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Universidade Federal do Pampa

Programa de Pós-Graduação em Engenharia


Disciplina de Mecânica dos Fluidos Viscosos

CALIBRAÇÃO E AFERIÇÃO DE MEDIDORES DE VAZÃO E VELOCIDADE EM


ESCOAMENTO INTERNO DE TUBULAÇÕES

E. O. da SILVA¹, F. P. GUTERRES¹, L. B. AVILA¹, V. D. SANTOS¹


1
Universidade Federal do Pampa, Programa de Pós-Graduação em Engenharia
e-mail: elenara.oliveira93@gmail.com

RESUMO – A medição de vazões e velocidades na indústria são importantes devido ao


conhecimento dos fluxos dos fluidos para o projeto e estudo de processos. Essa medição
pode ser realizada a partir de medidores primários, que fornecem os dados para uma
quantidade física e são convertidos em quantidades mensuráveis pelos medidores
secundários. Estes medidores devem ser calibrados e/ou aferidos para seu correto
funcionamento. Portanto, o objetivo deste trabalho foi determinar os coeficientes de
calibração e aferição de diferentes tipos de dispositivos medidores de vazão em dois
sistemas (água e ar). Realizou-se a calibração de uma placa de orifício e um tubo de
Venturi para ambos os sistemas e foram aferidos um rotâmetro (sistema com água) e um
anemômetro (sistema com ar). Obteve-se valores para os coeficientes de calibração (αC)
de 1,5 e 2,27 para a placa de orifício e para o tubo de Venturi no sistema com água. Para
o sistema em que o fluido de trabalho era o ar estes valores foram de 0,17 e 8,98,
respectivamente. Os coeficientes de aferição para o rotâmetro e o anemômetro foram de
1,09 e 0,53, respectivamente.

