Você está na página 1de 28

O Trabalho com "Modos" na Terapia do Esquema

PÓS GRADUAÇÃO EM TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

O TRABALHO COM MODOS NA TERAPIA DO ESQUEMA

O TRABALHO COM MODOS NA TERAPIA DO ESQUEMA

RESUMO
Neste artigo, foram detalhadas e analisadas as estratégias vivencias e cognitivas aplicadas na terapia do
esquema, em especial o trabalho com "modos de esquemas", que constituem numa prática psicoterápica
avançada e que representa a essência da linha de trabalho da Terapia do Esquema criada pelo Dr. Jeffrey
Young, podendo ser aplicada não apenas no tratamento de transtornos do Eixo I e II, mas como em
qualquer tratamento no dia a dia da prática clínica. O trabalho com modos, portanto, se constitui numa
poderosa ferramenta e estratégia de trabalho para o psicoterapeuta, merecendo com isso um estudo à parte
e um entendimento mais profundo do seu conceito. O trabalho com modos é considerado uma inovação, um
avanço, um passo além da abordagem cognitivo-comportamental tradicional, pois permite ao psicoterapeuta
mobilizar um arsenal de diferentes práticas terapêuticas como a Psicodinâmica, a Gestalt, a TREC (Ellis), a
TCC (Beck), a Terapia Dialética Comportamental, o Mindfulness, a Hipnoterapia, a Terapia do Afeto entre
outras. Na verdade, qualquer técnica psicoterápica pode ser utilizada no contexto do trabalho com os modos
de esquemas. Vai depender da característica individual do paciente, sua resposta e evolução ao tratamento
e também a experiência do psicoterapeuta. Além dessa vantagem, uma outra vantagem de se trabalhar com
modos de esquemas é que obriga o psicoterapeuta a rever detalhadamente o histórico familiar do paciente,
em especial a relação parental remota, suas primeiras experiências de vida, a dinâmica familiar e social na
infância, suas frustrações e necessidades emocionais não atendidas, os quais, no âmbito conceitual da
terapia do esquema, são os processos geradores dos esquemas e consequentes transtornos do paciente.
Portanto, trabalhar com modos de esquema dentro do conceito da terapia do esquema é uma abordagem
completa, efetiva e profunda. A terapia do esquema da grande ênfase e desenvolvimento na habilidade do
terapeuta na questão que envolve a relação terapêutica com o paciente. Essa habilidade é quase uma peça
fundamental para o sucesso dessa abordagem psicoterapêutica, além de tirar o psicoterapeuta e o paciente
da suas respectivas  zonas de conforto.
Palavras-chave: Esquemas. Modos. Psicoterapia        

                                                     
1.    INTRODUÇÃO
Este trabalho foi baseado predominantemente na concepção teórica do Dr. Jeffrey Young descritas em seus
dois livros, além da colaboração e inspiração de diversos sítios, vídeos e livros acerca do tema,
principalmente no que diz respeito a ideia dos modos como partes independentes, estanques e até
contraditórias que compõe a personalidade do indivíduo. Sendo assim, se destacam o trabalho do Dr. Peter
K. Gerlach, membro do NSRC (National Stepfamily Research Center) e sua experiência de mais de 30 anos
como psicoterapeuta familiar onde o trabalho com “subselves”, “subpersonalidades”, frustrações e feridas
emocionais na infância que influenciam os comportamentos neuróticos atuais do indivíduo, se relacionam
perfeitamente com o trabalho do Dr. Jeffrey Young na Terapia do Esquema, em especial o trabalho com os
modos. Também serviu como inspiração e embasamento teórico a experiência e ideias do Dr. Jonh Rowan.
Dr.Rowan é um eminente psicoterapeuta britânico que criou a base teórica da “terapia transpersonal” que
diz respeito à desconstrução das nossas “máscaras”, as quais ele classifica como  “subpersonalidades” o
que também se coaduna com a base do trabalho com modos na Terapia do Esquema do Dr. Jeffrey Young. 
  É ressaltado que a abordagem com os modos para situações do dia a dia, fora do contexto da
psicoterapia, talvez seja um dos principais legados, depois, evidentemente, da cura dos esquemas, haja
visto que os pacientes ganham importante expertise e experiência suficientes para trabalhar com os modos
de forma autônoma e independente, lidando com seus desafios e experiências de vida, adquirindo
considerável aumento da autoconsciência, maturidade psicológica e inteligência emocional.   
Nos capítulos, primeiramente, será dado ênfase e profundidade ao conceito de modos dos
esquemas e suas diversas nuances e desdobramentos começando pela definição, passando pelas
classificações e funcionamentos de cada modo. Em seguida, será apresentado um exemplo de caso clínico
real onde foi aplicado e vivenciado pelo psicoterapeuta o conceito do trabalho com modos, demonstrado
assim sua efetividade, bem como as dificuldades naturais da aplicação dessa abordagem. São sugeridas
correções de rumos das sessões diante dos problemas enfrentados. Foram detalhados e aprofundados
cada passo ou procedimento, assim como as reações da paciente em questão e sua evolução gradativa.

2.    ORIGEM E DEFINIÇÃO DE MODOS


2.1 Origem
O conceito de modos de esquema foi desenvolvido por Jeffrey Young e equipe
(Young,2008),inicialmente para tratar pacientes portadores de transtorno de personalidade borderline tendo
em vista o número expressivo tanto de esquemas como de respostas aos esquemas apresentados por
esses pacientes, além da característica instabilidade emocional. As constantes oscilações se mostravam
muito problemáticas no desenvolvimento e progresso da terapia. Ora os pacientes se mostravam motivados
e comprometidos, ora indiferentes e rebeldes, ora deprimidos, ou nutriam intensa raiva, para num momento
seguinte, cambiar para um distanciamento. Esse conjunto de fatores se mostrou muito difícil de lidar
pelo psicoterapeuta comprometendo a efetividade dos resultados. 
A conclusão é que se precisava agrupar e definir melhor os esquemas para torna-los
mais manejáveis na terapia. 
         2.2 Definição de modo
É o conjunto de esquemas adaptativos ou desadaptativos com seus respectivos estilos de
enfrentamento que são ativados no indivíduo em determinado momento os quais se agrupam em partes do
self. O modo não é a pessoa como um todo é uma “parte” dela. Pode ser denominado como “sub-self” ou
“subpersonalidades” (ROWAN, 1993).
Quando ouvimos expressões do tipo: “meu lado criança”, “minha parte emotiva”, “meu lado crítico”,
etc, isso, na verdade, são os modos ativados na experiência. Além disso, modos são estados
emocionais, cognições e reações físicas ativados ao mesmo tempo (pelos esquemas) como resposta a
determinadas experiências e situações de vida, as quais somos supersensíveis. Em síntese, os modos são
respostas aos esquemas. O estado emocional e consequente comportamento que apresentamos em
determinados momentos e situações se chamam “modo do esquema”. Na linguagem psicodinâmica os
modos são “entidades” com personalidade própria e característica autônoma, independente e estanque
tanto dos outros modos como do self. Esses modos não estão conscientes uns dos outros e podem ter
diferentes nomes, apelidos, idades, gêneros, histórias, memórias e funções
Modos são como tijolinhos de diversos tamanhos, espessuras, cor e característica que compõe o
self como um todo, como um mosaico disforme ou um quebra-cabeças. Muitas dessas peças não se
encaixam deixando o retrato desse self disforme e irreconhecível. O indivíduo psicologicamente saudável
tem modos reconhecíveis e identificáveis, que funcionam harmônica e funcionalmente. São flexíveis,
conscientes, coerentes e não dissociativos, compondo com harmonia um self unificado e bem definido. O
funcionamento disfuncional dos modos faz com que eles sejam rígidos, fortes, inconscientes e dissociados
do self, semelhante a um indivíduo com transtorno dissociativo de identidade. Esses modos são
desarmônicos e caracterológicos.
Quando um indivíduo tem um esquema, não significa que ele esteja ativado o tempo todo, portanto,
os modos podem ficar “hibernados” dependendo das condições ambientais e de vida favoráveis a não
ativação dos gatilhos dos esquemas.
Cada paciente exibe determinados modos de esquemas característicos dos seus esquemas
nucleares e secundários os quais são agrupados nesses modos.     Muitas vezes esses modos são
contraditórios e entram em conflito dependendo do ambiente e contexto vivido pelo paciente. Exemplo: um
paciente com esquema nuclear (principal) de defectividade cuja resposta é o da “criança vulnerável”
(resignação) ativado apenas para relacionamentos. O paciente fica carente, sofrido, inseguro. Entretanto, no
contexto profissional, esse mesmo paciente apresenta um outro modo (criança exemplar), hipercompesando
o esquema de defectividade, criando um esquema secundário subjacente de arrogo/grandiosidade ou busca
de aprovação e reconhecimento.  Sendo assim, no ambiente de trabalho o paciente se comporta de modo
confiante, arrogante e “exemplar”, totalmente oposto ao que costuma operar fora do trabalho. A situação
ficaria ainda mais confusa, conflitante e bizarra caso esse mesmo paciente se relacionasse afetivamente
com alguém do seu ambiente de trabalho, parecendo sofrer de transtorno dissociativo de identidade.
Os modos dos esquemas podem ser adaptativos, funcionais ou desadaptativos, disfuncionais.
Modo desadaptativo ou disfuncional se apresenta como respostas de enfrentamento que provocam
emoções desagradáveis e comportamentos autoderrotistas que dominam por completo a personalidadedo
indivíduo. Em qualquer momento ou situação, alguns dos nossos esquemas e respostas a esses esquemas
podem estar ativos ou inativos. Vai depender de qual situação que ativará ou não o gatilho de um esquema
específico. Consequentemente, o nosso humor está diretamente atrelado a essa condição. Dizemos que
estamos operando no “modo do esquema” quando esses gatilhos tiverem sido ativados.
            O trabalho com modos visa a ajudar os pacientes a cambiar as respostas disfuncionais aos
esquemas ativados para modos mais funcionais e adequados, mas isso leva tempo, esforço, habilidade do
terapeuta além de paciência, comprometimento e motivação do paciente. É travada uma batalha contra os
esquemas e suas respectivas respostas disfuncionais. O objetivo final da terapia do esquema no trabalho
com os modos é adquirir consciência psicológica (Young,2008). O terapeuta ajuda os pacientes a identificar
os seus esquemas ao nível intelectual e emocional o que envolve recuperar e trabalhar as memórias de
infância, emoções, reações físicas, cognições e estilos de enfrentamento para que os pacientes aprendam a
exercer controle sobre suas respostas e as tornem mais funcionais e “ecológicas” no sentido de coerência
com a situação e o ambiente.
A terapia do esquema na sua estratégia cognitiva e vivencial onde o trabalho com modos é a
principal “arma” no combate aos esquemas disfuncionais, cria novos caminhos e sinapses cerebrais no
córtex pré-frontal possibilitando um controle consciente efetivo das reações emocionais amigdalianas onde
as experiências que causaram os esquemas foram gravadas, enfraquecendo essas memórias, emoções,
sensações corporais, cognições e comportamento associados a eles.
Não é possível eliminar os esquemas a não ser que as memórias remotas fossem apagadas como
no filme “Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças”.
Em resumo, os modos variam de um indivíduo para outro em várias dimensões (Young, 2008, p.53):

Dissociado < ====>  Integrado


Não reconhecido  <====>  Reconhecido
Desadaptativo <=====>  Adaptativo
Disfuncional <=====>  Funcional
Extremo  <=====>  Moderado
Rígido  <=====> Flexível
Puro  <=====> Mesclado

No indivíduo equilibrado, o modo “adulto saudável” é mais forte, frequente e presente e pode
moderar e curar modos disfuncionais. Por exemplo, quando sentem raiva, o modo adulto saudável impõe
um comportamento adequado e equilibrado, impedindo que as emoções saiam de controle. Por outro lado,
pacientes com transtorno de personalidade borderline, por exemplo, geralmente tem um modo adulto
saudável fraco de forma que quando o modo criança zangada é ativado o comportamento fica incontrolável.
Young identificou dez modos de esquema agrupados em quatro categorias(Young,2008):

 Modos criança: criança vulnerável, criança zangada, criança impulsiva/indisciplinada, criança feliz
 Modos enfrentamento disfuncional: o capitulador complacente, o protetor desligado e o
hipercompensador
 Modos pais disfuncionais: pai/mãe críticos e exigentes e pai/mãe punitivos
 Modos adultos saudáveis.

