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14/02/2020 O que o Brasil quer da China?

| Eu & | Valor Econômico

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O que o Brasil quer da China?


Reordenamento de nossa política externa possibilitaria verdadeira aproximação com
o país asiático e melhor inserção no século XXI

Por Philip Yang — Para o Valor, de São Paulo


14/02/2020 05h01 · Atualizado há 7 horas

Leia versões do artigo em inglês ou em mandarim

— Foto: Nelson Provasi

Introdução

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"Ah, então você é um banana!", me dizia uma colega chinesa que eu acabava de
conhecer na sala de aula, logo depois de um debate acalorado sobre identidades
étnicas e culturais, no meu mestrado nos Estados Unidos. "Sim, um banana",
reafirmava ela aos risos e sotaque chinês, ao perceber o meu desconcerto.
"Chamamos de banana", me explicava ela, "todos os que, como a fruta, são
amarelos por fora e brancos por dentro".

O termo era para mim uma novidade. Na China e nas comunidades chinesas mundo
afora, explica minha colega, a expressão é usada para designar pessoas como eu: de
origem e feições asiáticas, mas portadoras de uma visão de mundo ocidental – na
cultura, na linguagem, nos maneirismos. A designação é frequentemente
empregada de forma pejorativa e ofensiva por chineses puristas críticos a
conterrâneos que se distanciam de suas origens culturais, adotando valores e
comportamentos ocidentais. No mais das vezes o termo também é aplicado de
maneira jocosa e bem-humorada para caracterizar a ocidentalização de chineses, de
seus hábitos e costumes distantes de suas raízes orientais.

Já familiarizado com a metáfora recém-aprendida, mas ainda sob o impacto do que


eu imaginava ter sido um insulto, arrisquei uma reação: – "Não sou um banana!",
retruquei. "Seguindo a sua figura de linguagem, sou um maracujá, amarelo por fora
e misturado por dentro, como um bom brasileiro." O Brasil não é exatamente o
Ocidente, expliquei, sem querer me alongar. E tampouco sou branco por dentro,
pensei com meus botões. Somos talvez um ocidente tropical, um extremo ocidente,
uma grande mistura.

O que terá impulsionado desempenho econômico tão


excepcional na China e tão pífio no Brasil nas últimas
décadas?

Estávamos no ano de 2000. Naquele momento, a China tinha completado apenas


duas décadas de reformas econômicas, a partir da redefinição do papel do Estado e
do mercado implementada por Deng Xiaoping em 1978. Embora já apresentasse
elevados índices de crescimento, a China de então não me despertava curiosidade
ou interesse particular. Para mim, tratava-se de um país geopoliticamente
importante, grande e distante, que, como o Brasil, buscava um caminho de
prosperidade.

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No contexto atual, tudo isso muda radicalmente. Meu sentimento em relação à


China salta da indiferença para a perplexidade. Como, em meras quatro décadas de
reformas, transformou-se na maior potência econômica do planeta, exibindo não
apenas as conhecidas taxas de crescimento, mas também capacidade de inovação
tecnológica em diversos setores e um desempenho educacional incomparável? Por
que nós no Brasil, após três décadas de reformas ensejadas pela Constituição de
1988, nos sentimos condenados econômica e socialmente ao imobilismo?

Para qualquer brasileiro, o contraste entre os dois países é estarrecedor. Para mim,
brasileiro de origem chinesa, a diferença de desempenho é espiritualmente
dilacerante. Por que terá o meu pai saído da China? Terá valido a pena vir para o
Brasil? Obviamente encontro respostas claras a essas perguntas. Se meu pai não
tivesse fugido da China, provavelmente teria sido morto, dadas as relações políticas
que mantinha dentro da elite do antigo regime nacionalista de Chiang Kai-shek. Meu
segundo irmão mais velho, que ficou para trás com a avó, acabou deprimido por ter
sido impedido de tocar o seu violino durante a Revolução Cultural (1966-1976), e
optou por encurtar sua vida atirando-se numa linha de trem.

Parece óbvio que a fuga terá valido a pena, mas essa é uma conta emocional difícil
de se fazer. E o sucesso econômico estrondoso da China oblitera ainda mais a razão.
Pior: o fracasso comparativo do Brasil é de tal ordem que o sentimento de
indignação prevalece sobre uma possível objetividade. Onde erramos? Temos algo a
aprender com o caso chinês? Ou a especificidade cultural e política deles (e nossa
também) impede qualquer paralelo?

Na falta de clareza analítica própria, recorro à teoria política. A literatura das ciências
sociais ensina que as transformações do Estado são geradas por um conjunto de
fatores: (i) forças internacionais, (ii) variáveis domésticas ("de baixo para cima") e (iii)
pressões originadas do próprio aparelho estatal ("de cima para baixo") (1). Quem
sabe, uma análise comparativa de nosso passado recente pós-1988 vis-à-vis o
avanço chinês desde 1978, jogue alguma luz para os nossos caminhos futuros.

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Mais objetivamente – e deixando de lado por ora o debate ideológico – a pergunta


que compõe meu tormento e perplexidade é apenas uma: o que terá impulsionado
desempenho econômico tão excepcional na China e tão pífio no Brasil, nestas
últimas quatro e três décadas de reformas, respectivamente?

Terá sido um determinismo histórico, cultural e geográfico que catapultou a China à


posição de farol do desenvolvimento da economia global? (2) Ou podemos atribuir o
sucesso chinês à obstinação e voluntarismo de sua população e de seus líderes; ou
ainda, à qualidade doutrinária do chamado "socialismo de mercado, com
características chinesas"? E o nosso fracasso relativo, de onde vem? Da nossa
herança e circunstância histórica e espacial periférica, ou das nossas lideranças e do
nosso povo? O que fazer?

Minha tentativa aqui é de extrair e de aprender algo desse contraste. Faço desde
logo um caveat para não afastar o interesse do leitor na partida: expressões de
admiração ou referências a resultados positivos alcançados pela China não
correspondem a atitude minha de complacência, condescendência ou de endosso
ingênuo do complexo sistema chinês. Meu objetivo aqui é observar, com humildade
e sem pré-juízos, o que a China eventualmente oferece de lições e assim identificar,
sem mimetismos, possíveis alternativas para o nosso desenvolvimento social e
econômico. (3)

Fatores internacionais

Começando pelo internacional, parece óbvio que o contexto geopolítico da China


colocava o país, na década de 1970, numa situação de centralidade muito maior do
que a do Brasil. Controladora do terceiro maior território do planeta, situado entre a
Ásia Central e o Pacífico, e com uma frente costal temperada de mais de 14.000km,
habitada por população superior a um bilhão de pessoas, detentora de cultura e
civilização milenares, a China sempre foi, por sua história e geografia,

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incomparavelmente mais importante do que o Brasil num sistema internacional


longamente dominado por relações entre povos do Norte.

No contexto da Guerra Fria, esse peso superior da China levou à histórica


aproximação entre Washington e Beijing, articulada pela visita secreta de Kissinger a
Zhou Enlai em 1971, evento que elevaria o país asiático a um patamar de
importância geopolítica e diplomática que o Brasil jamais terá atingido.

Preterido pelos centros hegemônicos, Brasil consolidou


status quo de potência média, mas sem experimentar
ascensão no poder

Dava-se início, sob as lideranças de Mao Zedong e Richard Nixon, à chamada


diplomacia triangular. A China distanciava-se da União Soviética e alterava assim a
geometria de poder da era bipolar, abrindo as portas para uma cooperação com os
Estados Unidos que trouxe consequências profundas para o desenvolvimento
econômico da China. Em especial, vale notar, a aliança sino-americana desencadeia a
profunda, complexa e sofisticada interdependência econômico-financeira e
comercial bilateral hoje em vigor.

No mesmo período, o Brasil percorria o caminho inverso nas suas relações com os
Estados Unidos. Por contingência geopolítica, irrelevância estratégica,
vulnerabilidade externa, inabilidade política, insuficiência criativa ou ausência de
personalidades catalisadoras, o Brasil não estabeleceu qualquer tipo de relação
preferencial com atores hegemônicos do sistema internacional que pudesse abrir
mercados, apoiar uma revolução nos níveis de produtividade do trabalho e
transformar nosso destino econômico, tal como fez a China em sua relação com os
Estados Unidos.

O Brasil – alvo de protecionismo do U.S. Trade Act de 1974 e fragilizado pela


dependência das importações de petróleo, cujos preços subiam acentuadamente
como resultado da crise de 1973, fato que impunha forte desequilíbrio na balança
comercial, além de enorme pressão inflacionária – passou a optar por um
distanciamento de Washington durante a presidência de Ernesto Geisel. E, assim,
depois de períodos de maior alinhamento aos EUA, a diplomacia brasileira nos anos
setenta passou a resgatar um posicionamento mais independente e voltado para a
defesa de valores universais.
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Ou seja, enquanto o relacionamento sino-americano em alto nível criava a base de


estabilidade institucional para um entrelaçamento de interesses econômico-
comerciais e culturais, a diplomacia brasileira – preterida por Washington – viria a ter
de lidar com uma série de complicadores ou irritantes no relacionamento com os
EUA, tais como o afastamento com relação a Israel e a aproximação ao mundo
árabe, o apoio à descolonização afro-asiática, o reconhecimento da independência
de Angola, Guiné Bissau e Moçambique (mesmo tendo sido esses novos Estados
fundados a partir de movimentos de orientação marxista) e também a celebração do
Acordo Nuclear Brasil-Alemanha, que ensejou a construção das Usinas Angra 1 e
Angra 2.

