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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO
DEMARCAÇÃO DO
LEITO E DA MARGEM DAS ÁGUAS DO MAR
NO LITORAL SUL DO ALGARVE
Faro, 2009
MINISTÉRIO DO AMBIENTE E DO
DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO
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Teixeira, S. B. (2009) – Demarcação do leito e da margem das águas do mar no litoral sul do Algarve.
Administração da Região Hidrográfica do Algarve. Faro, 207p.
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RESUMO
O presente estudo pretende contribuir para a definição da linha da máxima preia-mar de águas vivas
equinociais (LMPMAVE) no litoral sul do Algarve, de modo a fornecer os elementos necessários para a
delimitação física do leito e da margem das águas do mar enunciada na Lei nº 54/2005, de 15 de Novembro. Os
resultados apresentados assentam em informação cartográfica à escala 1/2000 ou superior e em treze anos de
observação e medições experimentais sistemáticas, que traduzem as condições morfológicas actuais.
Como ponto de partida, foram desenvolvidas equações empíricas, baseadas em dados experimentais
recolhidos no terreno do litoral sul do Algarve, para o cálculo da altura do espraiamento das vagas em condições
de agitação média do mar. A solução empírica obtida para as arribas não alcantiladas tem a fórmula geral: cota
LMPMAVE = 4m + 6.90 tan β. Da aplicação desta equação resultam cotas da LMPMAVE que oscilam entre os
5.2m e os 7.5m (ZH), para a gama de declives medida no terreno. No caso das arribas, onde não existe variação
da morfologia, a aplicação das soluções no terreno é imediata, bastando, para tanto, associar a LMPMAVE à
curva de nível correspondente à cota de espraio obtida na equação, para o declive da arriba em causa. A
equação sintética, que permite calcular a cota da LMPMAVE (m-ZH) em função do declive médio (β) das praias,
tem a forma: cota LMPMAVE = 4m + 15.0 tan β. As cotas da LMPMAVE, calculadas a partir da equação e do
declive médio das praias, atingem valores máximos de 6.5m (ZH) nas praias mais expostas à acção da agitação
marítima, onde a granulometria é mais grosseira, concentrando-se na vizinhança do cabo de Alfanzina (praia do
Carvalho) e da ponta do Castelo (praia do Evaristo). Nas praias mais abrigadas da agitação marítima dominante
e onde a granulometria é mais fina, a cota da LMPMAVE é apenas 5.0m (ZH). Tal sucede na praia da Rocha, em
parcelas da Meia Praia, da praia de Alvor e no sector a leste de Monte Gordo. Nas restantes praias, as cotas da
LMPMAVE, calculadas a partir dos seus declives médios, atingem valores entre 5.5m e 6.0m (ZH).
Da imprecisão de demarcação da LMPMAVE associada a uma curva de nível nas praias submetidas a
alterações morfológicas resultou a necessidade de olhar para o problema de forma diversa, mais abrangente,
tendo em mente o espírito da Lei e a necessidade da sua concretização no terreno. A alteração essencial reside
na abordagem do domínio público marítimo numa perspectiva assente no ordenamento e na gestão do território,
necessariamente condicionada pela dinâmica costeira associada aos fenómenos naturais, vista num intervalo
temporal alargado da ordem de, pelo menos, uma década, compatível quer com o período de eficácia dos
instrumentos de gestão territorial, quer com os ciclos de oscilação natural dos agentes mesológicos que
condicionam a evolução das praias (marés, agitação marítima, precipitação). Assente no pressuposto temporal
da ordem da década, os resultados recolhidos no terreno num período experimental de 14 anos permitem
demonstrar que, em praias naturais, a LMPMAVE coincide com a base da arriba (em praias suportadas por
arribas) ou com a base da duna (em praias suportadas por dunas). Nas barreiras arenosas acumuladas nas
fozes de estuários temporários ou lagoas costeiras, onde existem cordões dunares, a LMPMAVE também
coincide com os limites das dunas. Estas conclusões permitem a demarcação imediata da LMPMAVE, com base
nos elementos físicos estáveis, no espaço e no tempo, e facilmente reconhecíveis no terreno e em fotografia
aérea. Estes critérios de demarcação da LMPMAVE são válidos nas praias e barreiras que mantêm a sua
morfodinâmica natural, sem interferência humana, e podem ser estendidos a todo o território nacional,
independentemente do regime de agitação média do mar.
No presente documento é, ainda, apresentado um conjunto de soluções para identificação da crista da
arriba, em contextos morfológicos diversos, baseadas em critérios assentes na uniformidade litológica, na
resistência e no tipo de perfil da vertente costeira. São, ainda, identificados elementos morfológicos particulares
das arribas, nomeadamente os algares, os cones de detritos dos movimentos de massa e as fajãs e apresentada
a respectiva solução para a demarcação da LMPMAVE e da margem. São também analisados e discutidos os
critérios para demarcação da LMPMAVE e da margem nos ambientes confinados, nomeadamente lagunas,
estuários permanentes, estuários temporários e lagoas costeiras, submetidos à inundação periódica das águas
do mar.
Nas praias em que a intervenção humana alterou a morfologia natural, por pisoteio das dunas, através de
alimentação artificial ou na sequência de execução de obras de protecção costeira, o traçado da LMPMAVE
deve reflectir essas alterações e deve ser analisado caso a caso. Para o litoral do Algarve sul são apresentadas
soluções para a identificação da LMPMAVE e dos limites da margem, para todas as praias em que a intervenção
humana alterou o traçado natural da área do domínio público marítimo.
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ÍNDICE
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 1
1.1 Definição jurídica do leito e da margem das águas do mar................................................. 3
1.2 Dúvidas quanto à definição da LMPMAVE …………………………….………………..…….. 4
1.3 Âmbito do presente estudo…. ……………………………….……………………………..…… 7
2. A MORFOLOGIA DA ORLA COSTEIRA DO ALGARVE..................................................................... 11
2.1 Costa Vicentina.................................................................................................................... 12
2.2 Barlavento …………………………………………………………………….……………..……. 16
2.3 Sotavento ………………………………………………….….……………………………..……. 24
3. CONDICIONANTES MORFODINÂMICAS DO LITORAL SUL DO ALGARVE.................................... 37
3.1 Maré……...………................................................................................................................ 37
3.2 Agitação marítima …………………………..……………………………….……………..…….. 38
3.2.1 Condições médias de agitação do mar ……………………………………..…….. 39
3.2.2 As tempestades na costa sul do Algarve ……………………………………..…… 41
3.3 Granulometria das areias das praias.................................................................................... 44
3.4 Inclinação da face da praia …………………………..…………………….……………..…….. 47
4. SOLUÇÕES PARA O CÁLCULO DA ALTURA DO ESPRAIO............................................................ 51
4.1 Definições ……...………....................................................................................................... 51
4.2 Soluções contendo a altura da ondulação ……………………..………………………..…….. 52
4.3 Soluções contendo os parâmetros escalares da ondulação e o declive............................. 55
4.4 Soluções propostas para o litoral sul do Algarve ……………………..………………………. 59
4.4.1 Solução para as praias do litoral sul do Algarve …………………………………. 60
4.4.2 Solução para as arribas ……………………………………..…………………….... 69
4.5 Aplicação da solução para as praias do litoral ocidental..................................................... 73
4.6 Limitações da aplicação das soluções no terreno ……………………..……………………… 75
5. A MATERIALIZAÇÃO DA LMPMAVE NO TERRENO......................................................................... 77
5.1 Os ciclos naturais associados à definição da LMPMAVE................................................... 77
5.2 Praias suportadas por arribas.............................................................................................. 82
5.3 Praias suportadas por dunas…............................................................................................ 88
5.4 Praias acumuladas nas fozes das linhas de água............................................................... 94
5.5 A LMPMAVE em estuários, lagunas e lagoas costeiras...................................................... 97
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1. INTRODUÇÃO
1.1 Localização da área de estudo…………………………....................................................................................... 8
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3.V Características morfodinâmicas médias dos sectores de praias do litoral sul do Algarve……….…………….. 49
7.CONCLUSÕES
7.I Síntese dos critérios utilizados para demarcação da LMPMAVE e da margem das águas do mar …………. 190
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Siglas utilizadas:
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1. INTRODUÇÃO
Nos últimos anos foi publicada uma série de diplomas, que pretendem reflectir na ordem jurídica nacional a
Directiva nº 2000/60/CE, do Parlamento e do Conselho de 23 de Outubro, visando o estabelecimento das bases
e o quadro institucional para a gestão sustentável do domínio hídrico, sucessivamente, a Lei nº 54/2005 de 15 de
Novembro (Lei da Titularidade dos Recursos Hídricos), a Lei nº 58/2005, de 29 de Dezembro (Lei da Água), o
Decreto-Lei nº 226-A/2007, de 31 de Maio (Regime das Utilizações dos Recursos Hídricos) e, mais
recentemente, o Decreto-Lei nº 97/2008 de 11 de Junho (Regime Económico Financeiro), que estabelece o
regime económico e financeiro dos recursos hídricos previsto na Lei nº 58/2005, disciplinando a taxa de recursos
hídricos.
A necessidade de proceder à demarcação do leito e da margem das águas do mar do Algarve tornou-se
premente com a publicação do Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (PROTAL) - Resolução
do Conselho de Ministros nº 102/2007, de 3 de Agosto - que determina expressamente (p. 4996):
“Os organismos e serviços da Administração Central devem estabelecer prioridades de intervenção,
conforme níveis de criticidade, privilegiando o enquadramento de intervenções nos seguintes domínios:
- Cartografia e actualização do cadastro (realizada a uma escala de gestão do território adequada – 1/2000
ou superior) da margem das águas do mar definida na Lei nº 54/2005, de 15 de Novembro, e das faixas de risco
associadas à erosão costeira a ser sujeitas a medidas específicas no âmbito dos instrumentos de gestão
territorial, interditando a construção nestas zonas e equacionando cenários que conduzam à sua desocupação”.
O domínio público hídrico é uma figura de relevância maior, por tanto consagrado na própria Constituição da
República Portuguesa (artº 84º) e definido no artigo 2º da Lei nº 54/2005:
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ARTIGO 2º
(Domínio público hídrico)
1- O domínio público hídrico compreende o domínio público marítimo, o domínio público lacustre e fluvial e
o domínio público das restantes águas.
2- O domínio público hídrico pode pertencer ao Estado, às Regiões Autónomas e aos municípios e
freguesias.
De acordo o disposto no artº 3º da mesma Lei, o domínio público marítimo compreende as águas, os seus
leitos e as suas margens:
ARTIGO 3º
(Domínio público marítimo)
A linha da máxima preia-mar de águas vivas equinociais (LMPMAVE) corresponde a linha notável, definida
na Lei nº 54/2005, coincidente com o limite entre o leito e a margem das águas do mar. Além do seu significado
fisiográfico, como limite superior da área sujeita a influência das marés 1 , esta linha assume ainda carácter de
limite administrativo, decorrente do facto de, na estrutura administrativa e orgânica do Estado, se atribuir as
competências de gestão e licenciamento dos usos e ocupações no leito e na margem a diferentes organismos.
A LMPMAVE não é fisicamente diferente de outras linhas definidas em função dos elementos naturais,
nomeadamente, as linhas do Nível Médio do Mar (NMM) ou do Zero Hidrográfico (ZH) 2 , referências da
cartografia, respectivamente, topográfica e náutica, ou a linha da baixa-mar (entendida como a linha da mínima
baixa-mar equinocial - LMBMAVE) consagrada no Direito Internacional como a linha de base normal (a linha a
partir da qual são estabelecidos os pontos que definem o limite interior do Mar Territorial; Guedes, 1998). Em
1
As áreas sujeitas à influência das marés são entendidas como aquelas que, em qualquer ponto do ciclo de maré (seja
semi-diurno, do mês lunar, do ano solar ou do ciclo nodal lunar), experimentam imersão em consequência da oscilação
periódica da maré. Para o efeito, são tão sujeitas à influência das marés, as praias, arribas e os esteiros diariamente
emersos e submersos, como os andares mais altos dos sapais, sujeitos à imersão durante apenas alguns minutos, na
estofa da máxima preia-mar de águas vivas, ou os canais e os deltas das barras de maré que são descobertos apenas
durante breves instantes na estofa da mínima baixa-mar de águas vivas equinociais.