fluido e parte secundária que converte a


INTRODUÇÃO
resposta da parte primária em uma quantidade
mensurável. Tais medidores podem ser
A determinação da vazão de fluidos é
classificados de acordo com o princípio de
uma importante área de aplicação dentro da
operação característico: medida de área-
mecânica dos fluidos. Numerosos dispositivos
velocidade, correlações de queda de pressão,
foram desenvolvidos ao longo dos anos visando
arrastamento hidrodinâmico, entre outros
a medição de escoamentos e variam
(POTTER e WIGGERT, 2011).
amplamente em sofisticação tamanho e
A maioria dos medidores para
exatidão (ÇENGEL e CIMBALA, 2007;
escoamentos internos baseiam-se no princípio
POTTER e WIGGERT, 2011).
da aceleração de uma corrente fluida através de
Os instrumentos para medidas de vazão
uma restrição da área de escoamento. A
podem ser divididos entre aqueles que
variação de velocidade dessa corrente leva a
empregam meios de medida diretos e aqueles
uma variação na pressão que pode ser medida
que são indiretos. Os medidores diretos são
por um medidor de pressão diferencial ou um
frequentemente utilizados como padrões
manômetro. Já a vazão pode ser inferida a partir
“primários” para a calibração dos dispositivos
de uma análise teórica ou de uma correlação
de medida indireta. Estes medidores consistem
experimental para o dispositivo. A vazão
em parte primária que está em contato com o
teórica pode ser relacionada com o diferencial Tabela 1: Medidores calibrados e aferidos.
de pressão entre dois pontos (a montante e a Água Ar
jusante da restrição) pela aplicação das Placa de Placa de
equações da continuidade e de Bernoulli. Para orifício orifício
obtenção da vazão real, fatores de correção Calibrados
Tubo de Tubo de
empíricos podem ser aplicados (FOX et al., Venturi Venturi
2010). Medidores diferenciais amplamente Aferidos Rotâmetro Anemômetro
utilizados em aplicações industriais são a placa
de orifício e o Venturi (POTTER e WIGGERT,
2011), os quais realizam medidas indiretas e Para a aferição dos medidores comerciais
necessitam de calibração. (rotâmetro e anemômetro) o coeficiente de
A calibração de equipamentos é uma aferição (αA) foi determinado por meio de um
parte essencial em qualquer operação de ajuste linear aos dados da vazão real (ṁreal) em
medição e controle industrial. A calibração é a função da vazão fornecida pelos dispositivos a
única garantia de que os instrumentos serem aferidos (ṁ D), conforme Equação 1.
industriais possuam precisão e faixa de
operação exigidas para manter sistemas em ṁ𝑟𝑒𝑎𝑙 = 𝛼𝐴 ṁ𝐷 (1)
condições controladas. A calibração não
garante necessariamente o bom funcionamento Para a calibração dos medidores
de um instrumento, mas fornece uma boa confeccionados (placa de orifício e Tubo de
indicação de que o seu desempenho pode ou Venturi) foi realizado um ajuste linear aos
não atingir as especificações de precisão e dados da vazão real (ṁ real) em função da raiz
limite nos quais o instrumento deve ser usado quadrada da variação das alturas manométricas
(SOISSON, 2002). dos dispositivos a serem calibrados (√∆𝐻) para
Assim como a calibração, a aferição a determinação do coeficiente de calibração
também apresenta importância no controle (αC), como mostra a Equação 2.
industrial, pois através dela é possível assegurar
que os instrumentos estão de acordo com os ṁ𝑟𝑒𝑎𝑙 = 𝛼𝐶 √∆𝐻 (2)
critérios de aceitabilidade e qualidade. Ela é
realizada em medidores confeccionados por Onde αA e αC são provenientes do balanço
meio da comparação entre a medida dos global de energia mecânica e dos coeficientes
mesmos e a medida fornecida por um medidor de contração, velocidade e vazão.
primário. Para a determinação da vazão real
Em vista disso, o presente trabalho fornecida pelo tubo de Pitot, utilizou-se a
objetivou a calibração e aferição de medidores Equação 3.
de vazão e velocidade.
ṁ𝑟𝑒𝑎𝑙 = 𝑣𝑟𝑒𝑎𝑙 𝐴𝜌 (3)
MATERIAIS E MÉTODOS
Onde A é a área da seção transversal, 𝜌 é a
Para a realização da aferição e da massa específica do fluido e 𝑣𝑟𝑒𝑎𝑙 é a
calibração dos medidores de vazão e velocidade velocidade real do fluido obtida pelo balanço
foram utilizados um fluido compressível (ar) e global da energia mecânica que resultou na
um fluido incompressível (água). Equação 4.
A Tabela 1 apresenta os dispositivos que 2∆𝑃
foram calibrados e os dispositivos que foram 𝑣𝑟𝑒𝑎𝑙 = 0,99 √ (4)
𝜌
aferidos de acordo com o tipo de fluido.
Para vazões crescentes, determinou-se a Sendo ∆𝑃 a queda de pressão medida pelo
medida no equipamento primário bem como tubo de Pitot.
nos equipamentos os quais se desejou realizar a
calibração e aferição.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
1,0
Na Tabela 2 estão apresentados os
coeficientes de correlação (R2), o qui-quadrado

Vazão mássica (kg/s)


0,8

(X²) e os coeficientes angulares (αC) dos ajustes


0,6
aos dados experimentais da calibração dos
medidores de vazão para o sistema com água. A 0,4
placa de orifício foi calibrada com um tubo de
Pitot e o tubo de Venturi foi calibrado a partir 0,2
da relação volume/tempo.
0,1 0,2 0,3 0,4
Tabela 2 : Parâmetros dos ajustes de 
(H) (m )
1/2

calibração dos medidores de vazão de água.


