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{'lia Paraguai
Prancisco Drratioto
tudo é história
138
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Exali,., ; por nuus dr '~'>'n sé=ulo, a Guerra do
Paraguai tornou-se mot.oo w? ; .,C". 1 polê.r-ica em
an:(s recentes. Com base em minuciosa p <quisa
. (. ciusioe no arquivo reservado do Itamarat»), este
livryJpdt 1111'/. x\lque tanto a versão "crüica" d".I'.lio
J. \Chiave-" . '1)\ qianio a versão "prcriôtico" '1J.e
J 1íi uüos Jp nos ti, . de e,!lfl;olirno escola.
A.úalisando os z~teres~·~.>
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~I.BTU~~~ Francisco .Doratioto
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Coleção Primeiros Passos
Formação do Brasil
Dernêtrio Magnoli
o que é Guerra
A GUERRA
Contemporâneo
Caio Prado Jr.
Roberto Numeriano
-' po _PARAGU~
Genocídio Americano
Coleção Tudo é História DEDALUS - Acervo - FFLCH-HI
A guerra do Paraguai
905 A guerra do paraguai.
Julio J. Chiavenatto T912
A Guerra Contra o Paraguai
v.138
Da Móparquia â República Julio J. Chiavenatto
M@mentos decisivos
A RevoluçãoFarroupilha 11111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111
Ernília Viotti da. Costa
SandraJatahy Pesavento 21200041176
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TOMBO: 119678
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SBD-FFLCH-fJSP
editora brasiliense
Copyright © by Francisco Femando Monteo/iva Doratioto, 1991
Nenhuma parte desta publicação pode ser gravada,
armazenada em sistemas eletrônicos, fotocopiada,
reproduz ida por meios mecânicos ou outros quaisquer
sem autorização prévia do editor.
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T~~ - ISBN: 85-11-02138-8
'!. ~3g Primeira edição, 1991
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Preparação de originais: Rosemary C. Machado
Revisão: Ana Marisa Mendes Barbosa
Capa: Qu4tro Design - [uliana Vasconcelos SUMÁRIO
5.t{)t6 58' 3!
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Introdução
Brasil - Paraguai: -políticas defensivas no Prata..
·9.
15
As políticas externas ativas e convergentes (1842-'
1852) 24
Bf- Os interesses divergentes (1853-1862)
O Paraguai rumo à guerra (1862-1865)
34
42
tA
..
I·
Brasil, Argentina e Uruguai: a Tríplice Aliança
contra o Paraguai (1865)
Considerações finais
Indicações para leitura
62
78
82
Rua da Consolação, 2697
01416 São Paulo SP .
Fone (011) 881-3066 - Fax 881-9980
Telex: (11) 33271 DBLM BR
IMPRESSO NO BRASIL
li I
INTRODUÇÃO
1
rias, a Espanha criou em 1776 o Vice-Reino do Rio da
t Prata. Com sede em Buenos Aires, o Vice-Reino abran- .lI' - que Buenos Aires nao reconhecia - estava ameaça- \
gia, além da capital e adjacências, os territórios de Tu- da. Ademais, localizada estrategicamente na foz do Rio
cumán, Cuyo, Potosí, Santa Cruz de hl' Sierra, Charcas Paranã, Buenos Aires controlava a única saída paraguaia
e do Paraguai, neste a cidade de Assunção como capital para o mar. O país guarani encontrava-~~pois, numa!
provincial. Após longo .período de lutas militares e di-~ posição geopolítica extremamente vulner~. \
I
-l-~om
plomáticas entre Portugal e Espanha, a posse de Sacra--
mento ficou para a Coroa espanhola em 1777.
a proclamação das independências na América
I
Desde então e até 1864, as relações entre Brasil e Pa- I
raguai deram-se a partir de três elementos definidores: a
necessidade de demarcar as fronteiras, que cada país bus-
I Drtína, o Vice-Reino do Rio da Prata desmembrou-se cava segundo critérios que lhe fossem benéficos; a ga-
em repúblicas, enquanto a América portuguesa se man- rantia permanênte de livre navegação do Rio Paraguai
teve unificada sob a forma monárq~ O Paraguai pas- , que o governo imperial
, buscava junto ao governo para-
sou a ser governado por José Gaspar Rodríguez de Fran- guaio, por motivo anteriormente exposto; por último, fa- 11'
cia, um dos líderes do movimento independentista ocor- tor primordial na definição das relações entre Rio de Ja-
rido em 1811, que fçí nomeado, pelo Congresso Geral, neiro e Assunçãova ameaça representada pelo projeto de
Ditador Perpétuo.~ Brasil, D. Pedrol procurou con- Buenos 4-ire'S' de reconstruir, na forma de república, a
lunidade do antigo Vice-Reino do Prata. Quando a polí-
solidar sua autoridade sobre todo o território que com-
punha a antiga América portuguesa, inclusive a Banda
Oriental do Prata - atual Uruguai - que fora anexado
I tica de Buenos Aires apresentava maiores possibilidades
.de sucesso, Brasil e Paraguai estreitavam suas relações.
I
em 1821 por D. João VI, com a desigriação de Província í Quando tal sucesso parecia distante, as relações se tor-
navam menos amistosas, predominando as divergências
da ~s dois países tinham em comum a pre-
vençãtr'contrâ Buenos ~ que ameaçava ter sob sua em tomo da definição das fronteiras e da livre navegação
fl~ . . J
liderança, na forma de um Estado ~ublicano, o territó-
rio do antigo Vice-Rei no do Pratalr,ara o Império bra- CNo início da década de 1860, a possibilidade de Bue-
sileiro, a ameaça pairava sobre a posse da Banda Oriental nos Aires reconstruir a unidade territorial do Vice-Reino I
e a livre navegação dos rios platinas. O caminho fluvial do Prata era remota. Houve; mesmo, uma aproximaçãO!
. formado pelos Rios Paraná e Paraguai era a única forma entre Rio de Janeiro e Buenos 1!Le51 Por sua vez, nas I
relativamente rápida e viável, no plano comercial, de al- relações entre Brasil e Paraguai sobressaíam as divergên- \
cias, num processo que, por iniciativa paraguaia, levou
cançar a Província de Mato GrossoJsolada por terra do"
12 Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 21.1 visão 13
os dois países à guerra, em dezembro de 1864. Do con- 1tantes, conforme censo de 1857, dos quais mais de me-
flito também participaram, como aliados do Brasil, a Ar- [tade teria morrido no conflito. A historiadora norte-ame-
gentina e o Uruguai. ricana Vera Blinn Reber, porém, refuta tal número, que I
?-~ Na guerra entre a Tríplice Aliança - Brasil, Argen- exigiria o inverossímel crescimento demográfico anual I
tina, Uruguai - e o Paraguai, a inferioridade deste era de 17%. Usando a metodologia da história demográfica,
enorme nos aspectos econômico.. demo gráfico e militar. com base nas taxas históricas de crescimento populacío-
É o que releva a tabela seguinte: . nal paraguaio e comparando esse crescimento com o do,
resto da América Latina, Reber conclui que o Paraguai
País População Comércio ex- Tropa de linha tinha, rio início da guerra, entre 285 715 e 318 144 ha-
terior em libras bitantes.
Paraguai 318144 560392 12945 'A. gyerra contra-e-Paragaui não teve- apenas implica-
Argentina 1737076 8951621 18000 ções externas. para.o.Brasil. NQ_WM10 interno, serviu co-
Uruguai (número mo çatalis~qora desont!"ªitiçõ~ _CLu~-iévãramà-proçlã-
250000 3607711
simbólico) .mação da.República elll.J]~2., Divergências sobre a con-
Brasil dução da guerra contribuíram para que setores do Partido
9100000 23739898 6000
Liberal se afastassem do Imperador, fragilizando a sus-
tentação política da Monarquia, ao mesmo tempo em que
Quanto maior o número de habitantes de um país, tan-
se fundava o Partido Republicano, em 1870. À-~a
to maior, em princípio, sua capacidade de ampliar o exér-
cito em caso de guerra@ fato demonstra a vulnerabili- também fez com que o Exército se fortalecesse enquanto
dade militar paraguaia, numa época em que e~os nu- força armada e adquinsse nova imageni-desi próprio,
merosos eram fundamentais para vencer gu~. Essa segÚndo a ~al.Qs-niilitares- eram os pafnotas, enquanto
vulnerabilidade se agravava com a posição geográfica do os civis --=-"os casacas" - , na maioria, defendiam mes-
Paraguai, isolado no interior do continente, sem acesso quinhos interesses próprios. Os líderes militares, que der-
ao mar - e, portanto, à aquisição de armas modernas rubaram a Monarquia há um século, haviam lutado no
no exterior -, graças ao bloqueio naval da esquadra bra- . Paraguai.
sileira na foz do Rio' Paranã, intransponível devido à \ "
A- importância da guerra contra o Paraguai para o pro-
aliança do Brasil com Argentina e Uruguai. cesso histórico brasileiro explíca-ít.Xasta bibliografia so-
1 A versão corrente é a de que o Paraguai teria, antes li bre o tema. Este livro pretende contribuir para esclarecer
r da guerra contra seus vizinhos platinos, I 300 000 habi- as origens do conflito. Para tanto, evita personalizar o \
14 Francisco Doratioto
I • I
I
se à liderança da burguesia portenha e proclamou-se in-
dependente. Sofreu, em represália, a hostilidade de Bue-
nos Aires que, em 1813, embargou o seu comércio ex-
16 Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 2ª·visão 17
tenor. Como conseqüência, o líder paraguaio José Gaspar com o paraguai) nomeando Manuel Corre a da Câmara
,Alto Paraná por brasileiros levaram Francia a obrigar Câ- então, impor um modelo centralizador de Estado, pelo
mara a retomar ao Brasil em junho de 1829. qual o Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo pudes-
A guerra entre o Império e as Províncias Unidas do sem apoderar-se do mando político do país. Grupos do-
Rio da Prata decorreu da decisão do Congresso destas minantes regionais resistiram à imposição com subleva-
de incorporar a Banda Oriental (a "Cisplatina"), onde ções, às quais aderiam as massas populares com deman-
surgira a luta pela independência em relação ao Brasil. das próprias, procurando livrar-se de sua marginalização.
