
'L um todo tem interêssedireto na preservaçãodos interêssesame-
ricanosno estrangeiro.Com efeito, o êxito da política de Boa
Vizinhança está completamente ligado à proteção dêsses inte-
rêsses. . .x Se uma nação se decide a fazer o papel de mau
vizinho(a que paíslatino se referia o autor?Ao Brasil, à Ar-
gentina, a? Médico, Chile?) não há nenhuma razão para que
Tio Sam fique ali sentado, vendo-se privado do que' é justa-

Na realidade, se o presidente Roosevelt pensava em têrmos de uma


alta .política internacional, às vésperas da guerra, o que dominava o
espírito dos homens de negócio envolvidos na Amériça Latina era a
defesa de seus.interêssesferidos pelas expropriações' petrolíferas do Mé-
xico. A política rooseveltiana do Bom' Vizinho não foi recebida de
bom grado pelas.empresas norte-americanas com grandes capitais na
América Latina. Muitas delas, pelos seus homens mais representativos,
chegaram a demonstrar que o objetivo dêles era uma simples 'volta ao
ójg iribk, ou algo como.uma.série.de sanções
económicas'
em repre-
/'\ poi.ÍTicA de boa vizinhança,freqiientementeuma sé- sália .às ações. confiscatórias de vários governos latino-americanos a
rie de palavras sonantescom gestos e atos intermitentes de ver- fim de . obriga-los a devolverem as propriedades norte-americanasaos
antigos donos. Num relatório anual aos acionistasda Mexican'Petro-
dadeiro alcance, não conseguia, porém, desarmar de todo a leum Company?.subsidiária. da Standard Oil of New Jersey, o seu
velha desconfiança latino-americana. As resistências não eram presidente convidava o govêrno dos Estados Unidos a tomar as medi-
só económicasmas também políticas e ideológicas;de vez em das necessálliasa forçar o México a observar "as normas do direito
quando apareciam ao sul e imitavam profundamente os homens internacional, como em 1917 e 1925". Ainda aqui, ouve-se a voz pe-
de Washington. remp!ória do Sr. NichoJas Roosevelt a- acusar o govêrno Rooseveltde
prejudicara sua política de bom vizinho, não protestandocom mais
Uma voz americana autorizada, de nome sugestivo, Nicho- energia contra as confiscações das propriedades 'petrolíferas do Mléxi-
las Roosevelt, expressou, então, em folheto editado por não co e da Bolívía.Em declaração
perantea XXVll Convenção
Anual
outra autoridade que o /VaíbnaZF'oreign Tr(üe Cazlmc;1(1939) sabre o Comércio Exterior, publicada no Journal of .Camnerce de 31
de julho de .1940, disse: "0 govêrno mexicano interpretou a modera-
essasimitações e impaciências. O seu próprio título denunciava
ção e cortesia do Departamento .de Estado como uma indicação de
o estado de espírito reinante senão nos meios oficiais norte- que ao govêrno dos Est:dos Unidos é indiferente a sorte das proprie-
americanos pelo menos nos seus meios oficiosos. Era como títu- dades de súditos norte-americanos confiscadas pelo México.'i'.-(Ver
lo dos pequenos anúncios -- "Precisa-se" -- dos grandes jornais W. Fuerlein, E. Hannan, obra citada, pág. 12] .)' É claro, várias eram
da d\a 'lVanted: Good Neighbor -- The Need tor Ctoser Ties as represálias económicasque os Estados Unidos podia3n tomar para
põr no seulugar os diversosgovernosrecalcitrantes
do sul do Conti-
wi/A Za/in .4mericu. Selecionadas por Horace B. D:civis, havia nente. E daí? Os autores agora citados, com bom senso, observaram:
no livrinho essas passagens sintomáticas: "0 Govêrno america- Em uma guerrade sançõese represáliashá o perigo de que os Es-
no já desistiu definitivamente de qualquer ideia de intervenção tados Unidos percam seu comércio em benefício de outros paísesalheios
armada nos negóciosda América Latina. . . Mas a política de ao hemisfério." Além disso, comentavam: "A guerra voltou a acentuar
a necessidadeem que se encontram os Estados IJnidos de ter um can-
abstenção de qualquer espécie de intederêDcia nos negócios po- tata económico duradouro com a América Latina. . . Ela se dá cada
líticos dos paíseslatinos não significa e não pode significar que vez mais conta que é precisocriar tambémuma linha defensivade
os Estados Unidos abram mão do direito --- e do dever -- de caráter económico." (Obra citada, pág. 123.)

/Ó7
mente.seu.Implicito na política de Boa Vizinhança é o conceito sombria que a criada com a débacZe de 1929 e anos seguidos
fieiras . " us vizinhos devem ser induzidos a mudar de ma- de depressão.
Por outro lado, grande número dêssestrustes, os Dupont,
os Mellon, os Rockefellers, a U.S. Steel, etc., foram acusados
oficialmente, de práticas restritivas e de convênios de patentes
e de preços entre êles e, sobretudo, com trustes alemães.A Co-
missão do Congresso, constituída em função da mensagem do
PresidenteRoosevelt, a famosa Temporary National Economia
Committee, em 14 de junho de 1938, levantava a respeito uma
documentação de primeira ordem. O assistentede procuradot-
geral Thurman Arnold, a 12 de fevereiro de 1942, em plena
foi recauchutada econòmicamente para .vender e comprar nos guerra, ao testemunhar pera:nte a Comissão, não mediu pala-
Estados Unidos? como fornecedora exclusiva de materiais es- vras, fazendo as seguintesacusações: "I . O Govêrno dos Esta-
tratégicos e críticos à máquina de suei'ra norte-americana que dos Unidos tem -sidotaxado com preços excessivose desrazoá-
então estava sendo montada. O grau de colaboração tendia a veis por materiais de guerra essenciais, resultantes de convénios
certa reciprocidade, que quase era atingida no momento de entre companhias domésticas estrangeiras e propostas colidentes
Pearl Harbour.
Dos contratos com o Exército e a Marinha. 2 . Companhias es-
Com Pearl Harbor deu-se o reajustamento decisivo, no in- trangeiras (principalmente alemãs) têm-se apoderado de paten-
terior dos Estados Unidos, .da máquina produtiva americana e, tes e ent-rado em combinações de cartéis nos Estados Unidos re-
no exterior, do sistemaexploratório de matérias-primasdo sub- lativasa materiaisde guerraess-enciais,
com o fito e o efeito
solo ou do solo latino-americano. As dificuldades internas opos- de bloquear o desenvolvimento americano e criar séria escassez.
tas pelas.grandes colorações ao aumenta da capas dado pm- 3 . Tem havido divisõesdo mercadomundial por meio de acor-
dutiva para atender ãs tece-ssidades da guerra se manifesta- dos de patente entre companhiasdomésticase estrangeirasque
ram desdelogo; aa mesmotempo, na América Latina, as re- dão a intei'êssesestrangeiros o direito de determinar onde e
sistências a êsse reajustamento também se fizeram sentir. Estas como as companhias americanaspodem vender certos suprimen-
provinham em parte. da própria inércia e da desaparelhagem tos militares. 4. Pa.reconotório que informações militares vitais
crónica para um esforçoprodutivo mais intenso,em parte da tenham sido abertas a companhias estrangeiras através do requi-
falta de capitais e de mão-de-obra qualificada; da necessidade de
sito de descrever item por item o pagamento de direitos nos
equipamentos e instalações novas; 'em parte, também, de ope- acordos de licenças de patentes"
rações de transferências de propriedade e por fim de resistên-
Nessemesmodepoimento, Arnold informou ainda que a sua
cias de ordem política, deliberadas ou inconscientes,opostas por Divisão estava fazendo constantes revelações de exemplos impres-
governos ou governantes ideologicamente afins às potências'do
Eixo ou. por interêsses investidos hostis à penetração americana.
sionantesde controle alemão sabre indústrias de guerra vitais
americanas. E e-n-treos monopolíos americanos indicados estavam
Quanto às dificuldadesinterna.snos Estados Unidos, eram a Aluminium Company of America (AI,coA), Dow Chemical
oferecidos pelos. próprios trustes ou pelas grandes emprêsas na- Co., Baush& Lomb Optical Co. e Beryllium Corporation.Ainda
cionais, dominadorasde ramos de produção fundamentais. Estas na primavera de 1942, já depois das audiências da LNEC',comu-
temiam pelo. futuro, isto é, temiam . quando já no próprio nicou a mesmaautoridade a um comitê do Senadoque a Standard
p:ís.não, trabalhavam com a capacidade plena -=- que a am. Oil Co. of New Jersey,por força de um acordo com o grande
pijljila ainda mais acabassem,finda a guerra, com uma capa- truste alemão 1. G. Farbenindustrie, se recusara a entregar à
cidade Ociosa muito maior, sem mercado, numa perspectiva nlals Marinha americanae ao Govêrno britânico o processode fa-
bricação de uma borra-cha sintética, embora o tivesse feito à Ale- A unidade do hemisfério e sua defesa passarama ser mais
manha e à Itália, atravésa 1. G. Farbenindustde.
do que a política da Boa Vizinhança uma política estratégica
mundial dos Estados Unidos. Aos olhos de Washington o primei-
ro obstáculo à sua unidade foi a Alemanha. Primeirament-e atra-
vés sua capacidade competitiva comercial, reforçada pela tradi-
ção de bom freguês dos exportadores bem como dos importado-
res latino-americanos.D-epois,politicamen.te,pelo terrível e depri-
mente po'der proseliti-sta e propagandístico de seu regime junto
às diversasditadui.asda América Latina e grupos privilegiados
ou frust;rados, de tendência ou instintos reacionários, simples-
mente afins etnicamente à mãe-pátria. A Alemanha se tornou,
como vimos, o acicate mais poderoso a impelir o-sEstados Uni-
dos a açambarcarem para si aquela América esquiva. Compli-
candoainda a situação,a Alemanhafazia tambémaqui e aco-
lá de bom vizinho, exercendoentão co-mouma espéciede açãa
paralela à provocada muito posteriormente por Fidel Castão,
quando êste obrigou Eisenhower e Kennedy a irem a Buenos
Aires e a Punta del Este. Hitler, com efeito, impôs ao Govêrno
de Washington,
.na corridae luta competitivas,
a quebradc
qualquer preconceito ortodoxo de economia privada a fim de
que desseconcretização política,militar e económica
à idéia
de "defesa do hemisfério"
A Alemanha não era um competidor' comercial comum que
bons negociantesprivados americanos, mesmo urra bem equi-
O Estado americanoteve, com efeito, de intervir brutal- pados em organização, recursos e técnica de venda, pudessem
mente Da economiapara.forçar o aumento da produção indus- vencer numa guerrilha de preços ou de outras vantagens no plano
trial, em nome dos üterêssesvitais da m-ação
mas en] face da comercial privado. O seu comércio exterior. era guiado par outro
passividade .da economia capitalista privada. Na América La- princípio. O ,ínsf;/zzf /zzer Konjankfzírforsc/zune(Viertel Jahrens-
hefte zur Wirtschaftsforschung,1938-39, n. 3, pág. 305) assim
=Ê= =wl'=';"m#==#gl$'1;':Ê o definiu: "0 supremoprincípio do comércio externo nãÓé nem
um máximode volume de exportaçõesnem a exploraçãode cada
oportunidade de comércio externo que possa ser vantajosa do
ponto de vista do custo, mas primacialmentea satisfaçãoda
procura. de importações como um suplemento necessárioà pro-
dução doméstica.": Reimann explicam"As indústrias de expor-
tação da Alemanha se tornaram parte de uma máquina militar
gigantesca,que preparava a produção de armamentos numa es
cala sem precedentes". O contraste com as exportações america-

l Cit. por Guenther Reimann em T/ze 7amplre Eco/zomy, Vanguard


Press, N. Y., 1939, pág. 246.
/70
/7/
l

nas era patente, pois que e-stasvisavam a retornou cada vez mais tarmente, os Estados l.Jnidos podem isolar-se de novo, mas d:sta
altos de seus capitais.,salvo quando foi -- como durante a guer- vez para ser o Poder central absoluto.
ra -- para monopolizar e estocar minerais faltosos. A Alema- Ao tempo da discussão e das confabulações diplomáticas
nha Dazistavisavaà dominaçãopolítica em escalamundial. Os entre as diversas chancelarias americanas, um correspondente
Estados Unidos não visavam a tal dominação, mas as proporções do .New yar& Tomesem Washingtoninformava (a 7 de no-
do seu.gigantismoprodutivo tendiam, de fato, a r(;duzir seus vembro dc 1940) que as bases deveriam estender-sepelas cos-
competidores a, uma modesta cângrua: A "dominação" poder- tas sul-americanas
abaixo até a Antártica, com a garantia,po-
se-lia dar também por mera superior'idade económica e fnan- rém, de que nenhum vaso de guerra ou avião ou homens seriam
ceira, sem conseqüências
políticas à Alemanha. enviados a ocupa-las, salvo em caso de real perigo de agressão
nãa americana. Horace B. Davis, que dá a informação, pergunta,
Diante do fato da guerra,os EstadosUnido.snão hesitam: pertinentemente: quem vai determinar o que constitui ''non-
embarcamnuma definitiva política de utilizar, em benefício das À.merican aggression"? A pergunta, algo profética, foi levantada
operações belicosas, todos os recursos económicos, naturalmen- em 1940.Cuba,quando''agrediu"ou foi agredidana Praia
te, mas também militares e estratégicosdiretas, onde quer quc Giron, era já potência "não americana"? E antes dela a Guate-
os encontrem. No plano militar, pleiteiam o estabeleciiÚento'de mala de Arbenz? Quem determinou que a Guatemala,vaga-
basesnavais e aér-easpor todos os paísesda América Latina. onde m,ente comunizante, de Arbenz, cometia uma agressão "não
as reputam necessárias.A ideia custou a ser digerida pelos go- americana"? Hoje, os meios de determinar a questão são muito
vernos latino-americanos. A primeira ba-seque pedem é no Uru- mais requintados,pois se encontram em textos de resoluçãode
guai, à baga do Prata, e de saídacriou uma espéciede crise um dêssesmuitos tratados ou convênios ou declarações solene-
política em que se viram envolvidos, não sementeo Uruguai mas mente aprovados nas sucessivas reuniões ou conferência-s dos
também a Argentina, o Brasil, Bolívia e Paraguai.Êles que- soberanosEstados americanos. De qualquer modo, só em 1964,
riam o direito de patrulhar as águasterritoriais uruguaias.iJm no México, numa reunião de chanceleres americanos, se pede
mod zs vlvepzdi foi encontrado pelo qual os uruguaios mesmos determinar, a duras penas, que a ilha de Cubo era culpada de
faziam o patrulhamento mas com canhoneiras "compradas" aos agressão e nao era ameaçada.
Estados Unidos. Por aquela época, o Brasil e a Argentina se Muitos foram os economistas e analistas que fingiam es-
opunham à sugestãodos pactos de defesa entre os Estados IJni- pantar-sepelo fato de o-sEstadosUnidos terem passadoa uma
dos e os países latino-americanos, mediante os quais aquêles po- política de relativa generosidadede créditosem favor dos países
deriam instalar-se em território dos últimos. bati.no-americanos,numa situação económica extremamente es-
favorável em 1940, quando na década de 30 Washington era
Hoje, vemos que a história das bases americanaspelo mun- muito parco nessamat'éria. Fingiam ignorar o caráter político das
do nasce daí. Da primeira vez, a motivaçãopara as basesera operaçoesdo ano da entrada dos Estados Unidos na guerra,
a necessidade,em parte real, de combater o inimigo princi- quando lhes era indispensável dispor de todo-sos recursos físi-
pal, o nazismo. Na segundafase, depois da guerra, sob o pre- cos, geográficos, humanos, económicos e até espirituais da Amé-
texto de barrar o comunismo,tratava-se,DOfundo, de operação rica Latina aõ seu possível alcance.
de natureza puramentepreventiva, ou melhor, preparatória de O eminente economistaamericano John P. Powelson, já
uma terceira gu-erra,cujas preliminares seriam o que s.eveio a nosso conhecido. tenta demarcar o início das reviravoltas na
chamar de guerra fria. As basos são necessárias: l.o, nas Amé- políticaeconómicade seu paí-s,ao curso dos anos,a partir do
ricas (em guerra defensiva);2.o, na Europa e Ária, não mais choque depressivo de 1929, quando, em face da sua profundeza,
defensivas, mas de cêrco à Rússia. Depois as bases se tornam até ''o próprio caráter norte-americano começou a mudar". Di-
supérfluas, pois o-s mísseis de casa mesmo ou dos submarinos ferentementedos outros períodos de crise económica,comenta
Polaris são mais seguros, mais expeditos e independentes.Mili- êle, o de 1929 persistiu, pela primeira vez, além dos anos de
/72 173
!

1930, 31, 32, 33 e 34. Então, um têrço da força de trabalho houve nem há conexão interior, lógica entre a mudança de."ca-
dos Estados Unidos ficou desempregada.''A depressão abalou a ráter" do americano, de que nos falou e as reviravoltas oficiais
ética capitalista: se um homem não conseguiaachar trabalho. de seu Govêrno no que concerne à política económica externa
a[guma coisa ]he fa]tava. O pobre merecia caridade, mas certa- dêle. morme.nteem relação à América Latina. A época de Roo-
mente Dão compreensão. Durante. a depressão, porém, começou sevelt, ao lado de reformas sociais internas, se caracterizou por
gradualmente
a bruxulearem nós que uma grandeparte do um máximo de tensõesinternacionaisque duraram pràticamente
nossa população ..estava enfrentando' a pobreza, mas 'não era todos os três têrmos e pouco d-e seu (3ovêmo.
conclusivae inegàvelmentepor culpa do pobre". "A revolução Ao fim da guerra,porém,em 1945,na Conferência
:de
social trouxe tambémassistênciagovernamentalàs áreasde de- Chapultepec, na qual "os Estados Unidos cultivaram .conscien-
pressãoem casa." "Com a Lei de Pleno Emprêgo de 1946, o temente a aprovação da América Latina para seus objetivos de
Congressoreconheceuoficialmente que cada um tem o direito paz" (Poweison), o representante . americano reconhece, então:
a um emprêgo." ''. . . admite-se que o govêrno acarreta com a conseqüenteme.nte, ''que os acordos internacionais comerciais
responsabilidade em face do desemprêgo em grande escala. . . dem ser necessáriosem casos excepcbízafsde produtos pri-
Novas.armasde política monetária e fiscal foram afiadase mes- mários importantes que ameaçam acumular ou acumularam pe'
mo deficits orçamenüários se tornaram aceitáveis (dentro de li- sados excedentes".t
mites) para .criar fundo-s de emprêgo. Todos êsses 'aconteci- Na maior parte da décadados 50, porém, "quando o apoio
mentos constituíram g quadro de planejame:nto para um cresci- da América Latina para os objetivobamericanosnão era cru-
mento económico." "Mudanças s(iciais ' têm lugar internamente cial", Washington se mostra intransigente quanto aos propósitos
antesde encontrarsua marca no exterior. Pelo meio dos idos d-e"escorar preços de mercadorias" (Powelson). Assim, na Con-
de. 50, os EstadosUnidos ainda não haviam adaptado sua po- ferência Intéramericana de Caraças (1954), (não é mais "cru-
lítica estrangeira a incluir as tendências que já haviam tomado cial" para os EstadosUnidos o apoio da América.Latina) o.de-
forma nos negócios domésticos. No entanto, foi de encontro ao legado americano foi claro: "Nossa própria experiência nos leva
pano de fundo da mudança realizada DO interior dos Estados a acreditar que um programa de amplidão hemisférica que sim-
Unidos que Fidel apareceu,90 milhas ao sul de Florida. A mu- plesmente transferisse a esta nação uma grande parte do risco
dança de política para cç)m a América Latina foi precipitada pelasflutuaçõesde preços não se justifica pela naturezado pro-
por Castra, mas fundada sabre profunda revolução doméstica."i blema. O custo excederia nossa capacidade, quer o programa
Não. querem.os discutir aqui o idealismo por assim dizer contemplasse pagamentos diretos ou escorasse estuques criados
colegial do bem intencionado economista norte:americano. De- para sustentar preços."*
poisde ter assentado
a-sbasesda novapolíticaamericana
do Nessa época assalta -em todo o relêvo a diferença de ati-
exterior, êle reconhece que a política americana em relação aos tudes. em relação aos fenómenos económicos que costumam
convênios sabre mercadorias excedentes tem sido ex;tremamente afligir nossos países de economia primária, ente? norte e .latino-
contraditória. E.ssapolítica, no entanto, só se tem desviada do americanos;o'ângulo de visão oposto entre os famososvizinhos
que se.poderiachamarde ortodoxia económica,ou da prática ricos do nomee os pobres do sul. Com efeito,.falando sabre as
comercial corriqueira, em momentos de tensão internacional: flutuações de preços'de matérias-primas e os ciclos de negócios,
então o Govêrno americano é capaz de gestos, declaraçõesou o Professor Powelson tenta mostrar que tudo na prática se reduz,
me-smo deliberações, ates favoráveis aos interêsses de aliados, apesar de ser êle mesmo eminente econometrista, a essa "diferen-
dependentes, colonizados ou subdesenvolvidos, seus vizinhos com: ça psicológica ou de mentalidade" pela qual as.encaram ameri-
tinentais. Assim, contràriamente ao que pretende Powelson, não canos do norte e americanos do sul. Dessa diferença resulta-

l John P. Powelson --
Revoltar/o/z,
Lafí/z .4merica: Todas'a Ecorzomfc and Social
MacGraw Hill Co., New York, 1964,pães. 29, 30 e 31. : B:gl::F:l:l: E:li:ll:: á E l::S.! .l:'ib '':;;:1.;%i,.
174
1'
pobreza quanto à intervenção .de.Deus nos negócios reprel;entou
uma grande, uma incomensurável conquista espiritual da huma-
nidade moderna. Ao tempo de Calvino e ainda nos Estados Uni-
dos, segundoo próprio testemunho do Professor Powelson, aos
tempos de Coolidge-Harding, até a depr?ssão.de 1929, os po-
bres podiam acreditar ser a pobreza o lote dado.por Deus à
maioria dos homens. Era imutáv-el,era eterna. Hoje, nem mes-
mo os quichuas decadentese isolados do altiplano boliviano acre-
ditam nisso.
O ProfessorPowelson,que estêvedurante algum tempo.na
Bolívia, tinha esperançasde que para os bolivianos a quedados
preços nos mercados 'internacionais e. logo ameücanos, de seu
chumbo ou estanho, aparecessecomo fenómeno tão naturalmen-
te calamitoso quanto um terremoto mesmo, dêsses mandados
por Deus. O nosso professor? qptretanto, parece..não.saber ainda
que êsseestranho ceticismo boliviano .é compartilhado pelo Ter
cedroMundo em pêso e, por isso, até os budistas do.Vietnã do
Sul são também tão ingratos para com a indiscutível generosi-
dade americana. No fundo, os pobres do mundo, desde qulpas-
saram a acreditar que a pobreza dêles não é mais obra..de.Deus,
se tornaram, sem querer, de uma forma ou de outra? 'coletivis-
tas", "socialistas" ou mesmo -- que Deus nos acuda! -- ''co-
munistas". Há vinte anos os nossos amigos americanos fazem
diàriamente essa experiência, não só na Bolívia mas por todos
os recantos do Planêta onde aparecem, munidos sempre das mes-
mas boas intenções, da mesma generosidade, da mesma sacros-
santa missão de salvar os pobres do mundo do-sperigos do co-
munismo.
Seja Gamofâr, também nós -custamosa compreendero Pro-
fessor Powelson: que não se aperceba ser a economia boliviana
ultradependente dos preços í:nternacionais dos minérios que ex-
porta; seremos preçosdêssesminérios pelo menosem grande
parte con:troladospelos próprios americanos?
.ser por ôssoque a
mesma economia não consegue vencer, estabilizar seus próprios
recursos, sujeita não pròpriamente a cataclismos cósmicos,mas
de propaganda, nem a técnica de lavagem de cérebro, nem certamente ao mecanismo internacional dos preços das matérias-
primas, manejado por várias entidades financeiras e económicas
de âmbito e ação internacional, por várias da-schamadasZeaí&r-
s/zíp preces corporazians, em posição mais ou m?nos oligopólica ;
l Powelson,obra citada, pág. 103 quer 'dizer, aa final, por instituições humanas, pela vontade cons-
cientede homenscom fins objetivose claros.E qual a naciona-
176 /77
homens? Na suameas?ridêsãonlatncanos. pequeno número de sim, os americanosteriam sentido o calor boliviano. Mas evi-
dentemente ai:nda estamos muito longe de que tal venha a acon-
tecer (a própria atitude do Professor Powelson o prova). Se
os americanos a fizeram em casa, foi para uso próprio, como os
inglêses que, desde Bu.rke, não acreditam em "direitos do ho-
mem", mas só em ''direitos do inglês". Afinal de contas, o au-
xílio económico dado pelos americanos na crise boliviana servia
também os interêsses investidos da economia .norte-americana
como um todo e, por ricochête, também aos bfg b íness que
não são tãa humanos assim que não queiram assi-star
um fre-
guês em dificuldades, um agregado que sempre dá algum lucra,
embora modesto, nas horas de crise (aliás freqüentes, entre
subdesenvolvidos).
O Professor Powelson não se conforma, positivamente, com
o fato de os latino-americanos por sua vez não se conformarem
diante da disparidade crónica doç preços de p.rodutosprimários e
os manufaturados.
Êle gostariade instituir o q.uechamoude de-
partamento de faia prece. Mas estranha que não se queiram ex-
plicaçõespara o fenómeno. Uma 'ç-ezverificado, o que se quer
é vencê-lo, contarná-lo, remediar ao menos suas terríveis con-
seqüências.E cita, a p.ropósito, o Ministro das Finanças da Ve-
nezuela que, em setembro de 1960, dizia: "A contribuição que
estamoshoje pedindo a países mais afortunados (fala mesmo
como um subdesenvolvido)é em certa medidao retorno, ou
compensação pela renda perdida através do ante.rcâmbiointerna-
cional. Não deveríamos positivamente nos se:ntir embaraçados
em aceitar tais contribuições." (Citado -em editorial de C///fma
Hora, l,a Paz,Bolívía,8 de setembro
de 1960.) Assimcomo
não acredita em bruxas, o professorparece duvidar da existên-
cia de monopólios ("lf //zey exisf") . Mas, para argumentar, acei-
ta que "os big bati/zessnos Estados Unidos comprem (?!) pro-
dutos prima\íos latino-americanos. Aceitemos tenham alguma
influência sabre o preço."
A.ntes de prosseguirmos na exposição das idéias do professor
Powelson, talvez convenha lembrar um precedente histórico mo-
delar: o primeiro convêniointeramericanode café. do ano da
graça de 1940. Com efeito, qua.ndo então se discutiram os têr-
mos do convênio, não foram poucos os economistasa estimar
ser o "bom" preço do café estipulado como aquêle que cobria
o produtor do café de pior qualidade. O fato, porém, já não
178
/79
'A lição pode ser esta: os paísesprodutores,ao combi-
narem restringir a produção, podem dentro de certos limites
aumentar sua renda. Êles devem, porém precaver-secontra a
elasticidadeda procura a longo têrmo que pode corr-eros mer-
cadose deixa-lospior que antes". (Powelson.)Daí mais uma
vez se verifica não haver recursos para os subdesenvolvidos pro-
tegerem-se contra a decalagem tendencial do preço dos manu-
faturadosem face dos produtos primários. Não há, pois, meios
de arranca-los
da inferioridadede po-lição.Ou por outra: só
há uma so]ução, a intervenção sistemática, permanente nas leis
do mercado,ou seja, uma revolução-- enter-nacional, mundia!
-- para estruturar o que até aqui nunca foi estruturado mas
simplesmentemanipulado, condicionadode forma mais ou me-
nos aleatória, empírica ou. .. golpista. Eis a revolução para
a qual o seu país deveria dar a matar contribuição e êle, econo-
mista amigo dos países latino-americanos, o seu apoio.
O de que se trata é assim fazer com que as flutuaçõesde
preços internacionalmente não apareçam para nós outros, bo-
livianos de todo o mundo, como força da natureza, t-erremotocós-
mico, fenómeno meteorológico que traz chuva e vento, frio e
calor, queiram ou nãa queiram os homens. O diabo é que
os subdesenvolvidos vão aceitando cada vez menos es.sa me-
teorologia absoluta dos teóricos economistasdo capitalismo.
Por que os têrmos do comércio internacional hão de se resolver
sempre contra os interêsses dos subdesenvolvidas do mundo?
Por que o poder de compra relativamente à sua população só
cresce nos países de manufaturados? Powelson quer consola-los,
mas, sendo honesto, o faz mal: "A longo prazo as perspectivas
de mercado para os produtos primários são governadospor duas
fôrças opostas.Uma tendente a elevar os preços, outra a baixá-
los. A primeira consisteno aumento de produção mundial e na
renda; ambosevocam uma procura mais alta para os produtos
da indústria. As matérias-primas, porém, .existem em quantida-
des fixa-s: tanto petróleo no subsolo, tanto cobre, etc. Muitos
predisseramque os preços subiriam com o tempo em face da ine-
lasticidade dos suprimentos". E a segundaforça? ''Há tendência
para os substitutos (como rapo/z, nyZon,plásticos e borracha
sintética) bem como economia-sna utilização dos produtos pri-
l
mários (por exemplo,fazer com menor quantidadede cobre o
Duncan, Ti%e Hmerfca/z .Eco/zom/c Revfew, junho de 1944.
mesmoque uma quantidademaior fazia anteriormente)."
r'
tor de café, em primeiro lugar. Melhor do que qualquer outro
produto da América primária ou apenas "pós-primária", o café
define o verdadeiro comportamento norte-americano em face das
vicissitudes económicas dos nossos países. Qual a situação dêle
entre os outros produtos crânicamente em excedentesda Amé-
rica Latina às vésperasda guerra?O Ministro da Fazendado
Brasil na época, Sr. SousaCosta, a define assim: ". . . o valor
médio, em ouro, da saca de café desceude E 0,17 nos pri-
meiros nove meses do corrente ano".x Nos anos que precede- e
ram o comêço da guerra os produtor.es latino-americanos ex-
portavam aos E-stadosUnidos .uma média anual de treze mi-
lhões trezentos e oitenta e cinco mil sacas, quer dizer, 569o;
para a Europa, exportavam nove milhões e sete mil, ou 38%a.
Nessemesmo período, as importações da América Latina nos
Estados Unidos representavam 93,3%o de todo o café ali en-
trado (média anual). Acrescente-seuma ofei.ta de café nó mer-
cado mundial de mais quatro milhões e oitocentas mil sacas.
África e Ária enviavam aos Estados Unidos cêrca de quinhentas
mil sacas(médiaanual);o restodo caféera mandadoàsres-
pectivas metrópoles, e tinha tratamento preferencial. O bloqueio
da Europa interditou na prática toda essaprodução colonial de
alcançar aquêles centros consumidores de seus cafés. Assim se
pwha a situação estatística mundial do café: uma oferta po-
tencial de vinte e seis milhões de sacas no mercado americano
para uma procura de no máximqdezesseis milhões. Admitir, nas
condiçõesdadas, que o jogo da oferta e da procura se pudesse
exercitar, simplesmente,era admitir uma baixa vertical nos pre-
ços, ou a catástrofe para quatorze países latino-americanos, cuja
estrutura económica se apoiava no café.z A Terceira Confe-
rência Americana do Café se reúne em junho de ]940, com o
fito de estabelecer
um plano de cotas para a exportação: de
café aos EstadosUnidos. Ê-atesaceitam participar da confe-
rência (sem isso não haveria, aliás, o que deliberar). O projeto
de cota é aceito, mas sem a necessáriaunanimidade; uma mino-
ria de produtoresfica de fora. Afinal, depoisde.muitas.nego-
ciações,a 28 de novembrode 1940 um acordo é fechado.No
1 cousa Costa, Pa/zorama Fi/zanceíro e Eco/tónico, D.i.p.l 1941,
pag 91
2 Todos êssesdados são do Manual do Comitê Consultivo Económico
é..'Usei L:;:''H': {l='Ç:k l"Z'TãZ'
q: ''"" '"«'", e Financeiro, terceira parte, págs. 101 e seguintes.Ver também Chamisso,
obra citada, págs. 158-161.
/82
/83
acordode comprasde excedentes
de arroz (21-12-43), com
troca de notas, para prori.ogá-lo, em 20-7-45, com plano limi-
tado de compras, obrigando-se o Govêrno brasileiro a contin-
genciar sua exportação do produto. Antes do convênio, o co-
mércio exportadordo Brasil havia sofrido uma baixa de 35 a
40% dos totais anteriores
Não se pense, porém, que o convênio não levantou críticas
nos Estados Unidos, em nome da intangibilidade dos preços no
mercado.Referimo-nosoutra vez ao ProfessorWickizer. em sua
obra sabre o café. O professor da Califómia discute a tentativa
do Brasilno sentidode estabilizaros preços.Para êle o êno
dos esquemasde controle é que o nível a que são fixados os
preços.tende a ser alto bastante para dar lucro ao produtor do
mais alto custo. (Com isso assegura-senão sõmentd'uma renda
diferencial mais alta, mas tão alta que cobre a renda absoluta
da terra e impede seu valor de baixar. É o prêmio que o pro-
prietário da terra pede ao produtor, aó capitalista, Faia as ope-
rações comerciais ou valorizantes dêste). O nível alto incita,
por sua vez à superproduçãonão só no Brasil mas nos outros
países produtores do café, estabelecendo-se então um preço
que.desestimula a expansão do consumo. Para êles a posição
do Bmsil no mundo do café foi enfraquecidae não reforçada
com o resultado da experiência de controles artificiais e dos
efeitos sabre sua economia doméstica. Os preços estabelecidos
no convénio interamericanodo café de 1940 teriam sido muito
altos, muito acima do custo da produção. Chamou êle fortemente
a atençãopara o preço difeKncial em favor dos cafésmolesda
Colâmbia e outras repúblicas próximas ao Equador. O Brasil
aproveitou-se da situação para colocar seus cafés duros numa
relativamentemelhor posiçãode preço que as preferênciasdo
consumidor justificavam. A situação intêrnaciolial, inclusive a
posição estratégica do Brasi], observava o professor, não jus-
tificava os altos preços que foram consentidos, particulamlente
quando grandes compras de outras mercadorias dês.sesmesmos
países são tomadas em conta.
A análise do economista ortodoxo, como preito aos tempos,
tomando em consideração a posição -estratégica do Brasil e a
própria situação internacional, mostrava que aquelas grandes
l Quer dizer, um comprador absoluto geral e não -- ----. . compras não pediam tão altos preços para o convênio do café,
çm carne e osso. Um comprador "político';, em suma. uipiaclores uma vez que outras mercadorias dos mesmospaíses, em grande
procura, lhes proporcionavam fortes vendas. Na verdade, a mo-
l
/85
.r'\ hiSTÓRiA das relações dos Estados Unidos com a
AméricaLatina, a partir da épocada boa vizinhança,é um ne-
gaceio permanente entre permanentes interêsses económicos de
seus monopólios e consideraçõespolíticas nacionais. Em ne-
nhum campo êssenegaceio é mais patente do que no compor-
tamento do Govêrno americano em relação ao problema vital da
e-stabilização do preços de produtos primários e financiamentos
compensatórios.
Para que isso surja com maior clareza,veja-
mos o que a respeito dizem duas autoridades económicas: o Dr.
RobertoCampose o ProfessorPowelson.Um o faz no seulivro
aqui já muitas vêzw comentado;o outro, numa conferênciaem
seminário na Bahia, do qual participaram também os Srs. David
Rockefeller, Embaixador Lincoln Gordon e outros (editado em
livro por Mildtled Adaur, sob o título: Z,affn .dmerfau -- Eva-
Zzzfíonor Exphsíon? -- 1963). Ambos falam linguagem eru-
dita e acadêmica.Ambos sustentam ao mesmo tempo um otimis-
mo circunspecto e regularmente burocratizada. Apenas o Pro-
fessor Pawelson, na sua qualidade de americano e de puro técnico.
sem maiores responsabilidadespolíticas, tende a ser mais franco
e com simplicidade expõe sua opinião. O seu êmulo, hoje emi-
nentíssimohomempúblico no Brasi], depois de ser embaixa-
dor do Govêrno deposto, se compôs um estilo que, se é pedante
/87
por si, que estão criando dificuldades,para ver se soluçoes.em
cooperação podem ser achada?. Já asslim fizemos no caso :lo café
e mais recentementeno caso do chumbo e do zinco: Acreditamos
que uma efetiva cooperaçãointemacional para evitar desequilí-
brios repetidos e agudosentre a oferta e a procura dessasmerca-
dorias possa ser uma importante contribuição,para os, nossos
objetivos.'. Isso 'não significa que soluções fáceis podem ser
encontradas. Isso não significa que tenhamos alterado nossas
opiniões relativas à impraticabilidlde de esquemas de es111bi-
lização rígida de preços Isso significa que sentimos.que ganhos
reais podem ser obtidos onde qu;r que nõs tentemos todos juntos,
em boa fé e discutamos os nossos problemas comuns."' ; .
A linguagemera nova, quase patética, como convinha às
"exigênciasdo tempo". Passado o. ano, o choque seguinteestava
fadado a trazer contratempos e dissabores ainda mais fortes.no
seu baia: a Revolução cubana. Washhgton,. mesmo sob !?se-
o
nhower vivo dias de aborrecimento e .nervosismo. Presljen-

Compreendem e compartilham as preocupações expressas pelos


paísesda América Latina .a êsserespeito. Estamosprontos a
óos juntar (a êles) no estudo dos problemas de cada mercadoria
l Obra citada, pág. 31 xador, pois dêle não se sai.
}88 /89
nos locais mais fortes". palavras! o Dr. Campos sel.qglava :l)b

te Johnsone seuEmbaixadorno Brasil e, sema menordúvida,


com as ardentes simpatias daquelas mesmas companhias que
vinham perdendo força, segundo o Dr. Campos e pelas.quais
falam tãaibémno semináriona Baciae com autoridade be2
maior do que a dêste, o seu colega americano,Sr. David

