Objectivos da Unidade
O termo cultura tem múltiplas aplicações e foi usado em diferentes épocas e sentidos, tal
como ocorre na fase actual. Na Antropologia, o seu uso conheceu várias significações nas
diferentes escolas ou correntes.
Etimologia
Como mostra a sua etimologia, o termo cultura foi primeiro usado um sentido material,
significando cultivar a terra (colere terram). Mais tarde começou a tomar outros sentidos
como: sentido espiritual: culto aos deuses, prestar atenção aos deuses (cultus deorum);
sentido social: cultura como algo que identifica a coletividade, as populações e nações.
A definição antropológica clássica de cultura foi dada por Edward Tylor. Segundo este, a
cultura é “complexo unitário que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes e
várias outras aptidões e hábitos adquiridos pelo homem como membro da comunidade”
(Apud MARTINEZ, 2014:45).
Por sua vez, Franz BOAS (1930) considera que "a cultura inclui todas as manifestações dos hábitos
socias de uma comunidade, as reacções do indivíduo na medida em que se vêm afectadas pelos
costumes do grupo em que vive, e os produtos das actividades humanas, na medida em que se vêm
determinadas pelos ditos costumes”.
Para B. MALINOWSKI (1931), “a cultura inclui os artefactos, bens, procedimentos técnicos, ideias,
hábitos e valores herdados. A organização social não se pode compreender verdadeiramente a não
ser como uma parte da cultura".
Embora diferente, todas estas definição destacam aspectos comuns tais como: o carácter
humano da cultura; o facto de ela ser transmitida e adquirida historicamente pelo homem, em
tanto que membro de um grupo social; ter um carácter simbólico, característico de cada
grupo humano; ser um sistema complexo; que evolui, etc.
A cultura existiu desde que o homem começou a existir, ela é conatural ao homem, portanto,
não existe homem ou sociedade humanas sem cultura, tal como não há cultura sem sociedade
na qual ela é. A cultura evoluiu e diversificou-se ao rítimo de desenvolvimento histórico de
cada sociedade ou grupo social em que ela se insere.
Tal como se depreende das definições dadas à própria cultura, esta envolve vários elementos
tais como: crenças e ideias, valores, normas, símbolos, atitudes.
Porém é preciso salientar que a cultura é uma totalidade (envolve todos esses elementos no
seu conjunto), e não apenas um aspecto particular ou parcial da actividade mental ou de uma
manifestação humana. Assim, por exemplo, a simples forma de comer não se pode identificar
como o padrão cultural, pois ela é apenas uma expressão cultural que está integrada dentro de
um vasto complexo ou sistema cultural. Por detrás da forma de comer, há um leque de
valores, crenças, conhecimentos, significados e outros tantos elementos da cultura.
5. Factores da cultura
1. Uma componente imaterial (mental): produtos da actividade psíquica ora nos seus
aspectos cognitivos ora nos afectivos, significados, valores e normas.
Estas duas componentes não devem ser tomadas separadamente uma da outra. As duas se
relacionam e influenciam. Assim,
Bibliografia
BERNARDI, Bernardo. Introdução aos estudos Etno – Antropológicos. Lisboa, Edições 70,
1978.
MARTINEZ, Pe. Francisco Lerma, Antropologia Cultural: guia para o estudo, Maputo,
Paulinas, 2014.
1
Fornet-Betancourt define a interculturalidade como “(…) aquela postura ou disposição pela qual o ser
humano se capacita para, e se habitua a viver ‘suas’ referências identitárias em relação aos chamados ‘outros’,
quer dizer, compartindo-as em convivência com eles” (Apud NGOENHA e CASTIANO, 2011).
A diversidade cultural nos leva portanto a concluir que devemos observar e estar atentos a
todas as culturas e subculturas existentes numa sociedade, o que permite enriquecer os nossos
conhecimentos, tomando consciência dos valores existentes nas diferentes culturas. Por fazermos parte de
vários subgrupos (bairro, religião, família, etc) podemos observar valores conflituantes, sem que nenhum seja
possuidor da verdade absoluta. Devemos ser tolerantes às diferenças culturais e evitar ridicularizar os outros
simplesmente porque são diferentes de nós.
Não obstante a diversidade cultural de que falamos antes, existem em Antropologia o conceito de universais
culturais. Por universais da cultura entende-se o conjunto de elementos comuns a todas as culturas. Os
universais da cultura encontram seu fundamento pelo facto de os homens sentirem as mesmas necessidades
(biológicas, afectivas) em virtude da sua natureza biológica também igual. Com efeito, “todos os homens,
em toda a parte, procuram comer e beber o suficiente, abrigar-se e defender-se do perigo e do desconforto
físico, conseguir reacções favoráveis dos seus colegas (…), encontrar explicações satisfatórias dos fenómenos
do mundo observado” (MARTINEZ, 2014:28).