O território, motivo de três anos de guerra, não coube, , Das revoltas provinciais, a que se apresentou talvez
afinal, a nenhum dos dois contendores; tomou-se inde- como o maior desafio ao Rio de Janeiro foi a da Farrou-
pendente, graças à interferência diplomática da Grã-Bre- pilha, no Rio Grande do Sul. Iniciada em 1835, em 1838
tanha. Na Banda Oriental surgiu um país soberano: a proclamou a República Rio Grandense, seguida da Re-
República Oriental do Uruguai, com Buenos Aires e Rio pública Juliana, em Santa Catanna A Farroupilha pro-
de Janeiro assumindo o compromisso de defenderem a moveu uma articulação com o exterior, pela qual os re-
independência e integridade do novo Estado. A interfe- beldes, fugindo ao bloqueio naval da costa gaúcha pela
rência do governo britânico deveu-se aos grandes inte- Marinha Imperial, utilizaram-se de Montevidéu para suas
resses comerciais ingleses na região, cuja prosperidade exportações e para o recebimento de munições. Essa ar-
dependia de paz e de um porto seguro, Montevidéu. ticulação foi possível porque no Prata existia uma pola-
"rização de forças em luta entre si. No Uruguai disputa-
vam o poder os coZorados, ligados aos comerciantes e
às potências européias, aceitando as idéias liberais, e os
As lutas internas no Império e o recuo no Prata bZancos, compostos principalmente de proprietários ru-
rais, herdeiros da tradição autoritária espanhola, que se
I, opunham às intervenções européias no país.
Na década de 1830, inexistiram contatos oficiais entre
os governos brasileiros e paraguaio, pois ambos volta-
I, ram-se para seus problemas internos, ausentando-se do
Confederação Argentina: luta interna e interesses
Prata. Enquanto o Paraguai se isolava para preservar sua
geopolíticos
independência em relação a Buenos Aires, o Império en-
frentava lutas internas. Com a abdicação de b. Pedro I
em 1831, o poder político passou às mãos de brasileiros,
mais especificamente dos proprietários rurais. Tentou-se, I Envolvido na luta uruguaia estava o .governo da Con-
federação Argentina, que em 1831, sob a hegemonia de
Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 2e visão 21
20
Buenos Aires e tendo como líder o grande proprietário Juan Manuel de Rosas, da Província de Buenos Aires,
de terras Juan Manuel de Rosas, sucedeu às Províncias era líder dos produtores de charque para exportação, des-
tinada à alimentação de escravas no Brasil e em outras
Unidas do Rio da Prata, dissolvidas em 1829. A carac-
regiões do continente. Contava com o apoio de comer-
terística principal do processo de construção do Estado
ciantes e financistas portenhos, monopolizadores do co-
nacional argentino foi a luta entre unitários e jederalis-
mércio exterior. Tal monopólio prosseguiu com a Lei
tas. Ambos setores da clãsse dominante, unitários e fe-
das Aduanas de 1835. Proibindo a importação de uma
deralistas travavam uma disputa na qual estava em jogo série de produtos estrangeiras, e fechanda a Ria Paraná
o caráter que deveria assumir o Estado argentino. Os à navegação de barcos mercantes de outros países, essa
primeiros, basicamente comerciantes de Buenos Aires, lei favoreceu as manufaturas do interior argentino e, ao
defendiam um modelo centralizado, sob a liderança.da mesmo tempa, a própria burguesia mercantil, concen-
capital do antigo Vice-Reino. Pretendiam impor o mo-· trando toda contato cam o exterior na parto de Buenos
nopólio-do comércio exterior através da parto de Buenos Aires. Canjugada com uma política de farte repressão
Aires, apraprianda-se das rendas provenientes das aos opositores, cujas disputas promovia, a Lei das Adua-
impastos alfandegárias sabre as importações, Já osjede- nas de 1835 permitiu a Rosas estabelecer, sob a aparên-
ralistas, fundamentalmente elites regianais (grandes pro- cia de uma Confederação, um poder centralizado, favo-
prietários), pequenos manufatureiros e camerciantes vin- recendo a hegemania partenha.
culados ao mercado regional, eram favoráveis ao Estado A existência do Estada argentino centralizado permitia'
descentralizado, que lhes garantisse a cantinuidade de e, simultaneamente, exigia, para sua continuidade, que
Sua autonomia local. Além disso, a descentralização evi- Rosas interviesse no Uruguai, pois a porto de Montevi-
taria que a burguesia mercantil partenha se apropriasse, déu representava uma possível alternativa ao de Buenos
por meia de impostos, do excedente econômico gerado Aires para o comércio externa das províncias do litoral
nas províncias e que ficava em mãos dessas oligarquias fluvial argentino - Entre Rias, Corri entes , Santa Fé e
regionais. Córdoba -, assim chamadas por terem acesso ao mar
A luta entre centralizadores e descentralizadores foi par meio dos rios. Tal passibilidade seria afastada com
característica das diferentes países da América Latina, . 'o estabelecimento do "sistema americano", no qual a ca-
com exceção do Paraguai, que vivia sab a ditadura ..de. pital da Confederação submeteria também o Paraguai e
Francia. No Brasil, o Partido Liberal defendeu a descen- o Uruguai. Assim, na guerra civil uruguaia, que se esten-
tralízação, enquanto a Partida Conservador era favorável deu de 1839 a 1851, a Argentina interveio apaiando a
ao projeto centralizador, facção blanca contra os colorados. Estes, por sua vez,
22 Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 2~ visqo 23
contavam com a apoío das potências européias, a que revolta; a 1º de março de 1845 foi assinada a paz. A
lhes permitiu resistir em Montevidéu ao cerca dos ini- reintegração do Ria Grande ao Império beneficiou .os
migos. O Império brasileira, imobilizado em suas lutas próprias pecuaristas gaúchos. que passaram a contar, en-
I
tência hegemônica européia, a Inglaterra, como revela a
recusa em renovar, no início da década de 1840, o Tra-
tado Comercial de 1827, que concedera aos ingleses pri-
vilégios comerciais.
O fato de ser a única monarquia na América levou os
governantes do Império a apontarem o Brasil 'como um
solitário no continente, cercado de potenciais inimigos,
Temia-se o surgimento de uma grande república liderada
AS POLÍTICAS EXTERNAS ATIVAS por Buenos Aires, que poderia vir a ser um centro de
E CONVERGENTES (1842-1852) atração sobre o problemático Rio Grande do Sul e o iso-
lado Mato Grosso. Para o Império, a melhor garantia de
que a Argentina não se tomaria uma ameaça concreta
estavano fato de Paraguai e Uruguai serem países inde-
pendentes, com governos livres da influência argentina,
No início, da década de 1840, tanto no Brasil quanto A existência desses Estados era, também, a segurança de
no Paraguai, ocorreram mudanças que permitiram aos que os rios platinos não seriam nacionalizados por Bue-
dois Estados voltar a participar das questões platinas. Su- nos Aires, o que ameaçaria sua livre navegação. E esta,
A política externa paraguaia depois de Francia portação era a única forma significativa de essa burgue-
sia obter dinheiro, em contrapartida das mercadorias
agropecuárias que produzia, ou seja, de acumular capital
Em "1840 morreu Francia, o ditador paraguaio. Um
I
na forma monetária."
.•.•., dos representantes do núcleo de sobreviventes dos gran- Carlos López instalou no país uma ferrovia, além de
I
des proprietários rurais, Carlos Antonio López, mano- fundição e arsenal, estimulando também o comércio ex-
brou a situação de modo que o Congresso paraguaio, terior. Para absorver tecnologia moderna, estabeleceu
reunido em 1844, o designou presidente da República. " contato direto com os países da Europa e os Estados
Conseguiu também que o Congresso promulgasse uma Unidos. Na década -de 1850, Francisco Solano Lõpez,
"Lei de Administração Política da República", legalizan- filho do presidente paraguaio, foi enviado ao velho con-
do o sistema político autocrático implantado por Francia. tinente como Ministro Plenipotenciário, ou seja, agente
Consolidou-se, assim, uma extrema centralização do po- diplomático portador de plenos poderes para negociar.
der, permitindo ao presidente fazer praticamente tudo o Na Inglaterra, entrou um contato com a Blyth & CO., à
que desejasse, sob a justificativa de manter a ordem. época unia das companhias tecnologicamente mais avan-
No plano interno, o governo de Carlos López foi uma çadas do mundo. Por seu intermédio, o Paraguai conse-
continuidade da autocracia de Francia, mas nas relações guiu material de guerra e recrutou dezenas de técnicos
I
exteriores foi diferente. O novo chefe de Estado procurou europeus para modernizar o país, ao mesmo tempo em
romper o isolamento do país, e o Congresso, para con- que jovens guaranis iam receber treinamento especiali-
seguir o reconhecimento internacional, proclamou sole- zado 'naquela empresa. "
nemente, em 1842, uma independência que, de fato, era O Estado paraguaio dos López - Francisco Solano
realidade desde a década de 1810. sucedeu ao pai na presidência - implementou, pouco a
A mudança da política externa atendia à necessida- pouco, uma estratégia de "crescimento para fora", essen-
de de viabilizar a dinamização da economia. Na ausência cialmente com base nas exportações agropecuárias para
de um setor social com experiência administrativa e ca- os mercados regional e europeu. Essas exportações só se
pital financeiro para tanto, o Estado assumiu essa dina- I' tomaram viáveis com a liberdade de navegação implan-
mização, passando a representar os interesses da nascente tada no Prata após a derrubada de Rosas. A partir da
burguesia rural, ligados à expansão do regime capitalista, década de 1850 e até 1862 surgiram dois Estados argen;
com base na exploração da agropecuária e mão-de-obra tinos: a Confederaç-ão Argentina e o Estado de Buenos
barata e disciplinada, visando ao mercado externo. A ex- Aires; lutando entre si, não impuseram obstáculos à livre
A' Guerra do Paraguai: 29 visão 29
28 Francisco Doratioto
I
Negócios: Juan Andrés Gelly. Nos primeiros dias de 1847,
Pimenta Bueno assinava em Assunção o ato de reco-
apresentou ao governo imperial dois projetos de tratados:
nhecimento da independência paraguaia, firmando, ain-
um de limites e outro de aliança ofensiva e defensiva.
