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IMUNOLOGIA

ATIVAÇÃO DOS LINFÓCITOS B


Anelise Oliveira de Morais

 Visão Geral da Imunidade Humoral

As respostas imunes humorais são iniciadas pelo reconhecimento dos antígenos por linfócitos B (LB)
específicos nos órgãos linfoides periféricos, como o baço para antígenos transportados pelo sangue, os
gânglios linfáticos para antígenos que entram pela pele, e os tecidos linfoides de mucosa para alguns
antígenos inalados e ingeridos. Então, o antígeno se liga à IgM e IgD de membrana em LB naive maduros e,
somado a outros estímulos, possibilita que eles sejam ativados. A ativação leva à proliferação clonal de
células específicas para o antígeno e à sua diferenciação, gerando plasmócitos secretores de anticorpos e
células de memória.

Esses plasmócitos migram dos órgãos linfoides periféricos para a medula óssea, onde podem viver
por muitos anos, secretando continuamente anticorpos que proporcionam proteção imediata sempre que
um microorganismo reconhecido por esses anticorpos infecta o indivíduo. Já as células de memória
sobrevivem em estado de repouso, sem secretar anticorpos, por muitos anos, mas elas montam respostas
rápidas em encontros posteriores com o antígeno e, além disso, expressam altos níveis de uma proteína
chamada proteína antiapoptótica BCL2, que contribui para a longa vida útil dessas células.

A resposta imune humoral varia de acordo com o tipo de antígeno que induz a resposta imune, que
pode levar ou não a um envolvimento de LT, e a exposição prévia ao antígeno.

 Tipo de Antígeno

Existem antígenos timo-dependentes e antígenos timo-independentes.

Os antígenos timo-dependentes são aqueles antígenos proteicos que necessitam ser reconhecidos e
internalizados por células B específicas, processados e, posteriomente, seus peptídeos apresentados aos
linfócitos TCD4 para que estes, por sua vez, ativem os LB.

Já as respostas de anticorpos a antígenos não proteicos multivalentes não necessitam da


participação de linfócitos T CD4 específicos para o antígeno. Nesse caso, a resposta imune é induzida em

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razão dos múltiplos epítopos idênticos que promovem a ligação cruzada de muitos receptores antigênicos
de células B. Esses antígenos multivalentes são chamados de antígenos timo-independentes. Exemplo:
polissacarídeos, lipídeos e os ácidos nucleicos.

 Exposição Prévia ao Antígeno

Classifica-se em resposta primária e resposta secundária, que diferem qualitativamente e


quantitativamente.

As respostas primárias resultam da ativação de LB naive, ou seja, nunca estimulado previamente


que, ao encontrar o antígeno para o qual ele é específico, passa pelo processo de ativação no qual sofre
expansão clonal e se diferencia em células de memória e células secretoras de anticorpos. Assim que o
antígeno é eliminado, tem-se a homeostase e as células entram em apoptose havendo uma diminuição da
quantidade de anticorpos e restando apenas as células de memória.

A resposta secundária é induzida quando o mesmo antígeno estimula as células B de memória. Essa
resposta secundária se desenvolve de forma mais rápida e mais intensa nesse segundo contato com o
antígeno, sendo produzidas quantidades maiores de anticorpos específicos em comparação à produção
observada na resposta primária. Na resposta secundária também são produzido outros isotipos, por
exemplo, IgG, IgA, IgE, pois já houve a passagem pelo processo de troca de isotipo.

Para iniciar as respostas de anticorpos, os antígenos precisam ser capturados e transportados para as
áreas onde ficam os LB nos órgãos linfoides. A maior parte dos linfócitos B naive maduros recirculam
continuamente no sangue e migram de um órgão linfoide secundário para o seguinte em busca de
antígeno. O antígeno que é apresentado aos LB está, em geral, em sua conformação nativa e não é
processado por células apresentadoras de antígenos. Logo, a ativação dos linfócitos B é iniciada pela
ligação do antígeno específico às moléculas de Ig de membrana, que, em conjunto com as proteínas
associadas Igα e Igβ, constituem o complexo receptor de antígeno de LB maduros.