Na terapia, podemos, em conjunto com o paciente, dar apelidos a cada um dos modos.  O modo
criança zangada pode ser apelidada de “modo Pit Bull”. A criança vulnerável pode ser o “modo menina
carente”.
O objetivo do trabalho com os modos é acessar a criança vulnerável onde residem os esquemas
nucleares: a criança abandonada, a criança abusada, a criança rejeitada ou a criança privada e fazer a
reparação parental liberando a raiva, a mágoa, a frustração e o ressentimento recalcados causadores dos
esquemas, por intermédio do modo adulto saudável, promovendo a cura.
A criança zangada é a parte do self que está com raiva por não ter tido suas necessidades emocionais
atendidas e com isso age com base nessa raiva sem medir as consequências.
A criança impulsiva/indisciplinada também não mede as consequências de seus impulsos e desejos do
momento e age de maneira irresponsável e negligente tanto para o si mesma como para outros.
A criança feliz é aquela cujas necessidades emocionais básicas foram atendidas satisfatoriamente.
Cada modo e suas respectivas respostas de enfrentamento costumam se manifestar em um ou mais
grupos de esquemas, por exemplo, no modo “criança vulnerável” (o mais problemático e objeto de trabalho
terapêutico), a sensação é de desamparo, impotência e vitimização. A “criança” se mostra assustada, triste,
ansiosa e frágil. Nesse modo, podem ser ativados vários esquemas ao mesmo tempo, em cadeia, como o
esquema de defectividade, abandono, privação emocional, vulnerabilidade. Pacientes bordeline costumam
apresentar essa condição.
A criança zangada tem muita raiva acumulada e reprimida e este modo pode ativar esquemas de
subjugação (hipercompensado), postura punitiva, privação emocional, arrogo e grandiosidade.

3.    MODOS DE ENFRENTAMENTOS DISFUNCIONAIS

São três os modos de enfrentamento disfuncional: o capitulador complacente, o protetor desligado e


o hipercompensador (Young,2008).
Esses três modos correspondem aos três estilos de enfrentamentos dos esquemas; resignação,
evitação e hipercompensação. O nome dos modos foram alterados para “capitulador complacente”, por
exemplo, ao invés de “modo resignação” o que aparentemente seria mais natural, para justamente
evidenciar o apelido ao comportamento e sentimento específico. 
O capitulador complacente corresponde a criança vulnerável, passiva e desamparada que se
submete ao esquema (“veste a carapuça”) e também aos outros.
O modo protetor desligado foge do desconforto provocado pelo esquema ativado, desligando-se
psicologicamente do sofrimento, seja abusando do álcool, drogas, se auto-estimulando, evitando as
pessoas, se afastando emocionalmente ou utilizando outras formas de fuga.
O modo hipercompensador reage ao esquema ativado tentando refutá-lo através de um
comportamento disfuncional, excessivo, exagerado e desproporcional seja confrontando as pessoas,
maltratando-as, controlando-as ou rejeitando-as : “não serei um fracasso”, “jamais serei abandonado ou
rejeitado”, “contra tudo e contra todos, eu vencerei”.
Seja qual for o modo de enfrentamento, todos acabam fortalecendo e perpetuando os esquemas.
Os modos de pais disfuncionais são pai/mãe punitivo que pune um dos modos criança abusada,
criança zangada, criança impulsiva por se comportarem mal.
O outro modo é pai/mãe exigente que pressiona a criança a cumprir padrões elevados e inflexíveis
de conduta e resultados, obrigando-a a se tornar “exemplar”, “perfeita” e “cumpridora dos deveres” e, se
possível, excedendo as expectativas. 

4.    QUANDO USAR A ABORDAGEM BASEADA EM MODOS


Dr. Jeffrey Young (Young, 2008) sugere que o trabalho com modos de esquemas se mostra efetivo quando
aplicado nas seguintes condições:

A.Quando a terapia parece estagnada e não se consegue quebrar a evitação ou hipercompensação em


relação aos esquemas nucleares e subjacentes. O paciente se mostra muito rígido e fixado aos
padrões de comportamento atinentes aos seus esquemas.
B.Quando o paciente apresenta um comportamento demasiadamente autopunitivo e autocrítico
indicando que o mesmo modelou (internalizou) um comportamento disfuncional do pai/mãe. Este
modo pune, corrige e critica o paciente praticamente o tempo todo. Dar nome ou apelidar os modos,
neste caso chamando-o de “pai/mãe sargentão”, por exemplo, ajuda sobremaneira a criar um
distanciamento entre as partes do self do paciente, como o modo adulto saudável e este modo
disfuncional.
C.Quando dois ou mais modos entram em conflito e desacordo aparentemente insolúvel ou assumem
posições antagônicas criando forte embaraço, confusão e problemas funcionais ao paciente. Neste
caso, é desenvolvido nas sessões diálogos entre os modos de forma a criar um “acordo entre as
partes”, tendo o modo adulto saudável, desde que bem desenvolvido, atuando como “mediador”.
D.E quando o paciente apresenta frequentes flutuações de humor e comportamento, característica de
pessoas com transtorno borderline.
E.
Entretanto, na prática clínica, o trabalho com modos pode e deve ser usado independente dessas
condições, haja visto sua extrema efetividade e resultados relativamente rápidos e permanentes. A
estratégia é a de psicoeducar o paciente de tal sorte que ele entenda todo mecanismo e dinâmica tanto dos
seus esquemas, como dos estilos de enfrentamento e os respectivos modos, a ponto de discutir de igual por
igual com o psicoterapeuta sobre estratégias de combate e enfraquecimento dos mesmos, aliando tudo isso
com a prática do trabalho com modos nas sessões, empregando técnicas de Gestalt, Terapia
Psicodinâmica, estratégias cognitivo-comportamentais de acordo com a resposta do paciente, construindo
um entendimento intelectual completo, bem como um distanciamento emocional e uma não identificação
com os seus modos e esquemas (egodistonia), tratando-os como se fossem uma parte estanque e não
desejável da sua personalidade.

5.    DEFINIÇÃO E DETALHAMENTO DOS MODOS MAIS COMUNS IDENTIFICADOS

Conforme já apresentado anteriormente, Young e equipe (Young, 2008) identificaram e


classificaram 10 modos agrupados em quatro grupos, a saber:
Modos criança: criança vulnerável, criança zangada, criança indisciplinada/impulsiva, criança feliz
Os modos criança são comportamentos infantilizados apresentados pelos pacientes em
determinadas situações, como resultado do estilo de enfrentamento aos esquemas ativados principalmente
do domínio desconexão e rejeição (abandono/instabilidade, desconfiança/abuso, privação emocional,
defectividade/vergonha, isolamento social/alienação) e autonomia e desempenho prejudicados
(dependência/incompetência, vulnerabilidade ao dano ou doença, emaranhamento, fracasso).
Dependendo das circunstâncias de vida e experiências na infância, o modo criança (podendo ser
um ou mais modos desse grupo), pode ser reprimido ou fortalecido. 

5.1  O modo criança vulnerável

No modo criança vulnerável ativado, o paciente apresenta um comportamento “amuado”, inseguro,


sentindo-se desamparado, angustiado, sufocado e vulnerável.
O paciente nesse modo reage como uma criança que necessita de suporte, proteção e cuidados
dos pais, mas que não os recebe. 
A ferida emocional ou necessidades emocionais não atendidas pelos pais podem ter sido causadas
por negligência nos cuidados, a criança permanecendo longos períodos sozinha, os pais batiam e
castigavam em excesso, crítica, desprezo ou menosprezo, tratamento diferenciado (os pais demostravam
mais amor e apreço aos irmão ou irmão).
O modo criança vulnerável é o principal modo a ser trabalhado na Terapia do Esquema, pois é o
mais disfuncional e agregador de esquemas.

5.2 O modo criança zangada


A criança zangada tem um baixo nível de tolerância à frustração e responde de uma forma
impulsiva e raivosa quando percebe que suas necessidades ou vontades não estão sendo atendidas. O
paciente operando nesse modo é irascível e coleciona muitas histórias e problemas de vida relacionados ao
modo em si e aos esquemas agrupados nesse modo que podem ser: abandono, desconfiança/abuso,
subjugação, privação emocional, etc.
Quando se ativa um esquema cuja resposta é o modo criança zangada, o paciente sente-se tolhido,
abandonado, subjugado, injustiçado e por isso nutre um sentimento de vingança, uma raiva acumulada e
reprimida a qual é projetada nas pessoas e situações que o frustraram. Essas pessoas e situações se
transformam em gatilhos dos esquemas e resgatam emoções e memórias dolorosas, remotas, que criaram
esses esquemas e suas reações. É como se o paciente estivesse vivenciando as mesmas experiências
dolorosas da infância.

5.3 Modo criança impulsiva/indisciplinada

O paciente nesse modo age com impulsividade não para agredir ou se vingar, como no caso da
criança zangada, mas para buscar a sua satisfação e realização dos seus desejos e necessidades sem
considerar as consequências, negligenciando regras e pessoas. Desinibida, irresponsável, livre e
inconsequente, a criança impulsiva também tem baixa tolerância à frustração e não consegue se sacrificar
no curto prazo visando conseguir um benefício no longo prazo. Uma pessoa funcionando nesse modo é
mimada, imatura, descuidada, preguiçosa, impaciente, sem foco e descontrolada. Os esquemas associados
a esse modo são arrogo/grandiosidade, autocontrole/disciplina insuficientes.

5.4 Modo criança feliz

O paciente nesse modo sente-se amado e com as suas necessidades emocionais satisfeitas. Esse
modo não agrupa nenhum esquema desadaptativo remoto.

6.    MODOS DE ENFRENTAMENTO DISFUNCIONAIS

Os modos de enfrentamento disfuncionais ou “desadaptativos”, são a forma como o paciente


quando criança reagia na tentativa de se adaptar ao ambiente e circunstâncias que lhe foram prejudiciais e
de não ter suas necessidades emocionais satisfeitas. Na época, esses modos poderiam ser considerados
“adaptativos” uma vez que ajudavam o paciente criança a lidar emocionalmente com as situações, mas
esses modos se sedimentaram e permaneceram até a idade adulta. Sendo assim, é perfeitamente razoável
afirmar que os modos, de uma forma geral, são uma parte do self que não cresceu e amadureceu.

6.1 Modo Capitulador Complacente

No modo capitulador complacente o paciente se submete, aceita, “veste a carapuça” do esquema


ativado. O comportamento é passivo, submisso, obediente.  O paciente demonstra clara resignação, medo e
ansiedade, nutrindo uma sensação de desamparo e desesperança: “não tem mais jeito. Meu destino é ser
infeliz nos relacionamentos”; “Sou um azarado fracassado. Nada do que eu tento fazer da certo”.  Em geral
são muito obedientes e subservientes, fazendo o possível para não contrariar seja quem for, incluindo o
psicoterapeuta. Acham que não tem nenhuma outra alternativa a não ser agradar as pessoas para evitar
conflito, crítica ou rejeição. Se sujeitam até mesmo serem humilhados, desvalorizados apenas para manter
a conexão (medo do abandono, crítica ou rejeição) ou algum tipo de retaliação (medo de punição ou de criar
problemas para si mesmos).

6.2 Modo Protetor Desligado

No modo protetor desligado o paciente usa o distanciamento psicológico ou evitação do esquema


como estilo de enfrentamento. Os indivíduos se desligam de outras pessoas, se isolam, se encastelam,
fecham-se emocionalmente para se proteger de uma sensação de vulnerabilidade, abandono, fracasso ou
defectividade que possam expô-los. O paciente operando neste modo é como se vestisse uma armadura ou
construísse um fosso ou muro ao seu redor. Sentem-se vazios, desconectados às situações e pessoas,
como se não se importassem, se comportando com cinismo e indiferença: “tanto faz”, “não estou nem aí pra
nada”. Com isso, evitam investimento emocional em pessoas ou experiências. Os comportamentos típicos
são o isolamento social, indiferença com certo tom de arrogância, pedantismo e cinismo, busca viciante e
contumaz por conforto, fantasias, distração ou estimulação compulsiva (vídeo games, filmes, música, TV,
comida, sexo, compras, álcool, drogas).
O modo protetor desligado costuma ser o mais difícil de mudar porque os pacientes se
acostumaram desde criança a se proteger desse jeito de forma que entram nesse modo automaticamente.
É um refúgio, um conforto ilusório, mas que funcionou muito bem na infância. O problema é que o paciente
cresceu, as situações e o ambiente não são mais hostis ou frios, mas o paciente continua com a mesma
reação e comportamento e desaprendeu (ou nunca aprendeu) a entrar em contato com suas emoções. O
modo protetor desligado é uma reação inconsciente e automática. O paciente aprendeu muito bem a ser
assim e vê mais vantagens do que desvantagens em mantê-lo, daí a dificuldade em desconstruí-lo ou
enfraquece-lo.