da, um Tratado de Aliança, Comércio, Navegação, Ex-
O tratado de 1844, assinado por Pimenta Bueno com o
tradição e Limites, pelo qual, entre outras coisas, o Im-
Paraguai, não havia sido ratificado pelo governo brasi-
pério se comprometia a fazer gestões para que outros
leiro; este não concordava com o artigo que, na prãtica,
países reconhecessem a independência do Paraguai. Por
30 Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 211 visão 31
estabelecia que qualquer país poderia abrir à força a na- o Império e os países do Prata: relações
vegação de rios interiores de outros países. A posição internacionais e política interna
dos governantes imperiais explica-se por ser o tratado
desfavorável ao Brasil e implicar um precedente ao qual
poderiam recorrer outros Estados vizinhos, em prejuízo ' Para neutralizar a situação, que via ameaçadora, Pau-
de territórios incorporados ao Império graças ao expan- lino de Souza tratou de ajudar financeiramente os colo-
sionismo lusitano, se considerado o Tratado de Santo Il- rados no Uruguai. Estes controlavam apenas a capital do
defonso para definir os limites. É importante considerar, país, na luta contra os blancos, cujo líder, Oribe, tinha
também, que o rio Amazonas era mantido fechado à na- \ o apoio, militar inclusive, de Rosas. Além disso, o chan-
vegação internacional, inclusive de embarcações de paí- celer brasileiro aproximou-se de setores que se opunham
ses fronteiriços, enquanto ao sul, paradoxalmente, o Im- a Rosas na Confederação, assinando uma aliança com o
pério defendia a abertura dos rios platinos à mesma na- Paraguai, em 1850. Com os colorados o Império assu-
vegação. Ao aceitar o princípio do tratado assinado por miu, secretamente, o compromisso de colaboração finan-
Pimenta Bueno, estaria o governo imperial abrindo ca- ceira mensal, por intermédio do banqueiro Irineu Evan-
minho para a intervenção, no Norte do país, de potências gelista de Sousa, futuro Barão de Mauá. Evitava-se, as-
européias e dos EU A interessadas na região amazônica. sim, a eventual queda de Montevidéu nas mãos dos blan-
A posição do governo imperial quanto ao Paraguai era COS, o que privaria o Império de sua base de operações
governo legal, colorado, isolado em Montevidéu, que era de 1851. O objetivo declarado era manter a indepen-
favorável à liberdade de navegação, contra os blancos dência e promover a pacificação do Uruguai por meio
• que dominavam todo o país e se alinhavam com Rosas. da expulsão de Oribe e da força argentina que o apoiava .
Na Confederação, o governo brasileiro .tambérn buscaria No decorrer dos acontecimentos, Urquiza entrou com
se aliar à oposição a Rosas. Assim, a 25 de dezembro suas forças em território uruguaio e em outubro os b/an-
de 1850, o Império assinou com o Paraguai um tratado cos se rendiam. O ditador argentino, em represália, de-
secreto contra Rosas: que também estabelecia a promessa clarou guerra ao Brasil, que, para enfrentá-lo, estabeleceu
de auxílio recíproco para manter livre a navegação do nova aliança com o governo uruguaio e as províncias de
Rio Paraná. O Brasil colocou armase oficiais instrutores Entre Rios e Corrientes. O Rio de Janeiro concedeu um
à disposição do Paraguai, que retribuiu com a promessa empréstimo a Urquiza para financiar a luta, além.de for-
de cavalos. necer material de guerra.
A situação interna da Confederação favoreceu o Im- o Paraguai não aderiu à aliança contra Rosas porque
I
pério. Em maio de 1851, Justo José de Urquiza, gover-
nador de Entre Rios, província que tivera sua economia
atingida por medidas de Rosas, rompeu com este. Quatro
I
Caríos López tinha dúvidas da boa-fé de Urquiza em
relação ao país guarani. Já o governo inglês, ainda que
favorável ao ditador, absteve-se de tomar partido no con-
meses antes, em janeiro, o representante do governo im- flito. A manutenção da ordem que credenciara o líder da
perial em Montevidéu fora procurado por um agente de Confederação aos olhos dos governantes britânicos esta-
Urquiza e, a partir desse contato, as negociações evoluí- va custando a própria ordem, e a única forma de enfren-
ram para uma aliança entre o caudilho entrerriano e o tar os dissidentes apoiados pelo Brasil seria o terror cres-
Brasil, na qual aquele aceitou as condições determinadas cente. Ora, a luta no Uruguai, a guerra civil na Argentina
por Paulino de Souza: rompimento público entre Urquiza e o recrudescimento da repressão política eram prejudi-
e Rosas; garantia por parte do primeiro da mariutenção ciais aos investimentos e ao comércio internacional em
da independência do Uruguai e do Paraguai e, ainda, a Buenos Aires. O governo de Rosas perdera, assim, sua
retirada das tropas argentinas do Uruguai, onde o coto- razão histórica de existir.
rado Eugênuo Garzón deveria ser mantido na presidên- Em combate travado em Monte Caseros, a 3 de feve-
cia. A política do Império no Prata beneficiava-se, assim, reiro de 1852, as tropas aliadas, com vinte e cinco mil
com a velha disputa entre unitários e federalistas na Ar- soldados, dos quais. quatro mil eram brasileiros, vence-
gentina. ram a força de vinte e dois mil homens chefiados por
A aliança ofensiva entre os governos do Império, de Rosas, que se exilou na Grã-Bretanha, onde morreu.
Montevidéu e de Entre Rios foi assinada em 29 de maio
lt
I IA Guerra do Paraguai: 2~ visão 35
l
Buenos Aires, tendo como capital a cidad~ de mesmo
nome.
A posição do Império no Prata era confortável, pois
com a derrota de Rosas rompera-se o equilíbrio de forças
na região em favor do Rio de Janeiro, que pôde, assim,
., tomar-se hegemônico na área. O novo quadro platino
permitiu ao governo imperial estabelecer os tratados de
1851 com o Uruguai, que se tomou quase um protetorado
brasileiro, e a permanecer tranqüilo quanto à continuida-
OS INTERESSES DIVERGENTES de das independências uruguaia e paraguaia, pois contra
(1853-1862) as mesmas não havia uma ameaça argentina imediata. O
" .
governo imperial manteve-se, inicialmente, eqüidistante
nas disputas entre Buenos Aires e a Confederação, não
devido a uma política deliberada, mas em decorrência da
ameaça britânica em apoiar Buenos Aires, caso o Brasil
Derrubado Rosas, os governadores das províncias ar-
ajudasse Urquiza de algum modo. Isso, porém, não im-
gentinas assinaram o Acordo de San Nicolãs, pelo qual pediu que o Império fosse simpático à Confederação,
perdia Buenos Aires a delegação das demais províncias com a qual chegou a assinar, em 1856, um Tratado de
para dirigir a política externa.e as finanças do país. Para Amizade, Comércio e Navegação.
executar tais tarefas foram criados os poderes Executivo
.e Legislativo, ambos de caráter nacional. Enquanto treze
províncias juravam, em 1852, a Constituição, que sacra-
mentava as alterações, a burguesia mercantil portenha Os problemas da fronteira e da navegação do
recusava-se a participar, com Buenos Aires fazendo sua Paraná
própria Constituição em 1854. Passaram a existir, então,
duas unidades políticas independentes entre si; uma, a
Confederação, com capital na cidade de Paranã, tendo A essa altura, colocava-se ao Rio de Janeiro a questão
de definir, de modo favorável a si, as fronteiras tanto
como Presidente o general Urquiza, e outra, o Estado de
\ com a Confederação, quanto com o Paraguai. Faltava,
36 A Guerra do Paraguai: 29 visão 37
Francisco Doratioto
ainda, à diplomacia imperial, consagrar, de acordo com princípio do 'ut! possidetis de facto, pois seus cidadãos
o direito internacional, por meio da assinatura de trata- ocupavam a área. O governo paraguaio, por sua vez, sõ
dos, a livre navegação dos rios internacionais que pas- aceitava o uti possidetis jure, baseando-se na posse legal,
savam pelos territ6rios desses países, existente de fato para o que invocava o Tratado de Santo lldefonso, de
desde 1852. Carlos Antonio L6pez, porém, praticou uma 1777, assinado entre as Coroas espanhola e portuguesa,
política de resistência quanto às demandas do Rio de como definido r das fronteiras. O Império, porém, con-
Janeiro, condicionândo a assinatura de tratados de co- tra-argumentava que o Tratado de Badajoz, de 1801, en-
mércio e de livre trânsito fluvial à definição de limites tre as duas antigas metrópoles, superara aquele do século
favoráveis ao Paraguai. Como conseqüência, durante par- anterior, anulando-o. O governo guarani insistia no Rio
te da década de 1850 as relações brasileiro-paraguaias Branco como limite entre os dois países, por acreditar
caracterizaram-se pelas divergências, que quase levaram que o Apa não significava uma barreira genuína para a
os dois países à guerra. expansão de brasileiros na região. Esse último rio per-
r As relações entre a Confederação e o Paraguai não manecia quase seco, restando-lhe apenas um fio d'água
. eram, em 1856, das mais cordiais. O Congresso da Con- durante metade do ano, não se caracterizando como um
federação recusara-se a ratificar o Tratado de Limites obstáculo sério à referida expansão.