2 O Zero Hidrográfico (ZH) é um plano convencional situado 2.0m abaixo do Nível Médio do Mar (NMM). Por definição e em
condições normais, este plano está sempre imerso, ficando sempre abaixo da mais baixa baixa-mar equinocial.
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todos os três casos, estas linhas resultam da intersecção de dois planos: o plano das águas do mar em repouso
e a superfície do território continental.
“ARTIGO 10º
(Noção de leito; seus limites)
1. Entende-se por leito o terreno coberto pelas águas, quando não influenciadas por cheias
extraordinárias, inundações ou tempestades. No leito compreendem-se os mouchões, lodeiros e areais
nele formados por deposição aluvial.
2. O leito das águas do mar, bem como das demais águas sujeitas à influência das marés, é limitado pela
linha da máxima preia-mar de águas vivas equinociais. Essa linha é definida, para cada local, em
função do espraiamento das vagas em condições médias de agitação do mar, no primeiro caso, e em
condições de cheias médias, no segundo.
3. O leito das restantes águas é limitado pela linha que corresponder à estrema dos terrenos que as águas
cobrem em condições de cheias médias, sem transbordar para o solo natural, habitualmente enxuto.
Essa linha é definida, conforme os casos, pela aresta da crista superior do talude marginal ou pelo
alinhamento da aresta ou crista do talude molhado das motas, cômoros, valados, tapadas ou muros
marginais”.
ARTIGO 11º
(Noção de margem; sua largura)
1. Entende-se por margem uma faixa de terreno contígua ou sobranceira à linha que limita o leito das
águas.
2. A margem das águas do mar, bem como a das águas navegáveis ou flutuáveis que se encontram à
data da entrada em vigor desta lei sujeitas à jurisdição das autoridades marítimas ou portuárias, tem a
largura de 50m.
3. A margem das restantes águas navegáveis ou flutuáveis tem a largura de 30m.
4. A margem das águas não navegáveis nem flutuáveis, nomeadamente torrentes, barrancos e cónegos
de caudal descontínuo, tem a largura de 10m.
5. Quando tiver natureza de praia em extensão superior à estabelecida nos números anteriores, a
margem estende-se até onde o terreno apresentar tal natureza.
6. A largura da margem conta-se a partir da linha limite do leito. Se, porém, esta linha atingir arribas
alcantiladas, a largura da margem é contada a partir da crista do alcantil.
7. Nas Regiões Autónomas, se a margem atingir uma estrada regional ou municipal existente, a sua
largura só se estende até essa via.” 3
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De acordo com Amaral e Fernandes (1978), até à publicação do Decreto-Lei nº 468/71 a linha da máxima
preia-mar de águas vivas era definida pelo Instituto Hidrográfico (IH) como a intersecção entre a costa e o plano
das águas do mar em repouso na preia-mar das águas vivas equinociais, calculado a partir das constantes
harmónicas da maré de uma zona. Essa linha equivalente à cota +3.80m, ou +3.90m (ZH), correspondia à cota
da preia-mar de uma maré com coeficiente 120, de acordo com as normas adoptadas pelos serviços 4 (op. cit, p.
83 e 85), sem considerar a componente do espraiamento 5 das ondas sobre o litoral.
Volvidas três décadas sobre esta interrogação, num parecer do Director Técnico do IH, de 4 de Novembro
de 2005, solicitado pela Comissão do Domínio Público Marítimo, fica claro que aquele instituto ainda considerava
que LMPMAVE definida no Decreto-Lei nº 468/71 era irresolúvel, nos exactos termos do parecer: “Esta definição
já foi analisada por diversas vezes pelo IH tendo-se sempre concluído pela sua inexactidão técnica e
impraticável definição física por combinar elementos científicos com elementos empíricos”.
Por se considerar relevante para a problemática em causa, transcrevem-se os cinco pontos do parecer que
sustentam a posição do IH:
a) “O termo científico Agitação marítima refere-se à combinação da ondulação (alteração do estado
do mar provocado por fenómenos distantes) e vaga (alteração do estado do mar provocada por
fenómenos locais). No entanto, o legislador refere apenas o espraiamento das vagas para definir a
LMPMAVE.
4
O Coeficiente de maré (C) exprime a relação entre a semi-amplitude de maré e a unidade de altura. Define-se Unidade de
Altura (U) como a semi-amplitude de maré da onda de maré que ocorre após uma sizígia, quando o Sol e a Lua se
encontram no Equador e às suas distâncias médias da Terra. A maré de amplitude média tem coeficiente 70, a maré de
águas vivas tem coeficiente 95 e a maré máxima de águas vivas equinociais tem coeficiente 120 (Fernandes, 1971).
5 Também utilizado o termo “espraio“.
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b) A altura máxima da maré atingida para cada local pode ser estimada por cálculo, dispondo das
constantes harmónicas locais resultantes da força geradora de maré lunar e solar. No entanto, outros
factores existem que afectam a altura da maré realmente atingida em cada momento (pressão
atmosférica e vento). Mesmo considerando que se observam as alturas da maré, na altura de um dado
equinócio (amplitude de maré mais elevada) apenas a observação, em cada local, pode determinar
este parâmetro com precisão.
c) O espraiamento tem sido alvo de modelação por vários autores. As equações definidas são
complexas e entram em conta com a altura da onda em águas pouco profundas, celeridade de
propagação da onda, comprimento da onda e perfil da praia.
d) O declive da praia altera-se nas situações de Verão e Inverno, devido a processos erosivos e
sedimentares.
Apesar das reticências do IH sobre a definição da LMPMAVE, de acordo com o Parecer nº 5833 de 11
Março de 1999, publicado no Boletim da Comissão do Domínio Público Marítimo, para a costa sul de Portugal
Continental, na ausência de outros elementos, no traçado da LMPMAVE deverá ser considerada a cota +3.0m
(NMM), equivalente à cota +5.0m (ZH). Esta orientação foi confirmada através do Despacho Normativo nº
32/2008 de 20 de Junho do Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento
Regional.
Quando, em Outubro de 1995, o signatário iniciou a sua colaboração com o organismo da Administração
Central responsável pela gestão da margem das águas do mar do Algarve (a então Direcção Regional do
Ambiente e Recursos Naturais do Algarve), o primeiro diploma legal que teve oportunidade de conhecer foi o
Decreto-Lei nº 468/71. Para um geólogo costeiro, treinado a olhar o terreno e a ver de perto a dinâmica do litoral,
foi surpreendente verificar que as linhas de maré, sempre identificadas em qualquer estudo sobre dinâmica de
praias e com expressão física no terreno, marcada pela acumulação de detritos transportados pelas ondas,
tinham também interesse jurídico. A LMPMAVE não é mais do que uma linha de maré gerada sob condições de
maré extrema (as marés de águas-vivas equinociais) e sob condições de agitação marítima média.
Ao autor sempre pareceu óbvio que o legislador pretendeu distinguir claramente as parcelas do leito
(periodicamente inundadas) das parcelas da margem (inundadas em condições paroxismais); nos termos do nº 1
do artº 10º da Lei nº 54/2005 “entende-se por leito o terreno coberto pelas águas, quando não influenciadas por
cheias extraordinárias, inundações ou tempestades”. No caso dos rios, o legislador socorreu-se da figura das
cheias médias; para as águas do mar, adoptou a figura do espraiamento das vagas em condições de agitação
média, optando nas duas situações pelo estimador estatístico mais robusto, a média, que minimiza os erros.
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Apesar de ser fisicamente perceptível a visão do legislador subjacente à definição da LMPMAVE, passados
38 anos, desde a sua génese jurídica, o Estado não foi capaz de transpor sistematicamente essa definição para
a realidade no terreno, circunstância que tem criado constrangimentos múltiplos para as entidades responsáveis
pela gestão do domínio público marítimo, resultantes da indefinição dos limites físicos da sua actuação, em
particular nas zonas envolventes das praias, quer em termos de licenciamento dos usos e ocupações, quer em
termos de fiscalização dessa parcela do território. Na opinião do autor, esses constrangimentos radicam,
sobretudo, na dificuldade de compatibilizar a dinâmica natural do litoral com a interpretação tecnicamente literal
dos termos da norma jurídica.
A alínea a) do parecer do IH (v. pág. 4) espelha claramente a rigidez dessa postura, ao focar a semântica
técnica da agitação marítima, distinguindo os termos vaga e onda, como se fossem conceitos estritos e
perfeitamente estanques. Se o legislador pretendesse distinguir os dois termos da agitação marítima, tê-lo-ia
feito, enunciando as definições de ondulação, vaga, ondas e vagas no próprio diploma. Para o signatário sempre
foi óbvio que o legislador tomou como sinónimos as noções de vaga e onda, como decorre das definições
presentes, em qualquer dicionário ou enciclopédia, como, por exemplo, na Grande Enciclopédia Luso-Brasileira:
Aliás, veja-se que os próprios legisladores, no seu comentário ao Decreto-Lei nº 468/71, esclarecem a
noção de vaga transposta no diploma: “Como padrão da expressão física correspondente à agitação média do
mar, considera-se geralmente, nos respectivos serviços, para o litoral Oeste do Continente (do Rio Minho a
Sagres), uma vaga de 2 metros de altura e, no litoral Sul (de Sagres ao Rio Guadiana), uma vaga de 2m ou 1m,
conforme os casos, desenvolvendo-se sobre os citados níveis de +3,8m ou 3.9m (ZH). O espraiamento duma
vaga com a grandeza e as condições indicadas definiria, pois, normalmente o limite do leito do mar” (Amaral e
Fernandes, 1978, p. 86). Qualquer oceanógrafo conhecedor do regime médio do clima de agitação marítima do
litoral de Portugal Continental tem perfeita noção que a altura média das vagas (no sentido físico estrito do
termo) não atinge valores de 2m na costa ocidental.
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condições médias de agitação do mar, ou quando as mesmas se verificaram nunca coincidiram com as marés
equinociais. Sendo pouco provável a coincidência das condições mesológicas definidas na Lei nº 54/2005, o
traçado da LMPMAVE complica-se significativamente com a flutuação sazonal dos areais das praias, já que,
estatisticamente, no equinócio de Março as praias têm menos areia no seu segmento subaéreo e perfis diversos
dos registados durante o equinócio de Setembro, gerando linhas de maré espacialmente distintas.
Tomando literalmente o enunciado da Lei e face às observações colhidas no terreno, os especialistas foram
levados a concluir que a LMPMAVE se altera semestralmente, sendo ainda variável de ano para ano, pelo que a
sua definição é uma equação impossível ou, na melhor hipótese, uma solução com prazo de validade de apenas
seis meses. Esta conclusão está claramente expressa no parecer do IH.
Com o presente estudo pretende-se contribuir para a demarcação dos limites do leito e da margem das
águas do mar no litoral meridional do Algarve, de modo a fornecer os elementos necessários para a delimitação
física da área do domínio público marítimo, entendida como a área sujeita à servidão pública das águas (artº 21º
da Lei nº 54/2005), independentemente da sua propriedade pública ou privada. O documento foi elaborado no
estrito cumprimento do disposto na Portaria nº 394/2008, de 5 de Junho, que aprova os estatutos das
Administrações de Região Hidrográfica, que estabelece na alínea c) do nº 2 do artº 8º do Anexo V, que ao
Departamento de Recursos Hídricos do Litoral da ARH do Algarve cabe, entre outras, a tarefa de “apoiar a
autoridade nacional da água na delimitação do domínio público marítimo”. ”. No entender de Amaral e Fernandes
(1978), “o comando legal do artº 2º do Decreto-Lei nº468/71 de 5 de Novembro é imperativo: aos serviços
compete estudar os meios técnicos adequados para executar da maneira mais aperfeiçoada, já que a
disposição, enquanto estiver em vigor, tem necessariamente de ser cumprida” (op. cit., p. 87).