6.3 Modo hipercompensação

Os hipercompensadores agem como se oposto do esquema ativado fosse verdade. Caso se sintam
fracassados internamente, fazem de tudo para mostrar status de sucesso e o quanto são bem sucedidos
externamente. Podem ficar obsessivos em mostrar “sinais exteriores de sucesso”. Caso sintam que
inexoravelmente serão abandonados, sabotam relacionamentos e abandonam primeiro. Ao se sentirem
subjugados, dominam, controlam, intimidam e subjugam as pessoas. Ao se sentirem inferiorizados, tornam-
se arrogantes e tentam desvalorizar as pessoas. Alguns podem ser dissimulados (passivo-agressivos).
Fingem obedecer, concordar, mas em segredo se vingam ou adotam um comportamento rebelde por meio
de procrastinação, reclamação excessiva, crítica, traições, não-cumprimento da palavra. Outros
hipercompensadores são obsessivos, rígidos, inflexíveis, controladores, focados nas suas próprias regras e
planejamento e no cumprimento excessivo de rotinas. Muitos vilões de  filmes (e também da vida real) são
efetivamente hipercompensadores, assim como figuras proeminentes nas mais variadas áreas como
empresarial, artística, esportiva e política.

6.4 Modos pais disfuncionais

Nos modos pais disfuncionais, o paciente “modelou”, imitou, internalizou traços,  comportamentos e
até os esquemas dos próprios pais. Quando os pacientes estão operando neste modo, tornam-se seus
próprios pais e tratam a si mesmos como os pais os trataram na infância. Muitas vezes, assumem a voz do
pai ou da mãe e repetem neologismos, palavras, expressões que os pais costumavam falar. Aquela voz
interior insistente que critica e corrige o paciente ou o pune por erros é uma mera repetição do que o pai ou
mãe faziam com esse paciente quando criança.
Young e equipe (Young,2008) identificaram e classificaram dois tipos mais comuns de pai/mãe
disfuncional (muito embora possam existir outros tipos de modos pais): o modo pai/mãe punitivo ou crítico e
o pai/mãe exigente. O primeiro modo, o punitivo, critica e pune implacavelmente e com raiva, tolhendo a
criança de suas necessidades emocionais. Os erros são intoleráveis. Os esquemas mais comuns
associados a esse modo são defectividade e postura punitiva. Pacientes borderline ou com depressão grave
comumente operam neste modo. Os primeiros se punem se cortando por terem se comportado mal, terem
sido imorais, indignos de respeito. Os pacientes neste modo são o próprio pai ou mãe punitiva punindo a
criança vulnerável. Na verdade, os pacientes alternam sendo o pai ou mãe punitivos ou a criança vulnerável
sendo punida por eles.
O modo pai/mãe exigente pressiona a criança vulnerável para que atinja, e, se possível, supere as
expectativas exageradas, desproporcionais e irrealistas por eles formuladas. Há uma forma “certa” para
tudo e para todos, principalmente para o próprio paciente, a partir da qual a coisas tem que ser feitas. O
pensamento é maniqueísta, preto e branco, binário. Ou uma coisa é certa ou está errada, portanto,
intoleravelmente falha. O paciente operando nesse modo carece de espontaneidade. Sente-se pressionado,
sufocado e inseguro por medo de falhar. Pode sofrer de ansiedade de desempenho. Os esquemas
associados são padrões inflexíveis, postura punitiva e auto-sacrifício  . Esse modo é muito comum em
pacientes com transtornos narcisistas ou obsessivo-compulsivo. O paciente entra no modo pai exigente e
define os padrões elevados para si mesmo envidando todos os esforços para atingi-los e, caso não consiga,
o paciente sente vergonha da mesma forma como sentia vergonha por ter decepcionado pai ou mãe e pode
ou não se punir, mas o sentimento de humilhação e vergonha provocam forte sofrimento psicológico.
Alguns pacientes podem apresentar uma variação ainda mais complicada, numa forma híbrida do
pai/mãe disfuncional, sendo crítico, controlado, exigente e punitivo ao mesmo tempo.

6.5  Modo adulto saudável


Esse modo é a parte saudável e adulta do self que, na terapia, é orientada a satisfazer as
necessidades emocionais básicas da criança vulnerável, zangada ou indisciplinada. Construir e fortalecer o
modo adulto saudável do paciente de forma a trabalhar com mais eficácia sobre os outros modos
disfuncionais é o objetivo do trabalho com modos na terapia do esquema.
Embora a maioria dos pacientes adultos disponha de um modo adulto saudável, muitos são
ineficazes e não colaboram efetivamente para lidar com os modos disfuncionais. Em indivíduos
psicologicamente fortes e saudáveis, o modo adulto saudável predomina sobre modos disfuncionais e até
cura os esquemas. Pacientes com transtornos graves do Eixo I e II tem um modo adulto saudável fraco e
inoperante. Pacientes com transtorno de personalidade borderline não apresentam o modo adulto saudável
ou os tem “atrofiados”. Cabe ao psicoterapeuta ajudar o paciente borderline a desenvolver o modo adulto
saudável e torna-lo forte, influente e eficaz na luta contra os modos disfuncionais. O trabalho com modos
visa essencialmente isso.
As funções básicas do modo adulto saudável no trabalho com modos na terapia do esquema, e que
se chama “reparação parental remota”, são:

A. Proteger, apoiar e dar carinho a criança vulnerável.


B. Dar limites a criança zangada e impulsiva/indisciplinada.
C. Combate e modera os modos pai/mãe disfuncionais.

Uma estratégia fundamental no trabalho com modos é a troca de papéis entre o psicoterapeuta e o
paciente no desenvolvimento do modo adulto saudável. Ora o psicoterapeuta assume o papel de adulto
saudável na reparação parental, ora o paciente assume esse papel com o devido suporte. Um dos objetivos
no desenvolvimento da relação terapêutica com o paciente é justamente permitir que o paciente use o
psicoterapeuta como modelo de adulto saudável. Com o tempo, o paciente interioriza esse modelo e o
assume definitivamente para si no combate aos modos disfuncionais.

7.    ESTRATÉGIA CLÍNICA PARA O TRABALHO COM MODOS. OS SETES PASSOS.

 Identificar e dar nomes (apelidar) os modos do paciente.


 Explorar a origem dos modos e as vantagens (valor adaptativo) na infância e adolescência.
 Relacionar os modos desadaptativos aos problemas e sintomas atuais do paciente.
 Demonstrar as vantagens de modificar ou abrir mão de um modo disfuncional.
 Acessar a criança vulnerável por meio de imagens mentais e hipnoterapia.
 Realizar diálogos entre os modos, invertendo papéis, desenvolvendo o modo adulto saudável,
servindo como modelo de adulto saudável ao paciente.
 Ensinar o paciente a usar o modelo de trabalho com modos no seu cotidiano e fora do
contexto da terapia.

8.    CASO PRÁTICO – Exemplo Clínico

Paciente, R, 34 anos, solteira, morando sozinha, trabalha como executiva de uma empresa
farmacêutica.
Sua queixa focava nas questões envolvendo relacionamentos afetivos. Se sentia frustrada,
desanimada, sozinha, deprimida e sem perspectivas de que pudesse encontrar um parceiro segundo as
suas expectativas e idealizações. Ao relatar o seu histórico de relacionamentos anteriores, foi identificado
um padrão importante no sentido de que ela se mostrava interessada por homens emocionalmente
indisponíveis (que não tinham interesse em manter um relacionamento estável) e quando um potencial
parceiro demonstrava interesse ou se dizia apaixonado, ela imediatamente perdia o entusiasmo e a
motivação, desenvolvendo até uma repulsa ao pretendente deixando uma evidência de hipercompensação
de um esquema de abandono ou defectividade. Tudo isso seria validado no decorrer das sessões
posteriores.

Pontos importantes que devem ser considerados no trabalho com modos da terapia do esquema:

A. O objetivo das três primeiras sessões é mapear todo histórico da infância do paciente
tentando fazer uma correlação com esquemas, as queixas e problemas atuais, além de
desenvolver uma relação terapêutica próxima, empática e de confiança. 
B. Já na primeira sessão, deve ser entregue como dever de casa, os dois questionários do
Young: o dos esquemas e o dos estilos parentais, mas tente por si mesmo identificar os
esquemas e estilos de enfrentamentos durante as três primeiras sessões. O objetivo é  não
ser dependente dos questionários. Usar as respostas dos questionários apenas como
validação das conclusões e observações prévias. Em caso de divergências, as mesmas
devem ser usadas como elemento de discussão nas sessões.
C. Pacientes com estilos de enfrentamento como a evitação ou hipercompensação costumam
ser dissimulados, não contam detalhes e tentam encobrir a frustração emocional que tiveram:
“minha infância foi maravilhosa”. Meus pais eram nota mil”. “Não me lembro de nada
negativo”.
D. Pacientes que demoram a entregar as respostas dos questionários tem como provável estilo
de enfrentamento a evitação e operam no modo “protetor desligado”. É importante ficar atento
e trabalhar em cima do comportamento fazendo sempre associações entre o comportamento
do paciente, o histórico familiar dele, com esquemas e estilos de enfrentamento. Essa
dinâmica tem que ser bem entendida e correlacionada.

Em relação à paciente R, antes da aplicação do questionário de Young (YSQ-S3 93 Perguntas –


Versão curta) e o Questionário de Estilos Parentais YPQ , foram identificados os seguintes esquemas:

1. Defectividade (esquema nuclear ou principal).


2. Privação emocional (esquema subjacente ao esquema de defectividade).
3. Padrões inflexíveis (esquema subjacente ao esquema de defectividade hipercompensado).
4. Isolamento social (subjacente ao esquema de privação emocional como resignação aos
relacionamentos afetivos).

Modos identificados:

A. R carente (criança vulnerável). Uma resignação ao esquema principal de defectividade. “Deve ter
algum problema comigo por não conseguir manter um relacionamento saudável. Não dou sorte nos
relacionamentos”.
B. R fujona (Modo protetor desligado). R se isola socialmente e fica sozinha “curtindo a fossa” de seus
fracassos amorosos. Já até mudou de cidade (de SP para o RJ) por conta de frustrações amorosas
anteriores.
C. R menina exemplar. Modo hipercompensado do esquema de fracasso, ativado no trabalho. “Sou
azarada no amor. Só me resta me dedicar no trabalho. Pelo menos consigo ser o orgulho da família em
termos profissionais. Comecei de baixo e já sou gerente. Meu objetivo agora é ser diretora”.
D. Mãe resignada. Uma variante do modo criança vulnerável. (R. modelou o temperamento, esquema e
estilo de enfrentamento da mãe em se tratando de relacionamentos), se resignando e aceitando a sua
condição de “azarada” e “dedo podre” com namorados.
E. Adulta saudável. É a parte do self de R que eventualmente atua, mas que precisava ser  fortalecido e
se tornar dominante.