190 29/
FI

motivadas, pois em ciências sociais o quanfzzm pessoal, os fa-


târes subjeãvos são também componentes ou dimensões da
realidadesocial de que participam e sabre a qual influem. Entre
os componentesvivos da realidade social um número crescente
dêles tem consciência de si mesmo na situação e da responsa-
bilidade no seu todo.
Deixemos pois de lado, ao menos por um momento, essas
especulaçõessabre as motivações subjetivas que têm ou teriam
levado os governantes americanos a concordaremt com várias
das reivindicações económicas dos subdesenvolvidos da Amé-
rica Latina. Procuremos encontrar para isso ao menos algumas
razões económicas, pois que essas são claras, precisas e se
supõemcom razoáveldosede objetividadeservir de baseà re-
sistênciadas que, no Govêrno ou fora dêle, se opõem nos Esta-
dos Unidos a qualquer mudança na rotina ou na prática eco-
nómica usual.
Exigir que o Dr. Campos abandone sua Ihguagem sub-
britânica pelos subtons e preciosa pelo amor aos crachás (!es-
quícios talvez do matogrossensesubdesenvolvido que ainda dor.
me nêle) para dizer as coisascom simplicidadee clarezaé
esperaro impossívele, talvez, até seja injusto para com os re-
quififes, caprichos e ungüentos da sua personalidade. Para que
pedir-lhe que se despojo dêles? De qualquer maneira, o Di'.
Camposera, então, capaz de afirmar: "A América Latina não
esqueceo uso de pressãoarmada para afetar sistemaspolíticos"
ou'"restaurar a ordem civil" Da América Central e nasCaraíbas,
de 1912 a 1934, "com um implícito objetivo de desencorajar
a implantação de regimes ditatoriais", embora -- reconhece --
"em um bom número de casosrazões mais pragmáticasde pro-
teger a propriedade americana e de assegurar a solvência fi-
nanceira fossem dominantes". Também ''mais recentemente,. o
apoio militar e logísticopara a derrubadado regimeguatemal-
teco de Arbenz, a invasão aberta de Cuba e a demonstração
de força naval 'em São Domingos exemplificam tentativas de
f induzir a modificação de sistemas autoritários, recorrendo-se a
pressão militar". (Amanhã, quando o regime político ..atual. es-
tiver passado,comoirá êle exprimir a "pressão' ou ''logística.'
americana nas mudanças polãicas então havidas no Brasil?)
l Com mais precisãose deve dizer: têm declaradoque concordam
V
2
Em face da situaçãobrasileira tal como se apresentaapós
o golpede l de abril, dir-se-iater o Dr. RobertoCampostra-
çado, de antemão, o quadro político em que se viu e-nvolvido,
desde então, como o responsável pela política económica mone-
tarista imposta pelo rMI e pelos círculos financeiros de Wash-
ington. Pelas consideraçõesexpostaspelo seu principal Minis-
tro em 1964, com efeito, o Govêrno do MarechalCastelonão
pode sobreviversenãocomo uma "ditadura impopular", mas
intimamente identificada -- ou vice-versa -- com a Adminis-
tração Johnson. Seu programa, pai-a vingar, terá de "completar
o mal, sob condiçõessemicatastróficas".E para que não se te-
nha dúvida sabre a probabilidade de repetiçõe-s dessa ordem,
êle anemata: ''Em anos recentes a experiência não tem sido
senão frequente demais na América Latina."
Agora, sim, as relações lógicas, conceituais, se apresentam
sem invocar especulações subjetivas ou mágicas, entre o político
e o económico.Por baixo das peripéciase dramatizações
polí-
ticas denota-se uma linha de seqüência que explica senão a con-
tinuidade, a relativa coerência da política económica imperial
americana. através os anos.
Ao tratar da questão dos preços das mercadorias, êle
assinala, como Poweison, "a resistência contínua dos Estados
Unidos à sua estabilizaçãoem esquemasparitários -- manufa-
turados e primários -- e na cooperação internacional, mediante
convênios ou financiamento compensatório destinados a regu-
lar o mercadoe assegurar
a estabilidade
dos ganhosno inter-
câmbio externo. Os Estados.Unidos, sempre reticentes,prome-
maior tenha de ser aceito sob condições semicatastróficas". Para tem estudar (como até hoje continuam a fazer) mas sempre
vlr em seu apoio, chama o Professor David Felix, para quem lzon commi/fa/ quanto a qualqueração". Comprovandoessa
"manter uma série Consistentemente ortodoxa de medidas 'eco- atitude Kticente, o Dr. Campos evoca o que se passou na Confe-
requer usualmente rência Interamericana Económica de Ministros da Fazenda, em

BB.Egg;$=H$':B:
nõmica e . um clima favorável aos investimentos, identificar-se
Petrópolis, outubro de 1954, quando uma proposta latino-ame-
ricana para estabilizar os preços das matérias-primasfoi rejei-
tada pelos Estados Unidos como ''cima aznleaçaà livre emprêsíz"
por demais estreitamente com ditaduras impopulares'=t Eis aí uma fala clara, sem rebuços,que não mistifica nem se

l (rÀe 4//lance /or 325) 'The long and the short vier, Centennial tar a impopularidade. Para permanecer, porém, fielmente dentro dos
moldes exigidos em Washington -- ou na OnA-- isto é, os da "demo-
cracia representativa", o Congresso "funciona", o presidente foi "elei-
to" e é I'constitucional". No entanto, uma "linha dura" anónima, fe-
chada nos quartéis, integrante, poréml do novo regime legal, tem por
função quebrar as ditas resistências.
194
/95
perde em f?bulaçõesideológicas.Que a posiçãoamericana-- o preço mais flexível à vontade do consumidor.: Em Londres
esta, sim, de princípio.-- não.mudou, i) prova o comporta- como em Washington, os americanos estão prevenidos para não
mento americanode ]á para cá, mesmocom as exceçõesde consentir em "subsídios", para não permitir as velhas larguezas
Bogotá ou Punta del Este. ' ': "
de 1940, para não at-entarcontra a ortodoxia do mercado. Con-
Em 1964, na conferência dos subdesenvolvidos sob a égi- vênioscomo êsse,não esqueçamos, são "uma ameaçaà .livre
de da.ONU, em Genebra, foram os delegados norte-americanos emprêsa". Para que as vistas de Washington se tornem ''mais
os mais linflexíveis contra concretizar-se qualquer proposta posi- fle;íveis" com relação ao café e aos outros produtos sul-ameri-
tiva para a defesa ou regulamentação em defesa'dos 'pmdutos
canos, já não bastam as cusparadas antiimperialístas de :Caraças
primflrios no mercadomundial. O máximo que se conseguiufoi ou mesmo a revolução entre os cubanos. Seria preciso uma
nomear uma comissão e transferir o problema para a ONU,para verdadeira revolução nas práticas do comércio mundial= Ou
estudo O ,professorCamposafimia, entretanto,que essapolí- uma revolução em profundidade no sistemaeconómico brasileiro.
tica americana fará substancialmente modificada, pois que,
desdeBogotá e depois Punha del Este, os Estados Unidos focam Se voltarmos agora às vistas do professor Powelson sabre
os mesmosproblemas analisadospelo .seu êmulo.brasileiro, ven
levados "a uma participação mais atava no esforço 'de estabb
ficaremos que o professor americano faz um esforço bem maior
lização dos preços do café". Assim, toda a demonstraçãodessa em analisá=los sob o ângulo económico. Há nêle, pelo menos,
PT.gTça estÍlv2 então num convênio de café qu;'Wlii;ii;Ü;l uma tentativa de raciona]izar o assunto., Se ]he parece ter a acei-
assinou em 1962, em face de precedentes impossíveis de esconder.
A "modificação substancial" desdeBogatá e Punta del Este tação do convênio do café se tornado "instrumento da guerra
é deduzida da "participação mais atava dos EstadosUnidos no fria", nem por isso renuncioua tentar descobrir"razões eco-
esforço por estabilizar os preços do café". Convenhamosser nómicas"para que os EstadosUnidos concordassem cl:m os
pouco. Como essa.modificação "substancial" se caracteriza pela convénios: é preferível adquirir as matérias-primasonde são
mais baratas. FÇ)r isso os negociantes norte-americanos prever?m
boa vontade americanaem estabilizar os preços do café, cabe
aqui mostrarque o que os americanosfizeramem 1962 ou antes comprar as matérias .primas de fontes estrangeiras, inclu-
mais recentementeestá longe de poder ser comparado ao con- sive na América Latina, onde o baço custo do trabalho é um
fatos nesse sentido. A política oficial, reconhece Powelson, sem
vênio de café celebradoem 1940, quando, segundoo Sr. Cam-
pos, as relaçõesdos EstadosUnidos com a América Latina
eram governadas pelo geo-pa/í/icaZ approacã. Não há dúvida: #%hÊ üi:s:s=.i:in.==i:=
nçi
"que fazem honestamenteo máximo .para divorciar as opiniões
a situaçãoestratégicado País,muito aproximadoentão da Ale-
manha pela aviação, impunha aos Estados Unidos relações da- profissionais dos interêsses pessoais, têm aconselhado prudência
quela ordem. A pressão geopolítica era tão forte (para falar l Na reunião de 1965 em Londres, o total das cotas fixas foi.fixado
na linguagem campista) que, além do subsídio aos produtores para o ano cafeeiro,iniciado em oltulro daqueleano, em 43 luu uuu
de café, Washington ainda fêz considerável investimento público sacaspara um consumo previsto de 45 000 000 d! sacas, se o preço médio
na construção de Volta.Redonda. E agora? Um prometode con-
vênio de café foi negociado a duras penas no Senado americano 11Ü
:ãÜiUtiÜj« J::;:ã":!-:,::':Ê::ê::i:;
"=1':;4
as importaçõesnos EstadosUnidos e obtendoque os .outros país:s
e no Conselho do Café, em Londres. Nesta Capital, o Brasil produtores' estabeleçam metas de produção. Quer aind!..instituir a. di-
pleiteou cotas mais baixas de café a fim de melhor defenderos versificação'das regiõescafeeiras;'em suma, uma política que disci-
preços.contra eventuais quedas.no mercado. Foi derrotado pela pline os outros países produtores.. .Mas o .convênio de. preçosi que so-
bretudo interessa aos Estados Unidos -- é simplesmenteanual:.Isto .é,
oposição sistemática dos Estados Unidos à proposta brasileira
de uma cota geral de exportaçãoe consumode 35,2 milhões de fica prêso constantemente à conjuntura .imediata.do mercad!.(Ver de-
clarações públicas do Ministro da Indústria e .Comércio sabre.o con-
sacas;os EstadosUnidos forçaram a aceitaçãode um aumento vênio firmado e as negociaçõesna reunião da OrganizaçãoInterna-
na cota brasileira de dois milhõesde sacas,no intuito de tornar cional do Café.Correio da ZUanAã,l0/8/65.)
/9Ó /97
no aceitar convênios de mercadorias". As recomendações dêles mesmo dos mercados centralmente controlados do café do Brasil

IHgHH:itS0$
:mú8$
e Colâmbia". Daí acreditar que ''os latinos farão bem em unir:se
entre êles, como uma fârçã de contrapêso em face daqueles
compradores". E diz: "A vontade de comprar a. preç(3? ,nlps
res e, ainda mais, êles e não os EstadosUnidos, é que' devem' baixos é uma razão, mas apenas uma, pela qual os Estados
empreendê:la. O meio .de o conseguir seria de ordem fiscal. Os Unidos se têm oposto, tradicionalmente, aos acordosde merca-
produtos dessasmatérias primárias seriam taxadas quando os dorias. E a justificação dêles está na convicção de ser o pro'
preços estivessemaltas e os fundos deposi:ladosno Tesouro b ema dos produtores primários problema dos latinos, cabendo
a estessoluiioná-lo. Mais ainda: há forte crença de que às orga-
nizações monopolistas na América Latina (e alhures entre pro"-
dutores' primários) falta a iniciativa pa1la reduzir os.custos. .O
se traduz em ineficiência nas operações das.emprêsasnacio-
nais. A América Latina não apresentarecorde favorável sob
êsse aspecto". Mas se muitas dessas observações sao exatas,
não se compreende,nêle, essa série de perguntas:..'Por que,
então, a 'oposição dos Estados Unidos tem diminuído nos re-
locais". (Eis em que não falaria DOBrasil o Dr. Campos) Aqui centesanos?Por que os EstadosUnidos se têm mostradoincli-
é-nos forçoso confessar nosso ceticismo, pois 'tudo está a 'de- nados a reunir-se a grupos de estudos sabre produt?s e .po!
monstrar ser essavirtude hoje mero /eed-bzÚkideológico; mesmo que concordaram. em assinar o convênio de café? Haverá aí
Estados Unidos, onde a "ética. capitalista" é soberana, a uma estratégia política? Descobriram os Estados Unidos.que
tendência.é para.entregar ao Estado o poder de 'intervir na necessitamdo apoio latino-americano para a guerra fria? E es-
soluções dos problemas locais. Além disso, é o caso de se per- tarão prostituirtda sitas convicções ecanõmicas para ganhar uma
guntai. é, por exemplo, a produção de café problema local? base momentânea na opinião fundia!?" .A resposta é sim, con-
Há ainda outra posição dos economistas profissionais com fessa, sem restrições, o professor. "SÓ os ingênuos demais, diz-
relação.aos.convênios, qu-eé bem mais fundamental; é a relativa nos êle, para encarar dê frente a realidade política, raciocina-
ao nível médio dos preços- As diferençasopinativas são aqui, riam de outra maneira. Mas não é tudo. Não possopredizer sa
nos diz. Powelson, função "dos diferentes graus de aceitação do a reviravolta será de longa duração. Sua base política é clara
mercado como árbi/ro doi preços". "Os norte-americanos tendem. e pode durar apenasenquanto durar a guerra fria." Ao escrever
confessao nossoeconomista:a.não ver nada de errado com o as linhas acima, o professor Powelson foi franco. A era pó!-
mercado. l Eis aí uma posição "de princípio", isto é, de classe, krucheviana, como a krucheviana, será ou não de ''guerra fria",
irredutível nas condiçõesjurídicas vigentes ná sociedadee nm mas forçosamente será de "coexistência"; quer dizer, os. fatâres
Estados americanos. Ela significa que as classes determinantes políticos oriundos da chamada Doutrina Truman . (cujo prin-
na sociedade americana nada têm 'a reclamar do capitalismo. cipal representante, e aquêle que a encarnou verdadeiramente
Êle também: abas,.nada vê de errado no mercado e,'por isso com a fidelidade e o destemor qua-seque de um cruzado místico
mesmo, desdenha do alegado poder dos monopólios 'que para da Idade Média, foi o Secretáriode estado do PresidenteEise-
êle é mais espantalhoque outra coisa. Entretanto,não (fixa nhower, Fostes Dulles) terão de fazer espaço.aos fatâres eco-
reconhecer. -- justiça se ]he faça -- "apresentarem aquêles nómicos.l Êssestendem a dominar no centro da cena mundial.
uma frente substancialde barganhavis à vis dospl-odutoresde
borrachado Equador, dos criadoresda Argentinae Uruguai e l Do contrário será a guerra, a guerra mesma e não "fria", embora
não necessàriamente nuclear, como recentemente no Vietnã. A. guerra
l Obra citada, pág. 144. na periferia;' asiática será então o substituto da guerra fria e. ..
198 r99
A luta por essa primazia dos fatâres económicos constituirá quer dizer, de acordo com uma filosofia neocapitalista privada,
a essência da estratégia soviética até, talvez, o fim do século. em obediência a tendências sócio-produtivas exógenas, que
Seráuma épocaem que, não sementena União Soviéticamas viriam com o tempo privilegiar camadasburocráticasdirigentes
e centros individualizados de acumulação na agricultura indus-
em geral, as armas da lideologia serão substituídas pela ideolo-
gia . das armas, ou pelo realismo. Permitam-nos, 'agora, êste trializada (acusações ou previsões pessimistas dessa ordem têm
parêntese:Os governantesatuais soviéticossão de uma geração partido dos chinesesde Pequim); mas que vise -- para que a
que não fêz a revolução, nem sequer tomou parte atava ou de- grande experiência da revolução russa possa afinal vhg?! --..a
terminante nas graves lutas fracionais internas após a conquista serviços para o povo, quer 'dizer, de 'acôrdo com a filosofia
do poder e a morte de Lênin; foram formados como técnicos, socialista coletiva, à satisfação comunitária cada vez mais flexí-
como burocratas-- dentro e fora da política do poder -- com vel, mais fácil, cada vez mais automática, numa perspectiva que
as conotações más e boas dêsses conceitos. Estão interessados se deve aproximar cada vez mais das necessidadesde cada um,
sobretudo no fazer e não no agu, na eficiência da gigantesca isto é, numa perspectiva ilimitada.
maquina económica e social que os seus maiores e êles mesmos ''Coexistênciapacífica" que não fosse uma mera trégua na
ajudaram a construir e montar. Sua posição no contexto social guerra social, questão de relação de forças, era para Lênin, para
russo, suas tarefas são outras que as dos fundadores revolucio- Trotsky, para os teóricos © fundadores do Estado Operário russo
e da Internacional Comunista, a marca mesma da oportunismo.
nários do Estado soviético. Pala êles ou os que os sucederem, Concebê-la como duradoura, como estratégica, como toda uma
os "princípios" do socialismonão estãonos textos sagradosde
Marx ou de Lênin! nem mesmonas imagensgloriosasda meni- fase histórica, parte da integração da economia pública estatal
niw, de outubrode 1917:operários
e soldados
famintosmas no mercado mundial é revisionísmo, embora possa ser do bom
iluminados pela esperança,a bandeira vermelha ondulando sabre revisionismo. Eis porque para Kruchev e sobretudo para seus
continuadores atualmente à frente do Kremlin, a coexistência
as cabeças? assaltando o Palácio de Inverno, em Pettogrado
etc. E muito menos e.suãoDa montagem da deificação de um pacífica significa colocar no plano económico o cotejo dos dois
paranóico..na fase mais sombria da ]listória moderlla, quando regimes, o cotejo entre as duas grandes hipóteses de organização
em face dêsse processo outro semelhante era montado' na culta da sociedadede massanos próximos tempos; a do fomiidável
e civilizada Alemanha, sem falar na ltália e outras tentativas capitalismo americano, a máquina produtiva mais perfeita e mais
afins em países.menores. Para os dirigentes atuais êsses«prin- poderosaque já se construiu na história, em marcha para o seu
cípios" estão antes nas correias de transmissão ou Dos volantes apogeuo a das economiasdo mundo dito socialista,de que a
de suas máquinas, .na força de seus geradores de energia, na russa é a maior, a mais poderosa e representativa,embora ainda
precisão.de.suas linhas de comunicação à distância, na exatidão em fomiação, agitada pelas contradições, inclusive sociais, de
e minúcia de seus f?paradores estatísticos, de seus computadores classeatée pelosanacronismos,
sobretudo
de doutrinae dog-
eletrânicos, na flexibilidade e eficácia de seus planejamentos, na mática políticas, longe da flexibilidade da máquina produtiva
coordenação ótima de seus grandes trustes ecÓnâmicos entre si. americana e da bela proporcionalidade de seus diversos ramos
produtivos. É possível que a estratégia dos responsáveis pelos
no acoplamento perfeito da complexo industrial e do complexo
destinos dos Estados Unidos seja, ao contrário, conservar o
agrícolae do todo produtivo com ú todo consumidor,no apro- mundo na contexto da guerra fria, quer dizer, impedir que a
veitamento ao máximo das energias intelectuais da mocidade,
num esforço final para alcançar a produção em massa, já ma- grande questão, a grande escolha seja posta no plano da com-
dura Ros Estados Unidos. Façamospreces, porém, pala que petição económica,cada país livre de seguir o .modêlosócio-
êsse esforço não seja para o consumo em massa à americana, êconâmico para seu desenvolvimento e prosperidade que seu
povo escolher. Os americanos visariam a impor. à economia
também simultânea à "coeHstência pacífica". As guerras frias e quentes lioviética um estado permanente de tensão, obriga-n-do-aa expan-
serão endêmicas na periferia das metrópoles. dir-se na corrida armameRtistadas táticas de sobrevivência em

200 20]
função da estratégia da dissuasão. Nesse caso, em verdade, será económicas, sociais, culturais prevalecentes em sociedades de
necessário manter o plano da guerra fria com as deformações aparelho económico menos perfeito. Ou w joga o jogo da con-
e aberrações da guen'a ideológica a envenenar o ambiente social corrência, dos intercâmbios coma êle quer, conforme as regras
e político nacional .e internacionalmente; Continuar-se-á no pro- que êle próprio estabeleceu
-- e ganharásemprecontra os
cesso sistemático d-e alienar da realidade os homens de- Di)sso outros --. ou terá de aceitar, conscientemente, alterações nas
tempo regras do jogo capitalista. Exemplo histórico disso: depois da
O parêntese foi longo, embora necessário para abrir algu- Primeira Grande Guerra e seguindo-seao período de zoom dos
ma clareira no ingênuo provincianismo, que nos perdoe em o idos de 20, em face da prolongada crise de depressãoem que
dizer, das lucubraçõespolíticas do eminente professor Powelson. o mecanismo capitalista fracassou, o público americano não
Voltemos à questãopor êle levantada. É claro, a política ame pede deixar de tomar conhecimentodo fato, pois que o sentiu
ricana de apoio ou não à defesa dos produtos primários dos na própria carne. A con-sciência americana pela primeira vez
países subdesenvolvidos durará enquanto durarem as exigências põe em dúvida a perenidade e a excelência do sistema capitalista.
da guerrafria. Mastudo indicaestara mesmatendendo
a es- Em sua maioria, o povo inclinou-se em aceitar as modificações
vair-se, pelo menos no plano estratégicoda Europa Ocidental, que a própria depressão,como condição para ser superada,tor-
incoercivelmente atraída para renovar seus laços, velhos laços, nava possíveis e digeríveis ao paladar americano. Depois, em
económicos, sociais, culturais com a outra banda da também outra fase,veio a luta contra as normas do comérciointernacio-
velha Europa. Por ora, o GeneralDe Gaulle é o pioneiro dessa nal inaugurado pela Alemanha nazista, a liquidação da inamo-
tendência. Cedo, outros, na Europa, o seguirão. Isso é inevitá- vibilidade do padrão ouro, o investimentoestatal em obras pú-
vel. Enquanto puderem, porém, os Estados Unidos procurarão b[icas, o p]anejamento. Na luta contra a estatização da moeda
conservar-lheparte da virulência, ou pelo mono-sos seusefeitos dirigida e do comércio bilateral alemão, os americanosfizeram
no resto do mundo, especialmentena sua América Latina. Os a guerra,comia intervençãomaciça do Estadonas relaçõesde
países dêsseresto de mundo são contudo paísesde economia em produção, nos investimentos públicos, em substituição aos pri-
formação que não tomaram o rumo definitivo, ou não fizeram vados, ço sistema de defesa de preços, de estocagemde mate-
a escolha histórica. O subdesenvolvimento ainda é a chance riais críticos e estratégicos, de controle cada vez mais acentuado
americana de manter sobrevivente uma forma de colonização no mercado. Termina o conflito mundial e quando se pensava
que consi-steem traçar para êsws paísesas vias, dir-se-ia eter- que, afinal, se ia voltar ao privatismo económicogeral, ao su-
nas, da livre emprêsa. Assim o superimperialismo americano posto espoDtaneísmodo mercado e dos investimentos, às velhas
exercerá sôbre êles um controle que poderá ser ameno, razoável normas da economia mercantil, em suma, arquivadas pelo menos
e até alegre, mas saberá distinguir os seuse os interêsse.scrioulos. pajlcialmentedesde 1929, eis que novamente o que se apresenta
É inútil tergiversar. As vias do regime económico vige-nte é defrontar as regrasnovíssimasdo ca-pitalismo'de Estado (ou
nos Estados Unidos são inflexíveis. Assim como serviram a'êles, socialismo) russo, a ruína total das velhas economias mercantes
têm de servir aos outros. É a Doutrina Truman. O capitalismo européias; e a resposta? Foram as doações maciças de capitais
americanonão pode mais viver, com efeito, senãoem antago- públicos, a redistribuição planejada das rendas pelo Estado, o
nismo cada vez maior com o mundo exterior. É-lhe difícil. senãc} Plano Marshall. A última fase, a da guerra fria, se caracteriza
impossível manter relações económicas com os outros países, por uma intensapolítica externa intervencionistapara defender
sem crescentes choques de interêsses. Sua posição hegemónica a livre emprêsacapitalista,mas no cursoda qual medidaseco-
é de tal ordem que tende involuntária ou espontâneamente,
por nómicas de ordem geral por assim dizer clássicas são suprimidas
si mesmo, a envolver as outras economiasem seu contrito, ou deformadaspara manter o i/a/u que económico e social, que
para subjuga-las senão combatê-las. (Ver as inversões anuais só é mantido atravésuma mobilização política, ideológica, mi-
na Europa.) Do contrário, terá que se adaptar às condições litar permanente.
202 203

]..
No fundo, o que se chamou de "guerra fria", lançada ao os outros objetivos, como sejam o crescimento do bem-estar
mesmotempo que o PresidenteTruman declarava que nãa po- social e a continuação do progresso económico, embora rela-
deria o sistema americano sobreviver se não passassea vigorar cionados com o objetivo principal, são de importância secun-
no resto do mundo, foi a tentativa, como política sistemática dária." Tal prioridade que evoca a atmosfera wagneriana-
dos Estados Unidos, de comu-nácar
aos povos que seu objetivo hitlerista do Crespzísczz/o
dos Dezlsei, pede, para justificar-se,
nacional não poderia ser defendido e assegurado senão com a a opção em face de um supremo mal incorrigível: ". . .não
imposiçãoao planêtade seu sistemade livre emprêsaprivada. podemostolerar de modo algum a sobrevivênciade um sistema
Seu ideal de grandeza abrange a adaptação do mundo inteiro político (o comunismo) que tem tanto a crescente capacidade
à sua política. A guerra fria é a expressãode uma contradição como o desejobrutal de nos destruir. Não temosoutra alter-
insanável entre êsse "objetivo nacionalmente privado permanen- nativa senão adotar uma estratégiacatânica."I Há nisso um
te americano" e a liberdade do mundo. A estratégia traçada provincianismo perigoso para a paz e a tranqüilidade do mundo.
para sua vitória pressupõeque, do lado do comunismo,seja Daí um descontentamento crescente na frente internacional,
inconcebível qualquer alteração de comportamento "que possa a dissoluçãoprogressistado bloco ocidentalde defesado ilafu
permitir um acordo com o Ocidente". Essa pressuposição,que que político, social,económico,na paz, que se seguiuà vitória
nada, nem teórica nem tàticamente justifica é, no edita-nto,abso- sabre Q Eixo. Por sua vez, a manutenção do ifafzz qzzona frente
lutamente necessáriapara a fortaleza do pensamento estratégico internacional traz a rebelião do Zero fro À/24nda, inconformado
americano. O a]mirante Ward definiu, nesse sentido, lapidar- com os privilégios das nações industrializadas na arena do co-
mente, o objetivo nacional americano: "a vitória sabre o comu- mércio mundial. Ou alteram-se as regras do jogo, ou desmorona
nismoT. Num livro capital para a compreensão do pensamento o i/afu qlzo mundial com a agravaçãoextremadas tensões,in-
estratégico americano, destinado ao Instituto de Estudos de Po- ternamente, nos Estados, ou externamente, nas relações entre
lítica Estrangeira, t/üna' E.çlrafégz'apara a ,4mérfaa, da autoria êles. Agravação das tensõesnão se daria mais, p-orém,como
conjunta de três dos maiores teóücos da guerra moderníssima, aos primeiros tempos do pósguerra, contra os regimes ditcrs
coronel W. Kinster, da atava,Dr. StephanT. Possnony,diretor comunistas, em processo, aliás, de adaptação e democratização,
dos EstadosInternacionais do Instituto Hoover, Stanfofd, Uni- mas antes contra as ameaças de depressão e de pauperização
versidadeda Califórnia, e Dr. Robert Strausz-Hupé,assim se em permanência.Os p-ovossubdesenvolvido-s não aceitama mi-
define, de forma igualmente lapidar, o objetivo nacional ame- sériacomo o seulote na história. Não há saídapara o dilema.
ricano: "Ninguém acreditará. É a paz mundial, por meio de Os Estados Unidos estão Duma das pontas do dilema.
uma lei imposta a todos." Não estáclaro? É a DeclaraçãoTru-
man, definida em têrmos aritméticos, como convém a planeja-
#

dores militares. Não há saída para a contradição: a não ser que


o mundo todo se subordina à sua ''lei", o objetivo nacional Não exageremos, porém, as condições feitas aos países
americanojamais poderá ser assegurado.Enquanto não conse- subdesenvolvidospelo sistema das economias privatistas. Em
guir aquêle objetivo, a política americana tomará cada vez mais face da pujança e das virtualidades económicasque se contêm,
um caráter provinciano, isto é, em oposição ao mundo. Por hoje, no aparelho financeiro e produtivo americano, não é ape-
quê? Por ser inevitável que êste continue a vogar num plura- nas pelo seu lado negativo que se pode assinalaro papel dos
lismo de objetivos nacionais, num pluralismo de culturas oti Estados Unidos .na colaboração com outros países no esforço
de modos de viver, com aspiraçõesbásicasque não poderão ser de estimular as economiasprimárias. A maior crítica aos con-
conseguidas senão contrariando o sistema americano, fundado vénios de estabilização dos preços primários é que não resolvem
no "objetivo de maior prioridade", aquêleque a grandeestra-
tégia americana coloca ''acima de tudo", mesmo "de preferência l Citado por Fred J. Cook- em O Enfado Ã4ílírarísfa, Ed Civilização
à preservaçãoda paz", a "vitória sabre o comunismo"."Todos Brasileira, Rio de Janeiro, pág- 285.

204 205
o problema mas antes o perpetuam.Um remédio mais radical dência e até sabedoriano procurar atenuar a rigidez dos meca-
seria persuadir os produtores dêles a abandonarem culturas em ni-smosfinanceiros e as fiiaquezas congênitas de ordem estru-
superabundância por outras em escassez. Êsse remédio é para tural dos países subdesenvolvidos. Trabalham, com eileito, para
nós uma autêntica."mesinha" caseira. A história mesma de nossa a paz e para o mundo, tentando conciliar as idiossincrasiasdas
evolução económicanâ-la tem imposto desde as prismaseras diversas economias nacionais e regionais. Mas a tendência de
coloniais. E agora, com o café em estado crítico crónico, inú- seus esforços e estudos é no sentido de romper as cristalizações
meros são os produtores brasileiros que passarama cultivar cana dogmáticas das teorias económicas e, ao contrário, estimular ou
de açúcar, algodão, criação etc. Mas c-omopersuadir os pro- cultivar os embriõesde instituiçõesnovas no plana dos inves-
dutoresa passarem
a ''ocupaçõe-s
de maiornecessidade"?
Pa- timentos, por exemplo, como um jardineiro ou agrimensor ou
gando-lhes menos, propõe o nosso Povmlson. Poder-se-á até botânico cuida com carinho dos híbridos novos.
graduar o declínio nos preços, para a operação não ser penosa Em 1963, a discussão do plano oferecido prosseguiu entre
demais.Há, porém, que pagar o que Powelson batizou de "as a ONUe o PMI e, segundoinforma Powelson, êle mesmo técnico
durezas da mudança". Em relação ao Brasil, o marechal Castelo daqueleFundo, êste autorizou a retirada de 259o das cotas
tem a força para essapersuasãocom dureza.Mas não a usou dos paísesmembros vítimas do declínio dos preços de matérias-
contra os grandes proprietários territoriais. Foi p-ena. primas. Powelson: "É um passo na direção do financiamento
compensatório, ma$ está muito aquém das propostas das países
Pelo financiamentocompensatóriose poderia evitar o pro- primários". É verdade. Pelo esqueça esboçado pressupor-se
blema, dizem. As Nações Unidas têm sido, aliás, pródigas em não haver interferênciacom os ajustamentosa longo prazo dc
estudos e monografias sabre o problema, inclusive em esquemas mercadoriasem excedenteno mundo. e então se ofereceaos
de compensaçãoautomática.l Outro relatório, ainda mais elabo-
países vítimas das flutuações a seguinte alternativa: ou as rei-
rado, sôbre Interriatiotmt Compettsation for Fluctuation in Com-
mod/O Frade, de 1961, da mesma organização,entregaria ao vindicações não abrangeriam a totalidade das perdas (e por
conseguinte o país vitimado teria de compartilhar dos encargos
PMI a faculdade de agente único apropriado para efetuar um
com o fundo de seguro) ou êles as poderiamcobrir por ideia
plano de seguros, do qual participariam países mais ou menos
de empréstimo, com a obrigação de pagamento de retarda
desenvolvidos. O seguro seria contra o risco de flutuação de
quando as exportações subissem.Os Estados Unidos, por força
preços. A contribuição consistiria em determinada soma e prê- de seu pêso financeiro e comercial, também contam com finan-
mios anual-sa um fundo contra o qual seriam pagos os resgates
ciamentos compensatórios, à sua maneira soberana, isto é, bila-
a governos vítimas das flutuações nas exportações, acima de teralmente: ''Produtores estrangeiros acusam os Estados Unidos
determinadas percentagens. Os países mais adiantados pagariam
de competição e dumpíng, pela promulgação da Lei 480." (L:i
seus prêmios regulamiente, mas não fariam pedidos de recom- de Assistência e Desenvolvimento ao Comércio Agrícola dc
pensas (embora pudessem fazê-lo teoricamente) . A proposição
1954) . Ora, esta recomenda expressamente"precaução razoável
parte assim de uma premissa básica: a d;sposíçãa dos paíxei
desenvotwidosa aquiesceram em que seus benefícios diretos não para que as vendassob esta Lei não venham perturbar indevi-
igtmlassem suas contribuições. A participação dêles tornar-se-ia damente os preços mundiais de mercadorias agrícolas ou os
/7zçaforma de msfsfêncla mzi/fíZafera/.(Págs. 35-32 do Re- padrões normais de tráfico comercial com países amigos". Ela
latório. ) também determina que "as exportações se escoarão por novos
canais não correntemente ocupados pelo comércio mundial"
Como se vê, a atividade dos Serviços Económicos da ONU
não se prende a preceitos ortodoxos. Como verdadeiros orga- "Exemplo: um programa de ]anche escolar em função do qual
nismos de uma futura economia mundial, êles agem com pru- crianças são aliãlentadas, que nãa o leriam de qualquer owfra
maneira. Outro exemplo: projetos administrativos em que se
l Commodíly alta Z?cozzamíc
DeveZopmenf,UN, E. 25,2319, 25 de no- utilizariam bens como parte do pagamento aos trabalhadores
vembro de 1953. que constroemestudas';. (Citação de Powelson.) Êste comen-
206 207
ta: "Na prática, é impossíveldistinguir entre "canais normais" de atração de capitais também é considerável. "0 círculo vicioso
e ''aumento de consumo". da pobreza", de que falam G. Myrdal, Ragnar Nurkes e outros,
Na realidade o grande dilema do programa de auxílio ao preocupa Powelson, pois êle teme, embora não o mostre, que
estrangeiro está no fato de que os produtos agrícolas excedentes k se êssecírculo não puder ser rompido pelos meios do financia-
dos Estados Unidos podem servir de capital aos paísesmenos mento compensatório e pelos investimentos maciços de capitais
desenvolvidos, alimentando os trabalhadores que estão produ- nos países subdesenvolvidos, colocar-se-á a questão : resultará
zindo bens de capital. (Alimentar operários é antes preservar daí que, fora de uma revoluçãoviolenta ou de vigoro?aação
o variável do capital para salários e não fornecer capital produ- do Estado, todas as nações não pertencentesao grupo das que,
tivo. Também a operaçãopoderia agir num sentido de rebaixa no curso do tempo, conseguiram ganhar distância sabre as
de salários, sobretudo em países sem organização sindical po- L outras em adiantamento económico estão condenadaspara sem-
derosa). Na realidade, "êles (excedentes)não o podem fazer pre a seremfornecedoras
de matérias-primas
e nuncase ele-
sem entrar em concorrência com os fornecedores agrícolas nor- varão acima desta humilde condição?t
mais". O segundodilema é que a agricultura constitui um dos Para responder às suas dúvidas e converter os latino-ame-
pontos de estrangulamentoque impede se rompa o atraso eco- ricanos ao .4/H2cFÍcü/zi
way of /;/e, Powelson procura exemplos ani-
nómico na América Latina. Como os "estruturalistas" têm am- madores na história dos E,atados Unidos. Os subdesenvolvidos,
plamente indicado nos debates sabre a inflação, "o alto custo proclama, podem industrializar-se. Vejam os Estados suli-
dos alimentostem sido um obstáculoà construçãode bens de nos do seu p-aís. Acabaram enriquecendo,embora tenha sido
produção nas cidades. Acontece terem os Estados Unidos os necessáriauma revolução interna e um lapso de tempo de.
meios de quebrar essa rigidez, mas ao fazê-lo, na medida de cem anos. O "círculo vicioso da pobreza" é con-stituídopor
suas forças, provariam o ]avrador latino de qualquer estímulo alguns tropeços fundamentais como a inelasticidade da oferta
de preços para aume-atar a produção". (Powelson.) e da procura das matérias-primas, verificadano fato de que a
Os acordos sabre excedentes de trigo e outros produtos procura mundial da pr(Mução primária, se sobe em têrmos abso-
agrícolas norte-americanos, autorizados pela Lei D.o 480 do lutos, cai em proporção à renda nacional. "É provável que os
Congresso, se trazem a]gunsbenefícios locais sob a torna assis- têrmos do comércio a longo prazo se estão movendo contra
tencial, alívios a governantes sempre bandos de recursos finan- os países menos desenvolvidos." (Pawelson) Outro tropeço é
ceiros, amuamcomo uma espécie de co.mérciobilateral (o bar/er o fato de a produçãoprimária n-ãoabastecernem provocarou
alemãode antesda guerra).Constituem
um fator de pertur- requerer economias externas na mesma escala da manufatura.
bação na desenvolvimento de produtos agrícola-s de subsistência Para vencer o "círculo", é preciso achar um remédio para os dois
do país "beneficiado", por ameaçar, competitivamentg, .o. pro- primeiros problemas. Os próprios países primários têm feito
dutor correspondente
dêssepaís,por excluir, pelo subsídiodo suas propostas nesse sentido. Mas, sejam estas convênios de
Govêrno americano, o seu exportador habitual (Argentina, por comércio ou outras formas de fiDanciamenta compensatório,
exemplo, quanto ao trigo) , e até por pretender reintroduzir uma todas têm encontrado "em geral" a oposição dos Estados Uni-
forma retrógradade pagamentosalarial em espéciecom baixa dos. E quando se verifica qualquer concessãodêles.. . "é que
tendencial dos salários reais, além de exercer de algum modo há coincidência histórica com os seus interêssespolíticos", expli-
uma função de dumpíng no mercadoexterior. E
ca Powelson, que acrescenta: "A paciência latino-americana
Outro dos graves problemas que garroteiam os paísesem está, justificadamente, curta."
desenvolvimento é a disparidade de ação e recursos entre êles Se não há saída, como aberta ou veladamente se reconhece,
e os industrializados. Estes podem assistir uma projeção de que tem o economistaamericanoa replicar às conclusõespessi-
suas economias ao exterior, de onde não semente tiram recursos mistas de G. Myrdall quando afirma "serem as forças desequi-
primários e lucros de seusmaDufaturados,como também conse-
guem condições de custo mais baixo de produção. E seu poder l Powelson, obra citada, pág. 119