Dispositivo R2 X2 αC Figura 2: Ajuste aos dados experimentais para
Placa de 1,501 ± a calibração do Tubo de Venturi com v/t.
0,975 0,0015
orifício 0,033
Observando as Figuras 1 e 2 pode-se
Tubo de 2,270 ±
0,9948 0,0003 perceber que os dados apresentam uma
Venturi 0,019
tendência linear, fato que é confirmado através
dos coeficientes de correlação dos ajustes
A partir da Tabela 2 pode-se observar que
(Tabela 2), os quais apresentaram valores
para ambos os dispositivos os valores de R² do
superiores a 0,9. Este comportamento
ajuste linear foram satisfatórios. Os valores de
comprova que a vazão de um sistema é
X2 corroboram para a validação destes, visto
proporcional à raiz quadrada da queda de
que foram baixos. Quanto menor for o X²
pressão causada pela perda de carga deste
melhor é a qualidade do ajuste, o que pode ser
sistema. A constante de proporcionalidade é o
verificado nas Figuras 1 e 2. Os coeficientes de
coeficiente angular (αC) obtido de um ajuste
calibração dependem do balanço global de
linear.
energia do escoamento, portanto dependem do
Na Tabela 3 são apresentados os
sistema utilizado. Neste caso para a placa de
resultados para a aferição do rotâmetro a partir
orifício o αC obtido foi de 1,5 e para o tubo de
da relação v/t.
Venturi foi de 2,27.
Na Figura 1 é apresentado o ajuste para a
Tabela 3: Parâmetros de ajuste para a aferição
calibração da placa de orifício e na Figura 2 o
do rotâmetro no sistema com água.
ajuste para a calibração do tubo de Venturi,
Dispositivo R2 X2 αa
ambos utilizando como fluido de trabalho a
água. 1,0972 ±
Rotâmetro 0,9959 0,0002
0,0081

Para a aferição dos medidores de vazão


0,8
quanto mais o coeficiente αa se aproxima da
unidade, mais a vazão fornecida pelo
Vazão mássica (kg/s)

0,6
dispositivo se aproxima da vazão real fornecida
0,4
por um medidor de vazão primário. Como pode
ser observado através dos valores da Tabela 3,
0,2 o rotâmetro apresenta vazão próxima da vazão
real já que o valor de αa obtido para este
0,0 dispositivo está próximo a 1 (1,097) e o
coeficiente de correlação do ajuste apresentou
0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5
um valor de 0,99.
(H)1/2 (m1/2)
Na Figura 3 é apresentado o ajuste aos
Figura 1: Curva de ajuste para a calibração da dados experimentais para a aferição do
placa de orifício com o tubo de Pitot. rotâmetro.
0,08
1,0

0,8 0,06
Vazão mássica real (kg/s)

Vazão mássica (kg/s)


0,6
0,04

0,4
0,02
0,2

0,0 0,00

0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4
Vazão mássica do dispositivo (kg/s) 1/2 1/2
(H) (m )
Figura 3: Curva de ajuste para a aferição do Figura 4: Curva de ajuste aos dados
rotâmetro com v/t, no sistema com água. experimentais para a calibração da placa de
orifício com o tubo de Pitot e fluido de
Os dados experimentais de aferição do trabalho ar.
rotâmetro apresentam uma tendência linear que
é comprovada através dos valores de R² e X² do A curva de ajuste aos dados
ajuste (Tabela 3). O comportamento linear é experimentais de calibração do tubo de Venturi
coerente, visto que os dispositivos de medição com fluido de trabalho ar está mostrada na
de vazão devem fornecer valores de vazão Figura 5. Figura 5
próximos aos valores reais, obtidos pelo
medidor primário (recipiente graduado).
Na Tabela 4 estão mostrados os 6

coeficientes de correlação (R2), o coeficiente 5


angular (αC) e o qui-quadrado (X2) dos ajustes
Vazão mássica (kg/s)

