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Curso preparatório 2ª Fase Civil

Professora Veridiana Maria Rehbein

SUMÁRIO
1. SUJEITOS E OBJETOS DA RELAÇÃO DE CONSUMO.............................................................. 3
2. DIREITOS BÁSICOS DO CONSUMIDOR: REVISÃO CONTRATUAL E INVERSÃO DO ÔNUS DA
PROVA ......................................................................................................................................... 16
3. RESPONSABILIDADE CIVIL NAS RELAÇÕES DE CONSUMO: POR VÍCIO E POR FATO ......... 21
4. DA DECADÊNCIA E DA PRESCRIÇÃO .................................................................................. 35
5. DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA ................................................... 40
6. DAS PRÁTICAS COMERCIAIS .............................................................................................. 41
7. DA PROTEÇÃO CONTRATUAL ............................................................................................ 52
8. DA DEFESA DO CONSUMIDOR EM JUÍZO .......................................................................... 63
9. A TUTELA PROVISÓRIA NAS RELAÇÕES DE CONSUMO ..................................................... 66

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1. SUJEITOS E OBJETOS DA RELAÇÃO DE CONSUMO

Segundo Claudia Lima Marques, o direito privado brasileiro divide-se em


um direito geral, o direito civil, e dois direitos especiais, o direito comercial ou
empresarial, voltado para as relações entre empresas; e o direito do
consumidor, voltado para a proteção da parte mais frágil. Compreender as
diferenças e saber identificar quando uma relação é de consumo é primordial
para o estudo do Direito do Consumidor e para o êxito no Exame de Ordem.
Especialmente para a elaboração da peça processual, é imprescindível a
identificação inicial do direito a ser aplicado: consumidor ou civil.

Assim, o grande desafio do intérprete e aplicador do CDC, como


Código que regula uma relação jurídica entre privados, é saber
diferenciar e saber “ver” quem é comerciante, quem é civil, quem é
consumidor, quem é fornecedor, quem faz parte da cadeia de
produção e distribuição e quem retira o bem do mercado como
destinatário final, quem é equiparado a este, seja porque é uma
coletividade que intervém na relação, porque é vítima de um acidente
de consumo ou porque foi quem criou o risco no mercado. No caso
do CDC é este exercício, de definir quem é o sujeito ou quem são os
sujeitos da relação contratual e extracontratual, que vai definir o
campo de aplicação desta lei, isto é, a que relação ela se aplica.
(BENJAMIN, MARQUES e BESSA, 2014, p. 95).

Dessa forma, a identificação dos sujeitos de uma relação de consumo é


extremamente importante para distinguir o tipo de relação e identificar o direito
que deverá ser aplicado. Para compreender essa importância observe a
situação problema do XVIII Exame de Ordem Unificado (questão 4) que tratava
do caso de um atleta atropelado por um ônibus: a solução da questão
pressupunha a compreensão de tratar-se de um acidente de consumo (art. 17
do CDC).

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1.1 Conceito de consumidor


O conceito básico de consumidor é definido no art. 2º, caput, e
complementado pelo seu parágrafo único e pelos artigos 17 e 29.

Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou


utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de
pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações
de consumo.
Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores
todas as vítimas do evento.
Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos
consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às
práticas nele previstas.

Dessa forma, sobre o conceito de consumidor, pode-se concluir que:


 Não é definido apenas sob a ótica individual, mas também
enquanto categoria (direito transindividual);
 Não é apenas o contratante, mas a vítima de acidentes (onde
não há contrato entre as partes) e de práticas abusivas (realizadas antes da
contratação);
 Não é apenas o que adquire, mas o que utiliza os produtos ou
serviços;
 Pode ser pessoa física ou jurídica;

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A principal característica para conceituação de consumidor é ser


“destinatário final”. No entanto, o legislador deixou ao intérprete a tarefa de
esclarecer o sentido da expressão.
Para tanto, surgiram algumas teorias. Para a corrente finalista, o
conceito de consumidor está ligado à destinação econômica dada ao produto
ou serviço, sendo consumidor somente o destinatário final fático e
econômico, ou seja, aquela pessoa não profissional que adquire um produto
ou serviço para si ou sua família, que realmente encerra o ciclo do produto,
inclusive econômico, pois não vai utilizá-lo para produzir outro produto ou para
prestar outro serviço. Para esta corrente, se alguém adquire ou utiliza produto
ou serviço para continuar a produzir, para fazer uso profissional, não se
enquadraria no conceito de consumidor, pois não é destinatário final econômico
desse bem.
Já para os adeptos da teoria maximalista, não importa se a pessoa
física, jurídica ou profissional adquiriu o produto ou serviço para consumo
próprio ou com a finalidade de obter lucro. Como lembra Miragem (2013), “a
interpretação maximalista considera consumidor o destinatário fático do
produto ou serviço, ainda que não o seja necessariamente seu
destinatário econômico”.
Em meio às duas correntes, uma terceira via se desenvolveu nos
tribunais: a interpretação finalista aprofundada ou mitigada, dando
relevância ao fator vulnerabilidade. Nesse sentido, o consumidor pode ser
pessoa física ou jurídica, desde que seja destinatário final fático e econômico
ou, caso faça uso profissional (seja destinatário final fático, mas não
destinatário final econômico), que enfrente essa relação em situação de
vulnerabilidade.
É uma interpretação finalista mais aprofundada e madura, que deve
ser saudada. Em casos difíceis, envolvendo pequenas empresas que
utilizam insumos para a sua produção, mas não em sua área de
expertise ou com uma utilização mista, principalmente na área dos
serviços, provada a vulnerabilidade, conclui-se pela destinação final
de consumo prevalente. Esta nova linha, em especial do STJ, tem
utilizado, sob o critério finalista e subjetivo, expressamente a
equiparação do art. 29 do CDC, em se tratando de pessoa jurídica
que comprove ser vulnerável e atue fora do âmbito de sua
especialidade, como o hotel que compra gás. Isso porque o CDC
conhece outras definições de consumidor. O conceito-chave aqui é o
da vulnerabilidade. (BENJAMIN, MARQUES e BESSA, 2014, p. 103).

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Hoje, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, se encontra


consolidada no sentido de que a conceituação de consumidor deve ser
feita mediante a utilização da teoria finalista mitigada, conforme segue:

"[...] a jurisprudência desta Corte entende que se aplica a teoria


finalista de forma mitigada, permitindo-se a incidência do CDC nos
casos em que a parte, embora não seja destinatária final do produto
ou serviço, esteja em situação de vulnerabilidade técnica, jurídica ou
econômica em relação ao fornecedor, [...]". (AgInt no AREsp 964780 /
RJ, junho de 2018).

Essa vulnerabilidade, esclarece Bruno Miragem, não se restringe apenas


a hipótese econômica, mas especialmente na fragilidade técnica quando, “por
exemplo, pessoa jurídica que pretenda a equiparação demonstre que não era
especialista e não conhecia as informações técnicas relativas ao produto ou
serviço contratado, assim como que tais conhecimentos não lhe eram
exigíveis” (MIRAGEM, 2012, p. 135).
Importante! Observe, contudo, que a aplicação da teoria finalista de
forma mitigada é uma exceção. Julgados mais recentes do STJ têm
restringido bastante a sua utilização. Para a sua aplicação no exame de
ordem o enunciado deverá deixar bem clara a vulnerabilidade.

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO


EM RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. APLICAÇÃO
DO CDC. TEORIA FINALISTA. RELAÇÃO DE CONSUMO NÃO
CARACTERIZADA. ACÓRDÃO RECORRIDO CONFORME A
JURISPRUDÊNCIA DO STJ. VULNERABILIDADE.
RECONHECIMENTO. SÚMULA N. 7/STJ. CAPITALIZAÇÃO
MENSAL DOS JUROS. POSSIBILIDADE. PACTUAÇÃO. REEXAME
DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS E
INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS.
INADMISSIBILIDADE. DECISÃO MANTIDA.
1. O posicionamento adotado no acórdão recorrido coincide
com a orientação desta Corte Superior, a saber: "o Código de
Defesa do Consumidor não se aplica no caso em que o produto
ou serviço é contratado para implementação de atividade
econômica, já que não estaria configurado o destinatário final da
relação de consumo (teoria finalista ou subjetiva)" (AgRg no
AREsp n. 557.718/SP, Relator Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA
TURMA, julgado em 24/5/2016, DJe 10/6/2016).
2. O recurso especial não comporta exame de questões que
impliquem revolvimento do contexto fático-probatório dos autos e
interpretação de cláusulas contratuais (Súmulas n. 5 e 7 do STJ).
3. O reconhecimento da situação de vulnerabilidade, a fim de se
Aplicar o CDC, exigiria reexame de questões fáticas.
4. No caso concreto, o Tribunal de origem, a partir do exame dos
elementos de prova e da interpretação das cláusulas contratuais,

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concluiu pela existência de cláusula prevendo a capitalização mensal


dos juros.
5. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp 1218885 / MG, julgado em 07/06/2018)

Além da aplicação da teoria finalista mitigada, com vistas à equiparação


do profissional ou da pessoa jurídica a consumidor, os artigos 17 e 29 do CDC
também tratam de situações de equiparação. O artigo 17 refere-se a todas as
vítimas de fato do produto ou serviço e o artigo 29 às pessoas expostas às
práticas comerciais.

Em relação às vítimas de acidentes de consumo, foi efetuado o seguinte


questionamento no XVII Exame de Ordem:

ENUNCIADO:
O famoso atleta José da Silva, campeão pan-americano da prova de
200m no atletismo, inscreveu-se para a Copa Rio de Atletismo – RJ, 2015. O
torneio previa, como premiação aos campeões de cada modalidade, a soma de
R$ 20.000,00. Todos os especialistas no esporte estimavam a chance de
vitória de José superior a 80%.
Na semana que antecedeu a competição, o atleta, domiciliado no estado
de Minas Gerais, viajou para a cidade do Rio de Janeiro para treinamento e
reconhecimento dos locais de prova. Na véspera do evento esportivo, José
sofreu um grave acidente, tendo sido atropelado por um ônibus executivo da
sociedade empresária D Ltda., com sede em São Paulo.
O serviço de transporte executivo é explorado pela sociedade
empresária D Ltda. de forma habitual, organizada profissionalmente e
remunerada. Restou evidente que o acidente ocorreu devido à distração do
condutor do ônibus.

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Em virtude do ocorrido, José não pôde competir no aludido torneio. O


atleta precisou de atendimento médico-hospitalar de emergência, tendo
realizado duas cirurgias e usado medicamentos.
No processo de reabilitação, fez fisioterapia para recuperar a amplitude
de movimento das pernas e dos quadris. Sobre a situação descrita, responda
aos itens a seguir.
A) Que legislação deve ser aplicada ao caso e como deverá responder a
sociedade empresária D Ltda.? Quais os danos sofridos por José? (Valor: 0,85)
B) Qual o prazo para o ajuizamento da demanda reparatória? É possível
fixar a competência do juízo em Minas Gerais? (Valor: 0,40)
Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação
do dispositivo legal não confere pontuação.

GABARITO COMENTADO:
A1) Trata-se de uma relação de consumo, na qual José se qualifica
juridicamente como consumidor por equiparação, vítima de acidente de
consumo, conforme o Art. 17 do CDC. A sociedade empresária D Ltda.
enquadra-se na condição de fornecedora de serviços conforme o Art. 3º, § 2º,
do CDC. Assim, deve-se aplicar o CDC e a responsabilidade civil será objetiva,
nos termos do Art. 14 do CDC, bem como no Art.37, § 6º, da Constituição da
República, por tratar-se de prestadora de serviço público.
A2) Quanto aos danos suportados pelo corredor, verifica-se a ocorrência da
perda de uma chance. Trata-se da frustração da probabilidade de obter o
prêmio da Copa Rio de Atletismo. A situação revela que a chance se revestia
das características jurídicas de séria e real, e, assim, deverá ser reparada.
Além da perda da chance, deverão ser indenizados os danos morais pela
violação da integridade física e os danos emergentes decorrentes dos
tratamentos médicos (Art. 402 do CC).

B) O prazo prescricional será de cinco anos, como prevê o Art. 27 do CDC. O


regime de consumo autoriza o ajuizamento da ação no domicílio do autor,
conforme previsto no Art. 101, I, do CDC. Portanto, José poderá optar pela
demanda, em Minas Gerais.

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DISTRIBUIÇÃO DA PONTUAÇÃO

ITEM PONTUAÇÃO
A1) Aplica-se o CDC (0,10) e a responsabilidade civil
será objetiva (0,10), pois José é consumidor por
equiparação (0,15), conforme determinam o Art. 14 do 0,00 /0,10 /0,15/0,20 / 0,25/
CDC, ou art. 37, § 6º, da CRFB. (0,10) 0,30/0,35/0,45
Obs.: a mera citação do dispositivo legal não confere
pontuação.
A2) Além da perda da chance (0,10), deverão ser
compensados os danos morais pela violação da
integridade física (0,10) e indenizados os danos
emergentes decorrentes dos tratamentos médicos 0,00/0,10/0,20/ 0,30/0,40
(0,10), de acordo com o Art. 402 ou Art. 949, ambos
do CC (0,10).
Obs.: a mera citação do dispositivo legal não confere
pontuação.
B1) O prazo aplicável é de cinco anos (0,10) conforme
Art. 27 do CDC (0,10) 0,00/0,10/0,20
Obs.: a mera citação do dispositivo legal não confere
pontuação.
B2) O consumidor terá a faculdade de demanda em
seu domicílio, no caso, Minas Gerais (0,10) conforme
possibilita o Art. 101, I, do CDC (0,10) Obs.: a mera 0,00/0,10/0,20
citação do dispositivo legal não confere pontuação.

Mais recentemente o STJ aplicou a equiparação do art. 17 à ação de


responsabilidade civil movida por vítima de acidente de consumo no trânsito:

PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL.


AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E
COMPENSAÇÃO DE DANOS MORAIS. OMISSÃO,
CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO EXISTÊNCIA. FATO
DO PRODUTO OU DO SERVIÇO. CONSUMIDOR POR
EQUIPARAÇÃO. BYSTANDER. APLICAÇÃO. CDC.
POSSIBILIDADE. DISTRIBUIÇÃO. SOLIDARIEDADE.
[...]
2. O propósito recursal consiste em determinar: (i) se é correta a
aplicação da legislação consumerista à hipótese dos autos, em que o
recorrido foi lesionado por garrafas quebradas de cerveja deixadas
em via pública; e (ii) se é possível a solidariedade entre a
recorrente, fabricante de cervejas, e a interessada, então sua
distribuidora, responsável por deixar as garrafas quebradas em
calçada pública.
[...]
4. Para fins de tutela contra acidente de consumo, o CDC amplia
o conceito de consumidor para abranger qualquer vítima,
mesmo que nunca tenha contratado ou mantido qualquer relação
com o fornecedor.
5. Na hipótese dos autos, exsurge a figura da cadeia de
fornecimento, cuja composição não necessita ser

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exclusivamente de produto ou de serviços, podendo ser


verificada uma composição mista de ambos, dentro de uma
mesma atividade econômica.
6. Conforme jurisprudência deste Tribunal, a responsabilidade de
todos os integrantes da cadeia de fornecimento é objetiva e
solidária, nos termos dos arts. 7º, parágrafo único, 20 e 25 do CDC.
7. No recurso em julgamento, por sua vez, verifica-se uma cadeia de
fornecimento e, assim, impossível de afastar a legislação
consumerista e a correta equiparação do recorrido a consumidor,
nos termos do art. 17 do CDC, conforme julgado pelo Tribunal de
origem.
8. Recurso especial conhecido e não provido.
(REsp 1574784 / RJ, julgado em junho de 2018)

1.2 Conceito de fornecedor

Conforme já mencionado, os conceitos de consumidor e de fornecedor


são interdependentes, pois só haverá relação de consumo com a presença dos
dois sujeitos.

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou


privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes
despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção,
montagem, criação, construção, transformação, importação,
exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação
de serviços.
§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo,
mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira,
de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter
trabalhista.

Percebe-se que o conceito é amplo e que o legislador não criou


requisitos relacionados à natureza jurídica ou situação fiscal e administrativa do
fornecedor. O caput do artigo 3º esclarece que fornecedor é gênero, do qual
são espécies aqueles que desenvolvem as atividades listadas no artigo
(produção, montagem, importação, comercialização...). O elemento definidor do
conceito é “desenvolver atividade”.
Desenvolver uma atividade, conforme definições doutrinárias, está
relacionado a habitualidade e ao profissionalismo, mas de maneira ampla e não
limitada a uma formação profissional específica. Assim, uma concessionária de
veículos que decide vender um computador da loja para substituí-lo por um
mais moderno, não se transforma em fornecedora de computadores, pois essa
não é a sua atividade.