208 209
libradoras da história tão fortes que, a menos de um esforço estrangeiro,mas de uma posição de mais a mais popular. A
muito positivo, que envolvacontrolese planejamentos,
não po- crescente impopularidade da ajuda externa é manifesta nos
derão ser invertidas"? Que a visão de Myrdall é pessimista rígidos controles que o Congresso tem imposto à Administra-
ção. Os fundos não podem mais ser comprometidospor mais
demais? Que tem o economista a dizer, além disso? Que os seus
patrícios ''não se deixam dominar pelo pessimismo''e, à guisa
? de um ano adiante.Em 1961 o Presidentepediu uma lei que
de consolação,chegaa comparar a situaçãodo Sul dos Estados Ihe permitisse assumir compromissos por cinco anos e o Con-
Unidos no século XllX com a de Cuba agora. A verdade, porém, gresso recusou. Em face de-ssa má vontade à ajuda externa não
é que sinceramente lamenta não possamos esperar ce.m anos é de se admirar tenha o Sr. Goldwater sido sufragadopor quase
como, assim o sustenta, tiveram de esperar naquele fécula os 40% do eleitorado: a recusa à dita ajuda é uma demonstração
norte-americanosdo sul. O pior é que êle não tem outras ambas 'L de isolacionismo,mas do mau isolacionismo,do que se recusa
a entregaraoslatino-americanos
paraa demarragem
e parase a uma política de cooperaçãomundial por ter desesperadodos
assegurarem estabilidade e pmgresso, senão as já arquidiscutidas povos estrangeiros, apesar do dinheiro americano espalhado
dos "convênios de mercadorias e financiamento compensató- entre êles. A recusa significa: não adianta, êles não compreen-
rio". . . ''desde que judiciosamente empregadas com o devido dem nem querem aceitar o nosso .4merican wlW of /f/e. De ano
para ano, as verbas destinadasàquela ajuda diminuem. IJma
respeito à eficiência, às elasticidadesa longo prazo e à compe-
tição". Mas não foi êle quemnos mostrounão quereregios comissãode inquérito parlamentar, a ComissãoClay, instituída
em 1963, para investigar as operações 'estrangeiras nos campos
capitalistas americanos nada disso e mesmo que "os Estados
económico e militar diz no seu relatório: "Estamos tentando
Unidos em geral se têm oposto a êssesarranjos"? E que quando
fazem concessão é porque "coincide com interêsses políticos coisasdemaispara muitos demais. . . não podemos crer que o
em face da América Latina"? Não é êle ainda que reconhece nosso interêsse nacional esteja sendo wrvido por êssescontínuos
estara paciêncialatino-americana
esgotada,
-isto é, "justifica- compromissos,
indefinidamente,
ao presenteritmo, para com 95
damente curta"? países e territórios, que estão a receber nossa assistência eco-
nómica e militar." ('7/u Carporaffom a/ü Z)&íríbufian of t/. S.
Em relação à ajuda externa, Powelson é sóbrio. Sua visão Mititary and Economia Assistance Program, Dept. ot Skate,
equilibrista da economia faz com que, no fundo, . despreze .o Report to the President o$ the U. S. trem ttw Cammittee to
fenâmena da ajuda externa na situação da economia mundiali-
zante de hoje. Encarando-aapenascomo h-strumentosem fu- SZP?pzg#/zenf/zeFrei }yorZd,20 de março de 1963.)
turo ou perspectiva dentro dos limites da economia monetarista Talvez por lembranças antigas, geralmente penosas, ou por
espírito e mentalidade,o fato é que a América Latina em seu
que é a dêle, ou inortodoxo, de natureza.política passageiraé,
contudo, por ser homem liberal, partidário dela; que continue conjunto é muito mais propensaaos programasde intervencio-
a figurar no orçamento de seu govêrno, e só. Por isso é que êsse nismo económico estatal que os Estados UMdos. Aqui já se sabe
embrião de instituto Dava (das transferênciasde rendas por que sem a mão do Estado as forças capitalistas nativas e também,
cima das fronteiras), como apareceu no Plano Marshall, começa já agora, as internacionais não serão suficientes para arrancar
a ser visto em geral nos EstadosIJnidos apenascomo uma os nossos países do seu grau de primarismo económico. O pi-ó-
carga fiscal a mais sabre o eleitor que paga impostos. Sua impo- prio Dr. Campos, ainda naquele seminário em que discursou tão
profusamente sabre os problemas económicos latino-americanos
pularidade dentro do país é crescente. A propósito, Powelson q
imitao livro de Eugen Castle, 7'/m areal Gívean'(D'(Chicago, em relação aos Estados Unidos, depois de observar que os em-
1957), de onde tira estaproposição:"0 tempo de diminuir a préstimos privados indiretos tinham pràticamente desaparecido,
carga de programa tão ruinoso é precisamente agora, antes de também reconhecia tenderem os investimentos diretos, apesar
cosia nação ficar permanentementeprejudicada." Não se trata, de não envolveremnenhumaobrigaçãorígida de dívida, a ser
penosos em têrmos de balança de pagamontos. Por quê? Por-
porém,explica Powelson,de.um grito isoladode desolação?
em que "requeriam bas/a/z/e remuneração para atrair fundos em
meio a uma vaga avassaladoraãe entusiasmopela ajuda ao
2i0 2//
competição com investimentos domésticos lucrativos dentro dos o próprio Dr. Campos depois de colocar a premissa preceden-
EstadosUnidos ou no Mercado Comum". (Assim, para que ve- te: "Se incapaz de contar com adequada assistência estrangeira,
nham capitais norte-americanosprivados para a América Lati- o Govêrnoterá de se esforçar para elevar o nível de investimen-
na em investimentos duetos é indispensável sejam as condições tos pela inflação, tomando ainda mais o clima dos investimen-f
de rendimento capazesde vencer a competição com investimen- tos". Para êle, pois, sem assistênciaestrangeiranão há salva-
tos domésticoslucrativos tanto nos EstadosUnidos como na ção. O Brasil perdeu suas opções fundamentais.
Europa. É preciso que lhes sejam asseguradascondiçõesremu- Urgência dos projetos, comportamento erradiço dos capi-
nerativas excepcionais. Os marxistas falam a respeito de mais- tais privados e círculo vicioso de expansão de capitais com es-
valia. A terminologia pode ser bárbara ou fora de moda, mas tabilidade monetária e política e nível expansivo de investimen-
descreve
bastanteacertadamente
o fato.) Serápor issoquena
controvérsia sabre investimentos privados ou públicos prefiram
t tos, ao concorrerpara que Punta del Este dessepreferênciaaos
investimentos públicos, permitiram ao economista brasileiro pre-
os latino-americanos, como nos informa o Dr. Campos, os úl- cisar: "A passagem das principais responsabilidades pelo finan-
timos? A despeito das preferências marcadas dos norte-ameri- ciamento do desenvolvimento latino-americano do capital priva-
canos pelos primeiros, Campos via, então (1962), com otimis- do para os fundos públicos foi expressame/zfe
eizabe/ácidana
mo uma maior "flexibilidade de atitudesem relaçãoao maior Caemde Pü/zíndeZFere,pois que diz no Título 111,seçãoÁ:
papel dos fundos públicos por parte dos governantesde Wa- A maior parte da soma (um suprimento de capital de todas
shington,sobretudo
a partir da Declaração
de New Port (?), as fontes externas de pelo menos $ 20 bilhões nos próximos
do .d.fade Z?oga/áe da administraçãoKennedy. Qual a causa dez anos) deveria ier em fzz/zelos
pzíb/ices". A contradição entre
dessa mudança quanto a atribuir maior papel ao investimento a letra oficial da Car/a de Pu/zfa deZ Ex/é e a interpretação
público? Êle nos dá três razões: a) a urgência (síc) dos proje- frouxa, "er.radiça" que os círculos oficiais da Ca.sa Branca dão
tos e sua natureza;b) o comportamento
erradiçodo capital agora, concernente ao papel emiDentíssimodos fundos públicos
privado e sua suscetibilidadeaos choquespolíticos em curto para os projetos da Aliança para o Progresso, é tão escanda-
prazo; e c) o problemade um "círculo vicioso":. a expansãodo losa que se admira não tenha vexado o Ministro Campos quan-
investimento privado requer uma melhoria no clima dos inves- do, como representante do novo Govêrno brasileiro e da Co-
timentos em formos de esfabflídade po/ífica e mo/zefária que, por missãoInteramericanapara a Aliança, foi tratar com os senho-
sua vez, pressuporiauma elevaçãodo nível dos investimentos. res de Washington dos fundos públicos para os projetos desen-
(Pode-sedizer de novo aqui, que o Dr. Campos,dois anosapós volvimentistas da Aliança. No entanto, o ex-Presidente Lleras
o seminário .n-aBacia, o que ali expôs, na base das condições Camargo, um dos propugnadores e entusiastas da Alia:nça, de
dos capitalistas americanos para investirem no nosso País e nos tão vexado com a nova interpretaçãooficial da CasaBranca,
outros da América Latina, tentou criar, ao ver-seà frente da po- protestou publicamente. Hoje é doutrina oficial do marechal Cas-
lítica económicado Govêmodo marechalCastelo.)Com efeito, telnCampos-Bulhões-Rockefell-er-Johnson que a Aliança nunca
todas as medidas financeiras, económicase políticas exigidas foi senãoum programade iniciativa privada para capitais priva-
pelos capitalistas foram tomadas. Falta ainda assim a estabili- dos com maior ou menor assistência do Estado americano.
dade monetária, além da política e que se realize a ''pressupo- Com preferência ou não dos latino-americanos,pelos in-
sição" de "uma elevaçãodo nível de investimentos".Se esta vestimentos públicos e te:nha ou não a Administração Johnson
não fâr concretizada em têrmos de cobrir as necessidadespro- r
cambiado a orientação oficial em relação ao papel proeminente
fundas do País, o retrocesso prosseguirá e o fracasso da política dos capitaispúblicos nos projetos da Aliança, o fato é que o
estabillizadora do atual Govêrno será tão evidente que o Govêrno americanonão tem poupado oportunidadepara deixar
Dr. Campos será um dos primeiros a voltar aos negócios priva- claro seu desejode limitar ao mínimo essaespéciede investi-
dos, enquanto o marechal ou mudará de papel ou embarcara mento. Aliás, não é de agora que Washington recusa emprestar
para o ostracismo, com ou sem exílio. Aliás, é o que reconhece « a Estados onde existe monopólio estatal de petróleo ou onde
212 2/3
também esteja aberta a controvérsia sabre expropriação de pro- A controvérsia -- tão generalizadapela América Latina --
priedadesde súdios americanos.Mas há, ou tem havido, atenua- sabre expropriações de propriedades americanasrelativas às em-
ções nessasregras limitativas. Já é admissível, por exemplo, con- prêsas de serviços públicos, sistemas de transportes, produção
ceder empréstimospara financiar certas fases operatórias de de petróleo e processamento de derivados chegou a seu ponto de
companhias estatais como de transporte, refinamento, distribui- ?
exacerbaçãomáxima com as nacionalizaçõesde Cuba. Na Ba-
ção, desde que os países dessas companhias também permíMm hía o nossoDr. Fausto das finançasnacionaisfalara, até com
funcionamentode empresasprivada.sna prospecçãoe retina do largueza, sabre a questão: ''O movimento. de nacionalização
pe/PÓZeo(É o caso da Argentina -- de Frondizi -- e da Bolívia do petróleoé fundamentalmente político e estratégico;nos ser-
-- de Estensoro), ou dêem preferência a esquemas de inver- viços públicos e transportes, porém, é de ordem técnica em
sões conjuntas com capital privado. junção da quase impossibilidade de operação privada sôbre ta-
rifa regltlatória em períodos de inflação. As tarifas sempre atrás
Êsses dados fomecidos pelo Dr. Campos se aplicam como dos custos detêm as inversões privadas e daí a deterioração dos
uma luva ao caso atual do Brasil, onde há de se ceder também serviços e engarrafamentos; a excitação do público, oposição
-- de bom ou mau grado -- àquelas condições preliminares política ao aumentode tarifas e clamor intervencionista,sobre-
para os empréstimos públicos. Com tais objetivos, o decreto tudo em relação a emprêsasestrangeiras. A intervenção do Es-
de Jogo:Goulart nacionalizandoas refinarias de petróleo, assi- tado, se não resolve nlenhumproblema técnico conseqüenteà
nado demagõgicame-nte
no comício de 13 de março de 1964, no inflação (por vêzes até aumenta os custos reais e decrescea efi-
Rio de Jan-oiro,tinha de ser rev-ogado
pelo marechalCasteloe ciência), permífe tz con/ü anão do ãtzvesffmepzfo dividindo os
a ''intocabilidade"da Petrobrástem de ser ferida, para permi- encargos entre o utilizador dileto e o pagador geral de impos-
tir "esquemas de inversões conjuntas com capital privado" e tas". Nos acordos de expropriação, a inclinação usual do inves-.
"funcionamento de emprêsas privadas na prospecção e refino", tidor privado é recorrerda "custo de reprodução" como a mé/a-
segundo os têrmos do Dr. Campos. io de avaliação e requerer imediato pagamento em moeda con-
Com a discrição que o caracteriza, o Dr. Campos informa- versíveZ,, "se estritamente interpretado", confessa o economista,
va ainda: "Parece Dão haver restrições p-ara financiamento de Isso impediria de talo qualquer expropriaçãoem vista da es-
qualquer outra fonte não convencional de petróko", como o cassez finarLceira dn maiorü dos países latinos". Quanto a Estes.
xisto betuminoso, por exemplo. Assim, fica marcada a proteção a tendência
é advogaro pagamento
de compensação
em pres-
paternaldos trustespetrolíferospelo Dep-artamento
de Estado. taçõe,s,a maior parte paga em moeda local independentemente
Mas qual a explicaçãoque nos dá o autorizadocidadão para das providências de conversibilidade e, freqüentemente, com
essas restrições? "A disponibilidade de capitais privados -- ape- cláusulasajustadasde reinvestimento.O Govêrno do marechal
sar de seucomportamento"erradiço"? -- que justificaria pou- Castelo, mwzWÜmMancãh,seguiu l)ràticamente "a inclinação
par escassos fundos públicos para investimentos não atrativos usual do investidor privado". . . estrangeiro:custo de repro-
ao capita] privado". Mas o ])r. Campos é realmente imparcial dução,como método de avaliação (apesar do i/zow da arbi-
quanto ao mérito da questão, pois ei-lo a dar as razões dos tragem de conspícuosinvestidores estrangeirosnão americanos),
"latinos não convencidos": "não confiança na decisão de in- imediato pagamento em moeda convertível (até prêmio de multa
versões pelas companhias privadas de petróleo, falta de interês- pelo atraso no fechar o negócio). Com relação à sempre exis-
se das mesmasem abrir novos camposde produção que pode- tente -- em paísesde economiaperiférica e sob crónica infla-
riam concorrer já com o excesso de capacidade algures, subor- ção -- "escassez financeira" deu-se um jeito: o Govêrno pro-
dinação de sua exploraçãoe política de preços na América La- tetor das companhiasprivadas em vias de expropriaçãoempres-
tina a seusinterêssesmundiais de mercado e, finalm-ente,incon- ta o dinheiro para a prodigalidade do País expropriador. E assim
veniência ou caráter não aconselhável de operações estrangei- o Ministro Roberto Campos conduziu a expropriação das "con-
ras em campo de importância estratégica". cessionárias" pelo govêrno de l.o de abril exatamente como
e

214 2/5
\.

quando, Da Balia, descrevia tão bem "a. inclinação usual do pósito da moderação rooseveltiana diante dos nefastospreceden-
investidor privado'' no arreglo da matéria. A "revolução de tes de expropriação inaugurados em 1938 pelo Presidente
Cardenas.
l.o de abril cumpria muita melhor os ''compromissos'' da go-
vêrno para com os investidoresestrangeirose seu Govêrno, do O próprio Dr. Campos reconhecia então, isto é, antes de
que os compromissos internos com o povo e o desenvolvimento
ser ministro, que êsse dispositivo, se não sàbiamenteadminis-
nacional, legados abertos pelo Govêrno João Goulart. trado, poderá tomar-se uma fonte de intermináveis atritos nas
relaçõesdos Estados IJnidos com a América Latina, qae provà-
Segundoo Dr. Campos, ao lembrar-se do caso das expro'
velmente questionará a pretensão de fazer da compenisdçãolem
priações das companhias de petróleo .pelo México, em 1938,.o moeda estrangeira conversíve! exigência da tei internacional,
governo americano tem sido moderado nessasquestões.A ação
da administração naquela época foi muito morigerada, provà- quando a tradição legal apenas apóia o requisito de que a com-
velmente "em virtude de razõespolíticas que predominavam sa- pensação seja feita numa forma "usual" de pagamento". Que
magnífica oportunidade perdeu a diplomacia "revolucionária" do
bre os interêssesprivados. Essa tradição se manteve apenascom
a[terações insignificantes". Essas a].teraçõesinsignificantes, caso
regimede l.o de abril de denunciar o abusojurídico contido na
Lei de Assistência Estrangeira pelo qual se pretende ser obri-
vigorem atualmente, são, contudo, menos morigeradas que a ati-
gação da lei internacional a compensação em moeda estrangei-
tude geral do Govêrno americano em 1938, em face do ato in-
sólito, revolucionário do general Cardenas.O acordo que o Go- ra conversívelpara a expropriaçãode companhiasprivadases-
vêrno brasileiro anualfêz com as concessionárias
da Band anel trangeiras por um Estado soberano!.Defendendo legítimos inte-
rêssesbrasileiros. caberia ao marechal Castelo levar o caso ao
Share do Brasil foi muito mais vantajoso para as companhias
Tribunal de Haja e não prescrever o direito soberanodo Estado
expropriadas e sob pressão muito maior do Departamento de
Estada),do que o acordo negociadomuito depois das expropria- de avaliar pelos seus órgãos de justiça os bens de uma com-
panhia privada estrangeira em seu território, submetendoessa
ções entre o Govêrno mexicano e o de Washington.i Onde estão,
avaliação a uma arbitragem privada internacional desprovida de
pois, as ''alterações insignificantes"?
fundamento jurídico.
Já na administração kennediana, em 1962, por ocasião da A lei americanatambém exorbita quando pretende inter-
aprovação pelo Congresso da Fareign .dsiisfa.nce .BÍ//c foi.am nacionalizar prematuramente as disputas, antes mesmo de haver
adotados diapositivos pelos quais a admi-nistração dos Estados denegaçãodemonstradade justiça pelos tribunais locais. En-
Unidos era instruída a ''suspender ajuda em casos de expro- quanto isso não se dá, "o litígio entre companhias individuais
priação não seguida dos "passos apropriados" para "prove! e Estadossoberanoscontinuauma questãode lei interna e não
compensação junta e rápida em câmbio estrangeiro conversív:l internacional", ensina magistralmente o Dr. Campos. Teme êle
como exige a lei internacional". Esta lei de 1962 (o testemunho ainda, e com razão, que propósitos como os da ]ei em questão,
no me-smo ano do nosso atual Mi.nastro Campos é, nesse senti-
de assistência a capitais nacionais no estrangeiro, "possam ser
do, meridiano) foi apresentada, votada, promulgadanos Esta- transfomiados em um perigoso fermento pelos interêssespriva-
dos IJnidos por iniciativa, inspiraçãoe vontade dos investido- dos para apoio a exageradasreclamaçõescontra Governoses-
res privados americanosno estrangeiro.Em face das ameaças trangeiros".-(pág. 50).
expropriatórias e nacionalistasque pipocavam um pouco por Ao longo dessa viagem em temo das possibilidades de
tâãa parte -na América Latina, desde as grande nacionalizações cooperação no plano do desenvolvimento económico entre os
de Cuba, não quiseram as companhias interessadas que se re- Estados Unidos e os países latinos em luta pela emancipação,
petisse nem o malogro desastradoem face de Fidel Castra nem a nota-se, constante, a duplicidade de ação nos círculos dirigentes
tradição morigerada" de que falou o nosso economista, a pro' de Washington e mesmo entre os seuspodêres públicos. Daí re-
sulta ser perigoso ou imprudente querer qualquer um e, prin-
l Ver em outro capítulo o nosso comentário sabre a questão do pe
trólei no México. cipalmente, homens de govêrno estrangeiro, traça alinha de

2/Ó 2/7
um comportamento, se não único, homogêneo,por parte do Go-
vêrlto norte-americano,nas suasrelaçõescom a América Latina. formas" e "revoluções" são feitas no papel, no gabinete Presi-
O govêrnolatino'-americano
que pretendertraçar uma polí- dencial como nas salas de Estado-Maior -sefazem "planeja-
tica ou norma para suas atividades o-u um rumo fundado mentos" de guerra, de paz, de capitulação, de conquista, sem
em ilações dessaordem, além de não ser uma atitude muito uso de.qualquer"instrumento de mobilizaçãode apoio popular"
compatível com um justo sentimento de soberania das nações, Isto hoje é proibido, ainda mais se fosse, como preconi;ava o
será sobretudo imprudente para com os interêssesdo país. Esta- Dr. Campos, "de pressão para reconhecimento do princípio de
rá pondo em questãoo êxito de qualquer política nacional. De- planejamento e suá aceitação pelos E-atadosUnidos": Po-rmenos
sarma-se o govêrno perante o poder estrangeiro, embora admi- do que isso o Dr. João Gouiart foi deposto,sob acusaçãode
comunista.
tindo-se amigo, sobretudose mais forte; fica-se sem qualquer
possibilidadede optar por outra política e de flanco aberto Hoje, com o recuo DO tempo, não é demaissugerir uma
contra as surprêsasque do poder amigo podem advir, pois dêste relação entre a campanhaantigo-munistaque irrompeu nos Es-
as contradições de atitudes e comportamento são não só freqüen- tados Unidos no curso da guerra e se acentuou'depois com
tes mas até por vêzes escandalosas. McCarthy.e a política dos grandes interêssesprivados preocupa-
Até com relação à idéia mesmade plan-exame-nto, os pon- dos em defend-er suas posições iB& hora da reconve.rsão'da
tos de vista contraditórios não se fazem de minguados entre economia de guerra para a de paz, enquanto procuravam man-
Washington e as outras capital-slatino-americanas.Para amai- ter sua liderança na política económica geral. Temos nesse sen-
nar as desconfianças dos americanosa qualquer idéía que de tido um testemunho indireto mas autorizado para a nossa suges-
longe possa significar o abandono da economia de mercado tão. ''Quando, nos fi.ns de 1940, uma porção de gente digna neste
e da livre emprêsa, desconfiançasque crescem quando o big país repentina e tardiamente descobriu o fenómeno por assim
bzlsímss' ouve latino-americanos falarem em planejamento, o dizer normal da penetração estrangeira e da espionagem e saiu
Dr. Campos emascula a concepção mesma de uma economia freneticamentetentando nos persuadir de que devíamosperder
de plano, para Ihe dar um tom contingente,embora ainda assim a confiança em nós mesmos, porque haviam descoberto isso,
ligeiramente demagógico, desta vez agradável a ouvidos latinos. o mal da subversão comunista, com que estavam tão excitados,
A que visa o tal planejamento latino? Êle responde: a) na realidadeatingira o clímax muitos anosantese, no momento,
assegurar a continuidad-e nos arranjos financeiros; b) obter achava-se definitivamente em declínio".i E o mesmo autor ve-
compromis-se-sde fi.nanciamento globais sabre um programa e não rificava, a propósito, que a opinião pública americanaretardava
propriamente na base de prometoa prometo; c) investimentos de em relação aos fatos. E retarda ainda, apesar de sintomas ainda
expansão governamental na infra-estrutura; d) zzfí/lzaçãado pZa- fracas de mais atualização, ou melhor, de menos alienação.
nejamento como in.strumento de mobilização do .apoio popular ''Numa proporção muito maior do que pretendem admitir,
para o desenvolvimento económico e pressão para reconheci- nossos amigos americanos são prêsas de uma ideologia quase
mento do princípio de planejamento e programação e para acei- tão estreitaquanto a dos comunistase tambémtão fervorosa-
tação pelos Estados Unidos, tanto nas suas agênciasprópria-s de mente acreditada. ,4 ;deo/agia igzlaZao capífaZísmo não só à liber-
financiamento como através seus representantes nas organiza- dade coma quaseqae à v/rfüde. . . Para quasetodos os ameri-
ções intemaci-onais de compromissos de financiamento, a longo ricanos, o comunismo é um mal t:ía absoluto como o nazismo
r
prazo
ou o assassínio e qualquer um que investigue êste dogma. já deve
Ao escrever as linhas acima, certamente, o ])r. Campos estar infestado pelo contágio. Desistem de notar qualquer dife-
pensavanaquela atmosfera popular que reinava no Govêrno an-
terior deposto, a que servira como embaixador em Washington. l George F. Kennan, Rzzssiaa/zd f;ze resf z/rzderl,e/zín and Sfa/fK
Pois no atual, em que é o controlador dos negócios,todas as ''re- Little, Brownand Co., Boston,1961,pág. 389.Cit. de QzlínraCo
lzlna, de Burlingam, edição portuguêsa.
218
2/9
ferença entre a Rússia de Stalin e a Rússia de Kruchev, ignoram
o caso da lugoslávia, onde os comunistascriaram uma socie-
dade independente da Rússia e que aos democratas menos apai-
xonados parece não ser moralmen@ pior do que as sociedades
capitalis'tásda Espanta de Franco, do Portugal de Salazar e da
África do Sul de VaJ:woerd".í
A desatualização da opinião americana em relação à situa-
ção mundial, tanto no Terceiro Mu-ndo,incluindo neste a Amé-
rica Latina, quanto na Europa inteira (com exceçãopossívelde
Portugale Espanha) constitui um vácuo que impedeo avanço
dos povos para um entendimentogeral na base de uma trans-
formação económica e social realmente progressista. A desatua-
lízação ideológica americana faz com que todo o falatório sôbre
reformas e revolução na baça dos agentes oficiais de Washing-
ton seja perfeitamente enquadrado naquilo que chamei de ''re-
forma contra-revolucionária"

.r\ IDÉTAda unidade hemisférica apareceu,como vimos,


na hora em que a América Latina, desamparada,i.golada,com
os seus tradicionais e naturais laços perdidos com a Europa,
não tinha onde escoara maior parte dé seusprodutosprimários
e gênerosalimentícios.Os Estados Unidos não tinham, por ou-
tro lado, senãoa América Latina onde ir buscaros materiais
necessáriosaos preparativos para a guerra que se avizinhava.
Descobriram, então, que a América Latina ficava DO"Continen-
te" americano, era, também, América: conseqüentemente,pro-
clamaram chegada a hora de integrar todos os nossos povos,
anglo-saxõese latino-americanos, numa mesma unidade, ou me-
lhor, num mesmo hemi,sfério. Daí o mito.
Segunda o professor E. StaleS', o isolacionismo americano
foi um dos criadores dêssemito do hemisfério ocidental, que teve
no senador progressista La Follette, ex-governador de Wisconsin,
um de seus mais nobres arautos. Staley, num luminoso ensaio
sabre O Ã4ífa .da Con/íne/zfe,i demoliu as ilusões do senador La
Follette, sabre cujo isolacionismo ninguém pode fazer as reser-
[ London Observar, em ]7erald Triózzne,12 de maio de 1961. -- Cit. l Compass of fáe Poria, "A Symposium on Political Geography", ed
de Burlingam, QzlínraColanza,pág. 213. Hans W. Weigera and W. Stefansson. TAe Ã/y/A af fãe Cola/í/zenf
E. Staley.
220
22/
vas que se fazem ao segundo isolado'nismo dos McCarthy e Gold- Manchúria a Madison (o grande círculo via Estreito de Bering)
wate}. de franco teor fascista.
quase não perderia terra de vista. Em suma, enquanto a-s co-
Em que consistiam as ilusões do ex-governador do Wis- nexões por terra parece oferecerem os contactos mais fáceis entre
consin? Êle as exprimiu quando, em advertência a seus compa-
povos do mesmo Continente, são por vêzes barreiras; por sua
triotas, os acon-selhavaa não se meterem em expediçõesguer- vez, as massasde água que superficialmente podem ser vistas no
reiras a quatro mil milhas de distância na Europa e a seis mil mapa como barreiras,na prática podem ser ou têm sido os
na Ária ainda mais afastada. Reservassemsuas forças para "lutar laços de ligação mais importantes. O fato da persistência dêsses
ne-ste hemisfério", onde "poderíamos ser supremos". laços no passadoresulta terem sido os padrõesexistentesde
Nesse ponto Sta[ey intervém, convidando o leitor simp]es- cultura, tradição, filiação política e interdependência económica,
m.ente a olhar um globo. Para quê? Para, diz êle, ''espancar com que nos defrontamos hoje freqüentemonte, tão "oceânicos"
as persistentesilusões que nos restam no espírito dos mapas quanto "continentais".Toda a formaçãodo Brasil, da América
impressos nos velhos manuais escolares", onde víamos um mun- do Sul moderna, isto é, desde a descoberta se deve aos laços
do compartime.atado "em hemisférios sem nenhuma existência oceânicos. Os laços continentais da América são de uma América
objetiva na natureza". Assim, se o senadorLa Follette amar- outra, anterior, local, isolacionista,pré ou a-histórica. O com-
rasse um cordão num alfinête em Madison, Wisconsin, sua cida- plexo hemisférico, a unidade hemisférica é invenção recentís-
de natal e tentassemedir a distâiicíaque teria de cobrir para ir sima, sem raízes na nossa história, nas nossas tradições culturais
defender alguns pontos neste seu hemisfério, onde "poderíamos e espirituais,nas nossasfiliaçõespolíticas.Não é tão poucodi-
ser supremos", comparados a outros pontos fora do Continen- tada por identidade de interêsses.
te, distantesna Europae na Ária, teria muitassurprêsas:
é Ouçamos de novo Staley a examinar, à luz da doutrina
mais longe de Madison a Bue:nosAbres em linha direta (a dis- continental, a grande estratégia dos Estados Unidos. Êle é pe-
tância do grande círculo) que de Madison a Bengasi(África). remptório. O que se deve notar em primeiro lugar nas nossas
Andara é mais ou menos tão distante quanto Buenos Abres. Na
relações.iom os países..do hemisfério ocidental. é que.não..são
prática, pelas rotas regularmentenavegadas,Buenós Abres é rea[mente'"continentais" em nenhum sentido prático. Uma liga-
consideràvelmente mais distante do que qualquer dêsses pontos ção continental nos é dada pelo istmo do Panamá, mas ninguém
na África ou na Ásia, po-r causada saliênciado Brasil. Nenhuma viaja, envia mensagens, ou transpo.rtabensentre a América do
Capital na Europa, nem mesmoMoscou, é tão longe de Madison Norte -ea do Sul por terra. De fato, toda a América Latina. não
quanto BuCHosAires; e sòmenteuma capital na Europa (Ate- apenas a América do Sul é ultramar para nós, com exceção
ias) é tão lo-nge quanto o Rio de Janeiro. . . Gibraltar é mais parcial do México. A América Latina é suscetível de defesa
perto de Madisonque a Capital da BoHhia,mais perto que por parte dos Estados Unidos se êstescontrolarem as rotas ma-
Tacna e Anca, e mais perto do que qualquermaior cidade do rítimas, inclusive rotas que são problemas de alto mar. No caso
Brasil ou qualquer lugar na Argentina, Child, Paraguaiou Uru- de fins defe.noivo-sou outros propósitos, a solidariedade que
guai. Gibraltar, por avião, não é 'ùnicamentemais perto de então se impunha seria não continental, mas ''marítima". Per-
toda a costa-sul-atlânticada América do Sul que Madison,mas dido o controle de alto mar, estaríamosexpostosa ataquesde
é mais perto por mar do que o ponto mais próximo nos Estados bases terrestres pelo ar sabre a área vital das Caraíbas dÕ nosso
Unidos (Miami). Do mesmo modo, bases européias avançadas sistema de defesa. (Foi aliás o que se viu no episódio desfeito
em Danar, Bathurst e Freetown na costa da África são mais dos mísseis transportados a Cubo).
próximas de Madison que Lama, Peru. Quanto aos problemas económicos, servem apenaspara en-
E a Ária, senador La Follette? Pois está mais perto de sua fraquecer o sistema de defesa americano. A graniíe fraqueza da
cidade que Buenos Abres. Para aquêles a quem as conexõester- barganha de um bloco económico hemisférico contra um mundo
restres parecem especialmenb importantes, observa Staley, po- dominado pelo Eixo surgiria dos excedentes de produtos da
de-seaduzir que um japonêsvoando pela rota mais curta da América Latina competitivos com os nossospróprios, especial-
222 223
mente da zona temperadado sul da América do Sul. É fre- materiaisDa Europa, na Ária, África, Austrália, ilhas e provà-
quentea grita da Argentinaou do Uruguai contra as manipula- velmenteporçõesda América do Sul". Com isso o autor nãa
ções do mercado do trigo pelos Estados Unidos, em detrimento queria dizer que os Estados Unidos, .com suas áreas adjacentes,
do comércio dêsseproduto no sul do Continente.Em 1937, cal- não estivessemem condições de resistir a um sítio. Protegidos
cula Staley, a Europa continentale o Reino Unido absorveram por sua esquadra, dispondo de smasáreas adjacentes, nenhum
consideràvelmentemais do que os dois bilhões de dólares em poder contaria com melhores condições para uma tal resistência.
valor das exportaçõesdo hemisfério ocidental -- petróleo, algo-
dão, trigo, cobre, Games,milho, fumo, sementesde linhaça. Im- Em face das novas técnica-sde guerra,da tese das áreas
por.tantosgrupos latino-americanos dependem da venda de tais de massa compacta, fácil de defesa e as difusas, vulneráveis .(si-
bens no exterior. "Hitler", prossegue Staley, "se tivesse der- t tuações que seriam respectivamente a dos Estados l.Jnidos
rotado a Grã-Bretanha, teria podido provàvelmente oferecer- e a do ImpérioBritânico),Staleyfêz a demonstração
da
inconsistência dêsses pontos de vista. Antes da explosão ató-
]hes mais do que poderíamosnós, ao mesmo tempo que pedindo
menos na questão de reajustamento dos padrões estabelecidos de
mica e muita antesda era dos mísseis,êle most.uvaque
se as áreas difusas, vulneráveis, dependiam da capacidade de
produção e também teria podido ameaça-loscom mais eficácia.
A Inglaterra facilita o maneja do problema económico de defesa estar em posição de unir aliados e dividir o inimiga, a
das Américas. Muitos gênerose matériascompetitivascom a fim de que as linhas de comunicação pudessem ser mantidas.por
produção americana que não podem ser mandados aos Estados um podar marítimo dominante, a área compacta, de fácil defesa,
UDid06 fluem regularmentepara a Grã-Bretanha, onde são pagos poderia não ser capaz de agir em tempo contra um inimigo po-
em bens e serviços que a Grã-Bretanha fornece aos paísesdo tencial, isto é, antes de êste ter podido conjugar forças para, sem
império e a outros. Alguns dêsses países vendem grandes ex- ser interferido, escolher o melhor momento para atacar. O poder
cedentesde exportação aos Estados Unidos (por exemplo, bor- marítimo das áreas difusas, vulneráveis, pode ainda matar no
racha e estanho das índias orientais), enquanto os norte-ameri- botão qualquer ameaça à sua posição que se forme em qualquer
canos vendem mais do que compram à Argentina. Ajlnglaterra parte das diferentes zonas, desde que sua ação seja resoluta e a
é o pivâ dêssecomércio triangular ou multitriangular, do qual tempo. A área pode basear seus esforços militares nas recursos
depende grande parte dos excedentessul-americanos. A Grã- económicosda maior parte do mundo e não sementedos países
Bretanha é indispensável à defesa económica e política do he- aliados, mas também dos não-beligerantes que se enco-ntram
misfério ocidental. Se ela caíssesob as hordas de Hitler, essa longe do alcancedo adversário. Finalmente, a área compacta
queda abalada tanto a economia das Américas quanto o afun- pode não apresentar nenhuma vantagem particular e até, em
damentoou' captura da frota britânica na defesa dessasmesmas particular, desvantagem,levando-seem conta "as fasespsicoló-
Américas.
gicas da guena moderna": seria psicologicamente
mais im-
Outra idéia também perigosamentefútil é considerar van- portante sentir-se "cercando o inimigo" do que "estar cercado''
tagempara os americanosterem sua área de defesalimitada ao
hemisfério. Ao contrário de vantagem, a limitação acarretaria pelo inimigo..No caso dos EstadosUnidos, "é a diferençaentre
;eunir-secom os aliadosde todos os setoresdo mundo para o
desvantagem económica comparada a uma defesa de amplitude
mundial baseadano poder marítimo das frotas reunidas da In- t ajudaremna destruiçãodo Eixo, ou tentar resistir a uma com-
glaterra e dos Estados Unidos. Naquela-scondições, acentua Sta- binaçãodo Eixo, que controle o mundo, com exceçãode nossa
iey, "nós é que seríamosa parte bloqueada. Controlando as rotas vizinhança imediata". Escrevendo no curso da guerra, Staley
do comércio ma].ítimo excito os da imediata vizinhança de nos- procurava mostrar -- contra os preconceitos antibritâncos de
sas bases, os nazistas teriam certamente do seu lado o pêso das }'aria-ne e outros grupos americanos -- a indispensabilidade da
vantagens em poder económico para a defesa ou a agressão aliança Estados Unidos-Grã-Bretanha. À medida que fazia bri-
conferidaspela capacidadede dispor das melhoresfontes de L
lhantemente essademonstração, mostrava, por outra lado, a h-