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O domínio hídrico da franja costeira actualmente sob jurisdição da ARH do Algarve distribui-se ao longo de
cerca de 215 km, repartidos pelo litoral ocidental (45km) e meridional (170km). A franja costeira objecto do
presente relatório incide sobre o litoral sul do Algarve, desde o Cabo S. Vicente, a ocidente, até ao molhe poente
da barra do Guadiana, a nascente, incluindo território de 12 dos 16 municípios da região (fig.1.1). A análise foi
sobretudo centrada na franja costeira sujeita à acção directa da agitação marítima e subsidiariamente nas áreas
temporária ou permanentemente inundadas pelas águas costeiras, nomeadamente, as lagunas, estuários e
lagoas costeiras.
Com uma vasta componente experimental, os resultados apresentados e discutidos no presente documento
baseiam-se numa leitura da Lei nº 54/2005 assente em pressupostos mais abrangentes do que os critérios
técnico-científicos, incluindo a perspectiva de longo prazo de ordenamento do domínio público marítimo e a
gestão sustentável dos recursos hídricos, incompatível com a visão estrita e semestral que norteou a
interpretação dos serviços competentes e consequente incapacidade de aplicação do Decreto-Lei nº 468/71,
ignorando, aliás, as orientações do legislador expressas no comentário à norma jurídica, redigido pelos próprios
autores:
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“ … o intérprete tem o dever de extrair da lei, sem ofensa da sua ratio, conclusões que sejam operacionais,
de modo a emprestar-lhe a eficácia que se exprime por uma acção prática, clara e rápida.
E afigura-se que, se nos agarrássemos cegamente às indicações da realidade física, não poderíamos nunca
actuar naquelas condições, pois a onda-maré pode chegar amanhã 1 ou 2 metros, ou 1 a 2 quilómetros mais
longe… Só um exame rigoroso e semestral (isto é, em cada equinócio) permitiria conhecer os limites dessas
águas em cada momento e, portanto, os limites da jurisdição de cada entidade, o que produziria
necessariamente limites de competência flutuantes, ao sabor das marés. O que se impõe para evitar esta
situação é que as entidades competentes declarem, por forma precisa, como já se fez em relação à jurisdição
das autoridades marítimas, os limites da sua jurisdição.
Estes limites manter-se-ão invariáveis (do mesmo modo que os limites das margens fixados através do
processo de delimitação) (…), salvo modificações importantes das condições físicas que recomendem ou tornem
imperativa uma nova fixação de limites” (Amaral e Fernandes, 1978, p. 70).
O texto foi organizado em sete partes e versa sobretudo sobre a área do domínio hidrico da frente de mar
do litoral sul do Algarve. Na primeira parte, de carácter introdutório, foram expostos os motivos e na segunda é
apresentada a caracterização geral do litoral do Algarve. A terceira parte trata do inventário e caracterização das
condicionantes da morfologia do litoral, nomeadamente, os agentes mesológicos (maré e agitação marítima) e
os parâmetros que condicionam a morfodinâmica das praias (granulometria e inclinação da face da praia). Na
quarta parte é apresentada a solução matemática para o cálculo da altura do espraiamento das ondas, obtida
com base em dados experimentais e válida para o domínio das praias e das arribas não alcantiladas do litoral
meridional do Algarve. Na quinta parte é apresentada e discutida a opção metodológica da solução proposta
para a materialização da LMPMAVE no terreno. A sexta parte trata da definição e sistematização de critérios
para demarcação da margem das águas do mar nos diversos contextos geomorfológicos, Na última parte são
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
apresentadas as conclusões mais relevantes e enunciada a síntese da proposta final para o traçado da margem
das águas do mar no litoral sul do Algarve.
Como elemento auxiliar do texto, sempre que foi julgado útil para a melhor compreensão da matéria em
questão, no presente documento foi incluída uma vasta série de fotografias obtidas pelo signatário no litoral do
Algarve. As fotos são sempre identificadas com a data da sua obtenção. Nos casos em que as fotos têm autoria
diversa, esse facto está devidamente assinalado.
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
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A faixa costeira do Algarve é geomorfologicamente muito diversa, com grande profusão de geoformas, mas
com contraste muito marcado entre três grandes segmentos principais, cujos limites coincidem
aproximadamente com os limites de unidades administrativas da região (fig.2.1) e com os limites das áreas
objecto dos três Planos de Ordenamento da Orla Costeira, actualmente vigentes:
a) a Costa Vicentina inclui a orla costeira dos concelhos de Aljezur e Vila do Bispo e corresponde à
fachada mais exposta do litoral algarvio, onde predominam as formas de erosão, dominadas por arribas
subverticais talhadas em rochas paleozóicas e mesozóicas resistentes;
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b) o Barlavento contém a franja costeira dos concelhos de Lagos, Portimão, Lagoa, Silves e Albufeira,
com morfologia mista e variada, conjugando segmentos de arribas verticais talhadas em rochas
carbonatadas do Miocénico e segmentos de acumulação associados a sistemas estuarino-lagunares
holocénicos, em diferentes estados de colmatação;
c) o Sotavento engloba o litoral dos concelhos de Loulé, Faro, Olhão, Tavira, Castro Marim e Vila Real de
Santo António. Aqui domina a morfologia de acumulação, com barreiras arenosas extensas, onde se
destaca o sistema de ilhas-barreira da Ria Formosa e a planície costeira da Manta Rota-Vila Real de
Santo António.
Figura 2.2 – Vista geral das arribas cortadas em rochas paleozóicas na Costa Vicentina (22 Novembro 2006).
No troço ocidental desta unidade, submetido a regime de agitação marítima mais vigoroso, as arribas, com
alturas variáveis entre 150 e 60m, são essencialmente cortadas em rochas paleozóicas (fig. 2.2), dispostas em
sequências espessas de xistos e vaques. Os testemunhos do litoral de acumulação são muito raros e estão
associados a pequenas reentrâncias que o modelado da erosão costeira moldou ou a fozes de linhas de água.
No primeiro caso, acumulam-se praias, normalmente pequenas e estreitas, com areia fina ou calhau rolado,
suportadas por arribas subverticais (ex: Cordama, Arrifana). No segundo caso, a extensão da praia depende em
grande medida da dimensão da bacia hidrográfica da ribeira que ali desagua. Nas fozes das pequenas ribeiras
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acumulam-se pequenas praias de areia fina (ex: Castelejo, Amado, fig. 2.3). Nas desembocaduras das ribeiras
de maiores dimensões (ribª. Odeceixe, Aljezur, Bordeira, fig.2.4), a morfologia é dominada pela presença de
barreiras arenosas, mais ou menos desenvolvidas, cortadas por barras efémeras e sazonais, que asseguram a
génese e manutenção de estuários na zona vestibular das linhas de água. Frequentemente, as barreiras de
maiores dimensões são coroadas por edifícios dunares com expressão considerável (ex. Amoreira, Bordeira).
a) Praia de Odeceixe (19 Janeiro 2007) b)Praia da Amoreira (22 Novembro 2006)
Figura 2.4 – As praias de Odeceixe e da Amoreira acumuladas, respectivamente, nas fozes das ribeiras de Odeceixe e de
Aljezur.
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Desde a praia do Telheiro, ainda na costa ocidental, até ao Burgau, a morfologia de erosão representada
por arribas subverticais mantém-se, alterando-se a litologia das rochas em que estas vertentes são talhadas.
Trata-se de rochas carbonatadas do Mesozóico, representadas essencialmente por calcários e dolomitos e,
menos frequentemente, por margas. As morfologias de acumulação, geneticamente afins das do troço ocidental,
são representadas por pequenas praias de areia fina, acumuladas nas reentrâncias do contorno irregular das
arribas (Beliche,Tonel, Mareta, Baleeira, Salema, Cabanas Velhas e Burgau, fig.2.6), ou nas fozes das linhas de
água (Barranco, Furnas, Figueira, Ingrina, Zavial e Boca do Rio, fig. 2.7) que drenam para o litoral.
Na zona de Sagres destaca-se uma série de três promontórios resistentes (ponta da Atalaia, ponta de
Sagres e cabo de S. Vicente) cortados em dolomitos, onde as arribas, com cerca de 30 metros de altura,
mergulham até 20m de profundidade. Entre os promontórios do cabo S. Vicente e a ponta de Sagres, acumulam-
se duas praias suportadas por arribas (praia do Beliche e do Tonel), submetidas a regime de agitação marítima
misto, de transição entre o litoral ocidental e meridional (fig.2.8).
De entre este padrão geomorfológico homogéneo, sobressai a baía do Martinhal (fig. 2.9), a leste de
Sagres, que constitui um marco singular na Costa Vicentina. Trata-se de pequena baía com cerca de 800 metros
de comprimento, ancorada em rochas mesozóicas, estável no espaço. O eixo central da baía coincide com a
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várzea colmatada da zona vestibular de pequena linha de água, albergando uma lagoa costeira holocénica já
quase completamente preenchida por sedimentos recentes. A praia de areia que se acumula na baía é
suportada por um sistema dunar contínuo e bem conservado, interrompido na zona onde periodicamente se
rasga a barra por onde escoa o caudal debitado pela linha de água.
Figura 2.8 – Vista de sul para norte da ponta de Sagres, em condições de baixa-mar média (coeficiente de maré 0.85), em
22 Novembro 2006. A leste, a praia da Mareta e, a oeste, a praia do Tonel. Note-se o contraste da agitação marítima
incidente, com rumo de SW, registada nas bóias de Faro e Sines (Hs= 1.7m, na bóia de Sines e Hs=0.3m, na bóia de Faro).
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2.2 O Barlavento
O Barlavento engloba a franja costeira entre a praia do Burgau e a foz da ribeira de Quarteira e corresponde
à unidade central do Algarve, onde se concentra o núcleo da actividade turística da região. Ocupando apenas
cerca de 30% do comprimento total da franja costeira do Algarve, o litoral do Barlavento acolhe 60% dos turistas
que visitam ou utilizam as praias da região. Esta unidade central corresponde a zona de transição, contendo
grande diversidade morfológica, sendo, de entre as três unidades, aquela que maior número de praias oferece.
O sector poente, entre a praia do Burgau e a praia do Canavial, apresenta traços morfológicos afins da Costa
Vicentina, com litoral de arriba talhada em rochas cretácicas que suportam praias relativamente estreitas,
embora mais compridas (Luz e Porto de Mós) do que as praias típicas da primeira unidade (fig. 2.10).
Para leste da praia do Canavial (Lagos) e até Olhos de Água (Albufeira), o traço dominante é dado por
arribas amarelas, com alturas variáveis entre 6 e 40m, talhadas em calcarenitos miocénicos, intensamente
fracturados e carsificados, sobre os quais assenta uma cobertura plio-plistocénica de areias argilosas vermelhas.
A expressão e espessura desta cobertura varia ao longo do litoral; nuns sectores está confinada ao
preenchimento do carso, noutros constitui parte significativa da própria arriba. O recorte irregular da erosão
costeira, actuando sobre a variação espacial das cavidades cársicas, confere a este litoral um modelado muito
rendilhado, com profusão de leixões, arcos, furnas e algares, explorado como imagem de marca da paisagem do
litoral do Algarve.
O modelado recortado deste troço do litoral promove a acumulação de dezenas de praias, com dimensões
variáveis, algumas sem acesso por terra. O troço do litoral do concelho de Lagos, entre a ponta da Piedade e
Lagos, o troço central do litoral de Portimão, entre Alvor e a praia do Barranco das Canas (fig. 2.17), todo o litoral
de Lagoa (fig. 2.12) e o litoral de Albufeira, entre a Galé e Olhos de Água (fig. 2.14) estão polvilhados de
pequenas praias, disseminadas pelas reentrâncias destas arribas amarelas, contidas entre pontais resistentes
(fig. 2.11) ou acumuladas na dependência das fozes de pequenas linhas de água que desaguam no litoral.