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Já o conceito de fornecedor de serviços, conforme o parágrafo 2º do


art. 3º, tem outro elemento além do desenvolvimento de atividade: a
remuneração.
Saliente-se que o legislador optou pela expressão “remunerados” ao
invés de “onerosos”, que são aqueles que se contrapõem aos “gratuitos”,
assim, a remuneração indireta não afasta a incidência do Código de
Defesa do Consumidor. Alguns serviços que são prestados sem remuneração
direta do consumidor, mas lucrativos, ou seja, remunerados de outra forma,
sofrem a incidência do Código de Defesa do Consumidor. Neste sentido a
seguinte decisão:
CIVIL E CONSUMIDOR. INTERNET. RELAÇÃO DE CONSUMO.
INCIDÊNCIA DO CDC. GRATUIDADE DO SERVIÇO.
INDIFERENÇA. PROVEDOR DE CONTEÚDO. FISCALIZAÇÃO
PRÉVIA DO TEOR DAS INFORMAÇÕES POSTADAS NO SITE
PELOS USUÁRIOS. DESNECESSIDADE. MENSAGEM DE
CONTEÚDO OFENSIVO. DANO MORAL. RISCO INERENTE AO
NEGÓCIO. INEXISTÊNCIA. CIÊNCIA DA EXISTÊNCIA DE
CONTEÚDO ILÍCITO. RETIRADA IMEDIATA DO AR. DEVER.
DISPONIBILIZAÇÃO DE MEIOS PARA IDENTIFICAÇÃO DE CADA
USUÁRIO. DEVER. REGISTRO DO NÚMERO DE IP. SUFICIÊNCIA.
1. A exploração comercial da internet sujeita as relações de consumo
daí advindas à Lei nº 8.078/90.
2. O fato de o serviço prestado pelo provedor de serviço de
internet ser gratuito não desvirtua a relação de consumo, pois o
termo mediante remuneração, contido no art. 3º, § 2º, do CDC,
deve ser interpretado de forma ampla, de modo a incluir o ganho
indireto do fornecedor.
3. A fiscalização prévia, pelo provedor de conteúdo, do teor das
informações postadas na web por cada usuário não é atividade
intrínseca ao serviço prestado, de modo que não se pode reputar
defeituoso, nos termos do art. 14 do CDC, o site que não examina e
filtra os dados e imagens nele inseridos.
4. O dano moral decorrente de mensagens com conteúdo ofensivo
inseridas no site pelo usuário não constitui risco inerente à atividade
dos provedores de conteúdo, de modo que não se lhes aplica a
responsabilidade objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do
CC/02.
5. Ao ser comunicado de que determinado texto ou imagem possui
conteúdo ilícito, deve o provedor agir de forma enérgica, retirando o
material do ar imediatamente, sob pena de responder solidariamente
com o autor direto do dano, em virtude da omissão praticada.
6. Ao oferecer um serviço por meio do qual se possibilita que os
usuários externem livremente sua opinião, deve o provedor de
conteúdo ter o cuidado de propiciar meios para que se possa
identificar cada um desses usuários, coibindo o anonimato e
atribuindo a cada manifestação uma autoria certa e determinada. Sob
a ótica da diligência média que se espera do provedor, deve este
adotar as providências que, conforme as circunstâncias específicas
de cada caso, estiverem ao seu alcance para a individualização dos
usuários do site, sob pena de responsabilização subjetiva por culpa in
omittendo.

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7. A iniciativa do provedor de conteúdo de manter em site que


hospeda rede social virtual um canal para denúncias é louvável e
condiz com a postura esperada na prestação desse tipo de serviço -
de manter meios que possibilitem a identificação de cada usuário (e
de eventuais abusos por ele praticado) - mas a mera disponibilização
da ferramenta não é suficiente. É crucial que haja a efetiva adoção de
providências tendentes a apurar e resolver as reclamações
formuladas, mantendo o denunciante informado das medidas
tomadas, sob pena de se criar apenas uma falsa sensação de
segurança e controle. 8. Recurso especial não provido.
(REsp 1308830 / RS, julgado em maio de 2012).

A aplicabilidade do CDC também não é afastada somente pelo fato de o


contrato ser disciplinado por lei específica. Neste sentido a seguinte decisão
sobre planos de saúde:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE.


RESPONSABILIDADE CIVIL. DESCREDENCIAMENTO DE CLÍNICA
MÉDICA. COMUNICAÇÃO PRÉVIA AO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA.
VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO. PREJUÍZO AO
USUÁRIO. SUSPENSÃO REPENTINA DE TRATAMENTO
QUIMIOTERÁPICO. SITUAÇÃO TRAUMÁTICA E AFLITIVA. DANO
MORAL. CONFIGURAÇÃO.
1. Ação ordinária que busca a condenação da operadora de plano de
saúde por danos morais, visto que deixou de comunicar previamente
a consumidora acerca do descredenciamento da clínica médica de
oncologia onde recebia tratamento, o que ocasionou a suspensão
repentina da quimioterapia.
2. Apesar de os planos e seguros privados de assistência à
saúde serem regidos pela Lei nº 9.656/1998, as operadoras da
área que prestam serviços remunerados à população
enquadram-se no conceito de fornecedor, existindo, pois, relação
de consumo, devendo ser aplicadas também, nesses tipos
contratuais, as regras do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Ambos instrumentos normativos incidem conjuntamente,
sobretudo porque esses contratos, de longa duração, lidam com
bens sensíveis, como a manutenção da vida. São essenciais,
portanto, tanto na formação quanto na execução da avença, a
boa-fé entre as partes e o cumprimento dos deveres de
informação, de cooperação e de lealdade (arts. 6º, III, e 46 do
CDC).
3. O legislador, atento às inter-relações que existem entre as fontes
do direito, incluiu, dentre os dispositivos da Lei de Planos de Saúde,
norma específica sobre o dever da operadora de informar o
consumidor quanto ao descredenciamento de entidades hospitalares
(art. 17, § 1º, da Lei nº 9.656/1998).
[...]
7. Recurso especial não provido. (REsp 1349385 / PR)

Por fim, o legislador esclareceu que serviço é a atividade fornecida no


mercado de consumo. A expressão “mercado de consumo” traz uma ideia de
relação mercantilizada e acaba por afastar a incidência do CDC a algumas
relações que decorrem de políticas públicas, como financiamento estudantil
(REsp 1526984 / SP, 2015) ou imobiliário (SFH). Em relação ao financiamento

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habitacional, os julgados mais recentes ressaltam que: “no que toca à adoção
das normas do Código de Defesa do Consumidor, a jurisprudência do STJ
firmou-se no sentido de serem aplicáveis aos contratos do SFH, desde que
não vinculados ao FCVS e posteriores à entrada em vigor da Lei 8.078/90“
(AgRg no REsp 1216391 / RJ, 2015).
O mesmo argumento também afasta, segundo o STJ, a aplicabilidade do
CDC à prestação de serviços advocatícios, por força do art. 133 do CF, que
atribuiu ao advogado um munus público, ou seja, que ao postular em nome do
cidadão o advogado não exerce apenas uma profissão, mas uma atividade
essencial, indispensável à administração da justiça (AgInt no AREsp 895899 /
SP, 2016).
A ausência de lucratividade e o sistema fechado (serviço não
disponibilizado no mercado de consumo) também foi o fundamento de
alteração no entendimento do STJ sobre a aplicação do CDC aos planos de
saúde, conforme súmula 608:

1.3 Objeto da relação jurídica de consumo


Segundo o parágrafo 1º, produto é qualquer bem móvel ou imóvel,
material ou imaterial. Dessa forma, prevendo expressamente a caracterização
do produto também como bem imaterial, tornou a norma plenamente aplicável
também às relações estabelecidas pela internet. O conceito de serviço, como
dito, inclui o elemento remuneração.

Ainda sobre o objeto das relações de consumo, resta avaliar a aplicação


do CDC à prestação de serviços públicos. O legislador fez referência aos
serviços públicos em diversos dispositivo: art. 3º, caput; 4º, VII; 6º, X e 22.

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Todavia, não são todos os serviços públicos que se subordinam às normas de


proteção do consumidor.

A distinção dos serviços a que se aplica o regime do CDC e aqueles


que se subordinam exclusivamente ao regime de direito
administrativo é realizada, em nosso direito, por Adalberto
Pasqualotto, em estudo de referência sobre o tema. Observa então,
Pasqualotto, que a aplicação do CDC não prescinde da distinção
entre os serviços públicos uti singuli e uti universi. Serviços públicos
uti singuli são aqueles prestados e fruídos individualmente e, por isso,
de uso mensurável, os quais são remunerados diretamente por quem
deles se aproveita, em geral por intermédio de tarifa (e. g. serviços de
energia elétrica, água). Já os serviços uti universi, prestados de modo
difuso para toda a coletividade, não são passíveis de mensuração,
sendo custeados por intermédio de impostos pagos pelos
contribuintes (relação de direito tributário). (MIRAGEM, 2012, p. 150)

Neste sentido a seguinte decisão do STJ:


PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE
CIVIL DO ESTADO. HOSPITAL DA POLÍCIA MILITAR. ERRO
MÉDICO. MORTE DE PACIENTE. INDENIZAÇÃO POR DANOS
MATERIAIS E MORAIS. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. FACULTATIVA.
1. Os recorridos ajuizaram ação de ressarcimento por danos
materiais e morais contra o Estado do Rio de Janeiro, em razão de
suposto erro médico cometido no Hospital da Polícia Militar.
2. Quando o serviço público é prestado diretamente pelo Estado
e custeado por meio de receitas tributárias não se caracteriza
uma relação de consumo nem se aplicam as regras do Código de
Defesa do Consumidor. Precedentes. (REsp 1187456 / RJ, 2010).

O STJ, na edição 74 do “Jurisprudência em Tese” registrou que a “a


relação entre concessionária de serviço público e o usuário final para o
fornecimento de serviços públicos essenciais é consumerista, sendo cabível a
aplicação do Código de Defesa do Consumidor – CDC”. Posteriormente editou
a súmula 601:

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Relação entre CDC e CDU: Em 26 de junho de 2017 foi publicada a Lei


nº 13.460 que dispõe sobre participação, proteção e defesa dos direitos do
usuário dos serviços públicos da administração pública. A referida Lei
menciona que seu objeto são os direitos do usuário dos serviços públicos
prestados direta ou indiretamente pela administração pública. Mais
especificamente aos prestados pela administração pública direta e indireta da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (art. 1º, §1º), o que
não afasta a aplicação do CDC e das normas regulamentadoras (§2º).
Também determina que a lei seja aplicada subsidiariamente aos serviços
públicos prestados por particular.

Assim, resta esclarecido que havendo relação de consumo, faz-


se aplicável o Código de Defesa do Consumidor tanto em relação
aos serviços públicos prestados diretamente pela Administração
Pública, quanto nos casos de serviços públicos prestados por
concessão ou permissão, como já dispunha o art. 7º da Lei
8.987/95. O diálogo entre estas leis é incontestável, pois ambas
asseguram direitos aos consumidores-usuários (art.7º do CDC). Ou
seja, a confluência dos preceitos contidos no art. 22, da Lei 8.078/90,
no art. 7º, da Lei 8.987/95 e no art. 1º, § 2º, II, da Lei 13.460/17
elimina quaisquer dúvidas que possam haver ou ter havido, no
tocante à existência de um círculo protetivo dos consumidores
quando da prestação de serviços públicos no Brasil. (REVERBEL e
MAFFINI, 2017).

Em relação aos serviços locatícios, o STJ fixou a tese segundo a qual “o


Código de Defesa do Consumidor não é aplicável aos contratos locatícios
regidos pela Lei n. 8.245/91 (jurisprudência em Teses, edição 53/2016). E que
não o incide o Código de Defesa do Consumidor nas relações jurídicas
estabelecidas entre condomínio e condôminos.” (68/2016).

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02
2. DIREITOS BÁSICOS DO CONSUMIDOR: REVISÃO CONTRATUAL E
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
O artigo 6º dispõe sobre os direitos básicos do consumidor. Na sua
maioria, esses direitos são regulados posteriormente em artigos específicos,
como os direitos à proteção da vida, saúde e segurança e proteção contra a
publicidade enganosa e abusiva; outros, contudo, são disciplinados no próprio
artigo 6º, como o direito a modificação e revisão dos contratos e o direito à
inversão do ônus da prova.

CAPÍTULO III
Dos Direitos Básicos do Consumidor

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:


I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos
provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços
considerados perigosos ou nocivos;
II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos
produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a
igualdade nas contratações;
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e
serviços, com especificação correta de quantidade, características,
composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre
os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de
2012) Vigência
IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos
comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e
cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e
serviços;
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam
prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos
supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais,
individuais, coletivos e difusos;
VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à
prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais,
coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e
técnica aos necessitados;
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a
inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil,
quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando
for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de
experiências;
IX - (Vetado);
X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.

2.1 Modificação e revisão das cláusulas contratuais


O direito à revisão e/ou modificação das cláusulas contratuais decorre
do direito ao equilíbrio contratual. Conforme Bruno Miragem (2012, p. 171), “o
direito subjetivo do consumidor ao equilíbrio contratual constitui efeito da

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principiologia do direito do consumidor, muito especialmente dos princípios da


boa-fé, da vulnerabilidade e, especialmente, do próprio princípio do equilíbrio”.
O Inciso V menciona a possibilidade de modificação das cláusulas
contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em
razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.
Assim, pode o consumidor, diante de alguma abusividade (art. 51), buscar a
nulidade de determinada cláusula e também pode buscar a revisão e
modificação de cláusulas que, desde a contratação, violem o equilíbrio do
contrato. Enquanto que pelo direito civil a revisão do desequilíbrio existente
desde a celebração do contrato só pode se dar mediante a demonstração de
um vício de consentimento, para o direito do consumidor basta demonstrar a
desproporção (injustiça), sem necessidade de invalidação de todo o negócio
jurídico. Busca-se, em regra, a adequação do contrato aos limites legais.
Já quanto à revisão por fato superveniente que torne a obrigação
excessivamente onerosa, também há diferenças em relação a disciplina do
Código Civil. Segundo o art. 317 do diploma civil, o fato superveniente deve ser
imprevisível, já o CDC não faz referência à imprevisibilidade.

A norma do art. 6º do CDC avança em relação ao Código Civil (arts.


478-480 – Da resolução por onerosidade excessiva), ao não exigir
que o fato superveniente seja imprevisível ou irresistível. Apenas
exige a quebra da base objetiva do negócio, a quebra do seu
equilíbrio intrínseco, a destruição da relação de equivalência entre
prestações, o desaparecimento do fim essencial do contrato. Em
outras palavras, o elemento autorizador da ação modificadora do
Judiciário é o resultado objetivo da engenharia contratual, que agora
apresenta a mencionada onerosidade excessiva para o consumidor,
resultado de simples fato superveniente, fato que não necessita ser
extraordinário, irresistível, fato que podia ser previsto e não foi. O
CDC, também não exige, para promover revisão, que haja “extrema
vantagem para a outra” parte contratual, como faz o Código Civil (art.
478). (BENJAMIN, MARQUES e BESSA, 2014, p. 81).

No XVII Exame da Ordem Unificado foi questionado sobre a


possibilidade de um consumidor buscar a revisão de um contrato de
financiamento de veículo com alienação fiduciária, em razão de, alguns meses
após a realização do negócio, entender que a obrigação assumida lhe era
excessivamente onerosa. As alternativas versavam, além da possibilidade de
revisão de contrato, sobre a aplicabilidade do CDC aos contratos de

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financiamento com alienação fiduciária e sobre a necessidade de propositura


de ação independente para exibição de documentos.
A jurisprudência anterior à vigência do novo CPC disciplina a matéria da
seguinte forma:
A jurisprudência deste Tribunal Superior, inclusive firmada em recurso
especial representativo de controvérsia, é no sentido de ser
descabida a multa cominatória na exibição, incidental ou autônoma,
de documento relativo a direito disponível (Súmula nº 372/STJ).
Quando houver descumprimento injustificado da determinação
judicial, em se tratando de ação cautelar de exibição, o
magistrado poderá ordenar a busca e apreensão do documento
ou, nas hipóteses de exibição incidental de documento, sendo
disponível o direito, poderá aplicar a presunção de veracidade
(art. 359 do CPC), a qual será relativa. (AgRg no REsp 1491088/SP).