No esquema de defectividade, R sentia medo de ser rejeitada ou de sofrer desilusão e com isso
evitava parceiros com os quais se identificava e demonstravam “potencial” porque “o risco de sofrer
desilusão era maior”, nutrindo uma crença que ela não nasceu com sorte no amor e que o seu destino é a
solidão (modo mãe fatalista ou resignada). Com isso, mantinha facilmente relacionamentos superficiais
onde o parceiro não demonstrava muito interesse (risco zero de se decepcionar) mas que acabava ativando
o gatilho do esquema de privação emocional, sentindo-se desanimada, frustrada, deprimida, desiludida
(modo criança solitária/vulnerável). Com o estilo de enfrentamento hipercompensado no esquema de
privação emocional, ela era muito exigente, crítica com amigos, pessoas e ambientes, ativando um outro
esquema subjacente que vem a ser o isolamento social cujo estilo de enfrentamento (evitação) reforçava o
comportamento solitário e excludente (modo criança solitária/vulnerável).
No trabalho, R se dedicava, era ambiciosa, confiante e exigente, não lembrando em nada a R dos
relacionamentos afetivos.  Sua performance e comportamento no trabalho mostrava uma tentativa de
hipercompensar o sentimento (esquema) de menos valia, e defectividade como mulher; “compenso as
minhas frustrações amorosas me dedicando à carreira e ao trabalho”.
Foram usadas as respostas dos questionários de estilos parentais como elemento importante no
trabalho de memórias remotas com a aplicação da técnica de imagens mentais.
Questionada sobre as condições de vida na infância e a relação dela com os pais e irmãos, a
princípio ela dizia que a infância tinha sido difícil por conta das limitações financeiras, haja visto que ela
tinha mais três irmãos (duas irmãs mais velhas e um irmão também mais velho, sendo ela a “caçula”) e o
pai (ausente por  conta do trabalho) insistia em pagar colégio particular para todos e isso impactava
negativamente na qualidade de vida da família. Havia muitas restrições financeiras e materiais, mas os pais,
em função disso, foram “maravilhosos” e ela não tinha do que se queixar.
O pai, portanto, ausente e com provável esquema de privação emocional, não demonstrava
sentimentos, nem fora amoroso ou até mesmo empático com R. A mãe apresentava um esquema de auto-
sacrifício. Se portava como “mártir”, resignada. Não se queixava propriamente do marido, mas das
condições de vida por conta das dificuldades. Era a sua missão cuidar os filhos da melhor forma possível.
R relatou que algumas vezes a mãe oferecia o bife do próprio prato aos filhos e repartia em pedaços
iguais para todos evidenciando claramente o esquema de auto-sacrifício.

8.1 Pontos importantes:

É fundamental tentar identificar os esquemas tanto do paciente como dos pais, mesmo antes da
aplicação dos questionários, os quais servirão apenas como validadores das impressões do psicoterapeuta.
As divergências seriam objeto de elementos a serem abordados nas sessões. Conhecer bem o ambiente e
as condições de vida e relacionamentos familiares do paciente na infância também é  fundamental. Em
geral se levam 5 a 7 sessões desenvolvendo esse tópico (avaliação, levantamento de hipótese diagnóstica,
aplicação dos questionários, validação dos questionários, entendimento detalhado e profundo do universo
familiar remoto do paciente).
Deve ser feita uma correlação entre as respostas dos questionários com as observações nas
sessões e a hipótese diagnóstica.
O questionário de estilo parental muitas vezes se mostra mais conclusivo em comparação com o
questionário dos esquemas, no entanto, ambos devem estar coerentes e se complementarem. Pacientes
com estilos de enfrentamento hipercompensado ou de evitação podem não responder com coerência o
questionário dos esquemas, mas o questionário de estilo parental parece mais revelador. Eles se sentem
mais à vontade em responder sobre os pais do que sobre si mesmos.

Trabalhando com modos.

Após a identificação dos esquemas principais e subjacentes e os estilos de enfrentamento, faz-se a


identificação dos principais modos do paciente começando por seguir os sete passos.

9.    TRABALHANDO OS SETE PASSOS COM R

Passo 1: Identificando e dando nomes (apelidos) aos modos

Esse processo é feito “em comum acordo” entre o psicoterapeuta e o paciente no decorrer das
sessões e com o avanço do entendimento do paciente sobre o conceito dos modos. O paciente tem que
entender o conceito. Perceber que “faz sentido”. Com isso, ele mesmo começará a sugerir nomes e
apelidos jocosos e até ofensivos a respeito dos seus modos. E ele também ajudará a identificar os seus
próprios modos. É muito importante que o psicoterapeuta estimule e induza o paciente a identificar os seus
próprios modos e sugerir os apelidos. No caso da paciente R, ela ajudou a identificar a R fujona, a R carente
e a R mamãe resignada ou fatalista. A adulta saudável foi apresentada, identificada e fortalecida ao longo
das sessões, já que era uma parte até então não identificada por ela, mas que efetivamente existia.

Passo 2: Explorando a origem dos modos de R e o valor adaptativo deles ao longo da


infância e adolescência.

Após a identificação e “batismo” dos modos, explora-se a origem dos mesmos relembrando fatos e
situações da infância de R que contribuíram para o surgimento do esquemas e consequentemente dos
modos e os estilos de enfrentamento. O uso de imagens mentais com relaxamento profundo ajuda
sobremaneira o paciente a lembrar das suas experiências remotas. Pode haver resistência por parte do
paciente em acessar essas memórias, por terem sido muito dolorosas, traumáticas ou vexatórias. Cabe
ressaltar que a lembrança dessas memórias ativam os esquemas dos pacientes e, portanto, devem ser
tratadas com cuidado e o máximo de compreensão empática evitando que o paciente repita os estilos de
enfrentamento que usualmente recorre. O ponto fundamental neste passo do trabalho com os modos é
ativar os esquemas dos pacientes sem que os mesmos se utilizem dos mecanismos de defesa e estilos de
enfrentamento usuais, portanto, ele se sentirá exposto e vulnerável. A relação terapêutica, a cumplicidade e
a confiança mútua tem um papel fundamental nesta fase do trabalho. No caso de R, houve uma resistência
inicial. Ela negava que pai ou mãe fossem os responsáveis pelo seus esquemas. A princípio eles eram
“maravilhosos e perfeitos” e ela não conseguia correlacionar suas experiências na infância, na relação
familiar com os seu esquemas, estilos de enfrentamento e modos. Foram através das respostas ao
questionário de estilos parentais que se conseguiu mostrar a R as contradições e assim, ela compreendeu
perfeitamente o valor adaptativo dos seus modos naquelas circunstâncias e conseguiu fazer as correlações
necessárias com as situações e comportamentos atuais. A conclusão de R sobre essas questões foi uma
prova de que ela entendeu perfeitamente e conseguimos desconstruir a resistência inicial: “Quer dizer que
eu, operando com esses modos agora, já adulta, é como se eu fosse ainda criança e reagisse como eu
reagia naquela época ?! É uma parte de mim que não cresceu, amadureceu ! “

Passo 3: Fazendo a correlação entre os modos e o comportamento, problemas e sintomas


atuais.

O modo criança carente ou a R “fujona” foram os modos adaptativos que R criou para lidar com a
crítica, indiferença e a frieza dos pais no trato de suas questões emocionais, bem como as frustrações não
atendidas na infância e que se perpetuarem até o momento. A forma pessimista e fatalista como enxergava
os relacionamentos foi modelado da mãe que agia do mesmo jeito em relação ao marido (seu pai). Como
consequência da resposta aos esquemas de defectividade, R acaba sentindo-se atraída por parceiros com
esquemas de privação emocional, portanto, frios, distantes, desconectados, críticos e pouco empáticos,
cópias exatas do pai. R percebeu que esses parceiros lidavam com ela da mesma forma como o pai lidava.
Parceiros potencialmente adequados, afetivos e maduros acionavam o gatilho do esquema de defectividade
com resposta hipercompensada (criança fujona). Ela os criticava e subestimava, terminando por rejeitá-los,
sabotando a relação. Já para os parceiros “frios”, a resposta ao esquema de defectividade era a de
resignação (criança carente). Ela superdimensionava as qualidades ou até mesmo via qualidades que não
existiam e subdimensionava os defeitos (como fazia com os pais). Lembrando que no início das sessões, R
dizia que os pais eram “maravilhosos”, “calorosos”, “fantásticos”. Esses parceiros frios e distantes a
tratavam com desdém, indiferença, crítica ou menos valia, como os pais, em especial o pai, costumava
fazer.

Passo 4: Demonstrando as vantagens de modificar ou abrir mão dos modos disfuncionais.

            R descobriu por si própria que não há vantagem alguma em manter-se operando nos modos
disfuncionais e que eles, na realidade, perpetuam os esquemas e trazem sofrimento psicológico e não
oferecem qualquer tipo de defesa ou proteção como ocorria na infância. É primordial induzir e facilitar o
paciente para que ele mesmo consiga chegar a essa conclusão para em seguida focar nas vantagens em
abandonar ou desconstruir os modos, estratégia essa que, a essa altura, fica muito mais evidente para o
paciente. Neste estágio da terapia, o paciente já avançou e progrediu e vem experimentando e percebendo
essas vantagens tanto ao nível intelectual como emocional, mediante o trabalho de regressão (imagens
mentais) agora com a intervenção no modo “criança solitária/carente” por parte do psicoterapeuta e do
próprio paciente através do fortalecimento gradual do modo “adulto saudável”,o que veremos a seguir.

Passo 5: Acessando e trabalhando com a criança solitária e vulnerável de R.

Esse passo é o mais importante e o que efetivamente provocou a mudança em R. É o momento em


que “a ficha cai” e o paciente não mais se identifica com o modo criança vulnerável/carente, pelo contrário, o
paciente o enxerga como uma parte  com a qual não quer mais conviver e muito menos fortalecer. O modo
adulto saudável repara essa parte do self do paciente toda a vez que se manifesta até o ponto em que não
mais será necessária uma intervenção muito direta. O paciente funcionará no modo adulto saudável na
maior parte do tempo, sendo ele próprio o seu psicoterapeuta.
R concluiu que o seu modo criança carente estava reforçando e perpetuando sua condição em
relação aos seus relacionamentos afetivos. Como estratégia de combate, foi reforçado o exercício da auto-
observação e atenção plena (mindfulness) de forma que R pudesse mapear os gatilhos e perceber quando
a criança carente fosse ativada e, com isso, respondesse de modo adequado e funcional usando a sua
parte equilibrada e sábia (adulto saudável) para orientá-la na circunstância e nos julgamentos.
Foi usada a técnica da cadeira vazia onde R, operando no modo adulto saudável, acolhia e atendia
as carências da R (criança vulnerável). Primeiramente R é induzia a lembrar de uma situação no passado
que ativava o modo criança carente para em seguida, já no modo adulto saudável, pudesse acolher essa
parte de si mesma.
Antes de chegar a esse estágio, o psicoterapeuta faz o papel de adulto saudável e acolhe a “pobre
R carente e vulnerável”. Com o passar das sessões, é  ativado mais e mais o modo criança carente, ao
mesmo tempo em que o modo adulto saudável entra em cena e atende ou tenta compreender e reparar a
ferida emocional dessa criança vulnerável. Sendo assim, há uma dessensibilização natural do sofrimento da
criança carente, há um fortalecimento do modo adulto saudável de tanto que ele aparece e maneja as
situações do passado revividas nas sessões. A estratégia é como se as histórias desse passado de R
fossem recontadas e tivessem um desfecho ou conclusão diferentes, no caso, uma conclusão ou desfecho
favorável ao crescimento emocional e psicológico de R.  
O passo 5 é o resultado natural de tudo o que foi feito nas sessões até aquele momento e não se
constitui num passo isolado. Não se consegue chegar a este estágio da psicoterapia sem que antes tenham
sido trabalhado todos os outros passos e procedimentos. Não obstante o passo 5 é um resultado natural do
trabalho com modos e um indicador fundamental da evolução e cura do paciente, esse passo 5 pode (e
deve) durar várias sessões.

Passo 6: Realizar diálogo entre os modos. Desenvolvendo o adulto saudável de R.

Se no passo 5 se acessa e trabalha incessantemente a criança vulnerável/carente de R provocando


uma dessensibilização e até uma “banalização” dos fatos passados e consequente reações emocionais, R
não via mais esses fatos como “bicho papão” ou algo tão doloroso assim. A sensação é de que foram fatos
e situações que lhe pareceram difíceis e traumáticos, mas que agora, sob o olhar do modo adulto saudável,
se mostraram perfeitamente manejáveis.
O diálogo entre os modos criança vulnerável e adulto saudável pode ser feito através de diversas
técnicas dentre as quais se destacam: Psicodrama, Gestalt ou Hipnoterapia.
No caso em questão foi preferido  usar uma abordagem gestáltica, promovendo diálogos entre os
modos, fazendo “role play” e aplicando a técnica da cadeira vazia onde R era o adulto saudável, acolhendo
empaticamente sua parte carente, representada pela cadeira vazia. O relaxamento médio/profundo do
paciente por meio de hipnose, para então realizar esses diálogos entre o modo adulto saudável e o modo
criança vulnerável/carente, também se mostrou muito efetivo e foi utilizado. A paciente respondeu bem em
ambas abordagens, entranhando um pouco, no início,  as técnicas gestálticas, mas tendo depois se
acostumado e aderido com entusiasmo e naturalidade. É importante que o paciente esteja “aquecido” antes
de começar o trabalho gestáltico, caso contrário, ele pode se sentir desconfortável e não aderir.
Da mesma forma como ocorre em todos os passos, em especial no passo 5, o passo 6 também
pode levar várias sessões. Não se deve apressar esse procedimento.