224 225
ce-nsistência da estratégia da "unidade hemisférica" e de outros sim dizer, as potênciasrivais e as partesnão socialistasdo
balões ideológicos do estilo. globo em zona periférica. As áreas compactas se traDsfomlam
Deixando por um momento o plano da pura estratégia, é elas mesmas, agora, em áreas "compiefas": todos os recursos
oportuno mostrar como, de um ângulo estritamente político real, -b económicostenestre-sse encontram dentro delas, inclusive o
se as relações anglo-americain.as
puderam ser cordiais durante a poder industrial do homem até suas últimas consequênciastecno-
guerra,.nem por isso deixaram os inglêses de pagar caro a infe- lógicas.
rioridade crescenteà medida da prolongação da guerra e o bastão Graças a seu poder tecnológico, os americanos tentam co-
de comando passava decididamente às mãos americanas. Por brir espacialmentea Rússia Soviética e a China Popular; com
ocasiãodas negociaçõesde paz,.foram em geral os inglêsesque seupoder marítimo tentam cerca-las do exterior periférico. Como
pagaram as acomodações entaboladas, na mesa das conferências o impar-seatómicoé ainda um fato, os EstadosUnidos voltam,
dos big r/zree, e-ntre Roosevelt e Stalin. Antes disso. houve as sob MaNamara e seus computadores, a desenvolveras forças
transações
callíssjmas
entreo poder americanoe o poderbritâni- tradicionais (recrudescimento da produção de superaviões de
co em terno do /e/w/ a/zd@máetc. Desde, então, a Grã-Bretanha bombardeia, de porta-aviões, esquadraspara tarefas de blo-
deixou de ter uma política externa autónoma. queio e ataques locais, armas não atómicas aperfeiçoadíssimas,
Hoje, a.Grã-Bretanha é o mais importante dos satélites manejabilíssimas,
cc-mpoder de fogo inimaginável,inclusive quí-
americanos. Sua posição é caudatária, embora por vêzes recal- micas de vários tipos ditos não letais.) que são os instrumentos
ytrante, em face dos surtos,belicosos'ou de violência que aco- indispensáveis a -seu programa de guerras periféricas, coloniais,
metem frequentemente. ,Washington .. O mais recente' é presen- civis, guerrilhas e até para esmagar manifestações populares, hoje
tementeno Sudesteasiático. Á Inglaterra tem os olhos postos uma preocupação quase obsessiva dos senhores mantenedores
na Malásia. ameaçada e não nos bombardeios america.nosno da ordem no mundo em Washington.
Tudo isso é decorrênciainevitávelde sua estratégiageral:
HTgllçç«.m'=!::n.
,nn
O problema das diferenças,.vantagensou desvantagens,ine-
quebrar a frente socialista mundial, impor seu próprio regime
económico ao mundo. Escudado no impasse atómico, êle poderá
fazer a velha guerra ''tradicional", onde quer que seus interêsses
re-ntes a áreas compactas.ou áreas difusa-sde defesa, é hoje económicos, políticos, estratégicos comandem. Tivemos a guerra
grandementesuperado, pois a força decisiva é a força 'atâmíca, da Coréia, que graçasao estratagemado-ssantuários,ao norte e
gej'aumenteconcentrada, por enquanto, nos territórios metropo- ao sul, pede desenrolar-se "tranqüilamenD" durante bastante
litanos de cada inimigo e definida coma força retaliatória, isto tempo. Temos anualmente a do Vietnã do Sul, espraiando-se
é, defensivas Os submarinos, portadores de mísseis, são também para o Vietnã do Norte, onde, parece, santuáriosnão são
retaliatórios? Ou antes .armas ofensivas, destinadas a quebrar previstos.
a "macicez compacta" da metrópole inimiga? ' O conflito sino-russo, que pode estar destinado a provocar
A derrota do Eixo na guerra consistiu em grande parte no indiretamenteo maior desastredo século,veio a talhepara que
fracassadoesforço hitleriano de unificar a Europa numa massa o Pentágono prosseguisse em seus planos estratégicos. Pouco a
compacta, capaz de resistir ao poder combinado da potência pouco Washington vai amaciando o povo do Vienã do Norte
terrestre russa e das potências marítimas aliadas. Depois da com suasbombase o mundo com sua insistênciaem levar a
:.P
guerra, a Europ-a mesmaé rep-artidaentre Leste e Oes.te.'OsEs- guerraao norte da Indochina.Hanói é, talvez,no fu-ndo,o seu
tados l.Jnidos tentam reunir todo o mundo ocidental contra a próximo alvo, enquanto russos e chineses discutem, xingam-se,
União Soviética. Esta forma não só a massacompacta por exce acusam-se,defendem-se a poder de citações dos textos sagrados,
lência, o coração mesmo da terra (Haushofer), mas 'em con- à moda dos doutores de Bizâncio. O interêsse maior já não é, no
jugação com a China (liberta, por fim, de japonêses e imperia- fundo, separar os satélites da periferia -soviéticada metrópole so-
listas brancos) constituía um poder que trãiisformava, por as- '+
viética, mas esta metrópole da outra periferia asiática, a China.
22Ó 227
'q

bilidade das "armas ideológicas'' ou "psico-sociais" de que dis-


Isto explica a radicalização belicista por parte do govêrno ame-
põem. As repercussõesno Terceiro Mundo seriam amplas e pro-
ricano que se exprime, agora que as eleições presidenciais pas- fundas. A Aliança Atlântica dificilmente resistiria intacta, como
saram,com muito mais desempenoe despacho.No fundo, o Se- aliança militar, na conjuntu.ra. Os europeus tentarão circuns-
nador Goldwater era um apressado; como um colegial imp-aciente. crever a guerra, neutralizar a Europa. Do contrário será a de-
Os americanoslevariam a guerra a Hanói, com um alho em bandada.De qualquer modo poderosasforças de oposiçãoapa-
Moscou e outro em Pequim. A União Soviética, pelo menos recerão na Europa para neutraliza-la. Os podêres periféricos so-
quando ou se as hostilidades se tornarem mais abertas e claras, cialistas europeus crescerão ainda mais de importância e inde-
só muito diâuilmente tentará vir em auxílio a Ho Chi Minh por pendência, sob pressão popular nacional, em relação a Moscou
mar,:.onde poderá encontrar a bagagem da Vll Esquadra. Em e a Pequim. Sentir-se-ãomai-s"ocidentais", isto é, no sentido de
face do recuo de Kruchev no caso de Cuba, esperamos ameri- aproximar-se das forças progressistas, de esquerda, ou simples-
canos que.o precedente se repita? Para não se repetir, que será mente as que querem paz no velho Continente. Nesta união ou
necessário?Os americanos oferecem à IJnião Soviética o dile- unificação para a paz estará a abertura, talvez, de zzm/zóvopro-
ma: retirar-se do Sudesteda Ária com paz ou aliar-se à China cessapolítico, social e económico, de âmbito realmente europeu.
e arriscar a guerra.Ou.pelo menosa modalidadede guerraque Em defesa da paz européia trabalhadores do Leste e trabalha-
os Estados Unidos preferem, a guerra da estratégia gradualista, dores do Oeste do Can-tenenteterão ainda forças para sabre as
local, que vai. das armas convencionais às múltiplas passagens fronteiras tentar impedir a guena de' chegar até êles.
das armas táticas atómica-s,sem, no entanto, clíegar'jam:ãs à Para fazer a guerra "clássica'' na Agia, os Estados l.Jnidos
guerra estratégica, último grau. precisamque a frente ocidental européia esteja maciçamentea
É possível refazer se a frente russo-chinesa?Desta vez para seulado. Não será tarefa fácil.
motivosmuito sérios:defenderHo Chi Minh, defendendo-se
elas A razão mesma da OTAN é a pressuposição de uma ofen-
mesmascontra a ofensiva americana para dominar o mundo? A siva russa em massa contra a Europa ocidental, a invasão, em
frente restaurada seria uma aliança para a guerra. Tal aliança im- suma,da Alemanha. Toda a sua estratégiaé defensivae se funda
plicaria uma reviravolta política completa em Moscou.' Quo nessa hipótese. A OTAN seria o escudo de defesa contra êsse ata-
resistências terão de ser vencidas, dentro da União Soviética, que do Leste. Os Estados Unidos precisam de que êsseperigo
para êssepasso?Arriscar uma guerra contra os EstadosUni- exista e, mais do que isso, seja sempre iminente para que seus
da, aliando-seà China de Mao Tsé-Tungem defesado Vietnã esquemas estratégicos tenham sentido. Ora, um dos objetivos
do Norte? Moscou, para o fazer, terá de recorrer, não necessà- mais imediatos e importantes da política soviética é demonstrar
riamente à sua arma absoluta-- esta se acha bem guardada dos que êsseperigo é uma baleia sem o menor sentido no plano
dois lados -- mas às armas, estas sim, bem arquivadas, do ve- mesmo de sua estratégia indireta: fundada hoje na "coexistên-
lho arsenal revolucionário e logo também ideológicas. (Ainda cia pacífica levada ao mais longo prazo possível".(Resolução
terão "uso" nos dias realista-sde hoje? De qualquerfomla, o do XXI Congresso
do P.C. russo,1959.)É êle,entretanto,
um
conflito tomará inevitável caráter de guerra'civil revolucioná- dogma irremovível, sagrado, do "Ocidente". Que o ''comunis-
ria.) Os americanos se dizem também "preparados" p'ra -essa mo" tem por precípua finalidade dominar o mundo, estando
guena. O fato, porém, de serem obrigados a levar a guerra mes-
mo de verdadeao Vietnã do Norte, depoisde tantos anos de es- 1 0 general Beaufre, em Düxüasion er Srrafégíe (Ed. A. Colin,
forços para conquistar os povos indochinesesà democraciare- 1964), escreveu: "Resulta daí que o risco de um conflito mundial
entre o Leste e o Oeste no modo temionuclear tomou-se muito fraco,
presentativa e à emprêsaprivada, revela, de algum modo, a de- para não dizer nenhum.. . ])a mesmamaneira, o perigo de uma in-
vasãomilitar da Europa pelas 'hordassoviéticas',que parece,na época
l Problemas de geografia e de logística, problemas políticos se avo- de Stalin, constituir uma hipótese plausível, perdeu pràticamente toda
lumam pela via terrestre, talvez insolúveis numa perspectiva menos verosimilhança". (pág. 159.)
afastada
-+
229
228

l
sempre a maquinar essa dominação e não se deterá enquanto cos permitirá a êle compensar as esmagadorasvantagensda nú
não o conseguir,
é umacrença
vitalpa.rao Pentágoiio
ou mero de que se beneficiam os cc-munistas."I
para o ''complexo militar-industrial" que dirige o país. Como se Os "comunistas", falando semprecomo bonecosde ventre.
processa es-sademoníaca conspiração? Pela propaganda, pela locos dos.russos, se resignaram, há muito tempo e se resignam
intriga, a espio:nagem,a mentira, a calúnia-,a ameaça,o rapto, o ainda.ao'.impasseatómico", isto é, a não empregara arma es-
assassínio, o terror -- "armas psicológicas". Sòmente por êsses tratégica das bo-mbas ou mísseis atómicos ou termonucleares.
meios?Não! Os estrategistas
"ocidental-s"
não são tão ingê- Mas e e-sEstados Unidos -- perdão, o Ocidente? Êste, não, por
nuos assim. Pelas armas, pela guerra, também, naturalmente. s.erenormementeinferior em potencial humana e em número de
Mas que diabo é êssecomunismoque, além da encarnaçãodo 'grandes unidades terrestres": Sòmente o emprêgo de armas e
Anti-Crilto,.matei'ialista e ainda por cima ateu,'é um poder po- e=ngenhos
atómicostáticos poderá fazê-lo competir com "a$
lítico definido? Deixa de ser uma ideologia política, uma doutri- esmagadorasvantagens do número de que se beneficiam os co-
na social, um -sistflmafilosófico de idéias e proposições,um pla- munistas". Diante des.sasituação, podêres pacíficos ficariam sa-
no ou já um modê]o de um regime socia] ideal, para na prática tisfeitos: o.comunismo pretende invadir a Alemanha e ocupar a
se.r o poder nacional absoluto do Estado russo 'e mais, 'depois Europa ocidental, mas quer fazê-lo com o pêso esmagadorde
da guerra, o poder nacional absoluto do Estado chinês. Mas que 'suas . grandes unidades terrestres". Que forças poderiam detê-
é que exprime êsse poder nacional absoluto? A vontade do las? A regi?testaqetalíatória com a arma e-stratégica despejada
povo russo?A vontadedo povo chinês?Não. Ma-sa vontade sabre a Rússia. Proclamar a Europá ocidental um santuário,
monstruosa de um punhado de usurpadores. Êsse punhado de como o são os territórios respectivosdos EstadosUnidos e da
usurpadores que dominam mais de um têrço do mundo -estásó Rússia, eis a chave da estratégia da paz. E se se fala tanta enl
à espera do momento para invadir a Europa ocidental, arrasar "Ocidente", em ''civilização cristã ocidental", cinde êsse oci.
os Estados Unido-s,escravizar os brasileiros e assassinar,de pas- de=ntesagrado se aninha mais representativamente do que na
sagem, o Papa po Vaticano.
pequena península européia? É ela para todos nós, "americanos"
Na certeza de que o "comunismo", que tem no Kremlin o de todos os meridianos, o próprio 'sacrário dessacultura, dessa
seu gerador a moeu perra/zJa, sob a forma de hordas eslavas, civilização; ela é a matriz e o repositório de todos os valores
invadirá as fronteirasda Alemanha a oestedo Elba, além da que mais pi.ezamos.Merece, pois, ser também "santuário". Era,
Dinamarcaao norte até a Áustria ao sul e prosseguiráaté os com efeito, um ato de paz e assegurariaa paz. Os russosse
confins atlântico-s (Portugal) , falando tudo, 'roubando, massa- resignamao impasseatómico. Os EstadosUnidos não. Como
crando,. cometendo sacrilégios em todos os lugares de peregri- os governos europeus, membros da Orai, não conseguem nunca
nação da velha Europa cristã e ocidental que fâr encontrando reunir fôrças clássicas suficientes para escorar a ofensiva imin
(terá chegado, então, o momento mais feliz dos estrategistas nente das forças soviético-comunistas, os americanos entrega-
de Washingto-n), fundados nessa invasão potencialmente imi- ram-se à proliferação de armas atómicas táticas. O desenvolvia
nente, constroem os E-suadosUnidos a base de toda a sua es- mento delas é prodigioso. Os europeus não se consolam muito.
tratégia política. com essa profusão de armas atómicas táticas porque descon-
Fiados no impasse atómico, os estrategistasamericanos irão fiam estarem destinadas em grande parte a ser experimentadas
encarregar-sede fazer a defesada Europa. ''Os americanosnão no território de seuspróprios países,enquantoos EstadosUni-
poderão consentir numa guerra geral em que se empreguem ape- dos e a União Soviética ficariam, ambos, respaldados por suas
nas as armas clássicas,em face de sua enorme inferioridade em armas retaliatórias, como os grandes santuários.
potencial humano e, pois, em número de grandes unidades ter-
restres, para enfrentar a inundação por forças soviéticasnume- l General Golbery do Couto e Silva, O Blasíl e a l)e/esa do Ocfdenre.
rosas. Sòmente o emprêgo de armas e engenhos atómicos táti- Revista da l.JniversidadeCatólica de São Paulo, março de 1963, pág. 18.

230 23/
Quanto mais os Estados Unidos doscobremnovas armas deixar de ''pâr em equaçãoquestõesvitais para um ou para outro
e cargas,táticase estratégicas,
cujo númerojá se diz ter atingi- dos antagonistas",e então poderádeconer como "guerra limi-
do a cinqüenta mil, mais as dificuldades crescempara armas real- tada". O brilhante teórico do golpe de l.o de abbrildispõe, se-
mente intermediárias entre as grandes armas estratégicas e as guindo aliás os teóricos americanosdas várias modalidadesda
armas tradicionais. A grande dificuldade, com efeito, da teoria guerra nuclear, da vontade dos outros membros da "comunida-
estratégica america:naé encontrar as normas da tática atómi- de ocidental"com a maior sem-cerimónia. Naquelasguerraslo-
ca, a tática para a estratégia retaliatória. O esforço americano calizadas,nas quais o "emprêgo da arma tática será feito para
é no sentido de encontrar passagensgraduais, uma escala de pa- compensar a enorme desproporção de efetivos entre os dois
tamares das armas tradicionais, semitradicionais,táticas ató- con(endores", "o recurso a ataques nucleares e termonucleares
micas até o patamar himalaico, onde se acha a Grande Bomba, de caráter estratégico . . . não será mesmo impossível". Mas com
como a suprema divindade da destruição. Todas as esperanças uma condição: "fiquem sempre circunscritos ao teatro de guerra
que os estrategistasde Washingtonpõem nessatática de pata- tàcitamente aceito". Assim, os dois principais antagonistas, o
mares é de que não tenham de galgar, [numaúltima escalada, o Arcanjo Gabriel do Ocidente,com sua espadade fogo, e o Anjo
supremo patamar. Os países tecnologicamente e sobretudo pro- Extermiúador de Lucifer, do Oriente, Estados Unidos versas
dutivamentemenos ricos que os Estados Unidos tendem a re- Rússia, decidem poupar-se mutuamente, e só exterminar à arma
cusar-seà teoria da tática gradualistada adia atómicaou ter- estratégica o ''teatro de gu-erra" que ambos aceitaram, tà-
monuclear.Êles preferemficar no dilema do mais pobre ou citamente.
menosrico: ou tudo ou nada.
Vê-se mal como a Europa ocidental pode concordar com
Até agora não conseguiram os americanos encontrar uma
essaaceitaçãotática ]5orparte dos principaisantagonistas
de
tática a contento da unanimidade dos europeus. A êstes, com fazer de seu território teatro de guerra para as bombas estratégicas
efeito, não agradanada ser objeto da chamada"guerra por russas ou americanaslJSêriaêste o caso do "guerra tota] locali-
procuração", no curso da qual "os contendores, os antagonistas
zada",' da. qual !ão ée pode excluir a ''tendência sempre pre-
principais" ficarão "encapuzados",pois "situadospara além da sente. . . à ampliação do conflito". Grave inconveniente para
área ]'ealmenteconflagrada". Neste caso, segundoo general Gol- os defensoresdo humanismo ocidental. No entanto, nem tudo
bery, "o ato capitaldo conflito atómicoirrestritivo não tem ca- está perdido, pois, segundoainda o general Golbery, "bem
bimento". Não tem cabimentoporque os EstadosUnidos prefe- se deve admitir que não venha a efetivar-se, pois, independente-
ririam ficar imunes do ataque atómico e deixar que o inimigo mente de quaisquer técnicas, mais ou menos engenhosas,de limi-
principal, inimigo de todo o Ocidente,talassea parte mais sa- tação de tais guerras, com as quais sonham os técnicos norte-
grada do Ocidente, a Europa ocidental. Num tal conflito "em americanos, o que, decisivamente, ma/zrerá es/ em proporções
área para além dos pl'incipais antagonistas",será ''encarado o contratáveis será o tala de não envolverem interêsses'vitais hem
emprêgo tático", e isso "tanto mais quanto se imponha com- do Orientecomunista
nem do Ocidentedemocrático.
de /ze-
pensar enorme desproporção de efetivos entre os dois conten-
n/ m dos grcWdes,quer de um lado, quer de outro".x Ao fim
dores"e "não serámesmoimpossível
o ]-ecurso
a ataquesnu- de contas tudo fica reduzido, toda essafumaça ideológicafica
clearese temionuclearesde cara/er ésfr fénico, embora sempre reduzida a uma "banal" luta de podêres. Acima da cruzada
circunscritos ao teatro da guerra tàcitamente ac.Ditos".i Nes-
santa pela democracia e civilização ocidental cristã ficam os
se estranho trecho o dogma da sempre iminente ofensiva do interês-ses
xiacionaisvitais do Poder Nacional do Estado ameri-
"comunismo" a dominar pela força o Ocidenb (luta pelo cano, acima do comunismo e suas mistificações ficam os interês-
domínio ou preservação da Europa ocidental, por exem- sesnacionaisvitais do Poder Nacional do Estado russo. O que
plo) é esquecido, pois se admite que uma tal guerra possa
temos, então, é uma velha política de poderes, apenasagora de
l Golbery do Couto e Salva, obra citada, pág 19 l Obra citada,pág. 20
232 233
superpoderes. A luta do .Ocidente democrático contra o Oriente mã, cheiasde cargasnuclearespara explodir em funis de du-
comunistaé uma luta de dragõesde fábula para enganaros
ovos
V zentose oitenta metros de profundidade por míl de diâmetro. com
' Seja como fâr, os EstadosUnidos sonham em poder fazer uma capacidadede deslocamentode cento e noventamilhões
suasguerras sem reconer à grande arma retaliatória contra o ini- de toneladasde rochas, à passagemde forças comunistasinva-
migo. Ma-sé uma charadadifícil de decifrar. Por isso mesmo, vasoras.As cargas de demolição seriam limpas e teriam uma
o generalDe Gaullejá tirou a Fiança do impasse:não admite potência de.um .megatone pqr explosão: Não semente o pessoal
confiar o destinode seupaís a qualqueresquematático que o e o material,blindado ou não, que estivessena áreaseria des-
torne dependentedos Estados Unidos para o emprêgo da arma truído, mas numa vizinhança de vários quilómetros as rochas
atómica. A força multilateral otanica de que tanto falam tam- projetadas esmagariam todo o .pessoal .e materiais que por ela
circulassem ou estacionassem. A fronteira da Áustri; aos Bálti-
bém não resolverá o enigma, pois quem irá decidir da gu,erra
ou da paz serão anda os Estados Unidos. É esta decisão preci- cos, com uma extensão de setecentos e cinqüenta quilómetros,
samenteque o genera]])e Gaulle não quer deixar aos america- seria protegida por essas galerias.subterrâneas que explodiriam
sucessivamente, "assim que o adversário tivesse executado os
nos. Munida da arma estratégica, a França terá sua voz no ca-
pítulo e espera tornar-se também um santuário, o terceiro, ao
trabalhos tece-ssáriospara alcançar os primeiros funis e suas
margens contaminadas".i
lado do russoe do americano.Tambémnão tem ela objeçãoa
que a arma atómicase barateiea ponto de permitir que peque- Os russos parecem.não estar dc acordo com essasp-erfura-
ções de subsolo para colocar minas nucleares entre vizinhos As-
nas potências também a possam ter e não faz mesmo nenhuma
a que a Bélgica,Suíça,Polânia,Suécia.tambémtenhama sua. sim o. marechal Sokolovski, antigo Chefe do EstadüMaior da
Quem sabetalvez seja êste o caminho para a paz? Os receios Exército soviético, a 17 de fevereiro de 1965, visivelmenteem
nesse sentido expostos pelo Secretário de Estado Rusk e pelo resposta aos projetos .?#e:licano-alemães, lançava, em conferêi
cia de imprensa, um igo bem claro ao mundo ocidental: «Qual-
Secretário de Defesa McNamara não parece terem impressiona- quer explosão acMeh r de .uml mina nuclear ao longo das ü'on-
do muito os seus confrades da OTAN.
Mas os militaristasnão admitemficar tolhidos pelo im- leiras orientais da Alemanha do Oeste teria por resultado uma
guerra atómica mundial. A Alemanha Ocidental seria transfor-
passeestratégicode fazer a guena, no dia em que acharemne- mada num deserto em algumas horas"
cessário. Ainda agora,o último relatório da Comissãode Ener-
gia Atómica nos EstadosUnidos informa sabre a novíssimaar- Como se vê, êsses malditos .comunistas não estão pelos
ma de destruição que, ao lado dos cones de carga dos Polares autos. Vejam, não querem saber de uma "guerra por procura-
e Minutemen, será o que os peritos chamam de ."cargas d-e de- ção", ,"guerra limitada", nem de "guerra tota] localizada". Com
molição". Com tais cargas os americanos pretendem rasgar um êles, é só na guerra total. Estão ve;do, dizem o General Golbery
novo Canal do Panamápara a independência
completade sua e os outros teóricos da guerra no Ocidente, ês.sesrussos"só
área vital de defesa em relação a áreas periféricas, sob outras querem'' uma guerra tradicional em que aparecem com um
soberanias. Então as últimas aparênciasde unidade continen- número esmagador de ''grandes unidades terr;stres". Em vão os
tal terão desaparecido.
A Américado Sul ficará de fora da- americanosinventam dezenasde milhares de armas atómicas
quele sistema, esperemos, entregue à sua sorte de maior ilha dos táticas para poder guerrear contra os russos.E tentam conven-
mares do Sul. Ao menos, teremos paz. E o progresso que tiver- cê-los da .possibilidade ou vantagens de uma guerra com armas
mos será "nosso" táticas até limpas, desdeque, é claro, se fizesse"circunscrita a
Seja por sugestão dos generais alemães, seja por iniciativa teatro de guerra tàcitamente aceito" pelos dois grandes,"enca-
dos estrategistasamericanos,em dezembro de 1964 surgia na puzados para além da área realmente conflagrada" e "sem envo!-
Alemanha e em Washingtona idéia de fazer gakrias subterrâ-
neasao longo da fronteira oriental da RepúblicaFederalAle- l Camille Rougeron,Zes Barragemde il/í/zei /Vzlcléaíres,
Fígado,4 de
março, 1965.
234
235
ver interêss.esvitais" de nenhum dêles. Os russos não querem Os EstadosUnidos arriscam-se,assim, a ter de fazer uma
compreender. São comunistas mesmo. guerra isolada na Ária. A arma a.tõmica russa detém qualquer
'Na realidade, à ameaça de Sokolovski, McNamara deveria veleidade belicista dos fanáticos da OTAN na Europa.
responder: Se os russosinvadirem a fronteira ocidental da Euro- Os EstadosIJnidos já não visam, parece, a reservar-seo
pa será a guerra atómica mundial e a Rússia em pouco .tempo Vietnã como sua esfera d-einfluência. Visam agora a planos mais
estaria transformada num deserto. Então, o mundo (isto é, Oci- ambiciosos.A obrigar pela chantagemda guena pré-atómica a
dente e Oriente juntos) respiraria com mais tranquilidade. Rússia e a China a se separarem. Se consumada a separação,
Aliás, no fundo, toda essa inquietação norte-americana pode a paz nem por isso estará assegurada.Ao contrário. Os Estados
ser o reconhecimentode que a União Soviéticanão alimenta Unidos tentarão aproveitar-seda brecha para reduzir a China
sèriamente projetos de invadir as fronteiras da Alemanha Fe- à impotência, numa espécie de recolonização, com Chang-Kai-
deral para ocupa-laou ocupara Europa. O PoderNacional CheÉ ou qualqu.er outro títere chia à frente. A gmpr?itada é,
russo está hoje tão amarrado a seus interêssesvitais internos c porém, extremamente pesada. Poderia dar antes de tudo numa
externosque'não há lugar dentro dêle para qualque.raventuni belíssima guerra tradicional, com meio's modemíssimos, pré,
de caráte; ideológico ou militar. As suas fronteiras de defesa para, quase-atómicos,
sob o olhar inquieto da Rú-saia.Poderia
estão protegidas pelo que os franceseschamam de g/acfs sovié- mesmo, é claro, transformar-se numa aventura capaz de induzir
tico. empenhados numa competição tecnológica com os Estados certas camarinhas superexcitadas (apesar dos computadores) do
Unidos, todas as suas energias estão concentradas nesse esforço Pentágono e adjacências a experimentarem outra vez a arma
competitivoe num outro para aumentara produtividade de suas atõmiila (uma pequena, várias limpíssimas, numa guerra total
indústrias e unidades agrícolas, dando maior autonomia às suas isolada) contraafinal 'milhõese milhõesde amarelosque já estão
cmprêsas, para passar à produção em massa de bens duráveis "sobrando" na China. A Rússia tem ameaçado responder a essas
e de consumo, elevando o nível de vida de sua população, ainda preliminares táticas pul.à estratégia .'isolada" com a arma reta-
sensivelmenteinferior aos dos povos vizinhos da Europa. E ]iatória. Como queiã oferece a escolha: a paz ou a destruição.
vamos e venhamos: fora de interêssespuramente ideológicos Pode também acontecer que os estrategistas de Washington te-
que outros motivos há para esperar-seuma invasão-da Europa nham passado para a frente de sua testa pensante a ideia de que o
ocidental por parte do Poder russo-soviético?A economia so- momento é chegado do anular as veleidades atómicas chinesas
viética não é movida pela n-ecessidade
incessantede conquistar ainda por assim dizer em botão, anulando a possível superio-
novos mercados para o escoamento de suas mercadoria-s, nem ridade estratégicada inimigo, dono de uma área terrestrever-
pela premênciade investir capitais disponíveisno exterior, nem dadeiramente eurásica, não só compacta como confie/a e ser-
de monopolizar zonas de matérias-primas localizadas em vários vida também de mares mediterrâneos e oceânicos em todos os
pontos do globo. A União Soviética não tem colónias, não tem meridianos. Eis o que está em jogo nas guerrilhas, atentados e
interêssesvitais investidos no exterior, como os Estados Unidos, queimade budistasno VietDãdo Sul.t
a Grã-Bretanha,a França,a Bélgica etc. Quasetudo o de que
precisatem ela, dentro de sua área territorial oü na qae co/z-
iraZa mí/ífarmenfe.O pouco que não tem pode obter pela via Os bacharéise generaisdas províncias e territórios da Amé-
do comércio externo. Não há, assim, interêsses vitais económicos rica Latina não vêem nada do seu canto do mundo,onde o.s
ou políticos de segurançaque justifiquem uma política belicosa americanos mesmos lhes armaram um teatrinho para represen-
ofensiva de sua parte. No entanto, se Washington admitbse tações de alta política -- o "sistema interamericano"
essa hipótese, sua estratégia global ficaria balouçando no ar, Nesse desenvolvimento realmente supernacional, supe.rcon-
sem consistência.A atmofera de cruzada anticomunista tem de tinental, que resta dc} conceito vazio de unidade hemisférica'?
ser mantida para conservara tensãomundial, a ponto de conter
l E também agora de americanos em frente à Casa Branca
os aliados disciplinados e os Brasas, sob sua tutela.

23Ó 237
Olhem-se -- além da organização providencial da ONU, parla- verdadeiramente capaz de impor -- porque tem a força indis-
mento embrionário do mundo -- as combinaçõesde podêres pensável -- a validez das suas sanções ou decisões.
saídasda guerra. (Estão todas retardadasno tempo e no es-

:3.üm nii ylÃ#B


O idealismo jurídico da OZA é um objetivo despido de
qualquer conteúdo concreto, é um falso objetivo, quer dizer,
puramente ideológico. (Tentaremos mais adiante explicar as
razões históricas, económicas e políticas de sua constituição c
dos politicamente, economicamente, socialmente, ' cuJtumlmente
do seu papel.) Ou por outra, seu objetivo serve a uma política,
pela geografia?Há apenaso Mercado Comum Europeu da Eu- a promoçãodo objetivo nacionalpermanentede uma potência
ropa dos Seis,.em grandeparte sustentadoou nutrido pelos re- exclusiva,que não é o nosso,nem o da Argentinaou o do Pa-
cursosda África e Ária Menor. A sua união política'é' ainda raguai, do Equador, Venezuela, México, Handuras. É exclusi-
-- e não se sabe até quando -- um problema aberto. America- vamente dos Estados Unidos: a aniquilação de qualquer poder
nos de.um lado-e inglêsesde outro estão entre os que dificultam que, direta ou indiretamente, possa ferir ou ameaçar por sua
sua.unificação Enletanlo, esta.uma vez realizada, iria implicar existência mesma o regime de capitalismo privado que se iden-
novas aberturas. SÓ há um Continente "u-nado;' -- e assim tifica com a razão de ser dos EstadosUnidosmesmos.Não
mesmoCuja R)i declarada
fora do Hemisfério-- é o Brreiro é po-ssível uma agregação de vontades nacionais -- nunca mani-
latino-americano da metrópole norte-americana. Se houvesse festadasexpressamente
por nenhum meio em qualquer dos paí-
uma só .grande potência entre os vizinhos dos Estados Unidos ses latino-americanos -- em tardo 'de objetivos tão negativos.
falar-se-ia.menos em "unidade hemisférica".'(Se o Brasil amea- "Capitalismo" ou "socialismo" é, pelo menos teoricamente, uma
çasse de o ser!?)
questão aberta para ospovos subdesenvolvidos, para povos como
os nossos,em formação e que não chegaram ainda a ser senho-
Prevendo para o pós:guerra "agrupamentos supranacionais" res de sua história, dqiséu destino. Se assim é, como será possível
como a obra do século,-.sobo impulso de mudançastecnoló- fazer daquele objeti\t) nacional americano objetivo nacional per-
gicas fundamentais", tendentesa Produzir "unidades político- manente de Estados subdesenvolvidos, incompletos, com as
econõmicas maiores", o Professor Staley fazia antes da guerra
essa, pergunta pertinente: "Que deveríamos con.siderar coma perspectivas do futuro ainda abertas, não comprometidas com
nenhuma doutrina, preconceito ou sistema? Nenhum partido,
as áreas mais apropriadas para os agrupamentos supranacio-
nais? Particularmente,
que pêso deve ser dado numa futura nenhum setor social pode predetenninar hoje como se; vai
dar a passagem do estágio do indesanvolvido para o de desen-
conferênciade paz ao conceitode 'continente'?Muitos a essa
pergunta respondem com o conceito de 'regionalismo'. Mas antes
volvido. Ousamosdizer que a maior parte, grandeparte, uma
parte ao menos, a parte mais consciente do povo brasileiro con-
de.se falar em regionalismoseria preciso criar um sistemade sidera nesse sentido o futuro aberto e principalmente seu futuro
ordem mundial que agregasseum grupo de podêres suficiente- imediato.
mene, realmente interessados na manutenção da paz e dessa
ordem mundial e mais propensosa liquidar a agressão,onde Como é possível que nações soberanasconcordemem ter
aparecesse,do que sustentar êste ou aquêle lado num conHito como bas-ecomum para a união, para fins de interêssesnacio-
parucuiar. E com todos. os defeitos e deficiências o que temos 1 0 chamado Poder militar do Brasil é sobretudo uma aspiração.
hoje na ONU.O que se forjou, entretanto,com a oEAnão é um Não tem sequerautonomia teórica. Para viver, para funcionar, exer-
sistemade poder supranacionalregional, mas dentro do sistema citar-se em armas e em suas funções específicas, embora modestas, de-
pende de importar dos Estados Unidos armas, máquinas, técnicas,
mundial interes-sadoem preservar a paz. Ela é, antes de mais idéias, instruções, táticas e. .. a grande estratégia, o pensamentoes-
nasal um sistemapuramentepolítico cujo objetivoé intervir em tratégico, que não se coaduna nem com as nossas tradições nem çom
conflitos,masfacciosamente, isto é, a favor semprede um lado a nossahistória, nem com as idiossincrasiasde nosso povo, nem com
contra o outro. Sempre, aliás, do lado do único Poder Nacional os nossos interêsses concretos, imediatos e mediatos, nem naturalmente
com o nosso destino .
238
239
nais coletivos, em grupo ou associação de nações, condenações só contando com o Brasil do marechal Castelo, Honduras, Pa-
dogmáticasde ordem filosófica doutrinária? Na entanto. reso- raguai e talvez parte dos exilados cubanos. E as fascistases-
lução oficial é ap:rovadaem Punhadel Este, embora com abs- palhados pelo mundo, possivelmente.
tenções do Brasil (Govêrno deposto) , Arge=ntina (Govêrno de- Os regionalismos, ou, por outra, agrupamentos regionais
posto), Bolívia, Equador (Governos depostos) e Chile e Mé- de Estados,podem ser, no entanto,uma condiçãode sobrevi-
dico,.em. que se .declara: "a adesão de um membro da Orga- vência de pequenas nações e de pequenos Estados nacional-s,ou
nização dos Estados Americanos ao marxismo-leninismo (iic) é de grandes Estados fracos, economicamente, politicamente. Tais
incomparávelcom o sistemainteramericano".Qual a universali- agrupamentos,porém, adaptados às infra-estruturas naturais, vi-
dade necessária às diretrizes de agrupamentos dessa ordem? An- sariam a atuar sabre precisos problemas locais de áreas parti-
tes da SegundaGrande Guerra, constituiu-se uma associaçãode culares e afins. O regionalismo é uma aproximação conjugada
Estado com tais óbjetivos. Lembram-se? Foram as potênciasfas- de domínio sabre a natureza comum de Estados que, sòzinhos,
cistas que a co-nstituíram. Foi o Eixo anticomunista, cuja finalida- seriam incapazes ou encontrariam dificuldades para aquêle do-
de u:pressa era o combate ao comunismo, ao "marxismo-leninis- mínio, o que equivale a mobilizar conjuntamente recursos para
mo", por 'todosos meios.O .resultadofoi o que se viu. Mas é o superar o subdesenvolvimento.Os regionalismo-spodem ser pro-
caso de se levantar a questão: É tal condenação de princípio com- vincianos, localistas, mesmo paroquiais p-arabarrar do caminho
patível com ser membro da ONu? A Carta das Nações Unidas é largo os desvios impostos por espúrias pressões externas ou por
contrária a tais discriminações políticas sectárias. devaneios fantasistas de mistagogos. É o regionalismo um bom
antídoto às ideologias.
Se a grandemaioria do povo dos EstadosUnidos dá seu
apoio a êssealvo é porque teme que seu nível de vida (sem falar
nos.quarenta a cinqüenta milhões de necessitados,pobres, os A questão crucial # coloca: é possível enco:ntrar-se êsse
mudosl os esquecidosda '.grande sociedade") venha a sofrer, bloco regional vivo, orgânico -- e não nLera ideologia -- para
caso .algum dia o "comunismo" ou coisa pelo estilo viesse a a América Latina, ou pelo menosa do Sul? Era estano funda
substituir o regime anual sob que vive e com o qual parece a questão que apontava vagamente da realidade mesma da Amé-
satisfeito (apesar da crescente inquietação dos seus trabalha- rica Latina. Nas relações económicas entre QS Estados Unido.s
dores quanto aos efeitos da automação). Mas em nenhum outro e a nossaAmérica, a partir dastransformações
da guerra,pro-
país do mundo seria possível mobilizar o povo para ir em gue.rra cessou-se antes, no fundo, a interdependência, ou dependência
contra regimes .comunistas estrangeiros. Três ou quatro países uni[atera[ e independência uni]atera]. Com efeito, a interdepen-
na Europa ocidental .contam com fortes partidos de esquerda, dência dos Estados Unidos e da América Latina no curso da
resolutamente.anticapitalistas. Ainda hoje os maiores partidos da guerra se pode verificar ma progressão dessas cifras: Os Estados
trança e da ltália.são. os seus partidos comunistas. Imagine-se Unidos compraram ao conjunto da América Latina: em 1942 --
uma constelação de forças políticas em qualquer dêsses dois 997,3 milhões de dólares; em 1943 -- 1.318,5 milhões; em
paísespela qual o poder político se abrissea um dêles.Na 1944 -- 1.593,7 milhões; em 1945 -- 21.622,6 milhõe-s.
ltáJia, por exemplo. Concebera alguém (o mm'ec/za! CasfeZa. Quan;to às vendas, elevaram-se nessa escala no curso dos mes-
por exemplo) que os EstadosUnidos possammobilizar a ONU mos anos: 1942 -- 717,9 milhões; 1943 -- 813,2; 1944 --
(como podem mobilizar a OEA) ou mesmo a OTANou forças ] .055,6; 1945 -- 1 .261,3 milhões. Resultou daí, para os anos
populares ou o Govêrno. da República Federal Alemã para al- de 1942-45,um balançode pagamentos
constantemente
favo-
guma ação contra a ascensão ao poder do pci? Certamente obte rável à América Latina.
rão dos altos conciliábulos da OE:xalguma resolução condena- Para as zonas das Caraíbas, as vendas dobraram passando
tória e condicional, com muitos "todavia", ''porem", e "con- de 433,4 milhõesem 1942 a 849,4 em 1945. (Nessaszonas
tudo", para melhor ressalvados princípios. Mais do que isso, incluam-seo México, a América Central, as Ilhas, Venezuelae
240 24]
o esforçode readaptaçãode tôda uma economiaprimária a ser
suplementar de uma economia desenvolvida. Nunca o monopó-
lio de tudo -- fontes de matérias-pj'imãs,explomçãodas mes-
mas, comércio, mercado interno e externo, reserva.de campo
de inversões-- foi mais completo que ao têrmo da guerra. Foi
a situação mais clássica que já apareceu de economia depen-
dente ou colonial e também a mais moderna.
O resultado foi o declínio constante da parte da América
Latina no comércio mundial até recentemente.Os EstadosU.na-
dos tiveramde assegurar-lhe
a satisfação
de necessidades
mí-
Tiveram de asseguraro suprimentode ferro e aço,com-
bustíveis, têxteis, carvão, produtor químicos industriais, farinha
e trigo, maquinário agrícola e fer].amenta industrial, veículos.
De outro lado, porém, a escassezde tonelagemmarítima dispo-
nível então e as exigências da economia de guerra reduziam a
possibilidade de fornecimento de todos êsses artigos. Assim, a
própria ?scaslez foi impulso ao processa de industrialização ge-
neralizado, sobretudo nos principais países do Continente. Cãm
a criação de uma balanç'a de pagamentos constantemente favo-
rável aos países bati.no-americanos, verificou-se uma acumulação
de saldosem ouro e divisas. O ouro abundava,embora o mate-
rial de produção envehecesse e se estragas-se.Parecia ter sido
afinal encontrado, pelo menos para os principais países,na con-
tingência,o caminhoao dose:nvolvimento.
A' separaçãodos for-
necedoreseuropeuse sérios competidores de bens duráveis e
produtos manufaturadosservia ao esforço industrializante dos
nossos países. . A concorrência europeia, com efeito, desapar'e-
cera. Na medida que as indústrias norte-americanasnão po-
diam, em virtude das prioridades de guena, atender aos nossos
mercados, industriais latino-americanos apareciam para supri-
los. A coop-eraçãoeconómica e financeira apoiava-se, ainda as-
sim, "num monopólio sem precedentesda América do Norte''
Toda a política americanadesde o fim da guerra tem
visada a Dão perder êssemonopólio que, aliás, não se atenuou
com o tempo. A palavra de um dos grandes economistas de nossa
época, lúcida e .irrecusável, merece ser ouvida: ''Um grande
drama entre a América Latina e os Estados Unidos se joga
em virtude de uma de-sigualdade e em uma atmosferade con-
flito cultural. Um busãrzesx
gigantescotrata como seuspróprios
258.265. s dados expostosacima, ver Chamisso,obra citada, págs. negócios
os de vinte naçõesde que não fa]a a línguae não
mede bem a grandeza. O comércio exterior dos Estados Unidos
242
243
máxima dos últimos anos, sua participação no total mundial não
cessou de decre.scer.Esta foi de 10%o em 1953, de 8,7% em
1957 e de 7,3% em 1961.":
De ousas fontes, examinando-se a posição da nossa Amé-
rica no mercado mundial até 1962, encontra-se o mesmo quadro
desolador de retraimento. "De todas as regiões não industria-
lizadas. a América Latina apresenta a situação mais desfavorá-
rável por ser aquela em.que as exportações.menos se desen-
volver;m de 1953-55 a 1962, com um aumento ligeiramente in-
ferior a 17%. E ainda é preciso relevar que essataxa de au-
mento foi obtida numa larga parte graças à expansãodas expor'
tações de petróleo da Venezuela. Excluídas estas, a taxa de cres-
cimento cai a um pouco mais de 6%, correspondentea um cres-
cimento anual cumulativo de 0,7qo . . . No que concerne à dimi-
nuição do valor unitáüo das exportações,é ainda a América La-
tina que foi a mais tocqSlqporquanto o preço médio de suas ex-
portaçõescaiu de 19cl#no período consideradoe de perto de
24% se excluídas as -exportações de petróleo, o que evidente-
mente de muito contrabalançou o acréscimo, aliás modesto em
relação ao desenvolvimento do comércio de países industriali-
zados.de 44% no volumede suasexportações.
. . Quantoàs
importações,ainda aí a América Latina devia contentar-secom
um acréscimode 26% quando os paísesdo Sudesteda Agia (!)
e da África aumentaram respectivamente de 46qo e 28%, OS
países do Oriente Próximo registraram a taxa de progressão
mais elevada de 77% , graças ao petróleo."'
lsolamentp geográfico (confins da terra) somado ao isola-
mento ideológico (o "manismo-leninismo" declarado ilegal, in-
compatívelcom o ;'sistemainteramericano") não dão regionalis-
dão regressão. E nessecontexto a OPAé a máquinade re-
l Juan Eduardo Morarex -- Commerce Exféríezlr ef sozi Développe-
menf -- 1,'.4mé íqz/e La/íne e/z Devenír -- Recherches et Debats --
Paria,ançois Perroux, Z)emaín Z,'.4mérfql/e Z,aff/ze, Gille-Gozard, PUF,
Cahier n.o 44, outubro, 1963, págs. 55-56.
2 François Perroux, obra citada, págs. 204-207.
244 245
-- não é comunista, não é ''marxista-leninista", nem 'sequer mar-
xista, mas católico e admirador dos EstadosUnidos. Podia ser
ouvido pelos governos sul-americanos. Em primeiro lugar pelo
do Brasil, mas êste é o mais surdo, apesar de ser talvez de todos
o mais interessadoem que se crio um vasto mercado latino-ame-.
ficado, um sistemalatino-americanopróprio de pagamentosatra-
vés um mecanismoqualquer de moeda compensada,com ex-
clusão das moedas fortes convertíveis; não em vão o nosso País
é, com efeito, o mais industrializado da América Latina.
O isolamento econâmíco e quase cultural foi a prim-eira
condição para espicaçar no súdito latino-americano, no provin-
ciano latino-americano, uns primeiros vagidos de consciência
da solidaridade de seus interêsse-snacionais, nos dias da guerra.
anão, na procura desesperadapor novos mercadosonde escoar
seus produtos e importar outros, passaram os latino-americanos
a olhar o vizinho de lado ou do outro lado do mar, mas ao sul
do hemisfério. Um i.nício de intercâmbio entre paíseslatino-
americanoscomeçou a surgir, à sombra do isolamento dos velhos
freguesesda Europa. Fê2-se então alguma coisa nessesentido.
Assim, $e em 1938 a troca de produtos entre povos latinos das
Américas mal absorvia69o do conjunto das exportaçõese
9% das importações, án 1941 as exportações chegaram a 9%
e as importações a 15%a; em 1943, as primeiras foram a 13%
e as importações a 27%o, para em 19'45, fim da guerra, alcan-
çarem as primeiras 16,6% e as últimas 28qo.:
A Ai,ALC, se obedecessea seus interêsses verdadeiros, seria.
um esforço capaz de vence.ro isolacionismo, o provicianismo de
vários Estados latino-americanos condicionados pelo subdesen-
volvimento e o bilateralismo forçado de todos para com a me-
trópole. A vitória da Ai,Ai,c estaria em grande parte assegurada
se os Estados seus componentes conseguissemintercambiar sem
dólares. Todos os analistas da ALALC são unânimes no apreciar
as razões dos pequenos progressos feitos pelo novel organismo