Essa postura brasileira autonomista, de "pragmatismo responsável", conforme


denominada pela historiografia do período, expressa a consciência de que, dada
nossa baixa relevância geopolítica, qualquer alinhamento automático a Washington
não resultaria em contrapartidas relevantes. Numa nota pessoal – fui diplomata
brasileiro entre 1991 e 2001, meu testemunho dos anos de Itamaraty é de que a
grande maioria dos antigos colegas tem como inquietação e orientação intelectual a
identificação e defesa de interesses nacionais permanentes, em bases pragmáticas e
não-ideológicas.

— Foto: Nelson Provasi

Nos bancos do Instituto Rio Branco, debatíamos com admiração como a diplomacia
altamente profissional do regime militar diferenciava com clareza o interesse
nacional – permanente, estratégico, de Estado – dos interesses de governo, mais
conjunturais, a ponto de apoiar, como vimos, em plena ditadura, movimentos de
orientação socialista. Tal diferenciação, entre interesses de Estado e de governo, foi-
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se diluindo ao longo dos mandatos presidenciais civis, fazendo com que a


diplomacia se transformasse, paulatinamente, em ferramenta de defesa de
bandeiras partidárias, ideológicas, de natureza interna.

Tomando a nossa política externa para a Venezuela como um exemplo próximo,


vimos que nos anos Lula nosso relacionamento bilateral esteve fundamentado no
apoio ao chavismo, enquanto hoje, sob Bolsonaro, a ação diplomática tem como
foco o apoio à oposição de Maduro. Em ambos os casos, parece claro que nossos
interesses geoestratégicos permanentes, não partidários – o fato de que a Venezuela
é detentora da maior reserva petrolífera do mundo, o controle e a gestão territorial
da Amazônia, a estabilidade da fronteira, o combate ao narcotráfico – não foram
priorizados em relação a vínculos conjunturais, oportunísticos e transitórios.

A China, país onde servi como diplomata de 1994 a 1997, terá mantido uma política
externa mais regular e homogênea ao longo dessas quatro últimas décadas, fazendo
da diplomacia uma ferramenta de defesa de interesses de longo prazo: a integridade
territorial, o desenvolvimento econômico-comercial, a cooperação cultural e
educacional, a inovação tecnológica, estando os alinhamentos supostamente
ideológicos da China, como a Pyongyang ou Caracas, fortemente ancorados em
interesses estratégicos fundamentais do Estado chinês. De certo, a estabilidade da
política externa chinesa é resultado da estrutura política baseada em um só partido.
O dilema que se coloca a nós, portanto, é como fazer com que, numa democracia
com multiplicidade extrema de partidos e correntes políticas, os interesses
permanentes não sejam confundidos e diluídos por demandas de diferentes forças
sociais que, embora legítimas, podem colocar em risco interesses coletivos mais
abrangentes.

Não será o caso aqui de revisitar as relações exteriores dos dois países nas décadas
mais recentes. O que vale notar é que, no tocante ao impacto das forças
internacionais no amoldamento dos Estados chinês e brasileiro, as transformações
envolvendo a China são de alcance global (i.e. ingresso da China na OMC, Iniciativa
Um Cinturão, Uma Rota, etc.), enquanto no caso do Brasil as mudanças apresentam
impacto e influência em âmbito regional (e.g. Tratado de Assunção, formação do
MERCOSUL, etc.). E, internamente, os reflexos do internacional sobre a realidade
doméstica foram proporcionais: enormes e radicalmente transformadores na China
e apenas moderadamente importantes no Brasil, sem impactos relevantes.

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Em suma, a estabilidade da aproximação da China aos EUA ensejou onda de


investimentos que fazem da China a grande usina fabril do mundo, transformação
que teve impacto na estrutura do poder internacional e na realidade interna chinesa.
Já o Brasil, preterido pelos centros hegemônicos de poder, dependeu, como
veremos a seguir, de transformações endogenamente geradas, para consolidar um
status quo de potência média, para fortalecer sua autonomia, mas sem excedentes
de poder, e sem experimentar uma ascensão notória na hierarquia do poder
mundial, como ocorreu com a China.

Brasil só será viável se formos capazes de resgatar conjunto


mínimo de valores que nos façam enxergar como uma
coletividade unida

Será que algum gênio da diplomacia ou uma formidável liderança poderia ter
mudado nosso destino? Será que se tivéssemos tido a visão de um Bismarck ou o
poder agregador de um Gandhi ou mesmo a força carismática de um De Gaulle
teríamos logrado construir um caminho menos periférico? Talvez possamos nos
consolar pensando que, ao menos no plano diplomático, fizemos o que pudemos (e
contamos com o que tivemos do ponto de vista do patrimônio intelectual
disponível). Portanto, fica o indulto de que dificilmente poderíamos ter feito algo
diferente, algo que mudasse nossa condição acessória no contexto internacional.

Num clube chamado Ocidente, que adotou instituições como o Conselho de


Segurança da ONU, o G7, ou mesmo a OCDE como referências de poder, nos
situamos em posição secundária, subsidiária em relação a ele.

Usualmente, não entramos num clube de prestígio e poder por três razões: porque
não queremos, porque não fomos convidados ou, ainda porque, ao tentarmos, não
conseguimos. No Clube Ocidente, comandado no século XX pelos Estados Unidos, o
Brasil não entrou. Deixo ao leitor imaginar por que.

Fatores domésticos ("de baixo para cima")

Talvez, e reforço o "talvez", a comparação dos fatores domésticos de transformação


da China e do Brasil aponte para uma perspectiva um pouco mais alvissareira para o
nosso país. Com vistas a propiciar o entendimento paralelo da realidade de países

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distintos, metodologias de política comparada prescrevem o estudo sistemático de


uma série de variáveis, que enumero aqui em forma de perguntas:

– Na data de início das grandes reformas na China e no Brasil, 1978 e 1988, qual era
o nível de industrialização que prevalecia em cada país? – Qual era o tamanho dos
respectivos mercados consumidores? – Em que situação cada país se encontrava na
transição do fordismo para economia de serviços? – Qual era a escala e qualidade do
setor educacional; a força de sindicatos; a capacidade de mobilização de massas; o
nível de democratização (item que discuto em mais detalhe na próxima seção)?

– Podemos falar em estado de bem-estar social no Brasil e na China naquele


momento histórico, como expressão do equilíbrio entre capital e trabalho? – Qual
era, em cada caso, o tamanho do setor agrário? – Qual era o nível de concentração e
a estrutura da ocupação fundiária? – Qual era o tamanho, qualidade e
disponibilidade do capital humano, ou, em outros termos, qual era o tamanho da
classe média com educação pós-secundária? – Como era a disponibilidade de
matéria prima e energia, recursos naturais? – Qual era o grau de homogeneidade
étnica e de coesão social, do ponto de vista de valores e princípios que norteavam
cada sociedade?

Uma tabela que plotasse comparativamente a situação de cada país no ano


respectivo de inauguração de suas reformas indicaria que o Brasil terá partido de
uma situação mais avantajada nos principais indicadores acima enumerados. Em
poucas décadas, no entanto, fomos superados pela China, em quase todos os
domínios. Os números de cada indicador são conhecidos; para não cansar o leitor
cito aleatoriamente exemplos desse contraste tão dinâmico: em 1980 o PIB per
capita da China era USD 200,00 e no Brasil USD 3.500; em 2019 a China alcançou
US$10.000 (FMI), multiplicando o seu PIB per capita mais de cinquenta (!) vezes,
enquanto o Brasil, com uma população 6 vezes menor, chegou em 2019 a US$8.796,
elevando o índice em apenas duas e meia vezes no mesmo período.

No âmbito político, pudemos registrar no Brasil uma expansão notável da cidadania


e direitos civis, algo que deve ser celebrado. No plano educacional, no entanto,
nossos resultados são estarrecedores. Em relatório recente do PISA (Programa
Internacional de Avaliação de Estudantes, tido como a mais importante avaliação do
mundo em aprendizagem, tomando como referência o desempenho em leitura,
matemática e ciências), a China aparece de longe em primeiro lugar (4) – à frente de
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países tradicionalmente líderes – contrastando com a nossa vergonhosa 57ª posição


na prova de leitura.

Reservo as linhas desta seção para comentar dois aspectos que me parecem
fundamentais numa análise comparativa dos dois países que, na perspectiva de uma
ação futura, precisam ser aprofundados. O Brasil tornou-se ator de influência global
em dois setores econômicos: agricultura e energia. Somos uma potência alimentar e
energética. Curiosamente, o crescimento vertiginoso da China gerou dependência
externa do país justamente nestes dois domínios: os chineses são hoje os maiores
importadores líquidos de produtos agropecuários e de petróleo do mundo. Numa
metáfora popular, o império chinês é um verdadeiro gigante econômico sobre duas
pernas de gnomo, o que torna sua trajetória gravemente dependente do exterior e,
portanto, vulnerável a choques externos.

