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Universidade Federal do Pampa

Programa de Pós Graduação em Engenharia


Disciplina de Mecânica dos Fluidos Viscosos

DETERMINAÇÃO DA MASSA ESPECÍFICA E VISCOSIDADE DA GLICERINA,


AMACIANTE E ÓLEO DE SOJA

E. O. da SILVA¹, F. P. GUTERRES¹, L. B. AVILA¹, V. D. SANTOS¹


1
Universidade Federal do Pampa, Programa de Pós-Graduação em Engenharia
e-mail: elenara.oliveira93@gmail.com

RESUMO – O estudo das características de escoamento dos fluidos é chamado reologia


e é dividido em sólido elástico e fluido viscoso. O fluido viscoso escoa quando submetido
a uma força tangencial e suas principais propriedades são a massa específica e a
viscosidade. Essas propriedades são importantes pois caracterizam qualquer tipo de fluido
utilizado em diferentes indústrias. Sendo assim, o presente trabalho teve como objetivo
determinar a massa específica e a viscosidade de três fluidos produzidos nas indústrias
químicas e de alimentos, a glicerina, o amaciante e o óleo de soja. A massa específica foi
determinada a partir da técnica da picnometria líquida, a viscosidade cinemática a partir
do viscosímetro de copos e a viscosidade dinâmica com o viscosímetro de Brookfield.
Para a massa específica das amostras foram encontrados os valores de 1259,7 949,7 e
922,7 kg/m³ para a glicerina, o amaciante e o óleo de soja, respectivamente. Para a
viscosidade dinâmica utilizando o viscosímetro de Brookfield os valores determinados
para a glicerina e o amaciante variam muito nas condições de temperatura, spindle e
rotação e, portanto, não foram encontrados valores comparáveis com a literatura. Para o
óleo de soja o valor foi de 121,2 cP.