Assim, a resposta correta é que “a questão comporta aplicação do CDC,


e a ação revisional pode ser proposta independentemente de medida cautelar
preparatória de exibição de documentos, já que o pleito de exibição do contrato
poderá ser formulado incidentalmente e nos próprios autos”.
Outra questão do Exame de Ordem sobre o direito básico de revisar
contratos:
Analisando o artigo 6º, V, do Código de Defesa do Consumidor, que
prescreve: “São direitos básicos do consumidor: V – a modificação
das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações
desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes
que as tornem excessivamente onerosas”, assinale a alternativa
correta.
a) Não traduz a relativização do princípio contratual da autonomia
da vontade das partes.
b) Almeja, em análise sistemática, precipuamente, a resolução do
contrato firmado entre consumidor e fornecedor.
c) Admite a incidência da cláusula rebus sic stantibus.
d) Exige a imprevisibilidade do fato superveniente.

2.2 Inversão judicial do ônus da prova


Ter o ônus de provar significa suportar o risco pela falta de prova de um
fato pertinente (o risco é o resultado da ação). A inversão do ônus da prova
pode decorrer da lei (ope legis), como na responsabilidade pelo fato do produto
ou do serviço (arts. 12 e 14 do CDC), ou por determinação judicial (ope judicis)
como no caso do art. 6º, VIII. A norma (no caso da inversão judicial) autoriza o
julgador a inverter o ônus da prova em favor do consumidor em duas hipóteses:
quando for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as
regras ordinárias de experiência.

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Ora, na estrutura das relações de consumo, o domínio do


conhecimento sobre o produto ou o serviço, ou ainda sobre o
processo de produção e fornecimento dos mesmos no mercado de
consumo é do fornecedor. Da mesma forma, não se pode
desconhecer que a defesa judicial de interesses exige do titular da
pretensão a disposição de recursos financeiros e técnicos para uma
adequada demonstração da pertinência e procedência do seu
interesse. (MIRAGEM, 2012, p. 183).

Impõe-se assim a compreensão dos conceitos de hipossuficiência e


verossimilhança. Os doutrinadores esclarecem que, apesar da semelhança,
não se pode confundir os significados de vulnerabilidade e hipossuficiência.
Conforme visto, todos os consumidores são presumidamente vulneráveis, nos
termos do art. 4º. Já a hipossuficiência relaciona-se com a ausência de
condições de provar sua pretensão. “Já a verossimilhança se estabelece a
partir de um critério de probabilidade, segundo os argumentos trazidos ao
conhecimento do juiz, de que uma dada situação relatada tenha se dado de
modo igual ou bastante semelhante ao conteúdo do relato” (MIRAGEM, 2012,
p. 187).
A regra geral da distribuição do ônus da prova (estática) está prevista no
art. 373 do Novo Código de Processo Civil:

Art. 373. O ônus da prova incumbe:


I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou
extintivo do direito do autor.

A inversão judicial do ônus da prova deve ocorrer preferencialmente na


fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurando-se à parte a
quem não incumbia inicialmente o encargo, a reabertura da oportunidade para
apresentação de provas.

PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA.


INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGRA DE INSTRUÇÃO.
EXAME ANTERIOR À PROLAÇÃO DA SENTENÇA. PRECEDENTES
DO STJ. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a
inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, é regra
de instrução e não regra de julgamento, sendo que a decisão que
a determinar deve - preferencialmente - ocorrer durante o
saneamento do processo ou - quando proferida em momento
posterior - garantir a parte a quem incumbia esse ônus a
oportunidade de apresentar suas provas. Precedentes: (julgado
em 30/09/2014)

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Com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, a definição


sobre a distribuição do ônus da prova deve ocorrer em decisão de saneamento
(Art. 357, CPC).
Ressalte-se que a inversão do ônus da prova pode ocorrer também nas
ações civis públicas.

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA AO ART. 535


DO CPC. INOCORRÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ABUSIVIDADE
NA COMERCIALIZAÇÃO DE COMBUSTÍVEIS. INVERSÃO DO
ÔNUS DA PROVA A FAVOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
POSSIBILIDADE. TUTELA DE DIREITOS E DE SEUS TITULARES,
E NÃO PROPRIAMENTE DAS PARTES DA AÇÃO. 1. Trata-se, na
origem, de ação civil pública movida pelo recorrido em face da
recorrente em que se discute abusividade na comercialização de
combustíveis. Houve, em primeiro grau, inversão do ônus da prova a
favor do Ministério Público, considerando a natureza consumerista da
demanda. Esta conclusão foi mantida no agravo de instrumento
interposto no Tribunal de Justiça. 2. Nas razões recursais, sustenta a
recorrente ter havido violação aos arts. 535 do Código de Processo
Civil (CPC), ao argumento de que o acórdão recorrido é omisso, e 6º,
inc. VIII, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), pois o
Ministério Público não é hipossuficiente a fim de que lhe se permita a
inversão do ônus da prova. Quanto a este último ponto, aduz, ainda,
haver dissídio jurisprudencial a ser sanado. 3. Em primeiro lugar, é de
se destacar que os órgãos julgadores não estão obrigados a
examinar todas as teses levantadas pelo jurisdicionado durante um
processo judicial, bastando que as decisões proferidas estejam
devida e coerentemente fundamentadas, em obediência ao que
determina o art. 93, inc. IX, da Constituição da República vigente. Isto
não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. Precedentes. 4. Em
segundo lugar, pacífico nesta Corte Superior o entendimento
segundo o qual o Ministério Público, no âmbito de ação
consumerista, faz jus à inversão do ônus da prova, a considerar
que o mecanismo previsto no art. 6º, inc. VIII, do CDC busca
concretizar a melhor tutela processual possível dos direitos
difusos, coletivos ou individuais homogêneos e de seus titulares
- na espécie, os consumidores -, independentemente daqueles
que figurem como autores ou réus na ação. Precedentes. 5.
Recurso especial não provido. (STJ, REsp 125.3672/RS)

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03
3. RESPONSABILIDADE CIVIL NAS RELAÇÕES DE CONSUMO: POR
VÍCIO E POR FATO

A responsabilidade civil é uma das áreas do direito que melhor reflete as


transformações sociais, políticas e econômicas do último século. Considerando
que vivenciamos um modelo econômico fundamentado no acesso crescente
aos bens de consumo, não surpreende a afirmação de que a responsabilidade
civil decorrente das relações de consumo assumiu extrema importância na
sociedade contemporânea.
Inicialmente fundamentada na teoria da culpa, a responsabilidade civil
hoje volta seus olhos para a vítima. O Direito preocupa-se com o dano sofrido
pela vítima: o resultado ou objeto.

O Ministro Herman Benjamin, com muita perspicácia, elaborou uma


teoria que define com precisão os fundamentos da responsabilidade civil nas
relações de consumo: a teoria da qualidade. Segundo o Ministro, o Código de
Defesa do Consumidor, ao dividir o dever de responder em duas órbitas
distintas, inseriu nas relações de consumo o inafastável dever de qualidade dos
produtos e serviços oferecidos no mercado.

No direito do consumidor é possível enxergar duas órbitas distintas –


embora não absolutamente excludentes – de preocupações.
A primeira centraliza suas atenções na garantia da incolumidade
físico-psíquica do consumidor, protegendo sua saúde e
segurança, ou seja, preservando sua vida e integridade contra os
acidentes de consumo provocados pelos riscos de produtos e
serviços. Esta órbita, pela natureza do bem jurídico tutelado, ganha
destaque em relação a segunda.
A segunda esfera de inquietação, diversamente, busca regrar a
incolumidade econômica do consumidor em face dos incidentes (e
não acidentes!) de consumo capazes de atingir seu patrimônio. Não
obstante em termos éticos a proteção da incolumidade físico-psíquica
do consumidor seja prioritária, são os ataques a sua incolumidade
econômica que mais aparecem no seu relacionamento com o
fornecedor.
Em outras palavras: enquanto a primeira órbita afeta o corpo do
consumidor, a outra atinge seu bolso. Todavia, mesmo quando a
atividade do fornecedor provoca danos a incolumidade físico-psíquica
do consumidor, reflexamente está atingindo igualmente sua

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incolumidade econômica, ocasionado diminuição de seu patrimônio.


Portanto, na identificação do tipo de esfera – e do regime jurídico
– atacada pela atividade do fornecedor, não deve o intérprete
buscar um traço exclusivo e sim preponderante. (BENJAMIN,
MARQUES e BESSA, 2007, p. 100/101)

Desta forma, conclui o autor que o dever de qualidade se subdivide em


qualidade segurança (responsabilidade pelos fatos ou acidentes) e qualidade
adequação (responsabilidade pelos vícios). O primeiro assunto é tratado no
CDC nos artigos 12 ao 17 e o segundo nos artigos 18 ao 24.

3.1 Da responsabilidade por fato do produto ou serviço


Tema recorrente nas provas de segunda fase de Direito Civil é a
responsabilidade pelo fato do produto ou serviço. Também chamada de
responsabilidade pelos acidentes de consumo (falha no dever de segurança), é
aquela decorrente dos danos provocados por produtos ou serviços (aqueles
que extrapolam o valor do próprio serviço ou produto).

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro,


e o importador respondem, independentemente da existência de
culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por
defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem,
fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus
produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas
sobre sua utilização e riscos.
§ 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que
dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as
circunstâncias relevantes, entre as quais:
I - sua apresentação;
II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III - a época em que foi colocado em circulação.
§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de
melhor qualidade ter sido colocado no mercado.
§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será
responsabilizado quando provar:
I - que não colocou o produto no mercado;
II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito
inexiste;
III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do


artigo anterior, quando:
I - o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem
ser identificados;
II - o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante,
produtor, construtor ou importador;
III - não conservar adequadamente os produtos perecíveis.
Parágrafo único. Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado
poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis,
segundo sua participação na causação do evento danoso.

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Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da


existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos
consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem
como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição
e riscos.
§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o
consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as
circunstâncias relevantes, entre as quais:
I - o modo de seu fornecimento;
II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III - a época em que foi fornecido.
§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas
técnicas.
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando
provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será
apurada mediante a verificação de culpa.

Art. 15. (Vetado).

Art. 16. (Vetado).

Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores


todas as vítimas do evento.

Conforme o parágrafo 1º do artigo 12, o produto é defeituoso quando


não oferece a segurança que dele legitimamente se espera. “O dano é
pressuposto inafastável da responsabilidade civil. Não há que se falar em
responsabilidade civil sem dano – o que pode qualificar-se como patrimonial ou
moral” (BENJAMIN, MARQUES e BESSA, 2014, p. 169). Os fornecedores
responsáveis são aqueles mencionados no artigo. O comerciante só será
responsabilizado (por fato do produto) nas hipóteses do artigo 13. A
responsabilidade dos fornecedores é objetiva, exceto a dos profissionais
liberais, conforme art. 14, §4º, que determina que quanto a estes a
responsabilização se dará mediante a verificação de culpa.
Sobre a responsabilidade por fato do produto, a seguinte questão do
Exame de Ordem:
Determinado consumidor, ao mastigar uma fatia de pão com geleia,
encontrou um elemento rígido, o que lhe causou intenso desconforto
e a quebra parcial de um dos dentes. Em razão do fato, ingressou
com medida judicial em face do mercado que vendeu a geleia, a fim
de ser reparado. No curso do processo, a perícia constatou que o
elemento encontrado era uma pequena porção de açúcar cristalizado,
não oferecendo risco à saúde do autor. Diante desta narrativa,
assinale a afirmativa correta.

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A) O fabricante e o fornecedor do serviço devem ser excluídos de


responsabilidade, visto que o material não ofereceu qualquer risco à
integridade física do consumidor, não merecendo reparação.
B) O elemento rígido não característico do produto, ainda que
não o tornasse impróprio para o consumo, violou padrões de
segurança, já que houve dano comprovado pelo consumidor.
C) A responsabilidade do fornecedor depende de apuração de culpa
e, portanto, não tendo o comerciante agido de modo a causar
voluntariamente o evento, não deve responder pelo resultado.
D) O comerciante não deve ser condenado e sequer caberia qualquer
medida contra o fabricante, posto que não há fato ou vício do produto,
motivo pelo qual não deve ser responsabilizado pelo alegado defeito.

Os artigos 12, 13 e 14 já foram objeto de questionamento em situações


problemas na prova da segunda fase. Em relação à responsabilidade civil dos
prestadores de serviço, importa ressaltar que é solidária entre todos os
envolvidos na cadeia de fornecimento e que a responsabilidade dos
profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.
Já em relação à responsabilidade dos fornecedores de produto (artigos
12 e 13), o CDC imputa ao fabricante, independentemente de sua culpa, a
responsabilidade pelo fato do produto defeituoso, e não ao fornecedor direto
(comerciante). Segundo o artigo 13, o comerciante será igualmente
responsável nas situações previstas em seus incisos: I - o fabricante, o
construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados; II - o
produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor,
construtor ou importador; III - não conservar adequadamente os produtos
perecíveis. Os doutrinadores divergem sobre a natureza da responsabilidade
civil do comerciante, se solidária ou subsidiária. Diz-se subsidiária nas
situações previstas nos inciso I e II, porque a responsabilidade do comerciante
decorre da impossibilidade de identificação do fabricante (responsável original).
Já nas situações do inciso III (alimentos perecíveis) mostra-se mais coerente
entender pela solidariedade:

Internamente, na cadeia de produção o CDC estipula, em seu art. 13,


parágrafo único, a responsabilidade pelo ressarcimento do dano
novamente ligada ao defeito do produto, mas desta vez responderá
cada fornecedor na medida de sua “participação”, isto é, se o defeito
pode ou não ser a ele imputado subjetivamente. Assim, se o defeito
foi na fabricação do iogurte, no tipo de micro-organismo utilizado, o
comerciante pode até ser responsabilizado pelos danos causados à
saúde de seus clientes e suas famílias, pois está mais próximo e se
presume que tenha falhado na conservação do produto perecível;
mas, se o defeito do produto foi causado pelo fabricante, terá o
comerciante direito de regresso. Se o defeito que deu origem ao

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evento danoso foi causado totalmente pelo fabricante, terá direito de


regresso integral. (MARQUES, 2016, p. 1434)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


DIREITO DO CONSUMIDOR. INGESTÃO DE PRODUTO
IMPRÓPRIO PARA O CONSUMO. FATO DO PRODUTO.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO FABRICANTE E DO
COMERCIANTE. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE.
SÚMULA Nº 7/STJ. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. EVENTO
DANOSO. SÚMULA Nº 54/STJ.
1. No que se refere à alegação da recorrente de que os danos
suportados pelo autor da demanda seriam advindos de culpa
exclusiva
da vítima pelo evento danoso, rever o que decidido no recurso
especial requer nova incursão fático-probatória, procedimento
inviável, a teor da Súmula nº 7/STJ.
2. Consoante a jurisprudência desta Corte, a eventual
configuração da culpa do comerciante de produto impróprio para
o consumo não tem o condão de afastar o direito de o
consumidor propor ação de reparação pelos danos resultantes
da ingestão da mercadoria estragada em desfavor do seu
fabricante.
3. Em caso de responsabilidade extracontratual, os juros moratórios
fluem a partir do evento danoso (Súmula nº 54/STJ).
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 265586 / SP, 25/09/2014).

Sobre a solidariedade do art. 13, III, veja a conclusão de Antonio


Herman Benjamin (BENJAMIN, MARQUES e BESSA, 2017):

O Código, assim, traz dois tipos de solidariedade legal: uma para os


cocausadores do dano e outra em que nem todos os coobrigados são
causadores (diretos) do dano. É nesta última hipótese que se encaixa
a responsabilização do fabricante, apesar do verdadeiro causador
(direto) do prejuízo ser o comerciante que, v.g., deixou de conservar
adequadamente o produto (art. 13, III). Para aqueles casos em que
os coobrigados são todos cocausadores do dano, o Código tem
norma geral, já no limiar do seu texto, que impõe o princípio da
solidariedade ex lege. Segundo o art. 7.º, parágrafo único, “tendo
mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela
reparação dos danos previstos nas normas de consumo”, tratamento
este que é repetido no art. 25, § 1.º. É interessante observar que este
art. 7.º vai além do próprio Código, uma vez que cuida de “danos
previstos nas normas de consumo” (grifos nossos). E, como se sabe,
o Código não é o único repertório de normas de proteção ao
consumidor. Há, ao seu lado, entre outras, a legislação sanitária, a de
alimentos, a de medicamentos, todas traçando normas de consumo.

