Qualquer pessoa que já leu o livro de Atos e as cartas de Paulo entende claramente que os
cristãos do Novo Testamento praticaram beneficência. Eles demonstraram seu amor, cuidando
dos necessitados. Encontramos um belo exemplo desse amor em Atos 4:32-37: "Da multidão
dos que creram era um o coração e a alma. Ninguém considerava exclusivamente sua nem uma
das coisas que possuía; tudo, porém, lhes era comum. Com grande poder, os apóstolos davam
testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e em todos eles havia abundante graça. Pois
nenhum necessitado havia entre eles, porquanto os que possuíam terras ou casas, vendendo-as,
traziam os valores correspondentes e depositavam aos pés dos apóstolos; então, se distribuía a
qualquer um à medida que alguém tinha necessidade. José, a quem os apóstolos deram o
sobrenome de Barnabé, que quer dizer filho de exortação, levita, natural de Chipre, como
tivesse um campo, vendendo-o, trouxe o preço e o depositou aos pés dos apóstolos." O
exemplo de Barnabé e dos demais irmãos em Jerusalém continua nos incentivando a mostrar o
nosso amor com a mesma generosidade.
A benevolência (ou beneficência), como qualquer outro serviço a Deus, deve ser praticada em
nome do Senhor e de acordo com as instruções dele (Colossenses 3:17; 1 Coríntios 4:6). Neste
estudo, vamos examinar as Escrituras para entender a vontade de Deus neste aspecto
importante da nossa obediência. Abordamos o estudo com a plena convicção que "Toda a
Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a
educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado
para toda boa obra" (2 Timóteo 3:16-17).
Indivíduo ¹ Igreja
Uma vez eu usei a palavra "indivíduo" e um irmão em Cristo sentiu-se ofendido, pensando num
sentido depreciativo da palavra na fala popular. Mas, não é o sentido usado aqui. Indivíduo quer
dizer, segundo uma das definições mais comuns do Aurélio, "A pessoa humana, considerada
quanto às suas características particulares, físicas e psíquicas". Neste estudo, usarei a palavra
indivíduo para falar sobre uma pessoa em contraste com a igreja, que é um conjunto, grupo ou
coletivo de pessoas.
Algumas pessoas têm dificuldade em enxergar a diferença entre a igreja e um só cristão. Dizem,
corretamente, que a igreja é um conjunto de cristãos. Mas, erram quando tomam um passo
além das Escrituras, concluindo que "O que o cristão pode fazer individualmente, a igreja pode
fazer coletivamente." Podemos ver a falácia deste argumento, pensando em alguns exemplos. O
indivíduo pode dedicar-se a qualquer comércio honesto (Efésios 4:28; Atos 18:3; etc.). Contanto,
as Escrituras não permitem à igreja abrir, comprar ou operar firmas e fábricas (considere 1
Coríntios 16:1-2; João 2:16). O indivíduo tem diversos direitos e responsabilidades em relação à
família (veja Efésios 5:33; 6:4; 1 Coríntios 7:3; etc.). Este fato jamais autoriza a igreja,
coletivamente, a participar de todos os aspectos da vida familiar. A igreja é composta de
indivíduos, porém não pode fazer tudo que os indivíduos fazem.
É interessante que esta diferença é frisada claramente quando a Bíblia fala sobre o trabalho de
benevolência. Em 1 Timóteo 5, Paulo define a responsabilidade da igreja em cuidar das cristãs
viúvas. Ele deixa absolutamente clara a distinção entre o papel dos cristãos, individualmente, e o
da igreja, coletivamente: "Mas, se alguma viúva tem filhos ou netos, que estes aprendam
primeiro a exercer piedade para com a própria casa e a recompensar a seus progenitores; pois
isto é aceitável diante de Deus.... Ora, se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos
da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente.... Se alguma crente tem viúvas em
sua família, socorra_as, e não fique sobrecarregada a igreja, para que esta possa socorrer as que
são verdadeiramente viúvas" (1 Timóteo 5:4,8,16). Devemos prestar atenção nesta leitura. As
pessoas que ensinam a falsa noção que a igreja pode fazer coletivamente tudo o que o indivíduo
faz em termos de beneficência estão se colocando numa posição perigosíssima. Além de
sobrecarregar a igreja, podem estar negando a fé! W.E. Vine, no seu dicionário de palavras do
Novo Testamento, comenta sobre este trecho: "Há uma sugestão da tendência de abandonar
responsabilidade individual à custa da igreja."