assinado com Assunção em 1852, quando do reconheci- As divergências quanto às fronteiras foram a causa
mento da independência paraguaia, ordenando que Ur- central da deterioração das relações entre o Paraguai e
quiza o renegociasse. A resistência de Carlos L6pez em o Império, a ponto de, em 1853, o governo paraguaio
ceder o Chaco e as Missões, regiões reivindicadas pelo expulsar do país o Encarregado de Neg6cios brasileiro,
governo da Confederação, fez com que esta se conten- Pereira Leal, acusado de provocar a discórdia nas rela-
tasse em assinar, em 1856, um Tratado de Paz, Comércio ções entre Assunção e Buenos Aires e de faltar com o
e Navegação com o Paraguai, deixando em suspenso a respeito para com Carlos L6pez. No ano seguinte, o go-
~questão de limites por seis anos. verno paraguaio proibiu a navegação de navios estran-
Também as relações entre o Rio de Janeiro e Assun- geiros por seus rios, enquanto não fossem definidas as
I
. ção eram problemáticas na década de 1850, devido à
questão da livre navegação do Rio Paraguaí, bem como
a definição das fronteiras. O governo imperial reclamava
os tenit6rios entre os rios Branco e Apa, com base no
fronteiras com o Brasil. Desse modo buscava impedir
que o Império fortalecesse o Mato Grosso, pois era in-
teresse de Carlos López negociar os limites com o Brasil
em uma posição favorável política e militarmente.
38 A Guerra do Paraguai: 2~ visão 39
Francisco Doratioto
Prenúncio de guerra e acordos precários mais de 600 toneladas, nem transportassem mais de oito
canhões cada um. Tais medidas, contudo, segundo cláu-
sula do tratado, só entrariam em vigor quando houvesse
À expulsão de Pereira Leal e estabelecimento de obs- um acordo definitivo sobre a questão dos limites entre
táculos à navegação seguiu-se uma exibição de força por os dois países. A missão de Ferreira de Oliveira foi um
o
parte do Império. Almirante Pedro Ferreira de Oliveira desastre diplomático que pode ser explicado pelo fato de
partiu do Rio de Janéiro para Assunção em caráter de En- Carlos L6pez não pensar em recuar, já que não temia a
carregado de Neg6cios no Paraguai, acompanhadode uma esquadra imperial, pois tomara conhecimento das ordens
esquadra de vinte navios, 130 canhões e cerca de 2 000 do Almirante de abster-se de qualquer violência.
homens. Tinha instruções no sentido de conseguir a re- O governo imperial não ratificou o acordo assinado
paração de atitude do governo paraguaio com respeito à por Ferreira de Oliveira, já que não se obteve o livre
referida expulsão, bem como garantir a livre navegação trânsito do Rio Paraguai, conforme estabelecido, impli-
dos rios Paranã e Paraguai com base no artigo 32 da \ citamente, pelo tratado de 1850. Preparou-se então o Im-
Convenção de dezembro de 1850. Deveria ainda o Al- pério para usar a força para abrir aquela via fluvial à
mirante obter um tratado de -comércío e limites com o navegação, mas Carlos L6pez, procurando ganhar tempo,
país vizinho. enquanto se fortalecia militarmente, enviou um Ministro
Não chegou a haver choque armado entre a esquadra Plenipotenciário ao Rio de Janeiro em 1856, para tratar
e as forças paraguaias. Ferreira de Oliveira, de um lado, dos assuntos pendentes. Em 6 de abril do mesmo ano,
não podia fazer operações de guerra, pois, paradoxal- o enviado paraguaio assinou com o Império o Tratado
. mente, tinha ordens de se abster de qualquer ação vio- de Amizade, Comércio e Navegação, no qual se adiava
lenta, e, ademais, o rebaixamento das águas do Rio Pa- por seis anos a definição de limites e garantia a livre
raguai imobilizara a força naval à altura da fortaleza de navegação do Rio Paraguai para os barcos brasileiros.
Humaitá. Carlos L6pez, por sua vez, não dispunha, ainda, Desse modo, em 1862, Assunção deveria retomar a di-
de forças suficientespara um enfrentamentocom o Brasil. fícil questão de limites, simultaneamente com os vizinhos
As duas partes não querendo luta, houve negociação brasileiro e argentino, com os quais tinha compromissos
e chegou-se a um acordo. O governo paraguaio concor- assinados nesse sentido. Tal coincidência seria um risco
dou com o trânsito de navios mercantes por seus rios, para o Paraguai, na medida em que oferecia aos dois
I
Apesar do acordo assinado, o governo de Carlos Ló-
do-o a adotar uma posição de prudência e a aceitar as
pez continuou a dificultar, por 'meio de regulamentos, a
pretensões brasileiras qúanto à navegação. No mês se-
passagem dos navios brasileiros que rumavam para Mato
guinte, o Ministro Plenipotenciário do Império assinou
Grosso. Em resposta, o chanceleer imperial, José Maria
com o representante paraguaio, Francisco Solano López,
da Silva Paranhos, partiu para Assunção, passando antes
um acordo que liberou os rios à navegação e, por pro-
por Buenos Aires e por Paraná, onde assinou com a Con-
tocolo anexo, definiu a Baía Negra como.limite ociden-
federação vários acórdos, entre os quais um em que o
tal, no Chaco, entre os dois países:
Brasil concedia um novo empréstimo e um protocolo re-
Assim, no final dos anos 1850 e início da década se-
servado. Por este, a Confederação, juntamente com o
guinte, a hegemonia do Império só não era completa no
Uruguai, reclamaria a abertura do Rio Paraguai à livre Prata devido à resistência do governo de Assunção. Era
navegação, coincidindo a demanda com a presença de a ameaça à independência do Estado guarani que fizera,
Paranhos em Assunção. Não se chegou a estabelecer uma no passado, as relações brasileiro-paraguaias centrarem-
, aliança militar contra o Paraguai porque o enviado im- '
se nos aspectos convergentes. Afastada tal ameaça, em
perial não aceitou as pretensões argentinas quanto à de- decorrência das lutas internas argentinas, passaram a pre-
c
t<Y7.:
finição de limites com esse país vizinho'. Ainda assim, dominar naquelas relações as divergências, potencializa-
Qi'f-etQC.Q!O estabelecia a possibilidade de cooperação mi- das no início da década de 1860, quando se definiu o
litar entre1'araná e Rio de Janeiro, em caso de guerra contexto que levaria à guerra entre o Paraguai e o Brasil,
contra o Paraguai. Neste caso, a Confederação forneceria em dezembro de 1864.
6 000 homens, enquanto ao Império caberia acrescentar
mais 8 000 soldados, além de forças navais para o blo-
queio fluvial, ataque a posições paraguaias e transporte
de suprimentos e tropas. Caso não participasse do con-
flito, caberia ao governo de Paraná permitir que as forças
imperiais passassem pelo território de Corrientes, en-
quanto o Brasil se comprometia a impedir, com sua Ma-
rinha, eventual ataque de Buenos Aires à Confederação.
Em janeiro de 1858, Paranhos encontrava-se em As-
sunção, onde circulavam, convenientemel!te, os rumores
do protocolo reservado que assinara com o governo da
li
A Guerra do Paraguai: 2~ visão 43
Martín Garcia - ilha que, fortificada, poderia controlar Francisco Solano López e a ofensiva paraguaia no
a navegação do Prata - não tinham por fim opor obs- Prata
táculos ao livre trânsito dos rios Paraná e Paraguai por
países neutros, nem o objetivo de ameaçar a 'inde-
pendência uruguaia. A burguesia mercantil e financeira No mesmo ano de 1862 faleceu o presidente paraguaio
de Buenos Aires tinha interesse na paz com o Império, de Carlos Antonio López, substituído na chefia do Estado
modo a evitar obstãculos externos à sua consolidação no pelo filho, Francisco Solano López. O Paraguai era, en-
poder. Ademais, uma guerra com o Brasil significaria, tão, um país unificado, que, graças à presença de técnicos
em decorrência de eventual bloqueio do Rio da Prata, estrangeiros, fizera alguns avanços técnológicos. Essa
promovido pela Marinha imperial, a perturbação do cres- modernização, todavia, era de caráter militar ou defen-
cente e 'promissor comércio externo argentino. sivo, pelo fato de que o país não tinha fronteiras defini-
Após décadas de posições contrárias, as políticas do das com seus vizinhos e continuava a desconfiar das in-
Império - desde 1862 governado por um gabinete libe- tenções de Buenos Aires. Na área produtiva não houve
ral - e Buenos Aires começavam a encontrar uma base a mesma modernização, com o camponês paraguaio uti-
I
comum. O liberal Bartolomé Mitre era favorável à livre lizando ainda técnicas de cultivo de dois séculos atrás.
navegação e no Uruguai tinha ligações com os colorados, O Estado paraguaio era dono de quase 90% do território
de hist6ricas afinidades com o Império. Já a oposição nacional e da quase totalidade das atividades econômi-
federal àquele presidente, para se contrapor ao poder cen- cas. Para manter seu ritmo de desenvolvimento, possível
tral argentino, buscou estreitar relações com os blancos com a importação de tecnologia estrangeira, a economia
no país oriental e com o governo paraguaio. Ao Rio de paraguaia necessitava ampliar o comércio externo, de
Janeiro não passava despercebida a posição favorável de .modo a conseguir recursos, Tal quadro levou o Paraguaí
Mitre à livre navegação, bem como sua proximidade dos a sair de seu relativo isolamento e a projetar-se cada vez
colorados uruguaios, tradicionais aliados do Brasil. O mais para fora de suas fronteiras, intervindo nas lutas
Partido Liberal não chegava a ter uma política definida políticas do Prata.
para o Prata, mas, por outro lado, durante a década em A ação no sentido de aumentar sua presença no Prata
que esteve na oposição, criticara a política antiargentina colocava Assunção em rota de colisão com o Império.
para a região do Partido Conservador. Estava, portanto, Este buscava manter a correlação de forças entre os paí-
despido de maiores preconceitos em relação ao novo go- ses platinos, cujo desequilíbrio era favorável ao Brasil,
verno argentino. hegemônico na área por ter sido até então vitorioso em
46 Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 2~ visão 47
influir .sobre os Estados da região por meio de um siste- Liga Progressista, com maioria na Câmara, causando a
ma de alianças, do qual o Paraguai deixara de fazer parte.