Em relação às excludentes de responsabilidade civil (artigo 12, §3º e 14,


§3) pacificou-se o entendimento de que se trata de inversão legal do ônus da
prova.
A Segunda Seção deste Tribunal, no julgamento do REsp
802.832/MG, rel. Paulo de Tarso Sanseverino, DJ de 21/09/2011,
pacificou a jurisprudência desta Corte no sentido de que em demanda

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que trata da responsabilidade pelo fato do produto ou serviço (arts. 12


e 14 do CDC), a inversão do ônus da prova decorre da lei” (AgRg
no AREsp 402.107/RJ, rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., 26.11.2013, DJe
09.12.2013).

Ainda quanto à responsabilidade pelo fato do serviço (art. 14) importa


mencionar o dever de segurança inerente a prestação de alguns serviços. Em
relação ao furto de veículos em shopping centers, supermercados e outros
estabelecimentos que contam com estacionamento, a jurisprudência é hoje
pacífica no sentido da existência do dever de cuidado, de segurança, e de
vigilância (súmula 130 do STJ).

Também objetiva é a responsabilidade civil das instituições financeiras


por fraudes e delitos praticados por terceiros. Não cabe a alegação de caso
fortuito pois o dever de segurança é inerente à atividade, o que configuraria
fortuito interno.

O entendimento de que atos fraudulentos não eximem o fornecedor de


responsabilidade (não configura culpa exclusiva de terceiro) também é aplicado
a outros fornecedores que não os de serviços bancários, como lojas e
prestadoras de serviços de telefonia, por exemplo.
Não apenas furtos em estacionamentos e fraudes geram
responsabilidade objetiva da instituição financeira. O STJ tem decidido,
especialmente a partir de 2013, que o banco responde objetivamente pelos
danos sofridos por consumidores em decorrência de furtos e roubos dentro do
estabelecimento bancário.

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O STJ tem reconhecido amplamente a responsabilidade


objetiva dos bancos pelos assaltos ocorridos no interior de suas
agências, em razão do risco inerente à atividade bancária. Além
disso, já se reconheceu, também, a responsabilidade da instituição
financeira por assalto acontecido nas dependências de
estacionamento oferecido aos seus clientes exatamente com o
escopo de mais segurança. Não há, contudo, como responsabilizar a
instituição financeira na hipótese em que o assalto tenha ocorrido fora
das dependências da agência bancária, em via pública, sem que
tenha havido qualquer falha na segurança interna da agência
bancária que propiciasse a atuação dos criminosos após a efetivação
do saque, tendo em vista a inexistência de vício na prestação de
serviços por parte da instituição financeira. Além do mais, se o ilícito
ocorre em via pública, é do Estado, e não da instituição financeira, o
dever de garantir a segurança dos cidadãos e de evitar a atuação dos
criminosos. Precedente citado: REsp 402.870-SP, DJ
14/2/2005. REsp 1.284.962-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado
em 11/12/2012.

Conforme já mencionado, o artigo 17 (vítimas dos acidentes de


consumo são consumidores por equiparação) foi objeto de questionamento no
XVII EO. Sobre o mesmo tema, menciona Cláudia Lima Marques (2016, p.
1413) o interessante caso que ocorreu em Pernambuco, “em que o
desabamento de prédio (acidente de consumo) abalou prédios vizinhos e as
vítimas-vizinhos entraram com ações como “consumidoras”, com base no art.
17 do CDC”.
No XXI EO (caso em que a vítima de 13 anos sofre danos em
decorrência do superaquecimento de TV comprada por sua mãe), o padrão de
resposta da peça profissional estabeleceu que “quanto ao primeiro ponto, deve-
se sustentar a existência de relação de consumo entre a autora da ação, vítima
de acidente de consumo, e a ré, fabricante do produto defeituoso que lhe
causou dano moral e estético”. Nesse caso, a despeito de não ter participado,
como parte, da relação contratual de compra e venda do produto, a autora é
qualificada como consumidora, pois, nas hipóteses de responsabilidade pelo
fato do produto, “equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento”
(Art. 17 do CDC).” A menor também se enquadra no conceito de consumidora
em razão de ser a usuária do produto (art. 2º).
Ainda sobre a insegurança dos produtos, muito antes da Resolução da
Anvisa (RDC 26/2015) o dever de informação no rótulo já era reconhecido pela
jurisprudência: “É fundamental assegurar os direitos de informação e
segurança ao consumidor celíaco, que está adstrito à dieta isente de glúten,
sob pena de graves riscos à sáude, o que, em última análise, tangencia a

27
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garantia de uma vida digna (REsp 1479616/GO, rel. min. Ricardo Villas Bôas
Cueva, 3ª T., j. 03.03.2015, DJe 16.04.2015).”
Por fim, importa registrar a ainda polêmica reparação dos danos
decorrentes da compra de alimentos contaminados. No informativo
“Jurisprudência em Teses” o STJ menciona dois entendimentos divergentes em
relação ao tema:
2) A simples aquisição do produto considerado impróprio para o
consumo, em virtude da presença de corpo estranho, sem que se
tenha ingerido o seu conteúdo, não revela o sofrimento capaz de
ensejar indenização por danos morais. (Informativo de Jurisprudência
n. 0553, publicado em 11 de fevereiro de 2015.)
3) A aquisição de produto de gênero alimentício contendo em seu
interior corpo estranho, expondo o consumidor a risco concreto de
lesão à sua saúde e segurança, ainda que não ocorra a ingestão de
seu conteúdo, dá direito à compensação por dano moral, dada a
ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do
princípio da dignidade da pessoa humana. (Informativo de
Jurisprudência n. 0537, publicado em 10 de abril de 2014.)

Mais recentemente, conforme Informativo de Jurisprudência 616, de


2018, “o simples "levar à boca" do alimento industrializado com corpo
estranho gera dano moral in re ipsa, independentemente de sua
ingestão”.

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3.2 Da responsabilidade por vício do produto ou serviço


A responsabilidade pelos vícios dos produtos ou serviços refere-se ao
seu adequado funcionamento e a sua adequação aos fins aos quais se
destinam.

Nada mais natural e justo que os produtos e serviços oferecidos no


mercado de consumo tenham qualidade, atendam à sua finalidade
própria e, consequentemente, às necessidades e expectativas dos
consumidores. O Código de Defesa do Consumidor determina que,
independentemente da garantia oferecida pelo fornecedor (garantia
de fábrica), os produtos e serviços devem ser adequados aos fins a
que se destinam, ou seja, devem funcionar bem, atender às legítimas
expectativas do consumidor (BENJAMIN, MARQUES e BESSA, 2014,
p. 199).

O caput do artigo esclarece a existência de quatro modalidades de


vícios: a) aqueles que tornam o produto impróprio ao consumo; b) aqueles que
tornam o produto inadequado ao consumo; c) aqueles que lhe diminuam o
valor e d) aqueles em desconformidade com o que foi informado sobre eles.

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não


duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou
quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a
que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles
decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do
recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária,
respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o
consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode
o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em
perfeitas condições de uso;
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente
atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III - o abatimento proporcional do preço.
§ 2° Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do
prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a sete
nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a
cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio
de manifestação expressa do consumidor.
§ 3° O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do § 1°
deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a
substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou
características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto
essencial.
§ 4° Tendo o consumidor optado pela alternativa do inciso I do § 1°
deste artigo, e não sendo possível a substituição do bem, poderá
haver substituição por outro de espécie, marca ou modelo diversos,
mediante complementação ou restituição de eventual diferença de

29
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preço, sem prejuízo do disposto nos incisos II e III do § 1° deste


artigo.
§ 5° No caso de fornecimento de produtos in natura, será responsável
perante o consumidor o fornecedor imediato, exceto quando
identificado claramente seu produtor.
§ 6° São impróprios ao uso e consumo:
I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos;
II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados,
falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde,
perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas
regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação;
III - os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao
fim a que se destinam.

Percebe-se, assim, que o fornecedor, em regra, tem até 30 dias para


sanar o vício do produto. Não terá este prazo, contudo, nas hipóteses do
parágrafo 3º do art. 18, conforme questão (EO) que segue:

Dulce, cinquenta e oito anos de idade, fumante há três décadas, foi


diagnosticada como portadora de enfisema pulmonar. Trata-se de
uma doença pulmonar obstrutiva crônica caracterizada pela dilatação
excessiva dos alvéolos pulmonares, que causa a perda da
capacidade respiratória e uma consequente oxigenação insuficiente.
Em razão do avançado estágio da doença, foi prescrito como
essencial o tratamento de suplementação de oxigênio. Para tanto,
Joana, filha de Dulce, adquiriu para sua mãe um aparelho respiratório
na loja Saúde e Bem-Estar. Porém, com uma semana de uso, o
produto parou de funcionar. Joana procurou imediatamente a loja
para substituição do aparelho, oportunidade na qual foi informada
pela gerente que deveria aguardar o prazo legal de trinta dias para
conserto do produto pelo fabricante. Com base no caso narrado, em
relação ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor, assinale a
afirmativa correta.
A) Está correta a orientação da vendedora. Joana deverá aguardar o
prazo legal de trinta dias para conserto e, caso não seja sanado o
vício, exigir a substituição do produto, a devolução do dinheiro
corrigido monetariamente ou o abatimento proporcional do preço.
B) Joana não é consumidora destinatária final do produto, logo tem
apenas direito ao conserto do produto durável no prazo de noventa
dias, mas não à devolução da quantia paga.
C) Joana não precisa aguardar o prazo legal de trinta dias para
conserto, pois tem direito de exigir a substituição imediata do
produto, em razão de sua essencialidade.
D) Na impossibilidade de substituição do produto por outro da mesma
espécie, Joana poderá optar por um modelo diverso, sem direito à
restituição de eventual diferença de preço, e, se este for de valor
maior, não será devida por Joana qualquer complementação.

Assim, ao contrário do que normalmente o consumidor imagina, exceto


nas situações do parágrafo 3º, o vício não lhe dará o direito à substituição
imediata do produto. Conforme dispõe a parte final do caput e o parágrafo
primeiro, o fornecedor tem o direito de sanar os vícios, substituindo as partes
viciadas, no prazo de até 30 dias. Não sendo o vício sanado, poderá o

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consumidor fazer uso das alternativas do parágrafo 1º. Neste sentido, a


seguinte questão do Exame de Ordem:

Ao instalar um novo aparelho de televisão no quarto de seu filho, o


consumidor verifica que a tecla de volume do controle remoto não
está funcionando bem. Em contato com a loja onde adquiriu o
produto, é encaminhado à autorizada. O que esse consumidor pode
exigir com base na lei, nesse momento, do comerciante?
a) A imediata substituição do produto por outro novo.
b) O dinheiro de volta.
c) O conserto do produto no prazo máximo de 30 dias.
d) Um produto idêntico emprestado enquanto durar o conserto.

O art. 19 trata dos vícios de quantidade.

Art. 19. Os fornecedores respondem solidariamente pelos vícios de


quantidade do produto sempre que, respeitadas as variações
decorrentes de sua natureza, seu conteúdo líquido for inferior às
indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou de
mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir,
alternativamente e à sua escolha:
I - o abatimento proporcional do preço;
II - complementação do peso ou medida;
III - a substituição do produto por outro da mesma espécie, marca ou
modelo, sem os aludidos vícios;
IV - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente
atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos.
§ 1° Aplica-se a este artigo o disposto no § 4° do artigo anterior.
§ 2° O fornecedor imediato será responsável quando fizer a pesagem
ou a medição e o instrumento utilizado não estiver aferido segundo os
padrões oficiais.

O art. 20 trata dos vícios na prestação de serviços. Diferentemente do


art. 18, ao fornecedor de serviços a lei não concedeu prazo para que o vício
seja sanado.

Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade


que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor,
assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as
indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o
consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I - a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente
atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III - o abatimento proporcional do preço.
§ 1° A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros
devidamente capacitados, por conta e risco do fornecedor.
§ 2° São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os
fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que
não atendam as normas regulamentares de prestabilidade.

Art. 21. No fornecimento de serviços que tenham por objetivo a


reparação de qualquer produto considerar-se-á implícita a obrigação
do fornecedor de empregar componentes de reposição originais
adequados e novos, ou que mantenham as especificações técnicas

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Curso preparatório 2ª Fase Civil
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do fabricante, salvo, quanto a estes últimos, autorização em contrário


do consumidor.

Uma questão do Exame de Ordem mesclou os temas “vício na


prestação de serviços” e “validade e forma do orçamento”.

Hugo colidiu com seu veículo e necessitou de reparos na lataria e na


pintura. Para tanto, procurou, por indicação de um amigo, os serviços
da Oficina Mecânica M, oportunidade na qual lhe foi ofertado
orçamento escrito, válido por15 (quinze) dias, com o valor da mão de
obra e dos materiais a serem utilizados na realização do conserto do
automóvel. Hugo, na certeza da boa indicação, contratou pela
primeira vez com a Oficina. Considerando as regras do Código de
Proteção e Defesa do Consumidor, assinale a afirmativa correta.
A) Segundo a lei do consumidor, o orçamento tem prazo de validade
obrigatório de 10 (dez) dias, contados do seu recebimento pelo
consumidor Hugo. Logo, no caso, somente durante esse período a
Oficina Mecânica M estará vinculada ao valor orçado.
B) Uma vez aprovado o orçamento pelo consumidor, os contraentes
estarão vinculados, sendo correto afirmar que Hugo não responderá
por quaisquer ônus ou acréscimos no valor dos materiais orçados;
contudo, ele poderá vir a responder pela necessidade de contratação
de terceiros não previstos no orçamento prévio.
C) Se o serviço de pintura contratado por Hugo apresentar vícios
de qualidade, é correto afirmar que ele terá tríplice opção, à sua
escolha, de exigir da oficina mecânica: a reexecução do serviço
sem custo adicional; a devolução de eventual quantia já paga,
corrigida monetariamente, ou o abatimento do preço de forma
proporcional.
D) A lei consumerista considera prática abusiva a execução de
serviços sem a prévia elaboração de orçamento, o que pode ser feito
por qualquer meio, oral ou escrito, exigindo se, para sua validade, o
consentimento expresso ou tácito
do consumidor.

Ainda sobre vícios, O STJ, no Informativo de Jurisprudência 544/2014,


registrou atese de que “é cabível indenização por dano moral quando o

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consumidor de veículo zero-quilômetro necessita retornar à concessionária por


diversas vezes para reparo de defeitos apresentados no veículo”. E que “A
constatação de defeito em veículo zero-quilômetro revela hipótese de vício do
produto e impõe a responsabilização solidária da concessionária e do
fabricante” (505/2012).

3.3 Da responsabilidade solidária

Assim como no Código Civil, os coautores respondem solidariamente


pelos danos.

Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros


decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil
seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos
expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como
dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes
e eqüidade.
Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos
responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos
nas normas de consumo.

No XIV Exame de Ordem Unificado foi questionado sobre a


responsabilidade solidária nas relações de consumo, mediante o seguinte
enunciado:
Um homem foi submetido a cirurgia para remoção de cálculos renais
em hospital privado. A intervenção foi realizada por equipe médica
não integrante dos quadros de funcionários do referido hospital,
apesar de ter sido indicada por esse mesmo hospital.

Durante o procedimento, houve perfuração do fígado do paciente,


verificada somente três dias após a cirurgia, motivo pelo qual o
homem teve que se submeter a novo procedimento cirúrgico, que lhe
deixou uma grande cicatriz na região abdominal. O paciente
ingressou com ação judicial em face do hospital, visando a
indenização por danos morais e estéticos.

No caso apresentado, a equipe médica que realizou o procedimento não


integrava o quadro de funcionários do hospital acionado, mas foi indicada ao
consumidor por este hospital. Em síntese, as alternativas versavam sobre a
responsabilização ou não do hospital por fato do serviço. A alternativa
correta foi a de que “o hospital responde objetivamente pelos danos morais e
estéticos decorrentes do erro médico, tendo em vista que ele indicou a equipe
médica”.

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O Superior Tribunal de Justiça tem entendido, preponderantemente, que


quando há relação de subordinação dos médicos em relação ao hospital (não
necessariamente vínculo empregatício) existe solidariedade entre eles.
Entende-se, na mesma forma, que a responsabilidade do hospital depende de
prova da culpa médica.