As Responsabilidades do Cristão
Poucos assuntos são mais enfatizados nas Escrituras do que a responsabilidade do cristão em
termos de benevolência. Vamos considerar um punhado de exemplos:
"Aquele que furtava não furte mais; antes, trabalhe, fazendo com as próprias mãos o que é
bom, para que tenha com que acudir ao necessitado" (Efésios 4:28). A linguagem do versículo e
seu contexto deixam bem claro que ele está falando sobre aquele irmão (individualmente), e
não aquela igreja (coletivamente)!
"Exorta aos ricos do presente século que não sejam orgulhosos, nem depositem a sua esperança
na instabilidade da riqueza, mas em Deus, que tudo nos proporciona ricamente para nosso
aprazimento; que pratiquem o bem, sejam ricos de boas obras, generosos em dar e prontos a
repartir; que acumulem para si mesmos tesouros, sólido fundamento para o futuro, a fim de se
apoderarem da verdadeira vida" (1 Timóteo 6:17-19). Aqui também, a linguagem e o contexto
mostram que Paulo está dando responsabilidades individuais às pessoas mais abençoadas em
termos materiais.
Na descrição do grande julgamento, no qual Cristo separará as ovelhas dos cabritos, ele usa
exemplos de benevolência pessoal para ilustrar a importância de servir ao rei, Jesus (leia Mateus
25:31-46). Algumas pessoas destorcem as ilustrações deste trecho para incentivar igrejas a
sustentar grandes obras de benevolência que Deus não autorizou. Tais pessoas ignoram o fato
óbvio que o julgamento é individual, não coletivo. Jesus, aqui, está aprovando e rejeitando
pessoas, não congregações. Ele mesmo disse: "Não vos maravilheis disto, porque vem a hora em
que todos os que se acham nos túmulos ouvirão a sua voz e sairão: os que tiverem feito o bem,
para a ressurreição da vida; e os que tiverem praticado o mal, para a ressurreição do juízo" (João
5:28-29). Paulo deixou absolutamente claro que o julgamento será individual: "Porque importa
que todos nós compareçamos perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o
bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo" (2 Coríntios 5:10). Cada um de nós deve
aproveitar as oportunidades que Deus nos dá para praticar benevolência. Aqueles que aplacam
a consciência, repassando para a igreja as responsabilidades que Deus deu a cada um, terão
uma surpresa eternamente desagradável no julgamento final.
"Por isso, enquanto tivermos oportunidade, façamos o bem a todos, mas principalmente aos da
família da fé" (Gálatas 6:10). Algumas pessoas, querendo fugir da responsabilidade individual,
procuram aplicar este versículo à igreja coletivamente, assim roubando a passagem do seu
significado. Argumentam que o livro foi escrito "às igrejas da Galácia" (Gálatas 1:2) e, portanto,
todo o seu conteúdo aplica-se coletivamente às igrejas. Para defender tal interpretação, a
pessoa teria que pular praticamente tudo que Paulo escreveu entre 1:2 e 6:10. Paulo mandou a
carta a igrejas inteiras, sim, mas ele abordou as necessidades espirituais dos cristãos nas
congregações da região (como foi o costume dele nas diversas cartas enviadas a igrejas). Alguns
exemplos do ensinamento que ele dá ao indivíduo incluem: Cristo vive em cada cristão (2:19-
20); todos os que foram batizados em Cristo são filhos (3:26-27; 4:28); todo homem deve ficar
livre da lei (5:3); todos devem servir uns aos outros em amor (5:13-14); cada um deve andar no
Espírito, deixando de praticar as obras da carne (5:16-24); todos devem evitar atitudes erradas
"uns aos outros" (5:25-26); "alguém" pode tropeçar (6:1); devemos levar as cargas uns dos
outros (6:2); "alguém" pode se enganar (6:3); cada um deve provar o seu labor (6:4); cada um
deve levar o seu próprio fardo (6:5); "aquele" que está sendo instruído deve fazer participante
"aquele" que o instrui (6:6); "o homem" semeia e ceifa (6:7-8). Em 6:9, ele usa pronomes e
verbos plurais, mas obviamente falando sobre cada e todo cristão. Seremos julgados
individualmente, não coletivamente. É interessante observar que a palavra "tempo" em 6:9 vem
da mesma palavra grega traduzida "oportunidade" em 6:10, assim mostrando que Paulo
continua o mesmo discurso sobre responsabilidades individuais. Não temos nenhuma base para
sugerir que semeamos coletivamente para ceifarmos individualmente. Virá um "tempo" quando
cada pessoa será julgada. Agora é o "tempo" no qual cada pessoa deve fazer o bem a todos.