Passo 7: psicoeducar R para que use o trabalho com modos em situações de vida fora as
sessões.

            Esse passo se torna quase como um resultado natural desse trabalho com modos. O paciente
ganha uma enorme expertise em relação aos procedimentos e ao conceito em si de forma que pode
perfeitamente usá-los em situações fora do escopo da psicoterapia. R aprendeu a se manter consciente o
tempo todo através dos exercícios de atenção plena (mindufulness) de forma a se observar com
profundidade. Quando as experiências se mostram desafiadoras, R percebe as suas reações emocionais e
físicas, bem como o seu comportamento e se pergunta: “em que modo estou operando agora?” Na prática
da auto-observação, R aprendeu que a observadora é o seu modo adulto saudável e portanto, ela corrige
reações e comportamentos relativos as experiências, operando efetivamente nesse modo (“a minha parte
sábia”, diria R).

10. A REESTRUTURAÇÃO DOS ESQUEMAS DE R POR MEIO DO TRABALHO COM MODOS


Ao longo de 8 meses e 16 sessões, o nível de autoconsciência de R aumentou drasticamente. Ela
desenvolveu um distanciamento psicológico dos modos disfuncionais e dos esquemas correspondentes,
não mais se identificando com os padrões de comportamento que provocavam sofrimento, instabilidade
emocional e distorção cognitiva. A parte saudável do self (adulto saudável) predominou sobre os modos
disfuncionais que se tornaram fracos, quase inoperantes. Quando uma situação ou experiência ativa um
gatilho de um esquema disfuncional, a resposta ao esquema é funcional, adequada, coerente e equilibrada,
fazendo com que R tenha mais controle sobre suas reações, comportamento e sua vida, principalmente na
escolha de parceiros em relacionamentos afetivos. R se comprometeu com o psicoterapeuta a mantê-lo
informado quanto aos seus progressos, principalmente em relação a esse aspecto da sua vida
(relacionamentos afetivos). Foram combinadas sessões “avulsas” caso sejam da vontade dela que
demonstrou plena convicção de que saberá lidar com suas questões e desafios simplesmente aplicando
tudo o que aprendeu ao longo da psicoterapia no trabalho com modos.

CONCLUSÃO
O trabalho com modos, como parte fundamental da terapia do esquema, transparece ser eficiente e
representa um avanço na abordagem clínica-terapêutica dada a sua efetividade e profundidade. Requer
prática e experiência no manejo, principalmente em termos de estudo de Psicodinâmica, Terapia Cognitivo
Comportamental, Hipnose e Gestalt e pode muito bem ser aplicado como linha de trabalho principal do
psicoterapeuta cobrindo os mais diversos casos clínicos. A quebra de padrões de comportamento pela não
identificação com esses padrões ou “modos” se mostrou consistente e à prova de recidiva. Além disso, o
paciente aprende a usar a técnica para situações práticas e experiência de vida pós-terapia, proporcionando
um aumento considerável do seu nível de consciência, maturidade e inteligência emocional, operando no
modo “adulto saudável” na maior parte do tempo, tornando esse paciente o seu próprio psicoterapeuta.

O Trabalho com "Sonhos"


Os sonhos

Sonhar é uma experiência humana que, desde sempre, intriga, confunde e encanta tanto o homem comum
quanto o cientista. A sabedoria popular encontra relações causais entre um determinado tipo de sonho e
certo acontecimento; ou credita-lhe poderes de revelação sobre o futuro ou sobre enigmas; ou ainda de
cura. Há explicações que enfatizam a necessidade de reencontros com entes queridos que se foram, ou até
que os exploram como oportunidade para experiências extracorporais importantes, para insights e para
soluções de problemas do dia-a-dia. Há, portanto, uma série de crenças a respeito dos sonhos, seus
poderes e significados.

Para a psicologia, qual seu valor? Terá o sonho relação com a personalidade daquele que o sonha? Terá
alguma colaboração a dar? Estas perguntas têm sido respondidas de forma diferente em cada uma das
abordagens. Freud (1976), destaca a interpretação do sonho como técnica importante para acesso e
entendimento do Inconsciente. Para Jung (1996), os sonhos têm função compensatória, ao apresentar ao
ego pontos de vista que são complementares às atitudes dominantes quando acordados, além de revelar o
inconsciente coletivo. A Gestalt entende os sonhos como produto pessoal do sonhador, e todos os
elementos introduzidos nele como projeções dos aspectos da sua personalidade (Perls, 1977). Para os
behavioristas radicais, os sonhos são comportamentos discriminativos que trazem informação relevante
sobre a história passada e as contingências de reforçamento atuais (Skinner, 1976). Concorda-se, então,
que é uma atividade do ser humano que pode ser valorizada em psicoterapia.

Estudos recentes sobre neurofisiologia estabelecem 3 estados de existência do ser humano: a vigília, o
sono, e a parte do sono onde ocorre o sonho. Experiências diferentes são vivenciadas em cada uma destas
fases. As pessoas sonham em torno de 1/12 de suas vidas, o que corresponde a 50.000 horas. Nenhuma
atividade que consome este tempo do indivíduo pode ser desconsiderada, assim como deve ter função
importante para a sobrevivência da espécie (Doweiko, 2002).

É no estágio do sono chamado de REM, que está associado a movimentos rápidos dos olhos, que ocorrem
os sonhos. Neste momento, observa-se uma alta atividade cerebral; níveis de acetilcolina altos e de
serotonina e noradrenalina baixos; sonhos vívidos, bizarros e com imagens complexas. As imagens são
claras e nítidas, apesar de ausência de crítica, quando se aceita, por exemplo, como natural, estar
sonhando com uma pessoa que se transforma em outra no meio da conversa; quando se está em um local
e, de repente, em outro; ou quando coisas impossíveis ocorrem naturalmente naquele contexto.

A experiência do sonho é resultado de um processo extremamente complexo de ativação e supressão


neuronais no córtex cerebral. A neurobiologia moderna entende que os sonhos podem ser somente uma
forma de “barulho” criada por esta atividade cerebral em certos estágios do sono (Hobson, 1999, citado por
Doweiko, 2002).

De qualquer forma, os sonhos fazem parte da experiência humana e têm sido foco central nas psicoterapias
psicodinâmicas. Por isso, discute-se a utilidade de uma teoria dos sonhos que não esteja estabelecida em
princípios psicanalíticos. Terapeutas cognitivo-comportamentais podem construir uma compreensão dos
sonhos baseada em teorias contemporâneas e encontrar utilidade na análise de alguns sonhos, de alguns
clientes, em algum momento do trabalho clínico.

O modelo cognitivo dos sonhos

O terapeuta com formação em terapia cognitivo-comportamental não é preparado ou treinado para o


trabalho com sonhos e pode perder uma oportunidade valiosa de entrar em contato com a riqueza de
imagens oferecida pelos sonhos.
O modelo cognitivo vê o sonhador como ser idiossincrático e o sonho como uma dramatização de suas
crenças sobre si, sobre o mundo e sobre o futuro, sujeitas às mesmas distorções de quando acordado. Beck
(1971) afirma que o conteúdo de alguns sonhos tem relação com a personalidade do sonhador, que este
contém temas e expectativas de desfechos semelhantes com os pensamentos dele enquanto acordado, e
que as mesmas preocupações conscientes são expressas na experiência do sonho.

Deve ser entendido como temático em vez de simbólico. A compreensão do conteúdo e dos temas dos
sonhos oferece oportunidade para o cliente entender suas cognições e questionar os pensamentos
ansiogênicos ou depressores, podendo ter, como resultado, uma mudança afetiva. Os fatores cognitivos
dominantes exercem influência máxima sobre os sonhos, já que outros processos ativados durante a vigília
não estão presentes.

A recordação e interpretação do sonho ocorre no estado normal de vigília, e estas memórias relatadas estão
sujeitas às mesmas distorções aparentes nas outras dimensões de sua vida. Os pensamentos, sentimentos
e comportamentos que aparecem nos sonhos estão intimamente relacionados. O conteúdo e tema do sonho
podem ser identificados, questionados e reestruturados (Freeman & White, 2004).

Um Registro de Pensamentos Disfuncionais (RPD) preenchido pelo cliente entre as sessões relata o que ele
pensou, sentiu e fez em determinadas situações, clinicamente relevantes. O sonho também é uma história
que pode ser relatada, ou registrada, e discutida com objetivos e forma semelhantes. Muitas vezes, crenças
significativas podem ser identificadas a partir dos registros de lembranças dos sonhos. É, portanto,
inquestionável seu valor terapêutico.

Em revisão de pesquisas realizada por Beck (1971), conclui-se que os temas dos sonhos estão
correlacionados com categorias diagnósticas. Por exemplo, depressivos relatam sonhos de derrota e
coerção; paranóides, de perseguição ou abuso; ansiosos, de perigo; e maníacos, com temas expansivos e
de grandeza. É sugerido que o trabalho com sonhos pode também servir ao propósito de confirmação ou
refutação de hipóteses diagnósticas.

A narrativa imposta pelo sonhador ao seu sonho quando o conta pode servir como uma tentativa de
interpretar e estabelecer alguma ordem à experiência sensorial caótica vivenciada durante o sono. Este
“barulho” refletido da atividade cerebral durante o sono, quando lembrado em partes ao acordar, será
arranjado numa seqüência coerente para ser relatado.

Esta narrativa será construída de um jeito personalizado, isto é, alguma forma de estrutura será dada aos
fragmentos de lembrança do sonho. Este sonho contado também conterá as mesmas distorções
características da interpretação da realidade feitas pelo sonhador. Já que o processo de lembrança e
discussão do sonho ocorre em estado de vigília, o “modo” usado pelo cliente para lembrar detalhes e
interpretar as memórias do sonho será peculiar e característico (Gonçalves & Barbosa, 2004)

O trabalho terapêutico

Muitas vezes, os sonhos são trazidos espontaneamente pelo cliente e podem ser parte da agenda daquela
sessão como qualquer outro assunto. Terapeutas cognitivo-comportamentais têm dificuldade e se sentem
pouco à vontade nestes momentos, já que não estão familiarizados com esta perspectiva por não
encontrarem referências claras na bibliografia regular. A história do sonho nada mais é do que uma
oportunidade extra para identificação, questionamento e reformulação de crenças.

O trabalho terapêutico com os sonhos do cliente pode ser escolhido como estratégia em momentos em que
a terapia parece estar estagnada, por exemplo, ou quando emoções fortes são vivenciadas neles. Para
tanto, deve fazer parte da agenda da sessão como qualquer outro assunto, como sugerido por Freeman e
White (2004).

Registros de sonhos, fragmentos ou imagens devem ser pedidos de forma análoga aos registros de
pensamentos disfuncionais. Quando ocorreu o sonho, qual era a cena, o que pensou, o que sentiu e o que
fez. Os personagens envolvidos também serão explorados, pois podem trazer diferentes perspectivas sobre
o tema.
Técnicas de reestruturação cognitiva, compreensão e questionamento das crenças, criação de finais
alternativos ou solução de problemas, e auto-instruções podem resultar na mudança de humor e no
desenvolvimento de habilidades de controlar e interferir em sonhos aflitivos ou repetitivos. O conteúdo e as
imagens dos sonhos são sujeitos à mesma reestruturação cognitiva que os pensamentos automáticos.

Colocando de maneira mais geral, o trabalho terapêutico compreende acesso, experienciação, modificação
e ação sobre os sonhos (Gonçalves & Barbosa, 2004). Através de uma série de perguntas, como as
relacionadas abaixo, o cliente será guiado na recordação e exploração deste material. Por exemplo:

1. O que acontece no sonho? Qual o cenário?

2. O que você e os outros personagens estão pensando, sentindo, fazendo? Você percebe estas relações?

3. Qual o título desta história? Qual a relação deste título com a história?

4. Como esta história pode ser vista por outras perspectivas?

5. Que conexões tem com a sua vida acordada?

6. Qual a “moral” do sonho?

7. Como poderia construir sonhos diferentes sobre este tema?

8. Que outros finais poderiam acontecer?

O Trabalho com “Esquemas”


ESQUEMAS COGNITIVOS MAL ADAPTATIVOS

 O conteúdo exposto nesta página foi readaptado da seguinte Bibliografia:

YOUNG, Jeffrey E. Terapia Cognitiva para transtornos de personalidade: uma abordagem focada em
esquemas - 3ª ed. Porto Alegre : Artmed, 2003.