Os fluidos viscosos podem apresentar


INTRODUÇÃO
diferentes tipos de comportamento. Segundo
Potter e Wiggert (2011) os fluidos mais comuns
De acordo com Steffe (1996) reologia é o
são os de comportamento newtoniano que,
estudo das propriedades de escoamento de
quando submetidos a um gradiente de tensão se
materiais. O conhecimento reológico é
deformam linearmente. Outros tipos incluem os
essencial para cálculos de variáveis de
pseudoplásticos e dilatantes que sob presença
processo, tais como para o dimensionamento de
de tensão deformam-se exponencialmente e os
bombas e sopradores; para avaliação de
fluidos binghamianos, também conhecidos
características do material, como validade em
como plásticos ideais, que se deformam
alimentos e para equações reológicas de estado.
somente após uma determinada tensão.
A reologia é dividida em duas grandes
As propriedades principais de um fluido
áreas, o sólido elástico e o fluido viscoso. O
viscoso são a massa específica, que relaciona a
sólido elástico é um material, com forma
massa num determinado volume e é a definição
definida que quando deformado por uma força
de massa em equações de estado; e a
externa responde elasticamente, ou seja, dentro
viscosidade dinâmica ou absoluta, que
de certo limite volta a ter a forma original. Já o
fluido viscoso não tem forma definida e escoa relaciona as forças que agem no fluido
(POTTER e WIGGERT, 2011).
quando submetido à uma força tangencial
(STANLEY, et al. 1996).
Essas propriedades têm grande com o tempo de escoamento no orifício do copo
importância, pois caracterizam qualquer tipo de Ford é dada pela Equação 2.
fluido utilizados em diferentes indústrias.
Glicerina é a forma vendida ν = coefA.t + coefB (2)
comercialmente com mais de 95% de glicerol.
É amplamente utilizada nas indústrias química Na Equação 2, os coeficientes A e B são
e de alimentos pelas suas características de tabelados para o viscosímetro, de acordo com
viscosidade. Entretanto, a viscosidade da cada orifício. Já t e ν são o tempo (s) e a
glicerina é muito dependente da temperatura viscosidade cinemática (mm²/s). Os valores dos
(COLLINS, 2005). O amaciante é um produto coeficientes são apresentados na Tabela 1.
de uso doméstico destinado para a limpeza e
desinfecção de roupas. Como o amaciante é Tabela 1: Valores para os coeficientes de
uma mistura de diferentes substâncias existe acordo com o orifício.
uma legislação para o que pode ser considerado Coef. A Coef. B
amaciante de roupas (ANVISA, 2018). O óleo Orifício 3 1,5765 -11,01
de soja é extraído das sementes de soja por Orifício 4 3,8239 -31,95
processo de prensagem direta e extração por Orifício 6 12,9309 -40,23
solvente.
O objetivo deste trabalho foi determinar a Para cada fluido foram realizadas 6
massa específica e as viscosidades, dinâmica e replicatas. O tamanho do orifício foi escolhido
cinemática, da glicerina, amaciante e óleo de de acordo com o tipo de fluido. Os orifícios
soja. utilizados para a determinação das viscosidades
dos fluidos foram o de 3 e 6.
MATERIAIS E MÉTODOS O viscosímetro de copos baseia o
equacionamento da viscosidade dinâmica com
A massa específica real foi obtida através a equação de Pouiselle, isto é, escoamento
de ensaios de picnometria líquida, utilizando laminar hidrodinamicamente desenvolvido
um picnômetro de volume nominal de 25 mL, dado pela Equação 3.
com o auxílio de uma balança analítica. Foi
realizada a calibração do picnômetro com água, 𝜋. ∆𝑃. 𝑑4
𝜇= (3)
que possui massa específica conhecida, a fim de 128. 𝐿. 𝑄
determinar o volume real do picnômetro. O
ensaio de picnometria consiste em obter a Na qual, μ é a viscosidade dinâmica do
massa de determinada substância que ocupa o fluido em Pa.s, ∆P é a queda de pressão no
volume do picnômetro para cálculo da massa viscosímetro em Pa, d é o diâmetro do copo em
específica real, que relaciona estes dois m², L é o comprimento em m e Q é a vazão de
parâmetros através da Equação 1. Os ensaios e fluido em m³/s.
a calibração foram realizados em triplicata. A queda de pressão é dada pela
m Equação 4.
ρ= (1)
V
∆𝑃 = 𝜌𝑔∆ℎ (4)
Em que, ρ é a massa específica do fluido
em kg/m³, m é a massa em kg e V é o volume Na qual, g é a aceleração da gravidade em
em m³. m/s² e ∆h é a diferença de altura de líquido.
O viscosímetro de copo Ford foi utilizado A vazão é definida pela Equação 5.
para a determinação da viscosidade cinemática
dos fluidos. O ensaio consiste na medida do 𝑑ℎ (5)
tempo que determinado fluido demora para 𝑄 = 𝑎𝑡 .
𝑑𝑡
escoar em um orifício até a primeira interrupção em que, at é a área da seção transversal do copo.