Examinando a evidência, podemos ver claramente que 6:10 está falando da responsabilidade
individual de cada um de nós. Seria fácil e cômodo jogar esta responsabilidade para a igreja, mas
não seria certo! Devemos observar mais um fato sobre Gálatas 6:10. Enquanto a linguagem
deste versículo pode incluir ajuda financeira, o contexto enfatiza obras espirituais. Cada cristão
deve fazer o bem a todos em vários sentidos, principalmente em termos espirituais.
"Se alguém supõe ser religioso, deixando de refrear a língua, antes, enganando o próprio
coração, a sua religião é vã. A religião pura e sem mácula, para com o nosso Deus e Pai, é esta:
visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar_se incontaminado do
mundo" (Tiago 1:26-27). Este trecho destaca aspectos negativos e positivos da religião pura que
agrada a Deus. Do lado "negativo", devemos evitar pecados da língua e mantermo-nos
incontaminados do mundo. Do lado "positivo", cada cristão deve ser diligente no serviço a
outros, especialmente aos órfãos e às viúvas. Infelizmente, algumas pessoas fogem desta
responsabilidade individual, sugerindo que este trecho fala de obras coletivas de igrejas. Elas
acham bem mais fácil colocar algum dinheiro na coleta e deixar a igreja cuidar dos órfãos e das
viúvas. Por sua vez, algumas igrejas preferem criar ou sustentar outras organizações não
autorizadas por Deus (orfanatos, casas da terceira idade, etc.), fugindo mais ainda da
responsabilidade que Deus deu a cada cristão. Sem dúvida, é mais difícil aceitar uma criança na
sua própria casa, assumindo a responsabilidade de cuidar das suas necessidades do que jogar
algum dinheiro na oferta e deixar que a igreja ou um orfanato cuide de tudo. E, sem dúvida,
impressiona mais o mundo a vista de grandes orfanatos com placas e faixas e trombetas
tocando (veja Mateus 6:2) do que ver famílias humildes criando filhos no dia-a-dia. Não
devemos, porém, procurar as coisas mais impressionantes, nem as mais fáceis. Devemos fazer o
trabalho de Deus da maneira que ele mandou. Ele deu a cada um de nós a responsabilidade de
cuidar de órfãos e viúvas.
As Responsabilidades da Igreja
O principal papel da igreja é espiritual. 1 Timóteo 3:14-15 diz: "Escrevo_te estas coisas,
esperando ir ver_te em breve; para que, se eu tardar, fiques ciente de como se deve proceder
na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, coluna e baluarte da verdade." A missão básica da
igreja é espiritual, não física nem social. Porém, pessoas passam por dificuldades financeiras, e
precisamos seguir o padrão do Novo Testamento para saber como lidar com tais necessidades.
Antes de chegar a conclusões, vamos examinar a evidência, considerando diversos trechos que
falam sobre igrejas do primeiro século.
"Todos os que creram estavam juntos e tinham tudo em comum. Vendiam as suas propriedades
e bens, distribuindo o produto entre todos, à medida que alguém tinha necessidade" (Atos 2:44-
45).
"Da multidão dos que creram era um o coração e a alma. Ninguém considerava exclusivamente
sua nem uma das coisas que possuía; tudo, porém, lhes era comum. Com grande poder, os
apóstolos davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e em todos eles havia abundante
graça. Pois nenhum necessitado havia entre eles, porquanto os que possuíam terras ou casas,
vendendo_as, traziam os valores correspondentes e depositavam aos pés dos apóstolos; então,
se distribuía a qualquer um à medida que alguém tinha necessidade" (Atos 4:32-35).