O QUE SÃO ESQUEMAS?

Os esquemas são crenças e sentimentos importantes sobre si mesmo e sobre o ambiente e que o indivíduo
aceita sem questionar.

São ideias autoperpetuadoras e muito resistentes à mudança.

Os esquemas cognitivos são os motivadores dos transtornos emocionais, estes por sua vez, levam o corpo
físico ao adoecimento.

Por exemplo: Uma pessoa com esquema cognitivo de abandono e instabilidade poderá desenvolver a
obesidade.

Um esquema é um padrão extremamente estável e duradouro que se desenvolve durante a infância e é


aperfeiçoado durante toda a vida do indivíduo.

Mesmo que os esquemas persistam depois de formarem-se, nem sempre temos consciência deles, pois
eles operam de modo sutil, fora da nossa consciência.

Entretanto, quando um esquema irrompe, ou é desencadeado por acontecimentos, nossos pensamentos e


sentimentos são dominados por ele. É nesses momentos que as pessoas tendem a experienciar emoções
negativas extremas e a ter pensamentos disfuncionais.

Nós vemos o mundo por meio dos nossos esquemas.

Segue, abaixo, uma breve descrição de alguns esquemas:

PRIVAÇÃO  EMOCIONAL

Este esquema refere-se à crença de que as necessidades emocionais primárias nunca serão atendidas
pelos outros. Essas necessidades incluem carinho, empatia, afeição, proteção, orientação e interesse por
parte dos outros. É comum os pais privarem a criança emocionalmente.

ABANDONO/INSTABILIDADE

Este esquema refere-se à expectativa de que logo serão perdidas as pessoas com as quais se cria vínculo
emocional. A pessoa acredita que, de uma maneira ou outra, os relacionamentos íntimos terminarão
iminentemente. Na infância, esses pacientes podem ter vivenciado o divórcio ou a morte dos pais. Esse
esquema também pode surgir quando os pais foram inconsistentes no atendimento das necessidades da
criança: por exemplo, pode ter havido muitas ocasiões em que a criança foi deixada sozinha ou desatendida
por períodos prolongados.

DESCONFIANÇA/ABUSO

Refere-se à expectativa de que os outros, de alguma maneira, tirarão vantagens da pessoa,


intencionalmente. As pessoas com esse esquema acreditam que os outros vão magoá-las, enganá-las ou
desprezá-las. Elas com freqüência pensam em termos de atacar primeiro ou se vingar depois. Na infância,
esses pacientes muitas vezes foram abusados ou tratados injustamente por pais, irmãos ou amigos.
 
ISOLAMENTO SOCIAL/ALIENAÇÃO

Refere-se à crença de estar isolado do mundo, de ser diferente das outras pessoas e/ou de não fazer parte
de nenhuma comunidade. Essa crença normalmente é causada por experiências iniciais em que a criança
vê que ela e sua família são diferentes das outras pessoas.

 
DEFECTIVIDADE/VERGONHA

Este esquema refere-se à crença de que a pessoa é internamente defeituosa e que, se os outros se
aproximarem, perceberão isso e se afastarão do relacionamento. Esse sentimento de ser defeituoso e
inadequado, muitas vezes, leva a um forte sentimento de vergonha. Os pais geralmente criticavam muito os
filhos e faziam com que eles sentissem que não eram dignos de serem amados.

 
FRACASSO

Refere-se à crença de que a pessoa é incapaz de ter um desempenho tão bom quanto o dos outros na
profissão, na escola ou nos esportes. Esses pacientes podem sentir-se burros, ineptos, sem talento ou
ignorantes. A pessoa com esse esquema muitas vezes nem tenta fazer as coisas, porque acredita que vai
fracassar. Esse esquema pode-se desenvolver quando a criança é desprezada e tratada como se fosse um
fracasso na escola ou em outras esferas de realização. Os pais normalmente não proporcionavam suficiente
apoio, disciplina e encorajamento para que a criança persistisse e tivesse sucesso em suas realizações
acadêmicas ou esportivas.

 
DEPENDÊNCIA/INCOMPETÊNCIA

Refere-se à crença de que a pessoa não é capaz de assumir, de forma competente e independente, as
responsabilidades do cotidiano. A pessoa com esse esquema depende excessivamente dos outros para
tomar decisões e iniciar novas tarefas. Os pais, em geral, não estimularam a criança a agir de forma
independente e a ter confiança em sua capacidade de tomar conta de si mesma.

 
VULNERABILIDADE A DANOS E DOENÇAS

Refere-se à crença de que a pessoa está sempre prestes a viver uma grande catástrofe (financeira, natural,
médica, criminal, etc) e pode levar a preocupações excessivas para se proteger. Normalmente, um ou
ambos os pais eram muito medrosos e passaram a idéia de que o mundo é um lugar perigoso.

 
SUBJUGAÇÃO

Refere-se à crença de que é preciso submeter-se ao controle dos outros a fim de evitar conseqüências
negativas. A pessoa muitas vezes teme que, a menos que se submeta, os outros fiquem zangados ou a
rejeitem. As pessoas que se subjugam ignoram seus próprios desejos e sentimentos. Na infância,
geralmente, um dos pais ( ou ambos) era muito controlador.

 
AUTO-SACRIFÍCIO

Refere-se ao sacrifício excessivo das próprias necessidades a fim de ajudar os outros. Quando a pessoa
presta atenção às próprias necessidades, geralmente sente-se culpada. Para evitar essa culpa, ela põe as
necessidades dos outros acima das suas. Muitos pacientes que se auto-sacrificam obtêm um sentimento de
auto-estima aumentada ou um senso de significado por ajudar os outros. Na infância, a pessoa pode ter
sido obrigada a assumir excessivamente a responsabilidade pelo bem-estar de um ou de ambos os pais.

 
INIBIÇÃO EMOCIONAL

Refere-se à crença de que é preciso inibir as emoções e impulsos, especialmente a raiva, porque uma
expressão de sentimentos prejudicaria os outros, ou levaria à perda de auto-estima, ao embaraço, à
retaliação ou ao abandono. Essas pessoas podem não ter espontaneidade ou parecer contidos. Esse
esquema é frequentemente provocado por pais que desencorajam a expressão dos sentimentos.

 
PADRÕES INFLEXÍVEIS/CRÍTICA EXAGERADA

Refere-se a duas crenças relacionadas. As pessoas acreditam que nada do que fazem é suficientemente
bom, que eles sempre devem se esforçar mais, e/ou enfatizam excessivamente valores como status,
riqueza e poder, à custa de outros valores como interação social, saúde ou felicidade. Normalmente, os pais
nunca estavam satisfeitos e davam aos filhos um amor que estava condicionado a realizações notáveis.

 
MERECIMENTO/GRANDIOSIDADE

Refere-se à crença de que a pessoa deveria poder fazer, dizer ou ter tudo o que quisesse,
independentemente de isso magoar os outros ou lhes parecer razoável. Ela não está interessada nas
necessidades dos outros, nem está consciente do custo a longo prazo de afastá-los. Os pais que são
excessivamente indulgentes com os filhos e não estabelecem limites sobre o que é socialmente apropriado
podem favorecer o desenvolvimento desse esquema. Alternativamente, algumas crianças desenvolvem
esse esquema para compensar sentimentos de privação emocional, defectividade ou indesejabilidade
social.

 
AUTOCONTROLE E/OU AUTODISCIPLINA INSUFICIENTES

Refere-se à incapacidade de tolerar qualquer frustração na busca de objetivos, assim como à incapacidade
de conter a expressão de impulsos ou sentimentos. Quando a falta de autocontrole é extrema,
comportamentos criminosos ou aditivos regem a vida. Os pais que não modelaram autocontrole ou não
disciplinaram os filhos adequadamente podem predispô-los a ter esse esquema quando adultos.

 
 
COMO OS ESQUEMAS FUNCIONAM

ADAPTADO DA REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

Psicoterapias cognitivo-comportamentais: teoria e prática / (orgs) Renato M. Caminha... [et al.]. São paulo:
Casa do Psicólogo. 2003 

É por meio de 3 (três) processos que os esquemas exercem sua influência sobre o nosso comportamento.
São eles:

 
Processo de MANUTENÇÃO do esquema:

No nível cognitivo a pessoa tem uma atenção tendenciosa ou supervaloriza informações que são
consistentes com o esquema mental. Exemplo: Quem tem o esquema de vulnerabilidade a danos e
doenças tende a vasculhar seu corpo em busca de sinais que venham indicar algum tipo de doença.

Em nível comportamental: Ao receber uma crítica, tendo o esquema de defectividade e vergonha, a pessoa
corrobora suas idéias de inadequação.

Exemplos de pensamentos automáticos desse processo:

1.      Eu não consigo...

2.      Meus pensamentos negativos são mais fortes do que os positivos.

3.      É difícil sair de onde estou.


4.      Sempre fui assim, como vou mudar?

5.      Sou tanso(a), idiota, feio(a)....

6.      Aceito tudo que ele(a) diz.

 
Com pensamentos desse tipo, a pessoa mantém seus esquemas mentais de forma a gerar sofrimento
contínuo. Tais esquemas mentais se ativarão constantemente de forma a levar o indivíduo a não realizar o
seu projeto de vida e a comprometer o psíquico com doenças do tipo depressão, ansiedade,
psicossomáticas e, na evolução, possíveis transtornos psiquiátricos graves.

Processo de EVITAÇÃO do esquema:

Esse mecanismo que mantém a validade dos esquemas funciona com o objetivo de evitar um contato direto
com o esquema.

No nível cognitivo: A pessoa pode falar: "Não quero pensar sobre isso"

No nível afetivo: Há o bloqueio de sentimentos.

No nível comportamental: Indivíduos com esquema mental de indesejabilidade social e alienação tendem ao
isolamento social. Exemplo: Prefiro ficar em casa vendo televisão do que ir aquela festa.

Exemplos de pensamentos automáticos desse processo:

1.      Não irei ao jogo de vôlei da empresa, ficarei em casa vendo TV.

2.      Uma separação agora não é viável, esperarei mais um ano para ver se ele(a) melhora no tratamento
comigo.

3.      Apresentar o trabalho? Nem pensar? Pode ir você!

4.      Falar com a gata? Não! Não! Deixa quieta!

5.      Estou com saudade dele. Vou telefonar! Não. Melhor não incomodá-lo.

6.      Queria esclarecer essa dúvida, mas não sei......deixarei para depois.

Com  pensamentos desse tipo, a pessoa evita que o esquema mental se ative. Veja que, se o indivíduo
fazer o que realmente deseja ele estará ativando seus esquemas mentais. Como essa ativação é dolorosa
para o psíquico einsuportável para a consciência, a pessoa evita realizar o seu desejo. Com essa estratégia
permanente ele vai adoecendo o físico e o mental sem perceber que ao evitar a dor psicológica mantém os
esquemas mentais sobrevivendo com muita energia no seu psicológico. Dessa forma, cada vez menos irá
desenvolver novas habilidades cognitivas, afetivas  e comportamentais.

PROCESSO DE COMPENSAÇÃO do esquema:

Uma pessoa que apresente um esquema mental mal adaptativo de fracassso em realizar-se pode engajar-
se em uma série de trabalhos e projetos ficando sobrecarregada de tarefas das quais não consegue dar
conta. Como reflexo disso, nenhum trabalho ou projeto será concluído com um nível de qualidade esperado
pela pessoa, reforçando suas idéias de insucesso.  

Aqui, o leitor poderá perceber que este processo tende a compensar algum esquema cognitivo com outro
esquema cognitivo.

Exemplos de pensamentos automáticos desse processo:


1.      Eu ajudo você com esse trabalho sim. “Devo ajudá-lo sempre” (Normalmente este funcionário ficará
depois do horário fazendo horas-extras para conseguir concluir o seu trabalho) Esquema de auto sacrifício
compensando o esquema de abandono.

