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Módulo 1

4. ECONOMIA E PROTEÇÃO AMBIENTAL

4.1. INTRODUÇÃO

Na lição de José Paschoal Rossetti1 economia abrange apenas uma fração das
ciências sociais, competindo a esta ciência o estudo “da ação econômica do homem,
envolvendo essencialmente o processo de produção, a geração e a apropriação da
renda, o dispêndio e a acumulação.”
A despeito da superficial abordagem das definições supra, pode-se facilmente
concluir que as ações econômicas, bem como seus problemas não possuem
contornos bem delineados. As ligações existentes entre a economia e outros ramos
científicos, como o direito ou a sociologia, decorrem, segundo Rossetti 2, de que as
relações humanas e os problemas nelas implícitos ou delas decorrentes não são
facilmente separáveis segundo níveis de referência pré-classificados.

Assim, invariavelmente ações econômicas terão respostas finais no campo da


tecnologia, da psicologia e, principalmente no campo da tutela ambiental.
Relativamente a esta última correlação, qual seja economia e meio ambiente, é
ainda mais difícil sua separação, uma vez que trata-se o sistema econômico de um
subsistema integrante do sistema ecológico, sendo certo, como destaca Ricardo
Carneiro3, “que as mudanças de um afetam o outro, ou seja, qualquer mudança que

1 José Paschoal Rossetti, Introdução à economia, p..31.


2 José Paschoal Rossetti, op. cit., pp. 31-33.
3 Ricardo Carneiro, Direito Ambiental: uma abordagem econômica, p. 4.
ocorre no ambiente tem um impacto econômico direto, da mesma forma que
nenhuma decisão econômica pode ser entendida fora do contexto de seus inúmeros
e complexos efeitos sobre os ecossistemas e os recursos naturais.”
Diante dessa perspectiva e da atual crise ambiental, o estudo da economia do
meio ambiente, bem como das leis que regulam a atuação do homem no trato com
a natureza, torna-se cada vez mais importante. Para agravar ainda mais a situação
aumenta-se a toda hora os focos de tensão entre a necessidades humanas e os
recursos naturais, o que nos leva a uma irremediável situação de conflito entre
interesses de ordem econômica e interesses de ordem ambiental.

De se registrar a íntima relação do princípio do desenvolvimento econômico


com a problemática levantada, uma vez que o uso racional dos recursos disponíveis
decorre necessariamente do axioma “desejos ilimitados, meios limitados”.

4.2. OS INTERESSES ECONÔMICO E AMBIENTAL

Seguindo a orientação internacional, tanto a política ambiental nacional


quanto as diretrizes constitucionais referentes à tutela ambiental adotaram o
entendimento de que o desenvolvimento econômico e social e a preservação da
qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico podem ser compatibilizados,
desde que conciliados os dois valores.
Nesse passo, seria garantido ao particular a livre iniciativa econômica desde
que não ofendesse ou causasse dano irreparável à saúde pública ou ao meio
ambiente.
Por outro lado, em havendo conflito entres referidos valores
constitucionalmente tutelados, o meio ambiente ecologicamente equilibrado
deveria se contrapor ao direito individual do particular de exercer atividade que
venha a causar degradação do meio ambiente. Na lição de José Gomes Brito,4 “a
vida, a saúde e o bem-estar dos seres humanos devem ser preservados, vez que
constitucionalmente previstos acima de quaisquer considerações, como as de
desenvolvimento, as de respeito ao direito de propriedade, as de iniciativa privada”.
E mais:

Não há, portanto, direito adquirido em matéria ambiental,


visto como não existe o direito de poluir mas o dever de
não poluir, e sabemos que o que está em jogo quando se
discute a qualidade do meio ambiente é a proteção à
qualidade da vida humana, em decorrência do direito
fundamental à vida.

No mesmo sentido, José Afonso da Silva5:

As normas constitucionais assumiram a consciência de que


o direito à vida, como matriz de todos os demais direitos
fundamentais do homem, é que há de orientar todas as
formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente.
Compreendeu que ele é um valor preponderante, que há
de estar acima de quaisquer considerações como as de
desenvolvimento, como as de respeito ao direito de
propriedade, como as de iniciativa privada. Também estes

4 José Gomes Brito. Degradação ambiental, Revista dos mestrandos em direito econômico da UFBA, p.225.
5 José Afonso da Silva, op. cit., p. 818.
são garantidos no texto constitucional, mas, a toda
evidencia, não podem primar sobre o direito fundamental
à vida, que está em jogo quando se discute a tutela da
qualidade do meio ambiente, que é instrumental no
sentido de que, através dessa tutela, o que se protege é um
valor maior: a qualidade da vida humana.

A proteção ambiental, portanto, deverá sempre sobressaltar ao interesse


econômico, assegurando, além da capacidade de continuidade dos seres vivos, a
igualdade social e ambiental às gerações futuras.