Os universais da cultura são vários: a linguagem, os sistemas de parentesco, as regras em volta da sexualidade,
o uso do fogo, as crenças num mundo sobrenatural (a ideia de Deus), a arte, a preparação dos alimentos, o
amor, as normas morais (fazer o bem e evitar o mal), o respeito, entre outros.
A estabilidade cultural é mantida através da tradição que é o “processo pelo qual através do tempo e do
espaço se transmite o património cultural de uma determinada sociedade de geração em geração”
(MARTINEZ, 2014:64). Esta transmissão é uma acção dinâmica e um processo de conservação e de contíbua
reinterpretação de coisas já existentes. Isso significa que a tradição não uma aceitação passiva ou mecânica,
mas uma perpetuação activa de valores essenciais de uma cultura.
A tradição é corporizada através das instituições, leis, usos e costumes, padrões de comportamentos.
Trata-se de um processo de ajustamento das respostas individuais aos padrões culturais de uma sociedade e
que acompanha toda a vida do indivíduo, desde a infância até à morte.
Segundo MARTINEZ (op. cit.), no processo de enculturação dão-se os seguintes passos:
a. Assimilação: Assimilação de comportamentos padronizados que a criança observa à sua
volta.
b. Conformação: a tendência é absolver o máximo de cultura e conformar o
comportamento a ela.
c. Aprendizagem dos símbolos: aprender todo o dispositivo simbólico que permitirá à
criança comunicar-se com os outros membros da sociedade e tornar-se apta para o
processo intelectual, sensitivo e volitivo.
d. Aquisição de hábitos: a criança adquirirá hábitos e costumes, disciplinará seus
movimentos biológicos e sofrerá uma mudança progressiva que transformará seu
Segundo MARTINEZ (op. cit. p. 71), “as culturas mudam por factores endógenos, através
dos processos da invenção e da descoberta; e por factores exógenos, por meio dos
processos de difusão, de aculturação e da globalização”.
Estes dois termos apresentam elementos comuns e elementos próprios. Os elementos comuns
são:
Alguns exemplos:
Factores Exógenos
a. O processo da difusão
De acordo com MARTINEZ, a difusão contribui inegavelmente para o progresso dos povos e
o crescimento cultural da humanidade em dois sentidos:
a. O processo de Aculturação
Segundo o Conselho de Ciência Social dos Estados Unidos, aculturação são “aqueles
fenómenos surgidos onde grupos de indivíduos que têm culturas diferentes entram em
contacto contínuo de primeira mão, com subsequentes mudanças nos padrões da cultura
original de um dos grupos ou de ambos” (Apud MARTINEZ, 2014:83). É o fenómeno que se
deu durante o contacto entre povos durante as guerras de dominação de reinos e impérios,
durante as guerras religiosas (cruzadas), durante o colonialismo, durante a escravatura, etc.
b. O processo de desculturação
c. O Processo da Globalização
Segundo devemos respeitá-la, pois, segundo Hilzidina Norberto Dias, a diversidade cultural é
“um património tão importante para a humanidade tal como a biodiversidade e que a
interculturalidade e o respeito pelas diferenças são as melhores formas de garantir a paz e
o desenvolvimento” (2010:8).
Uma das formas de valorizar essa diversidade cultural é a que o novo Currículo de Ensino
Básico Designa por Currículo Local. Trata-se de uma componente do currículo nacional
“constituída por conteúdos definidos localmente como sendo relevantes, para a
integração da criança na sua comunidade” (INDE, 2014, s/p).
3.1. Conceituação
O termos tradição foi antes definido como “processo pelo qual através do tempo e do espaço se
transmite o património cultural de uma determinada sociedade de geração em geração”. A tradição garante
a estabilidade e continuidade da cultura, daí que também é um dos elementos da identidade cultural.
Num contexto multicultural como o nosso, a definição da identidade cultural não passa por imposição de um
modelo cultural único ou de elementos culturais de uma só cultura, em detrimento de outras. Ela deve ser
negociada, procurando-se definir os elementos que melhor projectarão a imagem de todos (os
Porém é preciso salientar que a identidade cultural não pode ser vista como sendo um conjunto de
valores fixos e imutáveis que definem o indivíduo e a coletividade da qual ele faz parte. Pelo
contrário, o intercâmbio e a modificação são caminhos que orientam a formulação e a
construção das identidades. Segundo teorias recentes, a identidade cultural se constrói de
forma múltipla e dinâmica.