"Ora, naqueles dias, multiplicando_se o número dos discípulos, houve murmuração dos
helenistas contra os hebreus, porque as viúvas deles estavam sendo esquecidas na distribuição
diária. Então, os doze convocaram a comunidade dos discípulos e disseram: Não é razoável que
nós abandonemos a palavra de Deus para servir às mesas. Mas, irmãos, escolhei dentre vós sete
homens de boa reputação, cheios do Espírito e de sabedoria, aos quais encarregaremos deste
serviço; e, quanto a nós, nos consagraremos à oração e ao ministério da palavra" (Atos 6:1-4).
"Quanto à coleta para os santos, fazei vós também como ordenei às igrejas da Galácia. No
primeiro dia da semana, cada um de vós ponha de parte, em casa, conforme a sua prosperidade,
e vá juntando, para que se não façam coletas quando eu for. E, quando tiver chegado, enviarei,
com cartas, para levarem as vossas dádivas a Jerusalém, aqueles que aprovardes" (1 Coríntios
16:1-3).
O que podemos aprender desses trechos? Quais são os limites colocados por Deus em relação
ao trabalho benevolente da igreja? Observamos no Novo Testamento que:
1. Esses versículos falam sobre pessoas necessitadas. A assistência aos santos não é para
fornecer luxo ou fazer de todos ricos. Jesus falou em Mateus 6:25-33 que devemos buscar o
reino de Deus e confiar no Senhor para nos dar as coisas necessárias (o que comer, o que beber,
com que nos vestir). Uma das maneiras como ele cuida das necessidades dos santos é através da
benevolência da igreja, satisfazendo as necessidades dos irmãos pobres.
2. As pessoas ajudadas pela igreja são os próprios santos, ou irmãos em Cristo. Algumas pessoas
podem estranhar lendo os relatos do Novo Testamento, porque muitas igrejas nos últimos dois
séculos se transformaram em grandes agências sociais oferecendo ajuda material para todas as
pessoas, cristãs ou não. Os nomes de algumas denominações aparecem com mais freqüência
em hospitais e orfanatos do que em casas de oração e louvor. Mas as tendências históricas não
mudam os fatos bíblicos. As igrejas do Senhor no Novo Testamento ajudaram os santos
necessitados. Como já observamos, cristãos ajudaram outros individualmente e não
sobrecarregaram a igreja com tais obras sociais.
4. O trabalho de benevolência foi feito pelas igrejas quando a necessidade surgiu. O trabalho
principal da igreja, o ensinamento da palavra de Deus, nunca pára. Mas as igrejas nesses
exemplos bíblicos não alocaram fundos de rotina a algum trabalho de benevolência. Quando a
necessidade surgiu, não mediram esforços para ajudar os irmãos.
5. Podemos ver que a ajuda sempre foi dada, não emprestada. A prática de muitas igrejas de
oferecer empréstimos que serão pagos de volta à igreja é mais um exemplo da desobediência de
homens que seguem opiniões humanas e não respeitam a palavra de Deus (veja Provérbios
14:12; Isaías 55:8-9; Jeremias 10:23). A igreja não é banco.
Como seguidores de Cristo, temos que aceitar nossa responsabilidade para usar o dinheiro da
igreja numa maneira que agrada a Deus. Devemos sempre agir segundo os princípios ensinados
por Jesus em Mateus 22:37-39: "Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a
tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O segundo,
semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo." O amor ao próximo exigirá
sacrifícios (Tiago 2:15-16; 2 Coríntios 8:2-4). O amor ao Senhor exigirá cuidadosa adesão ao
padrão dele, respeitando os limites que ele nos deu. Por exemplo, pessoas que amam a Deus
não tolerarão a preguiça de homens que desrespeitam a palavra de Deus: "se alguém não quer
trabalhar, também não coma" (2 Tessalonicenses 3:10).
Colocando a palavra de Deus acima das nossas próprias opiniões, jamais acrescentaremos ao
trabalho da igreja algo que Deus não mandou. A igreja não tem autorização de Deus para dar
ajuda benevolente aos cristãos que não têm necessidade. O papel da igreja é suprir as
necessidades da vida diária (Atos 6:1). Ela não pode sustentar os preguiçosos (2 Tessalonicenses
3:10).