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j) Praia Nova 20 Julho 2007 k)Senhora da Rocha 20 Julho 2007 l) Cova Redonda 20 Julho 2007
m) Beijinhos 21 Junho 2006 n) Galé Leste 20 Julho 2007 o) Manuel Lourenço 21 Junho 2006
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Figura 2.12 – Localização das praias encaixadas do concelho de Lagoa. Não estão assinaladas as praias sem acesso por
terra.
Figura 2.13 - Sector oriental do litoral do concelho de Albufeira (2 Agosto 2006), onde se destaca uma sucessão de
promontórios e pontais que favorecem a deposição de praias de dimensões variáveis.
A evolução das arribas amarelas do Barlavento processa-se segundo uma sequência descontínua e
intermitente de movimentos de massa que se revestem de múltiplas formas, desde os grandes movimentos
associados ao colapso de cavidades cársicas, que podem deslocar dezenas de milhares de metros cúbicos, com
recuos instantâneos locais de mais de uma dezena de metros, ao simples desprendimento de pequenos blocos
decimétricos. Em média, anualmente 0.2% desta frente costeira é afectada por movimentos de massa (Marques,
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1994, 1997a; Teixeira, 2004, 2006). Os produtos dos movimentos de massa acumulados na base das arribas
são, regra geral, rapidamente remobilizados pela acção directa da ondulação, constituindo fonte sedimentar
importante das praias, podendo permanecer no sopé das vertentes alguns blocos mais resistentes, por períodos
de décadas.
A geodinâmica natural das arribas e o modelo de ocupação turística do Barlavento determinam a existência
de risco quer para os utentes das praias por elas suportadas, quer para as estruturas implantadas no topo das
costeiras, quer ainda para embarcações que naveguem junto à costa. O regulamento do Plano de Ordenamento
da Orla Costeira Burgau-Vilamoura define especificamente a largura das faixas de risco associadas à
geodinâmica das arribas em todo o litoral abrangido por aquele Plano.
Figura 2.14 – Localização das praias entre a baía de Armação de Pêra e a foz da ribeira de Quarteira.
Figura 2.15 - O litoral de arriba arenosa da praia da Falésia (21 Junho 2006).
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Para leste de Olhos de Água, a morfologia do litoral altera-se bruscamente. A um litoral de arriba rochosa
sucede um litoral de arriba branda arenosa, moldada em arenitos argilosos vermelhos e areias brancas, numa
extensão de cerca de cinco quilómetros (fig. 2.15 e 2.16). Esta vertente, que chega a atingir 40 metros de altura,
suporta um areal contínuo acumulado na sua base, alimentado e mantido à custa da erosão da própria arriba,
que recuou a taxas médias de 0.35m/ano nas últimas décadas (Marques, 1997a). A evolução desta arriba
processa-se sobretudo através de sequências de movimentos de massa, complementadas com a acção da
erosão subaérea que promove o ravinamento da face da escarpa, gerando a deposição de cones de dejecção
na base da vertente. A remoção dos cones de dejecção acumulados na base da arriba pela acção do espraio
das ondas, que acontece de forma episódica, permite a introdução intermitente de areia na praia, alimentando o
circuito sedimentar, com saldo residual do transporte para nascente.
A arriba arenosa da praia da Falésia prolonga-se até à barreira da ribeira de Quarteira, interrompida pelos
molhes de acesso da marina de Vilamoura. A construção destes molhes, na década de 1970, favoreceu a
deposição do extenso areal da praia da Rocha Baixinha Leste, cujo prisma de enchimento atinge uma extensão
de quase dois quilómetros a barlamar dos molhes. Esta acumulação de areia, artificialmente imposta, possibilitou
a génese e desenvolvimento de um cordão dunar, que se prolonga desde o molhe nascente da marina de
Vilamoura e progride já na base do extremo leste das arribas arenosas da praia da Rocha Baixinha. Além desta
zona dunar, de acumulação recente, o litoral do Barlavento contém outras duas, mais expressivas, acumuladas
em baías de dimensões consideráveis: a baía de Lagos (fig.2.17) e a baía de Armação de Pêra (fig. 2.20),
ancoradas em cabos, talhados nos calcarenitos miocénicos.
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A baía de Lagos constitui acidente geomorfológico notável, correspondendo, a par com a baía de Armação
de Pêra, a um dos raros retalhos de litoral de acumulação do Barlavento do Algarve. Trata-se de ampla baía,
ancorada nas arribas carbonatadas das pontas da Piedade e de João de Arens, onde se acumula praia contínua,
ao longo de cerca de oito quilómetros, desde a barra de Lagos, a poente, até à praia da Rocha, a nascente. No
eixo da baía, o cordão arenoso suportado por dunas litorais, corresponde à barreira do sistema lagunar da Ria
de Alvor, cuja comunicação com o mar é assegurada por uma barra de maré fixada com dois molhes construídos
em 1992 (fig.2.17). Esta barra coincide com o limite dos concelhos de Portimão e Lagos, individualizando dois
extensos areais: a praia de Alvor, a nascente, e a Meia Praia, a poente.
O espaço lagunar da Ria de Alvor ocupa uma superfície de cerca de 3.5 km2, a maior parte da qual incluída
na faixa de oscilação da maré, experimentando imersão periódica (fig. 2.18). O corpo principal da laguna, com
cerca de 3km de comprimento, desenvolve-se paralelamente ao litoral e articula-se com dois canais de direcção
meridiana, que asseguram a transição para o sistema fluvial. A Ria de Alvor é receptáculo dos produtos de
drenagem de quatro bacias hidrográficas, de poente, para nascente, as bacias das ribeiras de Odeáxere, Arão,
Farelo e Torre, que no seu conjunto ocupam superfície de 250 km2 (Cabral et al., 1989). Estas ribeiras têm
desenvolvimento meridiano e as suas cabeceiras localizam-se nas serras de Espinhaço de Cão e Monchique,
onde se registam os mais elevados níveis de precipitação do Algarve. À semelhança da generalidade dos
sistemas lagunares do litoral meridional de Portugal, a barreira que individualiza a Ria de Alvor é de génese
tardi-holócenica (veja-se, por exemplo, Freitas e Andrade, 1998; Freitas et al., 2003; Teixeira, 2005). Os
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documentos históricos comprovam que no berço da nacionalidade já laboravam marinhas em Alvor (Lopes,
1841) e, de acordo com a análise apresentada por Marques e Romariz (1989) e Pereira et al. (1994), no século
XVII a barreira já estava formada.
Figura 2.18 - A Ria de Alvor e as praias de Alvor e Meia Praia, em 20 de Julho de 2007.
Figura 2.19 – O litoral do concelho de Portimão e o estuário do rio Arade, em 20 de Julho de 2007.
Na baía de Lagos merece destaque, ainda, o troço entre a praia do Vau e a praia da Rocha (fig. 2.19), um
dos pólos turísticos mais importantes do Algarve, pela frequência e eficácia das intervenções de alimentação
artificial das praias, que remontam ao início da década de 1970, com sedimentos dragados do estuário e barra
do rio Arade. Desta série de intervenções resultou a criação de praias amplas e a redução muito significativa do
risco de erosão costeira associada à evolução das arribas que suportam as mesmas praias.
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A baía de Armação de Pêra corresponde a ampla baía zeta, onde se acumula praia contínua, que se
desenvolve ao longo de cerca de seis quilómetros, interrompida pelas fozes temporárias das ribeiras de
Alcantarilha e Espiche (fig. 2.20). As praias da baía de Armação de Pêra são suportadas por robusto campo
dunar activo, que fossiliza paleolitoral tardi-holocénico, testemunhado pela presença de afloramentos de rochas
de praia que ocorrem junto à foz da ribeira de Alcantarilha e na Galé, que comprovam o contorno e a
estabilidade do litoral desde há cerca de 3000 anos (Pereira e Soares, 1994; Teixeira, 1999; Teixeira e Pinto,
2002). O areal da baía é sensível a alterações do clima de agitação marítima, à escala da década, sofrendo
rotação pendular de que resulta ora acumulação no extremo leste da baía e erosão no extremo oposto, ou o
movimento inverso (Pinto e Teixeira, 2003, 2005). Em consequência deste processo, a arriba da praia da Galé,
localizada no extremo leste da baía, experimenta processo erosivo desde as últimas décadas.
A enseada de Armação de Pêra é receptáculo dos produtos de drenagem das bacias hidrográficas de
Alcantarilha e Espiche, que drenam superfícies, respectivamente, de 204 e 41km2. As zonas vestibulares destas
linhas de água exibem morfologias afins das lagoas costeiras, correspondendo a estados terminais de
colmatação de sistemas estuarino-lagunares holocénicos, actualmente mantidos isolados do meio marinho
devido à presença de barreiras arenosas contínuas, que funcionam como estruturas de contenção do caudal
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fluvial descarregado pelas respectivas bacias hidrográficas. A comunicação entre estas zonas húmidas e o mar
processa-se ou artificialmente, mediante a abertura de uma barra, ou naturalmente, quando o plano de água nas
várzeas ultrapassa a cota da barreira, rasgando uma barra e permitindo o escoamento, em poucas horas, do
caudal acumulado. A barra aberta é rápida e naturalmente colmatada, num período que, via de regra, não
ultrapassa as duas a três semanas.
Figura 2.21 - Baía de Armação de Pêra em 10 de Julho de 2006. Em primeiro plano, o limite nascente da zona urbana de
Armação de Pêra e ao fundo a mancha urbana da Galé. Os dois planos de água correspondem às zonas molhadas das
várzeas da ribeira de Alcantarilha e da lagoa dos Salgados.
2.3 O Sotavento
Ao contrário das unidades anteriores, em que predominam as morfologias de erosão, no Sotavento
predominam as formas de acumulação, integradas em dois troços distintos mas com continuidade física: o
sistema de ilhas-barreira da Ria Formosa e a planície costeira da Manta Rota-Vila Real de Santo António. As
arribas litorais activas só existem no troço poente do Sotavento, no sector do litoral de Quarteira.
O litoral de Quarteira (fig. 2.22) faz parte de célula de circulação sedimentar, que se estende desde Olhos
de Água (Albufeira) até ao cabo de Santa Maria (Faro), em que o sentido do transporte se processa de oeste
para leste. Essa célula é alimentada e mantida, sobretudo, à custa das areias produzidas pela erosão das
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arribas arenosas e, secundariamente, pelos sedimentos transportados pelas linhas de água que drenam para o
litoral. A ribeira de Quarteira constitui contribuinte sedimentar notável na área de estudo, sendo responsável por
cerca de 80% do débito sólido fluvial que aflui ao litoral, estimado em 200.000m3/ano, dos quais cerca de 5-10%
correspondem a sedimentos areno-cascalhentos (Andrade, 1990; Teixeira, 1999/2000). A introdução intermitente
de areias no sistema assegura a permanência de um areal contínuo ao longo de todo este troço costeiro,
interrompido de forma episódica ou perene nas fozes das linhas de água que ali desaguam ou nas barras de
maré do sistema de ilhas-barreira da Ria Formosa.
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processa-se de forma intermitente e esporádica, quer associada aos episódios de galgamento da barreira
durante a ocorrência de ondulação de tempestade, quer durante os curtos períodos de comunicação com o mar,
quando o plano de inundação da várzea ultrapassa o plano do raso de barreira, rasgando barra efémera.
Figura 2.23 - A arriba do Forte Novo, em 2 Agosto de 2006. Note-se, na zona imersa, as ruínas do forte, destruído no final
da década de 1970, em consequência do recuo da arriba. No lado direito da foto, o plano de água da lagoa costeira de
Almargem.