Não nos interessa exportar comida e petróleo apenas, mas


construir parceria que nos conduza à rediversificação
produtiva do país

Temos alguma reflexão de alta política a empreender aqui? Ao longo dos 40 anos em
que a China subiu para o Olimpo das grandes potências, o Brasil saiu da condição de
importador de alimentos para se tornar um dos principais players do agronegócio
mundial, um dos maiores exportadores de produtos agropecuários para o mundo.
Obtivemos aumentos importantes na produção e na produtividade do solo, tanto no
plantio como na pecuária e na avicultura. No campo da energia, passamos a ser
referência internacional na produção de petróleo em águas ultraprofundas.

Mereceria essa curiosa complementaridade entre os dois grandes países ser objeto
de alguma ação política específica? Ou devemos deixar que forças e agentes de
mercado, sozinhos, atuem na construção de uma convergência de interesses? Claro,
temos muitos outros dotes. Temos uma indústria mineral competente, um
segmento aeroespacial importante, bem como matemática de qualidade. Mas me
concentro aqui na agricultura e na energia pois nestes dois setores há extrema
complementaridade com a China. Deixo em suspense, para o final do texto, uma
reflexão sobre este tema.

Antes disso, ainda no tocante a fatores domésticos que contribuem para as


transformações do Estado, mencionaria o forte contraste entre os patrimônios
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humano e histórico de cada país. Nenhum juízo de valor cabe aqui neste tema, sob o
risco e pena de incorrermos em equívocos de avaliações etnocêntricas. Mas vale
evidentemente registrar as diferenças que são gritantes como ponto de referência
para reflexão e ação, para que a leitura do presente e a construção do futuro de
alguma forma se produza a partir das especificidades de cada realidade.

De um lado, temos a homogeneidade étnica, socioeconômica e cultural da China. A


uniformidade sistêmica que prevalecia na década de 1970 (e que prevalece ainda
hoje) resulta de uma história milenar, rica e violenta, onde uma etnia dominante, a
dos Han (que hoje compõe 92% da população), fez prevalecer, mesmo sobre povos
invasores, seus valores, princípios, enfim, sua visão de mundo. Nos dois últimos
milênios, uma filosofia, ética social, ideologia política e modo de vida – o
confucionismo – tem moldado e amalgamado com rara força o comportamento
coletivo e político chinês, reforçando a homogeneidade e a coesão social.(5) Já a
igualdade social dos anos setenta – a pobreza generalizada – tinha, como fator de
curto prazo o fracasso geral da estatização dos meios de produção estabelecida pelo
regime maoísta e, de longo prazo, o declínio do regime imperial ao longo do século
XIX, que levaria à fragmentação (e humilhação) da China na primeira metade do
século XX.

Do nosso lado, a riqueza da diversidade étnica e cultural constitui o traço definidor


do que somos como sociedade. E as raízes patrimonialistas do Estado brasileiro
fizeram da desigualdade a nossa outra marca coletiva. Ou seja, os pontos de partida,
na China e no Brasil nos anos 70 e 80, eram completamente distintos, para não dizer
diametralmente opostos, lembrando sempre que nossa diversidade tem como
ingredientes a imigração européia e dois grandes horrores: a paulatina dizimação,
por doenças e violência bruta, de nossa população indígena original que, como
sabemos hoje, chegou à casa dos 10 milhões de pessoas, e a escravidão, que
submeteu 40 milhões de africanos a um regime atroz de trabalho forçado. São
feridas no nosso corpo social que ainda permanecem abertas, inflamadas.

Identificadas essas diferenças, quais são as transformações do Estado, geradas de


baixo para cima, em cada país, que podemos desejar para os próximos anos?

Se a recente estabilidade da China deriva da homogeneidade étnica e cultural, algo


que foi herdado da história pelas presentes gerações, no caso do Brasil nossa
estabilidade política, econômica e social deverá ser construída a partir da riqueza de
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nossa diversidade. Mas esse potencial brasileiro só poderá ser realizado a partir de
uma atitude de integração ativa, onde as diferentes lutas identitárias em curso –
ideológicas, étnicas ou de gênero, todas legítimas e necessárias – não prevaleçam
sobre ideais de valor universal.

A afirmação é vaga – reconheço – mas os ideais que movem as coletividades são


necessariamente difusos e altivos para que possam justamente abarcar o maior
número de indivíduos. “Qual é a sua utopia?”, pergunta o muro pichado, em letras
garrafais em tinta vermelha escorrida. "Qual será nossa utopia?", pergunto eu. Numa
tentativa preliminar de dar contornos de clareza a esse propósito coletivo
imaginário, talvez nossa saída seja a de imaginar que seremos capazes de construir
uma atitude radical e intransigente em defesa da integração social, política e
econômica, com base na tolerância, respeito e solidariedade em relação às
diferenças que marcam nossa sociedade.

A neurociência nos mostra que, do ponto de vista evolutivo, tendemos a preferir o


que nos é familiar, pois a familiaridade nos oferece a sensação de menos perigo. (6)
Nesse sentido, nossos cérebros foram programados para que o novo, o
desconhecido, a não-familiaridade – que pode ou não representar perigo – dispare
sinais de alerta. Nas aglomerações urbanas – habitat da grande maioria – temos de
nos reprogramar para domar esse reflexo atávico: ou aprendemos a conviver com
as diferenças ou estaremos fadados à nossa autodestruição como sociedade. Afinal,
somos ou não animais racionais? Esticando para outros domínios o celebrado motto
de Angela Davis – "não basta não ser racista, temos de ser antirracistas" –, não basta
criticar as desigualdades, precisamos ativamente lutar contra as desigualdades. Nas
cidades, devemos lutar pela produção de espaços urbanos que (a) propiciem um
ambiente saudável de segurança pública e (b) induzam, fomentem e estimulem (a
redundância aqui é proposital) o convívio das diferenças, a partir da integração social
e econômica, sobretudo pela educação pública de excelência.

"O diferente hoje nos será familiar amanhã", dizia o prefeito Richard J. Daley,
buscando contrarrestar o horror, a repulsa e a crítica conservadora que a
monumental escultura cubista de Picasso, de 15 metros de altura e 162 toneladas de
aço, inaugurada em Chicago numa manhã nebulosa de agosto de 1967, deflagrava
naquele momento. Visionárias palavras: nos anos seguintes o grande público
abraçava de tal forma a obra que sua presença desencadeou a instalação daquela
que é uma das maiores coleções de esculturas públicas do mundo, com obras de
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Chagall, Miró, Dubuffet, Calder, Noguchi, Moore, entre tantos outros mestres
universais, espalhadas pela cidade, abrindo caminho para outras manifestações de
arte urbana.

Será que a transição do estranhamento para a familiaridade, e da familiaridade para


o afeto, que se verificou na arte, pode se estender para o domínio das pessoas?
Talvez sim, porém com mais tempo. Mesmo Chicago, que conseguiu esse grande
feito na arte pública, está longe de aplacar o preconceito racial e de classe. Não
importa, a história nos dirá; e este deve ser o voto iluminista, de luz possível para
uma civilização, ou ao menos para uma certa civilidade, a um só tempo local e global.
Temos alguma esperança aqui. Vejam vocês como, em três gerações, mudou-se no
Brasil a percepção relativa a relacionamentos homoafetivos e à igualdade da mulher.
Mesmo em meio a terríveis retrocessos, apesar de não prevalecer ainda um quadro
de plena aceitação, ou ao menos de tolerância, de valores progressistas, é inegável
que muito se avançou.

Quem entre nós seria capaz de buscar uma nova inserção


internacional? Temos liderança à altura desse grande
movimento?

Voltando ao Brasil e à China, é triste constatar que nos dois países as cidades
avançam com programas de desenvolvimento urbano e imobiliário que aprofundam
a segregação territorial, que não favorecem a integração entre diferentes. A
produção de espaços urbanos, em ambos os casos conduzida sobretudo por forças
privadas, obedece a formação natural, pelo mercado, de preços da terra, o que faz
com que as populações de menor renda sejam jogadas para as regiões periféricas,
cada vez mais longe dos locais de trabalho.

Infelizmente, as cidades chinesas, que partiram de uma situação de muita igualdade


nos anos setenta, refletem hoje no território o aumento crescente da desigualdade.
Nas grandes cidades, quanto mais se caminha para periferia, menos beleza e menos
riqueza. E o crescimento urbano lá é exponencial. Beijing, por exemplo, cresce em
torno de anéis periféricos e a cidade já se estende para além do sexto anel. A China
nesse sentido perdeu uma grande chance: a de fazer com que a redução da pobreza
levasse também a uma maior integração socioterritorial.

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Ou seja, a inclusão socioeconômica não correspondeu a uma inclusão socioespacial.


Neste incrível processo de modernização das cidades realizado nas últimas décadas,
neste período em que houve aumento notável de riqueza, as cidades chinesas se
espraiaram mas sem fazer do espaço uma ferramenta para se promover a
integração social.