2.      Não me realizo sexualmente e ainda vem esse sujeito querer tirar vantagem do meu trabalho.
(Normalmente esse indivíduo terá uma tendência a agressão verbal ou física no ambiente de trabalho ou em
casa). Esquema de falta de auto controle compensando o esquema de Merecimento e grandiosidade.

3.      Devo ser amistoso, carinhoso e não devo falar o que penso. (Esse pensamento levará o indivíduo a
ser submisso e a se auto sacrificar para ganhar o amor das pessoas) Esquema de subjugação
compensando o esquema de Privação Emocional.

4.      Eu mereço realizar-me em meu projeto de vida a todo custo. (Esse pensamento levará a pessoa a ser
submissa ou agressiva para compensar a não realização do esquema de merecimento e grandiosidade.)
Esquema de falta de auto controle compensando o esquema de Merecimento e Grandiosidade.

Normalmente o estilo de compensação acaba ativando com freqüência o esquema de falta de auto controle
e auto disciplina.

É importantíssimo lembrar que todos os pensamentos automáticos são processos irracionais (inconscientes)
e muitos deles não são percebidos pela pessoa ou apenas parte deles é percebida.
Sessão Relatos da paciente Técnicas utilizadas Observações

10º

11º

12º

13º

14º

15º

16º

17º

18º

19º

20º

Medo: como vencer os seus


Sentimos dez vezes mais medo do que nossos pais. O mundo está mergulhado nele. Saiba como chegamos a esse ponto – e o
que fazer para se libertar

Você acorda, escova os dentes, se veste, sai para a rua. Pode ser atropelado, assaltado, empurrado no metrô. Se estiver
de carro, pode sofrer um acidente de trânsito – ou ficar preso no meio de uma enchente. A geladeira pode ter um curto e
incendiar sua casa enquanto você está fora. Aliás, será que você se lembrou de trancar a porta? Sua cara-metade pode
ter decidido trair você. O clima do planeta pode ter desandado de vez, com consequências terríveis para a humanidade.
Você pode apanhar da polícia – ou ser vítima de um arrastão. Pode pegar gripe suína e morrer em dias. Os agrotóxicos
da comida podem estar envenenando você. O seu avião pode cair. Você pode ser rejeitado. Fracassar na vida. Aquela
dorzinha na barriga… pode ser câncer. E, pior ainda, tudo isso pode acontecer com as pessoas que você mais ama.
Nunca houve tantos motivos para sentir medo. E isso está nos afetando. Segundo dados do Instituto Nacional de Saúde
Mental dos EUA, 20,8% das pessoas têm transtorno de ansiedade, ou seja, passam o tempo inteiro com medo de alguma
coisa (pois a ansiedade nada mais é do que medo antecipado, de algo que pode ou não ocorrer). É dez vezes mais do que
na década de 1980. Mesmo que você não seja uma delas, certamente já se sentiu incomodado por algum tipo de medo.
Ele se tornou o maior problema psicológico do nosso tempo – e virou parte do dia a dia de todo mundo.

Ter medo não é ruim. Nós só estamos aqui, afinal, porque nossos antepassados eram medrosos e viviam fugindo do
perigo. O cérebro humano evoluiu para ser extremamente sensível a ele. Mas isso aconteceu há milhares de anos,
quando a vida era muito diferente. Hoje, a quantidade de situações e estímulos que podem nos causar receio é
incalculavelmente maior. Daí a explosão de medo na cabeça das pessoas. Não precisa ser desse jeito. Mas, primeiro: por
que isso aconteceu?

Um cérebro, duas mentes

O cérebro humano quase triplicou ao longo da evolução. Passou de 600 cm3 no Homo habilis (há 2 milhões de anos) aos
1.400 cm3 do Homo sapiens, 150 mil anos atrás. Nossa massa cinzenta foi crescendo e ganhando camadas, cada uma
mais complexa que a anterior, até chegar ao neocórtex – sua parte mais externa, enrolada como uma linguiça,
responsável por funções mentais como pensamento e linguagem. Tudo o que você tem de racional está ali. Só que mais
para dentro, no miolo do cérebro, existe outra coisa: o chamado sistema límbico. É uma parte mais primitiva, que
coordena reações instintivas. Seu pedaço mais importante é a amígdala, que detona as sensações de medo. “Você está
caminhando por um bosque, vê uma cobra, se assusta e imediatamente pula para trás, sem sequer pensar a respeito. A
amígdala é a responsável por essa resposta”, explica Raül Andero, neurocientista da Emory University, nos EUA. Como
as cobras eram um perigo constante para nossos ancestrais, a evolução moldou o cérebro para ter medo delas. Prova
disso é que macacos criados em laboratório, que nunca viram uma cobra, se assustam se forem colocados diante de uma
(em compensação, se eles tiverem a amígdala retirada, deixam de sentir todos os tipos de medo). Os medos são
disparados pela parte primitiva do cérebro.
Quando você anda pela rua pensando nas férias, o seu cérebro avançado está decidindo para onde quer viajar. Mas o
cérebro instintivo, sem que você perceba, também está a todo o vapor, de olho nas ameaças imediatas (um buraco no
chão, por exemplo). Os dois são interligados, se comunicam, influenciam um ao outro. Por isso, os psicólogos preferem
dividir a mente em dois sistemas: o Sistema 1 e o Sistema 2. Cada um é um conjunto de processos mentais envolvendo
várias regiões do cérebro.

O Sistema 1 é intuitivo, rápido, emotivo, inconsciente, automático. Sabe aquele pressentimento que você tem quando
conhece alguém? É o Sistema 1 em ação. Ou quando volta para casa de forma automática, sem precisar relembrar o
caminho? Sistema 1. Tudo o que você faz sem pensar – inclusive sentir medo – é obra do Sistema 1. Já o Sistema 2 é o
contrário: ele é o pensamento, lento, consciente, racional. A sua consciência mora dentro dele. “Mas o Sistema 1 é o
autor secreto de muitas escolhas e julgamentos que você faz”, explica o psicólogo israelense Daniel Kahneman,
ganhador do Prêmio Nobel de Economia e autor de Rápido e Devagar, livro que discute a relação entre os dois
sistemas.
O Sistema 1 é essencial para a sobrevivência. É o instinto que nos permite reagir rapidamente a ameaças – seja uma
cobra ou um ônibus que avança sobre a faixa de pedestres bem na hora que você está atravessando. O problema é que o
Sistema 1 usa regras rudimentares, muitas vezes erradas, para dosar o medo que vamos sentir das coisas. Por exemplo.
Quanto mais você se lembra (ou é lembrado) de uma ameaça, mais medo o Sistema 1 produzirá, independente do real
perigo envolvido. E ele também é fortemente influenciado pelo medo que outras pessoas sentem (medo é contagioso).
Tudo isso nos leva a receios exagerados e errados.


Após os atentados de 11 de Setembro, por exemplo, os americanos ficaram com medo de andar de avião. Muito mais
gente decidiu viajar de carro. E, por isso, morreram 1.600 pessoas a mais em acidentes de trânsito nos EUA ao longo de
um ano. Avião era, e é, estatisticamente muito mais seguro do que carro. Só que as pessoas se lembraram dos atentados,
que tinham sido exaustivamente mostrados pela imprensa, e tomaram a decisão errada. Se tivessem superado o medo, e
andado de avião, praticamente todas estariam vivas. “Temos pavor de morrer de repente, junto com outras pessoas”, diz
o psicólogo Gerd Gigerenzer, do Instituto Max Planck, na Alemanha, que analisou números fornecidos pelo Ministério
dos Transportes dos EUA. “Aí tomamos a decisão errada, e pulamos da frigideira para o fogo.”

Há inúmeros exemplos assim, de medo irracional. Como a mãe que tem medo que seu filho fume maconha, mas não vê
problema se ele encher a cara – sendo que o álcool é comprovadamente mais prejudicial à saúde. A pessoa que tem
medo de usina nuclear, mas adora ir à praia se expor à radiação solar, algo muito mais arriscado (só o Brasil registra
120 mil casos de câncer de pele por ano). E você tem mais medo de diabetes, aids, ou acidentes de trânsito? No Brasil, a
aids (71%) e os acidentes (58%) lideram com folga. E a diabetes nem é citada em pesquisas sobre temores. Mas,
pensando racionalmente, é dela que você deveria ter mais medo: em 2010, essa doença matou 54 mil brasileiros, o
mesmo que os acidentes de trânsito (42 mil) e a aids (12 mil) somados. Ocorre que os acidentes aparecem todo dia na
TV e nos jornais. E o que você acha que terá mais destaque na imprensa, uma celebridade morrer de diabetes ou de
aids?

A mídia escolhe as coisas para chamar sua atenção. (Por exemplo: esta foto que publicamos aí do lado.) E as coisas que
mais chamam a atenção do cérebro são, justamente, as que mais assustam.

O marketing do medo

É por isso que existem tantos programas policiais e notícias sobre violência. “Vivemos num mundo onde somos
convocados a sentir medo. Na mídia, é como se estivéssemos em perigo constante, podendo ser assaltados em cada
esquina”, diz Luís Fernando Saraiva, do Conselho Regional de Psicologia (CRP) de São Paulo. O marketing também é
muito baseado no medo. Bancos e empresas de seguro usam esse argumento abertamente, mas, se você observar bem,
verá que outros anunciantes também manipulam nossos temores para vender. Só que usam mensagens mais sutis.

“A moda joga com o medo de não pertencer ao grupo”, diz o publicitário dinamarquês Martin Lindstrom, autor de cinco
livros sobre as táticas de manipulação usadas pelas empresas. “Aposto que você teria vergonha de sair com a roupa do
seu pai, pois se sentiria desconectado da sua tribo”, afirma. “O desodorante traz outro medo, de que você não vai
conseguir namorada com seu cheiro. A mesma lógica vale para xampus, branqueadores de dente e academias de
ginástica. Afinal, malhamos para estar saudáveis, ou por medo de ficar flácidos?”, questiona Lindstrom. Se você não
comprar o carro X, seu filho vai ficar com vergonha quando você for buscá-lo na escola. E por aí vai. Boa parte da
propaganda explora o medo da rejeição social.

E esse medo nunca foi tão forte. Nunca estivemos tão ligados uns aos outros, mas, ao mesmo tempo, nunca sentimos
tanto medo de não sermos aceitos. Você já deve ter percebido isso quando postou alguma coisa nas redes sociais – e
imediatamente ficou ansioso sobre quantos likes aquilo iria ter ou deixar de ter. Um estudo feito pela agência de
publicidade JWT com 1.270 americanos e ingleses constatou que 40% dos usuários do Facebook têm medo de não
serem incluídos nas conversas online dos amigos. “O mundo exige cada vez mais de nós. Não conseguimos nos
desconectar, e aí sentimos mais ansiedade”, diz o psicólogo Saraiva.

Políticos espalham temores para arrebanhar votos, jornalistas faturam em cima de catástrofes, biólogos citam vírus
letais quando querem obter fundos para desenvolver vacinas… Todo mundo propaga o medo. Mas não faz isso só por
maldade ou interesse próprio. “Se eu disser que há uma doença mortal se espalhando na sala onde você está, você sairá
dela mesmo sem saber se é verdade. E vai avisar as outras pessoas”, diz Lindstrom. “Milhares de anos atrás, também
espalhávamos a notícia de uma planta venenosa, porque isso aumentava a chance de sobrevivência do grupo.” Ou seja:
conforme cada pessoa absorve mais medo, ela também se torna propagadora, espalha esse medo para os outros. É uma
reação instintiva.

Ok, sentimos cada vez mais medo porque nosso pobre cérebro é imperfeito – e o mundo moderno explora seus defeitos
como nunca. E agora?

Como vencer o medo

Você certamente já se arrepiou vendo filmes de terror. E gritou dando piruetas na montanha-russa. Estranho: você
estava aterrorizado, mas adorou cada segundo. Isso acontece porque em situações normais, como no cinema ou no
parque, a parte avançada do cérebro permanece no comando. Você se diverte porque mantém o controle. O seu instinto
de medo é ativado, mas a consciência sabe que não se trata de um perigo real. Então acontece uma descarga de
adrenalina acompanhada de dopamina – neurotransmissor associado ao prazer. E você sente aquele gostoso friozinho na
barriga.