A falta de definição de limites, ao cabo dos seis anos de
adiantamento estipulado em 1856, era elemento visível
Iqueda do Conservador, presidido pelo Marquês de Ca-
xias, O período entre 1862 e 1868 viu a constituição de
seis gabinetes liberais, seqüência causada por divergên-
de tensão entre essa República e o Império. cias na própria Liga e pela falta de apoio do Parlamento.
Além das questões de limites e de navegação, ligadas Tais lutas tiveram repercussão no Prata, onde também a
entre si pela política do governo paraguaio, aprofundava ação da diplomacia brasileira passou a ser ditada visando
a rivalidade brasileiro-paraguaia a disputa pela posse de a fortalecer o grupo político que ocupava o gabinete.
terras de produção de erva-mate e dos mercados de con- A nova postura do Paraguai, de participar dos assuntos
sumo de suas exportações. No ano de ascensão de Solano platinas, alterou igualmente suas relações com a Argen-
López ao poder havia a superabundância de mate no Pra- tina. Nesta, apesar da vitória do prdjeto centralizado r de
ta, desvalorizando o produto quando Assunção necessí- Estado, decorrente de derrota militar de U rquiza em
tava de maiores recursos. A ampliação das exportações 1862, restavam resistências federalistas nas províncias,
paraguaias de mate teria que ocorrer, obrigatoriamente, especialmente em Entre Ríos e Corrientes. Para combater
às custas do mate brasileiro. Era mais um fato a contri- o recém-nascido governo central, procurou a oposição
Flores invadiu o Uruguai com tropas recrutadas e orga- tivamente as propostas de aliança. O presidente para-
nizadas em Buenos Aires e com o beneplácito do gover- guaio deu instruções a seu cônsul em Paranã no sentido
no argentino. Tanto os colorados quanto os seguidores de que Urquiza deveria marchar contra Buenos Aires,
de, Mitre eram liberais, vinculados economicamente ao explicitando, porém, ao mesmo tempo, que não apoiaria
comércio exterior. Tinham a uni-Ias, ainda, os laços esta- uma tentativa de separatismo. A postura no sentido da
belecidos à epoca da ditadura de Rosas, quando os libe- manutenção da integridade territorial argentina, em 1863,
rais argentinos, inclusive Mitre, se refugiaram em Mon- explica-se pelo fato de que López a encarava como con-
tevidéu. Frente a esse quadro, hostilizado por seus po- dição para o equilíbrio no Prata, sem o que o Império
derosos vizinhos - pois o governo imperial protestara se imporia na área.
em relação a violências cometidas contra súditos seus em A exacerbação gradual e controlada dos atritos dentro
território uruguaio - e enfrentando a revolta colorada, da Argentina e desta com os blancos no Uruguai poderia
Bernardo Berro aproximou-se do Paraguai, enviando a criar urna situação de equilíbrio platino. O governo uru-
I Assunção Octavio Lapido. Lápido tinha instruções no
guaio e os federalistas argentinos interpretavam a ambi-
sentido de convidar Solano Lépez para uma aliança, sob
güidade do líder paraguaio como a de um aliado em po-
o argumento de que apenas com a união dos dois países,
tencial, resistente em assumir um compromisso formal,
I'
haveria um equilfbrío no Prata de modo a conter as am-
mas que o faria com o desenrolar dos acontecimentos.
bições argentinas e brasileiras. Quase simultaneamente à
missão uruguaia, Solano Lõpez recebeu, pelo cônsul pa- Para Solano López a possibilidade dessa aliança signifi-,
raguaio em Paranã, a proposta do líder entrerriano Ur- cava ampliar o peso, o cacife para barganha, de seu país
quiza de uma aliança ofensiva e defensiva composta por frente a Buenos Aires e, também, ao Rio de Janeiro.
Entre Ríos e os Estados paraguaio e uruguaio. Desse modo, o Paraguai se tomaria presença indispen-
sável na solução dos problemas platinas e assim apare-
/' ceria também para os governos argentino e brasileiro.
Jogando, pois, com uma aliança não concretizada, mas
A estratégia paraguaia: em busca do equilíbrio no sempre possível, Assunção estabeleceria o equilíbrio re-
Prata gional, pondo fim à hegemonia do Império na área e
afastando a ameaça histórica de uma ação da Argentina
contra -o Paraguai. Além disso, este obteria condições
Solano López evitou comprometer-se quer com Mon- favoráveis para negociar as' fronteiras com-seus dois vi-
tevidéu, quer com Urquiza, embora não rechaçasse taxa- zinhos.
52 , Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 29 visão 53
Para o equilíbrio de poder no Prata seria necessário levou a modificar sua postura. Além de conciliador, mos-
que entre o Paraguai, a Argentina e o Brasil houvesse trou-se, ao mesmo tempo,decidido a adotar uma política
igualdade de condições. Ora, era enorme a inferioridade incisiva de defesa dos interesses paraguaios na, região.
demo gráfica, econômica - a produção agrícola e ma- Em carta dirigida a Mitre demonstrou á possibilidade de
nufatureira argentina e brasileira eram superiores - e o Paraguai tomar posição mais decidida nas questões pla-
militar, quer em homens, quer em qualidade do material tinas, em favor de seus aliados, O presidente argentino
bélico, do Paraguai. Apenas a forte rivalidade entre Bue- não se intimidou, respondendo que a política externa de
nos Aires e Rio de Janeiro permitiria a Sol ano López seu país não se alteraria em razão da postura paraguaia.
ocupar uma posição em pé de igualdade com os dois Valendo-se das lutas políticas platinas, Solano López
vizinhos que, na tentativa de neutralizar um ao outro, procurara estabelecer a influência do seu país, apresen-
disputavam a simpatia de Assunção. Além disso, o Pa- tando o Paraguai como parte legítima no quadro regional
raguai contaria adicionalmente com a ascendência que e fator de pacificação e estabilidade na área. Para a Ar-
possuía sobre os blancos uruguaios e federalistas argen-
gentina, contudo, o governo paraguaio era um intruso,
tinos para justificar-se como parte importante nas ques-
cuja presença no Prata sentia como ameaça.
tões platinas.
A marcha dos acontecimentos, porém, foi outra. O go- Enquanto isso, no Brasil, o ânimo popular era, desde
verno argentino não necessitava de intermediação para- 1863, d~.exacerbado patriotismo, decorrente da questão
guaia. Acusado oficialmente pelo Uruguai de ser insti- Christie (bloqueio inglês do porto do Rio de Janeiro, que
gador da revolta colorada, com o fim de anexar o país, obrigou o Império a pagar, sob protesto, a indenização
explicou-se, a pedido do Brasil, negando procedência na que a Inglaterra exigia pelo saque ao Prince of Wales,
naufragado no sul). Houve, por iniciativa do Rio de Ja-
l
acusação, o que tranqüilizou o Rio de Janeiro. O enten-
dimento brasileiro-argentino frustrou a tentativa de SQ- neiro, o rompimento de relações diplomáticas com a In-
lano López apresentar-se como árbitro no Prata, o que o glaterra, após trinta anos de tensões crescentes. A humi-
54 A Guerra do Paraguai: 2~ visão 55
vizinha, buscou Saraiva entender-se nesse sentido com sada a tentativa de pacificação, o gabinete liberal passou
Buenos Aires. Em encontro realizado no dia 11 de julho a ter interesse em provocar a intervenção no Uruguai,
de 1864, o Conselheiro ouviu de Mitre que seu governo que era pedida pela opinião pública do Rio de Janeiro.
não via no Brasil objetivos que não fossem justos e com- \
Esse sentimento foi realimentado e ampliado pelo gabi-
patíveis com a independência e a integridade uruguaias. nete como forma de fortalecer-se perante a população
O presidente argentino manteve-se formalmente neutro, melindrada com a questão Christie. O Prata era uma vál-
o que, de um lado, deixava o Império livre para pressio- vula de escape, onde, para efeito de política interna, se
nar Aguirre para que mudasse a composição de seu go- poderia fortalecer o Partido Liberal, apresentando-se co-
verno e, de outro, não provocava reação contrária de Ur- \ mo competente para enfrentar os problemas externos.
quiza, caudilho de Entre Ríos que tinha ligações com os Ademais, em setembro de 1864, o Brasil viu surgir a
blancos e com Solano L6pez. mais profunda crise comercial e financeira do século pas-
'Enquanto Saraiva tratava de compor-se tacitamente sado, devido à falta de crédito e dinheiro na praça. lni-
com Buenos Aires, o presidente Aguirre, por seu turno, ciou-se a crise quando a Casa Souto e Cia., a maior casa
\ fez o mesmo com Assunção. No mesmo mês de julho, bancária brasileira, fechou seus guichês, provocando vio-
Antonio Contreras foi enviado por M0n.~vidéu em mis- lenta corrida a outras instituições, com sérias perdas para
são especial ao Paraguai, onde afirmoil {f Solano López o comércio e depositantes. Uma ação no Uruguai tam-
que o Brasil pretendia anexar uma porção do território bém era uma forma de desviar a atenção da opinião pú-
uruguaio e que à Argentina, em contrapartida, caberia o blica dessa questão, desgastante para o governo, mais
uma vez apresentado como incompetente pela oposição,
que sobrasse, ou, então, o controle do governo uruguaio.