A coesão social de um país dependerá cada vez mais da capacidade de gerar cidades
com amplos espaços públicos e bairros que promovam a convivência de diferentes
faixas de renda, etnias, credos e comportamentos. Esta é uma agenda que deverá
ganhar centralidade também na China, na medida em que tensões sociais poderão
emergir como resultado do aumento do desigualdade. Críticos da urbanização
chinesa, inclusive nativos, como o premiado arquiteto Wang Shu, tem apontado para
a segmentação do espaço e a perda dos locais de convívio e de fricção social
espontânea.

Mas eis aqui a grande diferença entre cidades brasileiras e chinesas: enquanto aqui
o caos invade a ordem, lá a ordem invade o caos. Em ambos os casos assistimos a
processo de forte segmentação socioespacial, mas a China avança rapidamente na
infraestruturação e conectividade urbanas. As redes de metrô de Shanghai e Beijing,
por exemplo, somam hoje mais de 1.300 km; em São Paulo e Rio, os dois sistemas
metroviários perfazem magros 159 km. Aqui, assistimos passivos à presença
crescente de milícias, do crime organizado e de moradores de rua nas regiões
consolidadas das cidades. Lá, as cidades, muito seguras, se ligam por trens de alta
velocidade, cuja rede já passa de 29.000 km…

Finalizo esta seção retomando o "talvez" com que a iniciei. O Brasil só será viável se e
somente se formos capazes de resgatar um conjunto mínimo de valores que nos
guiem e nos façam enxergar como uma coletividade unida em torno de um destino
comum. Talvez a saída possível para nós envolva conjunto de iniciativas voltado para
a construção de cidades melhores, que, em termos objetivos, atue como uma
política distributiva intensa e inteligente, por meio da geração maciça de bens e
serviços coletivos urbanos.

Tal política deve partir de consenso, ainda a ser construído, de que uma cidade
melhor gerará ganhos de produtividade e constitui condição essencial para uma
inserção mais competitiva na nova economia. Não há eficiência quando grandes
proporções de trabalhadores passam diariamente horas no trânsito. Portanto, a
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mudança comportamental precisa ser acompanhada de um reordenamento do


espaço construído, envolvendo ativamente forças de mercado e da sociedade, de
baixo para cima, e também de iniciativas de governo, pactuadas de cima para baixo,
a partir de iniciativas que comento na próxima seção.

Talvez consigamos, mas não será fácil. Exigirá de nós ação proativa nesses dois
domínios associados à questão geral das diferenças que abordamos aqui: a
construção da tolerância, respeito e solidariedade – superando atavismos – e o
fomento permanente da inclusão econômica. (7) Não por mecanismos de
distribuição de tipo paternalista, mas por meio da construção, repito, de cidades
melhores, pela distribuição maciça de bens e serviços públicos urbanos. Usando a
criatividade, não nos faltarão mecanismos que promovam a reprodução de capital
privado em empreendimentos públicos voltados para a redução da desigualdade,
notadamente a segregação socioespacial.

O aparelho do Estado como fator de transformação ("de cima para baixo")

No plano doméstico, os fatores de transformação do Estado que prevaleciam na


China e no Brasil nas décadas de 1970 e 1980 eram igualmente contrastantes. Na
China, em 1978, o imperativo emergencial era estruturar o mercado, após o desastre
econômico da estatização plena. No Brasil de 1988, nossa urgência foi a de
reconstruir a democracia, após o trauma da ditadura militar. Na China, o Estado
abria as portas para a ação de agentes econômicos de mercado. No Brasil, o Estado
se abria para as forças plurais da política e para vozes da sociedade organizada.

O resultado parcial desses dois processos é conhecido de todos: na China, em


quatro décadas de reformas fortaleceram-se simultaneamente o poder político e o
poder econômico. No Brasil, assistimos o contrário: uma estagnação dos índices
gerais de produtividade do trabalho e o enfraquecimento do Estado, com exceção
notória feita ao agribusiness e a segmentos do setor energético. Estagnação
econômica e enfraquecimento do Estado foram processos simbióticos marcados
pela captura das políticas públicas, o avanço do crime organizado e das milícias e,
claro, como sabemos, pelo aumento patológico da corrupção.

Óbvio que a corrupção não é exclusividade nossa. Também deixa marcas profundas
na China, tendo sido objeto de campanha vigorosa de combate conduzida pelo
próprio líder máximo da nação, que resultou no enquadramento de mais de 1,5
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milhão de altos funcionários, numa lista que inclui generais do exército, membros do
influente Comitê Central do partido. Mas diferentemente do que aconteceu aqui, a
geração de riqueza na China foi capaz de, consistentemente, alçar centenas de
milhões de pessoas para cima da linha de pobreza. Mais de 80% da população, algo
como quatro Brasis, terão cruzado esta linha nestes últimos 40 anos. E, como vimos,
o combate à corrupção no Brasil também ganhou terreno, com a consolidação de
várias ferramentas de controle importantíssimas, as quais infelizmente nem sempre
foram aplicadas de forma legal e impessoal.

"E a voz do povo chinês?", perguntarão ansiosamente os arautos da crítica à China.


Vale aqui lembrar que o poder social na China sempre se fez ouvir ao longo de sua
história milenar, invariavelmente sob a forma de protestos, rebeliões e guerras.
Nunca na história da China a voz do povo foi canalizada por instituições que
garantissem uma manifestação popular ordenada nos grandes temas de
governança do país. Nem mesmo nos períodos que se seguiram às Revoluções
Republicana (1912) e Comunista (1949) se logrou constituir estruturas democráticas
de participação mais alargada, que se estendessem para além do próprio corpo
revolucionário.

O poder social na China, portanto, permaneceu, nestes últimos 40 anos, onde


sempre esteve: "tamponado" e, como sempre, pronto para se manifestar ou
explodir quando necessário. O poder central conhece melhor do que ninguém essa
realidade. Durante a Dinastia Tang, por exemplo, a Rebelião Anshi (756–763) levou à
morte o número atordoante de 36 milhões de pessoas (8), recorde mundial de
horror que só viria a ser superado 1.200 anos mais tarde durante a Segunda Guerra
Mundial. E a lista de rebeliões chinesas além de milenar é extensa e apresenta, como
traço comum, a escala, em milhões, de fatalidades.

Numa perspectiva cínica, a conta simplista talvez seja a seguinte: a corrupção


alastrou-se enormemente, lá como cá, mas a escala da geração de valor na China
tem sido de tal magnitude que foi e continua a ser suficiente para manter a
legitimidade do comando do Partido Comunista. Conversando com amigos e
familiares locais, o que se depreende é que a democracia e o seu valor são estranhos
à milenar história e à grande maioria da população chinesa. As fórmulas de
governança construídas ao longo desses milênios foram sempre de natureza
autoritária, e as tentativas de abertura ou flexibilização invariavelmente redundaram
em caos.
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No Brasil, não podemos hoje aceitar atitudes de condescendência em relação a


qualquer inclinação de natureza autoritária. Dito isso, e cientes também das
inúmeras imperfeições e fragilidades das democracias ocidentais, devemos evitar
um posicionamento opinioso, cegamente crítico, em relação às fórmulas de
governança na China. Afinal, são eles os titulares da civilização mais contínua e
populosa do planeta. Afinal, foram eles que, em quatro décadas, levantaram 800
milhões de pessoas para cima da linha de pobreza.

Ainda que aos nossos olhos ocidentais prevaleça um déficit de democracia na China,
o país gerou sem dúvida um superávit de mérito, pelas extraordinárias conquistas
sociais que lograram realizar em tão pouco tempo. Lógico, esta conta não é unívoca,
e tampouco pode ser usada como justificativa para fórmulas autoritárias no Brasil.
Mas é importante termos em mente que a legitimidade de um governo ou de um
partido certamente se repousa sobre um legado amplo de resultados que, embora
multifacetado, entram num balanço linear ou não de avaliação pela população.

De um ponto de vista mais teórico, e tomando como premissa a ideia de que a


organização das sociedades sempre obedeceu à ação e interação entre forças de
mercado, de governo e do povo – forças que configuram o poder econômico, o
poder político e o poder social – a reforma do Estado na China implementada a
partir da abertura de 1978 é absolutamente inédita, pois empreende novo
reequilíbrio desse tripé de forças, qualitativamente diferente dos reajustes
promovidos pela revoluções que definiram a formação dos Estados
contemporâneos: a Revolução Francesa (1789), a Americana (1776) e a Russa (1917).
Na caracterização de Giovanni Arrighi, trata-se de implantar, no “socialismo com
características chinesas” (1978), não uma economia de mercado, mas uma economia
com mercado (9), após a fracassada tentativa de supressão completa do modo de
produção capitalista na Revolução Chinesa em 1949.

Reservo um comentário final nesta seção para um elemento de transformação do


Estado oriundo do próprio Estado conhecido na teoria política como pontos de veto
(10). Os pontos de veto são definidos como o conjunto de situações nas burocracias
nas quais escolhas coletivas (decisões, projetos públicos ou privados, projetos de lei,
propostas de mudanças do status quo, etc.) podem ser obstruídas. Os pontos de
veto são a um só tempo necessários e perversos. Necessários, pois de alguma forma
constituem vetores de controle social e/ou técnico de projetos emanados do poder
político ou econômico; perversos, pois, conforme argumentam os defensores do
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Estado mínimo, todo ponto de veto, nas mãos de agentes de veto, tornam-se presas
facilmente capturáveis por interesses escusos de agentes públicos ou privados.