A magnitude da erosão sentida no litoral de Quarteira foi avaliada por diversos autores (veja-se, por
exemplo, Marques, 1991, 1997; Correia et al., 1994, 1995; Oliveira et al., 2003; Oliveira, 2005) que, mediante
comparação fotográfica e restituição fotogramétrica, concluiram que, anteriormente à execução das obras de
engenharia costeira de Vilamoura/Quarteira, as taxas de recuo das arribas atingiram valores da ordem de 0.20-
0.80m/ano, havendo sofrido aumento imediatamente após a construção daquele conjunto de estruturas de
retenção executado durante a década de 1970. A construção dos molhes da marina de Vilamoura, assim como
do campo de esporões de Quarteira, induziu incremento da erosão a sotamar das obras, gerando uma onda de
erosão que se propagou no sentido do transporte longilitoral (de oeste para leste). De acordo com os resultados
publicados na bibliografia (Consulmar, 1995; Marques, 1997a; Hidroprojecto, 1998) o pico de erosão (a crista da
onda de erosão) foi sentido nas arribas do Forte Novo (fig. 2.23) a partir de 1974, imediatamente após a
construção das estruturas, passou na zona do Trafal durante a década de 1980, varreu o litoral de Vale de Lobo
entre 1983 e 1990 e atingiu o Garrão entre 1990 e 1993, reduzindo progressivamente a sua intensidade de
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poente para nascente. A evolução temporal das taxas de recuo da totalidade do troço costeiro entre Quarteira e
o Garrão nas últimas décadas (fig. 2.24) mostra claramente o efeito do incremento da erosão associado à
construção das obras marítimas. No sentido de, localmente, atenuar a erosão costeira sentida nas arribas de
Vale do Lobo, foram já executadas duas intervenções de alimentação artificial da praia: uma primeira, em 1998,
e uma segunda, em 2006 (fig. 2.25).
2,5
Correia (1996)
taxa de recuo (m/ano)
1,0
0,5
0,0
1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010
ano
Figura 2.24 – Evolução das taxas de recuo do litoral entre Quarteira e o Garrão, entre 1958 e 2001.
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Para leste do Garrão, na zona do Ancão, o litoral é essencialmente arenoso, suportado por robusto sistema
dunar, que faz a transição para a península ocidental do sistema de ilhas-barreira da Ria Formosa. O sistema da
Ria Formosa constitui a unidade morfológica dominante no Sotavento. Corresponde a um sistema de ilhas-
barreira que engloba duas penínsulas: do Ancão, a oeste, e de Cacela, a leste e um conjunto de cinco ilhas-
barreira (sucessivamente, de poente para nascente, Barreta, Culatra, Armona, Tavira e Cabanas),
individualizadas por seis barras de maré (sucessivamente, no mesmo sentido, Ancão (fig. 2.27), Faro-Olhão,
Armona, Fuzeta, Tavira e Lacem). As barras de Faro-Olhão e de Tavira estão actualmente fixadas por estruturas
rígidas, enquanto que as restantes mantêm a sua evolução natural, apesar de na última década se haver
procedido à relocalização artificial da barra do Ancão, em 1997, e da barra da Fuzeta, em 1999.
O sistema de barreiras arenosas protege e assegura a manutenção de extenso sistema lagunar, com uma
superfície total de 84km2 e profundidade média de 2 metros (Andrade, 1990). Em marés de águas vivas, a
laguna é inundada por prisma de maré que atinge 135 Mm3, renovando mais de três quartos da água contida no
sistema (Andrade, 1990). A laguna contém a diversidade morfológica característica destes sistemas, com
ambientes de sapal, rasos de maré, canais de maré, deltas de maré, que proporcionam grande variabilidade de
andares de imersão/emersão e, consequentemente, elevada diversidade de habitats.
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A dinâmica do sistema de ilhas-barreira é complexa e nela intervêm três vectores principais que interagem
entre si: a dinâmica sedimentar costeira, a dinâmica das barras de maré e a intervenção humana. A comparação
de diversos documentos cartográficos e fotográficos do último século mostra que a localização e o número de
barras de maré (e consequentemente o número de ilhas-barreira) da Ria Formosa tem sofrido grandes
alterações (Andrade, 1990; Bettencourt, 1994; Vila-Concejo et al., 2002).
Figura 2.27 - O sector poente da Ria Formosa, em 2 de Agosto de 2006, na baixa-mar de águas mortas. Ao fundo, a
península do Ancão e a barra nova do Ancão, aberta artificialmente em 1997.
O sector ocidental, exposto à ondulação de rumo dominante, entre o Ancão e a barra de Faro/Olhão,
corresponde a um troço bastante condicionado pelas fontes sedimentares localizadas a poente (os produtos da
erosão das arribas do troço entre a praia da Falésia e o Garrão) e pelos processos sedimentares de natureza
transversal. A barreira da península de Faro, constituída por uma praia e um único cordão dunar, é
extremamente sensível aos processos erosivos, incluindo os de natureza transversal como galgamentos e
variação sazonais do perfil de praia (Andrade, 1990; Matias, 2006), de que tem resultado a destruição de
algumas construções e a execução de obras de contenção de emergência. Neste sector incluem-se as barras do
Ancão e de Faro-Olhão. A primeira, natural e divagante, em avançado estado de assoreamento, foi aberta
artificialmente em 1997, sofrendo uma evolução extremamente rápida (Vila-Concejo et al., 2002). A segunda,
corresponde a barra de maré artificial aberta em 1927 e concluída em 1955 (Esaguy, 1986). A construção dos
molhes que fixaram a barra de Faro-Olhão introduziu uma série de alterações no sistema que ainda hoje
persistem. A implantação de estruturas rígidas originou alteração no balanço sedimentar das praias adjacentes,
com erosão a sotamar e acumulação a barlamar (fig. 2.28). O canal da barra aprofundou-se drasticamente,
atingindo actualmente mais de 40m de profundidade. O aumento da secção da barra originou um aumento da
capacidade de escoamento de tal forma que as restantes barras do sistema, em particular a barra da Armona
29
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
(até então a barra mais importante), foram subalternizadas (Andrade, 1990), adquirindo tendência para o
assoreamento.
Figura 2.28- Barra de Faro-Olhão, em 2 de Agosto de 2006, com contraste do enchimento sedimentar acumulado nos dois
molhes.
Figura 2.29 – Localização das praias da península do Ancão e das ilhas da Barreta, Culatra e Armona.
30
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
A ilha da Culatra (fig. 2.30) é aquela em que as alterações do traçado em planta são mais significativas,
havendo triplicado a sua extensão no último século, através de crescimento de sucessivas cristas de praia
(Andrade, 1998), que foram incorporando os sedimentos libertados pelo delta de maré da barra da Armona
(Andrade, 1990). O bloqueamento da deriva litoral, induzido pelos molhes da barra de Faro-Olhão, desencadeou
a erosão na praia do Farol, obrigando à construção de estruturas de defesa costeira.
Figura 2.30 - Extremo nascente da ilha da Culatra e barra da Armona em preia-mar de águas vivas equinociais, em 28 de
Setembro de 2007.
O sector que contém as ilhas da Armona e de Tavira é o sector com maior estabilidade, com alterações
associadas à dinâmica e divagação da barra da Fuzeta (fig. 2.31). Nos últimos 60 anos, a barra da Fuzeta
migrou para leste dentro de uma franja de mais de 3000m (Andrade, 1990; Vila Concejo et al., 2006). A evolução
da Ilha de Tavira mostra relativa estabilidade, e uma tendência de acumulação no seu extremo nascente
associada ao efeito obstáculo induzido pelo molhe poente da barra de Tavira (Hidroprojecto, 1998).
31
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Figura 2.32 - A barra de Tavira, em 2 de Agosto de 2006, com grande contraste entre o extremo leste da ilha de Tavira,
robusto e bem vegetado, e o limite ocidental da ilha de Cabanas, estreito e com vegetação muito escassa
O troço contido entre a barra de Tavira e a barra do Lacem sofreu uma evolução muito rápida, com uma
sequência de transformações fisiográficas importantes. A barra de Tavira foi aberta artificialmente entre 1930-
1935, mas o seu assoreamento obrigou a nova abertura em 1961 e ao prolongamento dos molhes, cujos
trabalhos terminaram em 1977 (Esaguy, 1987) e provocaram um balanço sedimentar com acumulação de areias
de encontro ao molhe oeste e a erosão no limite oeste da ilha de Cabanas (fig. 2.32). Actualmente, a barra de
Tavira tende para o assoreamento (Hidroprojecto, 1998), sendo objecto de operações de dragagem frequentes.
32
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Com evolução recente, dependente das alterações verificadas na ilha de Cabanas, a península de Cacela,
estreita e com sistemas dunares incipientes, sofreu alterações significativas recentes. Com equilíbrio precário, a
península de Cacela é, desde o início dos anos 1950, literalmente varrida pela migração de barras de maré. No
inverno de 95/96, na sequência de ocorrência de ondulação de tempestade, foi naturalmente rasgada uma barra
em frente à povoação da fábrica (Dias et al., 1997) e, em 2003, foi aberta uma nova barra artificial (Vila-Concejo
et al., 2006) junto ao sítio do Lacem (fig. 2.33). As alterações experimentadas na península de Cacela reflectem-
se, ainda, para nascente, na praia da Manta Rota, que sofreu alterações muito significativas nos últimos 50 anos,
traduzidas na acumulação de extensos edifícios dunares (Rebelo, 2004).
33
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Para leste da Manta Rota e até à foz do Guadiana (figs. 2.35, 2.36), o litoral é dominado por praias de areia
fina suportadas por cordões dunares, regra geral estáveis, com largura considerável e bem conservados. Este
troço caracteriza-se pela sua estabilidade ou tendência para acumulação à custa da deposição dos sedimentos
provenientes de poente por deriva litoral, devido à pronunciada reorientação direccional que o litoral exibe para
leste da raiz de barreira de Cacela. O troço final do Sotavento caracteriza-se por intensa acumulação de areias,
retidas pelo molhe poente da barra do Guadiana (fig. 2.36) concluído em 1976 (Dias et al., 1998).
Figura 2.36 - O limite nascente da faixa costeira do Algarve, em 2 de Agosto de 2006. Ao fundo, junto ao litoral, a zona
urbana de Monte Gordo.
34
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A proximidade da bacia hidrográfica do Rio Guadiana e o extenso campo dunar que suporta o litoral para
nascente da Ria Formosa, restringem o escoamento fluvial directamente no mar. Desta conjugação de factores
resulta que as linhas de água que desaguam directamente no mar são muito raras, resumindo-se às fozes de
duas pequenas ribeiras: a ribeiras do Álamo, que desagua na zona poente da praia da Altura (fig. 2.37) e a
ribeira do Vale Põe Água, que desagua entre as praias da Altura e Verde (fig. 2.38). Na foz desta última ribeira
foi recentemente construído um emissário submarino, sob as dunas, que assegura a descarga fluvial
directamente para a zona submarina da praia, sem rompimento da barreira.
35
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
36
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Sendo a LMPMAVE uma linha de maré gerada em águas vivas equinociais sob condições médias de
agitação marítima, interessa conhecer e quantificar dois grupos de parâmetros que condicionam a expressão
física dessa linha no terreno, associados, por um lado, aos agentes modeladores do litoral, nomeadamente a
maré e a agitação marítima e, por outro, às características morfodinâmicos das praias, em particular o declive da
face da praia e a granulometria das areias que a constituem.
3.1 Maré
O regime de maré na costa do sul do Algarve é do tipo semi-diurno, com amplitudes médias de cerca de 2m.
Como se pode verificar na figura 3.1, que reproduz os níveis da máxima preia-mar diária previstos nas tabelas
de maré para o porto de Lagos, num período de 5 anos (1997 a 2001), a cota da máxima preia-mar de águas
vivas equinociais (MPMAVE) é de +3.9m acima do Zero Hidrográfico. No entanto e face à informação constante
das mesmas tabelas de maré, que alerta para o facto de “dado que o plano do Zero Hidrográfico (Z.H.) foi fixado
em relação a níveis médios adoptados há várias décadas, existe presentemente uma diferença sistemática de
cerca de +10 centímetros entre as alturas de água e as alturas de maré previstas”, deve adoptar-se a cota da
máxima preia-mar de águas vivas equinociais (MPMAVE) correspondente ao plano de +4.0m (ZH). A taxa de
elevação recente do nível médio do mar (NMM) foi quantificada por Dias e Taborda (1988), com base nos
registos do marégrafo de Lagos, entre 1908 e 1987, com valores médios de 1.5mm/ano, atribuída à expansão
térmica do oceano.