guaia de propor durante a conferência, a revisão do conceito de pan-


americanismo, ã ser substituído por uma espécie de latino-americanis-
ma, çoma conquistade fôrça política para a }.mlc". (Correioda
/VanÀã, 25-9-64.) Assim, tanto o eminente economista francês, de seu
ponto de vista desinteressado,
como um dos nossosgovernos,o uru
guaio, foram diretos ao ponto nevrálgico da questão: o que antes de:
tudo falta à ALAR,c para desenvolver-se é autoridade política.
l Chamisso, obra citada, pág. 261.
246
247
criado pelo I'j'atado de Montevidéu, ou de seu impasse .anual. Em lúcido artigo no Correio da Ã4a/z/zã,
de 25 de março
A CEPAL,em seurelatório oficial para a ONU,de setembrode de 1965, o economistaGilberto Paim, reportando-seao mo-
1964, pede como primeira condição. para vencer a estagnação mento político brasileiro, sustentava ser sua lacuna característica
no esforço de integração económica latino-americana, a capaci- uma ''ação.conseqüentedas classesa que está entregueo pro-
dade de decisãono mais alto nível. Ape-sarde os seusnove mem- cessoeconómico" e que se a lacuna fôsse preenchidater-ie-ia
bros constituírem cêrca de 82qo da população da América La- "pStslo termo ao ?lheamento empresarial em relação às questões
tina e mais de 80qo do produto regional bruto, a Associação não políticas' . Se tal. alheamento se verifica em face de questões de in-
deu ainda a seu arranque.É claro que é muito diferente orga- terêsse tão imediato na área económica .financeira brasileira da
nizar-se algo como um mercado comum em paísesde .alto de- atualidade, maior é ainda o alheamento dessa mesma classe em-
senvolvimento industrial com pujança financeha própria e or- presarial em relação à .política económica exterior do país. AÍ
ganização bancária e p.rodutiva de alta complexidade, que o fa- está o que.falta para dar dinamismo a um empreendimento de
zer, mesmo em estági(i incipiente, com países em fase ainda pr?- tãa vasto alcancecomo a associaçãode nove paíseslatino-ame-
industrial, despreparados financeiramente -e com o tamanho de ricanos. Falta-lhe uma força atuante consciente, movida por um
seus mercados nacionais ainda bem restrito. A passagem da objetivo pemlanente, por um ideal mesmo para a coleiividade
troca de bensde consumopara a de bens intermediáriose de latino-americana. Essa .é a autoridade, a vontade política que
capital é sobretudodifícil, pois não há o que intercambiarem estáfaltando por trás da Ai,ALC. Sem ela podem reunir tantos
grau suficienteou como o fazer, Da falta de financiamentoe ''conselhosde ministros" quantos quiserem,que a causada as-
capacidade de absorção. sociação latino-americana não avançará. Os governos da maio-
Mas no fundo tudo isso sãoquestõesde ordem técnica,isto ria dos nossosEstadosnão estão em condiçõesde compreender
ou levar por diante uma política sistemática,de longo alcance,
é. transmutáveis.
O fundamental
é a vontadepolítica,a von-
tade transformadora dos Estados associados. É, sobretudo, neces- em prol da integração eiiQiómica regional dos nossospaíses,ab-
sorvidos que vivem eiu' sair de dificuldades imediatas ou em
sário que em cadap-aísassociadose formulo uma.política econó- desatrelara carro de seuEstado da máquina económicae políti-
mica .nacional clara e definida, para que, ao associarem-seos Es- ca norte-americana que tem sua velocidade própria e sobretudo
tados-m-ombros,possam manifestar, no âmbito da grande re- sua escalacom de-atinomarcado. Outros, ao contrário, procuram
gião, uma vontade coletiva. Nada disso foi feito, porque os di- para salvamento e comodidade burguesa de seus dirigentes, atre-
rigentes latino-americanos não estão preparados.para essa de- lar o carro.emperrado. de seuEstado à possantemáquinaame-
finição de política económicae essa]lespolsabilidaderegional. ricana. Será preciso identificar tais dirigentes retardatários?
O Tratado 'de Montevidéu prevê um Conselho de Ministros da Os empa'etáriosbrasileiros não estão contentescom os re-
ALAR,c. lesse conselho nunca se reuniu e se vier a reuDu-se, sultados da ALALCobtidos até agora. E com toda razão. Alguma
pode-se desde já prever que será mais uma pomposa reunião coisa há, reclamam êles, que está freando o incremento nas
burocrática.
economias regionais. A ideia central da Associação, de promover
Antes da reunião de ministros, será preciso uma força di- um aumento de consumo e desenvolvimento de mercados re-
namizadora realmente interessadaem promover o intercâmbio, gionais.medianteum comércio mais vasta que o de cada país em
em fazê-lo constante e naturalmente progressivo, abraogendo particular, não .está sendo obtida. Ao contrário. SÓ pelo de-
po'uco a pouco todos os produtos que cada país esteja em con- senvolvimento daqueles mercados -- o objeto mesmo da Asso-
diçõesde suprir. Não bastaainda que a lista de produtosco- ciação -- poderia ser alcançadoo fortalecimento industrial dos
muns destinadosa seremtrocados na base da associaçãocresça paísesmembros.Alguns até agora não têm procurado ampliar
no papel, é preciso que passea constituir vantagenspalpáveis prõpriamenk os mercados recíprocos para que $e eleve o bem-
para os que vendem e os que compram, com exclusãode pro- estar de cada povo, limitando-se a fazer Üm bom negócio a
ilutos similares procedentes de outras zonas não associadas. cada transação e conseguindo com isso maiores saldos em moe-

248 249
das conversíveis estrangeiras. Pior ainda: com estas intensifi- países latino-americanos representa uma anomalia. O desenvolvi-
cam as importações dos países superindustrializados. É incom- mento da AIALC, assim como estão de saída colocando as coisas,
patível com a ALALCaproveitar-seum membroseu da ocasião se encontra inemediável e fatalmente estorvado porquanto pa-
para melhorar sua posição cambial em moeda forte. Isto é fazer rece mais do que óbvio que não se pede comerciar com uma
o contrário do intercâmbioregional,isto é reforçar as tendên- moeda que não se possui". (F. Conti)
cias de resistência à Ai.ALC, agravando o bilateralismo e com Os paísesmembros da Ai,Ai.c, diferentemente dos membros
êste a dependência. Os nossos empresários por isso mesmo con- do MCE,não são de um modo geral conconentes,
mas
sideramo "pecadooriginal" da AI,Ai.c permitir que "o seio complementares.
O Brasil tem manufaturasde feno e de aço,
comércio se processeem fnoedas conversheis, deixando pràtica- tecidos e outros produtos a exportar para países associados que
mente /caos os saldos /m .4/ztérlca do Morre". Esta foi a tese
não os produzem, mas tem todo um mercado aberto para o Mé-
apresentada na ll Convenção de Empresários Latino-America- dico, para a Argentina, .Uiuguai, Colâmbia. Um dos grandes es-
nos realizada no Médico. A tesefoi aprovada na ocasião. Trans- torvos ao intercâmbio é o traí-sporte.A sua dificuldade. a sua
formar-se-á em norma taxativa da Ai,Ai,c? Dificilmente. Os in- omissãomesmo,indicam.toda uma política, uma vasta política
terêssescontrários são poderosos.E a classe dos industriais bra- regional e não a favor da metrópole.imperial. O grande pro-
sileiros, argentinos, colombianos, mexicanos, uruguaios, chilenos blema, porém, queixam-se os empresários brasileiros, é sempre
não tem a ncia clara de seu destino, a energia moral ne- o mesmo: o de meios de pagamento,pois "todos têm que se sub-
cessáriapara canga-la para dentro de seuspróprios paísese por meter às operaçõesatravés o Chame'Manhattan Bank ou ou-
ela dar uma verdadeira batata política. No entanto, se o mer- tro estabelecimento norte-americano.(O National City Bank há
cado regional é uma necessidade absoluta para o desenyolv.i- tempos já anunciou unia vasta rêde de agências pelos países da
mento industrial dêsses países, não há melhor providê'nela Ai.ALC' e o estabelecimento da mesa da ALALC destinada a en-
a tomarque a proposta
pelosnossos
industriais.
O quese trosar e coordenar o qerêado e o exportador nacional com todos
propõe é uma moeda de exportação, ou pagamento em os outros mercadosl da AiJA[.c)".' (Córre]o da lida/z/zã. 18
moedas nacionais para as transações dentro da zona que de- de junho). "Êsses bancos dispõem de dólares e podem em
limita a Associação,medianteum meio de compensaçãoe de poucashoras fornecer car.tas-de créditos em moeda fort.e aos
operaçõestriangulares, tanto para a compra e venda de bens de negociantesregionais." No México e em Bogotá, as resistências
consumocomo para a de bensde produção.O que importa é, ao estabelecimento de.uma moeda compensada vieram sempre
segundo a tese brasileira, criar "as condições para desenvolver do lado dos órgãos internacionais bumcráticos das- finanças,
as'economiasregionaisaté agoraestranguladas
pela falta de como de interêsses ligados ao Chame Manhattan Bank 'ou
divisas para a importação de bens de capital, desvinculando-as ao NationalCity Bank. De qualq:uer
modo,comoera de
para efeitos de negociaçõesintrazonais do dólar norte-america- s.e esperar, o problema do financiamento das exportações
no". Essa proposição, de ordem prática, é fruto da experiência "tem-se. constituído no calcanhar de Aquêles dos países 'em
vivida dos 'empresários brasileiros e, provàvelmente, de colegas
desenvolvimento: No tocante à ALALC, as agências interna-
seusdo Uruguai, Argentinae outros. Havendo,com efeito, ga- cionais .de crédito, das quais se poderia esperar assistên-
rantias de pagamento na moeda nacional (cruzeiros, por exem-
cia efetiva, têm-se mantido omissas, reservadas,não muito
plo), mais Ifácil ficará aos compradores estrangeiros adquiri-los. c
a efetivação do resto das operaçõespor importadores nacionais, entusiásticas. O Brasil tem apresentado um balanço de pa-
gamentos com os países da zona associada constantemente de-
coisa que não acontece com o comércio latino-americano, todo
feito na basedo dólar americano.Como disse,perfeitamente,e ficitário e isso Ihe pode dar a autoridade necessáriapara que seus
com todo bom sensoum missivistaao Correia da À/an/zã (13 dc pontos de vista sejam escutadosnos meios da Ai.AI.c. De novo.
dezembrode 1964), "o que não deixa alguma dúvida é que a em nota da sucursal do Correio da À/am/zãde São Paulo, seu
forma de pagamentoaditada para as trocas comerciaisentre os correspondente,ao dar conta do ponto de vista empresarial'bra-
sileiro, infomlava: "Entre as bateiras que se têm levantadoa
250 25/
uma integraçãomais rápida, avulta o sistemade pagamentos.vi- para o Progresso que possibilitem.o . de-senvolvimento econó-
mico. . ." (Jornal da BrmfZ,20-8-1964). A Aliança é um em-
gente pam as importações da zona. Esse sistema ngiao, zznpasro
por e;rlgêrzcza da FMI,. faz com que os .pagamentos sejam efetua- preendimento não regional mas comum dos países latino-ameri-
dos em moedaforte de que os paíseslatino-americanostêm, sa- canos, tomados um ã um, e os Estados .Unidos: que financiam
seus projetos quando os acham razoáveis ou abençoam inves-
bidamente, escassez crónica". (Correio da Àd'am/zâ,15 do no-
vembro de 1964). Êste é o grande impasse ao empreendimento timentos privados americanos nos países latino-americanos;.As-
sim, vincular a AI.AI,c à Aliança é precisamentenegar o carâter e
regional. Supera:lo será um dos passos decisivos para a eman- a necessidade do esforço de integração . !egbnaZ .repleseltado
cipação económica e o desenvolvimentoregional de toda a Amé-
rica Latina. Se não se conseguirlimar a ALALCda sujeiçãoao pela p] imeira organização. Ademais, . a.Aliança.nao. dispõe.de
capitais maciços, nem de nenhum capital? na verdade; os de que
dólar não se chegará a parte alguma e. o. caminho para alcan-
çar-se uma verdadeiro marcado comum latino-americano, merca- dispõe,bem minguados, aliás, são vinculados,.sim, mas aos re-
do de duzentos mihões, hoje, e-starábarrado. A AI.Ai.c terá sido tornou'de investimentospara o país de sua origem. . ...
A Aliança é cadavez mais e tende.a ser.pela própria.filo-
um sonho d-e verão tipicamente latino-americano. sofia do atual Govêrno americano, um incentivo .ou assistência
Ü às inversões privadas diretas por .parte de capitalistas america-
nos .na América Latina. A inkiativa pode ser ótima, dar exce-

rto caso, a Aliança, ãlmitindo que funcione independentemente,é


uma organização,''ouantes uma operaçãode uma só T.ao eLde
certa forma aberta; a ALALC e tipicamente um organismo fecha-
do e o segrêdo de seu bom funcionamento está nessefechamento?
ou na possibilidade .de auto-regulagem:.. A Abançau nao. e um
oanco; é um exemplo que se quer edificante da boa vontade
sobretudo de nossos amigos governamentais:americanos, com
prazo fixo de existência. Na verdade, está hoje reduzida a uma
pranchetade projetos que o. Govêmo ámen.....o, atraem algu
mas de suas instituições de financiamento, aprova.ou não. Teõ-
ricamen© todos os paíseslatino-americanossão dela beneficiá-
rios. Os beneficiários,porém, no plano individual, não nego-
clam. não l?andemnem compram por seu intermédio, a não ser
pagando luras pelos capitais americanos investidos.ou n2o pa'
gando se o dinheiro do Estado fâr doado?ou, de.qualquerforma,
equipando-se com o dinheiro emprestado, nos Editados y:iates
conformea regra. Ademais,como é po'ssívelutilizar a Aliança
para os nove países latino-americanos da ALALC, enquanto os
onze Estados da América Latina restantes estão fora, dela ex-
cluídos?O equívoco é típico dêsses"técnicos" que antes de se-
253
252
rem técnicos.são burocratas de um aparelho muito mais amplo da mesma região económica" e das quais "os outros países não
e mais complexo do que aquêle a quê pensam estar servindo e se aproveitarão. . . em virtude da cláusula de nação ãiais favo-
não estão -- o aparelho do sistema financeiro capitalista ame- recida". (Art. 31, cap.VI, Da Segurança Ecanâmica). Eis. na
ricano. O contrário é que é verdade: sem a completa desvin- prática e na teoria do oeasismo, a u-nidade ou a solidariedade
culação da grande idéia regional da ALAR.cdas amarras do dólar económica hemisférica em ação.
e da transitoriedadede uma operação americana como a Aliança, Quando Da Conferência de Bogotá se decidiu reformular
a outra não tem vez. Não se des.envolverá. ' a União Pan-Americana, dand(»Ihe uma ampla:tudo de ação. e
Aliás,entrea Aliançaparao Progresso,
a Ai,Ai.ce a funções muito maiores do que as que tinha, ao mudar-lhe o nome,
Organização dos. Estados Americanos a única instituição que foram consideradas duas circunstâncias. Priineiramonte, a nova
não é produtode uma circunstância
extraordinária
-- a de instituição tinha de ser organizada dentro do contexto da Orga-
estar no poder, em Cuba, um homem como Fidel Castra e. nos nização das Nações Unidas, a que pertenciam os Estados Unidos
Estados Unidos, um homem como John F. Kennedy, no 'caso e mais os outros Estadas das Américas. E depois, por isso mes-
da Aliança para o Progresso, ou a de uma situação política mo, não se podia manter a velha designaçãode "união". "União
peculiar, um bloco de nações débeis vizinhas da nação mais rica dos Estados Americanos" não se coadunava com a organização
e mais poderosa, caso da OEA-- é a Associação Latino-Ameri- mu=ndialde Estados, já instalada e em funcionamento em Nova
cana de Livre Comércio.: A Aliança é uma operação p-assageiia lorque, com sua Carta, à qual todos os Estadosdeviam com-
e já .em processo.de definhamento. A OEA é uma organização promissos. Daí a "Organização" do-s'Estados Americanos, como
mantida, sustentada,prestigiadapelos Estados Unidos, como organ-isco regional da Organização mundial. A Carta das Nações
instrumento de um monopólio político e económico que Ihe Unidas impõe limites à ação de organismos do gênero, inclusive
convém. Quanto à Ai.ALC, é um sinal de amadurecimento na de jurisdição e direitos..Tudo em teoria, pois que dentro dos
dura experiência .de subdesenvolvidos por que tem passado a limites da OEAos Est.luas Unidos são soberanos (aliás a sobera-
América Lata:nadesdeo comêçodêsteséculo.-E a prova é que nia hoje é predicadcl das grandes superpotências).
ao longo de tantas conferências, tratados, organizações pan- Segui:ndo a praxe das conferências interamericanas prece-
ameri!abas, interamericanas, não foi ela objeto de nenhum ato de.ntes e reuniões de Ministros das Relações Exteriores, em
específico senão em 1960, sob a pressão das altas atmosferas Bogotá a mesma divisão, a constante divisão de interêssesse
políticas internacionais de então, particularmente na nossa Amé- verificou: de um lado os EstadosUnidos, de outro tôda a Amé-
rica, Mesmo anteriormente,.na Conferência de Bogotá, que pro- rica Latina. Esta fala semp;ro,como uma cantiga de realejo, nas
duziu os dois documentos fundamentais do sistema interameri- diferenças fundamentais de estrutura económica que a separam
=ano, a Carta dos Estados Americai'ms e a Convenção Eco- dos Estados Unidos. Queixa-se da disparidade crónica de preços
lzó/nuca,falou-se de tudo, decidiu-se sabre tudo, foram gastas da-smatérias-primas, que vende, e dos produtos manufaturados,
toneladas de pap?l e palavras com princípios, resoluções, reco- que compra. Embalde insiste não ser justo que o acessoàs suas
mendações;de tôda sorte e sabre todos cli assuntos possíveis e matérias-primas seja livre sem correspondência compensatória
imagináveis,mas nada sabre uma organizaçãonos moldes da em seu favor no acesso aos bens de produção. Apresentando
ALAR.c.Ou por outra, se pode divisar em certo artigo da Con- o seu rol de lamúrias, enaltece a necessidade de desenvolvi-
fie/ção Emraómicaalgo como uma abertura vaga à idéia de mento, a necessidadede capitais para a exploração racional de
organização regional ent-re nações para acordos preferenciais. seus recursos e uma industrialização intensiva e, na base da
Daí se poderia inferir talvez o germe de uma associação de experiênciados anosde guerra, em que os capitaiscom que
comércio fechada a nações latino-americanas. Pois foi êste um contou para algumas emprêsas produtivas foram de procedência
dos poucos .artigos ou proposições sabre os quais a delegação governamental, como no exemplo ainda verde do Plano Marshall,
americanafêz "reservasformais". Os EstadosÜnidos não admi- ásperatambém uma vasta ajuda em capitais por parte do Go-
tiam qualquer tentativa de "acordos preferenciaisentre Estados vêi.noamericano.Esta era a fórmula, a pedra de toque da soli-
254 255
dariedade hemisférica. Em resposta, os representantes america-
em conseqüênciada redução no abastecimento de produtos fun-
nos falavam a-scostumeiras banalidades, terrivelmente inamo-
víveis. Agora, passadaa guerra, insistiam em mostrar aos caros damentais e .de materiais estratégicos para a guerra, em que
planos deveriam ser formulados de comum acôrdo e o mais
irmãos . latinos que êsses haviam perdido a "prioridade". Esta
agoraé para a Europa; os recursosdo Tesouro americanoe de # ràpidamente possível, levando-se em conta as incertezas do con-
flito.": É evidente a contradição de interêsses indiretamente
seu.smúltiplos institutos financeirossão para a Europa Ociden- estampadaness-es
textos entre os paíseslatino-americanose os
tal. Uma vez reconhecida tal prioridade, os latino-americanos EstadosIJnidos,na questãoda reconversão
da economia
de
poderiam continuar a conversam,fraternalmente, com êles, que guerra para.! de paz. Para os últimos o que importa é a volta
lhes prometiam aprovar muitas resoluçõese princípios favorá- o mais ràpidamente possível às. condições mais propícias ao
veis a seus interêsses específicos: o "princípio" da paridade dos b prosseguimento normal dos negócios privados de suas émprêsas.
preços. das matérias-primas e manufaturados; a possibilidade Para a América Latina, porém, é não soltar as rédeasdos con-
(princípio, não) de acordos preferenciais a ser discutida em trõles e acordos estabelecidos durante a guerra, onde residiam
outra reunião; a promessade lenta, paulatina abolição da dupla os meios de defesaou de sobrevivênciadas próprias atividades
taxação sabre capitais de investimento externo, mas tudo em produtivas, para não entregar suas economias, suas poupanças
troca de nenhumadiscussãosabre os efeitos do'Plano MarshaU aos embatese à voracidade do comércio internacional restau-
na economia latino-americana.
rado.. Essa discrepância de objetivos .verificava-se a cada passo,
Na realidade,o Acordo de Bogotánão inovou em relação a cada.resolução que se aprovava. Assim, em relação a ponto
às i.evoluçõesaprovadas na Conferência do México, em janeiro tão delicado e decisivo-para as economiasprimárias como o da
de 19451 sabre as.questões de transição da economia de 'guerra decalagemde preços entre .os seus produtos e os produtos das
para a de paz. Falando ainda e semprena solidariedade'conti- áreasindustrialjzadasnofmáximoque os latinos arrancaramfoi
nental, começavam.aquêlestextos já a abrir mão dessanoção que, como "orientaç$) política geral", se levasseem conta "a
ao estatuir que quando os acordos exclusivistasde compra de necessidadede compensar a disparidade acentuada que se obser-
matérias-primas fossem suspensos,ao têrmo da guerra, oslatino-
americanos reconhecessem "a liberdade de comércio e da livre
va freqüentementeentre os preços dos produtos primários e os
preços .dos manufaturados, estabelecendo-se o equilíbrio entre
empresa" por que tanto, parece, suspiravam. Com efeito, numa os dois".a
resolução sabre o reajustamento económico do hemisfério no
período de transição os governos americanos acordavam: As-sim também para o tão sonhado des.envolvimento indus-
'a) em que no período de transição sobrevinha finalmente a trial, .decide-se:item 2) para facilitar o financiamentodas in-
necessidade de efetuar reduções no volume de abastecimentos dústrias, as repúblicas americanas tratarão de ratificar "no es-
e. . . que tais reduções vi-riam afetar. . . a estabilidade eco- paço,de tempo mais curto" os acordos de Bretton Woods que
nómica. . . dos países produtores; o país ou os países afetados se referem.à criação do Banco Internacional de Reconstrução
e o ou os países compradores. . . adotarão. . . medida.s tenden- e .Desenvolvimento e do Fundo Monetário Intemacional; item
tes a reduzir ao mínimo. . . as conseqüências negativas para 3). com o objetivo de promover e explorar seusrecursosnatu-
a economia dos países em questão. . . ê quando se tornar ne- rais, as repúblicasque tenham "abundância de capitais" (é o
cessário, os.países importadores e exportadores procurarão atin- casode seperguntar; Quais serãoestas?A do Paraguai,do Equa-
gir êssesobjetivos, levando em conta as necessidadesfunda- dor, Bolívia, São Domingos?) "farão tudo o que fâr possível
mentais de suas economias", e "b) em que todos os esforços para serem concedidos às que o peçam largos créditos a longo
necessários sejam empreendidos para atingir tão ràpidamente
quanto possível o restabelecimentodo comércio normal de pro- 1 Texto em Chamisso,obra citada,pág. 564.
dutos semelhantes e isso a fim de que cada país se beneilicie 2 Recomendação XLVI -- Venda e distribuição de produtos primá-
rios, n.o 5, Conferênciado México de janeiro, 1945. ' '
ao /züx//nla do tempo para o reajustamento que será necessário 3 /de/7:, pág. 568.
b
2JÓ
2j7
prazo, mediante amortizaçãoe direitos.. . que levem em conta acesso aos elementos essenciais à vida, tais como a alimentação
taxas e direitos prevalecentes nos países credores e os riscos adequada, a. habitação higiênica e o vestimenta constitui um
implicadosem tais operações".a
Mas no item 4) "as repúblicas serviço que deve ser estimulado pelos governos." Até aqui, tudo
americanas se comprometem.ãoa fornecer grandes facilidades + ótimo e..os latino-americanos encantados. . Mas acrescenta-se a
para o livre desenvolvimento e investimento de capitais, conce- seguir: "e que deve -ser igualmente favorecido com caráfer iu-
dendo tratamento igual aos capitais nacionais e aos capitais pZerívo.(sic) quando ? atividade particular não pode chegar a
estrangeiros" -- êste é o princípio para o qual, na realidade, satisfazer as necessidades fundamentais dos povos, e sempre -na
semente das repúblicas latino-americanas se exige o compro- medidaque as leis e a politica econâtNcade cada pais o per-
misso de "grandes facilidades" para o investimento de capitais mitam'' .}
estrangeiros.Mas nesseitem, no qual o princípio geral dos in- Nessa .mesma ocasião é que. sai.,.na Declaração de Chapul-
vestimentos estrangeirosé exposto com tanta clareza, os repre- tepec, a primeira afirmação. de "solidariedade política" das'na-
se:ntanteslatino-americanos conseguem acrescentar um "salvo
ções americanas. Essa solidariedade, esboçada ao tempo da
se os investimentos dêssesúltimos contrariem os princípios fun- guerra, ia tornar-se permanente na Conferência do Rio de Ja-
damentais de interêsse público".
neiro em 1947. Será agora unl princípio eterno, o dogma da
Na declaração geral de princípios do sistema interamerica- igreja hemisférica.
no ali aprovadahá uma sériede reservase diferençasde texto
entre as proposições latino-americanas e as norte-americanas, Finalmente,a Carta de Bogotá define a Organizaçãodos
muito reveladoras, sobretudo quanto a "igualdado de acesso Estados Americanos comia um "organismo regional". Com que
"política comercial internacional", "eliminação dos excessos de objetivos?,.Os políticos.ião: . paz, segurança do Continente, ;o-
lução pacífica dos conflitos citemos ; solidariedade em caso de
nacionalismo económico". Nesse ponto, as divergências explo-
dem. O texto português, que serviu de base à redação final e agressãoextema. Tudgi ótima. E objetivos económicos?Sabre
êstes fala o texto nal cooperação entre os Estados membros.
foi, afinal, aprovado,diz: "Cooperar no sentido de uma política
de colaboração económica internacional que elimine os excessos "na medida de seus recursos", ''no mais amplo espírito da boa
vizinhança". Também se diz que em caso de a economia de um
(iic) a que pode conduzir o nacionalismo económico, evitando-
se a resüição exageradadas importações e o dumpf/zg de exce- Estado americano "se confrontar com grandes problemas sem
dentes da produção nacional nos mercadosmundiais." A dis- encontrarrecursospara resolvê-losde modo satisfatório". "teria
tância de pontos de vista é patentequando os americanosapre- o direito de. . . submeterseusproblemas económicosao Conse-
sentam o seu texto, que quer, não que se evitem "os excessos'' ]ho Económico e Social Interamericano, com vistas a procurar,
do nacionalismo, mas simplesmente o próprio: "Para que a cola- de concêrto com aquêle, a solução mais conveniente"..Ê é tuã;
que em matéria de solidariedade.económica hemisférica se con-
boração econâmíca internacional possa ser realista e efetíva,
trabalhar pela eliminaçãodo nacionalismoeconómicosab fódai tém na famosa Carta de Bogaá.
as suas formas.''
Cotejo-seainda.o que a carta tem a dizer sabre a compo-
Em geral, essas recomendações e declarações de princípios sição de um.e de outro ãos órgãosprevistosna Carta: o CÉ=itê
são o meio utilizado pelos delegadosamericanos para estabele- Consultivo de .Deles! (.4dvho/y Z)ÉI/e/zse Cammíffee) e o Con-
cerem, em letra de forma, o que querem e o que não querem t selhoEconómico e Social Inte;americano. Para fazer parte da-
e, por vêzes, o fazem com uma rigidez ortodoxa de causar es- quele são designadasexpressamente"as mais altas autoridades
panto mesmo ao leitor já prevenido. Numa recomendação militares dos E-atadosAmericanos". Para fazer parte do Con-
LVlll sabre declaração dos pripzcípíossociais das Américas, selho Económico e Social, considerado em geral como o órgão
num item 7 se diz: "As nações americanas Consideram que o mais importante depois do próprio Conselho Diretor e desti-
l Obra citada, pág. 571 l /dem, pág. 574

258 2j9
l

O artigo, aliás, como o precedente, não se dirige para fora do


nado a promover "a melhoria do bém-estar social e económico "hemisfério". Ao contrário, para dentro dêle: aviso do grande
das nações americanas, por intemiédio de uma cooperação eficaz Estado imperial, em promiscuidadecontingentecom o bando
para melhor utilização.dos recursos" etc.,, designam-se'üeie- de Estados provincianos débeis, sem responsabilidadesnem
gados técnicos nomeados por país" Poderá haver maior con- interêsses mundiais -- a êstes parceiros para que se atendam
ao que aquê]e lhes possa dar.
traste entreuao$iportânciaque se dá a um e a importânciaque
No capítuloll (CooperaçãoFinanceira), em seu artigo 19,
A própria convenção. económica ali aprovada: .com treze osEstados"reiteramo objetivode facilitara um alto grauo
intercâmbio comercial entre êles e o resto do mundo e de favo-
recer o proa.ressoeconómico em geral, incentivar o investimento
das poupançase do capital privado estrangeiro. Êles se compro-
disfarçar a enomie disparidade de interêwes e de plano.em que metam igualmente a continuar a devotar-se à aplicação dêsses
ineviüvelmente se movem os EstadosUnidos e o provincianis- objetivos". A América Latina a "incentivar o investimentodas
mo também inevitável em que se movem os outros Estados.lati- poupalnças e do capital privado estrangeiro" e "compramefen-
no-americanos. E ao cabo'de toda essa árdua e contraditória 2o-se a con/ínzJar a entregar-se a tais objetivos"! Há, reconhe-
elaboração, não se sabe qual a 'Bua finalidade precípua, não se çamos,um certo gasto de humor negro nessaslinhas. Há, pcl-
sabeaoqueveioeparaqueserve. .. . , . .... '. rém, ainda melhor nesse estupendo artigo pelo qual os governos
Já no capítulo l dos Princípios, o artigo 3 é, na sua óbvia latino-americanos se tornarão apóstolos, arautos dos objetivos
banalidade, uma denegação de 'que houvesse entre os. Estados do Fundo Monetário Internacional: "Os Estadosmembrosdo
signatários' qualquer. solidariedade de interêsses especiljcos a os F. M. 1. reafirmam os fins desta instituição e, em condições
igar. Na parte, digamos, concreta do texto descobre-se es- normais, utilizarão seis serviços com vistas a realizar os obje-
!FllÊ#iE'=.:'ã'gz;;:
=':'1'ü-:;?
.w$11;:
dos declaram sua intenção de cooperar individual. e coletiva-
tivos da dita instituição . . . " (Os representanteslatino-america-
nos firmaram o compromisso,direitinho.)
Quando liricamente os delegados latino-americanos conse-
mente com outras naçõesem vista da realizaçãodo princípio guiam, por vêzes, a pêso de votos platónicos, fazer adotado
de facilitar o acesso,em condiçõesiguais, aa comercio, âos pro' algum texto com dispositivosrealmentede interessepara seus
dutos e aos meios de produção. . ." países, como a necessidade de compensar a disparidade entre
Outro, o sexto, define a medida e o caráter da.cooperação os preços de matérias-primas e os dos produtos manufaturados,
estabelecendo com is-se a eqüidade necessária entre êles -- os
delegadosamerica=nosnão falham em apor ao pé do texto sua
reservaformal. Assimo fizeramno texto citado (art. 3, cap.l).
O mesmoacontece em outro caso. Trata-se, também, de questão
vital para o Brasil e outros produtoresprimários, a dospreços
dêssesprodutos no mercado internacional. Os latino-americanas
tentam introduzir no texto sagrado da Convenção Económica
nterêsse comum'; ente os Estados -- o "de manter condições de Bogotá como se fossematéria "constitucional" a prática do
económicas favoráveis ao desenvolvimento . de uma economia financiamento compensatório. O artigo 30 (cap. VI, Segurança
Económica) diz: "Os Estados convêm de cooperar entre êles
e com os outros paísesprodutores e consumidores,em vista de
a-ssinarconvenções intergovernamentais que impeçam ou corri-
artigo visa a não prender as mãos .aos capitalistas americanos jam as flutuações que se produzem no comércio internacional
empenhados em assegurar a conquista dos mercados do mundo.
2Ó/
260
das matérias-primas básicas, esse/zcrafsà ecorzomiai dos /2tz&es americanos,com certo fastio, como para fe.cearo balançode
prodzzzoresdo Hemiyérlo, em conseqüência de um desequilíbrio um negócio.que terminou. Restam os ]aços políticos que deverão
persistente existente ou tendendo a .produzir-se entre a. produ- amarrar a América Latina. As lamúrias económicas'dos latino-
ção e o consumo, da acumulação de excedentes consideráveis, americanos são de sob?jo conhecidas. É com certa complacência
ou de flutuações acentuadasde preços. . ." A êste artigo como que concordam se ponha no papel uma espécie de desejos, aspi-
ao seguinte (31) a que já fizemos referência atrás, concernente rações, "princípios", fo.rmulaçõos que não comprometem nin-
ao desejo de ''Estados limíti.odes ou pertencentes à mesma região guém,.nem muito. menos a êles próprios. A Carta de Bogotá
económica concluírem acordos preferenciais para o desenvol- estatua sabre a solidariedade política do hemisfério, com sanções
vimento económicosdêles", sem que outros países se aproveitem expressaspara os violadores. Eis o que importa.
Quanto à "solidariedade económica" do hemisfério, era
das vantagensem nome da cláusulade nação mais favorecida,
a "Delegação dos Estados Unidos estima necessário formular sZogarzdos tempos de guerra. Agora, trata-se de outra coisa. Nos
suas reservasformais concernentesaos artigos 30 e 31 da Con- itens sôbre relações económicas da Carta e da Convenção, os
venção Económica de Bogotá".: delegados americanos. as .enquadram em regras para "a preser-
E aí está a unidade económica hemisférica, tal como defi- vação", .mesmo . em 1941 já afirmava NoimanÕ, ''do negócio
para o lucro" dos investidores americanos.A América Latina
nida na Carta e pormenorizada
na Convenção
Económicade seria uma válvula de segurança para o comércio e investimentos
Bogotá. A defesa económicado hemisfério, palavra de ordem do capitalismo americano.i
tão em voga nos anos de guerra, já em 1948 se desfazia oficial-
mente em nada, para decepção dos iludidos subdesenvolvidos Agora, o importanteé entregartoda a áreado sul do Con-
do sul. A situação do mundo é outra, as perspectivasdo mundo tinente aos homens de negócios do norte e êles saberão resolver
são outras. Naquelas longínquas épocas, as ilusões sabre revo- as dificuldadescom seus capitais e X:-!zaw
ãaw. O problema é
luções económicas, transformações estruturais, planos de uma deixa-los agir com cata liberdade. Os governos latino-ameri-
melhor sociedade e de superação do capitalismo, em desfavor canos não lhes .devem causar.embaraços com medidas preven-
generalizado, superabundavam. Todo americano pretendia atrelar
tivas, extemporânease perturbadorasda marchalide ãos ne-
c} carro latino-americano ao cano americano. gócios. Onde há negócios há lucros, onde há lucros -- todos po-
dem ganhar,.os que fazem os negócios,os que se utilizam ou
Já então, furando o mito do hemisfério ocidental ou de
gozam dos frutos dos negócios e os governos que cobram os
uma economia hemisférica, Normano mostrava ser a única pos-
impostos .e vêem a prosperidade crescer. Bogotá foi o triunfo
sibilidade de passar do mito à 3'validade tentar a organização incontestável dessa filosofia. Por i-ssomesmo, os latino-ameri-
de fada essa economia continental na base de métodos adminis-
trativos e não dos processosde competição automáica; "não canossaíramde lá com certo sentimento de frustração, a espe-
rar novas oportunidades para colocar suas velhas esperançase
embaixadores, mas um conselho especial de peritos económicos
deverá ter o encargo da técnica de planejamento, deixando às reivindicações..
E todo o drama do pan-americanismo,'do intera-
mericanismode então até hoje não tem .sido outro, emborae
administrações nacionais e locais a elaboração das esquemas apesar do ízzfermezzolírico dã "Carta de Punha del 'Este"
detalhados".Ora, isso é pura utopia, implicando uma revolução A.ch.ave'da situação é esta: no plano económico, as leis
(mesmo por consentimento) como queria Laski.' do capitalismo privado, a livre concorrência, o comércio inter-
Em 1948, a América Latina voltava à sua "rotina". Os nacional livre, som.defesa Dem partes isoladas ou protegidas e
americanosdo norte sereúnem,em Bogotá, aosdelegadoslatino- aqui e acolá, em alguma contingência, uma ajudazinha do Es-
l Os textos citados são da versão original francesa. ChamissÕos
tado -- e tudo se resolveráa contento. No 'plano político, a
transcreve na sua obra. ação comum, a solidariedade "hemisférica", as' sanções para os
2 John F. Normano, TAe EconomiaDe/e/zseo/ f;ze resfern Jlemís-
phere. Some Basic Considerationis, pâg. 1'7Q. l Normano, obra citada, pág. 162