Muitas experiências conhecidas de estruturação de projetos complexos


demonstram que o Estado brasileiro, no esforço geral de institucionalização da
democracia, criou nas suas diferentes esferas de poder um mar de pontos de veto
que nos condena à ineficiência e à imobilidade. Órgãos de fiscalização rapidamente
se transformaram em centros de arrecadação de fundos para fins políticos ou
privados. Agências públicas foram capturadas por empresas ou aparelhadas por
partidos, prejudicando a necessária independência dessas instituições. Mesmo
bancos de fomento foram objeto desse processo ao longo de décadas e diferentes
governos. Debates públicos, por sua vez, são frequentemente capturados por
grupos de pressão que não necessariamente representam o interesse público.

Para piorar, além da lentidão e incerteza que caracterizam esses processos, cada
decisão é adotada de forma diacrônica, uma após a outra. Qualquer projeto,
infraestrutural, ambiental ou imobiliário, precisa se submeter a diferentes balcões.
Não constituímos um balcão único que pudesse examinar de forma sincrônica todas
as variáveis de determinado projeto. Por exemplo, um projeto de intervenção
urbana de certa complexidade em São Paulo pode, em caso de sucesso, levar mais
de 5 anos para ser aprovado, até passar por todas as instâncias de aprovação. Enfim,
talvez o problema não seja propriamente a existência de “pontos de veto”, mas sua
descoordenação e captura por indivíduos e corporações mais interessados em
arrecadar recursos (por corrupção ou não), do que no interesse público.

E para completar, lembremos que a modelagem de qualquer projeto de


infraestrutura demanda conhecimento técnico que usualmente não está disponível
no âmbito interno da máquina pública no Brasil, dada a insuficiência de recursos
humanos e materiais nas diferentes esferas de governo. Tal insuficiência projetual
do Estado contribui adicionalmente para o desenvolvimento de relações incestuosas
(ou no mínimo conflitadas) entre o setor público e o privado no setor de concessões
e infraestrutura. Registramos melhorias no marco regulatório nas últimas décadas,
mas estamos muito aquém do desejável (11). Ou facilitamos a contratação de
projetos competentes junto ao mercado (como preferem os mais liberais) ou
dotamos o Estado de pessoal qualificado para fazê-lo (como querem os mais
estatistas). Independentemente da sua preferência (mais liberal ou mais estatista), o
componente fundamental é fazer acontecer e correr atrás do atraso, catalizando o
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processo de discussão do projeto juntos aos stakeholders: as forças de mercado e a


população (a beneficiária e a impactada negativamente).

O leitor pode inferir que num Estado poderoso e centralizador como o da China a
quantidade de pontos de veto é muito menor. De fato é. Os projetos de grande
escala são decididos de forma célere, e o Conselho de Estado e várias instâncias de
governo em nível provincial e municipal têm sistematicamente buscado integrar
instâncias de aprovação governamental em um sistema de aprovação unificado,
com vistas a reduzir prazos.

Seria simplista e empobrecedor caracterizar as diferenças entre China e Brasil como


sendo uma oposição entre tecnocracia e democracia. É justo no entanto afirmar que
a China talvez tomasse decisões ainda melhores se desenvolvesse um sistema de
escuta mais capilarizado, voltado para a captação de opiniões e do conhecimento
local de beneficiários/usuários, sempre precioso, nos grandes projetos. No sentido
inverso, certamente ganharíamos em eficiência se olharmos como a China vem
logrando enxugar prazos aprobatórios, aumentando a densidade tecnológica na
administração pública e unificando processos que correm diacronicamente em um
único fluxo sincrônico.

Se queremos reduzir a desigualdade e a exclusão promovendo inclusão social pelo


provimento de melhores bens coletivos públicos (insisto pois esta é minha tese
predileta), precisamos urgentemente encontrar fórmulas de prover o Estado e o
mercado de condições de estruturar projetos - de infraestrutura e habitação - de
melhor qualidade e de forma mais rápida. Que não continuemos na lentidão dos
nossos metrôs. Ou nos horrores do Minha Casa Minha Vida. (12)

O Brasil no mundo

"No século XIX, o mundo se europeizou. No século XX, foi americanizado. O século
XXI será asiático", me diz Parag Khanna ao telefone, numa afirmação que mais tarde
seria utilizada na vinheta de lançamento do seu livro publicado ano passado,
intitulado The Future is Asian. (13) Mal ingressamos no Ocidente, pensei eu, e o
centro de gravidade do sistema internacional se desloca para o Oriente. Estaríamos
buscando hoje, objetivamente, um posicionamento estratégico ante essa mudança
de eixo do poder mundial, que ocorre ao mesmo tempo que experimentamos uma
transição profunda de paradigma tecnológico?
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Creio que não. Um olhar sobre os movimentos diplomáticos, empresariais e


acadêmico/culturais no Brasil das últimas décadas nos mostra que estamos muito
aquém do que deveríamos e poderíamos fazer.

Na passagem do século XIX para o XX, diante da ascensão dos Estados Unidos como
grande potência e a difusão das tecnologias da Segunda Revolução Industrial, o
lendário Barão do Rio Branco reorientava a política externa brasileira, tirando a
centralidade que a diplomacia de então atribuía à Europa e favorecendo uma
aproximação à potência nascente do Norte (apesar de ser ele um grande admirador
da cultura européia). O fim da escravidão, o sucesso do comércio do café, a
acumulação de capital necessária para o início da nossa industrialização tardia, a
transição da monarquia para a república, enfim, as grandes transformações em
curso na sociedade brasileira, impulsionavam a construção de uma nova identidade,
a de um Brasil moderno.

O Barão soube auscultar essas grandes mudanças, internas e externas. (14) Forjou
uma política que buscava consolidar a imagem do Brasil após a mudança de regime
(apesar de ter sido ele um devoto monarquista), mostrando ao mundo que a
República recém-estabelecida seria capaz de ocupar um espaço de poder entre as
grandes nações. O trabalho de afirmação do Brasil no cenário internacional era de
tal forma admirado (e enraizado nas aspirações coletivas da época) que o Barão
alcançou ainda em vida estatura de herói nacional. Seu enterro em 1912 foi
acompanhado por um público estimado em 300 mil pessoas, um evento tão inédito
que levou ao adiamento das festividades oficiais do Carnaval. (15)

Nossa entrada no século XXI é marcada por evento histórico de transformações


ainda mais profundas, desta vez tendo a China, como vimos, na posição de grande
locomotiva das mudanças estruturais, na expansão simultânea das fronteiras
tecnológicas da Terceira e Quarta Revoluções Industriais. Mas nesta transição, nos
mandatos pós-abertura de Sarney, Collor/Itamar, FHC, Lula e Dilma/Temer, falhamos
em detectar o vertiginoso deslocamento do poder mundial para a China e, como
consequência, não produzimos políticas e estratégias à altura desse evento histórico
de modo a alavancar interesses reais recíprocos.

O atual presidente brasileiro e o seu chanceler "trumpista" autodeclarado agravaram


a situação do relacionamento sino-brasileiro: de um diálogo de baixa inspiração e
criatividade, porém respeitoso, passamos para uma política, do lado brasileiro,
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utilitarista e tacanha, destituída de valores civilizatórios que as duas populações


certamente almejam. A China foi desprezada e mesmo atacada durante a
campanha; e a correção de rota (tentativa, pois os chineses foram tomados
sentimento desconfiança) veio tarde, de forma tímida e evasiva, que nem mesmo a
visita presidencial a Beijing em novembro de 2019 logrou ajustar. "O grande
encontro aqui foi comercial, a política é caso a caso", disse o presidente Bolsonaro de
forma rasteira após o encontro com o seu homólogo chinês. Deixar a política com a
maior potência emergente do planeta "no caso a caso" parece ser, no mínimo, um
despautério. Algo que precisa ser urgentemente corrigido.

Enfim, vamos reconhecer: historicamente fomos míopes, medíocres, pequenos. E a


situação piorou neste governo. Devemos fazer de tudo, sobretudo junto às
lideranças do Congresso Nacional, para a situação não piorar ainda mais. Não
poderia haver contrassenso maior do que pensar política no "caso a caso" com
aquele que é o candidato maior a superpotência, hoje já uma potência com
influência de alcance global. Uma política bilateral com "P" maiúsculo deveria ter
como pauta os interesses estratégicos recíprocos e permanentes, e a adoção de
valores e princípios que correspondam a anseios reais e concretos dos dois povos.

No plano dos interesses objetivos, nada mais urgente para a China – que
metaforicamente descrevi como o gigante caminhando com pernas de gnomo – do
que diminuir sua vulnerabilidade nos dois setores em que o Brasil se destacou,
alimentos e energia. Parece-me portanto lógico que os temas associados à
segurança alimentar e energética da China pudessem integrar uma pauta prioritária
e estratégica de alto nível – cuidadosamente articulada – envolvendo os dois países.
(16)

A China tem sido a maior compradora de terras rurais do mundo. Por razões óbvias:
cada terráqueo precisa de 0,22 hectare para se alimentar durante um ano, de
acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura
(FAO). (17) Cada chinês(a) hoje dispõe de apenas 0,09 hectare de superfície arável no
país, o que faz com que o governo e prepostos atuem diretamente na compra de
terras no exterior. Por essa razão, a China é hoje o maior detentor estrangeiro de
áreas não-urbanas dos Estados Unidos e na Austrália. E deve ser também o maior
detentor de terras na África.