4
aos dados experimentais da calibração dos
medidores de vazão de ar. 3

2
Tabela 4: Coeficientes do ajuste aos dados
experimentais da calibração dos medidores de 1
vazão de ar. 0
Dispositivo R2 X2 αC
0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7
Placa de 0,1773
0,8304 0,0001 1/2
(H) (m )
1/2
orifício ± 0,0129
8,9841 Figura 5: Curva de ajuste aos dados
Venturi 0,9792 0,1040 experimentais para a calibração do tubo de
± 0,2773
Venturi com o tubo de Pitot e fluido de
Os valores obtidos do ajuste pela trabalho ar.
calibração do dispositivo placa de orifício
mostram que esse dispositivo não se adequa Ambos αC, da calibração da placa de
para o uso como medidor de vazão, pois o valor orifício e do tubo de Venturi, são parâmetros
do coeficiente de correlação foi menor que 0,90 que dependem de diversos fatores físicos
e a probabilidade de os valores ajustados oriundos de um balanço de energia no
representarem o experimento foi menor que escoamento estudado. Dentre os parâmetros
1%. Já para o dispositivo de Venturi os dados dos quais o αC é composto está o coeficiente de
estatísticos mostram que ele pode ser utilizado escoamento (K). Este coeficiente depende de
como medidor de vazão com maior confiança. outros dois que estão relacionados ao
Na Figura 4 pode-se observar a curva dispositivo e ao escoamento: o coeficiente de
ajustada aos dados experimentais para a descarga (Cd) e o coeficiente de contração (Cc).
calibração da placa de orifício com o fluido de Cd relaciona a velocidade máxima ou ideal do
trabalho ar. escoamento e a velocidade real (que leva em
consideração as perdas de carga do sistema), linear, portanto, utilizando-se o valor
enquanto que Cc expressa a redução no encontrado para o coeficiente angular na Tabela
diâmetro do escoamento devido à presença do 5 tem-se a vazão real do sistema. O valor do αa
orifício. deveria ser próximo a unidade, entretanto,
Os coeficientes de correlação (R2), o devido a perdas de carga no anemômetro que
coeficiente angular (αC) e o qui-quadrado (X2) não podem ser obtidas o valor difere do ideal.
do ajuste aos dados experimentais da aferição
do medidor de velocidade de ar podem ser CONCLUSÃO
observados na Tabela 5.
No sistema em que o fluido de trabalho
Tabela 5: Coeficientes do ajuste aos dados era a água foram obtidos coeficientes de
experimentais da aferição do medidor de calibração para a placa de orifício e o tubo de
velocidade de ar. Venturi de 1,5 e 2,27, com valores de
Dispositivo R2 X2 αa coeficiente de ajuste de 0,97 e 0,99,
0,5377 respectivamente. O coeficiente de aferição
Anemômetro 0,9109 0,00005 ± obtido para o rotâmetro foi de 1,09 com R² de
0,0282 0,99, indicando que a vazão real é próxima à do
dispositivo.
Os coeficientes de correlação e o qui- Para o sistema com ar, os valores para os
quadrado mostram como o ajuste se deu aos coeficientes de calibração da placa de orifício e
dados experimentais, o valor do coeficiente de do Venturi foram de 0,17 e 0,98, com R² de 0,83
correlação foi maior que 0,90 o que determina e 0,97, respectivamente. Para a aferição do
um bom ajuste enquanto o qui-quadrado baixo anemômetro obteve-se um coeficiente αa de
mostra que a probabilidade dos dados ajustados 0,53 com R² de 0,91.
descreverem o experimento é baixo menos que
1%. O coeficiente angular do dispositivo foi de NOMENCLATURA
0,53 o que significa que esse valor deve ser
multiplicado pela vazão do dispositivo para se coeficiente
αA -
obter a vazão real. de aferição
Na Figura 6 pode-se observar a curva de coeficiente
αC m5/2 s-1
ajuste aos dados experimentais de aferição do de calibração
anemômetro utilizando o ar como fluido de Área da
trabalho. 𝐴 seção m²
transversal
0,08 Queda de
∆𝑃 Pa
Pressão
Variação da
Vazão mássica real (kg/s)

0,06
∆𝐻 altura mm H2O
0,04 manométrica
Massa
𝜌 kg m-3
0,02 específica
Vazão
ṁ real kg s-1
0,00
mássica real
0,00 0,03 0,06 0,09 0,12 0,15
coeficiente
Vazão mássica do dispositivo (kg/s)
R2 de correlação -
do ajuste
Figura 6: Curva de ajuste aos dados
Velocidade
experimentais de aferição do anemômetro com 𝑣𝑟𝑒𝑎𝑙 m s-1
real
o tubo de Pitot e fluido de trabalho ar.
X² Qui-quadrado -
Pela Figura 6 pode-se perceber que os
pontos experimentais se ajustaram a um modelo
REFERÊNCIAS

ÇENGEL, Y. A.; CIMBALA, J. M. (2007)


“Mecânica dos Fluidos: Fundamentos e
Aplicações”, Cengage Learning, p. 279-
295.
FOX, R. W.; PRITCHARD, P. J.;
McDONALD, A. T. (2010). “Introdução
à mecânica dos fluidos”, LTC, p. 341-
355.
POTTER, M. C.; WIGGERT, D. C. (2011)
“Mecânica dos Fluidos”, McGraw-Hill,
p. 523-553.
SOISSON, H. E. (2002). “Instrumentação
industrial”, Hemus, p. 51-82.

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