Após a ligação cruzada de antígenos, o BCR exerce 2 funções essenciais na ativação do LB. Primeiro, a
ligação do antígeno ao receptor libera sinais bioquímicos aos LB, que iniciam o processo de ativação.
Segundo, o receptor internaliza o antígeno ligado em vesículas endossomais e, se o antígeno for uma
proteína, ou seja, timo-dependente, ele é processado em peptídeos que podem ser apresentados na
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superfície do LB para o reconhecimento por LT CD4 pelo MHC II. Embora o reconhecimento do antígeno
possa iniciar respostas de LB por si só, geralmente esse evento isolado é inadequado para estimular de
forma significativa a proliferação e a diferenciação dos LB.

Para que uma resposta completa seja induzida, outros sinais são requeridos a fim de servirem como
estímulos que REFORÇAM o sinal advindo do BCR. Por exemplo, os LB expressam um receptor chamado
receptor de complemento tipo 2 (CR2 ou CD21) que reconhece proteínas do complemento C3d
covalentemente ligados ao antígeno ou que fazem parte dos imunocomplexos contendo o antígeno. C3d
vai se comportar como uma molécula coestimulatória que vai se ligar ao CR2 presente no LB. Isso aumenta
a força de sinalização do BCR. Outro exemplo é que os produtos microbianos se acoplam aos receptores do
tipo Toll nos LB, o que também aumenta a ativação dessa célula. Estes receptores de reconhecimento de
padrão fornecem sinais que aumentam ou cooperam com os do BCR durante a ativação celular.

Após o reconhecimento do antígeno por meio de uma ligação cruzada, o LB sofre algumas alterações
importantes:

 Em resposta a antígenos multivalentes, as células que se encontravam em estado de repouso


entram no estágio G1 do ciclo celular e isso é acompanhado por aumento no tamanho celular e na
biossíntese de organelas;

 Aumento da expressão de moléculas de MHC e da molécula coestimuladora chamada B7;

 Aumento na expressão de receptores para várias citocinas derivadas de LT, o que permite que os
linfócitos B estimulados pelo antígenos respondam às citocinas secretadas pelos LT CD4;

 Alteração da expressão de receptores de quimiocinas, visando aproximar LB e LT no momento


adequado. No caso do LB, essa alteração vai resultar no movimento dos LB para fora dos folículos.

 Resposta de Anticorpo Dependente de LT CD4 a Antígenos Proteicos

Os antígenos proteicos são reconhecidos por linfócitos B e T específicos nos órgãos linfoides
periféricos e as populações de células ativadas se reúnem nesses órgãos para iniciar a resposta imune. A
interação entre as células T auxiliares e os linfócitos B é iniciada pelo reconhecimento do mesmo antígeno
proteico pelos dois tipos celulares.

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As células T CD4 são ativadas pelo antígeno (sob a forma de peptídios processados) nas zonas das
células T por meio da apresentação por células dendríticas e, então, diferenciam-se em células T auxiliares.
As células B naive são ativadas nos folículos pelo mesmo antígeno (em sua conformação nativa) que foi
transportado para lá. Após esse reconhecimento e ativação, o LT e o LT agora ativados vão em direção um
ao outro (uma vez que eles estão separados morfologicamente nos linfonodos) e interagem nas bordas dos
folículos, onde a resposta inicial de anticorpo se desenvolve. Então, os LB e os LT específicos precisam se
encontrar e interagir fisicamente para gerar uma forte resposta de anticorpos. Isto é alcançado por um
movimento regulado das células  Os LT CD4 diminuem a expressão do receptor de quimioquina CCR7 e
aumentam a expressão de CXCR5. CXCL13, o ligante para CXCR5, é secretado dentro do folículo e é essa
quimiocina que atrai as células T CD4 ativadas para o folículo. Os LB por sua vez, respondem a esses
antígenos reduzindo a expressão do receptor de quimiocina CXCR5 e aumentam a expressão de CCR7.
Como resultado, os LB ativados migram para a zona da célula T por ação de um gradiente de CCL19 e de
CCL21, os ligantes para CCR7. O resultado final dessas alterações é a atração mútua dos linfócitos T e B
ativados pelo antígenos.

Logo, antígenos proteicos são reconhecidos por receptores antigênicos específicos do LB, são
endocitados através dessa interação antígeno-BCR, e processados para gerar peptídeos que se ligam a
moléculas de MHC II e são apresentados às células T CD4.

