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Alef Augusto Martins, R.A.

95640, Ciências Sociais Noturno

O escravismo-patriarcal e sua influência no Ethos brasileiro

Hoje, reconhecemos que a estrutura social brasileira está repleta de rachaduras que
dificultam o desenvolvimento pleno de uma grande parcela da população. Podemos especificar
os negros e as mulheres como os mais prejudicados pelo desenvolvimento histórico social
brasileiro. Em nossos dias ainda vemos nas populações mais pobres uma predominância de
negros, e as mulheres ocuparem a maioria de empregos e setores de menor importância ou
quando não se ocupam exclusivamente do afazeres domésticos, como algo que está escrutado
em nosso ethos social. Evidente que essa ordem de coisas não se processou da noite para o dia,
quando olhamos para tais fenômenos sociais não podemos perder vista seu desenvolvimento
histórico, para com isso empreendermos uma correta análise e obter sua devida importância.
Portanto, como compreender o complexo entrelaçamento histórico que nos levou as situações
exemplificadas acima? Alguns autores e estudiosos do desenvolvimento social brasileiro nos
fornecem caminhos para começarmos a empreender essa tarefa. E o primeiro passo importante
é afirmar o período escravocrata, mais especificamento em seu final, como o momento decisivo
para o desenvolvimento social posterior do Brasil — seguimos a aqui os passos analíticos de
Caio Prado Jr, pois esse período interessa por dois motivos, primeiro: “ele nos fornece, em um
balanço final, a obra realizada por três séculos de colonização e nos apresenta o que nela se
encontra mais característico e fundamental”. Segundo: “constitui uma chave, e chave preciosa e
insubstituível para se apanhar e interpretar o processo histórico posterior“.

O Brasil, como demonstra Caio Prado Jr. em “Formação do Brasil contemporâneo”, no


inicio teve uma colonização de caráter extrativista, como base fundamental o trabalho escravo
dos povos negros, diferentemente das regiões temperadas, principalmente da América do
Norte, onde a colonização se deu de modo diferente. Uma vez a sociedade colonial brasileira
assentada com essas bases, criou-se uma estratificação social rígida sem grandes possibilidades
de ascensão social à pessoa negra. Por outro lado, a mulher submetida a um sistema
patrimonialista-patriarcal, era impedida de participar dos espaços de decisão política, tinha
baixa ou nula instrução, e era confinada a supervisão do lar, como argumenta Heleieth Saffiott
em seu livro “A mulher na sociedade de classes”. O importante notar é que a partir das
observações desses autores podemos categorizar o período mencionado como escravista-
patriarcal, uma vez que as bases econômicas era assentadas no trabalho escravo e a moral
política era regida por uma ideia de tradição da superioridade masculina.

A abolição da escravidão em 1888, possibilitou ao desenvolvimento social brasileiro


novas bases e condições para que os grupos sociais, aqui problematizados, pudessem se
introduzir na estrutura social de outra maneira. Para Clóvis Moura, a abolição significou “O
fato histórico-social mais importante para a formação brasileira”, pois além de libertar todo um
povo do cativeiro do trabalho forçado, também possibilitou que o Brasil se desprendesse de
formas que impediam seu potencial desenvolvimento, uma vez que o escravismo

“atuou como elemento de entrave no desenvolvimento interno do Brasil, a instituição que


permitiu que a economia de tipo colonial pudesse chegar aos níveis de exploração a que chegou,
descapitalizando permanentemente aqueles setores que poderiam compor uma economia de consumo
interno, em favor de uma economia de exportação.”

Mas como aponta Caio Prado Jr, a abolição “não veio mais que reconhecer uma situação de
fato”, pois para este autor o evento que realmente significou possibilidade de mudanças
profundas foi a proibição do tráfico negreiro, já que o que se seguiu foi uma intensa liberação de
capitais e surgimento de grandes empreendimentos e o definhamento do trabalho escravo no
Brasil. Fora a controvérsia sobre qual o exato evento foi decisivo para o efetivo de
desenvolvimento brasileiro em direção a sociedade de mercado, o que vemos é uma série de
mudanças que fazem a estrutura social brasileira, aos poucos, mudar de patamar e trazendo
consequências diversas para os grupos aqui estudados.

Clóvis Moura observa que o negro não viveu estático e passivo por todo período
escravista, em seu livro “Rebeliões na senzala” demonstra que os negros participavam
ativamento dos movimentos e rebeliões e nos movimentos emancipatórios via grandes
possibilidades abolicionistas. O em seu livro conclui que as rebeliões escravas dinamizava a
sociedade escravista e o quilombo sendo a referência que negava todo o sistema possibilitava o
vislumbre por uma nova organização social, mesmo que inconscientemente. Por outro a lado, a
situação da mulher foi bastante diferente, como mencionado anteriormente, a pouca instrução e
o confinamento não possibilitou à mulher brasileira um horizonte de grandes mudanças, por
isso mesmo Heleieth Soffioti chega a afirmar que a mulher era mesma a raiz do
conservadorismo na sociedade. Descreve Saffioti: a mulher
“Permaneceu, pois, alheia à agitação da opinião pública urbana da últimadécada do
Império em torno da abolição da escravatura. Como o movimento abolicionista fermentou nos meios
letrados, a mulher brasileira não pôde sequer ver nele a oportunidade para um enfoque crítico de sua
condição existencial.”

Como a relação com o abolicionismo e com a própria abolição se deu de maneira


diversa para os negros e para as mulheres, as consequências do pós abolição não poderia ser
diferente. Clóvis Moura destaca que no pós abolição o negro não saiu da condição de escravo e
passou à condição de trabalhador assalariado livre, mas excluído do processo de assalariamento
da sociedade, pois o trabalho do branco imigrante cada vez mais foi substituindo o trabalho
negro em setores importantes da economia, ocasionando assim uma estagnação social do negro
no Brasil pós abolição. Com as mulheres podemos observar, segunda Saffioti, uma mudança de
patamar, claro que não foi radical, mas possibilitou algumas mudanças importantes. Com o
desenvolvimento urbano, a desagregação da família consanguínea e o desenvolvimento da
família conjugal, maior atenção à instrução da mulher e a abertura de maiores contatos sociais
significou um avanço importante, contudo a autora observa que mesmo com a abertura que a
urbanização possibilitava não significou a total independência da mulher e protagonismo
econômico, pois antes da abolição a força de trabalho da mulher era considerável em setores
importantes da economia, embora fosse por meio da instituição escravista, agora, com o
desenvolvimento industrial a mulher foi perdendo espaço, mesmo que algumas mulheres por
alcançarem ser protagonismo, para a autora, isso não passa de mera ilusão, uma vez que a
participação e protagonismo da mulher na economia se reduziu e o trabalho doméstico se torna
principalmente atividade da força de trabalho feminina.

Podemos, portanto, concluir o quando é de fundamental importância os caminha


deixados por esses autores para o entendimento da situação da estrutura social brasileira. Eles
nos mostram como a constituição do colonialismo assentou bases para a instituição escravista-
patriarcal. A proibição do tráfico negreiro e a abolição em 1888, foram de fundamental
importância para mudanças estruturais fossem realizadas, apesar do impacto não ter sido
imediato e uniforme para os grupos aqui apresentado. Com isso podemos ter uma ideia de como
a estrutura social brasileira está entrelaçada com o passado, e este que ainda pode ser visto em
muitas situações do nosso cotiano, para Clóvis Moura: “os quatrocentos anos de escravismo
foram definitivos na plasmação do ethos do nosso país”,

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