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No Brasil, a China, ao menos oficialmente, não é grande compradora de terras,


dadas as nossas restrições à propriedade de terras por estrangeiros. No entanto, na
prática, provavelmente ocorrem aquisições chinesas no Brasil por meio de
mecanismos contratuais que ocultam sua presença. Ou seja, à medida que essas
transações supostamente privadas envolvendo compradores chineses recônditos
avançam, perdemos a chance de negociar de forma saudável, altiva e transparente
as condições e contrapartidas para uma desejável presença do investimento chinês
na agropecuária brasileira. Podemos certamente conceber diferentes fórmulas para
que o capital chinês seja alocado na agropecuária, com foco na segurança alimentar
da China, sem riscos à nossa soberania sobre o território. Não atuar neste sentido –
deixando o "mercado" resolver – é parvoíce.

Nossos depósitos de petróleo do pré-sal constituem outro tema de interesse chinês


e, na mesma linha, deveriam ser objeto de negociação bilateral, politicamente
administrada e específica. Nossas riquezas petrolíferas podem e devem ser
negociadas a partir de parcerias que apresentem contrapartidas de interesse
brasileiro mais amplo. Do jeito que encaminhamos a questão, blocos do pré-sal são
ofertados em leilão, mas, dadas as incertezas jurídicas e políticas que cercam o
ambiente regulatório aqui, os chineses participaram da última rodada de licitação,
realizada em novembro passado, em resposta a um pedido – para não dizer súplica
– do atual governo para que as estatais chinesas comparecessem, o que acabaram
fazendo de forma apenas simbólica. Muito melhor seria negociar uma parceria
estratégica de coparticipação na exploração e desenvolvimento do nosso potencial
petrolífero, numa negociação governo a governo em que interesses brasileiros (e
contrapartidas chinesas) pudessem ser colocados na mesa de negociações.

A história mostra que nenhuma nação terá sido bem-sucedida em todos os


aspectos. E o sucesso em um aspecto está muito frequentemente ligado ao fracasso
em outro. E o estrondoso sucesso chinês por coincidência apresenta
vulnerabilidades nesses dois setores em que o Brasil é forte, agropecuária e
petróleo. A busca de uma parceria verdadeiramente estratégica precisa levar em
conta essa complementaridade.

Evidentemente, tal mudança de curso em política externa pressupõe duas vontades:


do Brasil e da China. Até que ponto os chineses se interessariam sinceramente pela
ideia? Até que ponto não tendemos a superestimar nosso potencial de reduzir a
dependência externa chinesa em alimentos e energia? Qual será o nosso valor
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comparativo, econômico e estratégico, em relação a outras cartas de que os


chineses dispõem (tanto internas, como por exemplo as fontes de energia renovável
que desenvolvem, como externas, oriundas de outro parceiros)?

Ante tais questões, uma ação diplomática vigorosa será o único movimento capaz de
nos trazer respostas claras. Neste caso, a ação diplomática – se bem articulada –
deverá envolver elementos de avaliação quantitativo, econômico, mas também
aspectos qualitativos associados a percepções de interesses e valores de natureza
subjetiva, porém fundamentais numa negociação. E, no plano interno, caberá uma
avaliação genuína de nossa capacidade de unificar interesses setoriais pulverizados
em uma frente de negociação única, a partir de ampla coordenação prática e não-
burocrática de forças plurais, num contexto aberto, transparente e permeável aos
interesses efetivamente transformadores.

Não se trata de tarefa ordinária, convencional. Tampouco será uma política que
possa ser formulada entre quatro paredes, em gabinetes palacianos. Exigirá o
envolvimento do Congresso Nacional, das unidades da federação e de
representantes qualificados de segmentos geradores de alto valor econômico e
social, especialmente os setores associados à infraestruturação das cidades para o
ambiente da nova economia. O objetivo desse esforço: obter um máximo
denominador comum para um posicionamento integrado numa mesa de
negociações com a China.

Pesa contra nós a extrema e crescente assimetria de poder entre China e Brasil. Em
nosso favor, além das nossas vantagens nos setores agropecuários e energético, a
competitividade de outros setores, notadamente da indústria mineral e, sobretudo,
o tamanho do nosso mercado consumidor. E esse constitui a motivação central
deste ensaio: a visão de que que os nossos centros urbanos e o nosso interesse em
construir cidades e infraestruturas urbanas melhores possam representar hoje alvos
de interesse chinês para a destinação de investimentos, serviços e produtos.

Claro que, num eventual esforço de construção de uma agenda comum mais
substantiva, a relação bilateral China-Brasil não pode reproduzir os termos do
relacionamento de tipo neocolonialista. Em uma palavra, não nos interessa exportar
comida e petróleo apenas; importa construir uma parceria que nos conduza à re-
diversificação produtiva do Brasil no quadro da chamada indústria 4.0.

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Desnecessário dizer nesse contexto que teremos muito a aprender e a ganhar com
uma interação maior com a China – se soubermos lançar sobre ela um olhar
analítico sóbrio, altivo, humilde e despolarizado, descolado das certezas teóricas
frágeis às quais estejamos ferrenhamente abraçados. Essa é, aliás, a grande lição e
exemplo que a China contemporânea exibe para o mundo: a capacidade de
aprender com os erros e acertos próprios e dos outros; a competência de entender
que nem o liberalismo ou o socialismo em suas formas puras abririam o caminho
para o seu desenvolvimento socioeconômico; a inteligência de encontrar,
coletivamente, a partir de seu ethos, um caminho próprio de prosperidade, sem
mimetismos automáticos a esta ou aquela corrente do pensamento econômico ou
político.

No plano das reformas oriundas dentro do Estado, a China a seu modo criou um
mosaico teórico próprio e práticas específicas na formulação de políticas públicas.
Agregou a importância dos mercados que observou em países ditos liberais; as
técnicas de desenvolvimento industrial do Japão e Tigres Asiáticos; a gestão da
integridade territorial a partir dos erros cometidos pela antiga União Soviética; o
controle da regulação financeira e das políticas monetárias e fiscais a partir dos
diferentes choques enfrentados pela economia global nos anos 70, 90 e na crise dos
subprime; as modalidades de inovação tecnológica do Vale do Silício; e, finalmente,
não nos esqueçamos, os ensinamentos da abortada Nova Política Econômica (NEP)
de Lenin, que propugnava a combinação de elementos do capitalismo no programa
socialista da URSS, algo que o jovem Deng absorvera em seus estudos em Moscou.
(18) Os ingredientes são diversos e conhecidos, mas a dosagem de cada elemento
faz parte de uma fórmula que é chinesa. E que só vale para a China.

Na minha condição de observador mundano da vida, recorro sempre à imagem do


tripé conformado por mercados, governos e sociedade, à qual aludi mais acima. Essa
imagem do tripé, do necessário equilíbrio entre os poderes econômico, político e
social, me parece muito potente, pois mercado, governo e sociedade constituem
forças primordiais e permanentes. Estão ligadas às origens e evolução das
sociedades e se apresentam continuamente como principais agentes da história das
civilizações. E são categorias de poder irredutíveis, no sentido de que elas não
podem ser eliminadas. As experiências do passado, desde os tempos ancestrais,
demonstram que tentativas radicais de supressão do mercado, do Estado, ou da
expressão popular são sempre geradoras de instabilidades, com consequências
sempre trágicas.
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Nessa perspectiva, o que vale notar do exemplo reformador da China é como um


governo absolutamente centralizado que se autodeclara socialista foi capaz de
libertar forças e agentes de mercado, conseguindo estabelecer um equilíbrio sem
precedentes nas relações entre o poder político e o poder econômico e, partir desse
novo equilíbrio, abrir o caminho para uma nova inserção internacional.

E nos planos das transformações do Estado vindas "de baixo para cima", de natureza
popular, poderia a China – esse colosso imperial com um governo de um só partido
e população hiper homogênea – nos ajudar em algo? Justamente a nós brasileiros
que, como um espelho em negativo da China, buscamos fortalecer a pluralidade
democrática a partir de nossa diversidade étnica?

Certamente sim. E a resposta categoricamente afirmativa não deixa de constituir um


curioso paradoxo.

Max Weber achava que um determinado modo de produção é o resultado de uma


ética, de uma ideologia, do ethos de um povo. (19) O raciocínio de Weber é portanto
diametralmente oposto ao de Marx, para quem a infraestrutura – as forças de
produção, a base econômica da sociedade – é na realidade a produtora das
ideologias, do Estado, religiões, cultura e artes, dos meios de comunicação. (20)
Consequentemente, na perspectiva weberiana, um determinado modo de produção
só pode ser implantado em uma sociedade se uma ética compatível com esse modo
de produção estiver sido previamente estabelecida no corpo social. Nessa linha, nos
casos da China, Japão e Coreia do Sul, terá sido a ética confucionista que permitiu
adoção de uma ordem produtiva espelhada no Ocidente. (21) No mesmo diapasão,
teria sido o puritanismo protestante que ensejou o estabelecimento do capitalismo
moderno na Europa.

