Trata-se de um livro que procura destacar a pertinência da reflexão histórico-cultural na
psicoterapia, principalmente a partir de Vigotsky, tanto para levantar críticas ao desenvolvimento histórico desse campo, como para propor algumas possibilidades de reflexão sobre o mesmo. discute criticamente o desenvolvimento da psicoterapia, destacando suas limitações ontológicas e as possibilidades de resgatá-lanuma leitura que inclua suas dimensões culturais e sociais apresenta uma proposta inovadora de discussão com a perspectiva histórico-cultural, realçando tanto o impacto desta na reflexão sobre apsico terapia, como a contribuição que a noção de subjetividade pode possuir neste campo de reflexão teórica e prática. O último capítulo é destinado a um diálogo com perspectivas atuais da psicoterapia pós-moderna, como o construtivismo e o construcionismo social, principalmente em termos da noção de sentido subjetivo e sujeito. Em seu primeiro capítulo, é destacado que um dos principais problemas epistemológicos da psicologia, que teve conseqüências diretas na prática psicoterápica, foi a inexistência de uma definição ontológica sobre a psique. Nas diferentes expressões do pensamento psicológico, muito influenciadas pelo fisicalismo, pelo metodologismo e pela ênfase no patológico, a psique surge ligada a alguma outra dimensão do saber, de caráter invariante e universal, não sendo reconhecida em sua especificidade. Assim,inspirando-se no enfoque histórico-cultural, o livro propõe a noção de subjetividade como uma alternativa de reconhecimento da psique como um processo subjetivo, construídohistórico e socialmente a partir das ações so-ciais do sujeito, ao invés de uma entidade reificada e transcendentedistante das trocas sociais do cotidiano. Na sua revisão crítica de diversos autores da psicologia,o livro destaca que, malgrado a evolução que se deu no século XX, a definição ontológica da psique ainda permanece em aberto no seio de muitos movimentos psicológicos. Assim, reconhecendo um desenvolvimento acentuado desde autores como Freud, que a concebiam d entrode parâmetros universais e essencialistas, a autores comoCastoriadis, Guattari, Elliot e, para quem já se configuramdimensões emocionais e sociais mais amplas, o problemaainda não se resolve, uma vez que não houve uma defini-ção precisa, com o estudo de seus processos constitutivos esuas articulações com o complexo mundo sócio- cultural. Fugindo da perspectiva comum de restringir Vigotsky àpsicologia do desenvolvimento, no segundo capítulo, a obradestaca que a abordagem histórico cultural é bastante pertinente para a psicoterapia devido às possibilidades queabre em termos de uma forma complexa de pensar. Fazendo uma interessante revisão da psicologia soviética, queno Ocidente muitas vezes é reduzida à teoria da atividadeou a perspectivas discursivas, ressalta o potencial da noçãode sentido de Vigotsky, que não se prendeu a um simples processo de mediação, mas a uma integração complexa deelementos cognitivos e emocionais relacionados à personalidade do sujeito como um todo. Daí seu autor evolui para sua própria noção na qual não mais o cognitivo, maso simbólico se integra ao emocional numa processualidadeque vai além do intrapsíquico e integra a subjetivação dosprocessos sociais em que o sujeito toma parte. Essa integração – nomeada pelo autor como configuração – está nabase da construção de sentidos do sujeito e relacionada, de uma forma não linear, aos registros que se dão na sociedade e na cultura. É interessante notar como essa proposta seaproxima de uma forma complexa de pensamento, como a de Morin que é discutida pelo autor, uma vez que integra osujeito, com seus processos internos, numa dialética sóciocultural sem dissolver ou dicotomizar as diferentes dimensões envolvidas. Por buscar integrar tais processos numaperspectiva sistêmica de definir a subjetividade, sua proposta se apresenta mais abrangente do que outras já discutidas em termos de complexidade (Delourne, 2001; Pagès,1993) com as quais, infelizmente não estabelece diálogopropõe, já em seu terceiro capítulo,a subjetividade como um conjunto complexo de sistemasorganizados de forma configuracional caracterizado poruma processualidade emocional e uma geração de sentidosincessante, ele apenas busca oferecer condições para romper com a perspectiva de patologia dominante nas práticaspsicoterápicas atuais, onde a noção de transtorno tem ganhado cada vez mais espaço.A proposta psicoterapêutica aqui trazida confere umaênfase especial à noção de sujeito, de maneira que o paciente assume essa condição quando se posiciona de formaativa na terapiaue a caracteriza como fundamental.Em seu diálogo, já no quarto capítulo, com autores construtivistas, esta obra ressalta a pertinência dealgumas de suas propostas, como a construção própria dosujeito, a criatividade técnica, e o papel ativo do sujeito noprocesso terapêutico. Ao mesmo tempo, não deixa de destacar que a perspectiva racionalista neles presente os levaa uma concepção de significado como algo intencional, oque difere radicalmente da noção de sentido, cujaemocionalidade, freqüentemente, está além da percepçãodo sujeito. Esse racionalismo, inspirado em boa partepelas escolas cognitivistas, também conduz o terapeuta auma postura de explicitar os momentos significativos damudança do sujeito, o que é criticado nesta obra, na qual amudança advém das próprias produções subjetivas dosujeito e não depende linearmente das interpretações doterapeuta.Já em seu diálogo com outra perspectiva recente, o construcionismo social, o livro não deixa de ressaltar o valor desuas contribuições, mas se apresenta de forma muito maiscrítica. Apesar de destacar sua proximidade no que se refere ao diálogo e a valorização das construções singulares dosujeito, ressalta a contradição desse movimento que atacaenfaticamente as posturas realistas, mas, ao mesmo tempo, acaba por reificar o discurso, como ocorre com freqüência em Gergen.