acusado de não tomar a tempo medidas para evitar ou
Assim, se Mitre conseguisse submeter as províncias ar-
minorar a crise.
gentinas, acrescentou o enviado, surgiria uma ameaça pa-
Em 4 de agosto, ainda em 1864, o enviado imperial
ra o Paraguai, que s6 poderia ser afastada pela separação
apresentou um ultimatum ao governo uruguaio, dando-
entre essas províncias e Buenos Aires.
lhe o prazo de seis dias para atender as exigências bra-
I
Confiando no respaldo paraguaio, Aguirre recusou-se sileiras e ameaçando-o com a entrada de tropas imperiais
a afastar do ministério os blancos, tidos como radicais, no Estado oriental para garantir os direitos dos súditos
e a nomear, em substituição, políticos colorados. Tal do Império. Feito isso, Saraiva retirou-se para Buenos
acordo tinha sido conseguido por Saraiva, juntamente Aires, onde se encontrou com o chanceler argentino Ru-
com o chanceler argentino Rufino de Elizalde e pelo re- fino de Elizalde. Ambos declaram, em nome de seus paí-
presentante inglês em Buenos Aires, Thornton. Fracas- ses, que a paz no Uruguai era indispensável para que
58 Francisco Doratioto g
A Guerra do Paraguai: 2 visão 59
suas questões internacionais fossem solucionadas. Para No mês seguinte, em 20 'de outubro, Tamandaré, chefe
alcançar essa paz, os governos argentino e brasileiro ex- da força naval nas costas uruguaias, que substituíra Sa-
pressaram que qualquer um deles .poderia agir contra raiva, de volta ao Rio de Janeiro, assinou o Acordo de
Montevidéu, de acordo com Q direito internacional - Santa Lúcia com Venâncio Flores, pelo qual se estabe-
do qual, à época, não fazia' parte o princípio da não-in- lecia a cooperação entre esse líder colorado e as forças
'tervenção '- e sempre respeitando a integridade territo- do Império. Em 10 de novembro, o vapor Marquês de
rial e independência do-Estado oriental. o linda , embarcação de uma companhia brasileira que fa-
Em Montevidéu, os blancos ficaram contentes com a zia o serviço de navegação pelos rios Paraná e Paraguai
situação criada pelo ultimatum. Ao que tudo indicava, até Corumbã, foi aprisionado pela canhoneira paraguaia
para o governo uruguaio, seria o ensejo para o Paraguai Tacuari, horas após ter saído de Assunção rumo a Mato
assumir decididamente a aliança sonhada por Herrera. Grosso; estavam rompidas as relações entre o Império e
No dia 30 de agosto, o governo paraguaio protestou junto o Paraguaí.
à legação imperial - hoje se diria embaixada - em A eventual suspeita de Solano López de que o governo
Assunção contra qualquer ocupação do território uru- do Rio de Janeiro tencionava lançar-se numa guerra de
guaio por forças de mar e terra do Brasil, porque seria conquista em relação ao Uruguai não explica a declara-
contra o equilíbrio entre os Estados do. Prata e afirmou ção de guerra de Assunção ao Brasil e, posteriormente,
~.não assumir a responsabílidadepelas conseqüências, de, à Argentina. Registre-se que antes da Missão Saraiva, o
qualquer ato brasileiro. Tal ameaça pão foi -levada a sétio Paraguai, já em março de 1864, preparava-se militarmen-
pelo governo imperial, que sequer acreditava estar o Pa- . te, ao instalar o importante acampamento de C erro León
raguai disposto a romper com o Rio de Janeiro em de- e ao convocar, de imediato, todos os cidadãos submeti-
corrência do ultimatum a Montevidéu, opinião compar- dos ao serviço militar obrigatório, ou seja, aqueles entre
tilhada pelo governo argentino. 17 e 40 anos. Há que se considerar também, para refutar
a idéia de que a causa da guerra fosse unicamente o
interesse de Assunção em conservar a independência
uruguaia, o fato de que o governo paraguaio não forne-
o prelúdio da guerra
ceu ajuda de nenhuma espécie a Montevidéu, sequer fi-
nanceira, que estava a seu alcance. A referida inde-
,Em 12 .de setembro de".l864;uma brigada .btasileira, pendência foi um pretexto para Solano López implemen-
A gravidade do quadro levou o gabinete liberal a en- que tenham ocorrido tanto o conflito contra o país gua-
viar em missão ao Prata um conhecedor da região, o rani, quanto a queda de Aguirre, é farta a documentação
político conservador José Maria da Silva Paranhos, que demonstrando que o governo imperial não queria uma
negociara com o governo platino, nos anos 1850. Tinha guerra contra o Paraguai. Quanto à intervenção no Uru-
instruções no sentido de buscar uma aliança com Buenos guai, no início, não tinha como fim principal derrubar o
Aires para uma intervenção conjunta nó Uruguai, em governo blanco, pretendendo antes impedi-Io de romper,
apoio a Flores. Essa união era necessária porque o Brasil a dependência uruguaia em relação ao Brasil; ao mesmo
não tinha forças suficientes para atacar, sozinho, a cidade tempo, atendia aos reclamos dos pecuaristas gaúchos e
, de Montevidéu e porque havia a hipótese remota, segun- procurava levar a opinião pública brasileira a esquecer
do a opinião do gabinete, de uma invasão paraguaia do a humilhação sofrida de parte da Inglaterra.
território brasileiro. Paranhos procurou ampliar o caráter Em 23 de dezembro de 1864, Solano López iniciou a
dessa aliança, de modo a englobar uma ação comum en- guerra contra o Brasií - apanhando o Império de sur-
tre o Império e a Argentina contra o Paraguai. A aliança presa -, ao enviar duas expedições, uma fluvial e outra
proposta foi recusada pelo presidente argentino, que, ain- terrestre, contra Mato Grosso. O governo argentino, até
da assim, manifestou votos pela vitória do Brasil. a invasão de Mato Grosso, não tinha motivos para crer
que seu território fosse atacado por Assunção. A possi-
Mitre não podia aliar-se formalmente com o Império,
bilidade, porém, ainda que remota, não poderia ser des-
corno o governo brasileiro desejava, devido à reação in-
prezada a partir de janeiro de 1865. Nesse mês, Solano
terna que tal ato provocaria, especialmente em Entre Ríos
López pediu autorização a Buenos Aires para passar com
e Corrientes. No entanto, classificava de "justas recla- .
tropas pela: Província de Comentes para atacar as forças
mações" as exigências feitas por Saraiva ao governo de
brasileiras no Rio Grande do Sul e Uruguai, recebendo
Montevidéu.
resposta negativa.
O fato de grupos políticos liberais ocuparem o poder
simultaneamente no Brasil e na Argentina, enquanto os
governos de Assunção e Montevidéu eram contrários a
tal ideologia, facilitou a aproximação e, depois, a aliança,
entre Buenos Aires e Rio de Janeiro. A aliança em si
teve a cimentá-Ia, em 1865, a agressão paraguaia ao Bra-
sil e, em seguida, à Argentina, fato que, pela. primeira
\ vez, criou um inimigo comum aos dois países. Ainda
A Guerra do Paraguai: 2ª visão 63
I
',j
p.rolongado~.Port~tQ,graças.à posição geogrãfícédo seu
ranhos assinava, com a concordância argentina, o Proto-
't
flito que iniciara contra o Brasil, devido à impossibili- de 1864 era promovido o recrutamento detropas para-
. .
dade de este atacar o Paraguai. Ao que tudo indica, tal
solução não era de mteresse do chefe de Estado para-
guaias, pois Solano López antevira a guerra para a qual
esperava contar com o navio encouraçado, última palavra
guaio que a inviabilizou de vez ao atacar a Argentina. em tecnologia naval, em construção na Inglaterra pela
Aparentemente, Solano Lopéz convencera-se de que, casa Blyth. Os planos desse chefe de Estado com relação
após a queda de Montevidéu, o governo argentino se à guerra favorecem diferentes interpretações. A docu-
voltaria contra o Paraguai, passando a acreditar que o mentação existente permite concluir que o plano era de
Brasil, ao aliar-se com Flores, servia à política de Buenos que a invasão da indefesa província de Mato Grosso apa-
Aires. Na recusa argentina de autorizar a passagem de recesse como vitória suficiente para promover o levan-
tropas paraguaias por Corrientes, o chefe de Estado gua- tamento de forças políticas oposicionistas argentinas em
rani pensou ver a demonstração de que Mitre havia pac- favor do Paraguai. Além do que, tomado Mato Grosso,
tuado uma aliança secreta com o Brasil. Diante disso, aumentaria o poder de barganha de Assunção frente
ofereceu apoio para que o governador de Entre Ríos, ao Império. O Brasil estaria impedido militarmente de
retomar o território invadido, por não ter uma base de
Urquiza, derrubasse _o presidente argentino e ocupasse
operações no Prata: em dezembro -de 1864 a Argentina
seu lugar. López sabia que as questões pendentes trariam
era neutra - Urquiza continuava sendo um aliado pa-
a guerra mais dia, menos dia, e o momento lhe era apa-
raguaio em potencial- e Paranhos ainda não assinara
rentemente propício: dispunha de apoio popular no inte-
o acordo que garantia uni governo amigo do Império
rior argentino e esperava que, aos primeiros êxitos mili-
em Montevidéu. Desse modo, o Rio de Janeiro se
tares paraguaios, levantar-se-iam, sob sua liderança, os
tomaria receptivo a negociações que redefinissem o
opositores de Buenos Aires.
quadro platina nos moldes desejados pelo governo
paraguaio.