Uma vez que o trabalho da igreja é espiritual, especialmente o de ensinar a palavra, ela não
deve negligenciar esse aspecto do trabalho em relação aos irmãos necessitados. Presbíteros,
evangelistas e outros professores devem orientar irmãos sobre as próprias responsabilidades. O
irmão necessitado pode precisar de comida hoje, mas não devemos deixar de ajudá-lo a saber
como cuidar de si mesmo amanhã. Devemos ensinar sobre a responsabilidade de cada irmão em
relação a sua família (1 Timóteo 5:8). Ele deve trabalhar (2 Tessalonicenses 3:10). Deve procurar
viver dentro das suas condições (Lucas 3:14; Atos 20:33-34; 1 Timóteo 6:8). Numa época em que
muitas pessoas se afogam em dívidas, devemos exortar os nossos irmãos a falar sempre a
verdade (Efésios 4:25; Mateus 5:37). Comprar a prazo quando não se tem condições para pagar
é uma maneira de mentir, e pode até chegar a ser fraude.
Enquanto cada irmão deve procurar suas próprias soluções através de trabalho honesto e de
boa administração dos seus bens, existem casos de necessidade verdadeira entre cristãos.
Devemos praticar o amor não fingido, mostrando a compaixão digna dos filhos de Deus. Cada
um de nós deve ler com freqüência as instruções importantíssimas de Romanos 12:9-16: "O
amor seja sem hipocrisia. Detestai o mal, apegando_vos ao bem. Amai_vos cordialmente uns
aos outros com amor fraternal, preferindo_vos em honra uns aos outros. No zelo, não sejais
remissos; sede fervorosos de espírito, servindo ao Senhor; regozijai_vos na esperança, sede
pacientes na tribulação, na oração, perseverantes; compartilhai as necessidades dos santos;
praticai a hospitalidade; abençoai os que vos perseguem, abençoai e não amaldiçoeis.
Alegrai_vos com os que se alegram e chorai com os que choram. Tende o mesmo sentimento
uns para com os outros; em lugar de serdes orgulhosos, condescendei com o que é humilde; não
sejais sábios aos vossos próprios olhos."
Desafios Bíblicos
Depois de examinar a evidência bíblica, podemos estranhar que tantas igrejas se envolvam em
grandes obras sociais que jamais se encontram nas Escrituras. Por que tantas divergências?
Alguns aceitam outras práticas porque não consideram os ensinamentos bíblicos como padrão
ou modelo para as igrejas hoje em dia. Neste caso, nossas diferenças são maiores do que
qualquer determinado assunto polêmico. Não estamos usando o mesmo livro, ou abordamos o
livro de maneiras totalmente diferentes. Para os leitores que não acham importante examinar e
seguir o padrão bíblico, eu gostaria de sugerir a leitura cuidadosa de vários textos:
Levítico 10:1-7. Nadabe e Abiú foram dois dos primeiros sacerdotes que entraram no
tabernáculo de Deus. Nos capítulos 8 e 9, encontramos, pelo menos, doze afirmações que os
servos escolhidos fizeram como Deus lhes ordenou. Eles usaram as roupas certas e seguiram
todas as instruções dadas por Deus. Mas, erraram em um detalhe. O primeiro versículo do
capítulo 10, em contraste com os capítulos anteriores, diz que fizeram "o que [o Senhor] não
lhes ordenara". Levaram fogo errado nos seus incensários. Deus os matou na hora. Mas, o ponto
não é só o medo de sermos punidos por Deus, nem é questão de sermos legalistas. Os servos
sinceros sempre procurarão glorificar o Senhor porque ele é santo (10:3; veja 11:44-45).
Números 15:32-36. A lei de Moisés proibiu trabalho no sábado. Um homem apanhou lenha no
sétimo dia. Deus mandou que o povo o apedrejasse.
1 Crônicas 13:1-14. Davi e o povo de Israel decidiram levar a arca da aliança a Jerusalém, onde o
templo seria preparado. Tentando respeitar a santidade da arca (que simbolizava o trono de
Deus), eles a colocaram num carro novo, guiado por dois homens. Quando os bois tropeçaram,
um dos homens estendeu a mão para segurar a arca. Deus o matou na hora. Davi voltou triste e
procurou entender este castigo severo. Ele buscou a resposta na lei de Deus e aprendeu que o
Senhor já havia dado instruções específicas sobre o transporte da arca. Ele chamou os levitas e
explicou a morte de Uzá: "...o Senhor, nosso Deus, irrompeu contra nós, porque, então, não o
buscamos, segundo nos fora ordenado" (1 Crônicas 15:13).