2Ó2 2Ó3
desrespeitadores. . . e tudo será perfeito, num mundo de ordem, dar sinaisde esgotamentode possibilidades,a cederlugar a uma
de liberdade,de paz. Nessemundo abstrato,perfeito juridica- economia de plana. Então o entendimento com o resta da Euro-
mente, os governos latino-americanos têm cada vez menos es- pa colocar-se-á como o p.roblema do dia. As economias socia-
paço para reclamar ou mesmo manobrar. Enquadrados nesse listas do Leste europeuterão também de falar.
esquema ''oeasiano", não podem opor-se a seus predicamentos O regionalismo é no fundo .um esforço cooperativo para
e seus "princípios", porque êles mesmos se fundam na mesma a aquisição de recursos impossíveis de serem alcançados, isola-
ordem capitalista privada. Qualquer gesto de impaciência ou de damente,Estado por Estado. Os podêres que se regionalizam
ínconfomiismo na defesa dos mais comezinhos direitos de seus visam, pela conjugação de forças e recursos, 'a alcançar os níveis
povos cada vez mais necessitadospode ser qualificado de "tota- tecnológico-ssuperioresque só os grandesEstadosricos, os su-
litário", de perigosa.inortodoxia,de inclinaçõesainda mais peri- perpoderesse permitem por enquanto monopolizar e desenvolver.
gosaspara o comunismoe o fim estáà vista para quem o teve O nosso regionalismo latino-americano seria como uma coope-
-- Jânio Quadros,Carlos Arosemena,do Equador, e, /mf bü/ rativa .de.pequenos produtores agrícolas que se cotizassem para
llo/ /e zs/, Joãa Goulart.
adquirir implementos para a mecanização de sua lavoura e' ati-
vidades correlatas.
A OEA,definida como "organismo regional" é, pois, de um
falso regionalismo; sobretudo um anacronismo geopolítico, uma A revolução tecnológica aproxima no espaço e no tempo
ficção ideológica,. um híbrido sócio-económico. O 'regionalismo os povos mais afastados,suprime a geografia, substitui-se à na-
é, em sua essência,uma primeira divisão internacionaldo tra- tureza. Ela. faz da geopolítica um coiihecime:nto passivo e, por
balho ou supranacional, mas que principalmente não é, nem conseqüência, anacrónico. E cria a instabilidade fundamental
pode ser, !ma relação de dependência. (Em virtude dos prece- dos sistemas sociais e económicos fundados na tradição, nos
dentes stalhistas de caráte.rimperialista -- a lugoslávia que o fatâres ditos eternos -- os geográficos, a tema, os biológicos,
diga! -- ainda não de todo mortos na Urss, o Comeco#até a raça.e os "sociais" 1llt6s "naturais", isto é, a'família, a pro-
hoje não vingou; haja vista a resistênciaromena -- para não falar priedade privada, as ralações de compra e venda e os pretensos
na de outros paísessocialistas). A falência das economias socia- automatismos do mercado. l.Jma instiabilidade fundamental, in-
listas ao alcançaremum estágiomais alto de integração sócio-eco- sanáv:l, condenará,previa Staley, os sistemasque, ignorando
nómica é, aliás, um dos sinaisdessaincapacidade
para uma a tendência unificadora das mudanças tecnológicas, tentassem
verdades'a integração. E explica parte de sua impotência no dividir o mundo em "blocos totalmente separados" ou se fun-
campo da política internacional. As burocracias dirigentes dêsses dassem na base de barganhas eventuais ou tie política de poder,
paíse-sainda se fundam no dogma stalinista do "socialismo num no defrontar problemas realmente de âmbito' mundial. O sis:
só país". Mais do que dogma,é anacronismoperigoso nos tem- tema interamericano é um clássico exemplo dêsses"blocos"
pos abertos de hoje. separatistas,cuja função precípua é conservar o mundo dividido
em .compartimentos estanques anacrónicos, e a América do Sul
Os povos latino-americanos (com alguns de seus gover-
nos) sentem ou sabem que fora de sua dependência o chamado
ainda mais separada,mais isolada do mundo do que já é por
sua posição geográfica --o que fêz eminente geógrafo dizer
sistema interamericano, ou a OZA, é uma casca vazia. Compa-
que com a Aüstrália e Nova Zelândia "jaz a América do Sul
rando-a com outro agrupamento regional, o MCE, preciso, de- literalmente nos confins da terra".: Não é só geograficamente
limitado, em processode evolução,contraditório, vê-se a dife- que ela jaz isolada do mundo. Economicamente, seu isolamento
rença. Os membros do MCE são interdependentesentre si, em- cresce. A participação dela, como já vimos, no comércio do
bora parte dêles tenha também outras lealdades, outra relação
de dependência externa ao sistema, o que o deforma e Ihe retarda mundo tende a restri:agir-sede ano para ano. Quem a expulsa
o desenvolvimento. O neoliberalismo inicial que Ihe serviu dc l James Fairgrieves, Geograpãy a/z'd }rorld Paper. (Ver Staley
basepara criar na prática o grandemercadointerno começaa obra citada,pág. 189.)
264 2Ó5
do mercado?Seuscompetidoresna exportaçãode produtos pri- Quanto à integração da Europa, Napoleão tentou realiza-la
mários (entre os quais se destacamos Estados Unidos) e os e a Alemanha, por duas vêzes, como condição mesma para
que, dieta ou indiretamente? voluntàriamente ou .não? coíbem alcançar o poder imperial mundial que a Inglaterra, os Estados
sua transformação estrutural, dificultam sua industrialização. Unidos, a Fiança já haviam atingido. Com que resultado?Levou
(Também a contribuição negativa dos Estados Unidos é aqui o mundo duas vêzes à guerra, quase numa geraçãoe ela mesma
bastantegrande.Embora seja de bom tom atacar a União So- regressou a UHa situação pré-bismarkiana.
viética toda vez que se criticam os EstadosUnidos -- para
manter a simetria -- cabeobservarnessecontextoque ela é a As ligações puramente continentais são, freqüentemente,
como o demonstrou Staley, muito menos flexíveis, menos cómo-
única entre as grandes potências industriais não cúmplice nesse das, menos utilizáveis que as comunicaçõesextra-continentais,
empêno latino-americano,) quer dizer, marítimas. O importante para a ordem mundial de
O impasse do chamado sistema interamericano é apenas hoje não é a integração, a solidariedade política do bloco "hemis-
mais escandalosodo que as "integrações". continentais da mito- férico", mas a distribuiçãofluídica pêlo mundo de todos os
recursos e bens produzidos na terra. Isso se faz e se vem fazendo
logia geral. Na verdade, os grandes grupos intercontinentais que
se fazem responsáveispela paz e pela ordem no mundo são por até hoje principalmente pelas rotas marítimas e, parcialmente,
definição ligadas por interêssescomu:nsno abordar certos pro- pelas aéreas;são ainda os meios mais "naturais" de ligação e
blemas decisivos. Na base das grandes associaçõesde povos e associação entre zonas as mai-s diversas e afastadas. E também,
na fase anual do mundo, é por essasrotas, sobretudo, que o Ter:
nações que o mundo do impasse atómico pede não há lugar
para pretender-se construir tais grupos de um ponto de vista ceira Mundo se enlaça às grandespistas do desenlacehumano
"natural". continental. Os continentessão cada vez mais uma no planeta.Há, com efeito, nessecomplexototal um hemisfé-
abstraçãosem realidade concreta. Que pode haver de "orgânico rio --- e êste verdadePo{ na acepção plena da palavra -- o
Plemistériosut que selírata de integrar na socied(Meindmtrial
numa limitação de países e Estados por "continentes" quando
suasnecessidades
económicas
não coincidem,ou só muito difi- mover/za. A noção geográfica superada de continente não tem
cilmente, com a necessidadedos outros países do mesmo con- vez nesse processo de integração universal. Os países subdesen-
tinente? E as afinidades culturais, a formação histórica, desde volvidos, os paísescoloniais, os paísessituados na periferia do
mundo, bordejados pelos grandes oceanos, freqüentemente são
quando foram ditadas pelo fato passivo de que se continuem mais ligados economicamenteaos centros comerciais do mundo
pelo mesmo estarãode terra? A chamada "integração continien-
tal" i.aumento encontroujustificativa espontâneano próprio pa Europa, nos Estados Unidos do que entre, por exemplo, o
Brasil e o Peru ou Turquia e Paquistão. Na realidade, as asso-
curso dos acontecimentos históricos e ralissimamentena pró-
ciações económicas entre nações poucas vêzos devem o fenâ-
pria determinaçãogeográfica.Quando isso se dá, na maioria das
vêzes, é conseqiiência da desproporção de um grande poder meng às vizinhançascontinentais. Os Estados Unidos querem
ser "bons vizinhos" de todos os paísesda América Latina, mas
rodeado de podêres de segunda ou terceira ordem. Circunstâncias
são apenas soeríveis "vizinhos" da Argentina ou do Child. Se
políticas excepcionaisque isolaram a América do Sul de fregue- as associações éconâmicas não se fazem necessàriamente em vir-
ses naturais na Europa, transfo].mando-a, num certo momento tude de contigüidadescontinentais, as relações outras, de lín-
da história, em fornecedorade materiaisestratégicosetc., para gua, de etnia, de afinidades espirituais e culturais tampouco são
os EstadosUnidos e em basesaérease navais para que o ini- dependentes dessas continuidades.
migo fosse atacadona África e na Europa, forçaram tal "inte-
gração continental", integração que a cada passo se choca em Os continentes são suprimidos pela facilidade crescente de
iionf[itos desintegrantes
de cu]turas,de língua, de raça, de cos- linhas de comunicação, de circulação de idéias, de propaganda,
tumes, religião, atavismos. . . e de negócios. de mercadoriasbaratas, barcos, aviões. "0 continentalismoé

2ÓÓ 2Ó7
um. mito'.',. co.nclui Staley, "de pouca relação com as possibili-
dades práticas do pós-guerra". A noção de um continejite como
algo.de uma entidadepolítica e económicanatural é uma noção
envelhecida definitivamente. "A mitologia do continentalismo e
a noção de .solidariedade continental sãa mais freqüe:ntemente
aplicadas a duas áreas: a Europa e o assim chamado hemiiféria
ocidental(terras da América do Norte e terras da América do
Sul). Ora, o curioso,observaêle, é que nenhumadessasáreas
é realmente continental. A América do'Sul e a América do Norte
11
são ultramar uma em re.laçãoà outra. Quanto à Europa, se é
continente, arremata, é "por cortesia". Poderíamos acrescentar:
se a América do Norte e a América do Sul são continente. é
por dependênciada última para com a primeira. Reformas
Contra-Revolucionárias
/1 '

2Ó8
L ../ PATO DECiS].vo, realmente, de toda essa época que se
poderia chamar de nazi-rooseveltiana foi a transformação nao
sementepolítica mas ecanâmica.por que pasü)u.o mundo. Njo
se pode compreenderna sua jlssência.e na sua dinâmica o com-
plexo sóci04mnâmico capitalista ocidental..dehoje.sem a cons-
ciência clara e objetivo das transformações. ciciada! .!om a
grandedepressãode 1929-30e o Plano Marshall de 1947. Que
se passou então? O capitalismo liberal, impotente. para vencer
a depressãoe repor em marchao mecanismo
.produtivoe eco-
nómico mundial,' cedeu lugar a regimes transitórios e totalitá-
rios, cujo obscurantismopõlítioo, moral e .cultuml revelava.pro'
fundo retrocesso da própria civilização ocidental. O temível pa-
radoxo foi que, no plano económico e financeiro, .aquêlesregi-
mes quebraram várias ortodoxias intocáveis do capitalismo clás-
sico decadeMe.A época atual provém, em grandeparte, da-
quele paradoxo. Conhecê-lo é indispensável .à .compreensãodos
acontecimentos
e de muitostraços'característicos
de agora.É
o que nos propomos demonstrar neste capítulo.
A mais importante daquelas ortodoxias era a irremovibi-
]idade do padrão ouro como'fundamento sine azia na,z.de todas
as transaçõescomerciais, financeiras do sistema capitalista den-
tro e fora das fronteiras nacionais dos países. Nos Estados
27]
Unidos, Roosevelt quebrou o padrão monetário do dólar, des- Tentando descrever o que entendia por "reforma contra-
ligando-odo ouro, interveionos banco-spara controla-los,lan- revolucionária',. que encheu a época entre as dua-sguerras, es-
çou, segundo a receita keynesiana, vasto programa de obras crevia eu em 1948, com acento polêmico explicável então, mas
públicas em pleno recesso, para absorver o desemprêgo em hoje algofora de tom:
massa,enquantona AlemanhaHitler, sem um tostão em ouro # ''Os Estados Unidos querem restaurar as leis do capitalis-
nos cofres do Tesouro Nacional, aia várias espéciesde marcos, mo =naslente, separando a política da economia, para permitir
controla bancos, põe fábricas em funcionamento,mesmo sem que as fôrças capitalistas encontrem o velho automatismo inicial,
levar em conta sua rentabilidade contábil e milhões de traba- automatismoêsseque lhes dava um movimentopróprio, indi-
lhadores desempregados a abrir e pavimentar estudas para os
futuros exércitos, contestando assim militares e oficiais 'ociosos risca e, depois, contrapuseram os Sovietes à Assembléia Constituinte
É
e dando satisfação aos grandes magnatasdo ferro e do aço, do em virtude de os Sovietes serem "cem mil vêzes mais democráticos
carvão, da indústria química e da eletricidade que o financiaram (Lênin) que o mais democrático dos parlamentos burgueses. A oposi-
e..cuja febril atividade encheria o país de qliartéis, depósitos, ção trotskista era considerada-a ala esquerda porque, entre outras coi-
fábricas, minas, armamentosde toda sorte. A Alemanha sai da sas, reclamava a democracia no partido contra a burocracia do par-
tido. Quanto a alguns dos grupos urra-esquerdistas,é bem conhe-
depressão,apresenta-seforte, com aparênciade próspera. Hitler cido que quasefaziam um fetiche de sua luta contra o burocratismo
fêz reformas, Mussolíni fêz reformas, mas essasreformas tinham nos movimentos operários e revolucionários. Nesse sentido. e da
socialmente, culturalmente, politicamente caráter ahti-histórico e maior jmportãncia? o movimento stalinista, que é a verdadeira apo-
obscurantista: eram o que me permiti, então, chamar de ''refor- teose do burocratismo, não tem similitude com as tendências ultra-
mas contra-revolucio.nárias."I esquerdistas conhecidas do movimento operário. .. A ala direita da
movimento operário, clàssicamente e contemporâneamente, é sua ala
conservadora, sua ala reformista. É essa seção do movimento da clas-
l A propósito dêsseconceito de "reforma contra-revolucionária". Max se operáriaque se situa mais próxima da democraciaburguesa,que
Sc#achtman, marxista americano, tentando, em artigo de 1944, des- pratica a colaboração económica e política com a burguesia, que'se
crever as característicasdas alas e oraçõesde "esquerda"(revolucíoná- confina a si mesma a modestas (crescentemente modestas) reformas
!jas) e de direita (reformistas) dentro do movimento operário socia- do capitalismo. Sendo êsseo aspecto fundamental da ala direita, devia
lista, desde o século XIX até a revolução russa, escrevia: "Quaisquer ser claro que o stalinismo é fundamentalmente diferente de quaisquer
outras. características dos movimentos de esquerda (ou urra-esquerda) outras correntes reformistas e burocracias de que temos conhecimen-
poderão ocorrer a qualquer um ligeiramente informado de sua histó- to no movimento operário".(A left wing of the labor movement?
ria. l:Jma, de extraordinária e decisiva importância, deve ser citada TAe New /nfer/zarfona/, setembro de 1944, Nova lorque.)
aqui. Sem exceção,cada um dêles, em sua luta contra as tendências O movimento stalinista liquidou quaisquer veleidades não só de
à sua direita, se caracterizavapela ênfase na democracia contra a bu- democraciainterna nos partidos e nos sindicatos,como de se permi-
rocracia, nos. direitos e na auto-atividade das massas contra a arregi- tir às massasqualquer impulso espontaneístano sentido de uma ação
mentação e freio das massas. Se a ênfase era em alguns dêles extn- revolucionáriapor parte delas. Todos os movimentos,para serem'le-
mada, não vem ao caso aqui... A característica mesma é que é de- gítimos, tinham que ser organizadose centralizadospelos vértices
cisiva. A democracia social no século XIX era a ala esquerda da po- secretos do Partido, numa negação do principa] lema do marxismo
lítica em virtude de sua luta pelo sufrágio universal contra o sufrágio -- a emancipação dos trabalhadores será obra dos trabalhadores. A
restrito, e de seu trabalho pelo socialismo, como a realização da mais ascensão
da classeoperária,que se fazia em nomedos direitosde-
completa democracia política e económica -- a social-democracia. mocráticos que ela ia conquistando, um a um, numa luta de sacri-
Anarquistas e sindicalistas se distinguiam como uma ala esquerda por f fícios durantemais de um século,deixou de ser sua obra, para o ser
sua ênfase na anão de massa dos trabalhadores contra as manobras de um punhado de especialistase funcionários, de burocratas que em
burocráticas e os processos do oficialismo reformista no parlamento nome dela decidiamde tudo, sem consulta-la.Ao contrário.'misti-
ou nas negociações com empregadores. Luxemburg(Rosa) distin- ficando-a. Eis a essênciadas reformas contra-revolucionárias
da
guia-se como representante da ala esquerda em virtude de sua ênfase época. Eis aí porque fascistas e nazistas puderam organizar partidos
na anão espontânea das massas irrompendo através o conservadoris- de estrutura análoga à dos partidos comunistas e com tais métodos
mo institucionalizado da burocracia reformista. Os bolcheviques con- e instrumentos puderam fazer amplas incursões no seio do movimen-
trapunham a Assembleia Constituinte democrática ao despotismo cza- to operário,com os resultadosque se sabe.
k
272 273
gerente a qualquer outra consideraçãode ordem social e polí- economia capitalista da época era o beco sem saída em que foi
tica, enquanto os governos, aparentementeneutros diante dos dar o sistema de mercad(i, tanto na ordem financeira como co-
negócios,ficariam apenascom as funções de manter a ordem mercial. Todo o problema então consistia em escolherentre não
o garantir a santidadedos contratos comerciais. Isso seria unl '}

r intervir deixando que os milhões de desempregados se acumu-


nei)vitorianismo americano, a proclamar a independênciada laswm, que a$ mercadorias se amontoassem sem escoamento.
política e da economia como uma máxima de comportamento a fim de que o padrãomonetárioe o valor do ouro não sofres-
internacional. Assim como Das conferências comerciais interna- semataque,até que de novo, automàticamente, não se sabe
cionais os representantesamericanosinsistem em que os outros quando, os altos fornos da grande i:ndústria voltam;sem
a fundo.
países removam os obstáculos protecionistas às suas inda-strias, nar e novos compradores fossem achados para os estoques su-
para um intercâmbio livre de produtos, querem restaurar o
ou.ro como supremo regulador dêssecomércio. Detendo, como
detêm, quase o seu monopólio, seguros de uma fomiidável su-
perioridade industrial, querem subordinar de novo as atividades
l petabundantes. de mercadorias, .ou intervir o Estado para dar
trabalho aos desempregados,criar artificialmente merc;dos. es-
timulando a procura, elevando muros protecionistascada'vez
mais altos, subvencionandoas indústrias de exportaçãopara o
económicas do mundo ao automatismo dos mercados.
du/7@ilzg no exterior, . desvalorizando a própria moeda para 'au-
Desprovidos de ouro, com suas economias arruina- mentar a concorrência externa.
das, é evidente que nem a Áustria nem o Brasil podem inverter De um lado, se tr3tava de manter o valor do mercadoin-
capitais nos Estados Unidos. Nenhum govêrno teria sequer a ternacional do dinheiro, de modo a pemiitir o intercâmbio livre
ocasiãopara intervir na vida dos outros povos a fim de garantir dos produtos quando houvessepossibilidade, e do outro, cor-
as inversões de -seuscapitalistas. SÓ os Estados Unidos teriam tando as amarrasdas e.conomias
nacionaisrespectivas
'dêsse
êsseprivilégio. Êsse simples privilégio daria, assim, aos Estados mesmo mercado internacional, se tratava de sair das dificuldades
Unida)s,o ilireito de intervir por tôda parte, não em nome dos por conta própria, independentemente de quaisquer outras con-
interêsses de seus empreendedor.es,industriais e capitalistas, mas siderações financeiras ou de doutrinarismo liberal económico .
em nome da santidade jurídica das contratos e tratados comer- Os homens.que até então geriam a economia mundial, os gran-
ciais, toda vez que um choque do interêssessurgisseentre os des banqueiros,perderam para os novos partidários do inter-
países importador:esde capitais americanos e os homens de ne- vencionismo.Em vez de participante, em pé de igualdade teó-
gócios privados, donos dêssescapitais. Repetir-se-ia a mesma rica no mercado intemacional, cada país' tratou'de fechar-se
situaçãoeconómica
e políticado séculoXIX e teria razãoo para. dentro de.si mesmo. Daí nasceram as autarquias nacionalis-
economistae sociólogo Kart Polany quando, ao estudar a as- tas da época. A solução fascistas de então consistiu precisamen-
cen.são e o declínio da economia do mercado, verificava: 'Isto te em deformara economiado mercadolivre, masao preço da
explica o fato quase inacreditável de que uma civilização esti- extirpação das instituições democráticas. Os fascistas' criaram
vesse sendo desãoçada pela ação cega de instituições sem alma,
que tinham por objetivo único o crescimentoautomático da ri- " .solução fascista do impasse em que foi dar o capitalismo libe-
queza material.' Por isso mesmo,. tinha êle .razão ainda .quando ral pode ser descrita como uma reforma da economia de mercado ao
dizia,a propósitoda criseeconómica
de 1929:.'0 eclipsede preço da .extirpação de todas as instituições democráticas. tanto no
Wall' Strêet 'na década de trinta -salvou os Estados Unidos de reino da indústria como da. política. O sistemaeconómico'que estava
em perigo dç dissolução seria assim revitalizado, enquanto os próprios
uma catástrofe social do tipo conthontal."i povos eram sujeitos à reeducação»visando a desnaturalizar o indivíduo
Em 1928, com o início da grande crise que desembocou e tarda-lo incapaz de funcionar como uma unidade responsável do corpo
na Segundabrande Guerra mundial, o traço mais evidente da po!!taco. Essa reeducação, que compreendia os dogmas de uma religião
política que negavaa fraternidade'do homem, sob todas as suasfor.
l T;ze areal rralzs/armário/z, barrar & Rinehart, Inc., Nova porque,
mas! era realizada por um ato de conversão em massa, imposta aos
recalcitrantes por métodos científicos de tortura". (Kart' Polany, obra
1944, pág. 229. citada,pág. 237.)
274 27S
/

as moedas dirigidas, iate.rvieramno mercado de trabalho para acabadanessesentidoé a da própria União Soviética.tA ]ngla-
impedir as greves, controlaram os bancos e, finalmente, para re- terra trabalhista é também uma formação nova que seguea mes-
por em marcha a economia, entregaram-se ao surto armamentis- ma tendência. Mas onde o favor decisivo se faz se.ntircom força
ta que constituiu o grande mercado para as .suas forças produ- particular, é na participação independente e livre, no processo
tivas, inativas até então por falta de escoadouros económico, da classe trabalhadora. Os sindicatos livres e autó-
Essa foi a reforma contra-revolucionária dos países fascis- nomos em face do Estado, as cooperativas livres e autónomas em
tas totalitários. Os paísessob êsseregime não tinham os recursos face do Estado, os clubes operários livres e autónomos, os co-
mitês de emprêsa, as organizações culturais e os partidos políti-
e privilégios com que contavam no mercado mundial os grandes
cos livres e autónomos, asseguram a democracia. E por esta forma
países imperialistas democráticos -- a Grã-Bretanha e os Esta-
dos Unidos. Êssesúltimos puderam manter a democraciainter- o Estado que nacionaliza as indústrias fundamentais é constan-
na. . . porque tinham possibilidade de, utilizando-se e exploran- temente pasto em cheque e sua tendência absorvente é assim
do o acesso mais fácil às zonas de matérias-primas e os recursos mantida à distância. E=nquantoa autonomia e liberdade de todas
e rendas provenientes das inversõesde seus capitais no exterior, essas organizações puder se conservar . intacta, haverá -sempre
manter em relativo nível de vida as ma-asas trabalhadorase as esperançasde que a libertação das forças produtivas e econó-
classesmédias, sem necessidadede instituir um regime de dieta micas britânicas do automatismo do mercado e das i:njunçõesdas
e de restrições severo demais para elas. finanças não sujeitarão o povo a um regime totalitário. De modo
que, diferentemente do que -se passou na Alemanha, a demo-
No fundo, uma grande 'revolução' económica se estava ope- cracia não é sacrificada ao Moloch do Estado nacional. E en-
rando: a aboliçãoda controleda moeda pelo mercado,com a quanto esta subsistir, o caminho estará livre para uma evolução
introduçãoda 'finança funcional', isto é, a direção das inver- socialista do capitalismo inglês.
sões e a regulamentação da taxa de juros de depósitos bancários. Na Rússia, deu-se uma evolução no sentido da totalitariza-
O desaparecimento do mecanismo automático do padrão ouro ção da economiae da sociedade.A Rússia começoua sua evo-
levou ao isolamento das economias nacionais e à intervenção
luçãoseparando-se
da Europapara salvar-sea si mesma;por
crescentedo Estado para substituir o automatismo daquele fator isso mesmo, desde o início ela estabeleceu.o monopólio do co-
regulador. Os gi.andes problemas da. organização . industrial se mércio exterior e das indústrias-chaves.
A própria depressãoque
vão. assim,tornando independe:nte-s
de considerações
de ordem se seguiu à Primeira Grande Guerra levou a Rússia a isolar-se
puramente financeira. E êste fato colocou em ordem do dia o cada vez mais. Exportadora que era de produtos agrícola-s,os
problemado socialismo,isto é, uma economia.organizada
para mercados mundiais deixavam de ser escoadouros para êstes em
servir o homem, independentemente de considerações não sò-
virtude da depressãoem que caíra a economia ocidental. Ela não
mente financeirascomo de fronteiras.Ou isto, ou uma econo-
mia limitada ao Estado nacional,fundida com o Estado e hostil l Hoje, depoisda morte de Stalin e da derrocadado sistemastalinis-
à colaboração internacional, comunicando-se com o mundo ex- ta, a IJnião Soviéticase achaem processorevisionista,visandoa uma
terior como se comunicam por cima dos muros de uma fortaleza recuperação democrática, através reformas nas estruturas econâmícas,
situados e sitiantes. para maior eficiência produtiva de seus trustes industriais e através
uma descentralização no aparelho produtivo e burocrático supercen-
Essas economias, que prolificaram até a Segunda Grande tralizado e um refinamento mais alto dos métodos e finalidades do
Guerra, tiveram a sua expressão-maisacabadasob o fascismo planejamento económico global. Já estamos a mil léguas das reformas
italiano e o nacional-socialismoalemão.Não foram, contudo, li- contra-revolucionárias, obscurantistas da era staliniana, como, por
exemplo, o ifaÊa/zovísmo.Se as novas reformas forem levadas a bom
quidadas com a guerra. Deram ligar a formações .idênticas, em- têrmo e com todas as implicaçõesdelas decorrentes,
uma era nova
bora em graus de acabamentodiferentes e de origens às vêzes abrir-se-á para o povo russo e para ó mundo -- a era realmente do
opostas.hoje temos, sob outras formas políticas e com outra socialismo.A longa e dolorosa experiênciarussa terá enfim mostrado
ideologia, silitemas económicos semelhantes. A economia mais todo o seu alcance.

27Ó 277
pede, assim, trocar os.produtos agrícolaspor maquinismos.e ob- o ritmo de sua industrialização,a expropriar de novo os cam-
jetos manufaturados?de modo a equilibrar. as necessidadesde seu ponesesa quem a revolução havia dado a terra, foi.çando a cole-
povo: com as exigências
de sua industrialização.
Foi forçada, tivização. O Estado tornou-se o senhor de todos os meios de
também, a entrar no caminho da auto-suficiência. A classe tra- produção. Nesta base, uma nova casta dominante surgiu, ao
balhadora russa que teve forças para derrubar o czarismo, não mesmo tempo que o mercado livre de trabalho era suprimido, os
as teve, entretanto, para fazer funcionar o novo regime de modo sindicatos perdendo qualquer possibilidade de lutar por aumento
democrático. As contradições políticas, por outro lado, entre a de saláriose melhoria de condiçõesde vida. Todas as fobias
Rússia e os países imperialistas mundiais, levaram-na a acelerar de organizaçãoeconómica e política perderam a sua autonomia,
integradasno aparelho estatal. Não existe ali nenhum contra-
l L Trotski, em 1932,em sua campanhapela frente única da social- pêso de controle democrático. O Estado dispõe ao mesmo tempo
democracia alemã com o partido comunista alemão para barrar o ca- da totalidade do poder económico e do poder político. A con-se
minho ao poder do nazismo, fazia proposição extremamente audaciosa qüência é que, se o automatismo do mercado foi perdido, Dem
e revolucionária da colaboração germana-soviética, isto é, entre a URSS por isso a economia deixou de se basear no sobretrabalho e na
c uma Alemanha que, ao invés de ter sido nazificada, teria sido socia- exploração dêsse sobretrabalho em favor do Estado. As diferen-
lizada. Não se trata, dizia êle, de começarpela primeira vez uma cons-
trução socialistana Alemanha,mas de "unir as forças produtivas da ciações sociais ah aumentam em vez de diminuir. A exploração
Alemanha, a sua cultura, o seu gênio técnico e organizatório, à cons- de trabalhochegoua um ponto em que foi instituído o traba-
trução socialista que se vem processandona IJnião Soviética". . . "ligar lho forçado como fator permanente e indispensável ao funcio-
à construção socialista da urss, às suas enormes experiênciase valio- namento do próprio mecanismo económico. A opressão econó-
sas realizações,as tarefas da revolução proletária na Alemanha. : . Os mica dá origem ali, como em toda parte, à opressãopolítica.
projetos incoerentes e covardes de capitalismo de Estado da social-de-
moaacia precisam ser combatidoscom um plano geral para a cons- A opressão política pennite que se desenvolva livremente a
trução socialista da URSS e da Alemanha, conjuntamente". : .. "que !e opressão económica.
tornasse objeto de estudo das organizações da classe operária alemã, Bukharin, o grande teórico que Stalin imolou, como toda
e as forças progressivas da sociedade, técnicos, estatísticos,. economis- a velha guarda de Lênin, aos pés do seu próprio altar, escrevia,
tas". Com o plano se poderia estabelecer "uma ponte que ultrapassasse inspirando-seem Hilferding, no curso da Primeira Guerra Mun-
as fronteiras nacionais". A idéia estratégica era utilizar dezenas e cen-
tenas de fábricas importantes paralisadaspela depressãona Alemanha
dial: "Um poderosoEstadomilitar é o último triunfo na luta das
para ajudar a completar o segunda plano .$üinqüenal soviético. "0 potências. Assim a capacidade competiiva no mercado mundial
socialismo na Alemanha", escrevia Trotski, "teria a ver-se com uma depende da força e da coesão da nação, de seus recursos finan-
economiacujas forças produtivassó trabalham pela metade. A regu- ceiros e militares, uma unidade económica e nacional se bas-
larizaçãoda economiateria, assim,desdeo comêço,50% de reservas. tando a si mesma, a expandir sem limites seu poder imenso, até
Isto basta amplamente para compensar as perdas provenientes das apal-
padelas do comêço, para amortecer os choques brutos do Dava. sistema governaro mundo num império mundial. Eis o id-ealcom quc
e para garanti-lo contra o declínioprovisório das.forças produtivas.Na sonhao capital financeiro'.xHilferding, na sua própria obra,
linguagem convencional dos números, isto significa .que, se de uma arremata: 'Os conflitos de classe desapareceram, cessaram, a
economia capitalista a 100%oa revolução socialista tivesse no. comêço serviço do todo. Em lugar da luta de classes sem saída, perigosa
de descer talvez a um nível de 75qo e mesmo de 50%o,a revolução do para. os possuidores, vem a luta comum de toda a Nação por
proletariado, que parte de uma economia a 50%, não. pode senão ele um ideal de grandeza nacional'.z
var-seao nível de 75% e de 100%o,para ter em seguidaum surto in-
comparável em relação a tudo o que já se conheceu no passado". (Re- Foi essaa ideologiado nacional-socialismo
de Hitler e é a
voZzzçãoe Contra-revolziçãa /za .4Zema/zha, Ediçf)es l.Jnidas, . 1933, págs. que predomina na Rússia stalinista (o chauvinismo grão-russo
321-323 e 420-421.) A colaboração germana-soviética não veio, mas veio
a vitória de Hitler que impôs sua reforma contra-revolucionário, absor- l N. Bukharin, Z'Ecanamíe mondfale e/ Z'/mpéríalíxnz:e,
Ed . Sociales
vendo o desemprego'em massa,reorganizando a indústria, rearmando a Internationales,Paris, 1928,pág. . 107.
Alemanha para desencadear a guerrae, depois de ter feito um pacto com 2 Rudolf Hilferding, l)as FÍ/zanzkapíraZ,
Verlag der Wiener Volksbuch-
Stalin, invadir e espezinhar a Rússia. handlung, Zweite Auflage, Wien, 1920, pág. 458.