Os planos do chefe de Estado paraguaio fracassaram,
Por que o Paraguai foi à guerra? basicamente, por dois motivos. De um lado, Urquiza fal-
tou aos compromissos que contraíra com Solano L~pc~"
privando-o de apoio efetivo dentro da Al'l~l~lllil1a. POI' ou
o governo de Assunção se preparou e tomou a ini- tro, no Uruguai, os blancos não se mantlvcram numu
ciativa de começar a guerra. Como foi visto, já no início resistência prolongada em Montevldéu, como era cspc
66 Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 2e visão 67·
A Guerra do Paraguai: uma nova interpretação coloradismo, algo quase religioso. Construiu-se, assim,
a "santíssima trindade" Lõpez-Caballero-Stroessner, an-
tes de este ser derrubado da chefia do Estado em 1989.
Durante muito tempo, a historiografia tradicional bus-
Culpar a Iriglaterra pelo início do referido conflito sa-
cou as causas da guerra mais nas características da per-
crifica a objetividade histórica, mas satisfaz a distintos
sonalidade de Solano López que no contexto da época. '
interesses políticos. Para alguns, trata-se de mostrar a
Nas últimas duas décadas-impôs-se um revisionismo his-
possibilidade de construir na América Latina um modelo
tórico, atribuindo a responsabilidade do conflito ao im-
de desenvolvimento econômico não dependente, apon-
perialismo inglês, do qual o presidente Mitre e o impe-
tando incorretamente o precedente do Estado paraguaio
rador Pedro 11teriam sido meros instrumentos. Para essa
interpretação, a luta foi o resultado do confronto entre no século passado. Essas mesmas pessoas, no entanto,
uma premeditada estratégia de crescimento auto-susten- acabam por negar a referida possibilidade, na medida em
tado, de parte do Paraguai, e outra, baseada no ingresso que apresentam a potência central- a Grã-Bretanha-
de recursos financeiros e tecnológicos estrangeiros, ado- como onipotente, capaz de impor e dispor de países pe-
tada pelo Brasil e Argentina. Os dois países teriam sido ,riféricos. Assim, o leitor desavisado pode concluir que a
utilizados pela Inglaterra para acabar com o modelo de história do continente não se faz ou não se pode fazer
desenvolvimento paraguaio, de modo a evitar que o mes- aqui, pois os países centrais tudo decidem inapelavel-
mo fosse seguido por outros países do continente, aba- mente. Os latino-americanos, nessa perspectiva, deixam
lando o domínio britânico. de ser o sujeito de sua própria história, ou, na melhor
Essa teoria imperialista, conspirativa, passou a ter hipótese, vêem negado seu potencial de' ser tal sujeito.
grande difusão junto à esquerda latino-americana. Já no Estudos recentes, com base em farta documentação,
Paraguai, tal explicação tornou-se, paradoxalmente, a demonstram que a essência da política inglesa com res-
ideologia do coloradismo: tentando legitimar a ditadura I peito ao Paraguai consistiu em impedir que Solano Lõpez
do general Stroessner, apresentou-o como continuador da utilizasse a Grã-Bretanha nas disputas com países vizi-
obra do general Bernardino Caballero, fundador do Par- .nhos e, ao mesmo tempo, em assegurar ° livre acesso
tido Colorado em 1877 e, nos anos da guerra, valente dos navios de bandeira inglesa aos rios Paranã e Para-
oficial de confiança de Solano L6pez. A visão mani- guai. Afinal, foi a Inglaterra que mais capitalizou com
queísta do ditador paraguaio como vítima de uma cons- o auge econômico paraguaio, visto que os projetos de
piração internacional, que preferiu morrer a ceder a pres- infra-estrutura guarani foram atendidos por bens de ca-
sões externas, confere um caráter épico às origens do pital ingleses e os técnicos estrangeiros que os imple-
70 Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 2~ visão 71
mentaram eram, em sua maioria, britânicos. As manufa- os governos argentino e brasileiro, ambos nas mãos de
turas oriundas da Inglaterra cobriam 75% das importa- liberais, convergiam ideologicamente e, pela primeira
ções paraguaias, quase todas originadas de Buenos Aires, vez, havia interesses comuns concretos - neutralizar os
em operações controladas por comerciantes ingleses ali blancos uruguaios e Solano López. Contudo, mais que
instalados, que praticavam a política de concessão de cré- o propósito imediatista de solucionar a guerra civil uru-
dito de oito meses para o pagamento das mercadorias. guaia em favor dos colorados e de isolar Solano López,
Ademais, a guerra atingiu os interesses comerciais bri- retirando o respaldo externo dos que lhe faziam oposição
tânicos no Paraguai, com o bloqueio naval do Prata im- dentro da Argentina, concebia Mitre uma política de lon-
posto pela Marinha imperial. go alcance. Por esta, Buenos Aires e Rio de Janeiro, em
As causas da guerra devem ser buscadas na própria lugar de disputarem entre si a hegemonia no Prata, pas-
dinâmica da construção dos Estados nacionais na região sariam a compartilhá-Ia, sendo a rivalidade entre os dois
do Rio da Prata. Ao estreitar relações com Urquiza e países substituída pela colaboração. Ao se tomarem par-
com o governo blanco uruguaio, que também tinha liga- ceiros, Argentina e Brasil favoreceriam a paz na região
ções com o líder entrerriano, Solano López tomou-se um platina, estabelecendo nova correlação de forças não só
obstáculo à consolidação da república argentina, unida nas relações intracontinentais, como também nas relações
sob a liderança da burguesia portenha. A ligação Assun- com as potências européias. O projeto foi inviabilizado
ção-Montevidéu também entrava em rota de colisão com porque seus opositores ascenderam ao poder nos dois
o Brasil. Devido às reclamações dos pecuaristas do Rio países em 1868: no Brasil o Partido Liberal foi subs-
Grande do Sul- que, três décadas antes, haviam tentado tituído pelo Conservador e na Argentina Sarmiento as-
separar-se do Império -, prejudicados por medidas do sumiu a presidência.
governo blanco, o governo brasileiro adotou uma ação o. presidente Mitre foi, portanto precursor, em mais
intimidatória contra os blancos. Desse modo, pela pri- de um século, da idéia de uma política de colaboração
meira vez no Rio da Prata, Buenos Aires e Rio de Janeiro argentino-brasileira, hoje existente por outros motivos .
.tinham o mesmo interesse: apoiar os colorados que se A guerra iniciada em 1865 interessava, por diferentes
sublevaram contra os blancos no poder, em MOntevidéu. motivos, a todos os Estados envolvidos. Os govemantes
No Uruguai cruzavam-se, pois, os interesses dos go- desses Estados, com base em informações parciais ou
vernos argentino, brasileiro e paraguaio. Ante a tentativa falsas do contexto platino, antcviram um conülto rãpído,
de Montevidéu estabelecer aliança com Assunção, tratou cujos objetivos seriam alcançados r()1I\ () menor custo
o presidente Mitre de compor-se com o Império. Afinal, possível, exatamente por sua suposta curta duração. Dos
72 Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 2~ visão 73
erros de análises dos govemantes envolvidos o de maior Sul, planejada desde antes do tratado de I º de maio e
conseqüência foi o de Solano López, pois seu país viu-se contando com o apoio das populações de Corri entes e
materialmente arrasado no final da guerra. Entre Ríos.
O isolamento no Prata, que Solano López planejara Por insistência de Francisco Octaviano de Almeida
para o Império, acabou por ocorrer em relação a si mes- Rosa, negociador brasileiro do Tratado da Tríplice Alian-
mo. Colho resultado de suas agressões contra o Mato ça, este, em seu artigo nono, determinava que, terminada
Grosso e Corrientes, foi ássinado em Buenos Aires um a guerra, seria garantida a independência paraguaia. O
tratado, de conteúdo secreto, entre Argentina, o Império Império desconfiava de que a Argentina tivesse intenção \
de, derrotado Solano López, anexar o Paraguai. Pelo tra-
e o Uruguai, constituindo-se, assim, a Tríplice Aliança
tado, os aliados se comprometiam também a não depor
para enfrentar e vencer o Paraguai. Pelo tratado, termi-
as armas senão em comum acordo e depois da derrubada
nada a guerra, o governo paraguaio deveria pagar inde-
do chefe de Estado paraguaio, proibida qualquer inicia-
nização a particulares, por prejuízos causados com a in-
tiva de paz em separado, por um dos países aliados.
vasão dos territórios brasileiro e argentino, e ressarcir as
Pelo Tratado da Tríplice Aliança, o comando-em -che-
despesas aliadas com a guerra. Além disso, deveriam ser
fe dos exércitos aliados caberia ao presidente Mitre, en-
destruídas as fortificações nas margens do Rio Paraguai quanto as operações se dessem em território argentino
e proibido o levantamento de outras, como garantia de ou paraguaio. Caso as operações fossem em território
sua livre navegação. Ficaram estabelecidos, também, os uruguaio ou brasileiro, era garantida a reciprocidade para
limites do Paraguai com o Brasil e a Argentina, favorá- aquela alta função militar. A nomeação do presidente ar-
veis aos dois últimos. gentino para o comando supremo das forças terrestres
Para Solano López, a Tríplice Aliança representa uma aliadas foi um ato político do governo imperial. Evitava
catástrofe, que a inércia da oposição argentina descon- que outros países vissem o Brasil como uma ameaça,
tente com Mitre tornou viável. Nesse contexto, duas com ambições sobre o Paraguai, caso um brasileiro ocu-
eram as opções para o chefe de Estado paraguaio: recuar passe aquela posição.