Utilizando os elementos de maré obtidos pelo Instituto Hidrográfico através de observação instrumental para
diversos pontos do litoral sul do Algarve para o cálculo da máxima maré equinocial (a maré com coeficiente 120,
v. capítulo 1), obtém-se o mesmo valor para a MPMAVE (Quadro 3.I). Note-se que a variação das cotas da
MPMAVE estimadas através da Unidade de Altura não excede 7 cm ao longo do litoral sul do Algarve, sendo
inferiores à precisão associada aos levantamentos topográficos efectuados nas praias (10 cm).
Para o objectivo do presente trabalho considera-se, pelo exposto, que a cota da MPMAVE é constante ao
longo da frente de mar do litoral sul do Algarve e corresponde à cota +4.0m (ZH), equivalente à cota +2.0m
(NMM).
37
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4,0
cota da máxima preia-mar diária (m-ZH)
3,8
3,6
3,4 1997
3,2 1998
3,0 1999
2,8 2000
2,6 2001
2,4
2,2
2,0
01-Jan
01-Jun
01-Nov
01-Dez
01-Mai
01-Jul
01-Mar
01-Fev
01-Ago
01-Set
01-Out
01-Abr
dia
Figura 3.1 – Séries da cota da máxima preia-mar diária prevista nas tabelas de maré, publicadas anualmente pelo Instituto
Hidrográfico para o porto de Lagos, entre 1997 e 2001.
38
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Relativamente ao litoral sul, existem actualmente duas séries de dados de registos das condições de
agitação marítima, obtidos em bóias ondógrafos fundeadas ao largo de Faro. Uma, mais antiga, que cobre o
intervalo entre 1976 e 1980 (Pessanha e Pires, 1981) e outra com registos recolhidos entre 1986 e 2000 (Costa
et al., 2001). Apesar do intervalo relativamente longo de aquisição de dados, as séries de registo contêm
apenas, respectivamente, 59% e 64% de registos válidos. No Quadro 3.III estão inscritos os valores médios dos
parâmetros escalares da agitação marítima da série mais longa e na figura 3.2 representam-se os histogramas
de frequências dos mesmos parâmetros.
Quadro 3.II – Valores médios anuais dos parâmetros escalares da agitação marítima ao largo do litoral de
Portugal Continental (Costa et al., 2001)
Local Hs (m) T0 (s) Tp (s) Tmáx (s) Período de dados
Figueira da Foz 2.2 7.2 11.4 14.2 Jul 1990-Jan 1996
Sines 1.7 6.6 10.8 13.8 Mai 1988-Dez 2000
Faro 1.0 4.7 8.2 11.1 Set 1986-Dez 2000
Hs – altura significativa; T0 – período médio; Tp – período de pico; Tmáx - período máximo
Quadro 3.III – Valores médios dos parâmetros escalares da agitação marítima obtidos em bóias
ondógrafos fundeadas ao largo de Faro
Hs (m) T0 (s) Tp (s) Período de dados Refª
Média anual 0.93 4.8 8.5 Set 1976-Jul 1980 1
Média anual 1.0 4.7 8.2 Set 1986-Dez 2000 2
Média Setembro 0.8 4.7 7.7 Set 1986-Dez 2000 2
Média Março 1.1 5.3 9.3 Set 1986-Dez 2000 2
Média meses de Equinócio 0.95 5.0 8.5 Set 1986-Dez2000
(1) Pessanha e Pires (1981); Costa et al., (2001).
39
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Do enunciado do referido nº 2 do artigo 10º da Lei nº 54/2005, não se afigura claro se as condições médias
de agitação se referem a condições médias anuais, ou às condições médias registadas na altura dos equinócios.
Os resultados expressos no quadro 3.III mostram que as condições médias de agitação marítima durante os
meses dos equinócios (Setembro e Março) não diferem significativamente das condições médias anuais, sendo
essas diferenças da mesma ordem das diferenças verificadas entre as médias anuais obtidas a partir das duas
séries de dados (1976-1980 e 1986-2000). Desta verificação resulta que, com base nos dados actualmente
disponíveis, se pode considerar que no litoral sul do Algarve as condições médias anuais de agitação marítima
ao largo são idênticas às condições médias de agitação ao largo verificadas durante os meses dos equinócios.
Face a esta verificação, optou-se por utilizar os valores médios anuais publicados por Costa et al. (2001), que
correspondem a observação por um período mais longo, como representativos das condições médias de
agitação do mar no litoral sul, conforme enunciado no nº 2 do artigo 10º da Lei nº 54/2005.
.
Relativamente ao rumo da ondulação, o regime de agitação marítima sentido no litoral sul do Algarve é
marcadamente bimodal (fig. 3.3), reflectindo a sua posição charneira sujeita à influência atlântica e
mediterrânica. A agitação marítima predominante é gerada no oceano Atlântico, atingindo o Algarve com rumos
de W ou SW que em conjunto apresentam cerca de três quartos das ocorrências. Os rumos de E e SE
representam cerca de um quarto da agitação marítima registada e estão associados ao vento de leste, gerado
na zona do Estreito de Gibraltar (Pires, 1989). A agitação marítima proveniente do quadrante sul é relativamente
rara, com uma frequência anual de cerca de 2%.
Figura 3.3 – Distribuição da frequência relativa (%) dos rumos da agitação marítima obtida na bóia fundeada ao largo de
Faro, no período 1986-2000 (Costa et al., 2001).
40
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A própria definição de tempestade não é uniforme nos diferentes ramos do conhecimento, variando em
função da perspectiva da análise ou da sua finalidade. Por exemplo, Carvalho (2004) considerou que para o
litoral sul de Portugal Continental, a agitação marítima de tempestade corresponde aos registos de altura
significativa igual ou superior a 2.0m que ali representam, de acordo como os critérios do Instituto de
Meteorologia, o limiar para os avisos de mau tempo. Já Costa et al. (2001) consideraram as tempestades na
costa sul apenas como as ocorrências de altura significativa igual a superior a 3.5m, quando as bóias procedem
a aquisição de dados de forma quase contínua. No estudo das variações morfológicas das praias do Algarve
meridional, Teixeira et al. (1989) e Teixeira e Macedo (2001) verificaram que o valor da altura significativa a que
corresponde a alteração significativa do perfil de praia coincide com o patamar de 2.5m, utilizando este limiar
como representativo da agitação marítima de tempestade.
Como atrás referido, as séries de dados colhidas nas bóias ondógrafos padecem de lacunas de aquisição o
que compromete a análise de temporal de fenómenos extremos, como as tempestades. Para suprir esta
deficiência e no sentido de obter uma série temporal contínua, Carvalho (2004) procedeu à reconstituição do
regime de agitação marítima no litoral sul do Algarve, utilizando modelo numérico e a série dos dados de vento
num período de 14 anos (1989-2002), tendo concluído que a frequência da agitação marítima com altura igual ou
superior a 2m, nesse período, foi de 76 dias por ano (28 temporais com duração média de 65 horas). Para o
limiar de 6m de altura significativa, a frequência anual foi de 0.54 dias (1 temporal por ano, com duração média
de 13 horas).
No sentido de obter uma série temporal mais longa, foi utilizada a série de previsões de agitação marítima
do Boletim Meteorológico, diariamente publicado pelo Instituto de Meteorológica e contendo informação
quantitativa sistemática sobre a altura significativa da ondulação desde 1976. A série temporal utilizada,
referente a previsões de altura significativa igual ou superior a 2.5m, incorpora um período de 32 anos, entre os
anos hidrológicos de 1976/77 e 2008/2009 6 , inclui 880 dias de tempestade, a que corresponde uma frequência
anual média de 27.5 dias por ano. A projecção dos dados das frequências acumuladas ordenadas ajusta-se
muito satisfatoriamente a uma distribuição logarítmica e é compatível com os dados encontrados por Carvalho
(2004) para um intervalo temporal de 14 anos (fig. 3.4).
41
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
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A série evidencia grande variabilidade plurianual no regime de tempestividade e esboça uma tendência
ténue para o incremento dos dias de tempestade anual e uma tendência mais forte para o aumento da duração
das tempestades (fig. 3.5). Estes resultados corroboram o padrão de incremento recente do regime de
tempestividade já identificado para o litoral ocidental (Andrade et al., 1996).
10
0,20
y = 4,89x
altura significativa (m)
2
R = 0,99
presente trabalho
Carvalho (2004)
1
0,01 0,10 1,00 10,00
período de retorno (ano)
Figura 3.4 – Distribuição conjunta altura significativa e período de retorno, baseada na série de previsões de 32 anos do
Boletim Meteorológico Diário.
60 4,5
4,0
duração média das tempestades (dias)
50
3,5
nº de tempestades por ano
nº de dias de tempestade
40 3,0
2,5
30
2,0
20 1,5
1,0
10
0,5
0 0,0
1976/77
1978/79
1980/81
1982/83
1984/85
1986/87
1988/89
1990/91
1992/93
1994/95
1996/97
1998/99
2000/01
2002/03
2004/05
2006/07
2008/09
ano hidrológico
Figura 3.5 – Distribuição temporal da frequência de tempestades (Hs≥2.5m) previstas no litoral sul do Algarve, no Boletim
Meteorológico Diário entre 1976/77 e 2008/09.
42
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Analisando apenas as tempestades extremas (Hs≥5m), com período de retorno superior a um ano, a série
utilizada revela, mais uma vez, o incremento recente da intensidade das tempestades e evidencia a dispersão
temporal das tempestades mais violentas que assolaram o litoral sul do Algarve (fig. 3.6). Os anos em que as
previsões apontam para valores de altura significativa da agitação marítima igual ou superior a 5m, coincidiram
com picos de ruptura em diversas núcleos de ocupação no litoral sul do Algarve. No Inverno de 1978/79, quando
se verificaram danos maiores no Porto de Sines (Feio, 1980), foram também registados estragos vultuosos no
porto da Baleeira, em Sagres (João Peleja IPTM, comunicação pessoal). No primeiro semestre de 1990 ruíram
diversas habitações na praia de Faro e várias estruturas na praia do Alvor; em ambos os locais foram, então,
construídos enrocamentos de emergência, no sentido de minimizar os efeitos da acção erosiva do mar. Nos
anos de 1996/97 e 1997/98 ocorreu uma dezena de movimentos de massa de grandes dimensões nas arribas
cortadas em calcarenitos miocénicos. O volume perdido, apenas nestes dois anos, corresponde a dois terços do
volume total deslocado no intervalo no período de 12 anos entre 1995/96 e 2007/08. Em Março de 1998 foram
destruídas mais algumas casas na iha de Faro. Em Fevereiro de 2008 foram derrubadas três casas na praia da
Fuzeta e verificou-se recuo de mais de 10m nas dunas que suportam a praia do Alvor Nascente.
18
16
frequência absoluta (dias)
14
12 Hs> 6m
10 Hs> 5,5m
8 Hs> 5m
6
4
2
0
1976/77
1978/79
1980/81
1982/83
1984/85
1986/87
1988/89
1990/91
1992/93
1994/95
1996/97
1998/99
2000/01
2002/03
2004/05
2006/07
2008/09
Figura 3.6 – Distribuição temporal da frequência de tempestades extremas (Hs≥5m) previstas no litoral sul do Algarve, no
Boletim Meteorológico Diário do Instituto de Meteorologia.
43
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Com base numa série de colheitas realizadas entre 1998 e 2000 pela Direcção Regional do Ambiente e
Ordenamento do Território do Algarve, nos resultados obtidos por Andrade (1990) nas praias da Ria Formosa,
por Bettencourt (1994) em todo o Sotavento (Olhos de Água à foz do Guadiana) e por Carvalho (1984) na baía
de Lagos, elaborou-se o gráfico da figura 3.7 que mostra a variação longilitoral do diâmetro médio das areias da
face da praia no litoral sul do Algarve, com franco predomínio das areias médias. A figura 3.8 contém uma
amostra das areias das praias e o gráfico da figura 3.9 contém a variação longilitoral do teor de carbonatos das
areias da face da praia.