278 279
de grande potência, os ideais nacionais russos são exaltados; perialistas, reveladosquando, aos primeiros dias da revolução
lvã a Temívelpassaa ser lvã o Grande,e a grandezanacional bolchevique vitoriosa, b Govêrno soviético mandou publicar os
substitui os ideais socialistas) . . . Ao findar da última guerra, tratados interimperialistas e denunciou as cláusulas secretas.En-
a Rússiade Stalin se revela como a continuadorada política im- tre estas, a mais famosa era a promessa pelas potências aliadas
perialista dos czares. O mesmo expansionismo em defesa de de entregarConstantinoplaao Czar em Ã4oscou.Na basedes-
puros ''interêssesnacionais" a impele. O programa de paz do sas denúncias,o Govêrno soviético ajudou a luta antiimperialista
Govêrno russo atual não é aquela velha paz humana 'sem ane- de Kemal Pachána Turquia contra'o imperialismobritânico e
xações nem indenizações, nem diplomacia secreta' dos primeiros com êle fêz um tratado de amizadee não-abres-são
que, em 19
anos da revolução, mas uma paz de rapina, que açambarca os de março de 1945, era unilateralmente denunciado pelo Govêrno
países vizinhos, que carrega com as suas fábricas, desmonta as soviético. Em compensação,êste repunha em vigor a velha pre-
suas máquinas, desapropria as indústrias para leva-las para den- tensão imperialista russa de ocupar os Dardanelos e Constan-
tro do seupaís, ou para forçar a organizaçãode sociedadesmis- tinopla, ou lstambul, segundoa designaçãodada pela revolu-
tas nas quais o Estado imperial russo fica com a parte do leão."a ção nacionalistade Kemal Atartuk. (Ver ainda a obra citada
Ainda quanto aos objetivos da guena, a União Soviética de Louis Fi-sher.)
seguiu então à risca as tradiçõe-scla velha Rússia czarista, reto-
mando suas ambições imperialistas, objeto inclusive de cláusu-
las secretasem convênios, tratados com as outras potências im- Sob tais equívocos tremendos e contradições, o mundo va-
rou os anos de depressão,os anos da SegundaGrande Guerra e
3 Mário Pedrosa, Ox SocfaZâsfai e a /// Gzzerra ]b4zz/zdfaZ,
Rio, 1948. nãa conseguiu alcançar a paz. Hitler fai destroçado; os campos de
Louis Fisher dá a essa evolução nacionalista do stalinismo uma série concentração nazista-sforam desfeitos. Mas a barbaria científi-
de indicaçõesque ao seu tempo for?M muito comentadasna imprensa
mundial e de esquerda."A revoluçãorompeu com o passadoe com a fla inaugurada pelo nazismo e pelo stalinismo não desapareceu.
tradição. . . Stalin decidiu pâr um fim à guerra de classe.. . Tendo sus- Foi, ao contrário, institucionalizada pelos Estados IJnidos com
pendido a guerra de classecontra o campesinatoe os gerentes.. . Stalin a entronização da bomba atómica e a destruição experimental de
escolhia o nacionalismo. . . decidindo do mesmo modo introduzir o bol-
chevismona história russa. Como um primeiro passo,as figuras do pas- Hiroshima e Nagasaki. Apoiado nela, o imperialismo america-
sado russo, a quem os velhos bolcheviques rejeitavam e desprezavam, no entremeia a guerra fria como sucedâneoda guerra e da paz.
eram tiradas da poeira da história e redecoradascomo ídolos soviéti- Aquela Ihe é necessáriapara justificação de umâ política de
cos. . . A Rússia tinha outros heróis: Pugachev e Stenka Ríazin, por ofensiva e cruzada anticomunista na exterior. As guerras fria
exemplo,que dirigiram infelizes levantescamponeses
contra os czares. e atómica são os componentes de uma nova estratégiamundial.
Stalin, porém, não precisavamais de rebeldes.
. . O Kremlin lançou Os Estados Unidos transformaram-se naquele "poderoso Estado
um lençol de esquecimento sabre Pugachev, Stenka Riazin e outros
não-conformistas. .. A campanha pelo nacionalismo, que começou em militar" profetizado por Bukharin há quarenta anos, bastando-se
1934 como um tímido grito do Kremlin, torna-seagora um barulho a si mesmo, a expandir sem limites seu poder imenso, até gover-
incessante,ensurdecedor.
.. nar o mundo num império mundial.
Em 1939, numa população de 179 milhões, 58qo eram russos...
A revolução bolchevique, no entanto, fêz todas as raças iguais; nenhu- Criou-se, áo lado do impasse atâmioo, um impassepolítico
ma era superiorou inferior". Stalin acreditavaque "sem a lealdade entre os vitoriosos da grande guerra. A inatualidade dos diri-
e apoio dos russos,maioria da população, a União Soviética não podia gentes soviéticos em relação ao mundo ociden-tal no pós-guerra
ganhar a guerra.. . Também Stalin não podia tornar-se o pai de seu era ainda maior que a do Czar Alexandre quando, vencido Na-
país, êle não podia glorificar o passado da Rússia enquanto negava poleão, passeoupela Europa a sua empáfia e sua ignorância dos
aos russos o mesmo papel primordial que desempenharam no passa-
do". (L. Fisher, Stalin, págs. 145-159). homens e das coisas daquele Ocidente tão prestigioso e longín-
Foi nessaépocaque Stalinsepromoveua marechal,para ficar igual quo, fascínio e repulsa da Santa Rússia dos Czares. As expe-
em pasto aos chefes militares e, depois, a generalíssimo. riências políticas, sociais e económicas tão profundas e tão de-
280 28]
cisivas por que passaramos povos europeusnão sòmentenos capitalismo; êste era, com efeito, capaz de Dava surto de desen-
anos de guerra (naturalmente)mas nos anos anterioresentro volvimen.to de sua-sforças produtivas, por uma notável transfor-
a grandedepressãoe a grandeguerranão foram não direi assi- mação de suas estruturas. O mundo está pagando caro essa im-
miladas, mas sequer estudadas e muito menos compreendidas. potência teórica.
Nos partidos comunista-simperavam o monolitismo sáfaro Não há, assim,por que se admirar se se dá com um mundo
e, no fundo, retrógrado do stalinismo, a mais terrível estreiteza na mais formidável revolução tecnológica e mesmo científica de
teórica e uma combinação do oportunismo com um sectarismo que há memória -- mas engolfado ainda num primarismo polí-
organizatório do mais completo feitio totalitário. A União So- tico positivamenteindecente.O Sr. Adolph Berle, no seulivro
viética fazia então uma política de feroz realismo nacional russo TAe Capíía[[sf levo/u/ioiz ín //ze XX Cerzfüry, livro apo]ogético
nos paísesocupados
(amigosou inimigos)e no jogo com as do sistema económico da grande corporação, que discutiremos
outras grandes potências de um oportunismo realmente digno longamenteem outra parte dêste trabalho, mostrava o extremo
delas. Os socialistas (ou comunistas) restantes pelo mundo, anacronismodas doutrinas políticas em conflito. Os comunistas,
quando lúcidos, eram impotentes;quando carreando ainda po- dizia êle, atacamo capitalismodo séculoXX com teorias quõ
derosas massastrabalhadoras atrás dêles, não tinham indepen- culminam com as de Marx em 1870; mas em respostaos defen-
dência em face de seus resp-Cativosgovernos nacionais e ainda sores do capitalismo recorrem às idéias de Adam Smith em 1770.
mais rotineiros e semprincípios, DOseu oportunismo visceral, que No entanto, se de ambos os lados tivesse sido estudado,
os stalinistas. Daí resultou a impotência teórica generalizada no mais de perto e com mais isenção,o que se passouno campo
mundo imenso do socialismo numa prática, conseqüentemente, económico e financeiro nos anos que precederam a guerra e
inconsistente, contraditória, do mais baixo emphismo. no curso dela, sobretudonos paísesnazi-fascistase nos próprios
Desde então o mundo político passou a viver ao deus-dará. Estados Unidos, os e-strategistasdo anticomunismo e do anti-
Os primeiros a reaprumarem-seforam ainda os Estados Unidos socialismo estariam com suas teorias muito mais a par da rea-
(graçasà formidáve[acumu]ação de recua-sos,
de ouro que lhes lidade viva de sua época e o mundo talvez não estivessevivendo
deram o monopólio virtual das riquezas num mundo empobre- agora uma era política da mais completa confusão. É preciso,
cido e exau-sto). Conseguiram, ao reconverter sua economia às porém, reconhecerque o saldo negativo do-ssocialistas,princi-
tarefasprodutivas para a paz, guardar ainda controles dos tem- palmente dos comunistas russos ou chineses, foi bem maior que
pos de guerra, sobretudo as alavancasdo comando financeiro, o do lado capitalista.Toda uma equipede economistas
ociden-
além de uma máquina estatal ainda participante nas atividades tais, principalmente norte-americanos e inglêses, fêz valioso
económicas,como produtora e consumidora(a nova energia esforço para fazer da velha economia acadêmica uma ciência
nuclear, etc.). Nessa base mista para a paz e para a guerra, de- viva, capaz de corresponder em parte às modificações formidáveis
linearam-seas estruturasdo um novo capitalismo,um "neocapi- surgidas no capitalismo ocidental e, principalmente, americano.
talismo" que ia servir de modêlo aos outros países industrializa- As teorias e doutrinas podem ser as mais negras,as mais
dos, ao trabalharem na sua recuperaçãoeconómica.Quanto à reacionârias e cruéi-sno campo social e económico e, no entanto,
União Soviética, reparando suas terríveis perdas de gente, de da:prática que em nome delas se exercita podem resultar coisas
equipamentose riquezas DOcurso da guerra, às custas em parte diferentes, instrumentos úteis de técnicas êconâmicas. financei-
de um processo de acumulação pi.imitava às expensas dos paí- ras ou sociaiscom possibilidades,posteriormente,em outro con-
ses europeus ocupados (amigos e inimigas) retomava sua política texto, de servir até mesmo à causa do progresso. Nesse sentida,
de intensificação da indústria pesada, te-fitando aqui e acolá con- emi=nente economista de origem alemã, êle mesmo vítima da
quistar novas posições no exterior, na base da mesma velha barbárie hit[eriana, o professor Otto Nathan, num lúcido livro
estratégia de antes da guerra e de velhas formulações teóricas sabre T/zeNazi Economíc Sysfem (Duke University Press, ])urk-
num mundo que assistia ao desmentida mais acabado às pers- ham, N.C. , 1944) escrevia,com muito propósito: "Nosso hor-
pectivas socialistas, comunistas, marxistas quanto ao futuro do ror e indignação às insuperáveis brutalidades do nazismo, nos-sa

282 283
completa rejeição de tudo aquilo que representa, não devia obs- pleno emprêgoe a disposiçãodo Govêrno em subsidiar os pro-
curecer a possível importância das experiênciaseconómicasle-
vadas a efeito sob os auspícios nasci-stas,experiências que podem
dutoressubmarginaísfaziam a lucratividadede sua emprêsamui-
to mais segurado que nunca fará antes. O's nazistasgostavam
adquirir novos vaiõres e stgnüficaçãonuma atmosfera política
di/erenfe. Num tempo em que, na maioria dos países, a necessi- muito de chamar a atenção para a s'egurançaque haviam trazido
dade de intervenção nos negócios económicos é tão distinta- ao povo alemão. Enquanto se tratar de aspectoseconómicos, há
mente sentida por muitos e tão acerbamentecombatida por ou- que admitir que, até segunda ordem, preparaçõesfrenéticas para
tros, uma compreensãocompleta de experiênciaque o fascismo a guerra tornaram o empreendedor mais seguro e o trabalhador
alemão teve com o planejamentopode provar ser instrutiva. mais garantido quanto ao emprêgo permanente e à renda. Se-
Os nazis. . . mantinham a instituição da propriedade privada gurança, porém, tem largas conotações. Onde a segurança po-
com muitos de seusantigosdireitos e privilégios. A propriedade, lítica foi suprimida, onde todo homem ou mulher é sujeito à falta
por exemplo, continuou a ser uma fonte de rendas grandes e não de lei e aos caprichosde uma ditadura fascistabrutal, os valores
produzidas pelo próprio trabalho. A propriedade, porém, não na vida dos homens mudaram completamente. Quando o último
mais carregava consigo o direito discricionário de interferir no resquício de liberdade pessoal e decência humana desapareceu,
torna-se uma farsa falar de ''segurança".i
processoprodutivo. O lucra privado continuou a existir como um
dos importantes títulos à renda nacional. O motivo do lucro e É o trecho acima a última parte de uma descrição adequada
a competição deixaram, no entanto, de preencher as funções con- precisamentedo caráter "contra-revolucionário" das reformas de
fiadas a e]as peia capitalismo tradicional. . . Em lugar do anti- então. Pràticamente, todas as reformas daquela época, pelo me-
DOSna Europa continental, tiveram êssecaráter contra-revolucio-
go papel na produçãoe no processode investimentoêles agora
funcionavam primeiramente como energéticos para estimular os nário. Ainda em capítulo anterior da mesma obra, Nathan des-
homens de negócio a se empenharema melhorar a produtivida- creve,em excelentes têrmos,a transformaçãodo sfa/zzsdo ope-
rário alemão em partícula sem raízes, anancado que foi de seu
de de suas emprêsas. Todos êssesdesenvolvimentos significavam
proprio contexto social e submetido a uma ''integração" num
que o papel do empreendedorna economia mudara. O empreen-
dedor audacioso do século XIX que arriscava seu próprio ca- todo de que só os nazistas conheciam o mecanismo, a significa-
pital na procura de altos lucrosjá e-stavaa caminhodo capita- ção e a finalidade. O operário deixava de ser operário da fá-
lismo altamente "organizado" da Alemanha pré-nazista. O fas-
brica, deixavade ser socialista,comunistaou democl.ata,para
ser alemão, membro da raça superior e força do trabalho, a ser-
cismo alemão o eliminou completamentee, em seu lugar, colo-
viço da produtividadeem benefício do grande todo nacional-so-
cou um empreendedor que podia exercer iniciativa e acumular
riqu'eza,mas era compelido a operar estritamentedentro das limi- cialista alemão. Assim -sedissolvia o "proletariado'' como classe
tações de um determinado programa de atividade económica do e se estabelecia o contrate do operariado alemão, e isto, para
todos os burgueses"progressistas"do mundo, era o que tinha
Govêrno. 'As emprêsasprivadas', declarava uma publicação importância.
gemi-oficial em 1937, 'se tornaram trustes públicos. O Estado Não nos furtamos ao prazer de citar essapassagemsobre-
é, para todos os fins práticos, um sócio em tôda emprêsaale-
modo ilustrativa de Otto Nathan: ''Tão cedo (o regime nazista)
mã. . . Quando a emprêsaé um truste público, sua sobrevivên- assumiu o controle, liquidou q.ualquer vestígio de ação coletiva
cia e a lucratividade do capital investido se tornam questões de independente pelo trabalho. A rep.rebentaçãotrabalhista foi eli-
interês-sepúblico.'i minada. Os sindicatos foram destruídos. O direito de greve abo-
Se, continuava o mesmo autor, o empreendedornazista não lido. O contratocolotivo e a vastamaquinariapara soluçãodos
podia investir livremente,era compensadopelo fato de que o conflitos trabalhistas foram suspensos.Como substituto para os
sindicatos, os nazistas impuseram a Frente Alemã do Trabalho,
l Der Dezitsclte Votkwirtschaft XI, 1937 The Nazi Economia Sys.
fem, págs. 366-368. l Obra citada,pág. 368
284 285
uma organizaçãodominadapelo partido, de todos os homens e tas. . . compreendiam que seus objetivos finais precisavam de
mulheres do país que executavam 'trabalho humano\ tanto de trabalhadores com boa saúde e, se possível, com uma boa mo-
empregadores como de empregados. Salários, ordenados, con- ral. Embora não permitissem interferência nas instituiçõesfun-
dições operárias, prèviamente determinados pelo poder de bar- damentaisque regiam as relaçõesindustriais, embora não tole-
ganhados vários negociadores,agora eram fixados pelos zrzzi/ei rassem a aiividade de organições operárias independentes,nãa
do trabalho, nomeados pelo Govêrno e de cujas deck-sõesDão he-sitavam em cortejar os trabalhadoresde muitas outras ma-
neiras. . . Tem-s-eüisinuado que o primeiro objetivo da política
havia apelo. Com a passagemdo tempo os controles govema-
mentais aumentaram,o trabalho foi perdendo cada vez mais sua trabalhista nazista era uma redução no padrão de vida do tra-
mobilidadee a completaarregime-ntação foi posta na ordem do balhador. É, no entanto, superficial supor.que a abolição da
ação coletiva independente do trabalho deve necessàriamente ser
dia. Os operários se tornaram autómatos no serviço de um Es-
tado militar, um Estado que dita o tipo de trabalho, o lugar do acompanhada por uma queda na renda real dos trabalhadoBS,
trabalho. as horas de trabalho e a ronda do trabalho. Na que exclui qualquer aumento nessarenda. O govêrno nazisla
éra motivado por consideraçõesmais complexas. A chave para
AJemanha pré-nazista uma legislação social democràticamente a-saçõesdos iiazistasera um conflito de ideologiae propósito
estabelecida previa o operário de instituições para sua pro- entro o movimento sindical e o nazismo, conflito tão funda-
teção contra a exploraçãodo trabalho, para pmtegê-lo co- mental que tornava fora de questão qualquer compromisso.Os
moum ser humano contra o mesmo mecanismo do sistema nazistas 'estavam determinados a alterar a distribuição da renda
de mercado livre. Tal legislação representava uma vitória nacionalvisando uma menor partilha para o proletariado. Essa
da atividade coletiva dos trabalhadores que tinha suas raí- alteração preenchia pelo menos duas funções. Significava que
zes na liberdade política do proletariado. O operário como uma percentagemmenor da renda nacional seria disponível para
um indivíduo, com direitos ta-nto como responsabili.dados, o consumo, diminuindo assim a pressão sabre bens de consuma
podia unir-se com seus companheiros de trabalho para exer- e uma maior facilidade para a acumulação de fundos para capi-
cer pressão sabre os representantes eleitos. Podia reclamar o tais de investimento. . . Não se podia esperar que os grupos sin-
controle social e em certa medida influenciar sua direção. Sob o dicais independentesfossem assinar sua sentença de morte, ou
regime nazista a ação independente de grupo era proibida. O abrir mão do que consideravamuma justa partilha da renda
operário era um membro de organizaçõessabre as quais não ti- nacional. . . A visão dêles era uma vida melhor para os ü'aba-
nha a menor influência, nem direitos. Dr. Ley, o chefe da Frente ]hadores, a ser alcançada mediante uma mudança na distribui-
Alemã do Trabalho, chamou os operários de "soldados do tra- ção da renda nacional em favor do trabalho e a expensasdo
balho". .. Hitler definiu a posição dos trabalhadores assim: capital. Cada aumento na força do trabalho organizado o colo-
'SÓhá um direito Destacomunidade,o direito que resulta da ob- cava em posição mais vantajosa para alcançar seusfins e amea-
servânciade deveresque sãoprescritosa cadaindivíduo'. Assim çava os lucros marginais dos empregadoresindividuais e do ca-
que um trabalhador aceitava um emprêgo com um empresário, pital como um todo. Do ponto de vista nazi-stanão havia, por
dizia-se ter sido criada uma ''relação de comunidade". . . des- conseguinte, outra alternativa senão acabar com a independên-
crita como ''relaçãode trabalhobaseadana lealdade,na honra cia do trabalho".l
e nas obrigaçõespara as quais o trabalhador faz uso de sua capa- Poder dispor da renda nacional, decidindo a seu talante da
cidade de trabalho a serviço do empregador".. . (Os operá- parte nela do ietor do trabalho, é o ideal de todo capitalista ou
rios) não sãomais livres para exercerpressãoaberta a fim de l Nathan ainda mostra, em nota, que várias atividadese instituições
melhorar suas circunstâncias. Têm de aceitar as tarefas e re- nazistas "realmente beneficiaram o trabalho". No tope dessa lista es-
muneração que lhos são dadas.Não há apelo, nem oportunidade tava a "Força pela Alegria", "da qual muitas centenas de milhares
para procurar modifica-las. Isso não era necessàriamente
acom- de trabalhadores desfrutavam grande satisfação".(Obra citada, págs.
panhado de deterioração nas condições de trabalho . . . Os nazis- 171-175

28Ó 287
patrão. É o que pedem, hoje, as grande! corporações. americanas, isso vem do arsenal totalitário das reformas contra-revolucioná-
êm sua luta constante co-nora o trabalho organizado. Os seus rias. As categorias sociais desaparecem, o homem é atomizado;
panegiristas também falam, a propósito, em substituição ao po- é o ideal da democracia, da boa, isto é, representativa.Êsse ideal
foi criado pelo fascismo. É Q que impera nos Estados Unidos .
Zler de barganha independente do movimento sindical, de uma
"relação comunitária" de emprêsa,como os nazistasqueriam. # Nos Estados Unidos, o mecanismo da produção em massa
Também é hoje instituição generalizada nas "democracias dc do neocapitali-smocriou uma suprema categoria social, medida
massa" a organização de similares da "Força pela Alegria". Dêsse pelo maior número de bens duráveis que possui um cidadão.A
conjunto de idéias se faz a substânciadas "reformas contra- classificaçãodo homemna sociedadetende a desligar-sede seu
revolucionárias". trabalho, de sua função na produção para caracterizar-se pelo
f grau de seu consumo. A circularidade social de que tanto se or-
Sob o regime das reformas contra-revolucionáriasinstitu-
cionalizadas, inclusive nos países democráticos ocidentais,x a efi-
gulha a civilizaçãoamericanaé tanto maior quantomaior a
capacidade consumidora em bens de prestígio do cidadão. O au-
ciência produtiva aumentou, a racionalidade -económicacresceu,a
cultura chegou às "massas", mas tudo em detrimento da homem, tomóvel é provàvelmente o grande fator da circularidade. A pro-
do homem com os seus fins e aspirações contraditórias, substi-
dução em massaserve ao princípio neocapitalistade que o ho-
mem privado, o homem particular deve estar assentadoná Casa
tuídos êssespor jornadas de trabalho mais curtas mas ülfinita- Branca, no Capitólio ou na Suprema Carte e daí para baixo presi-
mente mais intensase um dia a dia cada vez mais cheio de mata-
dir todas as instituições am-tricanas,l)úblicas ou não. Vem daí a
tempos, distrações e divertimentos organizados, sistemas de in- capacidadeda civilização americana de institucionalizar todas as
formações crescentes em quantidade e relativa diminuição do
do valor, propagandadas vantagensda melhor democracia,da atividades. Ao fabricar em massa as coisas mais espontâneas ou
casuais,por definição artesanaisou da fazer manual, são institu-
melhor cerveja, do melhor calista, do melhor negócio, da me-
lhor igreja, do melhor cinema,circo ou jogo, do melhor político, cionalizadas,
comoa torta, a maionese,
a pipoca,o sorvete,o
do melhor campeão, do melhor govêi.no, do melhor trabalha- brinquedo, a gravata, o bonde, o berimbau, o saxofone, a -estei-
dor ou patrão, do melhor doutor, da melhor mãe, etc., etc. O ra, o rosário,o santo,a imagem,a lembrança,
o amor,o ca-
melhor no pior também é objeto de admiração. Toda-sas mani- samento,etc. Assim, a popu]ação inteira, todos os dias, (]e
festações culturais de nosso tempo participam dêsse otímismo, norte a sul, de leste a oeste do país, come a mesmatorta, a
dêsseenfechamentosabre o presente-- é o ópio do povo. Tudo mesma salada, nas mesmas horas, do alto a baixo da es-
cala social. Evidentemente, a torta vira assim instituição
nacional também. As coisas são arrancadas de seu local fami-
l Paul A. Baran -- .4 Economia Política do DesenvoZvime/z/o(Zahar
Editores, Rio, 1964) mostra como a "revolução" de Keynes, apesar liar regional e confeccionadas em massa, como objetos neutrcns,
de toda a "importância intelectual" que Ihe dá Baran, - a ponto de aios sociais neutralizados, quase abstratos, trocados, efetuados,
comparar(mesmo "com o risco do exagêro") o que êle "alcançou consumidosde ponta a ponta do território nacional,de Nova
com relação à economia neo-clássica" ao que "Hegel alcançou çom lorque a Seattle, de Saint Paul a Saint Louis, indiferen-
relação à filosofia clássica alemã" -- "não se associou. . . ao vigoroso
movimento pela abolição de uma ordem social obsoletae destruidora, temente ao . clima, gostos,hábitos, tradições de mesa, tra-
pelo desenvolvimento e pelo progresso social. .. A lógica do capita- dições familiares, tradições antropológicas e culturais, como um
lismo monopolista... provou ser mais forte do que Keynes e seusse- f automóvel, uma postura municipal, um instituto legal, enfim,
guidores radicais a imaginavam. Ela usou seus resultados teóricos para democraticamente para todos.
propósitos muito distintos de suas intenções. . . Foi a Alemanha fas-
cista que, até hoje, usou mais extensamente
a visão penetrantedo Por vêzas, de certos círculos inesperados vêm luminosas ob-
keynesianismo, ao construir a máquina económica que Ihe permitiu servaçõesque ajudam a colocar o problema fundamental -- de
desencadear a ll Guerra Mundial". (pág. 59.) Em função da época países subdesenvolvidos e massas trabalhadoras com suas aspi-
e do contexto sócio-económicoe político vigorante em escala interna- raçõessociais-- em face do neocapitalismo,quer dizer, o pro-
cional, tôda "reforma" pode virar "contra-revolucionária" blema da reforma ou revolução. Referimo-nos ao livro do profes-
Ç.
288 289
sor E. Staley.l O autor distingue,por exemplo, duas conceitua- capitais é preciso mais: é preciso que se faça a reforma imiaJ
ções relativas ao problema do desenvolvimentoválidas a consi- agrária e os camponeses sejam elevados a proprietários de terra,
derar: de um lado, o "crescimentoeconómico"e de outro a produtores independentes. À Sociedade, a acumulação capitalista
'transformação económica". Esta última expressão descreveria
melhor que ''crescimento econâmíco" as ''drásticas modificações
+ pode ser menos intensiva, até que as forças de trabalho dispo-
níveis sejam bem aproveitadas e o surto de industrialização se
nas relaçõeseconómicase sociais gerais" que são requisito ca- generalize.
pital para o desenvolvimentodos paísesnão industrializados.O O autor teme que se dê toda a atenção ao problema do
desenvolvimento não é apena-sum processo de acumulação de aumento da produção de mercado.rias e investimentos de capitais
capitais: "A acumulação de capitais é, sem dúvida, importante, e tecnologia e nenhuma no estimular as necessár&sre/armas so-
mas o núcleo real do processo desenvolvimentista consiste na ciaise psíco/ógicaB,
ou o lado ''mais especificamente
humanodo
evolução da mente humana, especialmentena mudança de hábi- desenvolvimento". O resultado poderia ser a incapacidade do
tos e organização do trabalho comum. Mesmo se desejarmos processo "pegar", tornando-se "autofecundante". Tirante a ex-
focalizar a atenção sabre os capital-s, as questões chaves. . . di- pressão, sem consistência teórica ou mesmo lógica, de "mundo
zem respeito à formação de capíraís,o que constitui em si mesmo livre", a que o autor pretende validez objetiva e não puramente
processo de tMtureza socialJ'z emocional, o resto da argumentaçãoé certo. Limitar o problema
É importante a distinção. A ênfasedeve ser posta não numa do desenvolvimento a um processo de crescimento económico
questão meramente económica, de imediata rentabilidade capi- sem mais nada é transplantar capitais e uma técnica neutra para
talista, masno problematotal -- qual o de revolver, de trans- um país primário-. Isso viria apenas, através êsse crescimento,
formar a sociedade.Ora, I'ecriá-laé principalmenteum prooes- reforçar o poder económico e político de uma pequena ari-stocra-
s(i social e contínuo d© formação de capitais. Formação quer cia burocrática-feudal-militar aliada a capitais estrangeiros,o que
dizer esforçono criar, no começaralgo não anteriormenteexis- não atenderia aos reclamos de uma verdadeira, radical trans-
tente. Acumulação capitalista -- quando não se trata de acumu- formação da sociedade.Seria por exemplo um regime de "Belos
lação primitiva que os países industriais realizaram, internamen- Antânios" para' a Marinha brasileira brigar com a Aeronáutica
te, em épocas revo]ucionárías passadas, mas ]á fora nas colónias ou de Hotéis Hilton, cada qual o mais rico e o mais belo do
e povos periféricos, ainda hoje, por exemplo, no Conho! -- signi- mundo, no tapa dos morros do Rio de Janeiro, como, por exem-
fica ir buscar capitais existentes e introduzi-los p-ara com êles plo, no Pão de Açúcar,para orguUiodo Governador
do Es-
tado da Guanabara.
chegar à reprodução ampliada. Aqui, devemos notar coisa muito
importante para os subdesenvolvidos:enquanto todos êles foram Tentando examinar as origens ou a causa dêsse fenómeno
e têm sido objeto predileto da acumulaçãoprimitiva em bemfí- de desenvolvimento que aparece entre os povos atrasados, o
cio dos Estados imperialistas, já não podem êles mesmos, para autor recusaas explicaçõesde ordem histórica, talvez com mêdo
alcançar a transformação económica estrutural, entregar-sea um de cair em alguma categoria hegeliana ou marxista. O pensamen-
processode acumulaçãoprimitiva autóctone.Ao contrário, trata- to burguês americanoatual evita a história; quer poupar, sem
ie exatamente de impedir que êsse processo continue, embora dúvida, aos povos subdesenvolvidoso seu trauma. Os Estados
mesmo sob forma jurídica. Trata-se de realizar a transformação Unidos estão aí para ajuda-los, com o seu #naw-/zow,seusinves-
estrutural sem esfaimar as vastas populações destituídas do in- timentos, suas técnicas física e social, suas instituiçõe-spassíveis
terior. Assim, para o crescimentoba-staque se invertam capi- de transplantação. O Sr. Staley verifica, porém, de repente, uma
tais na produção,digamos,agrícola.Mas para a fomlação de vontade de desenvolver-se" que aparece um belo dia em vários
i:ndivíduos,ou numa certa elite dum país. Confessanão enten-
1 0 F'zifzlro
doi Países
S ódêxenvolvído-ç,
E. Staley,traduçãoportu- der muito bem ês-se''elemento intangível", e sobretudo não sabe
guêsa,Fundo de Cultura, Rio de Janeiro, 1963, edição revista. "porque surge em determinada época e lugar e não em outras''
2 Obra citada, pág. 206. 'b "Nada obstante, não padece dúvidas de que. . . a questão deci-
290 29/
sovano desenvolvimento
económico
é a seguinte:o quefará o fluência ocidental", apesarde tudo, entra no deflagrardo desejo,
apenas
"dramatizada
na visita (?) do Comodoro
Perry".i
povo por iniciativa própria? No particular, (?) o que importa O trecho que transcrevemos revela o pensamentofilosófico
é a motivação. A menos que algo ocorra para alterar as motiva-
social do. autor..Êle não quer saber das causas possíveis de tal
ções, a economia estática :não assumirá caráter dinâmico." À guisa
fenómeno, sequer seu condicionamento histórico, social, cultu-
de explicação da estranho fenómeno, ou-sainsinuar algo: "No ral. O que importa é, todavia, a motivação. E pergunta perplexo:
Ocidente, a vontade de desenvolver-seera geral . Manifestava-
se através da iniciativa de indivíduos e grupos privados" Que fará o povo por iniciativa própria? Não sabedizer, nem
indaga, contestando-s-ecom o resu]tado, que ]he parece seguro:
Se era geral essa vontade no "Ocidente" (?), é claro que "A menos que algo ocorra para alterar as motivações, a econo-
se tinha de manifestarem grupos . . privados. Que outros gru- mia estáticaDão assumirácaráter dinâmico". A partir daí, êle vai
pos "não privados" havia então na-s sociedades ainda tomadas ver qual a maneira de transplantar no país que acordou com von-
pela vontade desenvolvimentista? Os corpos feudais? O .velho tade de desenvolver-se algumas das ''instituições vigentes e prós-
}'armamentodas monarquias absolutistas?O Terceiro Estado? O pe.ras"no seu próprio país, elevadasa ideal eterno, acima da
clero? A nobreza? Os fidalgos das cortes? ''Os governos não História e fáceis de transportar, como capitais.
desempenhamparte decisiva nem muito menos foram o móvel Estudando os tipos de tecnologia social, êle aponta a co-
dessavontade." Também era isso coisa evidente, pois como es- munista que, deliberadamente, co:nfundecom a teoria marxista
perar que partissedo Rei e de suacarte de nobresparasitasessa da história. "0 movimento comunista oferece a êssespaíses uma
vontade súbita de desenvolver-se?Mas essavontade não promo- tecnologia social pronta e acabada". Onde está essa"tecnologia
veu o desenvolvimento, pois, segundo o autor, não precedeu, não social pronta e acabada"? Disso se poderia talvez falar na época
empolgou, não provocou as mudanças .decisivas da época,. mas staliniana,mas hoje, quando a Internacional Comunistadeban-
apenas"cre-sceu'ladoa lado com o declínio das velhas lealdades dou, -sofrendoverdadeira diáspora? Quando os meios táticos de
feudais, as reformas no sistema da posse da terra, a expansão das chegar ao pode.r em cada país são deixados aos comunistas locais,
cidades. a ascensão do industrialismo, a democracia representa- declarando-se expressamente dependerem das condições naco(»
tiva, a Reforma protestante, a mente indagadora na ciência, a naus?Não em vão, aliás, foi enterrada oficialmente, com todos
capacidadeinveniliva na tecnologia.e p espírito empreendedor e os santosóleos, a velha prerrogativa de Moscou de ser a Meca
progressista no mundo dos negócios". Diante .dêsse quadro. a do comunismo.
Na realidade.desdeo conflitoabertocomPe-
vontade de desenvolver-senão teve, parece, maior papel no de- quim, Moscou deixou de ser o.centro dirigente único do movi-
senvolvimento geral que os outros fenómenos, os quais, logica- mento comunista. Ao contrário, a doutrina do "policentrismo"
mente, poderiam ter sido parcialmente promovidos ou função da proclamada por Palmiro Togliatti, o chefe dos comunistas italia-
dita vontade. Por acaso apareceu,por acaso se foi. Em ''casos nos, antes de morrer, foi declarada doutrina oficial na reunião
dos ]íderes comunistas dos vários partidos, de março de 1965, em
posteriores" (quer dizer, em épocas /zíxfórícas mais modernas) , a
vontade "cen-tralizou-se mais, os governos atuaram mais vigo- Moscou, convocadaainda por Kruchev, numa tentativa do Krem-
rosamente na deflagração do processo", "recorrendo a idéias o ]in de arrancar uma definição de posições dos diversos partidos
comunistas'nacionais em face do cisma chinês. Forças centrípe-
tecnologias estrangeiras". "Em fins do século XIX surgiu re-
penfínamerzfe no Japão o desejo de desenvolver-se. .Para que tas nacionais ou regionai-svão atraindo cada vez mais os partidos
nada tenha causa histórica, êsseIHppemfí/zo
desejo que deu em al- comunistas que, de dia para dia, se autonomizam da direção cen-
tralizada de Moscou, passando a girar na área nado.nal de suas
guns sujeitos da elite japonesa mal tem ligação com o fato his- atividades com liberdade, ou guardando apenas para com o
tórico da entrada.em Tóquio do comandantePerry e o bom-
bardeia da Capital pelos canhõesdo comodoro americano, parti Kremlim uma lealdade ideológica cada vez mais parecida à que os
forçar o país, fechado no isolamento de séculos, a comerciar com l Obra citada. pág. 219
os Estado-sIJnidos e competidores.Para o mesmo autor a ''in- +'
l
r
293
292
Estados Unido-s,em seu caritativismo, exigem dos países aos física, a-ssimnão consideramos próprios regimes (haja vista a
quais fornecem algum capital, armas e miçangas. Aliás, os com- enorme fermentação e espírito de experimentação que grassa
promissos que Washington exige hoje de seus dependentesDa agorana lugoslávia,na Romênia,Polânia,Hungria), suaspró-
América Latina são maiores que os que prendem o Partido Co- prias "instituições''
munista Italiano ou o francês, americano, inglês, sueco ou bra-
Desde Hegel, desde mesmo Herder, é esta a grande distin-
sileiro a Moscou. A formidável rebeliãoda lugoslávia, ainda em ção entre uma atitude, um pensamento revolucionário, experimen-
pleno stalinismo, acabou sendo digerida pela Urss e a Romênia tal, crítico e um pensamerüto
estático,institucionalizante,
conser-
não se cansa de mostrar a Moscou que não é satélite, ou não o
vador. A consciênciah.istórica preside qualquer demo'c/zeou in-
quer mais ser e sim colaboradora.Moscou resmunga, mas aceita. vestigação científica da sociedade; a negação preliminar, a priori,
A heresia é hoje e felizmente um vento salutar que começa
dessaconsciência condiciona o exame da realidade social. A ra-
a soprar por todo o vasto território comunista,inclusivedentro
zão dialética, diziam Maré transplanta=ndo
Hegel e Lênin repe-
da União Soviéticae faz da heróica heresiade Leon Trotsky tindo Marx, nada afirma sem negar. Devora os dogmas e é "um
apenasuma flama. E êssevento não parecevá extinguir-seantes escândalo e abominação ao reino da burguesia e a seu-sprofes-
de limpar toda a atmosfera, em muitos quadrantes ainda pesada, soresdoutrinários, pois inclui na sua amplitude o reconhecimento
do mundo comunista e trazer os germes da renovação e do novo
positivo do estado de coisas existentes e, ao mesmo tempo, tam-
arranque para o socialismo, que ainda é, na Rússia e fora da bém o reconhecimento da negação dêsse estado. . . Considera
Rússia, no Oriente e no Ocidente, uma etapa a vencer. cadaforma social histericamentedesenvolvidacomo em fluídico
Partindo do pressupostoirreal de que Da áreacomunistadc> movimentoe, por conseguinte,toma em consideraçãoessanatu-
planêta predominam instituiçõesrígidas, imutáveis, verdadeiras reza transitória não menos que sua exfsfêncía de zzmmama/zfo. .
ferramentas estandardizadas para os males sociais, económicos
não permite que nada sabre ela se imponha, e é, em sua essên-
e políticos, a crítica anticomunistado autor cai por terra. A so- cia, crí/íca e reFaZ cíonáría".t
ciologia americana oficial, o corpo de economistasamericanosdo
boa acolhidauniversitária vêem o "comunismo" como algo intei- Volvamos ao autor americano.As necessidadesdos países
riço, pmnto, imutável:O mal do regimena Urss vemprecisa- subdesenvolvidos em melhores técnicas abrangen naturalmente
mente da ausênciade instituições reais com força de impor uma as ''técnicas sociais". Torna-se imprescindível que a ajuda a êsses
rotina, uma legalidadeimpasoaZ.Ali ainda impera o volunta- países concorra para lhes dar "qualificações sociais e políticas"
rismo bolchevique,dogmático,de cima para baixo e tanto mais e "as instituições neles-sábias às sociedades democráticas" . Mas
dogmático quanto não consegue escapar a um inquieto sentimen- isso implica, acen'tuaStaley, "no uso dos métodos modernos d-e
to do transitório. A burocraciadespótica,restos da primeira era administração dos negócios, gestão da coisa pública, tipos de
ainda revolucionária, tem de ceder lugar à burocracia funcional . liderança sindical, técnicos da imprensa livre e responsávelc
O gênia organizatório americano onde melhor se manifesta é na meios de atingir-se o consenso democrático através de partidos
segurançacom que descobrepara cada uma de suasinstituições políticos, eleições e governos responsáveis". Com as instituições
a rotina correspondente. O seu mal é querer transplantar, não americanas, admiràvelmente funcionais no seu país, êle quer
tanta essasinstituiçõesa outra terras e outros povos, mas com também transplantar as respectivasmtinas, inclusive as modi-
elas cada rotina. Rotina só gente faz. A rotina do americano ficações sociais e políticas. E receita seu prontuário de rotinas
não é a do brasileiro nem a do vietnamita (do sul, do norte, do, para essasinstituições necessárias à sociedade democrática: ''no-
centro). No entanto,quandoStaleyfala na necessidade
de criar- vos métodos de administração dos negócios,novos tipos de lide-
nova-sinstituições nos subdesenvolvidos, no que êle pensa é nas rança sindical, novas técnicas de imprensa livre e novos meios
respectivas rotinas. Os economistas americanos não percebem ou
não querem perceber que as próprias teorias ''comunistas" (ou l TÀe CapífaJ,vol. 1, prefácio à 2.a ed., CharlesH. Kerr, Chicago
marxistas) assim não tomam a própria realidade social e mesmo 1909, pág. 26.