Se adotamos a abordagem de Weber como referência, podemos então perguntar


se, efetivamente, a sociedade brasileira estaria dotada de um conjunto mínimo de
valores comuns que ensejará um caminho de prosperidade e justiça social para o
século XXI. Ou, em outras palavras, tomando o nosso ethos como ponto de partida,
qual seria o modelo econômico, ou o modo de produção, condizente com a alma
brasileira, que nos traga prosperidade e justiça social sem violar nossa essência
como povo? Considerando os valores que compõem a nossa identidade coletiva
mais fundamental, seria possível imaginarmos um projeto de nação neste momento

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de profunda mudança de paradigma tecnológico? Em caso afirmativo, em quais


bases econômicas e com que parcerias?

Numa métrica de réguas absolutamente incomparáveis, talvez o equivalente


brasileiro do ethos confucionista chinês seja representado pelos valores da alegria,
desprendimento, irreverência, diversidade, improviso, miscigenação e de celebração
espontânea da vida que a alma brasileira carrega. Tais valores representam um
verdadeiro contraponto ao confucionismo que é constituído, numa simplificação
grosseira, por um conjunto diverso de princípios e valores como a benevolência, a
justiça, a reverência, o conhecimento e a confiança. Esse contraponto é revelador de
dois grandes contrastes.

O primeiro tem a ver com as diferenças marcantes entre a natureza própria de cada
conjunto de valores. Não vou me estender aqui. Basta pensar que o confucionismo
tem como pilares valores apolíneos como a benevolência e a reverência, enquanto a
brasilidade tem a alegria e o desprendimento – traços dionisíacos – como elementos
de esteio social. Não há julgamento aqui; apenas a constatação de que a realização
do que talvez possamos chamar de plenitude coletiva de cada nação se dê em bases
de valores que são bastante distintos entre si.

O segundo contraste é igualmente acentuado, mas aqui neste domínio impõe-se


inevitavelmente um juízo comparativo. Enquanto o confucionismo é uma doutrina
madura e consolidada, o ethos brasileiro está ainda em plena formação, ainda
jovem, instável, frágil. O confucionismo se impôs como um cânone que se
sedimentou ao longo de séculos e dinastias, tendo inclusive se alastrado por vasto
território que se estende para muito além do solo chinês. Os valores identitários do
Brasil – nossa história, hábitos, costumes, comportamentos e ideais – não
constituem ainda uma força aglutinadora de nossa coletividade.

E este é talvez o grande drama, dilema e desafio que temos pela frente: a beleza e o
poder do ethos brasileiro é a nossa diversidade. No entanto, essa diversidade
encontra-se ameaçada por forças múltiplas e contraditórias: a renitência do racismo
e de diferentes formas de discriminação, as lutas identitárias (a um tempo
necessárias e legítimas mas potencialmente fragmentadoras), o aumento da
desigualdade e a sua expressão territorial – a acentuada segregação socioespacial
nas cidades.

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O que afinal a China poderia ensinar para que estes valores se consolidem como
grandes ideais a serem efetivamente amadurecidos e consolidados? Seremos
capazes de nos unir em torno da nossa diversidade? Vamos conseguir fortalecer
nossa coesão como povo e encontrar um caminho de prosperidade? Ou vamos nos
fragmentar, aprofundando o estranhamento e a apartação de diferentes, gerando
um quadro de anomia crônica?

Talvez a maior lição das reformas chinesas seja essa: não há contradição entre
Weber e Marx. A infraestrutura de fato produz os valores, princípios e a cultura de
uma civilização, ao mesmo tempo o ethos de um povo é definidor do modo de
produção possível que pode se instaurar num país.

Até que ponto a liberdade individual e os processos democráticos “atrasam” o


desenvolvimento? Essa questão é frequentemente discutida ao se considerar o
descompasso entre os avanços econômicos e sociais da China, mais homogênea e
dirigista, e da Índia, mais diversa e democrática. A questão é aplicável também ao
Brasil, onde é imperativo que os princípios da democracia se fortaleçam, jamais o
contrário.

Conclusão

Não valeria a pena buscarmos uma verdadeira aproximação com a China, a partir de
um reordenamento profundo de nossa política externa? Como vimos, no plano
prático, temos algum excedente de poder que interessa à China de forma estrutural,
nos setores da agropecuária e de energia. Para o Brasil, importa explorar como as
ferramentas tecnológicas e metodologias disponíveis hoje na China podem nos ser
úteis no enfrentamento dos desafios associados ao fortalecimento do nosso ethos: a
desigualdade e a intolerância. Ao mesmo tempo, o Estado brasileiro, seu sistema de
representação e as relações com o setor privado demandam uma reestruturação
urgente.

Não se trata aqui de construir uma imagem idealizada da China ou de sonhar com
uma aliança de natureza soterista. A China ainda apresenta severas limitações em
sua capacidade de influenciar o sistema internacional a partir de ferramentas
sofisticadas de soft power, entendido como o poder de moldar ou motivar
comportamentos de terceiros por meios seus valores, cultura e estilo de vida. A força
da homogeneidade étnica e do amálgama confucionista apresenta força de coesão
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interna, mas baixa potência de persuasão e aderência externa, o que dificulta sua
presença e ação internacional orgânica.

Mas é fundamental lembrar que a Quarta Revolução Industrial tem a China como
um dos motores de inovação e transforma radicalmente a maneira como vivemos,
convivemos e trabalhamos. Os avanços tecnológicos prometem fundir o mundo
mecânico e digital ao biológico. A velocidade e abrangência desta revolução nos
forçam a uma reconfiguração dos mercados, governos e sociedades e, mais
importante, a um reequilíbrio entre eles – algo que a China, melhor do que ninguém,
vem demonstrando saber fazer. Difícil negar: o experimento chinês é o maior e mais
bem sucedido evento de engenharia econômico-político-social jamais realizado no
planeta. Ou, em outros termos, a China tornou-se a maior máquina de redução de
pobreza e de inclusão já construída pela humanidade. Num futuro muito próximo,
tende a tornar-se a maior usina de inovação tecnológica do mundo.

Claro, as críticas oriundas do Ocidente e do Brasil são fartas. Bradam os liberais que
se trata de um capitalismo de Estado, excessivamente intervencionista, que
ulteriormente acabará por sufocar a inovação. Ativistas pró-democracia criticam a
onipresença de um partido único e o controle dos meios de comunicação.
Ambientalistas alertam para o enorme impacto ambiental trazido pelo crescimento
da China. Igualitaristas radicais dirão que o sucesso chinês é altamente
concentrador. Manifestantes protestam contra o tratamento dado às minorias. Na
perspectiva de valores universalistas, há fundamentos em todas essas críticas que
não podem ser descuradas. Mas como mencionado antes, o poder e a legitimidade
de um governo são sempre plurifacetados.

Em meios mais conservadores, quando confidencio a minha preocupação com o


aumento da desigualdade na China, a reação vem em disparo automático: "Melhor
ter ricos e pobres do que um mar de pobres". Conto até dez para não responder
com o estômago. Na hora que estou pronto para dizer algo já perdi o espaço da fala.
Concluo então comigo mesmo que, de fato, devemos olhar com respeito um povo
que conseguiu retirar centenas de milhões de pessoas da pobreza em poucas
décadas.

E como contraponto, nas economias avançadas do Ocidente, apesar das grandes


promessas que o novo paradigma tecnológico descortina em todas as áreas do
conhecimento, é desalentador verificar que, no plano da política, as novas
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tecnologias têm sido empregadas muito mais para fins distópicos. As democracias
em crise de representação são moucas aos fartos insumos de participação popular e
de escuta territorial disponíveis. Os partidos têm donos, fecham-se ao povo e abrem-
se ao poder corporativo, nas eleições e na formação de políticas.

As cidades – totalmente cegas às novas possibilidades de ordenamento territorial


dadas por soluções de big data – se expandem maculadas por produtos imobiliários
que não conformam um tecido urbano sadio, aumentando a segregação social e a
demanda por infraestruturas de alto custo ambiental. Mercados e governos
esquecem que é a cidade a principal fonte de gases de efeito estufa, o que torna
incontornável e urgente uma transição para uma organização espacial urbana
sustentável. No mundo digital, populações vêm sendo capturadas pela fabricação de
falsas informações e mecanismos que, pela introdução de filtros de viés
confirmatório, aprofundam a polarização e disseminam o ódio.

Na especulação final dessas reflexões, retorno ao tópico do relacionamento com os


chineses, deixando como mensagem central uma metáfora gráfica do que
poderíamos almejar nesta parceria: que, no contexto da Quarta Revolução Industrial,
o Brasil possa ser para a China o que a China foi para os Estados Unidos no contexto
da Terceira Revolução Industrial. Em termos práticos, tal imagem corresponderia a
uma aproximação à China, tendo como fulcro o investimento chinês em cidades,
infraestruturas e tecnologias urbanas que configuram hoje a Quarta Revolução
Industrial - big data, internet das coisas, robótica, inteligência artificial, bioengenharia,
em uma agenda de interesses recíprocos que nos coloque no caminho da Indústria
4.0 e da inclusão social pelo provimento maciço de bens coletivos urbanos.