Mas, em situações de perigo real, como um assalto, isso não acontece. A amígdala passa por cima de todo o resto e
impõe um temor incontrolável. Quando alguém desenvolve medo crônico, fobias ou transtorno de estresse pós-
traumático, situações cada vez mais comuns no mundo moderno, a amígdala fica disparando o tempo inteiro. “Por isso,
a pessoa apresenta grande ansiedade no dia a dia”, explica o neurocientista Raül Andero, da Universidade Emory. Já
estão sendo criados medicamentos que podem aliviar ou suprimir o medo (mais sobre isso daqui a pouco), mas, na
maioria dos casos, a principal solução é terapia. Não só a terapia feita em consultório. Há coisas que você mesmo pode
fazer.

A principal delas se chama terapia cognitivo-comportamental (TCC). Ela nos ensina a mudar os pensamentos ruins que
ficam estimulando a amígdala e gerando ansiedade. “A forma como pensamos influencia a maneira como sentimos.
Portanto, mudar o modo como pensamos pode mudar como nos sentimos”, resume o psiquiatra Aaron T. Beck, pai da
TCC, no livro The Anxiety and Worry Workbook (“O Manual da Ansiedade e da Preocupação”, inédito no Brasil). Se
antes da entrevista de emprego você pensa “Não tenho ideia do que dizer; eles acharão que sou um idiota”, vai se sentir
tenso e ansioso. Mas se em vez disso você pensar “Estou bem preparado para a entrevista e vou causar uma boa
impressão”, ficará mais calmo e confiante. Pode parecer banal, mas funciona. Tem efeitos neurologicamente
comprovados.
A exposição gradual da pessoa ao objeto ameaçador também ajuda a superá-lo. A neurologista Katherina Hauner, da
Universidade Northwestern, utilizou essa técnica – que se chama dessensibilização – para tratar fobia de aranhas. Ela
monitorou o cérebro de pessoas que tinham muito medo e não conseguiam nem olhar para os aracnídeos. Esses
voluntários foram sendo expostos às aranhas, aos pouquinhos, sem ultrapassar o limite de cada um. Ao fim do processo,
a maioria conseguiu se aproximar e até tocar nas aranhas. Seus cérebros tinham mudado fisicamente. “A terapia mudou
a rede de neurônios ligados ao medo, e reorganizou a resposta do cérebro ao objeto ou à situação temida”, concluiu
Katherina.

Em seu novo estudo, publicado no final de 2013, ela foi além: mostrou, pela primeira vez, que é possível apagar medos
enquanto uma pessoa dorme. Numa experiência meio cruel, que lembra aquelas feitas em ratos, a cientista condicionou
um grupo de voluntários humanos a ter medo de certo rosto. Quando eles viam esse rosto, eram expostos a um cheiro
específico e levavam um choque elétrico. Em pouco tempo, aconteceu o óbvio: as pessoas associaram o choque aos dois
sinais (o rosto e o cheiro), e passaram a ter medo deles. Aí, Hauner resolveu tentar algo revolucionário: apagar o medo.
Deixou que os participantes dormissem, e os expôs àquele mesmo cheiro, para que eles evocassem a memória ruim. A
diferença é que, agora, não aplicou choques. Deu certo. As pessoas deixaram de ter medo do cheiro – apenas o medo do
rosto persistiu.

A técnica de apagar medos durante o sono é experimental, ainda não existe fora dos laboratórios de pesquisa. Mas é
possível conseguir o mesmo efeito com um procedimento bem conhecido: a hipnose. “Vivemos tão condicionados no
dia a dia que usamos nossa mente de forma muito limitada. Em geral, não comemos quando temos fome, e sim quando
está na hora de comer”, diz o psiquiatra italiano Leonard Verea, especialista em hipnose. “A hipnose auxilia a pessoa a
estimular a própria mente, para sair da acomodação e ultrapassar obstáculos.”

Segundo Verea, o medo é a dificuldade de lidar com uma coisa desconhecida. Isso pode gerar tensão suficiente para
ultrapassar os limites da pessoa e fazer com que ela entre numa espécie de curto-circuito mental. Quem tem ataques de
pânico, por exemplo, perde a capacidade de imaginar situações. “E quanto menos ela consegue imaginar, maior a sua
ansiedade e menores os seus limites de tolerância frente à situação”, diz ele. “A hipnose ajuda o indivíduo a imaginar
que pode sair disso e viver com tranquilidade. Ele sai do pânico aproveitando seus próprios recursos, conscientes e
inconscientes.”

A psicanálise e diversas outras terapias também têm se mostrado eficientes para lidar com o medo e a ansiedade. O
sucesso não depende da linha terapêutica em si, até porque tudo depende da relação entre o terapeuta e o paciente. Mas
existe uma condição básica para que uma terapia dê certo. “O bom atendimento é aquele que não se limita a combater
os sintomas. É o que procura entender a causa do problema no cotidiano de cada pessoa”, diz o psicólogo Luís
Fernando Saraiva. Faz sentido: você pode tomar calmantes para dormir. Mas se não entender o que está tirando seu
sono, pouco adianta.

O fim dos medos


A maioria de nós passa por algum trauma na vida – assalto, sequestro, acidente, desastre natural, abuso ou a perda
repentina de alguém querido. E cerca de 10% dos que vivem um trauma (até 14% no caso das mulheres) vão
desenvolver o chamado transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). Eles revivem a cena em pesadelos e flashbacks
aterradores. Sentem tanto medo que chegam a se isolar do convívio social. Muitos conseguem se curar total ou
parcialmente com terapia. Mas algumas pessoas nunca se recuperam. Nesses casos, a grande promessa são os estudos
voltados à prevenção do medo. Eles buscam evitar que a emoção negativa seja gravada no cérebro. Fazendo pesquisas
em ratos, cientistas descobriram que injeções de substâncias como cortisol reduzem a chance de sofrer os transtornos.
Cortisol é o hormônio do estresse. Quanto mais estresse você tem, mais a memória é fixada. No entanto, por um motivo
que ainda não é bem compreendido, tomar uma grande dose de cortisol reduz a fixação do trauma.

“Daqui a cinco ou dez anos, tomaremos um comprimido após experiências ruins. E isso reduzirá drasticamente a
possibilidade de desenvolver um trauma”, diz Andero. O remédio terá preço acessível, como a pílula do dia seguinte
(usada para bloquear o desenvolvimento de gravidez), e você poderá comprá-lo na farmácia após uma situação ruim,
como um assalto. Os sintomas do trauma não se fixarão na memória e você terá mais chances de seguir sua vida normal.
“Como o medo é um fenômeno complexo, não dá para preveni-lo atuando num só receptor do cérebro. Por isso, haverá
dois ou três fármacos na mesma pílula”, acredita o pesquisador.
A ideia da pílula do medo não é eliminar a memória do acontecimento, e sim as emoções negativas associadas a ele.
Você se lembraria do assalto, mas sem trauma. Como todo medicamento, claro, o perigo é o uso indiscriminado.
Imagine um mundo onde ninguém tivesse medo de nada, nunca. Ele poderia evoluir de modo imprevisível, com
explosões de violência e ondas de solidão. “Faz parte da vida sentir medo e ficar ansioso. O que temos que avaliar é o
limite, ou seja, quando essas sensações se tornam insuportáveis. Aí sim merecem intervenção”, diz Saraiva. Para ele, a
sociedade nunca teve tão pouca tolerância a emoções negativas. Terminou o namoro? Tem que estar bem no dia
seguinte. A mãe morreu? Precisa levantar o astral. “Frente a qualquer sensação ruim, as pessoas já procuram tratamento,
como se não pudessem sentir o que sentem”, diz. Nunca sentimos tanto medo – e, pior, nunca tivemos tanto medo dessa
sensação. Talvez a chave do problema, e sua grande solução, morem justamente aí. Perder o medo do medo.
VIDA SOCIAL

Todo mundo tem medo de ser rejeitado. É normal – mas às vezes passa do limite.

Medo de perder as pessoas que ama


O que fazer: Apelar à razão.
Como: É o maior medo social dos brasileiros. Esse receio está enraizado no cérebro humano (pois a espécie é
extremamente social, depende da família e do grupo). Não temos como eliminá-lo, mas podemos aprender a conviver
com ele. Sempre que você sentir esse temor, lembre-se: ele é inútil, pois não ajuda em nada a proteger quem você ama.
E pode atrapalhar a relação entre vocês.

Medo da solidão
O que fazer: Ficar um dia offline. Ou terapia sistêmica.
Como: Experimente ficar um dia inteiro quietinho, sem falar com nenhum amigo via Facebook, WhatsApp e coisas do
tipo. Você verá que a solidão não é tão assustadora quanto parece. Para casos mais intensos, pode valer a pena procurar
um psicólogo especializado em terapia sistêmica (linha de análise que estuda a pessoa a partir das relações que ela tem
com outras).

Medo de levar pé na bunda


O que fazer: Mudar o foco.
Como: Ter medo de ser largado pela pessoa amada é uma profecia autorrealizável: quanto mais medo você sente, mais
paranoico fica, sem aproveitar os momentos bons a dois. Vira uma pessoa chata – e acaba afastando o outro. Faça de
conta que o medo não existe, por mais absurdo que isso possa parecer. Dá resultado.

Medo de perder o emprego ou de ficar sem dinheiro


O que fazer: Terapia cognitivo-comportamental.
Como: Mentalize o contrário do que dá medo. Sempre que lhe ocorrerem coisas do tipo “vou ser demitido” ou “meu
chefe me odeia”, pense em frases contrárias – como “sou bem preparado” e “meu trabalho tem valor”. Pode parecer
simplório, mas tem efeito comprovado – e poderoso – sobre o cérebro.
VIOLÊNCIA

Sim, você pode sofrer violências terríveis. mas não faz sentido antecipá-las.

Medo de crime
O que fazer: Ignorar estímulos negativos.
Como: Já reparou como a TV e os jornais estão cheios de notícias sobre violência? É que esse tipo de coisa ativa a parte
primitiva do cérebro – e tem um poder fortíssimo de chamar sua atenção. Mas também faz você sentir que o mundo é
mais violento do que realmente é. Evite consumir esse tipo de informação. Você quer fugir das suas fobias. Mas, para se
libertar, tem de abraçá-las.

Crises de pânico
O que fazer: Respirar… e buscar ajuda.
Como: Ataque de pânico é uma manifestação extrema de medo, que requer ajuda de um especialista. Há algumas
terapias que fazem efeito – como a hipnose, que auxilia o indivíduo a sair do pânico aproveitando os próprios recursos
mentais.

Medo de altura, insetos, lugares fechados/lotados


O que fazer: Dessensibilização.
Como: O segredo é se expor gradualmente à situação ou ao objeto ameaçador. Se você tem medo de barata, por
exemplo, baixe algumas fotos do inseto na internet, salve no seu computador e se obrigue a olhar uma por dia. Você
verá como o medo diminui (quando estiver mais confiante, aumente a exposição – veja um vídeo de baratas no
YouTube). A mesma técnica vale para situações como medo de altura e de lugares fechados. Procure se expor um
pouco a eles. Mas, nesses casos, leve um amigo junto.

Medo de dirigir
O que fazer: Dessensibilização.
Como: O segredo é enfrentar, mas aos poucos. Experimente começar dirigindo aos domingos, quando há menos
trânsito, levando um amigo junto. Se você sofreu um acidente e ficou com trauma, vale a pena procurar um analista ou
instrutor (há autoescolas especializadas em gente com medo de guiar).
MORTE

Todos vamos morrer. Alguns, com sofrimento. Mas isso não é relevante.

Medo de adoecer
O que fazer: Não dar ouvidos à internet.
Como: Se você entrar no Google e começar a pesquisar sintomas, com certeza vai terminar achando que aquela coceira
no seu braço esquerdo é sinal de um câncer incurável. Desconfie das coisas escritas na internet (mesmo em fontes
confiáveis, pois o que elas dizem não necessariamente se aplica a você). Nada melhor do que marcar uma consulta
médica para esclarecer tudo e acabar com as preocupações.

Medo de sofrer
O que fazer: Aceitar. Ou análise.
Como: Todo mundo tem esse medo. É normal. Se ele for muito intenso, e ocupar grande parte do seu tempo, pode valer
a pena fazer psicanálise – que tentará encontrar as raízes do temor. Outra opção é o psicodrama, técnica que trabalha as
vivências da pessoa por meio de dramatizações, como se fosse uma peça de teatro.

Você também pode gostar