De igual forma tem entendido o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

DIREITO AMBIENTAL. PRESERVAÇÃO AO MEIO AMBIENTE.


LIMINAR.
I – A decisão vergastada fez-se ao pálio dos pressupostos
ensejadores da liminar, eis que caracterizado o grave risco
ao meio ambiente, consubstanciado na deterioração
definitiva das águas do lençol termal. É de ser mantida a
liminar uma vez atendidos seus pressupostos legais.
II – Questões relativas a interesse econômico cedem passo
quando colidem com a deterioração do meio ambiente, se
irreversível.
II – Agravo Regimental desprovido.
(Agravo Regimental na petição nº 924 – GO
(1998/0005264-0). Relator Ministro Antônio de Pádua
Ribeiro. Disponível em: <http://www.stj.gov.br>. Acesso
em: 06.11.01)

Não obstante pacificado seja o entendimento a que nos referimos há pouco,


não poderíamos deixar de abordar o trinômio riqueza-pobreza-bem-estar 6 e suas
principais consequências para o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável.
Consoante alardeado pelos defensores do desenvolvimento sustentável,
somente com a satisfação das necessidades básicas das populações, bem como com
a adoção de um sistema social que garantisse a todos emprego, segurança social,
educação e respeito às culturas é que realmente se alcançaria um equilíbrio
ecológico-econômico pleno.
Todos, porém, concordam que até então os benefícios decorrentes da
exploração irracional dos recursos naturais vinham sendo, em sua maior parte,
utilizados para a manutenção das condições de vida dos chamados países ricos.
Dessa forma, à margem desse desenvolvimento, porém sofrendo com a escassa
disponibilidade de recursos ambientais e econômicos, restaram grandes parcelas da
população mundial vivendo na mais completa miséria.
Isso significa que para atender a esse imenso contingente de excluídos mais
recursos naturais deveriam ser disponibilizados para a sua transformação em bens
de consumo, o que, por conseguinte, significaria mais degradação ambiental.
Para Ricardo Carneiro7, oferecer condições mínimas de sobrevivência aos
excluídos, proporcionando-lhes oportunidades de trabalho, moradia, alimentação,
etc., ainda demandaria, considerando os obstáculos políticos normalmente impostos
à redistribuição de renda, uma notável expansão da economia global, com impactos

6 Marshal.
7 Ricardo Carneiro, op. cit., pp. 2/3.
ambientais inevitáveis, tanto mais quando se leva em conta as projeções de
aumento demográfico para os próximos anos.

Alcançar a sustentabilidade, nos moldes de desenvolvimento e crescimento


econômico que conhecemos atualmente, implicaria necessariamente em aumento
de produção. Seria viável, então, o desenvolvimento sustentável?
Parece-me que a melhor abordagem sobre o assunto foi dada por Ricardo
Carneiro. Segundo o autor8, ante a impossibilidade prática de uma rápida alteração
nos fundamentos atuais da economia, a solução seria a internalização das
externalidades ambientais negativas, ou seja, a absorção, aos custos privados, do
significado econômico da degradação ambiental.
Assim, para internalizar tais externalidades, a economia do meio ambiente
apontaria para dois caminhos, não excludentes. “O primeiro deles refere-se à
regulação direta, pela qual o Estado, no uso de seu papel normativo e regulador,
disciplina o comportamento dos agentes econômicos, estabelecendo padrões de
qualidade, exigindo a obtenção de licenças ambientais, proibindo determinadas
atividades e, sobretudo, punindo os que transgridem os critérios estabelecidos de
proteção e conservação do meio ambiente. O segundo, normalmente preferido
pelos economistas, sugere a adoção de incentivos e instrumentos de índole
econômica que possam, através de uma adequada atribuição de custos pela
utilização dos recursos ambientais (via sistema de preços), induzir o poluidor a

8 Ricardo Carneiro, op. cit., p. 3 “(... ) Se perguntarmos aos ecologistas a receita para obter a compatibilização entre
as aspirações materiais da humanidade com a preservação dos ecossistemas naturais e a manutenção dos padrões
mínimos de qualidade de vida, a maior parte deles certamente irá propor como situação ideal aquela em que se
pudesse deter rapidamente os níveis atuais de crescimento econômico , refrear o aumento populacional, demover as
pessoas dos seu hábitos perdulários de consumo, alterar radicalmente as matrizes energéticas fósseis, substituindo-
as pelo fluxo permanente da energia solar, investir maciçamente os recursos hoje disponíveis na recuperação de
ambientes degradados e no combate à pobreza e, sobretudo, mudar radicalmente os valores socialmente aceitos,
eliminando o individualismo e a concupiscência, em favor da simplicidade, da austeridade e da solidariedade.(...)”
controlar seus níveis de utilização dos recursos naturais, bem como o grau e o teor
de suas emissões.”

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