[...]
5. A responsabilidade objetiva para o prestador de serviço, prevista
no art. 14 do CDC, na hipótese de tratar-se de hospital, limita-se
aos serviços relacionados ao estabelecimento empresarial, tais como
estadia do paciente (internação e alimentação), instalações,
equipamentos e serviços auxiliares (enfermagem, exames,
radiologia).
6. Se o dano decorre de falha técnica restrita ao profissional
médico, que não possui qualquer vínculo com o hospital - seja de
emprego ou de mera preposição - não cabe atribuir ao nosocômio
a obrigação de indenizar a vítima.
7. Ausente vínculo entre o profissional causador do dano e a
operadora de plano de saúde, em razão da contratação em caráter
exclusivamente particular, não se pode imputar a esta a
responsabilidade pelo ilícito para o qual não contribuiu de nenhuma
maneira. (REsp 1733387 / SP, julgado em 15/05/2018)

A jurisprudência das Turmas que integram a Segunda Seção do STJ


sedimentou que a responsabilidade dos hospitais, no que tange à
atuação dos médicos contratados que neles laboram, é subjetiva,
dependendo da demonstração de culpa do preposto, não se
podendo, portanto, excluir a culpa do médico e responsabilizar
objetivamente o hospital.
Por outro lado, se o dano decorre de falha técnica restrita ao
profissional médico, que não possui qualquer vínculo com o
hospital - seja de emprego ou de mera preposição - não cabe
atribuir ao nosocômio a obrigação de indenizar a vítima [...]". (REsp
1579954 / MG, julgado em 08/05/2018).

Em síntese, em caso de comprovação de culpa de médico vinculado ao


hospital, responde este solidariamente.
A agência de turismo que comercializa pacotes de viagens responde
solidariamente, nos termos do art. 14 do CDC, pelos defeitos na prestação dos
serviços que integram o pacote (Informativo 484/2011).

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04
4. DA DECADÊNCIA E DA PRESCRIÇÃO

Tema complexo no direito do consumidor é aquele relacionado aos


prazos para reclamação por vício ou por fato. O art. 26 trata do prazo para
reclamar pelos vícios e o próprio legislador o denominou de prazo decadencial.
Contudo, “a decadência tem em consideração a existência de um direito
potestativo ou formativo que, uma vez exercido pelo titular, produz desde logo
sua eficácia na constituição, modificação, ou extinção de uma determinada
relação jurídica” (MIRAGEM, 2012, p. 506). Assim, por sua natureza, pode-se
denominar de prazo decadencial aquele que o consumidor tem para reclamar
perante o fornecedor dos vícios aparentes ou ocultos dos produtos ou serviços.
Ocorre que o fornecedor pode não atender espontaneamente ao pedido do
consumidor. Neste caso, lesado o direito do consumidor e tendo este que
recorrer ao judiciário, a natureza deste segundo prazo se aproximaria muito
mais de um prazo prescricional. Contudo, não é este o entendimento que
prepondera na jurisprudência.
O parágrafo 2º do art. 26 do CDC determina que “obsta a decadência” a
reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o
fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que
deve ser transmitida de forma inequívoca. Prepondera na doutrina a
interpretação doutrinária de que a expressão “obstar” se trata de interrupção
(ao menos no que diz respeito a contagem do prazo), assim, após a resposta
negativa do fornecedor, o prazo previsto no artigo recomeça. Recomeça,
segundo entendimento de nossos tribunais, para o ajuizamento de uma ação
por vício.
Já o prazo prescricional para o exercício da pretensão reparatória por
danos causados aos consumidores-vítimas de acidentes de consumo é de
cinco anos, segundo estabelece o art. 27 do CDC.

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Diversas questões da segunda fase de direito civil já abordaram o


assunto, contudo, a mais importante e polêmica delas foi a peça profissional do
XIX exame de ordem unificado:

ENUNCIADO:
Antônio Augusto, ao se mudar para seu novo apartamento, recém-
comprado, adquiriu, em 20/10/2015, diversos eletrodomésticos de última
geração, dentre os quais uma TV de LED com sessenta polegadas, acesso à
Internet e outras facilidades, pelo preço de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Depois de funcionar perfeitamente por trinta dias, a TV apresentou
superaquecimento que levou à explosão da fonte de energia do equipamento,
provocando danos irreparáveis a todos os aparelhos eletrônicos que estavam
conectados ao televisor. Não obstante a reclamação que lhes foi apresentada
em 25/11/2015, tanto o fabricante (MaxTV S.A.) quanto o comerciante de quem
o produto fora adquirido (Lojas de Eletrodomésticos Ltda.) permaneceram
inertes, deixando de oferecer qualquer solução.
Diante disso, em 10/03/2016, Antônio Augusto propôs ação perante Vara
Cível em face tanto da fábrica do aparelho quanto da loja em que o adquiriu,
requerendo:
(i) a substituição do televisor por outro do mesmo modelo ou superior,
em perfeito estado;
(ii) indenização de aproximadamente trinta e cinco mil reais,
correspondente ao valor dos demais aparelhos danificados; e
(iii) indenização por danos morais, em virtude de a situação não ter sido
solucionada em tempo razoável, motivo pelo qual a família ficou, durante algum
tempo, sem usar a TV.
O juiz, porém, acolheu preliminar de ilegitimidade passiva arguída, em
contestação, pela loja que havia alienado a televisão ao autor, excluindo-a do
polo passivo, com fundamento nos artigos 12 e 13 do Código de Defesa do
Consumidor.
Além disso, reconheceu a decadência do direito do autor, alegada em
contestação pela fabricante do produto, com fundamento no Art. 26, inciso II,
do CDC, considerando que decorreram mais de noventa dias entre a data do

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surgimento do defeito e a do ajuizamento da ação. A sentença não transitou


em julgado.
Na qualidade de advogado(a) do autor da ação, indique o meio
processual adequado à tutela do seu direito, elaborando a peça processual
cabível no caso, excluindo-se a hipótese de embargos de declaração,
indicando os seus requisitos e fundamentos nos termos da legislação vigente.
(Valor: 5,00)
Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação
do dispositivo legal não confere pontuação.

GABARITO COMENTADO:
A decisão em questão tem natureza jurídica de sentença, na forma do
Art. 162, § 1º, do Art. 267, inciso VI, do Art. 269, inciso IV, e do Art. 459, todos
do Código de Processo Civil. Com efeito, extinguiu-se o processo, sem
resolução do mérito, quanto ao comerciante, acolhendo-se a sua ilegitimidade
passiva, e com resolução do mérito, no tocante ao fabricante, em cujo favor se
reconheceu a decadência. Em virtude disso, o meio processual adequado à
impugnação do provimento judicial, a fim de evitar que faça coisa julgada, é o
recurso de apelação, de acordo com o Art. 513 do CPC.
Deve-se, para buscar a tutela integral ao interesse do autor, impugnar
cada um dos capítulos da sentença, isto é, tanto a ilegitimidade do comerciante
quanto a decadência que aproveitou ao fabricante.
Quanto ao primeiro ponto, deve-se sustentar a solidariedade entre o
varejista, que efetuou a venda do produto, e o seu fabricante, admitindo-se a
propositura da ação em face de ambos na qualidade de litisconsortes passivos
(art. 7º. § único do CDC). A responsabilidade do comerciante, em relação ao
primeiro pedido deduzido da petição inicial, qual seja, o de substituição do
produto, encontra fundamento no Art. 3º, CDC, que conceitua os fornecedores,
e no art. 18 do CDC, que trata de hipótese de vício do produto.
Quanto ao segundo capítulo da sentença, deve-se pretender o
afastamento da decadência. No que concerne ao primeiro pedido, referente à
substituição do produto, a pretensão recursal deve basear-se na existência de
reclamação oportuna do consumidor, a obstar o prazo decadencial, na forma
do Art. 26, § 2º, inciso I, do CDC.

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Já no tocante aos demais pedidos formulados (indenização por danos


patrimoniais e morais), há responsabilidade civil por fato do produto, haja vista
os danos sofridos pelo autor da ação, a atrair a incidência dos artigos 12 e 27
do CDC. Deste modo, a pretensão autoral à indenização dos danos não se
submete a prazo decadencial, mas ao prazo prescricional de cinco anos,
estipulado no artigo 27, do CDC.
Nessa linha, deve-se requerer a reforma da sentença para que o pedido
seja apreciado, mediante o reconhecimento da legitimidade passiva do
comerciante, e o afastamento da decadência, determinando-se o retorno dos
autos ao juízo de primeira instância, para prosseguimento do feito.
DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS:

ITEM PONTUAÇÃO

Endereçamento correto: o recurso deve ser interposto perante o


0,00 / 0,10
juízo sentenciante, Vara Cível, com as respectivas razões (0,10)
Indicação do apelante (0,10) e dos apelados MAX TV SA (0,10) e 0,00 / 0,10 / 0,20 / 0,30
LOJA DE ELETRODOMÉSTICOS LTDA (0,10).
Fundamentação Jurídica/Legal:
Demonstrar a existência de responsabilidade solidária do
comerciante (0,70), em relação ao primeiro pedido formulado 0,00 / 0,70 / 0,80
(substituição do televisor), com base no Art. 7º, parágrafo único do
CDC OU Art. 25, § 1º do CDC OU Art. 18 do CDC (0,10).
Demonstrar a inexistência de decadência quanto ao pedido de
substituição do produto defeituoso (0,30), em virtude de
reclamação tempestiva formulada pelo autor (0,20), configurando 0,00 / 0,20 / 0,30 / 0,40 / 0,50 /
causa obstativa da contagem do prazo decadencial (0,20), prevista 0,60 / 0,70 / 0,80
no Art. 26, § 2º, inc. I, do CDC (0,10).
Em relação aos pedidos de indenização formulados, demonstrar que
seu fundamento é o fato do produto (0,30), sujeito a prazo 0,00 / 0,20 / 0,30 / 0,40 / 0,50 /
prescricional (0,20), previsto no artigo 27, do CDC (0,10). 0,60
Formular corretamente os pedidos:
Deduzir pedido de afastamento do acolhimento de decadência
(0,40), por se tratar de responsabilidade pelo fato do produto 0,00 / 0,20 / 0,40 / 0,60
(0,20).
Deduzir pedido de inclusão do comerciante no polo passivo (0,40). 0,00 / 0,40
Reforma da decisão (0,40) para julgar procedentes os pedidos 0,00 / 0,20 / 0,40 / 0,60
deduzidos na inicial (0,20)
Intimação dos apelados para apresentar contrarrazões (0,10) 0,00 / 0,10
Demonstrar o recolhimento do preparo (0,10). 0,00 / 0,10
Estruturar a peça corretamente: fatos (0,20); fundamentos (0,20); 0,00 / 0,10/ 0,20 / 0,30 / 0,40
pedidos recursais (0,10). /0,50
Fechamento da Peça (Indicar a inserção de local, data, assinatura e
OAB) (0,10). 0,00 / 0,10

38
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A banca examinadora entendeu, portanto, pela possibilidade de uma


mesma situação gerar responsabilidade pelo vício e pelo fato do produto. O
pedido formulado seria o elemento identificador da disciplina a ser utilizada.
Desta forma, entendeu que o pedido de substituição do televisor por outro
caracteriza reclamação pelo vício do produto, o que legitima o comerciante a
responder solidariamente com o fabricante – por isso a necessidade de recurso
em relação ao afastamento do comerciante do polo passivo. Considerando que
este pedido segue a disciplina dos vícios, o prazo para reclamar é o
decadencial previsto no artigo 26 do CDC. Conforme o enunciado o
consumidor reclamou no prazo e jamais recebeu uma resposta negativa
transmitida de forma inequívoca (art. 26, §2º, I), o que impede o recomeço da
contagem do prazo decadencial para o ajuizamento da ação. Assim, não há o
que se falar em prazo de decadência.
Ainda sobre prazos prescricionais, importa observar alguns
entendimentos jurisprudenciais consolidados:
Em 2017 o STJ decidiu que o artigo 206, § 1º, II, do Código Civil,
segundo o qual prescreve em um ano a pretensão do segurado contra o
segurador, dirige-se à pretensão resultante de inadimplemento contratual,
envolvendo a cobertura securitária em si. No caso em que a pretensão decorre
de prestação de serviço defeituosa, incide o prazo prescricional estabelecido
no artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor (no caso, pedido de dano
moral). (AgInt no REsp 1192274 / SP
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 2010/0079400-8, julgado em
fevereiro de 2017).
Já a ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto sujeita-se
ao prazo prescricional estabelecido no Código Civil – art. 205, prazo de dez
anos. (Súmula n. 412/STJ).
Também foi fixada a tese de que “a ação de indenização por danos
morais decorrente da inscrição indevida em cadastro de inadimplentes não se
sujeita ao prazo quinquenal do art. 27 do CDC, mas ao prazo de 3 (três) anos,
conforme previsto no art. 206, § 3º, V, do CC/2002” (Jurisprudência em teses,
edição 59/2016).

39
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05
5. DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

Dispõe o artigo 28 do CDC:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da


sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de
direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação
dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será
efetivada quando houver falência, estado de insolvência,
encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má
administração.
§ 1° (Vetado).
§ 2° As sociedades integrantes dos grupos societários e as
sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas
obrigações decorrentes deste código.
§ 3° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis
pelas obrigações decorrentes deste código.
§ 4° As sociedades coligadas só responderão por culpa.
§ 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre
que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao
ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.

A primeira parte do dispositivo traduz as hipóteses tradicionais de


desconsideração: o abuso de direito, e o desvio de finalidade e a prática de ato
ilícito. Já o §5º introduziu novidade maior: um texto normativo aberto que
permite a desconsideração da pessoa jurídica sempre que sua personalidade
for obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados.
A controvérsia acerca dos pressupostos de incidência da teoria da
desconsideração da personalidade jurídica acabou por ensejar duas
subteorias: teoria maior e teoria menor da desconsideração.
A teoria maior condiciona a desconsideração à caracterização da
manipulação fraudulenta ou abusiva. Para a teoria menor, basta a prova de
insolvência da pessoa jurídica.
“A teoria menor da desconsideração foi adotada no art. 28, §5º, do
Código de Defesa do Consumidor. Esse entendimento prevaleceu, por
maioria, no Superior Tribunal de Justiça no julgamento do rumoroso caso da
explosão do Shopping Center de Osasco (REsp 279273-SP)” (CAVALIERI
FILHO, 2011, p. 364). O mesmo entendimento foi adotado pela FGV no padrão
de respostas da peça profissional do XV Exame de Ordem Unificado.

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06
6. DAS PRÁTICAS COMERCIAIS

O art. 29 do CDC determina que, para os fins do Capítulo V (das práticas


comerciais), equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis
ou não, expostas às práticas neles previstas. É importante, desta forma, não
esquecer que não é apenas o contratante que é protegido pelo CDC (vide
peça do XXI EO), o que, inclusive, é tema questionado nos exames da OAB.

SEÇÃO II

Da Oferta

Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa,


veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a
produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor
que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a
ser celebrado.

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem


assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em
língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade,
composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre
outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e
segurança dos consumidores.
Parágrafo único. As informações de que trata este artigo, nos
produtos refrigerados oferecidos ao consumidor, serão gravadas de
forma indelével. (Incluído pela Lei nº 11.989, de 2009)

Art. 32. Os fabricantes e importadores deverão assegurar a oferta de


componentes e peças de reposição enquanto não cessar a fabricação
ou importação do produto.
Parágrafo único. Cessadas a produção ou importação, a oferta
deverá ser mantida por período razoável de tempo, na forma da lei.

Art. 33. Em caso de oferta ou venda por telefone ou reembolso postal,


deve constar o nome do fabricante e endereço na embalagem,
publicidade e em todos os impressos utilizados na transação
comercial.
Parágrafo único. É proibida a publicidade de bens e serviços por
telefone, quando a chamada for onerosa ao consumidor que a
origina. (Incluído pela Lei nº 11.800, de 2008).

Art. 34. O fornecedor do produto ou serviço é solidariamente


responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes
autônomos.

Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar


cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor
poderá, alternativamente e à sua livre escolha:
I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta,
apresentação ou publicidade;
II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;

41
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III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia


eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e
danos.

O direito à informação é um direito básico do consumidor (art. 6º, III). A


Lei nº 10.962/2004 dispõe sobre a oferta e as formas de afixação de preços de
produtos e serviços para o consumidor.

Art. 2o São admitidas as seguintes formas de afixação de preços em


vendas a varejo para o consumidor:
I – no comércio em geral, por meio de etiquetas ou similares
afixados diretamente nos bens expostos à venda, e em vitrines,
mediante divulgação do preço à vista em caracteres legíveis;
II – em auto-serviços, supermercados, hipermercados,
mercearias ou estabelecimentos comerciais onde o consumidor tenha
acesso direto ao produto, sem intervenção do comerciante, mediante
a impressão ou afixação do preço do produto na embalagem, ou a
afixação de código referencial, ou ainda, com a afixação de código de
barras.
Parágrafo único. Nos casos de utilização de código referencial
ou de barras, o comerciante deverá expor, de forma clara e legível,
junto aos itens expostos, informação relativa ao preço à vista do
produto, suas características e código.
Art. 2o-A Na venda a varejo de produtos fracionados em pequenas
quantidades, o comerciante deverá informar, na etiqueta contendo o
preço ou junto aos itens expostos, além do preço do produto à vista, o
preço correspondente a uma das seguintes unidades fundamentais
de medida: capacidade, massa, volume, comprimento ou área, de
acordo com a forma habitual de comercialização de cada tipo de
produto. (Incluído pela Lei nº 13.175, de 2015)
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica à
comercialização de medicamentos.