 Papel das moléculas CD40 e CD40L

CD40 é expresso constitutivamente na superfície de LB e CD40L é expresso na superfície de células T


auxiliares após a ativação pelo antígeno e moléculas estimuladoras. Quando essas células T auxiliares
ativadas interagem fisicamente com os LB, o CD40L reconhece o CD40 sobre a superfície da célula B. A
ligação CD40-CD40L em LB estimulados pelo antígeno induz proliferação e a diferenciação do LB com
aumento da síntese e secreção de Ig. Além disso, essa interação entre o LB e o LT CD4 também leva à
secreção de citocinas pelo LT CD4 que contribuem para respostas do LB. Dessa forma, a resposta de LT
para antígeno timo-dependente inclui não apenas o reconhecimento do antígeno, mas também a ligação
de CD40 com CD40L e a secreção de citocinas coordenando essa resposta imune.

Os eventos característicos de respostas humorais dependentes das células T auxiliares, incluindo


maturação da afinidade, troca de isotipo e geração de plasmócitos e células B de memória de vida longa,
ocorrem principalmente em estruturas organizadas denominadas centros germinativos, que são criados

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dentro de folículos linfoides durante as respostas imunes T dependente. A formação de centros
germinativos é dependente da interação CD40-CD40L porque essa interação é essencial para a
proliferação dos LB, que é necessária para a expansão dessas células nos centros germinativos e também
para a troca de isotipo e maturação da afinidade.

 Troca de Isotipo

Em respostas T-dependentes algumas das células B ativadas que expressam IgM e IgD sofrem troca
de isotipo da cadeia pesada e produzem anticorpos com cadeias pesadas de diferentes classes, tais como γ,
α e μ. A habilidade das células B de produzirem diferentes isotipos de anticorpos proporciona uma notável
plasticidade nas respostas imunes humorais por meio da geração de anticorpos que exercem funções
efetoras distintas e estão envolvidos na defesa contra os diferentes tipos de agentes infecciosos. As células
B mudam os isotipos dos anticorpos que produzem, mas a especificidade dos anticorpos permanece
inalterada. Além disso, a troca de isotipo em resposta a diferentes tipos de microrganismos é regulada
por citocinas produzidas por LT CD4 que são ativados na presença de patógenos.

Como ocorre essa mudança de isotipo? Esse processo exige a sinalização do CD40 através da ligação
CD40-CD40L que induz a expressão da enzima deaminase induzida por ativação (AID). O mecanismo
molecular da troca de isotipo é um processo chamado de recombinação de troca, que é feito no DNA.
Então, a presença da citocina vai fazer um editoramente no DNA.

 Maturação de Afinidade

Processo que conduz a um aumento da afinidade de anticorpos a um determinado antígeno,


conforme progride a resposta humoral T-dependente e é o resultado da mutação somática dos genes Ig

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seguida pela sobrevivência seletiva das células B produtoras de anticorpos com maior afinidade. Com as
hipermutações somáticas acontece o aumento da afinidade antígeno-anticorpo em respostas secundárias,
terciárias, ou seja, a constante de dissociação entre o antígeno e seu anticorpo vai diminuindo gerando
uma função mais efetiva de neutralização e eliminação do patógeno.

As células T CD4 e as interações CD40-CD40L são necessárias para que se inicie a mutação somática
e, como resultado, a maturação de afinidade é observada apenas em respostas de anticorpos T-
dependentes a antígenos proteicos. A enzima AID também desempenha um papel essencial na maturação
de afinidade.

ATENÇÃO!  Como essa mutação somática é aleatória não há como garantir que essa mudança vai
necessariamente aumentar a afinidade, ou seja, também há geração de muitos LB que não expressam
receptores de alta afinidade para o antígeno e não podem, portanto, ser selecionados para sobreviver.
Dessa forma, os centros germinativos são locais de gigantesco índice de apoptose, pois antes do linfócito
B sair do linfonodo, ele passa por um processo feito pela chamada célula dendrítica folicular, no qual se a
afinidade diminui, fazendo com que a célula pare de interagir com o antígeno, o LB vai ser destruído, uma
vez que há a possibilidade de estar reconhecendo outra estrutura que pode ser própria do organismo,
gerando uma doença autoimune. Já as células selecionadas diferenciam-se, então, em células B de
memória ou em precursores de plasmócitos secretores de anticorpos de alta afinidade que deixam o
centro germinativo.