suas tropas de volta a seu país e negociar a paz em in- A notícia da assinatura do Tratado da Tríplice Aliança
ferioridade, na defensiva, fazendo concessões; ou tentar, foi recebida friamente no Rio de Janeiro. Pensava-se que
temerariamente contando com a sorte, uma operação bé- para vencer o Paraguai seria necessário apenas (111(' BIH'
lica de grande impacto psicológico no inimigo, permi- nos Aires não embaraçasse a ação das fon;/I~ IHilslklrll
tindo melhores condições de negociação. Sob esta hipó- O menosprezo pelo poder militar dI' ~1I1i1110 1,(11WI NU
tese, foi lógica a invasão paraguaia do Rio Grande do compartilhado pela Argcntlnu, Mil!'!' 11101111'11'111(11'rll\hli
74 Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 2f visão 75
co, após a invasão paraguaia do território argentino: "em eram débeis e desunidas. Sob essa lógica, a política ex-
24 horas ao quartel, em quinze dias em Corrientes, em tema do Partido Conservador visava à hegemonia brasi-
três meses em Assunção". O otimismo argentino e bra- leira na América do Sul, com intuitos defensivos: evitar
sileiro foi amargamente desmentido pelos cinco anos de um ataque externo - e, para tanto, a superioridade naval
guerra. do Império era ponto-chave - e çonsolidar como bra-
O Tratado da Tríplice Aliança foi duramente criticado, sileiro o território herdado do expansionismo colonial lu-
no Brasil, pela oposição 'conservadora. Apontou-se que sitano.
a demarcação das fronteiras argentino-paraguaias no O Partido Liberal, quando na oposição, criticara a po-
Chaco Boreal contrariavam a política imperial de manter lítica dos conservadores para o Prata. Octaviano, ante as
não só a independência do Paraguai, como também a críticas dos conservadores de que o Tratado da Tríplice
parte de seu território necessária para separar Mato Gros- Aliança rompia com tal política, manteve suas convic-
so do território Argentino. Já que o tratado de aliança ções. Afirmou que a política conservadora resultara para
reconhecia como argentina também a área das Missões, O Brasil em decepções e guerras no Prata, além do.
os conservadores viam ameaçada a independência do Pa- "espantoso" crescimento da dívida pública. Só defendiam
ragu aí , colocado num "abraço apertado" da Argentina sua continuidade, quando se podia fazer a paz duradoura
pelos dois lados. com.Buenos Aires, segundo Octaviano, aqueles que não
Francisco Octaviano defendeu-se das críticas da opo- presenciavam os sofrimentos dos brasileiros na guerra
sição conservadora. Para ele, a política tradicional, por contra o Paraguai. Por esses motivos, declarava pertencer
meio de suspeitas e diminuição da Argentina, alimentava "à escola dos que hão de aconselhar o Brasil a paz com
discórdias da época colonial, como se o Império só pu- seus vizinhos, desprendendo-se das pretensões dos trata-
desse prosperar na América se as repúblicas à sua volta dos portugueses". Estava convencido de que a Tríplice
-t I
fossem fracas e pequenas. Essa era, de fato, a política Aliança estabelecia a base "para uma reconciliação e
do Partido Conservador para o continente: os países vi- amizade entre as duas raças. que tanto se odiaram".
zinhos eram vistos como inimigos potenciais, prevenções O Tratado da Tríplice Aliança foi assinado em mo-
antiportuguesas da época colonial, somadas ao fato de mento crítico para o Brasil. O Império estava rompido
serem repúblicas, em contraposição à monarquia existen- com a Inglaterra, isolado em relação às repúblicas vizi-
te no Brasil. Solitário no continente em sua condição nhas por questões de limites e, ao mesmo tempo, única
monárquica e cercado de vizinhos hostis, o Brasil só não monarquia na América, era alvo de atitude suspeita dos
era alvo de agressão porque as repúblicas sul-americanas Estados Unidos. Nesse contexto, compreendem-se as
76 Francisco Doratioto A Guerra do Paraguai: 2~visão 77
.concessões territoriais feitas por Francisco Octaviano à cional política de conter o projeto expansionista que atri-
Argentina. Ademais, pensava ele, o território do Chaco buía a Buenos Aires. Assim, esses novos governos im-
não teria maior significado sequer no século XX. plementaram diretrizes de política externa que, já em
Apesar das intenções de Octaviano e Mitre, a rivali- 1869, comprometeram a continuidade da Aliança e, nos
dade entre Brasil e Argentina não foi superada. Desde o anos 1870, quase levaram à guerra os dois Estados, na
início os aliados alimentavam mútuas desconfianças so- disputa pela hegemonia sobre o Paraguai.
bre a sinceridade na realização dos objetivos do Tratado
de 12 de Maio. A aliança entre Rio de Janeiro e Buenos
Aires não conseguiu ultrapassar a mera conveniência
ocasional, cessando com a vitória militar sobre Solano
López e a consecução dos objetivos específicos de cada
11\
um dos países aliados. Não foi efetivado o potencial da
. aliança: ser o marco de uma nova fase das relações ar-
gentino-brasileiras em dimensão continental. Isso teria si-
do possível porque o Império e a Argentina, juntos, ti-
nham fronteiras com todas as nações da América do Sul.
A unidade de propósitos entre os dois Estados teria
constituído o eixo do equilíbrio internacional na Amé-
rica do Sul.
A consolidação da aliança entre a Argentina e o Brasil
teria levado a uma nova correlação de forças não só nas
relações intracontinentais, como também nas relações
com as potências européias. Mitre e os liberais brasileiros
quase conseguiram inverter a histórica rivalidade nas re-
lações entre seus países. Contudo, em 1868, o sucessor
de Mitre, Domingo Faustino Sarmiento, foi adversário
da aliança. No Império, os liberais não aprofundaram a
opção pela cooperação com a república argentina em vir-
•
tude da reação contrária do Partido Conservador. Este,
assumindo o poder também ém 1868, retomou à tradi-
A Guerra do Paraguai: 2g visão 79
como explica que Londres tenha permitido a destruição guerra contra o Paraguai, a qual, no Brasil, até então era
desse mercado pela própria guerra? Mesmo a premissa quase exclusivamente motivo para comemorações, nas
é falsa, pois a modernização tecnológica paraguaia, sob datas das grandes batalhas, e de referência ao se buscar
Carlos López e Francisco Solano, usou técnicos e equi- as origens da construção do Exército que derrubaria a
pamentos ingleses. Ademais, uma questão "factual" foi Monarquia em 1889.
esquecida pela explicação.Imperialista: no início da guer- Buscou-se demonstrar neste livro que as causas da
guerra contra o Paraguai estão na própria dinâmica da
ra em dezembro de 1864 e, ainda, no estabelecimento
construção dos Estados nacionais na região do Rio da
da Tríplice Aliança, em maio de 1865, o Império brasi-
Prata. A conclusão se fundamenta em vasta documenta-
leiro estava de relações diplomáticas rompidas com a In-
ção, que não é a última palavra sobre o tema, pois a
glaterra.
história está constantemente sendo reescrita, quer pela
O revisionismo, que critica corretamente a falta de ob-
descoberta de documentos inéditos, quer porque cada
jetividade e a construção de mitos por parte da historio-
época se volta sobre o passado para esclarecer novos
grafia conservadora, acaba ele mesmo sendo vítima da
temas, que angustiam ou ou despertam a curiosidade no
falta de objetividade e construindo novos mitos. Destes, presente. Não podemos .esperar explicações finais e in-
o maior talvez seja o de representar Solano López quase contestes em história, mas devemos cobrar que elas se
como um líder antiimperialista, arrojado e decidido na baseiem em sólida, séria e científica análise de documen-
busca do desenvolvimento autônomo e da justiça social tos. Assim o fizemos e com paixão, mas com a paixão
no Paraguai. Solano López foi, sim, um ditador, sem pro- de procurar desvendar e reconstruir, com a maior obje-
jeto econômico autônomo, mas com a,tilSpiração de trans- tividade possível, o processo que levou a uma guerra que
formar o Paraguai em potência no Prata. Estava à frente teve imensas repercussões sobre a história, não só bra-
de um país no qual também havia escravidão e tratava sileira, mas também dos demais países platinos.
o Estado como um assunto de família, a ponto de sua
companheira, a francesa Madame Lynch, ter um imenso
patrimônio imobiliário, resultado da "compra" de enor-
mes extensões de terras públicas.
Cabe, porém, ao revisionismo o mérito de demonstrar
a fragilidade da historiografia tradicional sobre o tema e
questionar a utilização dessa guerra na construção de mi-
tos, Enfim, o revisionismo fez ressurgir o interesse pela
A Guerra do Paraguai: 2!1 visão 83
-
SBD/FfLCH/)jSP -
HISTÓRIA GERAL lução e Guerra Civil na Espanha
31 {> A Revolução Industrial 11
nio Quadros 30 -I< O Governo
Juscelino Kubitscheck 14 -I< His-
tória da Música Independente
A~~~.;=rm0~
-I< A Revolução Russa 61 124 {> A Industrialização Brasi-
ANTIGA
(Até o séc. V) \eira 98 {> Juventude Operária
.SEÇ~~. Católica 97 'I> A Uberdade Sin-
HISTÓRIA DO BRASIL
O Egito Antigo 36 -I< O Mundo dical no Brasil 113 -I< Mata Ga-
Antigo: f;conomia e Sociedade -19gos 129 -I< Movimento Gmvista
39 {> A Reforma Agrária na .Ro- no Brasil 120 -I< Partido Repu-
COLONIA blicanO Federal 115 -I< A Procla-
ma Antiga 122 "'," (1500-1822) mação da República 18 -I< Rs-