de fluxo. A relação da viscosidade cinemática Reorganizando os termos para obter-se a
viscosidade cinemática têm-se a Equação 6.
grande dependência com cada marca específica
𝑑𝑡 𝑑ℎ 128. 𝑎𝑡 . 𝐿 de fabricação. Já, para o óleo de soja, Souza e
= (6) Luz (2014) obtiveram um valor de 915 kg/m³
𝜈 ℎ 𝜋. 𝑔. 𝑑4
numa temperatura de 20°C. Ainda, pequenas
Assumindo as constantes de integração e divergências podem ser explicadas por
separando as variáveis têm-se a Equação 7. diferenças de temperatura, visto que esta
Portanto, a Equação 2 é uma simplificação da propriedade apresenta uma relação direta com a
Equação 7 que descreve o processo. massa específica. Cabe ainda ressaltar que
dentre essas substâncias apenas a glicerina é
𝑡 mais densa que a água, sendo 1,25 vezes maior.
𝜈= O óleo e o amaciante são menos densos que a
𝐶. ln (ℎ𝑓 ⁄ℎ0 ) (7)
água, com valores de 0,92 e 0,94,
Na Equação 7, C é uma constante que respectivamente.
representa o coefB da Equação 2, hf e h0 são as Na Tabela 3 são apresentados os valores
alturas final e inicial. obtidos para as viscosidades cinemática e
Para determinar a viscosidade dinâmica dinâmica, calculadas a partir dos ensaios com o
dos fluidos estudados, foi utilizado um viscosímetro de copos. Essas propriedades
viscosímetro de Brookfield. O procedimento foram analisadas com uma temperatura de
consistiu em colocar uma haste cilíndrica com 14°C. A viscosidade do óleo e do amaciante
discos de diferentes tamanhos (spindle) foram obtidas utilizando-se o orifício 3,
submersa no fluido de estudo com uma rotação enquanto que para a glicerina o orifício
constante. O aparelho mede a força de utilizado foi o 6.
resistência à rotação (torque) que o fluido
exerce sobre o spindle, obtendo, desta forma, a Tabela 3: Valores de viscosidade cinemática e
viscosidade dinâmica do fluido. A viscosidade dinâmica obtidos pelo viscosímetro de copos.
dinâmica também foi calculada a partir da Substância ν (cSt) μ (cP)
relação entre massa específica e viscosidade Glicerina 798,36 1005,69
cinemática. Amaciante 67,28 63,9
Óleo 80,70 74,46
RESULTADOS E DISCUSSÃO A partir da Tabela 3 observa-se que todas
as substâncias apresentaram viscosidades bem
Na Tabela 2 estão apresentados os maiores que a água, visto que esta possui um
resultados médios para o ensaio de picnometria valor de 1,17 cP numa temperatura de 14°C
para a glicerina, amaciante e óleo de soja, (GEANKOPLIS, 1998). O fluido que
obtidos para uma temperatura de, apresentou maior viscosidade foi a glicerina,
aproximadamente, 14°C. com valores para a viscosidade cinemática de
798 cSt e viscosidade dinâmica de 1005 cP.
Tabela 2: Valores médios de massa específica. Segundo Jardim et al. (2009) a viscosidade
Substância ρ (kg/m³) dinâmica da glicerina a 20ºC é de 1410 cP (1,41
Glicerina 1259,7 ± 0,0014 Pa.s). Esta diferença de valor com a viscosidade
Amaciante 949,7 ± 0,0068 obtida neste trabalho pode ser atribuída à baixa
Óleo 922,7 ± 0,0006 sensibilidade do método de medição. A Tabela
4 apresenta os valores experimentais médios de
Os valores obtidos para a massa viscosidade absoluta, para cada condição
específica das substâncias analisadas estão estudada, obtidos por ensaio com viscosímetro
próximos aos reportados na literatura. Para a de Brookfield.
glicerina este valor foi de 1259,9 kg/m³ nos
estudos de Cruz (2013). Para alguns
amaciantes, de acordo com relatórios técnicos,
a massa específica pode variar entre 980 a
1000 kg/m³, porém é um parâmetro que possui
Tabela 4: Valores médios para a viscosidade rotação, causou um aumento de 11,6% na
dinâmica da glicerina em diferentes condições. viscosidade.
Capacidade Durante o experimento observou-se que
Condições μ (cP)
(%) os valores de viscosidade dinâmica alteravam-
14°C, R2, 2038,35 ± se com o passar do tempo do experimento. Uma
- possível explicação para este comportamento
20 rpm 68,76
18°C, R2, 1381,8 ± seria a presença de cloreto de dimetil amônio,
71,8 um sal solúvel em água, usado para diminuir a
20 rpm 15,69
18°C, R2, 1544,42 ± tensão superficial da água na lavagem de
46,4 roupas. Este produto pode causar uma
12 rpm 17,34
diminuição da viscosidade dinâmica pela
A partir da Tabela 4 é possível notar um formação de regiões com baixa viscosidade
aumento de 32,2% na viscosidade quando a devido a diminuição da tensão resultante no
temperatura foi reduzida de 18 para 14ºC. Isto fluido.
se deve à grande sensibilidade da glicerina a O valor mais adequado para a viscosidade
mudanças de temperatura. Observa-se também do amaciante de acordo com a capacidade do