2 Samuel 24:1-25. Davi levantou um censo em Israel. No passado, Deus havia dado ordem para
Moisés fazer a mesma coisa. Mas, Deus não autorizou o censo de Davi. A conseqüência de seu
ato não autorizado? 70.000 homens morreram!
1 Reis 13:1-32. Um profeta velho enganou um jovem, e este desobedeceu à ordem do Senhor.
Ele foi morto por um leão.
Algumas pessoas tentam negar o significado de tais trechos, dizendo que Deus era mais severo
na época do Velho Testamento. Ele nos mostrou a graça superabundante no sacrifício de Jesus e
na revelação do evangelho. Isso quer dizer que ele é menos exigente e menos severo hoje? Ao
contrário, o Novo Testamento afirma que Deus permanece severo, até mais severo do que no
passado! Leia estes trechos da Nova Aliança:
"Porque, se Deus não poupou os ramos naturais, também não te poupará. Considerai, pois, a
bondade e a severidade de Deus: para com os que caíram, severidade; mas, para contigo, a
bondade de Deus, se nela permaneceres; doutra sorte, também tu serás cortado" (Romanos
11:21-22).
"Por esta razão, importa que nos apeguemos, com mais firmeza, às verdades ouvidas, para que
delas jamais nos desviemos. Se, pois, se tornou firme a palavra falada por meio de anjos, e toda
transgressão ou desobediência recebeu justo castigo, como escaparemos nós, se
negligenciarmos tão grande salvação?" (Hebreus 2:1-3).
"Sem misericórdia morre pelo depoimento de duas ou três testemunhas quem tiver rejeitado a
lei de Moisés. De quanto mais severo castigo julgais vós será considerado digno aquele que
calcou aos pés o Filho de Deus, e profanou o sangue da aliança com o qual foi santificado, e
ultrajou o Espírito da graça? Ora, nós conhecemos aquele que disse: A mim pertence a vingança;
eu retribuirei. E outra vez: O Senhor julgará o seu povo. Horrível coisa é cair nas mãos do Deus
vivo" (Hebreus 10:28-31).
De fato, foi o Deus do Novo Testamento que matou Ananias e Safira (Atos 5:1-11). Foi o Deus do
Novo Testamento que derrubou o arrogante rei Herodes Agripa I e o deixou morrer comido
pelos vermes (Atos 12:20-24). Foi o Deus do Novo Testamento que cegou Elimas (Atos 13:11) e
que mandou as tropas romanas contra Jerusalém para a destruir. Servimos o mesmo Deus, e
jamais devemos esquecer da severidade dele!
Algumas pessoas procuram basear suas crenças e práticas na Bíblia, e ainda acham certo aceitar
diversas obras sociais como trabalhos da igreja, incluindo obras direcionadas a não cristãos. Às
vezes, citam algumas passagens que parecem apoiar essas práticas. Vamos examinar três
exemplos de versículos do Novo Testamento usados para justificar o uso do dinheiro da igreja
para não cristãos. Já estabelecemos claramente que as Escrituras ensinam que os cristãos,
individualmente, devem ajudar necessitados, sejam cristãos ou não. Aqui, a questão é outra.
Existe algum versículo que autoriza o uso dos fundos da igreja para ajudar descrentes,
financeiramente?
Alguns citam Tiago 1:27: "A religião pura e sem mácula, para com o nosso Deus e Pai, é esta:
visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar_se incontaminado do
mundo." Este versículo fala sobre assistência aos órfãos e viúvas, e não diz que tal ajuda seria
limitada aos cristãos necessitados. De fato, já consideramos este versículo quando estudamos
sobre a responsabilidade de cada cristão, individualmente, praticar benevolência. Mas a
aplicação deste versículo ao trabalho coletivo da igreja seria uma perversão óbvia do conteúdo
do versículo e do contexto. Tudo no contexto fala sobre responsabilidades individuais: "algum
de vós" (1:5); "esse homem" (1:7); "homem" (1:8); "o irmão" (1:9); "ele" (1:10); "o homem"
(1:12); "cada um" (1:14); "todo homem" (1:19); "alguém" (1:23); "homem" (1:23); "si mesmo"
(1:24); "aquele" (1:25); "ouvinte" (1:25); "esse" (1:25); "alguém" (1:26); "o próprio coração"
(1:26). Assim, chegamos ao versículo 27, o qual continua as instruções aos indivíduos,
terminando com a exortação para "a si mesmo guardar-se incontaminado do mundo". Esse
versículo não autoriza nenhuma obra coletiva da igreja.