294 295
salvo.)gir o consenso democrático". (Feito isto, o Vietnã está só de capitais mas das suas mais elementaresinstituições, cama
o Vietnã, o Iraque, o Brasil?
Assim, com os novos tipos de líder, novastécnicas sociaisi
meios e habilidades sociais e políticas importadas dos Estados
Unidos para fazerem funcionar.as instituições democráticase
um regime económico privado .florescente, todos. os problemas
da sociedade imperfeita dos países subdesenvolvidos estarão re-
solvidos e o comunismo pasto no alho da rua. A "canela" para
o "consensodemocrático'',bem gramada,bem tratada, com suas
marcaçõeslineares nítidas, é a representaçãosimbólica de outro
campo, também delimitado e conüoladoz .o campo da compe-
tição capitalista, o mercado, onde.o partido dos subdesenvolvi-
dos entra para jogar com suasbolas de gude e os big bzlifmss
vêm com suasbolas de ferro. Lá como cá, só devem entrar na
''canela" os partidos já afeitos às limitações das regras do jôgo,
treinados (por técnicos americanos) para correrem bem (e sa-
tisfeitos) na pista.
Pala êssemecanismofuncional perfeito temos que o "líder
sindical" não é um "líder", é um tipo; a "'imprensalivre" não
é uma missão, é uma ''técnica" industrial; as partidos políticos
não são uma causa mas um "instrumento" à mão, uma ma-
quete de jogar tênis, uma luva de jogar box.
O ideal é uma sociedadesem história, não há futuro nem
há passado, só o presente perfeitamente controlado, equilibrado,
acabadoem si meigo. SÓo comunismo é que "propõe uma dra-
mática teoria da história e do progresso humano" (Staley). To-
dos êsses bons pa-stâres, êsses lúcidos teóricos americanos só
faltam acusaros marxistas de terem inventado a história.
O "partido político" é o que não tem, nem pretendeter
finalidade . . . histórica, destino histórico ou sequer consciência
histórica. (Já houve, entretanto, um partido assim na "histó-
ria" americana: o partido da Independência, o partido de Jeffer-
son,ou o partida da aboliçãoda escravidão,o partido de Lin-
coln, e outros mais radicais do que êle).
Em verdade,porém,partidoscom aquêlespredicadossão
perigosos,pois vêm sempre pâr em questãoa legitimidadeda
ordem social, econâmíca,política, moral em que gravitam os
cidadãos americanos não desajustados, em conto:rtável maioria.
Nos paísessubdesenvolvidos
dá-se o contrário: a maioria da
população nem sequer pode-se dizer francamente que já é de.ci-
iladãosl (No Brasii, por exemplo: os seusmilhões de analfabe-
29Ó 297
'T
tos, 50qü da po»ulalflo, são cidadãos?Os milhõesde campo- vend-o inglêsmente no Parlamento e nos negócios. .Tudo nasceu
neses, lavradores miseráveis do interior são cidadãos? ãllande
espontâneamente no abençoado solo britânico. Dirigentes e teó-
pari'bagos moradores da Cidade Maravilhosa são cidadãos?) ricos podem não pensar assim, mas se comportam l;egundo aquê-
Os dois partidos americanossão, na verdade,um só Veja- le pensamento burkeano. Toda construção social do pensamento
se: quando,por: acaso,um dêlesapresentaum candidatoa pre- humano é uma abstraçãológica irreal, criando o monstro de uma
sidente com. idéias, já é um desalento geral. Quando são idéias sociedade artificial. Esta concepção está gravada nos escritos
menos anódinas.ou mais inusitadas,isto é, de mais difícil massi- de Burke, desde a primeira obra, .4 yãndicafion oÍ .Nafm'aZ
So-
ficação, os membros dos dois partidos e a ma aria dos eleitores cfeO, e atinge sua expressãoplena e insuperada no famoso en-
passama votar no candidatomais óbvio e a dualidadede parti- saio contra ã revolução francesa(RdZecrfo/zi on /he RevaZzi/ion
ín f'ralzce, etc.), de 1790. Ai! Se conscientementeos homens
ou algunshomensou muitos homensaparecessem com.a mania
de reformar a ordeminglêsa,a sociedadeinglêsa,e pâr escrito
num papel que o que a naturezamesmadas Ilhas Britânicas,
as qualiiíades mesmasdos seus habitantes criaram ao longo do
trados da opinião americana se apoderaram'do mecanismo do tempo e de um constante comportamento conservador era um
Partido Republicano e opuseram seu candidato. Os donos e direito universal, que tinha de ser asseguradoa todos, indiscri-
eleitoresJepublicanos tradicionais compreenderam, num instan- minadamente, pelo fato de seremhomense não inglêseslO re-
te, que seucandidato natural era o outro, o da insígniado ãBur- sultado nefasto e pavoroso da nova instituição tipicamente ame-
!!, .:! l!!:l:Fi?"m e Ih' du,m os«;%. o; ã;n':';;.tiã=;-, ricana -- os direitos do homem -- seria, como estava sendo na
estavam unificados em o candidato democrático; eram Johnson, trança, a destruição
do Império,a infelicidadedecretada
para
enquanto Goldwater foi candidato de um pax'ddo oficialmente o povo inglês.Os teóricosamericanosde hoje têm em Burke o
inexistente,partido Dava ou: latente, que não é "republica:no" seugrandeprofeta ou patrono. É o patrono do pensamentocon-
e muio. menos "democrático". Se tal fenómeno de desvios da servadorde todos os tempos. Para êles tudo o que brotou, nas-
norma institucionalizadase verifica nos EstadosUnidos, se 'in- ceu, se desenvolveusocialmente, é privilégio do fato de ser ame-
vasão de campo" dêssequilate surge nos Estados Unidos, como ricano, de ter nascido no solo americano. Tudo é "bstituição
querer impedir que se verifiquem em nossas lanchas mal 'defhi- social. . . natui.al. Depois da grande depressão, sua ordem e seu
ü$;1#hWg:\.%HÊ
lilÊEHH:g progresso são eternos. Os arranha-céus de Manhattan, a pro'
ilução em série, os dois partidos políticos, as sopas enlatadas,as
grandes corporações, os sindicatos, a bomba atómica, a energia
nuclear, os teleguiados e, h f bzzf /zof leayr, a "guerra fria"
foram brutos que se desenvolveramporque, salvo algumascrises
graves como a abolição da escravidão e a grande. depressão, não
se mexeu na' base natural, social, eterna de todo o edifício --
a ordem capitali-staprivada, o mercado. A propriedade privada
e o mercado constituem a essênciaimutável da própria nature-
P.arlamento, os negócios de seus burgueses industriais e nobres za humana. . .: ou pelo menos da natweza americana. Os outros
dirigentes, a marinha, o comércio marítimo, o protecionismo
l "Pensadoresdo século XIX pretendiam, por exemplo, que compor-
mercantilista,etc. Tudo era fruto da natureza,da terra, do ar, tar-se como um comerciante no mercado era "natural", qualquer outrc}
do céu, da boa cepa, do sangue,dos nervos, do bom funciona- modo de comportamento sendo comportamento económico artificial --
mento dos órgãos da burguesia e da nobreza inglêsas,já convi- resultado da interferência dos instintos humanos; que os mercados sur-.
298 299
[ dentes e até rebeldes. A tais restrições ''condicionadas" quanto

l$%$1ã$?$!g$à noção de classe,que tanto teme Staley, Myrdall em seu


livro .4n ,fnfer/zaz/anal Ecanomy (Ruthledge & Kegen Paul, Ltd.,
Londres, 1956) responde: ''Isso é verdade e não deveria ser es-
quecido; mas, mesmo assim, as reformas não são provàvelmente
dadas às pobres massaspopulares só por causa da racionalidade
e benevolência das classes privilegiadas; como sempre prèvia-
mente na História, as reformas têm de ser conquistadas pela
luta, vencendoa resistênciatenaz da maior'iade-sque !êm de
aceitar sacrifícios. E sem diminuir a importância dos conselhos
e da pressãode fora, como exemplificadospelos vários grupos
das Nações Unidas, a / fa decfsíva fem da ier fravadcz/zo ter-
reno doméstico. .As reformas terão de vir como resultado de ltm
processo po/Zr&u {& e/fcác;a cresce/zfe."i Assim, em lugar de con-
denar as lutas pelas refo.rmascomo um mal, o economista euro-
peu socialmenteconscientetende a considera-lascomo inevitáveis
e também fecu.ndas. É que essas listas, diz êle, acanetam em
si mesmas uma preparação, um exercício educacional in.substi-
tuível na democracia. Myrdall, que não é marxista, aproxima-se
aqui do velho Marx na sua maneira propedêuticade educarde-
mocràticamente os povos e os homens na ação e pela ação. "Êsse
processo", afinna, "é cumulativo em caráter e, do ponto-de vista
oposto, nada é mais apto a fortalecer a base para os frágeis
começos da democracia política nos países não desenvolvidos do
que emb.armaremcom sucesso nas reformas necessâ'ias para
quebrar as desigual(ides sociais e económicas". Em seu abono,
o eminenteteórico cita o depoimento de um perito -- não dêsses
da grei Roberto Campos,servidoresda finança americano-inter-
nacional -- mas das Nações Unidas, membro da futura equipe
dos construtores da economia mundial. Eis o depoimento: "Ten-
tatkas de cdnírahr o consumodos ricas têm verdadeiravab/
pa/íf:ca se o Govêrno procura ganhar a confiança e a coopera-
ção dos grupos de baixa e média renda para seu programa dc
desenvolvimento".z
Myrdall não acreditamuito no fa/r-p12zy
dos grupo'spriva
legiadoschamadosa fazer algum sacrifício em nome das refor
1 Myrdall, obra citada, pág. 185.
! :n,'iES',,;'. ::'- 2 u.u. Dept. of Ecoa. Affairs,
S/racrure
band Re/orm; De/ec/s ín Jurar/alz
as OÓafacZes fo Ecorzomíc l)evelopme/zf, Nova lorque, 1951,
pág. 39.
300
de livro de cabeceirado próprio Lênin, mostra como as revo-
luções foram tomando, ou iriam tomar um caráter menos anár-
quico e menosviolento para uma.forma de luta. superior,.ou
melhor, organizada,de maior disciplina e sem violências inú-
teis. Assim, a "revolução proletária", ao chegar à ordem do
dia, seriadhigida -- nos paísesde alto desenvolvimento,
natu-
ralmente -- por uma classe operária senhora de seus destinos,
tendo o que perder, rica em quadros experimentados em todos
os setores da vida social e cultural, forte de suas poderosas
organizações sindicais, políticas, culturais, etc. Pesando os prós
e os contras,disputariaela o poder à classedominantena de-
fensiva, não, porém, através barricada-sromânticas, mas através
eleições, manifestações, ação parlamentar, sindical e a greve
geral planejada, se fosse necessário. A luta de classes, assim --

abole os antagonismosnem adia o objetivo final, mas opera no sen-


tido de impedir a classeascendentede tentar realizar tarefas para as
quais ainda não está capacitada e de evitar que a classe dirigente re-
cuseconcessões
quando já não tem a força de preservar-se.A direção
do movimentonão mudou com isso, mas seu curso se torna mais cons-
tante e mais pacífico. . . O método democrático-proletário de batalha
pode parecer mais monótono que o do período revolucionário da bur-
guesia; êle é certamente menos dramático e impressionante, mas requer
menos sacrifícios.. . Não é, por conseguinte, de esperar que nesses
paísesonde êle é mais altamente desenvolvidoo proletário perca fà-
cilmente a cabeçae seu autocontrâlee entre numa política de aven-
tura. Êsse perigo é tanto menor quanto mais elevadossão, simultâ-
neamente, a' cultura, a inteligência da classe operária e o desenvolvi-
mento democrático do Estado. . . Por outro lado, a mesma segurança
não pode ser oferecida em relação à classe dominante. Ela vê e sente
que se estátornando dia a dia mais fraca e naturalmentemais e mais
nervosa e descontente, e por conseguinte incerta. E se aproxima cada
vez mais de um estado de espírito. . . em que pode ser tomada de um
acesso de ódio desesperado capaz de leva-la a jogar-se furiosamente
sabre o seu oponente:. . os políticos da classe dominante já chegamm
a uma condição em que estão prontos a arriscar tudo sabre um único
lance de dados. Êles' prefeririam tentar a sorte numa guerra civil do
que suportar o mêdo de uma revolução". (TAe Roamfo Poder, Samuel
A. Bloco, The Bookman, Chicago, 1909, págs. 52-55.) Ao escrever as
linhas acima, Kautsky define as condições que iam provocar.a ascensão
do fascismo'(nazismo) . Êle cita ainda famosa passagemdo ]8 Bru-
nzárío de Z,z/íxBo/zaparfe, em que Marx distingue os traços específicos
das revoluções burguesas do passado, dramáticas, cheias .de lances.sur-
preendentes, indo de clímax em clímax, dos . da proletária, calculada,
disciplinada, constantemente criticando-se a si mesma.
302 303
e o pensamentovem direto de Maré e de Engels -- não é ne- rêsses do grupos Nem se considerava possível que as massas da
cessàriamenteÜm processo de agravaqiento de violências e sub- população fossem seguir a direção das classes supejliores, nela
versões, nem de caos, mas pode ser um processo de disciplina- que estasjamais se aliassema um movimento que pudesseamea-
ção, educação e criatividade das massasproletárias. çar seu poder e riqueza. Assim, a realidade fascista foi a grande
surprêsa e tem sido muito pouco r?conhecida em todos os seus as-
pectos especiais e novos". Desconheceu-se por isso o caráter.dis-
tintivo do fascismo, para nêle só ver os seus aspectos capitalistas
e por isso "seu caráier.verdadeiro de.um regime de mas-sainsti-
tucionalizado foi mantido escondido". Lederer, na base de sua
análise dos efeitos de uma sociedade de massas no fascismo pela
atomizaçãodos indivíduos e liquidação física dos órgãos de clas-
se e defesa do proletariado e na ditadura stalinista pela. liquida-
ção física das classesnãa proletárias .e amordaçamentodo prole-
tariado pelo congelamento de seus órgãos específicos de clãs-se,
concluía: "Olhando para trás, para as décadasde antes.daguer-
ra na Alemanha, vemos agora que o$ operários se tinham tor-
nado um grupo social muito bem organizadoe, sob muitos as-
pectos, influente; sua ideologia revolucionária estava em forte
contraste com a sua disposição de cooperar com o Estado e
com os empregadoresque, DO entanto, rejeitavam essa coopera'
riam ser resolvidosem uma sociedadesem classes - a distri- ção tanto quanto podiam. Sendoêsseo caso, todos os seuses-
buição das rendas, o crescimento.do dividendo' nacional, a ga- forços para crescer na tessitura da sociedade vendo-se frustra-
rantia do emprego -- não são !dequadamente apresentados se dos, a ideo]ogia revo]ucionárialhes deu essa certezae confian-
são separados do problema da ]iberdadé política e se' se ignora em si que todo grande grupo requer. Não podia haver ne-
a seguintepergunta: libertando-seos seuspróprios instintos de nhum substitutopara essavisão da importância fundamentalda
massa, nâo constitui tal coisa um perigo para a humanidade. luta de classes."x
Em face da análise precedente, quanto maior .pêso social
tiver a classeoperária industrial menos caótico e violento será
o processo revolucionário que a mover. Em contrapartida,
quanto mais subdesenvolvidoum país, mais plebeu, mais popu'
tência dos grupos sociais" lar, mais violento seria seu processo revolucionário. IJma ideo-
logia tipicamente burguesa capitalista costuma impingir ao povo
o mito de que a luta de classes desapareceu das sociedades.de
alto capitalismo.Mas é puro engodo.O que esmaeceu.foia
consciência social, por assim dizer histórica'da classe trabalha-
dora como portadorade uma civilizaçãonova, graçasãs con-
quistas salariais e assistenciaisque andou arrancando através
mais de um século de lutas porfiadas, tenazes, violentas muitas
que êssesgrupos sabiam quais seriam seus objetivos razoàvel- l E. Lederer, S/afe of /Ae Ã4asses, W. W. Nortond Co. Publishers
mente estabelecidos,ninguém concebia a paralisação dos inte- Nova lorque, 1940, Tàe Necesiífy/or Social Sfrzzggle,
págs. 148-162.
304
vêzes: não esqueçam .os senhores panegiristas das bondades do Já =noprefácio (ediçãode abril de 1961), reconheceêle a
necessidadede mudar, explicando que os argumentosem favor

:i=BUB=::B:am®$11 da ajuda pela comunidade mundial, a parto central do suple-


mento ao livro, $e tomaram "pràticamente .irrefutáveis" . . . O

W
autor daria muito mais importância que há oito anos ao seu
ponto de vista da comunidade .mundial.."Fatos recentes . . . as-
sim como as persistentestendênciasa longo prazo em armas,
tecnologia, economia e política sugerem com clareza cada vez
maior a necessidade
de formaçãode uma opinião e programa
mundiais,em contrastecom a política de interêssesnacionaise
programas bilaterais de fomento ao desenvolvimento.":
Daí era lógico reexaminasse êle a política de ajuda amor.i-
cana, cuja defesa ou justificativa oficial tem sido "excessivamente
atava' e estreita, excessivamente concentrada sabre o argu-
mento de defesacontra o comunismo". Ora, à parte de contrariar
os objetivos comunistas,pergunta êle que é que se deseja?Êle
gostaria que os Estados .Unidos pudessem oferecer ao mundo
"um grandeideal, traduzido em propósitos mais construtivose
mais atraentes para a maioria dos povos do mundo..' Uma po-
lítica externa realista, diz Staley, deveria atender a dois aspectos
interrelacionados:
o defensivo
e o construtivo.
E, francoe sem
rebuços, para a esfera da defesa -- "o que poderemos fazer.é
procurar gan&ur zempa". Mas de que forma? pergunta. Utili-
zando êssetempo ''para exercer a liderança que permitirá a cria-
ção de uma ordem mundial exeqüível, "de modo .que", espera,
ão problema da defesa não perma'necesse tão irritantemente
agudo"

1 Obracitada,pág. 16.
2 No fim da'livro, depois de oito anos de escrita a .primeira edição,
êle faz uma revisão "realista" do ângulo de visão inicial e reconhece:
Todas as filosofias que têm o 'combate ao comunismo'..como tema
central são excessivamentenegativas. Até mesmo as avaliadas contra
o teste da eficácia no combate aos avanços do credo vermelho.nos
novos países. .. Uma filosofia de desenvolvimento. do "mundo livre"
é tambémexcessivamente
limitada". E em nota à mesmapáginae
seguinte, é taxativo: "Devemos abandonar a expressão 'Mundo. Livre'
e falar em promover a Jíóerdaderzomu/zda. . . Além do mais? a rigorosa
dicotomia na expressãoMundo Livre tende a radicalizar a divisão entre
os dois 'mundos'. . . em uma situação onde a melhor esperança.pode
ser a gradual difusão da liberdade nos paísescomunistas.e nâo ,as
transferências dramáticas de um mundo para outro". (Obra citada,
págs. 430-431.
3Q6 307
Conseguindo repo-r o problema tão irritante da defesa ricos: ''O desenvolvimento desigual no processo de concentração
contra. "os objetivos" do comunismo po-r parte dos Estados Uni- desequilibra a balança do poder de barganha, não sòmente entre
dos, êle reaparecequaseque como numa posiçãode Terceirc} capital e trabalho e não sementeentre indústria e agricultura,
Mundo: "Devemos .naturalmente procurar o tipo de sisbsma mas também entre país e país e continente e continente. Assim
mundial em que todos os povos, /anjo /zós qlZunfo os de/7zaís como o crescimentodo oligopólio fortaleceu o capital relativa-
l.s\c), sinta-se menos ameaçados e capazes de trabalhar lado a mente à agricultura, assim também fortaleceu os paí-sesindus-
ado pma atettder às t+ecessi(&xies hurrmnas, que não co- triais em relação ao-spaíses indesenvolvidos. Ainda mais, nesse
nhecem./ro/zZeü'm .wm. fc$eoÃogüs.Êsse sistema terá de ser uma caso a possibilidade dos interêsses oprimidos aprenderam a jun-
comunidade mundial e será praticável apenasse repousar na leal- tar-e para sua proteção era de muito mais difícil realização.
dadea um órgãomuito maisforte do que o hoje existente". Os assalariados e camponeses de um país altamente indus-
trializado poderiam aprender a usar de seus direitos e seus
Staley joga por cima do muro do anticomunismoo espan- votos para reaprumar a balança económica que havia pendido
talho da guerra fria. Apela para um sistemamundial económico
contra êles. Era, e algumas vêzes ainda é, bem mais difícil para
e com lealdades mundiais. Até agora nada indica que o Poder os lavradores e camponeses dos continentes subdesenvolvidos
Nacional americano possa .adotar tal finalidade como objetivo assim agir, pela simples razão de que em alguns dêssesnão têm
nacional permanente. Mas do outro lado, do lado dos subdesen- nem direitos Dem votos a usar. As áreas subdesenvolvidas eram,
volvidose mesmodo lado dossocialistase comunistas,
tal apêlo e em alguma medida ainda são, as colónias das metrópoles in-
às ]e.aldades mundiais é parte mesma de sua razão de .ser: "Pro- dustriais. Êsses'seus' governos não lhes pertencem, mas aos po-
dêres metropolitanos. Assim a desigualdade de desenvolvimento
que aparecedentro dos Estadosindustriais como uma intensi-
ficada maldistribuição de rendas e:ntreos donos de capital, de
ve para bandeira dos paísessubdesenvolvidosde hoje em face um lado, e os assalariados e lavradores,de outro, apareceuex-
da crescente distância que os separa dos países'ricos e mo- ternamente,como a exploração de um país por outro, como a
nopoJuadores em progressãode tôda a renda mundial. Não llá exploração de continentes inteiros pelos países adiantados; apa-

l;'':'h:.=%m%:'n.'
.::'H:' ,i:ãÍh!-iÊ receu, numa palavra, como imperialismo."i
Países subdesenvolvidos do mundo, uni-vosl Não tendes a
perder senão vossas cadeias!
A tragédia dos Estados Unidos é a sua isco-nfo-rmidade
provinciana, embora talvez justificada pelo seu conceito, estreito
a uma só classee, passandopor cima das fronteiras dos Estados .demais,arraigado demais, de "normalidade" definida pelos inte-
instav! pela união de seusmembros contra a outra classe. a dos rêsses das grandes corporações. Por sua extensão e mesmo im-
capitalistas,que já viviam, diz Myrdall, por cima 'das frontei- portância, responsabilidade no plano económico nacional, são
ras, explorando em sociedadee convivência os proletários do elas obrigadas*a pressionar o seu Govêrno a cada momento, a
mundo. Agora com o imperialismo, diz êle, é um Estado. o Es- intervir nos mercados internacionais, a imiscuir-se nos proble-
tado imperialista contra nações subdesenvolvidasinteiras, países mas do mundo, mas p'ara emprestar à intervenção um móvel
coloniais, depe:nde.ntes. conjuntural, que pretende ser de egoísmonacional. Elas priva-
Outra voz .de eminente político e economista inglês, que foi tizam ou se empenhamem privatizar, demais, a grande política
internacionaldos EstadosUnidos. Daí resulta ser essapolítica,
minist.ro do único grande Govêrno tj'abalhista britânico, isto é.
o primeiro depois da guerra, J. Strachey, descreveu muito bem l J. Strachey, Cotütemporary Capitaltsm: Victor Gallance, Londres,
êsse antagonismo de nações proletárias e Estados imperialistas 1956, pág. 32.
308 309

'q,#, 'Rê
passarama intervir no mercadocontra os consumidoresdelas.
Hoje, êssemercadona maioria dos paísesainda existe,mas a
concorrêncianêle é cada vez mais imperfeita. Quando o cartel
dos trabalhadores chegar ao poder do monopólio, o mercado
de trabalho estará extinto.
Tempo virá em que os paísesprodutores de artigos primá-
rios se juntarão também, como as forças de trabalho fizeram. e
irão ao mercadolevar seusprodutos, organizadosem uma espé-
cie nova de caJ.tel, que não visa a fins privados de produtores
agrupadosem liga contra os consumidores,mas a fins coletivos
de cartéis de Estados,sindicatos de povos.
Os consumidores dêssesprodutos podem recusar-se a com-
pra-los, a pretexto de o mercado primário ter deixado de ser
livre, sujeito que passou a ser de uma conspiração monopolísti-
ca, de práticas comerciais inconfessáveis. Para tanto, porém,
terão de fazer uma revoluçãointerna, no próprio sistemade
produção,para boicotar os produtos'primários do cartel dos
subdesenvolvidos do mundo. Substituí-los por equivalentes sin-
téticos.. . a não ser que os EstadosUnidos, a única grande
potência industrial que até agora faz concorrência aos subde-
senvolvidos em mercadorias primárias -- os seus excedentes
agrícolas -- se resolvam a suprir os mercados com os "seus"
primários em face do bloqueio dos similares . . . "cartelizados",
íntíoduzindo em seu território métodos intensivos de produ-
ção em massa para a exploração de seus "recursos naturais"
ainda em receosoou até agora inaproveitáveis ou inaproveitados
coma não econòmicamente interessantes.
A economia mundial nessascondições será compelida a
transformar-se ràpidamente e talvez que, desta feita, a "trans-
formação rápida" se processe com maior rapidez ainda entre os
próprios Estados subdesenvolvidos. Eis porque o económico pa-s-
sa a ter, explícita ou implicitamente, objetivos supereconâmicos,
extraeconâmicos, não económicos, como queiram, inevitàvel-
mente.Mas é nessaaltura que os responsáveis
pelo puro eco-
nómico timbram em afastar "o político", fingindo considera-lo,
apenas,com um p& azar, algo de passageiroe incomodo como
uma mascaao nariz. É para êles que o professorDuncan, aqui
já citado, disse a palavra justa: "Princípios económicos podem
governar âtzvacuc} num mundo perfeito"
As reformas de estrutura de que tanto se fala, precisam de
dois requisitos para assim amem definidas: participação direia,
3]0
7
r'
cooperaçãoativa na sua execução,do povo, das camadasde
oprimidas e a grande Naç?o Imperial Americana. A ajuda que
rendas baixas e médias, ao contribuírem para "controlar o con- ela dá é estratégica,quer dizer, faz parte dos planos para r?ali-
sumo das ricos",. e térmi.!o. da exploração das massasprole- zar os seusgrandesobjetivos. Ninguém ainda os definiu melhor
tárias pelo imperialismo. Hoje, além da velhíssimaexploração, do que Stacy May, eminente economista e figura pública.dos.Es-
cujas raízes descemàs profundezasda relação primeira entre tados Unidos desde muitos anos, ao afi;mar:: "Em sentido bem
o primeiro senhore o primeiro escravo,a exploraçãodo homem real, competimospela adesãode mais de um bilhão de sêreshu
pelo homem.--.e que se encontra, sob esta ou aquela forma, em manos a um sistema compatível com a nossa própria sobrevi-
cada comunidade fundada na propriedade pi.ivada dos meios de vência, contra as tentativas de atrelá-los a um sistemaque aspira
produção ou sob governos ainda de "despotismo oriental". isto à destruição das instituições livres e democráticas. Essa ilzzação{
e, em que o monarca é o dono de tudo -- passamosa conhecer tudo indica, será o fato mais importante da política jntelnacional
uma forma nova dessaexploração,de ordem coletiva. ou de nz.a3
próximas ger(iões." Não obstante, dois anos depois?.a co-
um Estado.que explora outro. Hilferding em parte descreveuo missão sabre política económica estrangeira, em relatório ao
processo: "Com o olhar seguro e frio, êle passa os olhos pela Presidente e ao Congresso, afimlava sem rebuços, duramente:
mistura de povos e distingue sabre todos êles sua pr(jfzrz'unação. "Áreas subdesenvolvidas estão reivindicando um direito ao au-
Ela é real; ela vive no Estadopoderow, cadavez maior e mais xílio eco:nâmico por parte .dos Estados Unidos. . . Não reco-
poderoso; em glorificação dêle glorificam-se todos os seus es- nhecemostal direito."a Não é de admirar, pois, que Dessemesmo
forços. A renúncia ao interêsseindividual em favor do interêsse
plano intemacional,o que se verifica de ano para ?no seja a
geral mais .alto, que constitui a condição de toda ideologia social intensificação da "tensão política entre os subdesenvolvidos e os
vital, é assimrealizada;O Estado,estranhoao povo e a própria países industrialmente adiantados".a
nação são juntados numa só unidade e a idéiá nacional. como
Citando Jacob Viver(/pzfer/za/io/ãaZ Traje arzd Eco/zomjc
força motriz, é.pasta a se.rviçoda política. Os antagonismosde
classe são abolidos a serviço da totalidade. Em lugar da luta de Z)eveZopmenf) , para quem a crescente importância política dos
subdesenvolvidos e da capacidade dêles em se articularem ia
classes,p?rugosa
.e fora de controle dos possuidores,é posta a
ação geral de.toda..a nação .para um único objetivo : 'a grandeza aparecendo como inaceitável para uma OI.tentação económica
nacional.": Hilferding. revelava aí a ideologia emergente que que extrai o seu caráter, seleciona seus problemas e dirige sua
ia ter seu mais completo desabrocharna Alemanha nacional- análise ùnicamente em têrmos estátioos e única ou esmagadora-
socialista. mente à luz das condições e preocupaçõesdos paísesindustrial-
mente mai-s adiantados, socialmente mais estáveis e economica-
Essa nova ideologia -- a ideologia do superimperialismo
mente mais prósperos, Myrdall o aprova expressamente, para
em todas as línguas -- foi a base que se criou para a justifica-
ção.de /âcíbs ai re/ormai contra-revóZucíozzárü: que, desde então,
se fizeram e se vêm fazendo. Os Estados Unidos com todo o seu l No prefácio à obra de Eugen Staley, anteriormente comentada,na
qualidade de Presidente do Grupo de Estudos do Conselho das Rela-
institucionalismo conduzem sua política externa na base dessa ções Exteriores, êle escreveu: "Teríamos de preocupar-nos com o . de-
idéologiatSeusteóricose políticos de hoje falam da Grande So- senvolvimento internacional, como elemento básico de nossa política
ciedado Ame.ricana na qual os interêsses privados gostosamente externa, mesmo que inexistisse a campaiüa soviético-comunista,para
se suprimem, se abolem, se refreiam em nome do Grande Todo. substituir pelo seu o nosso sistema de vida, em ví r de da.baixa. cada
vez maior de provas de que a economia americana depende de fontes
isto é, o Estadomais rico e mais podero-sedo mundo. Uma das .de s zprímenros e eicoadoziros comerciais externos. A ameaça,. todavia,
armas mais proficientes a serviço dessa ideologia é a ajuda es- é inegável, havendo crescente evidência de que seu maior esforço visa
tratégica. Todos reconhecemque há uma colisão de interêssese, ao estabelecimento
do controlesôbre as áreassubdesenvolvidas
que,
também, queremos crer, de direitos entre as nações proletárias e até agora, têm-serevelado muito mais vulneráveis do que os que gozam
de progresso industrial relativamente alto ."
l Hilf=rding, obra citada, pág. 478. 2 Randall Report, 1954, cit. por Myrdall.
3 Myrdall, obra citada, pág. 233.
312
3]3
ainda acrescentar: "Quando economistas, sem explicitamente grande, seus recursos são reais, sua indúst.ria está quase monta-
levar o. fato em consideração, tratam dos problemas comerciais da e sobretudo -ea poder de óargan/u é cara.çíderáveZ. É certo
dos países~subdesenvolvidosdentro dos quadros das teorias ge- como dois e dois são quatro que a Europa ocidental, a do Mer-
rais que são próprias .às. condições e..aos interêsses dos países cado Comum e a outra colaborarão com o Brasil, cooperarão
adia:ntados,..estão. seguindo um procedimento qzíe é ípzle/ecfuaZ- com o Brasil, comerciarãofranca e rasgadamentecom o Brasil,
men/d falso".l E declara, alto e bom som, propor-se tratar dêsses se os Estados IJnidos o boicotarem porque nossa marcha tomou
problemas, deliberadamente, ''do ponto de vista dos interêsses
dêssespaíses" rumo menos oeasiano.A menos que nos dedal'e guerra. . . e
ainda assim: a vitalidade da revolução brasileira é inexaurível .
Feita a declaração,
faz êle es.saapreciaçãomuito grave: (Vejam a pequeninailha de Cuja).
"Continuo a pretender que os países subdesenvolvidos 'esc:o//le- Não antecipemos. Não façamos prognósticos. Essa descri-
ram o caminho maisUtttcit nd tentativa de resolver sew prob!e- ção sócio-económica em que se enquadra o nosso País serve
'nas e(»nomtcos sem o recuso aos mêt«ío's mais rudes do de- para nos advertir de que não se fala em reformas impunemente.
senvohimento económico apticcUos sob o sistema se:viético.
A despeito de todos os bons pastores da moderação, ordem e pa-
E mais particularmente, pretendo que êles preservem um papel ciência e de primeiro educar para depois melhorar, os povos
significativo para.o.mecanismode preços ao efetuar ajustes inter- subdesenvolvidos não podem esperar. Não há escolha aberta
nos tanto às medidasde sua própria política como às mudanças entre querer um ritmo mais lento ou mais rápido de desenvolvi-
exógenas".z SÓ dificilmente o economista sueco poderá ser con- mento económico, afirma Myrdall após dezenas de outros eco-
siderado nas rodas do Pentágono e adjacência.sbrasílicas um co- nomistas e cientistas sociais debruçados sabre a situação do mun-
munista, .ou .um temível "marxista-leninista". É um moderadís- do indesenvolvido. Todo govêrno de país não desenvolvido
simo social-democrata sueco, especializado em economia de paí- terá de fazer o máximo para empurrar para a frente, tão ràpida-
ses subdesenvolvidos, tendo estado por várias vêzes na índia co-
mentequanto possível,o esforço refomiador. Um ritmo lento de
mo conselheiro do govêrno daquele país. Sua voz deveria ser ou- desenvolvimentoeconómico implica graves perigos sociais e po'
vida e muito bem pesadano Brasil e em toda a América Latina. líticos e Myrdall insiste: ''Aconselhar a não apressaras mudan-
Ela vai juntar-se à do grande europeu François Perroux. de Guio ças económicas tem, por conseguinte, de ser rejeitado. . As mu-
depoimentosabre a América Latina demosconta mais atrás, danças culturais e sociais têm de ser planejadas e controladas;
Nós não sabemos,o Marechal Castelo não sabe, nem mes- até certo ponto têm mesmo de ser induzidas. De fato, somb©
mo o Dr. Campos,,ninguémpode saberse o Brasil acabaráto.. compelidos ü aceitar a necessidadede rdamm radicais iniciais
mando ' rudes métodos do desenvolvim-enteeconómico apli- da estrutura social que abram o caminho para o desenvolvimento
cados sob o regime soviético", quando os processos atuais, que económico e dirigintio as mudanças sociais para completos rea-
Myrdall considera os .mais difíceis para chegar à solução dos justamentos.":
problemasvitais em jogo, tiverem demonstradosua falência ou Exagera o economista sueco? Ou faz demagogia? Ouçamos,
real imprestabilidadepara arrancar o Brasll de sua pobreza.É outra vez, o que diz uma comissão de peritos das Nações Unidas
muito possível,é bem provável que nas condições'atuais do encarregada de estudar o problema do desenvolvimento econó-
mundo, o Brasil não tenha de pastar por tôdas as durezas dos mico dos países não desenvolvidos: " . . . rápido progresso eco-
métodos soviéticos de então. À colaboração internacional será nómico é impossível sem penososreajustamentos.Antigas filo-
agora incomparàvelmeDte mais fácil de conseguir não só do mun- sofias têm de ser liquidadas; velhas instituições sociais têm de
do ocidentalmasdo mundo oriental também;o Brasil é muito se desintegrar; laços de casta, credos e raças têm de ser quei-
1 Myrdall, obra citada. pág 223
mados;e um grandenúmero de pessoasque não pode acompa-
2 /dem, pág. 294.
l Obra citada,pág. 174
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nhar o progresso tem de ver suas expectativas de uma vida con- pliou extraordinàriamente es-sanoção. Os "produtores assalaria-
fortável :frustradas. . . Em nosso julgamento, há diversos países dos" abrangemhoje toda uma vasta escalade assalariados, que
subdesenvolvidos onde a concentração de poder econâmíco e vai desdeos trabalhadoresmanuais,na antiga acepção,aos seto-
Rali\ico nas mãos de uma pequena classe, cujo principa;l interês- res mais diversos no conjunto da produção, setor de conservação,
se está na prezem'ação de süa próprio riqueza e prhilégios, êDo- setor dos trabalhadores classificados, dos desenhistas, técnicos,
=lui a perspectiva de muito progresso económico até que' uma engenheiros,de escritórios,de estúdios,de laboratórios,de usi-
revolução socül tenha etetuado um deslocamentona distribuição nas, que de mais a mais se constituemem categoriashomogé-
Elasrendas e do poder:'t neas de trabalho. Nessesúltimos grupos também o estatuto pes-
soal tende a desaparecere o trabalho a ser submetido a uma nor-
ma de rendimento, passandoa ser parcelado, e, finalmente, a ser
Num livro sob.muitos aspectosnovo e construtivopela ori- pago em função da relação salário-produtividade. Na medida
ginalidade.de conceitos.e.sobretudopela maneira de repor o pro- em que, com o desenvolvimento racional do trabalho produtivo,
blema capital da estratégia da revolução socialista em nossa épo- êste tende a constituir uma engrenagemsó, cada vez mais co-
ca, André Gorza retoma de algumaforma a questãoda natureza letiva, mais vasta e complexa ao longo da escalasocial, abran-
das reformas e contra-reformas, revolução e contra-revolução de ge;ndo todas as atividades, das fontes de matérias-primas aos
que.é tão cheia a nossa época.A mil léguasdo fomiulário cansa- seus transportes, dêstes às usinas e fábricas para a transforma-
do do chamado "marxismo-leninismo", o dogma oficial do Estado ção, destas às embalagense veículos que vão dar no circuito da
soviético russo, de seus satélites e do Estado chinês de Mao-tsé- distribuição, nos setores secundários, tôdas elas funções que se
tung (para escárniode Mam e do próprio Lênin), Gorz trata do realizamem grupo e com etapasdo produto final e do destino
final. nessa medida os assalariadossão indistintamente produto-
Woblema pasto por nós nos idos de 40: a natureza de certas
transfol'maçõeshavidas ou por haver no funcionamento ou nas res parcelados ao longo de uma mesma cadeia em movimento.
'A evolução técnica pode permitir, na maioria dos casos, subs-
estrutura-sdo capitalismo. Gorz dirige-se especialmenteao mo-
tituir o comércio,atividadeespeculativa,pela distribuição,e de
vimento socialista nos paísesdesenvolvidos da Eu.rapa ocidental. fazer desta simples prolongamento da produção, seu último es-
Dir-se-ia não nos tocar. Engano.
tágio.": É claro que essaconseqüênciadireta da evoluçãotécnica
O problema da revolução nos países subdesenvolvidosé di- ainda não chegou a abranger todos os setoresdas atividadespro-
ferente, sem dúvida, do da revolução nos países de alta indus- dutivas, desde que o próprio regime neocapitalista nãn permite
trialização. A. diferença maior, quanto à forma, está em que a que a evoluçãotome todo seu surto lógico, embora dela se uti-
velha alternativa entre a luta pelas reformas e a insurreição ar- lize parcialmente,empiricamente,e de mais a mais. Nos Esta-
mada deixou pràticamente de existir, principalmente nos velhos dos Unidos, o comércio, a distribuição são cada vez mais uma
países altamente industrializados do Ocidente. Quanto à força mo- técnica neutralizada que tende a forçar o consumo, como uma
triz dos movimentos, contràriamente ao que se pensa, continua, etapa direta, em outro campo da atividade manufatureira. Belle-
nos paísesde alto desenvolvimento,a poder ser representadapela ville diz muito bem: "Concentrando-se,a indústria integra o co-
classetrabalhadora redefinida. Os ''assalariadosprodutoresl' a mércio (ou bem é o contrário que s-eproduz) ; os lucros puramen-
que se referia Marx não podem mais ser confinados à noção de te comerciais são considerados como secundários; ao que se visa,
"trabalhadores manuais, criadores de mais-valia, pagos por é o controledireto dos escoadouroscomerciais.A vendaé or-
peça ou à hora. O desenvolvimentotecnológico e proiluãvo ãm- ganizada em prolongamento direto da produção, ela mesma fre-
qüentemonte
comandadaem parte pelo estudodo mercado".A
- u.n., Measures for the Economic Devetopment ot Underdevetop'
ped Coz/n/ríei, Nova lorque, maio de 1951, pág. 177. l Pierre Belleville, U/ze /zoz/velie classe o /vríêre, René Julliard, Paras
2 .S/rafégfe Olzvrfêre ef Neo-cáfila/íxme, Editions du Seuil,