A Lei nº 13.455/2017, que autorizou a diferenciação de preços de


bens e serviços oferecidos ao público em função do prazo ou do
instrumento de pagamento utilizado, acrescentou o art. 5º – A à Lei
10.962/2004, determinando que o fornecedor informe, em local e formato
visíveis ao consumidor, eventuais descontos oferecidos em função do prazo ou
do instrumento de pagamento utilizado.
Oferta, em termos gerais, é uma proposta de contrato que uma pessoa
faz a outra. Contudo, no Direito do Consumidor, por suas características,
abrange inclusive a publicidade.

No contrato de massa, em virtude de seu caráter coletivo, a oferta


deixa de ser individualizada e cristalina, e passa a ser feita também
através de meios massificados, como a publicidade, a exposição das
mercadorias em vitrines, em exposições, e até na rua. Quando o

42
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dono da banca de jornais e revistas expõe as suas mercadorias ao


público, está fazendo oferta. (CAVALIERI FILHO, 2011, p. 146)

Os artigos 30 e seguintes tratam do princípio da vinculação, que significa


a obrigação, do fornecedor, de cumprir o que ofertou. São dois os requisitos
para a vinculação: que a oferta efetivamente chegue ao conhecimento dos
consumidores (seja veiculada) e que seja suficientemente precisa (não se trate
de um exagero publicitário óbvio). Em regra, a oferta deve ser cumprida,
inclusive em relação ao preço. Contudo, a jurisprudência tem afastado o dever
de cumprimento em caso de evidente equívoco:

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO


ESPECIFICADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS
MATERIAIS E MORAIS. OFERTA PUBLICITÁRIA DE
COMPUTADOR COM PREÇO EQUIVOCADO, DISSOCIADO DO
REAL VALOR DE MERCADO. NEGATIVA DE VENDA. SENTENÇA
MANTIDA. A oferta publicitária cria vínculo entre consumidor e
fornecedor, fazendo surgir obrigação pré-contratual, obrigando o
anunciante ao cumprimento da oferta nos exatos termos do
anunciado. Entretanto, pode o fornecedor recusar-se a cumprir
a oferta nos casos em que se mostrar evidente o equívoco na
publicidade veiculada, pena de se admitir o enriquecimento sem
causa de uma das partes, em evidente prejuízo da outra. NEGARAM
PROVIMENTO AO APELO. (Apelação Cível Nº 70071293294,
Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Giovanni Conti, Julgado em 23/02/2017)

Especificamente em relação à publicidade, dispõe o CDC:

SEÇÃO III
Da Publicidade

Art. 36. A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o


consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal.
Parágrafo único. O fornecedor, na publicidade de seus produtos ou
serviços, manterá, em seu poder, para informação dos legítimos
interessados, os dados fáticos, técnicos e científicos que dão
sustentação à mensagem.
Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.
§ 1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou
comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou,
por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em
erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade,
quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados
sobre produtos e serviços.
§ 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de
qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a
superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência
da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de
induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa
à sua saúde ou segurança.

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§ 3° Para os efeitos deste código, a publicidade é enganosa por


omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto
ou serviço.
§ 4° (Vetado).
Art. 38. O ônus da prova da veracidade e correção da informação ou
comunicação publicitária cabe a quem as patrocina.

O caput do artigo 36 determina a necessidade de identificação da


mensagem publicitária, ou seja, o consumidor não pode “receber” publicidade
sem saber se tratar de uma. O parágrafo único traz o chamado princípio da
transparência da fundamentação. Por exemplo, se a escola anuncia que
consegue inserir a maioria dos seus alunos egressos no mercado de trabalho,
deve dispor de dados que comprovem essa informação.
Nos artigos seguintes o legislador tratou de conceituar e proibir a
publicidade enganosa e a abusiva. Publicidade enganosa é aquela capaz de
enganar o consumidor total ou parcialmente, por omissão ou comissão. É
irrelevante a intenção ou não de enganar, basta o resultado. Leva-se em conta
somente a capacidade de induzir em erro. Já a publicidade abusiva é aquela
que fere o sistema de valores da Constituição.
Importa destacar a responsabilidade solidária também na oferta e na
publicidade.

Informativo de Jurisprudência nº 0562


Período: 18 a 28 de maio de 2015
Quarta Turma
DIREITO DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE DO
FABRICANTE QUE GARANTE NA PUBLICIDADE A QUALIDADE
DOS PRODUTOS OFERTADOS.
Responde solidariamente por vício de qualidade do automóvel
adquirido o fabricante de veículos automotores que participa de
propaganda publicitária garantindo com sua marca a excelência dos
produtos ofertados por revendedor de veículos usados. O princípio da
vinculação da oferta reflete a imposição da transparência e da boa-fé
nos métodos comerciais, na publicidade e nos contratos, de forma
que esta exsurge como princípio máximo orientador, nos termos do
art. 30 do CDC. Realmente, é inequívoco o caráter vinculativo da
oferta, integrando o contrato, de modo que o fornecedor de produtos
ou serviços se responsabiliza também pelas expectativas que a
publicidade venha a despertar no consumidor, mormente quando
veicula informação de produto ou serviço com a chancela de
determinada marca. Trata-se de materialização do princípio da boa-fé
objetiva, exigindo do anunciante os deveres anexos de lealdade,
confiança, cooperação, proteção e informação, sob pena
de responsabilidade. O próprio art. 30 do CDC enfatiza
expressamente que a informação transmitida "obriga o fornecedor
que a fizer veicular ou dela se utilizar", atraindo a responsabilidade
solidária daqueles que participem, notadamente quando expõe
diretamente a sua marca no informativo publicitário. A propósito, a
jurisprudência do STJ reconhece a responsabilidade solidária de

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todos os fornecedores que venham a se beneficiar da cadeia de


fornecimento, seja pela utilização da marca, seja por fazer parte da
publicidade. Trata-se, cabe ressaltar, de caso de responsabilização
objetiva. Nesse contexto, dentro do seu poder de livremente avalizar
e oferecer diversos tipos de produtos e serviços, ao agregar o seu
"carimbo" de excelência aos veículos usados anunciados, a fabricante
acaba por atrair a solidariedade pela oferta do produto/serviço e o
ônus de fornecer a qualidade legitimamente esperada
pelo consumidor. Na verdade, a utilização de marca de renome -
utilização essa consentida, até por força legal (art. 3º, III, da Lei
6.729/1979) - gera no consumidor legítima expectativa de que o
negócio é garantido pela montadora, razão pela qual deve esta
responder por eventuais desvios próprios dos negócios jurídicos
celebrados nessa seara. REsp 1.365.609-SP, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 28/4/2015, DJe 25/5/2015.

O julgado é muito elucidativo em relação aos princípios gerais de direito


do consumidor, especialmente boa-fé objetiva, vinculação à oferta e a
solidariedade na publicidade.

SEÇÃO IV
Das Práticas Abusivas

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre


outras práticas abusivas: (Redação dada pela Lei nº 8.884, de
11.6.1994)
I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao
fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa
causa, a limites quantitativos;
II - recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata
medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de
conformidade com os usos e costumes;
III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia,
qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço;
IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo
em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para
impingir-lhe seus produtos ou serviços;
V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;
VI - executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e
autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de
práticas anteriores entre as partes;
VII - repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo
consumidor no exercício de seus direitos;
VIII - colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço
em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais
competentes ou, se normas específicas não existirem, pela
Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade
credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e
Qualidade Industrial (Conmetro);
IX - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente
a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento,
ressalvados os casos de intermediação regulados em leis
especiais; (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)
X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços. (Incluído
pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)

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XI - Dispositivo incluído pela MPV nº 1.890-67, de 22.10.1999,


transformado em inciso XIII, quando da conversão na Lei nº 9.870,
de 23.11.1999
XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação
ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo
critério.(Incluído pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)
XIII - aplicar fórmula ou índice de reajuste diverso do legal ou
contratualmente estabelecido. (Incluído pela Lei nº 9.870, de
23.11.1999)
Parágrafo único. Os serviços prestados e os produtos remetidos ou
entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III,
equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de
pagamento.

O envio de cartão de crédito sem solicitação prévia é considerado uma


prática abusiva (inciso III), conforme entendimento já sumulado pelo STJ:

Prática abusiva, segundo Antônio Benjamin, “é a desconformidade com


os padrões mercadológicos de boa conduta em relação ao consumidor”. O rol
apresentado no artigo é exemplificativo. O inciso I refere-se à venda casada,
assunto sempre muito comentado na imprensa. O inciso III, já questionado no
exame da ordem, refere-se a proibição do ato de enviar ou entregar produto ou
serviço sem solicitação prévia.

Art. 40. O fornecedor de serviço será obrigado a entregar ao


consumidor orçamento prévio discriminando o valor da mão-de-obra,
dos materiais e equipamentos a serem empregados, as condições de
pagamento, bem como as datas de início e término dos serviços.
§ 1º Salvo estipulação em contrário, o valor orçado terá validade pelo
prazo de dez dias, contado de seu recebimento pelo consumidor.
§ 2° Uma vez aprovado pelo consumidor, o orçamento obriga os
contraentes e somente pode ser alterado mediante livre
negociação das partes.
§ 3° O consumidor não responde por quaisquer ônus ou acréscimos
decorrentes da contratação de serviços de terceiros não previstos no
orçamento prévio.

O art. 40 trata da obrigatoriedade do fornecimento de orçamento e da


aplicação do princípio da vinculação ao mesmo. Abaixo, questão do Exame de
Ordem sobre o orçamento.

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A empresa Cristal Ltda., atendendo à solicitação da cliente Ruth,


realizou orçamento para prestação de serviço, discriminando material,
equipamentos, mão de obra, condições de pagamento e datas para
início e término do serviço de instalação de oito janelas e quatro
portas em alumínio na residência da consumidora. Com base no
narrado acima, é correto afirmar que
a) o orçamento terá validade de trinta dias, independentemente da
data do recebimento e aprovação pela consumidora Ruth.
b) Ruth não responderá por eventuais acréscimos não previstos
no orçamento prévio, exceto se decorrente da contratação de serviço
de terceiro.
c) o valor orçado terá validade de dez dias, contados do
recebimento pela consumidora; aprovado, obriga os contraentes,
que poderão alterá-lo mediante livre negociação.
d) uma vez aprovado, o orçamento obriga os contraentes e não
poderá alterado ou negociado pelas partes, que, buscando mudar os
termos, deverão fazer novo orçamento.

A seção V do CDC trata da cobrança de dívida. O caput do art. 42 trata


do dever de respeito ao consumidor e da preservação de sua dignidade, e o
parágrafo único da repetição do indébito em dobro.

SEÇÃO V
Da Cobrança de Dívidas

Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será


exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de
constrangimento ou ameaça.
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem
direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que
pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros
legais, salvo hipótese de engano justificável.

Art. 42-A. Em todos os documentos de cobrança de débitos


apresentados ao consumidor, deverão constar o nome, o endereço e
o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas – CPF ou no
Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ do fornecedor do
produto ou serviço correspondente. (Incluído pela Lei nº 12.039, de
2009)

O CDC não proíbe o ato de cobrar, apenas os abusos empreendidos


nesta prática. O parágrafo único trata da repetição do indébito, ou seja, o
consumidor cobrado em quantia indevida terá direito à restituição em dobro.
São, portanto, requisitos desta penalidade 1) a cobrança de dívida; e 2)
extrajudicial de consumo. Até pouco tempo jurisprudência e doutrina
concordavam que a expressão “salvo engano justificável” significava o dever,
pelo fornecedor, de provar uma causa justa para o engano. Cobrança indevida
decorrente de dolo ou mesmo culpa (negligência ou imprudência) não afastava
o dever de restituir em dobro (Informativo de Jurisprudência 0389 de 2009).

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Neste sentido é o entendimento doutrinário majoritário. Ocorre que a


orientação jurisprudencial do STJ se modificou, tornando-se comum o
entendimento pela necessidade de comprovação de má-fé.

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DE QUANTIA PAGA
INDEVIDAMENTE. EXIGÊNCIA DE CARACTERIZAÇÃO DE MÁ-
FÉ. MATÉRIA PROBATÓRIA. SÚMULA 7 DO STJ. SÚMULA 83 DO
STJ.
1. Inviável a repetição em dobro do indébito sem prova
inequívoca da má-fé do credor, que não pode ser presumida.
2. A verificação da ocorrência de má-fé, a justificar a devolução em
dobro dos valores pagos, demanda o reexame da matéria
fático-probatória. Incidência da Súmula 7 do STJ.
3. A Corte estadual julgou nos moldes da jurisprudência pacífica
desta Corte. Incidente, portanto, o enunciado 83 da Súmula do STJ.
4. Agravo interno a que se nega provimento.
Julgado em outubro de 2016.

Assim, tem-se a seguinte situação:


É obrigatória a restituição em dobro da cobrança indevida de tarifa de
água, esgoto, energia ou telefonia, salvo na hipótese de erro justificável (art.
42, parágrafo único, do CDC), que não decorra da existência de dolo, culpa ou
má-fé (edição nº 74 do Jurisprudência em Tese). Ou seja, mesmo a cobrança
indevida culposa (negligência ou imprudência) acarreta a restituição em dobro
em caso de cobrança indevida desses serviços.
Nos demais casos, em especial contratos financeiros, securitários e
educacionais, é comum o STJ julgar da seguinte forma: “Decisão em
consonância com a atual jurisprudência desta Corte
quanto ao tema da impossibilidade da restituição em dobro, nos
termos do art. 42 do CDC, se não for comprovada a má-fé do
fornecedor" (REsp 1595018 / RJ, agosto de 2016).
Ainda em relação ao Capítulo V, das práticas comerciais, tema relevante
é o dos bancos de dados e cadastros de consumidores.

SEÇÃO VI
Dos Bancos de Dados e Cadastros de Consumidores

Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá


acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e
dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre
as suas respectivas fontes.

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§ 1° Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos,


claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não
podendo conter informações negativas referentes a período superior
a cinco anos.
§ 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de
consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando
não solicitada por ele.
§ 3° O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados
e cadastros, poderá exigir sua imediata correção, devendo o
arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a alteração aos
eventuais destinatários das informações incorretas.
§ 4° Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os
serviços de proteção ao crédito e congêneres são considerados
entidades de caráter público.
§ 5° Consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do
consumidor, não serão fornecidas, pelos respectivos Sistemas de
Proteção ao Crédito, quaisquer informações que possam impedir ou
dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores.
§ 6° (Vide Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)

Art. 44. Os órgãos públicos de defesa do consumidor manterão


cadastros atualizados de reclamações fundamentadas contra
fornecedores de produtos e serviços, devendo divulgá-lo pública e
anualmente. A divulgação indicará se a reclamação foi atendida ou
não pelo fornecedor.
§ 1° É facultado o acesso às informações lá constantes para
orientação e consulta por qualquer interessado.
§ 2° Aplicam-se a este artigo, no que couber, as mesmas regras
enunciadas no artigo anterior e as do parágrafo único do art. 22 deste
código.
Art. 45. (Vetado).