4,0
VRSA
Portimão
Albufeira 3,5
Sagres
Faro 3,0
diâmetro médio das areias (phi)
2,5
areia
fina
2,0
areia
1,5
média
1,0
areia
grosseira 0,5
0,0
areia muito
grosseira -0,5
-1,0
100,00 130,00 160,00 190,00 220,00 250,00
Figura 3.7 – Variação longilitoral do diâmetro médio de Folk e Ward (1957) das areias da face da praia do litoral sul do
Algarve. A curva cheia corresponde a médias móveis (n= 10). As linhas a ponteado marcam os limites entre as classes
granulométricas das areias. A escala phi (Φ) relaciona-se com o diâmetro D em milímetros através da fórmula: D = 0.5Φ.
44
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Mareta (10 Mar 2008) Salema (10 Mar 2008) Porto de Mós (28 Fev 2008)
Batata (28 Fev 2008) Meia-Praia (29 Jan 2008) Alvor (15 Jan 2008)
Carvoeiro (29 Jan 2008) Armação de Pêra (17 Fev 2008) Salgados (13 Jun 2008)
Coelha (14 Fev 1008) Oura (15 Jan 2008) Olhos Água (21 Jan 2008)
Falésia (21 Jan 2008) Vilamoura (10 Jun 2008) Quarteira (10 Jun 2008)
Garrão (13 Mai 2008) Praia de Faro (15 Jan 2008) Farol (5 Mar 2008)
Praia da Fuzeta (5 Mar 2008) Cabanas (12 Jul 2008) Manta Rota (31 Mar 2008)
Praia Verde (16 Jan 2009) Monte Gordo (18 Fev 2008) Santo António (1 Jul 2008)
Figura 3.8 – Amostras das areias da face da praia do litoral sul do Algarve.
Os resultados patentes na figura 3.7 mostram claramente que a granulometria das areias das praias varia
ao longo do litoral sul do Algarve, reflexo do efeito conjugado entre a variação das fontes sedimentares e a
45
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exposição à agitação marítima dominante. A grande tendência regional é a diminuição do calibre para nascente,
reflexo directo da redução da energia da agitação marítima que atinge as praias, no mesmo sentido. Numa
escala de observação mais fina é possível distinguir três sectores que correspondem aproximadamente às três
grandes unidades morfológicas do litoral do Algarve, em que o padrão de variação da granulometria das areias
reflecte a origem dos sedimentos acumulados nas praias que provém de duas fontes principais: a erosão das
arribas e o caudal sólido que aflui ao litoral, transportado pelas linhas de água:
a) no sector poente, que engloba o troço sul da Costa Vicentina até à ponta da Piedade, as fontes
sedimentares das praias residem essencialmente no produto residual da erosão das arribas carbonatadas, e
secundariamente na descarga sólida das linhas de água que drenam a série turbidítica da Serra Algarvia, pelo
que o espectro granulométrico das areias das praias não ultrapassa a gama das areias médias, com importante
fracção carbonatada (20-50%), que espelha o contributo da erosão das arribas cortadas em rochas mesozóicas
carbonatadas;
90%
VRSA
80% Portimão
70%
teor de carbonatos (%)
Faro
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Figura 3.9 – Variação longilitoral do teor de carbonatos das areias das praias do Algarve sul. Incluídos resultados obtidos
por Carvalho (1981) na baía de Lagos e por Andrade (1990) nas praias da Ria Formosa. A curva cheia corresponde a
médias móveis (n= 10). O teor de carbonatos (%) foi obtido através da diferença ponderal entre o peso das amostras antes
e após ataque com ácido clorídrico a 10%.
b) no sector central, entre a ponta da Piedade e o cabo Santa Maria, regista-se a maior flutuação
granulométrica. O diâmetro médio das areias é mais grosseiro nos troços mais expostos, nas imediações dos
cabos e promontórios (Alfanzina, Castelo e cabo Sta Maria) e mais fino nas zonas abrigadas da agitação
marítima dominante (baía de Lagos). Nas pequenas praias encaixadas, acumuladas no recorte irregular das
46
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arribas cortadas em calcarenitos do Miocénico, cujos produtos da erosão constituem fonte sedimentar muito
importante, o teor de carbonatos das areias das praias atinge valores da ordem dos 50%. O contributo das
arribas carbonatadas cessa para nascente de Olhos de Água, pelo que o teor de carbonatos das areias de praia
se reduz drasticamente, estabilizando em torno dos 5%. Este valor residual corresponde essencialmente à
fracção dos fragmentos dos bioclastos incluídos nas areias e secundariamente aos litoclastos de calcarenitos
que afloram de forma dispersa e descontínua na zona submarina;
c) no sector nascente, a leste do cabo de Santa Maria, o diâmetro médio das areias reduz-se
progressivamente, atingindo calibres muito pequenos nas imediações da barra do Guadiana, onde já se
depositam areias finas. A fracção carbonatada das areias de praia ronda os 5% em todo o sector, aumentando
para cerca de 10% nas imediações da barra do rio Guadiana, reflectindo o contributo continental carbonatado
drenado na bacia desta linha de água.
Para o caso em apreço, interessa, sobretudo, conhecer a inclinação da face da praia onde se processa o
espraio das ondas na estofa da preia-mar. No sentido de caracterizar o regime de inclinação da face das praias
do litoral sul do Algarve, foi feito um esforço de colheita sistemática de informação experimental de que resultou
a obtenção de uma vasta série de dados. Na recolha de dados, a inclinação da face da praia foi medida sempre
na zona de espraio das ondas que varrem a praia na segunda metade da enchente até à estofa da preia-mar,
correspondendo à franja entre o plano do nível médio do mar e a linha de praia mar impressa no areal. Foram
realizadas cerca de dois milhares de medições ao longo de 118 praias, com um valor médio de cerca de 19
observações por praia, disperso por intervalo temporal de mais de uma década e varrendo toda a gama de
variação dos perfis de praia. Os dados incluem: a) medições realizadas através da execução de perfis
topográficos transversais (34%); b) medições executadas sobre levantamentos topográficos à escala 1/2000 ou
superior (10%), c) medições executadas directamente no terreno com clinómetro (54%). A série de dados foi,
ainda, completada com os dados dos perfis de praia executados nas praias da Ria Formosa por Andrade (1990)
e Bettencourt (1995).
Quadro 3.IV – Síntese dos valores da inclinação da face das praias do litoral sul do Algarve (24 FEV)
47
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14
13
12
Faro
declive da face da praia (º)
11
1 3 5 6 8 9 10
2 4 7 11
10
2
120,00 145,00 170,00 195,00 220,00 245,00 270,00
Figura 3.10 - Variação longilitoral do declive médio das praias do Algarve meridional (inclui valor médio e erro padrão da
série de medições). Os troços assinalados numerados de 1 a 11 correspondem aos sectores identificados com inclinação
da face da praia distinta (v. texto e quadro 3.V)
Os resultados de síntese por sector, inscritos no quadro 3.IV, revelam que a inclinação média da face da
praia é idêntica nas praias da Costa Vicentina e do Sotavento, sendo mais elevada no Barlavento. A figura 3.10
representa a variação longilitoral do declive médio das praias do litoral sul do Algarve, construída com base na
série compilada, evidenciando a existência de sectores distintos que reflectem a conjugação dos dois factores
que condicionam a morfodinâmica: por um lado, a granulometria dos sedimentos das praias, por outro, o grau de
exposição à agitação marítima. Os troços mais expostos e com granulometria mais grosseira apresentam
maiores inclinações da face da praia, enquanto que nos troços menos expostos e com granulometria mais fina a
48
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inclinação da face da praia é menor. Nas praias recentemente submetidas a alimentação artificial a partir de
manchas de empréstimo ao largo, nomeadamente nas praias de Vilamoura, Quarteira e Vale do Lobo (sector 8,
figura 3.10), com introdução de areia mais grosseira do que a areia nativa (Teixeira, 1998; Teixeira et al., 1998),
a inclinação da face da praia é superior à inclinação das praias contíguas, reflectindo o efeito do incremento do
calibre das areias.
Da conjugação da granulometria das areias, do declive médio da face da praia e da exposição à agitação
marítima é possível distinguir 11 sectores ao longo do litoral do Algarve sul com características uniformes, que
reproduzem um vasto espectro de condições morfodinâmicas (quadro 3. V).
Quadro 3.V – Características morfodinâmicas médias dos sectores de praias do litoral sul do Algarve
Sector Praias limite do sector Inclinação média da Granulometria da areia da
face da praia (º) face da praia
1 Tonel – Canavial 5-7º areia média
2 Camilo – Batata 7º areia grosseira
3 S. Roque – Rocha 4-5º areia média a fina
4 Molhe - Pintadinho 6º areia média
5 Caneiros- Fontaínhas 8-9º areia grosseira
6 Nova – Galé Leste 6-7º areia média a grosseira
7 Evaristo – Coelha 8-9º areia grosseira
8 S. Rafael – Cabo Santa Maria 6-7º areia média a grosseira
9 Cabo Santa Maria (Deserta) 7-8º areia grosseira
10 Farol – Santo António 5-6º areia média
11 Santo António leste 3-4º areia fina
49
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Desde há mais de quatro décadas que são publicadas soluções empíricas para o cálculo da altura de
espraio das ondas que incidem sobre o litoral. As diversas aproximações disponíveis podem dividir-se em dois
grupos, conforme a complexidade das fórmulas e as variáveis necessárias para a sua resolução: um primeiro
grupo de fórmulas, mais simples, que relacionam directamente a altura do espraio com a altura da ondulação
incidente e um segundo grupo de equações, mais complexas, que, além da altura da ondulação, consideram
ainda os outros parâmetros escalares da ondulação (período ou comprimento de onda) e o declive da estrutura
natural (p. ex. praia) ou artificial (p. ex. enrocamento) onde as ondas incidem.
Neste estudo apresenta-se uma aproximação empírica para o cálculo da altura do espraio das ondas que
incidem sobre as praias e as arribas não alcantiladas, de modo a obter uma solução válida para o litoral sul do
Algarve e aplicável para níveis de maré equivalentes à preia-mar de águas vivas equinociais, sob condições de
agitação média do mar. Esta solução foi desenvolvida com base em dados experimentais obtidos ao longo da
última década e pretende contribuir para a definição da linha convencional da LMPMAVE, conforme disposto na
Lei nº 54/2005.
4.1. Definições
As definições dos termos utilizados do presente relatório (fig.4.1):
Cota do espraio – cota do plano da linha de maré impressa pelas ondas que atingem o litoral, seja na praia
ou na arriba.
Altura da maré – diferença altimétrica entre o plano do Zero Hidrográfico e a cota da preia-mar prevista na
tabela de maré.
Face da praia (ou da arriba) – talude da praia ou da arriba exposto à acção directa das ondas; zona onde
se processa o espraiamento das vagas.
51
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Altura do espraio (espraiamento das vagas) - diferença altimétrica entre o nível do plano de água em
preia-mar (no caso, considerada a cota da preia-mar prevista na tabela de marés) e a linha de maré impressa na
arriba ou no areal 7 .
Inclinação da face da praia (β )– declive da zona da praia onde se processa o espraiamento das vagas em
condições de preia-mar. Esse declive, expresso em graus, é medido entre a linha de maré impressa no areal e o
plano equivalente à cota da preia-mar prevista na tabela de marés.
Inclinação da face da arriba (β )– declive da zona da face da arriba onde se processa o espraiamento das
vagas em condições de preia-mar. Esse declive, expresso em graus, é medido entre a linha de maré impressa
na arriba e o plano equivalente à cota da preia-mar prevista na tabela de marés.
5
Cota de espraio
4 Altura de
altura (m-ZH)
espraio
B Altura da
3 cota da maré
onda
2
Altura da maré
1
0
0 50 100 150 200 250 300 350 400 450
distância (m)
Em taludes planos e impermeáveis construídos em laboratório e submetidos a ondas regulares, Hunt (1959,
in Hughes, 2004) encontrou relação directa entre o altura do espraio (R) e a altura da ondulação (H) incidente,
propondo a equação:
7
Espraiamento ou espraio das ondas, aqui considerado como a totalidade da componente de “setup” e “swash”,
correspondente ao termo “runup total” utilizado na bibliografia anglo-saxónica (e.g. Komar, 1998).