Aqui é oportuno nos perguntarmos: Que elementos definem a cultura moçambicana hoje?
A multiplicidade cultural na metade oriental da África Austral tem origem a partir dos
contactos entre povos causados pelas migrações. Estas migrações foram internas e externas.
Entre as migrações internas podemos destacam-se a migração dos povos bantu, do centro de
África para o região Sul (no caso de Moçambique, chegaram os San e os Khoi-khoi, que
depois se uniram formando os Khoisan), o Nfecane, a migração do povo Nguni por motivos
de guerras (1880) internas. E entre as migrações externas destacam-se as dos comerciantes
aisiáticos (indianos, árabes, persas, chineses), séc XII e ss, e colonos europeus (ingleses,
portugueses, alemães), sec XV-XVI.
A cultura socialista vem a ser amplamente difundida nas escolas por meio do Sistema
Nacional de Educação que tinha como objetivo formar um “Homem Novo”, que significava
Até à data da sua independência, Moçambique como nação não existia. Tratava-se apenas de
um território/colónia portuguesa composto por vários grupos sociais (etnias e tribos), cada
uma com sua cultura. O colono, para melhor dominar, não encorajou as culturas locais, mas
procurou, através da política de assimilação, civilizar, tornar portugueses os nativos,
obrigando-os a conhecer e viver a cultura portuguesa, em detrimento da sua própria. Portanto,
neste período colonial, a pluralidade cultural não era bem vista e foi combatida. Como
exemplo disso é a imposição da língua portuguesa, em detrimento das línguas locais.
Antes de tudo tentemos definir os conceitos de etnia, tribo e nação. Segundo P.
Mercier, uma etnia é um “grupo fechado, descendendo de um mesmo antepassado ou, mai
s
geralmente, tendo a mesma origem, possuindo uma cultura homogénea e falando uma lín
gua comum”. (Apud CHICHAVA, 2008: s/p). Por sua vez, Catherine Vidrovich- Cocquery
afirma que o termo etnia, na sua acepção socio-antropológica, surge no século XIX, com o
Imperialismo ocidental para designar “os povos ou sociedades consideradas
“primitivas” ou pré‐industriais, em oposição às sociedades ocidentais ou
evoluídas”. A partir dessa altura, a tribo ou etnia, em oposição à nação ― fenómeno
então tido como tipicamente ocidental ― foi considerada como um fenómeno
africano, onde os respectivos povos não teriam consciência da sua unidade nem vontade de
viver em conjunto. (Apud CHICHAVA, 2008).
Em conclusão, podemos afirmar com Chichava que o problema não é a multiplicidade étnica
ou a etnicidade em si, mas o uso que dela se faz, a sua instrumentalização, que pode conduzir
ao seu aspecto negativo (tribalismo). Torna-se problema quando se usa a origem étnica como
critério de selecção e exclusão de uns pelos outros no acesso aos recursos e postos do Estado.
A anomia é um conceito que foi bastante explorado no ramo sociológico. Um dos principais
representantes desta teoria foi o sociólogo e psicólogo social Émile Durkheim, em suas
obras “Suicídio” (1897) e “Da Divisão Social do Trabalho” (1893).
Mas, assim como afirma em suas obras, Durkheim diz que a anomia social permanece ativa
temporariamente, apenas durante o período de transação entre as transformações sociais.
Para sair do estado de anomia, as pessoas precisam de uma liderança carismática que lhes
indique novos valores e que, de um modo geral, o líder personifica. As pessoas se identificam
com a liderança e juntos começam a definir as suas novas identidades. Às vezes, estas
lideranças podem tornar-se ditadoras e totalitaristas, recorrendo à força para impor os novos
valores e normas que orientarão a sociedade.
Bibliografia
CASTIANO, José P. “O diálogo entre as culturas através da educação” in: NGOENHA, Severino E.
& CASTIANO, José P. Pensamento Engajado: ensaios sobre Filosofia Africana, Educação e Cultura
Política. Maputo. Editora EDUCAR, Universidade Pedagógica. 2011, p. 213-249;
DIAS, H. N., “Diversidade cultural e educação em Moçambique” (art.) in: V!RUS (Rev.),
São Carlos, n. 4, Dezembro, 2010, Disponível em: http://www.nomads.usp.br/virus/virus04/?
sec=4&item=4&lang=pt, Acesso em: 16/09/2017.