O art. 43 trata dos bancos de dados e cadastros dos consumidores. Ao


discipliná-los o legislador reconheceu sua licitude, desde que criados e
mantidos conforme as regras estipuladas na lei.
Embora permitida a existência de arquivos de consumo, vez que úteis
para a dinamicidade da economia, beneficiando o fornecedor e o
próprio consumidor, há evidente preocupação da lei em impor limites
e regras, considerando a ameaça que os arquivos de consumo
representam à privacidade e honra das pessoas. (BENJAMIN,
MARQUES e BESSA, 2014, p. 325)

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Sobre a recente súmula 550, é importante relembrar que a Lei


12.414/2011 que disciplina o chamado “cadastro positivo” foi regulamentada
pelo Decreto 7.829/2012. Esta Lei foi usada como fundamento da decisão no
Recurso Especial nº REsp 1419697 / RS que é representativo da controvérsia
do sistema "CREDIT SCORING". Assim decidiu o STJ:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA


(ART. 543-C DO CPC).
TEMA 710/STJ. DIREITO DO CONSUMIDOR. ARQUIVOS DE
CRÉDITO. SISTEMA
"CREDIT SCORING". COMPATIBILIDADE COM O DIREITO
BRASILEIRO. LIMITES.
DANO MORAL. I - TESES:
1) O sistema "credit scoring" é um método desenvolvido para
avaliação do risco de concessão de crédito, a partir de modelos
estatísticos, considerando diversas variáveis, com atribuição de uma
pontuação ao consumidor avaliado (nota do risco de crédito).
2) Essa prática comercial é lícita, estando autorizada pelo art. 5º, IV, e
pelo art. 7º, I, da Lei n. 12.414/2011 (lei do cadastro positivo).
3) Na avaliação do risco de crédito, devem ser respeitados os limites
estabelecidos pelo sistema de proteção do consumidor no sentido da

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tutela da privacidade e da máxima transparência nas relações


negociais, conforme previsão do CDC e da Lei n.
12.414/2011.
4) Apesar de desnecessário o consentimento do consumidor
consultado, devem ser a ele fornecidos esclarecimentos, caso
solicitados, acerca das fontes dos dados considerados (histórico de
crédito), bem como as informações pessoais valoradas.
5) O desrespeito aos limites legais na utilização do sistema "credit
scoring", configurando abuso no exercício desse direito (art. 187 do
CC), pode ensejar a responsabilidade objetiva e solidária do
fornecedor do serviço, do responsável pelo banco de dados, da fonte
e do consulente (art. 16 da Lei n. 12.414/2011) pela ocorrência de
danos morais nas hipóteses de utilização de informações excessivas
ou sensíveis (art. 3º, § 3º, I e II, da Lei n. 12.414/2011), bem como
nos casos de comprovada recusa indevida de crédito pelo uso de
dados incorretos ou desatualizados.

Embora a súmula não mencione, é importante atentar para o item 5 da


ementa: o abuso do direito sumulado pode ensejar a responsabilidade objetiva
e solidária do fornecedor dos serviços e do responsável pelo banco de dados.
A edição nº 59/2016 do Jurisprudência em Teses fixou o entendimento
de que “não existindo anotação irregular nos órgãos de proteção ao crédito, a
mera cobrança indevida de serviços ao consumidor não gera danos morais
presumidos”. Também foi fixada a tese de que “a ação de indenização por
danos morais decorrente da inscrição indevida em cadastro de inadimplentes
não se sujeita ao prazo quinquenal do art. 27 do CDC, mas ao prazo de 3 (três)
anos, conforme previsto no art. 206, § 3º, V, do CC/2002” (59/2016).

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07
7. DA PROTEÇÃO CONTRATUAL

Importa compreender que a proteção contratual do consumidor começa


na fase pré-contratual, com a oferta, conforme exposto anteriormente. Já a fase
contratual necessita de maior proteção em razão da preponderante contratação
por adesão.
SEÇÃO I
Disposições Gerais

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não


obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de
tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos
instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de
seu sentido e alcance.

Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais


favorável ao consumidor.

Art. 48. As declarações de vontade constantes de escritos


particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações de consumo
vinculam o fornecedor, ensejando inclusive execução específica, nos
termos do art. 84 e parágrafos.

A primeira disposição, do art. 46, confirma os princípios da informação e


da transparência. Dar conhecimento, segundo a melhor doutrina, não é
apenas oportunizar a leitura, mas proporcionar compreensão. Sem dar o
conhecimento o contrato se torna ineficaz. Mesmo oportunizando a
compreensão, se as cláusulas ainda necessitarem de interpretação,
especialmente em razão de alguma ambiguidade, essa deverá se dar da
maneira mais favorável ao consumidor (art. 47). Por fim, ressalva o legislador
que todas as espécies de documentos relativos às relações de consumo
vinculam (obrigam) o fornecedor.

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a


contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou
serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e
serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente
por telefone ou a domicílio.
Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de
arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente
pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão
devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.

Um dos instrumentos de proteção mais utilizados na atualidade é o


direito de arrependimento. Importante não esquecer que ele se refere às

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compras feitas fora do estabelecimento comercial (a domicílio, pela TV,


internet...). A principal razão do direito de arrependimento é proporcionar ao
consumidor um prazo de reflexão, no qual possa desistir do contrato,
independentemente de qualquer justificativa. Segue questão do exame de
ordem sobre o direito de arrependimento:

Quando a contratação ocorre por site da internet, o consumidor pode


desistir da compra?
a) Sim. Quando a compra é feita pela internet, o consumidor pode
desistir da compra em até 30 dias depois que recebe o produto.
b) Não. Quando a compra é feita pela internet, o consumidor é
obrigado a ficar com o produto, a menos que ele apresente vício. Só
nessa hipótese o consumidor pode desistir.
c) Não. O direito de arrependimento só existe para as compras
feitas na própria loja, e não pela internet.
d) Sim. Quando a compra é feita fora do estabelecimento
comercial, o consumidor pode desistir do contrato no prazo de
sete dias, mesmo sem apresentar seus motivos para a
desistência.

O art. 50 trata da garantia contratual.

Art. 50. A garantia contratual é complementar à legal e será conferida


mediante termo escrito.
Parágrafo único. O termo de garantia ou equivalente deve ser
padronizado e esclarecer, de maneira adequada em que consiste a
mesma garantia, bem como a forma, o prazo e o lugar em que pode
ser exercitada e os ônus a cargo do consumidor, devendo ser-lhe
entregue, devidamente preenchido pelo fornecedor, no ato do
fornecimento, acompanhado de manual de instrução, de instalação e
uso do produto em linguagem didática, com ilustrações.

Conforme o art. 26 do CDC, nos casos de vícios dos produtos ou


serviços, o prazo para o consumidor reclamar é decadencial, de 30 dias para
produtos não duráveis e de 90 dias para produtos duráveis. O art. 50 determina
que o prazo da garantia contratual (aquela oferecida pelo fornecedor por
liberalidade) é complementar ao prazo da garantia legal. Como a garantia legal
(art. 24) não possui prazo estipulado em lei, convencionou-se pela utilização do
prazo decadencial (para reclamar) como prazo de garantia legal. “De acordo
com esse entendimento, o prazo da garantia convencional começa a correr a
partir da entrega do produto ou da prestação do serviço, enquanto o prazo
decadencial (30 ou 90 dias) tem por termo inicial o dia seguinte do último dia da

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garantia convencional” (CAVALIERI FILHO, 2011, p. 163). No mesmo sentido


decisão constante no Informativo de Jurisprudência do STJ nº 506/2012.

SEÇÃO II
Das Cláusulas Abusivas

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas


contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do
fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços
ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de
consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a
indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;
II - subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já
paga, nos casos previstos neste código;
III - transfiram responsabilidades a terceiros;
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que
coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
V - (Vetado);
VI - estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do
consumidor;
VII - determinem a utilização compulsória de arbitragem;
VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio
jurídico pelo consumidor;
IX - deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato,
embora obrigando o consumidor;
X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do
preço de maneira unilateral;
XI - autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente,
sem que igual direito seja conferido ao consumidor;
XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua
obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o
fornecedor;
XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo
ou a qualidade do contrato, após sua celebração;
XIV - infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais;
XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao
consumidor;
XVI - possibilitem a renúncia do direito de indenização por
benfeitorias necessárias.
§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que
pertence;
II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza
do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio
contratual;
III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor,
considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das
partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.
§ 2° A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o
contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de
integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes.
§ 3° (Vetado).
§ 4° É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente
requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser
declarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto

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neste código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio


entre direitos e obrigações das partes.

As denominadas cláusulas abusivas, segundo o CDC, são nulas de


pleno direito. “O controle das cláusulas abusivas e decretação da sua nulidade
é competência tipicamente judicial” (MIRAGEM, 2012, p. 295). O rol
apresentado no artigo é exemplificativo. Questão do IX Exame da Ordem
versou sobre as abusividades previstas nos incisos I, VI, VII e VIII, com
transcrição literal dos incisos (negativa ou afirmativamente).

O exame destas cláusulas em espécie observa tanto a desproporção


de direitos e deveres entre as partes, a violação do equilíbrio entre as
prestações do contrato, quanto aquelas que diminuam ou exonerem a
responsabilidade do fornecedor, dentre outras. Da mesma forma, o
art. 51, IV, do CDC determina, como cláusula abusiva, as que
“estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que
coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”. Trata-se de cláusula de
abertura do sistema de reconhecimento das cláusulas abusivas no
CDC, a partir da qual se dá o desenvolvimento jurisprudencial em
relação à violação dos deveres decorrentes dos princípios da boa-fé,
do equilíbrio ou da equidade. (MIRAGEM, 2012, p. 296).

Destaca-se, assim, o inciso IV, do art. 51, que determina abusiva a


cláusula que cria um desequilíbrio e o inciso XV, que refere aquelas que
estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor, como
cláusulas abertas que devem ser interpretadas em conformidade com os
princípios e regras do Direito do Consumidor. Já em relação ao art. 51, I, veja
a seguinte questão do Exame de Ordem:

Martins celebrou negócio jurídico com a empresa Zoop Z para o


fornecimento de dez volumes de determinada mercadoria para
entretenimento infantil. No contrato restava estabelecido que Martins
vistoriara toda mercadoria antes da aquisição e que o consumidor
retiraria os produtos no depósito da empresa. Considerando tal
situação fictícia, assinale a alternativa correta à luz do disposto na Lei
nº. 8.078/90, de acordo com cada hipótese abaixo apresentada:
A) A garantia legal do produto independe de termo expresso no
contrato, bem como é lícito ao fornecedor estipular que se exime de
responsabilidade na hipótese de vício de qualidade por inadequação
do produto, desde que fundada em ignorância sobre o vício.
B) É nula de pleno direito a cláusula contratual que exonere a
contratada de qualquer obrigação de indenizar por vício do
produto em razão de ter sido a mercadoria vistoriada
previamente pelo consumidor.
C) O contrato poderia prever a impossibilidade de reembolso da
quantia por Martins, bem como ter transferido previamente a

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responsabilidade por eventual vício do produto, com exclusividade, ao


fabricante.
D) A Zoop Z tem liberdade para estabelecer compulsoriamente a
utilização de arbitragem, bem como exigir o ressarcimento dos custos
de cobrança da obrigação de Martins, sem que o mesmo seja
conferido contra o fornecedor.

O STJ fixou tese (Informativo de Jurisprudência 608/2017) de que “A


cobrança da multa de fidelidade pela prestadora de serviço de TV a cabo deve
ser proporcional ao tempo faltante para o término da relação de fidelização”.
Considerou que é “abusiva a prática comercial adotada por prestadora do
serviço de TV a cabo que cobra a multa de fidelidade integral
dos consumidores, independentemente do tempo faltante para o término da
relação de fidelização. Isso porque essa prática coloca o fornecedor em
vantagem exagerada, caracterizando conduta iníqua, incompatível com a
equidade, consoante disposto no § 1º e inciso IV do artigo 51 do CDC”.
Em relação ao inciso XI do art. 51, a seguinte questão:

João celebrou contrato de seguro de vida e invalidez, aderindo a


plano oferecido por conhecida rede particular. O contrato de adesão,
válido por cinco anos, prevê a possibilidade de cancelamento, em
favor da seguradora, antes de ocorrer o sinistro, por alegação de
desequilíbrio econômico‐financeiro. A esse respeito, assinale a
afirmativa correta.
A) Os contratos de seguro ofertados no mercado de consumo, apesar
de serem de adesão, são regidos pelo Código Civil, e a eles se aplica
o Código de Defesa do Consumidor apenas subsidiariamente e em
casos estritos.
B) A cláusula prevista, que estipula a possibilidade de cancelamento
unilateral do contrato em caso de desequilíbrio econômico, seria
viável desde que exercida na primeira metade do contrato.
C) O Ministério Público tem legitimidade para ajuizar demanda
contra a seguradora, buscando ser declarada a nulidade da
cláusula contratual celebrada com os consumidores, e que seja
proibido à seguradora continuar a ofertá‐la no mercado de
consumo.
D) A cláusula prevista no contrato celebrado por João não é abusiva,
pois o seguro deve atentar para a equação financeira atuarial,
necessária ao equilíbrio econômico da avença e à própria higidez e
continuidade do contrato.

Em relação ao inciso XII, o STJ firmou tese, conforme Informativo de


Jurisprudência 611/2017. Ao julgar o REsp 1.361.699-MG os ministros
decidiram que “não há abusividade na cláusula contratual que estabeleça o
repasse dos custos administrativos da instituição financeira com as ligações
telefônicas dirigidas ao consumidor inadimplente”.

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O artigo 52 trata dos contratos de outorga de crédito ou financiamento e


o art. 53 trata da compra e venda de móveis e imóveis em prestações.

Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga


de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o
fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e
adequadamente sobre:
I - preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional;
II - montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros;
III - acréscimos legalmente previstos;
IV - número e periodicidade das prestações;
V - soma total a pagar, com e sem financiamento.
§ 1° As multas de mora decorrentes do inadimplemento de
obrigações no seu termo não poderão ser superiores a dois por cento
do valor da prestação.(Redação dada pela Lei nº 9.298, de 1º.8.1996)
§ 2º É assegurado ao consumidor a liquidação antecipada do débito,
total ou parcialmente, mediante redução proporcional dos juros e
demais acréscimos.
§ 3º (Vetado).

Art. 53. Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis


mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações
fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as
cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em
benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a
resolução do contrato e a retomada do produto alienado.
§ 1° (Vetado).
§ 2º Nos contratos do sistema de consórcio de produtos duráveis, a
compensação ou a restituição das parcelas quitadas, na forma deste
artigo, terá descontada, além da vantagem econômica auferida com a
fruição, os prejuízos que o desistente ou inadimplente causar ao
grupo.
§ 3° Os contratos de que trata o caput deste artigo serão expressos
em moeda corrente nacional.

O caput do art. 52 detalha as informações mínimas que devem ser


apresentadas ao consumidor: a) preço do produto ou serviço em moeda
corrente nacional; b) montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de
juros; c) acréscimos legalmente previstos; d) número e periodicidade das
prestações; e) soma total a pagar com e sem financiamento. O art. 53
apresenta mais uma cláusula abusiva: aquela de perdimento total das
prestações pagas em favor do credor.

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Ainda sobre os contratos de compra e venda de imóveis, importa atentar


para a súmula 543 do STJ, que dispõe:

O CDC também disciplina de forma mais detalhada os contratos de


adesão:
SEÇÃO III
Dos Contratos de Adesão

Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido


aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas
unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o
consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu
conteúdo.
§ 1° A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de
adesão do contrato.
§ 2° Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde
que a alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se
o disposto no § 2° do artigo anterior.
§ 3o Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos
claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte
não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão
pelo consumidor.(Redação dada pela nº 11.785, de 2008)
§ 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor
deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil
compreensão.
§ 5° (Vetado)

A inserção de cláusula em formulário de contrato (pré-elaborado) não


desconfigura sua natureza de adesão. Não podem ser redigidos com fonte em
tamanho inferior ao corpo 12.

7.1 Dos contratos submetidos à disciplina do CDC : alguns


exemplos.

7.1.1 Contratos bancários


O CDC inclui expressamente a atividade bancária no coneito de
“serviços” (art. 3º, §2º). Não obstante, a confederação Nacional do Sistema
Financeiro impetrou junto ao Supremo tribunal Federal, em dezembro de 2001,

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a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.591. Tal ação buscava que alguns


contratos bancários não fossem considerados relações de consumo. O
resultado final foi de dez votos a um pela improcedência da ação. Em setembro
de 2004 o superior Tribunal de Justiça publicou a Súmula 297, segundo a qual
o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.
Alguns entendimentos do STJ em relação aos contratos bancários e a
aplicação do CDC.

Na avaliação do risco de crédito, devem ser respeitados os limites


estabelecidos pelo sistema de proteção do consumidor no sentido da
tutela da privacidade e da máxima transparência nas relações
negociais, conforme previsão do CDC e da Lei n. 12.414/2011. (Tese
julgada sob o rito do art. 543-C do CPC TEMA 710)

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A súmula 321 do STJ determinava a aplicação do CDC aos contratos


entre entidades de previdência privada e seus participantes. A Segunda
Seção, na sessão de 24/02/2016, ao apreciar o Projeto de Súmula nº 627 e o
julgado no REsp 1.536.736/MG, determinou o CANCELAMENTO da Súmula
321 do STJ (DJe 29/02/2016).

