No mesmo domingo, pelas onze horas Mariana viu uma verdadeira procissão de traineiras se aproximando da ilha. E ouvia gritos... Correu ao galpão onde estava Protásio e alertou-o. O ilhéu, apreensivo, com a aproximação dos barcos, resolveu precatar-se. E foi ao quarto preparar sua espingarda, que pronta para o uso, deixou sobre a mesa da sala. E saiu a receber os visitantes. Entretanto, não teve mais dúvidas quando, ao ficarem mais próximas as embarcações, ouviu os gritos de ‘abaixo os boches’, ‘fora com os bruxos’, ’morram os excomungados’, ‘quintas colunas’, e tantas outras imprecações. Na proa da primeira traineira, conheceu o Candinho da Ernestina. ‘Sem mais grê-grê prá dizer Gregório’, a turba foi desembarcando e quebrando o que via pelo caminho da casa. Mariana correu para o quarto e Protásio dispensou-se de maiores explicações. Foi à sala, tomou a espingarda e plantou-se à porta da casa. Ao ver a arma, pararam todos. - Que querem vocês? – perguntou Protásio em vos alta. - Que vocês vão embora. Não queremos feiticeiros e alemães, quintas colunas perto da nossa vila. - Mas que há? Sempre fomos amigos. Tratamos bem a todos, com o maior carinho que pudemos. Tanto eu como a Mariana. E depois, eu não sou alemão. Sou brasileiro como vocês. Olhem! Sou manco porque recebi uma bala na Revolução Constitucionalista. Brigando como soldado do Brasil! Qual de vocês pode dizer o mesmo? - É! Mas vão ver o que vocês fizeram com os filhos da Dona Quinda... - Eu já sei do caso. Deveriam é ter olhado o pão que as crianças comeram A Mariana, que é agrônoma, disse que o fungo constatado nos guris só dá em pão. Nunca poderia ter ido com os chás que ela receitou à Dona Quinda. Nunca se soube de onde veio o tiro que acertou o Protásio. Quando ele caiu, todos correram para casa e para os galpões, e, a pauladas e faconaços, matavam as cabras ‘endiabradas’, as ovelhas, e os perus; quebravam os móveis e pisoteavam tudo quanto encontravam. Bem que a Mariana, desesperada em atender Protásio, clamava-lhes que, pelo amor de Deus, não fizessem aquilo tudo. Mas, ainda foi pior, pois alguém a acertou na cabeça, gritando: “Morra bruxa!” Quando acordou, estava já sozinha na ilha, Protásio morto a seu lado, e a casa e galpões já em rescaldo, ainda ardendo em pequenas fogueiras. Tudo se perdera. Os animais jaziam despedaçados. Os móveis queimados. As lanchas afundadas. Tudo destruído.