Não consigo enxergar outro domínio da economia em que falha de mercado e falha
de governo ganhem mais concretude e com efeitos tão negativos do que no âmbito
da formação de preços da terra nas cidades, habitat da maior parcela das nossas
populações que, como resultado dessa dupla falha, se fragmenta em guetos
dominados crescentemente pelo ressentimento e ódio social.

Quem sabe então o problema central não seja a desigualdade, mas a exclusão?
Quem sabe, haverá então um caminho intermediário, que produza riqueza sem
gerar tanta exclusão e mais desigualdade? Ou que propicie mais inclusão com
igualdade sem produzir pobreza. Será que - acreditando que "a verdade está no
meio", conforme máxima de tantas tradições - uma política de inclusão pela via da
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distribuição maciça de bens coletivos urbanos não poderia constituir então a


convergência doutrinária entre capitalismo e socialismo, entre neoliberalismo e
neokeynesianismo?

O Brasil abraçou com grande atraso a Primeira e Segunda Revoluções Industriais.


Vinculou-se de forma precária à Terceira e corre hoje o risco de situar-se longe e à
margem da Quarta, como consumidor passivo, sem papel relevante nos processos
de inovação e produção de bens e de serviços da economia do conhecimento. Não
há mais tempo a perder.

O eixo de poder se desloca vigorosamente. Não cabe a nós um julgamento


maniqueísta das realidades surgidas em contextos histórico-culturais diferentes;
mas uma observação do mundo judiciosa e desideologizada é necessária, sempre
com o olho atento aos nossos interesses coletivos mais abrangentes.

A guerra "comercial" entre EUA e China apresenta hoje características de um conflito


estrutural de natureza permanente e abrangente, escalável para outros domínios da
vida internacional. (22) E nesse contexto a China volta a se aproximar da Rússia.
Lembremos que a criação original da República Popular da China é historicamente
inspirada e apoiada pela Rússia Soviética, e a aproximação sino-russa hoje em curso
tende a ganhar contornos de aliança estratégica de longo prazo, sem precedentes.

Dois aspectos saltam à vista no contexto dessa grande contenda. De um lado, os


EUA são nossos concorrentes nos setores em que apresentamos nossas principais
vantagens comparativas, sobretudo produtos agropecuários e energia. De outro, as
eventuais oportunidades que Washington poderia nos oferecer, no âmbito
diplomático, estão circunscritas a uma maior ou menor abertura comercial (e ainda
com grandes limitações impostas pelo Capitólio), numa negociação que não
contemplaria portanto a alocação de investimentos em setores que nos interessam,
domínio em que, inversamente, a diplomacia chinesa se movimenta em grande
escala e com ampla liberdade.

O que é então melhor para o Brasil? Uma aderência ao consolidado Consenso de


Washington ou ao emergente Consenso de Beijing? (23)

Para o Brasil cabe, afinal, adotar decisões estratégicas, de Estado. Uma parceria de
efetiva e especial cooperação com a China, de geometria variável, sem exclusivismos,
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sem exclusões apriorísticas de parceiros, abertas sempre a novas oportunidades, a


um só tempo (i) permitirá melhor inserção do Brasil no paradigma da Quarta
Revolução Industrial, (ii) apoiará a reforma do Estado, tanto no que diz respeito ao
necessário reequilíbrio entre poder político e poder econômico, quanto pela
disponibilização de ferramentas tecnológicas aplicáveis à gestão pública e (iii) nos
inspirará, pelo exemplo próprio, na busca de nossa identidade e ethos, sem
imitações.

Quem entre nós seria capaz de buscar uma nova inserção internacional, de garantir
o melhor acesso aos benefícios do novo paradigma tecnológico, reformar o Estado
instaurando um novo equilíbrio entre forças de mercado e de governo e, sobretudo,
promover a coesão social? Temos liderança à altura desse grande movimento? Tal
liderança só existirá se vier acima de qualquer coloração étnica ou partidária,
devidamente representando a maioria negra do país, nos conduzindo à grande
conciliação nacional e, quem sabe, à construção de parceria de longo prazo com a
China. O mais cedo possível…

P.S. … antes que o eixo de poder se desloque em função de aliança entre Beijing,
Moscou e Delhi, tendo a Rússia como a grande provedora de produtos
agropecuários e energéticos para os dois maiores gigantes populacionais do planeta.
Dado que o BRICS não passa hoje de fábula protocolar, restará o CRI. Nesse sentido,
transformar o BRICS em algo efetivo é portanto tema de elevado interesse
permanente para todos nós.

NOTAS

1.Ver The Oxford Handbook of Transformations of the State (OHTS) Eds. Stephan
Leibfried, Evelyne Huber, Matthew Lange, Jonah D. Levy, Frank Nullmeier & John D.
Stephens, 2015.

2.Numa visão econômica mais ortodoxa, ao liberar forças de mercado, a China


meramente retorna à sua condição "normal" de maior economia do mundo desde o
séc. X, posição que foi interrompida pelo advento da Revolução Industrial no séc.
XVIII. Nessa perspectiva, não haveria nenhuma excepcionalidade no processo de
crescimento econômico atual, apenas um retorno a uma suposta "normalidade".

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3.A crise do coronavírus em curso, embora grave e assustadora, é tomada aqui


como evento conjuntural que não mitiga a perplexidade gerada pelas reformas
chinesas ao longo das quatro últimas décadas.

4.O Pisa foi aplicado na China em quatro cidades: Shanghai, Beijing, Jiangsu and
Zhejiang. Embora represente amostragem parcial da realidade chinesa não deixa de
evidenciar os avanços alcançados no país.

5.A polarização do debate hoje tende a minimizar o papel da cultura e a imputar ao


centralismo político do PC Chinês as virtudes e vícios da China moderna. Para debate
aprofundado ver Culture Matters: How Values Shape Human Progress, de Lawrence
E. Harrison e Samuel Huntington (2001).

6.Familiarity promotes the blurring of self and other in the neural representation of
threat, de Lane Beckes, James A. Coan, Karen Hasselmo, in Social Cognitive and
Affective Neuroscience, Volume 8, Issue 6 (2013).

7.Em O multiculturalismo e a dialética do universal e do particular, de Celso


Frederico, Estudos Avançados vol.30 no.87 (2016), o autor indaga como diferente
culturas podem conviver no Estado democrático de direito. Estudos Avançados vol.
30 no.87 (2016)

8.Cifra citada em The Better Angels of Our Nature, de Steven Pinker, e apresentada
como a maior atrocidade da história.

9.Adam Smith in Beijing: Lineages of the Twenty-first Century, de Giovanni Arrighi


(2007).

10.Ver Veto Points, Policy Preferences, and Bureaucratic Autonomy in Democratic


Systems, de Thomas H. Hammond (1997).

11.Seria possível um modelo de transparência na infraestrutura?, Philip Yang, Nexo


Jornal, 22.3.2019

12.O que fazer do Minha Casa, Minha Vida, Philip Yang, Folha de S. Paulo, 12.2.2019.

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13.The Future is Asian: Commerce, Conflict and Culture in the 21st Century, de Parag
Khanna (2019).

14.Nas palavras de Rubens Ricupero, "Nem antes, nem depois, surgiu figura-símbolo
tão perfeita dos valores e das aspirações que os brasileiros imaginam corresponder
à 'ideia de Brasil' ", in A diplomacia na construção do Brasil: 1750-2016 (2017).

15.O dia em que adiaram o Carnaval: política externa e a construção do Brasil, de


Luís Cláudio Villafañe G. Santos (2010).

16.Evidentemente, além da agropecuária e energia, o Brasil apresenta vantagens


comparativas em outros setores, a mineração sendo talvez o exemplo mais
evidente. No entanto, segurança alimentar e energética constituem temas de
interesse muito mais "visceral" para os chineses do que o das commodities minerais.

17.The State of the World’s Land and Water Resources for Food and Agriculture, FAO
(2010).

18.Lenin’s NEP and Deng Xiaoping’s Economic Reform, de Wei Xiaoping, in:
Rockmore T., Levine N. (eds) The Palgrave Handbook of Leninist Political Philosophy.
Palgrave Macmillan, London (2018)

19. Protestant Ethic and the Spirit of Capitalism, Max Weber (1905).

20.A Contribution to the Critique of Political Economy, Karl Marx (1859)

21.Why has Japan 'succeeded'? Western Technology and the Japanese Ethos, de
Michio Morishima (1981)

22.Enquanto concluo este texto, o Presidente Trump pressiona países mundo afora
a banirem a entrada da Huawei nas concorrências voltadas para a implantação da
tecnologia 5G. O que prevalecerá no mundo? O livre mercado, comércio
administrado, política industrial ou trumpismo entreguista?

23.Ver The Beijing Consensus, de Joshua Cooper Ramo (2004) e Goodbye


Washington Consensus, Hello Washington Confusion?, de Dani Rodrik (2006).

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Philip Yang, empreendedor e ativista urbano, fundador do Instituto Urbem;


mestre em administração pública por Harvard e graduado pelas academias
diplomáticas do Brasil e da Suíça; serviu nas Embaixadas do Brasil em
WashingtoneBeijing,entre1995 e 2001.

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