7.1.2 Arrendamento mercantil (leasing)


Tecnicamente o contrato de arrendamento é aquele pelo qual uma
pessoa arrenda a outra, por tempo determinado, um bem comprado pela
primeira, cabendo ao arrendatário a opção de adquirir o bem arrendado findo o
contrato, mediante o pagamento de um valor residual. Atualmente o leasing
financeiro “trata-se de verdadeira operação de financiamento, com o propósito
de assegurar ao arrendatário o uso imediato do bem móvel ou imóvel”
(CAVALIERI, 2011).

No recurso representativo da controvérsia (REsp 1.099.212 – RJ), assim


se manifestou o Relator:

Ocorre que, em caso de inadimplência do arrendatário, poderá o


arrendante, na qualidade de proprietário do bem locado, ajuizar ação
de reintegração de posse, retomando a posse direta do bem
arrendado e resolvendo o leasing . Nesse caso, questiona-se: o valor
residual garantido - VRG, pago antecipadamente e que seria utilizado
caso o arrendatário opta-se pela compra do bem arrendado, deve ser
devolvido ao arrendatário ou retido pelo arrendante?
[...]
Enfim, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está
pacificada no sentido de que retomada a posse direita do bem pela

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arrendante, por meio da ação de reintegração de posse, extingue-se


a possibilidade de o arrendatário adquirir o bem, devendo ser-lhe
devolvido o valor residual pago antecipadamente. Negar-se essa
possibilidade ao arrendatário acarretaria, inclusive, enriquecimento
ilícito da arrendante.

7.1.3 Seguro de saúde (planos de saúde)


A aplicação do CDC às atividades securitárias também está prevista
expressamente no art. 3º. Os planos de saúde privados não são operados
apenas por companhias seguradoras, mas também por empresas de medicina
de grupo e por cooperativas de serviços médicos. Observe as seguintes
súmulas sobre os planos de saúde:

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No V Exame Unificado, a peça processual versou sobre plano de saúde


contratado por pessoa idosa e posterior negativa de tratamento domiciliar
(home care). O STJ, no Informativo de Jurisprudência 0564/2015, fez constar a
seguinte ementa:
No caso em que o serviço de home care (tratamento domiciliar)
não constar expressamente do rol de coberturas previsto no
contrato de plano de saúde, a operadora ainda assim é obrigada
a custeá-lo em substituição à internação hospitalar
contratualmente prevista, desde que observados certos
requisitos como a indicação do médico assistente, a
concordância do paciente e a não afetação do equilíbrio
contratual, como nas hipóteses em que o custo do atendimento
domiciliar por dia supera a despesa diária em hospital. Isso
porque o serviço de home care constitui desdobramento do
tratamento hospitalar contratualmente previsto, serviço este que, a
propósito, não pode sequer ser limitado pela operadora do plano de
saúde, conforme a Súmula 302 do STJ ("É abusiva a cláusula
contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação
hospitalar do segurado"). Além do mais, nota-se que os contratos de
planos de saúde, além de constituírem negócios jurídicos de
consumo, estabelecem a sua regulamentação mediante cláusulas
contratuais gerais, ocorrendo a sua aceitação por simples adesão
pelo segurado. Por consequência, a interpretação dessas cláusulas
contratuais segue as regras especiais de interpretação dos contratos
de adesão ou dos negócios jurídicos estandardizados, como aquela
segundo a qual havendo dúvidas, imprecisões ou ambiguidades no
conteúdo de um negócio jurídico, deve-se interpretar as suas
cláusulas do modo mais favorável ao aderente. Nesse sentido, ainda
que o serviço de home care não conste expressamente no rol de
coberturas previstas no contrato do plano de saúde, havendo dúvida
acerca das estipulações contratuais, deve preponderar a
interpretação mais favorável ao consumidor, como aderente de um
contrato de adesão, conforme, aliás, determinam o art. 47 do CDC
("As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais
favorável ao consumidor"), a doutrina e a jurisprudência do STJ em
casos análogos ao aqui analisado. REsp 1.378.707-RJ, Rel. Min.
Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/5/2015, DJe
15/6/2015.

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8. DA DEFESA DO CONSUMIDOR EM JUÍZO

O Código de Defesa do Consumidor estabelece algumas garantias


processuais ao consumidor em seu Título III - “Da defesa do consumidor em
juízo” – dividindo-o em ações individuais e ações coletivas. Sob o título “das
ações de responsabilidade do fornecedor de produtos e serviços” disciplinou
aspectos relativos às ações individuais.
Ao tratar das ações coletivas o CDC introduziu modificações na Lei da
Ação Civil Pública (7.347/1985). O artigo 81 conceituou os interesses coletivos
dividindo-os em dois grupos: transindividuais (difusos e coletivos) e individuais
homogêneos. O traço distintivo da primeira espécie é justamente a
transindividualidade (impossibilidade de divisão entre seus titulares). “Já nos
direitos individuais homogêneos, a titularidade do direito é individual, podendo
ser mensurada e aproveitada de modo distinto por cada um dos seus titulares”
(MIRAGEM, 2012).
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste
código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam
titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos
deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja
titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com
a parte contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos
os decorrentes de origem comum.

O novo Código de Processo Civil trata, no art. 139, inciso X, da chamada


“comunicação aos legitimados coletivos”

Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste


Código, incumbindo-lhe:
X - quando se deparar com diversas demandas individuais repetitivas,
oficiar o Ministério Público, a Defensoria Pública e, na medida do
possível, outros legitimados a que se referem o art. 5o da Lei
no 7.347, de 24 de julho de 1985, e o art. 82 da Lei no 8.078, de 11 de
setembro de 1990, para, se for o caso, promover a propositura da
ação coletiva respectiva.

Em relação às ações individuais, o CDC, além de disciplinar questões


alusivas à responsabilização civil, permitiu outras medidas capazes de garantir
a efetiva proteção do consumidor.

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Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este
código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de
propiciar sua adequada e efetiva tutela.
Parágrafo único. (Vetado).
Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da
obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica
da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado
prático equivalente ao do adimplemento.
§ 1° A conversão da obrigação em perdas e danos somente será
admissível se por elas optar o autor ou se impossível a tutela
específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.
§ 2° A indenização por perdas e danos se fará sem prejuízo da
multa.
§ 3° Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo
justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz
conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o
réu.
§ 4° O juiz poderá, na hipótese do § 3° ou na sentença, impor
multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for
suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável
para o cumprimento do preceito.
§ 5° Para a tutela específica ou para a obtenção do resultado
prático equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias,
tais como busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas,
desfazimento de obra, impedimento de atividade nociva, além de
requisição de força policial.

O CDC veda expressamente à denunciação da lide na hipótese do artigo


13, parágrafo único. Contudo, o STJ pacificou o entendimento de que não cabe
denunciação da lide em nenhuma hipótese de fato do produto ou serviço
(artigos 12 e 14).
Art. 88. Na hipótese do art. 13, parágrafo único deste código, a ação
de regresso poderá ser ajuizada em processo autônomo, facultada a
possibilidade de prosseguir-se nos mesmos autos, vedada a
denunciação da lide.

O entendimento do STJ em relação ao artigo 88 é de que a denunciação


da lide é vedada em todas as circunstâncias de fato do produto ou serviço:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE DE CONSUMO. EXPLOSÃO DE
BUEIRO. CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO. DENUNCIAÇÃO
DA LIDE. NÃO CABIMENTO. HIPÓTESE NÃO RESTRITA À
RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO. ACIDENTE DE
CONSUMO. ARTS. 12 E 14 DO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR.
1. Ainda que não tenham participado diretamente da relação de
consumo, as vítimas de evento danoso dela decorrente sujeitam-se à
proteção do Código de Defesa do Consumidor.
2. A vedação à denunciação da lide prevista no art. 88 do Código
de Defesa do Consumidor não se restringe à responsabilidade

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do comerciante por fato do produto (art. 13 do CDC), sendo


também aplicável nas demais hipóteses e responsabilidade civil
por acidentes de consumo (arts. 12 e 14 do CDC).
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 589798 / RJ, 20/09/2016)

Outro tema recorrente na segunda fase do exame de ordem é sobre o


juízo competente para o ajuizamento da ação. Estabelece o art. 101 que a
ação pode ser proposta no domicílio do autor.

CAPÍTULO III
Das Ações de Responsabilidade do Fornecedor de Produtos e
Serviços

Art. 101. Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos


e serviços, sem prejuízo do disposto nos Capítulos I e II deste título,
serão observadas as seguintes normas:
I - a ação pode ser proposta no domicílio do autor;
II - o réu que houver contratado seguro de responsabilidade poderá
chamar ao processo o segurador, vedada a integração do
contraditório pelo Instituto de Resseguros do Brasil. Nesta hipótese, a
sentença que julgar procedente o pedido condenará o réu nos termos
do art. 80 do Código de Processo Civil. Se o réu houver sido
declarado falido, o síndico será intimado a informar a existência de
seguro de responsabilidade, facultando-se, em caso afirmativo, o
ajuizamento de ação de indenização diretamente contra o segurador,
vedada a denunciação da lide ao Instituto de Resseguros do Brasil e
dispensado o litisconsórcio obrigatório com este.

Art. 102. Os legitimados a agir na forma deste código poderão propor


ação visando compelir o Poder Público competente a proibir, em todo
o território nacional, a produção, divulgação distribuição ou venda, ou
a determinar a alteração na composição, estrutura, fórmula ou
acondicionamento de produto, cujo uso ou consumo regular se revele
nocivo ou perigoso à saúde pública e à incolumidade pessoal.

A primeira e mais importante garantia foi permitir ao consumidor o


ajuizamento da ação no foro do seu domicílio. Em razão disso, consagrou-se
o entendimento jurisprudencial da não admissão do foro de eleição,
quando este, de alguma forma, dificulte o acesso à justiça do
consumidor.

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9. A TUTELA PROVISÓRIA NAS RELAÇÕES DE CONSUMO

O novo CPC transformou a antiga tutela antecipada e o processo


cautelar autônomo na tutela provisória contemplada nos artigos 294 a 311.
Segundo Elpídio Donizetti (2017, p. 417), “dá-se o nome de tutela provisória ao
provimento jurisdicional que visa adiantar os efeitos da decisão final no
processo ou assegurar o seu resultado prático”.

A tutela provisória (cautelar ou antecipada) exige dois requisitos:


probabilidade do direito substancial (o chamado fumus boni iuris) e o
perigo de dano ou o risco do resultado substancial (periculum in
mora). A soma desses dois requisitos deve ser igual a 100% de forma
que um compensa o outro. [...]
A tutela provisória pode ser concedida com base na urgência,
somada à probabilidade do direito substancial, ou somente com base
na evidência. Na tutela denominada da evidência (as hipóteses estão
contempladas no art. 311), a probabilidade do direito é de tal ordem
que dispensa o perigo de dano ou risco de resultado útil do processo
– dispensa a urgência.” (Donizetti, 2017, p. 450)

O juiz Rafael Calmon Rangel, em artigo publicado na Revista de Direito


do Consumidor 107 (2016) aborda a utilização da tutela antecipada
antecedente às demandas de consumo. Defende o autor que situações
comuns nas relações de consumo, como em caso de negativa de fornecimento
de serviços e produtos urgentes pelos planos de saúde; negativa de matrícula
ou do fornecimento de algum documento escolar, restabelecimento do
fornecimento de energia elétrica ou de água; negativação indevida de
cadastros de inadimplentes, entre outras, poderiam ser resolvidas e
estabilizadas em conformidade com o disposto nos artigos 303 e 304 do Novo
Código de Processo Civil.
Segundo o autor, “a simplicidade de peticionamento por parte do autor-
consumidor, a estabilização dos efeitos da tutela, a inversão do ônus pela
instauração do contraditório e a transferência do custo financeiro pela
continuidade da demanda ao réu-fornecedor são circunstâncias que
possivelmente facilitarão a defesa dos direitos de um sem número de
consumidores, prestigiando a regra contida no art. 6.º, VIII, do CDC”.
A tutela provisória antecipada antecedente caracteriza-se pela
possibilidade de ser buscada em petição inicial incompleta (que será
complementada posteriormente). Portanto, deve ser utilizada nos caso em

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que, em razão da urgência, não foi possível juntar todos os documentos e


elementos necessários para uma petição completa. Já nos casos onde o
enunciado da questão deixa claro que o autor já está de posse de todas as
provas, deverá ser formulado pedido de tutela provisória antecipada incidental
(preferencialmente juntamente na petição inicial).
Vejam a questão do exame XXII:

ENUNCIADO:
Danilo ajuizou ação cominatória com pedido de reparação por danos
morais contra a financeira Boa Vida S/A, alegando ter sofrido dano
extrapatrimonial em virtude da negativação equivocada de seu nome nos
bancos de dados de proteção ao crédito. Danilo sustenta e comprova que
nunca atrasou uma parcela sequer do financiamento do seu veículo, motivo
pelo qual a negativação de seu nome causou-lhe dano moral indenizável,
requerendo, liminarmente, a retirada de seu nome dos bancos de dados e a
condenação da ré à indenização por danos morais no valor de R$5.000,00.
O juiz concedeu tutela provisória com relação à obrigação de fazer,
apesar de reconhecer que não foi vislumbrado perigo de dano ou risco ao
resultado útil do processo; contudo, verificou que a petição inicial foi instruída
com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, não
havendo oposição do réu capaz de gerar dúvida razoável.
Em sentença, o juiz julgou parcialmente procedentes os pedidos,
condenando a ré à obrigação de retirar o nome do autor dos bancos de dados
de proteção ao crédito, confirmando a tutela provisória, mas julgando
improcedente o pedido de indenização, pois se constatou que o autor já estava
com o nome negativado em virtude de anotações legítimas de dívidas
preexistentes com instituições diversas, sendo um devedor contumaz. Em face
do exposto, responda aos itens a seguir.
A) À luz da jurisprudência dos tribunais superiores, é correta a decisão
do juiz que julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais?
(Valor: 0,65)
B) Poderia o advogado requerer a tutela provisória mesmo constatando-
se a inexistência de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo?
(Valor: 0,60)

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Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação


do dispositivo legal não confere pontuação.

GABARITO COMENTADO:
A) Sim; com apoio na jurisprudência consolidada no Superior Tribunal de
Justiça, “da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe
indenização por dano moral quando preexistente legítima inscrição, ressalvado
o direito ao cancelamento”. É o que dispõe o teor da Súmula 385 do STJ.

B) Sim. Trata-se de tutela provisória de evidência, que dispensa a prova de


perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando “a petição
inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do
direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida
razoável”, nos termos Art. 311, inciso IV, do CPC/15.

ITEM PONTUAÇÃO

A) Sim, pois há entendimento jurisprudencial consolidado segundo


0,00/0,55/0,65
o qual a anotação irregular em banco de dados não gera dano moral
indenizável quando preexistente legítima inscrição (0,55), conforme
dispõe a Súmula 385 do STJ (0,10)
B) Sim, porque se trata de tutela provisória de evidência (0,50), nos
termos do Art. 311, inciso IV, do CPC/15 (0,10). 0,00/0,50/0,60

O padrão de resposta da questão B leva em conta o enunciado quanto à


referência de que “a petição inicial for instruída com prova documental
suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha
prova capaz de gerar dúvida razoável”, nos termos Art. 311, inciso IV, do
CPC/15, elementos que autorizam a concessão da tutela provisória de
evidência. Embora a negativação indevida, em regra, configure perigo de dano
(o que justificaria um pedido de tutela de urgência), no caso da questão o
consumidor “já estava com o nome negativado em virtude de anotações
legítimas de dívidas preexistentes com instituições diversas, sendo um devedor
contumaz”.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BENAJMIN, A. H.; MARQUES, C. L.; BESSA, L. R e. Manual de Direito do


Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Direito do Consumidor. São Paulo:


Atlas, 2011.

DONIZETTI, Elídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. São Paulo:


Atlas, 2017.

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o


novo regime das relações contratuais - 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2016.

MIRAGEM, Bruno. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos


Tribunais, 2012.

RANGEL, Rafael Calmon. A estabilização da tutela antecipada antecedente


nas demandas de consumo. In: Marques, Claudia Lima (coord.). Revista de
Direito do Consumidor nº 107. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.

REVERBEL, Carlos Eduardo Dieder e MAFFINI, Rafael. Nota sobre a defesa


do consumidor e os serviços públicos: inovações da Lei 13.460/2017 e seu
diálogo com o CDC. RDC VOL. 114 (NOVEMBRO - DEZEMBRO 2017)
Disponível em
<https://proview.thomsonreuters.com/launchapp/title/rt
/periodical/92900151/v20170114/document/145502818/anchor/a-145388857>
Acesso em 01.08.2018.

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