que a redução da velocidade de 20 para 12 rpm equipamento seria o de 145 cP, porém este
causou um aumento de 10,5% na viscosidade. valor apresenta grande diferença em relação ao
Além disso, observa-se elevados valores de obtido com o ensaio de copos. Ainda, foram
desvios médios que são decorrentes da realizadas tentativas para obtenção da
oscilação da viscosidade dinâmica entre valores viscosidade do amaciante com temperatura de
mais altos e mais baixos que ocorreram 14°C, no entanto, não foi possível a utilização
repetidamente ao longo da medição. Essa de nenhuma combinação de spindle e rotação.
oscilação pode ser atribuída à possível Isto ocorreu devido as limitações do aparelho
formação de zonas de convecção de calor pelo para determinadas condições, visto que as
atrito do fluido com o spindle. Isto provoca um leituras de viscosidade somente são permitidas
aumento na temperatura do fluido na camada com capacidades do equipamento entre 20 e
limite e o fluido aquecido realiza um 80%.
movimento ascendente, deixando a glicerina Já para o ensaio com o óleo de soja o valor
com temperatura mais baixa atingir o spindle. obtido para a viscosidade absoluta foi
Na Tabela 5 são apresentados os valores constante, sendo este de 121,2 cP. Este
médios para a medida de viscosidade do comportamento está de acordo com o
amaciante em diferentes condições. apresentado por fluidos newtonianos. Tal valor
de viscosidade foi obtido para o óleo a uma
Tabela 5: Viscosidade dinâmica média do temperatura de 15°C, com o spindle R2 e uma
amaciante. rotação de 100 rpm. O valor obtido para a
Capacidade viscosidade do óleo de soja também apresenta
Condições μ (cP) uma diferença significativa em relação ao
(%)
18°C, R3, 164,2 ± obtido com cálculo a partir dos dados com
18,5 ensaio no viscosímetro de copos. Segundo
100 rpm 4,80
18°C, R2, 194,32 ± Brook et al. (2008) a viscosidade dinâmica do
30,9 óleo de soja a 20°C é de 59 cP.
60 rpm 5,86
18°C, R2, 145,15 ± Desta forma, o viscosímetro de
39,4 Brookfield é mais indicado para substâncias
100 rpm 5,44
homogêneas enquanto que o viscosímetro de
A partir da Tabela 5 é possível constatar copos é mais indicado para misturas.
que a redução na velocidade de 100 para
60 rpm, mantendo fixo o diâmetro do spindle, CONCLUSÃO
gerou um aumento de 25,3% na viscosidade.
Também se observou que a redução no Os valores de massa específica
diâmetro do spindle de R2 (4,7 cm) para R3 encontradas para a glicerina, amaciante e óleo
(3,47 cm), mantendo fixa a velocidade de
de soja foram de 1259,7; 949,7 e 922,7 kg/m³, <anvisa.gov.br/anvisalegis/resol/275_01r
respectivamente. e.htm>. Acesso em 2 set. de 2018.
Para a viscosidade cinemática, BROCK, J.; NOGUEIRA, M. R.;
determinada pelo viscosímetro de copos, dos ZAKREVSKI, C.; CORAZZA, M. L.;
fluidos glicerina, amaciante e óleo de soja, OLIVEIRA, J. V. Determinação
foram encontrados valores de 798, 67 e 80 cSt experimental da viscosidade e
respectivamente. Os valores obtidos por meio condutividade térmica de óleos vegetais.
do viscosímetro de Brookfield para as amostras Ciênc. Tecnol. Aliment., Campinas,
de glicerina e amaciante apresentaram 28(3): 564-564, 2008.
diferenças quando submetidas a diferentes CRUZ, T. F. M. Estudo numérico do
combinações de spindle e temperatura. deslocamento de fluidos não
newtonianos. Relatório. Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro,
NOMENCLATURA Departamento de Engenharia Mecânica,
2013.
área GEANKOPLIS, C. J. Procesos de Transporte
at transversal m² y Operaciones Unitarias. México:
do copo CECSA, 1998.
diâmetro do JARDIM, R. F.; VERAS, M. I.; SANTOS, E. J.
d m Determinação do coeficiente de
orifício
derivada do viscosidade de líquidos. Instituto de
dt tempo de s Física, Universidade de São Paulo, 2009.
escoamento POTTER, M, C; WIGGERT, D, C. Mechanics
aceleração da of fluids. 4th ed. Cencage Learning.
g m/s² Stanford. 2012.
gravidade
altura de SOUZA, I. A. M.; LUZ, J. A. M. Propriedades
h m de óleos empregados em flotação. Holos,
líquido
comprimento ano 30, vol.3, 2014.
L m STEFFE, J.F. Rheological methods in food
do copo
vazão de processing engineering. 2nd ed.
Q saída de m3/s Freeman Press. New York. 1996.
líquido
diferença de
ΔP pressão no Pa
copo
viscosidade
μ dinâmica do cP
fluido
viscosidade
ν Pa.s
cinemática
massa
ρ específica kg/m3
real
t Tempo s

REFERÊNCIAS

AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA


SANITÁRIA – ANVISA.
Regulamentação amaciantes. Disponível
em:

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