l Outros citam Gálatas 6:10: "Por isso, enquanto tivermos oportunidade, façamos o bem a todos,
mas principalmente aos da família da fé." Já observamos este versículo, também, em relação à
responsabilidade individual. Não repetirei todas as evidências já citadas que mostram que o
versículo não autoriza atividade coletiva da igreja. Da mesma maneira que Tiago 1:27 fala sobre
responsabilidades de cada discípulo, Gálatas 6:10 mostra o que cada um de nós deve fazer. Se
tivermos oportunidade para fazer o bem para um irmão em Cristo, façamo-lo. Se surgir
oportunidade para ajudar um descrente, ajudemo-lo. Mas, precisamos de bastante imaginação
e ousadia para tentar inserir a igreja nesse versículo. Antes de ceder a tal tentação, faríamos
bem lembrar de Nadabe, Abiú, Uzá, Davi e outros que agiram sem autorização. Paulo disse para
não ultrapassarmos o que está escrito (1 Coríntios 4:6). O autor de Hebreus mostra que aquele
que age onde as Escrituras não falam muda a lei (Hebreus 7:11-14). Jesus recebeu autoridade
para tal mudança; mas ninguém hoje tem a autoridade para agir onde Deus não falou. João
disse que aquele que ultrapassa a doutrina de Cristo não tem Deus (2 João 9). Vamos ficar
dentro dos limites que Deus revelou!
Ainda outros usam 2 Coríntios 9:13 para justificar o uso do dinheiro da igreja para dar
assistência aos descrentes. O versículo, num contexto que fala sobre dinheiro enviado da igreja
de Corinto para ajudar os santos necessitados da Judéia, diz: "...visto como, na prova desta
ministração, glorificam a Deus pela obediência da vossa confissão quanto ao evangelho de Cristo
e pela liberalidade com que contribuís para eles e para todos".
A questão é esta: depois de tantos versículos que mostram igrejas dando assistência aos santos,
podemos provar que esse versículo autoriza a assistência a pessoas não cristãs? Para responder
a essa pergunta, temos que saber o que foi dado para quem. Vamos examinar estas duas
perguntas:
1. Para quem? Paulo fala da liberalidade "para eles e para todos". No contexto que fala sobre
ajuda enviada aos irmãos da Judéia, é facilmente entendido que "eles" são exatamente aqueles
irmãos. A dúvida surge a respeito de "todos". Algumas pessoas interpretam "todos" como
"todos os homens" e afirmam que este versículo autoriza o uso do dinheiro da igreja para
benevolência a qualquer pessoa, cristã ou não. Já percebemos a dificuldade com essa
interpretação no próprio versículo. Ele não disse que poderíamos mostrar liberalidade para
todos, ele disse que eles realmente mostraram liberalidade para todos. Alguém afirmaria que os
coríntios, de fato, enviaram dinheiro para todos os homens do mundo? É claro que não!
Qualquer leitura deste versículo exige o entendimento que "todos" é limitado. Agora, vamos
inserir nossas próprias limitações para justificar obras que nenhum outro trecho autoriza, ou
vamos procurar uma resposta bíblica no próprio contexto? Os servos fiéis, que respeitam a
palavra do Senhor, se contentarão com o sentido estabelecido no contexto. A palavra grega
traduzida "todos" aqui (πάντας) tem que ser entendida no contexto. Joseph Henry Thayer, no
seu léxico grego, disse que, nesse caso, πάντας é usada "de uma certa definida totalidade ou
soma de coisas, o contexto mostrando quais coisas" (A Greek-English Lexicon of the New
Testament, página 493). Aplicando esta definição, voltamos ao contexto para saber quais
"coisas" são indicadas. O versículo anterior (9:12) diz "santos". O versículo posterior (9:14) fala
de pessoas que oraram a Deus em favor dos coríntios, obviamente crentes. Voltando um pouco
mais, chegamos ao 9:1, onde ele diz "santos". No capítulo anterior, 8:4 diz santos. Mais ainda, o
contexto remoto de todas as outras passagens no Novo Testamento que falam do uso do
dinheiro da igreja para benevolência também mostra que "todos" seria todos os santos. Nós não
temos direito de mudar o significado da palavra para justificar obras que Deus não autorizou.