 Diferenciação em Plasmócitos

Os plasmócitos são LB diferenciados, morfologicamente distintos e comprometidos com a produção


abundante de anticorpo. Existem dois tipos de plasmócitos:

• Os plasmócitos de vida curta são gerados durante as respostas T-independentes por LB da zona
marginal ou linfócitos B1, e no início das respostas T-dependentes em focos extrafoliculares de células B.
Estas células são geralmente encontradas em órgãos linfoides secundários e em tecidos não linfoides
periféricos.

• Os plasmócitos de vida longa são gerados em respostas T-dependentes a antígenos proteicos nos
centros germinativos  Os plasmoblastos gerados nos centros germinativos entram na circulação e são
direcionados para a medula óssea, onde se diferenciam em plasmócitos de vida longa. Esses plasmócitos

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na medula podem continuar secretando anticorpos por meses ou mesmo anos após o antígeno não estar
mais presente. Esses anticorpos, por sua vez, podem proporcionar proteção imediata se o antígeno for
encontrado posteriormente. Os anticorpos secretados entram na circulação e nas secreções mucosas, mas
os plasmócitos maduros não recirculam.

A mudança na produção de Ig da forma de membrana (caraterística de LB) para a forma secretada


(nos plasmócitos) é o resultado de modificações na extremidade da cadeia pesada de Ig. Esta transição
de Ig de membrana para Ig secretada é provocada pelo processamento alternativo de RNA que determina
se os éxons para a porção citoplasmática e transmembrânica são incluídos ou não.

ATENÇÃO!  Todas as cadeias pesadas podem ser potencialmente expressas na forma ligada à
membrana e na forma secretada. No entanto, a forma secretada da cadeia pesada δ raramente é feita, de
maneira que a IgD geralmente está presente apenas como uma proteína de membrana.

 Diferenciação em Células B de Memória

As células B de memória são geradas principalmente durante a reação do centro germinativo,


portanto elas são observadas em respostas imunes T-dependentes, e são capazes de gerar respostas
rápidas à introdução subsequente do antígeno. Então, essas células adquirem a capacidade de sobreviver
por longos períodos, aparentemente sem a continuidade da estimulação antigênica. Caracteristicamente,
as células de memória expressam receptores de antígenos de alta afinidade e moléculas de Ig de isotipos
que sofreram troca.

 Regulação da Ativação do LB

A produção de anticorpos é extremamente importante, mas também é necessário haver uma


regulação fisiológica dessa produção, bloqueando a produção adicional de anticorpos. Para isso, existe o
fenômeno chamado de retroalimentação de anticorpos, que mediante um excesso de anticorpo há uma
regulação negativa da produção de anticorpos pelos próprios anticorpos IgG secretados.

Como acontece isso? No próprio LB, há a expressão de um receptor que se liga à região Fc do
anticorpo IgG (CD32 – FcγRIIB ou CD32). Os anticorpos IgG inibem a ativação de células B por meio da
formação de complexos com o antígeno e esses complexos se ligam a esse receptor de células B para as
porções Fc de IgG. A cauda citoplasmática do FcγRIIB contém um motivo de inibição de imunorreceptor
baseado em tirosina (ITIM). Quando o receptor Fcγ de células B é acoplado, o ITIM na cauda citoplasmática
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do receptor é fosforilado nos resíduos tirosina, fazendo com que ocorra um bloqueio da resposta celular,
culminando na parada de resposta do LB.

 Efeito Hapteno-Carreador

Haptenos são pequenas substâncias químicas que podem ser ligadas por anticorpos específicos, mas
não são imunogênicas por si mesmas. Se, no entanto, quando esses haptenos são associados a proteínas,
que servem como carreadores, os conjugados são capazes de induzir respostas de anticorpos contra os
haptenos. Mecanismo: LB específicos para o hapteno ligam-se ao antígeno através da interação do BCR
com o determinante antigênico do hapteno, endocitam o conjugado hapteno-carreador e apresentam
peptídios derivados da proteína carreadora a LT CD4 específicos para essa proteína que exercerá sua
função principal de secreção de citocinas coordenando agora uma resposta de anticorpos contra os
haptenos. Assim, os dois linfócitos cooperam reconhecendo diferentes epítopos do mesmo complexo
antigênico.

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