2. O que foi dado? 2 Coríntios 9:13 diz "...contribuís para eles e para todos". A palavra contribuís
vem do grego κοινωνίας. Esta palavra é usada 19 outras vezes no Novo Testamento. A grande
maioria das vezes, é traduzida "comunhão". É usada para descrever a participação juntos de
seguidores de Cristo, de cristãos com Cristo, etc. Em nenhuma ocasião é usada nas Escrituras
para falar de participação ou comunhão entre cristãos e descrentes. De fato, a mesma palavra
aparece no mesmo livro, absolutamente proibindo tal comunhão: "Não vos ponhais em jugo
desigual com os incrédulos; porquanto que sociedade pode haver entre a justiça e a iniqüidade?
Ou que comunhão, da luz com as trevas? Que harmonia, entre Cristo e o Maligno? Ou que
união, do crente com o incrédulo?" (2 Coríntios 6:14-15). A palavra "comunhão" (κοινωνία) não
é usada no Novo Testamento para descrever relações entre cristãos e descrentes.
Paulo usa a palavra comunhão em termos espirituais, descrevendo algo compartilhado entre os
santos, e não entre discípulos e descrentes. O estudante cuidadoso jamais usaria duas duvidosas
interpretações no mesmo versículo ("contribuís" e "todos os homens") para tentar justificar uma
utilização do dinheiro da igreja que não tem apoio em nenhum outro trecho. Lamentamos que
algumas pessoas incentivem igrejas a sustentar seus grandes projetos humanos, ao invés de
incentivá-las a seguir cuidadosamente o padrão bíblico.
Não achando nenhuma prova bíblica, alguns se contentam com argumentos baseados em casos
excepcionais de catástrofes naturais, etc. Não tentarei aqui definir para outros como resolver
casos de bois que caem num poço, ou quando colocar misericórdia acima de sacrifícios (Lucas
14:5; Mateus 12:7). Mas, antes de usar exceções para modificar ou negar regras divinas,
devemos lembrar que homens através dos séculos têm usado exatamente esta tática para
abandonar diversas doutrinas e práticas da Bíblia. Casos excepcionais (moribundos confessando
sua fé) foram usados por alguns para justificar batismo por aspersão, e por outros para negar a
necessidade do batismo. Basear práticas do dia-a-dia em casos excepcionais é uma tendência
perigosíssima.
Contra o Quê?
Pessoas que querem defender seus projetos, mesmo não tendo provas bíblicas, freqüentemente
regridem ao comportamento de meninos no ginásio, usando apelidos para tentar instigar outros
contra certos colegas. Quando insistimos em seguir o padrão bíblico em termos do trabalho da
igreja, sempre há alguém pronto para usar algum nome depreciativo. É mais fácil inventar
rótulos do que estudar e humildemente seguir a Bíblia.
Mas, não precisamos sentir-nos ofendidos pelos rótulos que outros nos apliquem. Alguém pode
chamar-nos de "anti-cooperativo". Depois de examinar as Escrituras, devemos opor cooperação
entre a luz e as trevas. Devemos opor cooperação nas obras infrutíferas das trevas. Alguém
pode nos chamar de "contra". Tal rótulo nos ofende? Os verdadeiros discípulos de Cristo
continuam resolutamente contra o pecado, contra os projetos humanos que Deus não
autorizou, contra desobediência e contra a arrogância humana que ousa falar e agir onde Deus
não revelou. Alguém pode tentar nos ofender com tais rótulos, mas quem queria ser conhecido
como pró-pecado, pró-desobediência, pró-cooperação-não-autorizada com as obras infrutíferas
das trevas?
Pessoas bem-intencionadas, às vezes, são tentadas a rebaixarem-se para participar das mesmas
táticas carnais, criando divisões e partidos ao invés de examinar as Escrituras. Vamos evitar tal
tendência, estudando e defendendo a palavra de Deus com sinceridade, humildade e seriedade.
"Porque, embora andando na carne, não militamos segundo a carne. Porque as armas da nossa
milícia não são carnais, e sim poderosas em Deus, para destruir fortalezas, anulando nós
sofismas e toda altivez que se levante contra o conhecimento de Deus, e levando cativo todo
pensamento à obediência de Cristo" (2 Coríntios 10:3-5).
Que Deus nos ajude a mostrar nosso amor para com ele e para os nossos próximos.