52
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A partir de dados experimentais recolhidos em praias da Califórnia, Guza e Thorthon (1982) obtiveram uma
equação do mesmo tipo:
Rs = 0.7 Hs (4.2)
em que:
Rs – espraio significativo (média do terço mais alto dos níveis de espraio);
Hs – altura significativa das ondas ao largo (m).
Uma Nota Técnica do US Army Engineer Waterways Experiment Station (CERC, 1995), fornecendo
orientações relativamente à estimativa da altura do espraio das ondas em praias naturais, recomenda que a
altura do espraio das ondas seja estimada com base na seguinte equação:
em que:
Rp – altura do espraio excedida na percentagem P;
Hmo – Altura significativa das ondas ao largo (m);
Zp – Desvio padrão normalizado numa distribuição normal;
C1= 0.5; C2= 0.4;
Rs = 0.5Hmo + 0.97 x 0.4 Hmo <=> Rs=0.89 Hmo Zp= 0.97 (4.4)
R5% = 0.5Hmo + 1.65 x 0.4 Hmo <=> R5%=1.16 Hmo Zp= 1.65 (4.5)
R2% = 0.5Hmo + 2.05 x 0.4 Hmo <=> R2%=1.32 Hmo Zp= 2.05 (4.6)
R1% = 0.5Hmo + 2.32 x 0.4 Hmo <=> R1%=1.43 Hmo Zp= 2.32 (4.7)
em que:
Rs = R33%– espraio significativo (média do terço mais alto dos níveis de espraio);
R5% – altura de espraio excedida pelo 5% mais alto dos níveis de espraio (m);
R2% – altura de espraio excedida pelo 2% mais alto dos níveis de espraio (m);
R1% – altura de espraio excedida pelo 1% mais alto dos níveis de espraio (m):
Para a definição da LMPMAVE, o nível da altura de espraio que interessa conhecer é o nível
correspondente ao espraio máximo (Rmáx), uma vez que é este nível que traduz o limite da inundação máxima
da praia. Qualquer dos outros níveis de espraio é inferior ao nível de espraio máximo.
53
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Há cerca de uma década, no âmbito dos trabalhos associados à elaboração do Plano de Ordenamento da
Orla Costeira (Burgau-Vilamoura), como primeira aproximação para a definição da cota da LMPMAVE, o
signatário procedeu a mais de uma centena de medições experimentais em sete praias do litoral do Algarve
(Alvor, Vau, Rocha, Carvoeiro, Salgados, Albufeira, Vale de Lobo), entre 1996 e 1999, onde foram medidas as
cotas das linhas de preia-mar impressas no areal e estimada visualmente a altura da ondulação incidente 8 . Em
cada observação, a altura do espraio máximo (Rmáx) foi calculada a partir da diferença entre a cota da linha de
maré medida e o plano da preia-mar prevista nas tabelas de maré publicadas pelo Instituto Hidrográfico (v. fig.
4.1). Os pares de valores obtidos permitiram estabelecer, através de regressão linear, a equação da recta que
melhor se ajusta aos dados experimentais, com a forma (fig. 4.2):
em que:
Rmáx – altura de espraio máximo (m);
Hs – altura significativa da ondulação ao largo estimada visualmente (m).
y = 0,80x + 0,62
altura de espraio (m)
3
R = 0,81
0
0 1 2 3 4
Altura da ondulação (m)
Figura 4.2 – Relação entre altura da ondulação estimada visualmente e a altura de espraio obtida em sete praias do Algarve
Central entre 1996 e 1999.
8 A estimativa visual da altura da ondulação por um observador treinado corresponde aproximadamente à altura significativa
da ondulação – média do terço das ondas mais altas (Komar, 1998; Masselink e Hughes, 2003). Foi, aliás, a partir desta
relação que Munk (1949) definiu originalmente o parâmetro Altura Significativa. Anteriormente à existência de dados
recolhidos em bóias ondógrafos, o Instituto de Meteorologia recolhia informação sobre a agitação marítima através da
observação visual realizada por faroleiros nos principais cabos de Portugal Continental. No Algarve, foram recolhidos dados
de observação visual nos faróis do cabo Santa Maria, do cabo de Alfanzina e da ponta da Piedade.
54
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Com base na última equação, estima-se que, perante as condições de agitação marítima média do litoral
Central do Algarve em que a altura significativa média anual da ondulação atinge 1m (Costa et al., 2001), a
altura do espraio produzido por uma onda com essa altura atingirá 1.42m. Aplicando estes valores na equação
4.8 resulta que, para as praias do litoral do Algarve Central, a curva de +5.42m, relativa ao Zero Hidrográfico,
pode ser utilizada como referência para a definição da LMPMAVE:
Estes resultados foram incorporados nas disposições regulamentares dos Planos de Ordenamento da Orla
Costeira Sines-Burgau, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 152/98, de 30 de Dezembro, e
Burgau-Vilamoura, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 33/99, de 27 de Abril, que consideram
a LMPMAVE coincidente com a curva de +5.5m acima do Zero Hidrográfico (equivalente à curva de +3.5m
acima do nível médio do mar). A mesma cota para a LMPMAVE foi adoptada no Plano de Ordenamento da Orla
Costeira Vilamoura-Vila Real Santo António, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 103/2005, de
27 de Junho. Na ausência de qualquer outro nível de referência, a cota dos 5.5m (ZH) tem vindo a ser utilizado
como o plano de referência para a definição da LMPMAVE pelo organismo regional com competência para
licenciamento e fiscalização da margem das águas do mar; sucessivamente a Direcção Regional do Ambiente
do Algarve (DRAA), a Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território do Algarve (DRAOT), a
Comissão de Coordenação de Desenvolvimento Regional do Algarve (CCDR) e a Administração da Região
Hidrográfica do Algarve, I. P. (ARH).
Em resultados obtidos no âmbito do estudo dos níveis de espraio em enrocamentos, Hunt (1959) verificou
que a altura de espraio também era influenciada pelo declive das estruturas, havendo proposto a expressão:
em que:
R2% – altura de espraio excedida pelo 2% mais alto dos níveis de espraio (m);
Hs – altura significativa da ondulação (m).
β – inclinação do talude
Posteriormente, Battjes (1971, in Komar, 1998) mostrou que a altura de espraio se relacionava melhor com
o designado número de Iribarren (ξ):
55
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R2%/Hs= C ξ0 (4.11)
para
ξ0= tang β / (Hs/Lo)05 (4.12)
em que:
R2% – Nível do espraio excedido pelo 2% mais alto dos níveis de espraio (m);
HS – altura significativa das ondas ao largo (m)
ξ0 – nº de Iribarren
β – inclinação da praia
L0 – comprimento de onda ao largo (calculado através de equação da teoria linear das ondas =gT2 /2π = 1.56 T2)
T – período das ondas (s)
C – constante
Este tipo de solução foi testado por diversos autores, em condições naturais, em praias, (Holman, 1986;
Nielson e Hanslow, 1991; Ruggiero et al., 2004), em laboratório (Mase, 1989; Van de Walle et al., 2004; Roberts
et al., 2007) e em estruturas de defesa costeira (Ahrens, 1981; Van der Meer e Stam, 1992; Hughes, 2003;
Eurotop; 2007), para uma extensa gama de condições de agitação marítima, níveis de altura de espraio e
declives, com a fórmula geral:
R/Hs= C ξ <=> R= C Hsξ (4.13)
para:
R – altura de espraio 9 ;
Hs – altura significativa da ondulação;
C – constante;
ξ – nº de Iribarren;.
A partir de dados recolhidos em praias naturais, Holman (1986) deduziu equações para a altura de espraio
máximo e para a altura de espraio com um nível de excedência de 2%:
para:
R2% – Nível do espraio excedido pelo 2% mais alto dos níveis de espraio (m);
Rmax – altura de espraio máximo (m);
H0 – altura significativa das ondas ao largo (m);
ξ0 – nº de Iribarren = tang β / (H0/L0)0.5
L0 – comprimento de onda ao largo (m).
9A relação entre os diferentes níveis de espraio das ondas foi estudada por Grune & Wang (2000), que encontraram a
seguinte relação entre os diversos níveis de espraio e o nível de espraio excedido por 2% das ondas (R2%) em estruturas de
defesa costeira:
56
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A primeira equação foi confirmada por Nielson e Hanslow (1991) em praias australianas com declives entre
0.026 (1.5º) e 0.189 (10.7º).
Mase (1989) executou uma série de experimentação laboratorial sobre o espraio associado a ondas
irregulares, em praias impermeáveis, desenvolvendo as seguintes equações:
em que:
Rmax – altura de espraio máximo (m);
R2% –- altura do espraio excedido pelo 2% mais alto dos níveis de espraio (m);
R1/3 – altura de espraio significativo.
H0 – altura significativa das ondas ao largo (m);
ξ0 – nº de Iribarren = tang β / (H0/L0p)0.5
Lop – comprimento de onda ao largo associado ao período de pico (TP).
A introdução do número de Iribarren associado ao período de pico e não a outro parâmetro do período
(médio ou significativo) resulta do facto de o espectro irregular da ondulação conter gama de períodos mais
alargada, circunstância que os estimadores médios, por definição, tendem a camuflar. Por outro lado, no
dimensionamento de estruturas de defesa costeira são particularmente críticas as condições extremas, quer de
altura de espraio, quer de energia incidente. Dado que os maiores níveis de espraio reflectem o efeito das ondas
de menor frequência e sendo o parâmetro período de pico associado à maior energia do espectro, as
formulações do espraio tendem a incorporar essa variável em detrimento dos estimadores médios.
A comparação entre os resultados de Mase (1989) e os resultados medidos em praias naturais revelou que
as equações de Mase (1989) produzem estimativas sistematicamente sobreavaliadas da ordem do dobro
(CERC, 2002; Hughes, 2004). Daqui resulta que as equações de Mase (1989) servem, como primeira
aproximação, para definir a envolvente máxima dos limites do espraio em praias naturais. A título ilustrativo, na
figura 4.3 apresentam-se os resultados da aplicação da fórmula do espraio máximo (Rmax) de Mase (1989) para
as praias de Portugal Continental, tendo como base os valores da altura significativa e do período de pico
médios anuais publicados por Costa et al. (2001), inscritos no quadro 3.III, e considerando uma cota de maré da
MPMAVE de 4.0m (ZH) uniforme em todo o litoral.
57
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Figura 4.3 – Envolvente máxima da variação da cota da LMPMAVE nas praias de Portugal Continental em função do declive
da face da praia, resultante da aplicação da fórmula de Mase (1989) para os níveis de espraio máximo (equação 4.16).
Considerada a altura de maré da MPMAVE de 4.0m (ZH) e os valores médios da agitação marítima registados nas bóias da
Figueira da Foz, Sines e Faro (Costa et al., 2001), respectivamente para as praias do litoral ocidental norte, litoral ocidental
sul e litoral Algarve sul.
Soluções do mesmo tipo das fórmulas de Mase (1989) foram desenvolvidas por Van der Meer e Stam
(1992), depois de compilarem medições de altura de espraio em estruturas de defesa costeira, reproduzidas em
laboratório, para valores de ξ0 inferiores a 2.0 e alturas significativas (Hs) inferiores a 1.7m:
R2%/Hmo=1.5 ξ0 <=> R2% =1.5 Hmoξ0 estruturas com superfície lisa (4.19)
R2%/Hmo=0.83 ξ0 <=> R2% = 0.83Hmoξ0 estruturas com enrocamento (4.20)
Hughes (2003) apresenta uma solução idêntica, válida para estruturas lisas e impermeáveis, submetidas a
agitação irregular, baseado nos dados obtidos por Ahrens (1981) e Waal e Van der Meer (1992), com a forma:
58
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No recentemente publicado “Manual de Galgamento de Defesas Costeiras” (Eurotop, 2007), que contém a
revisão dos dados actualmente disponíveis, a equação proposta para estruturas lisas, impermeáveis e de declive
uniforme, baseada numa série de modelos laboratoriais sobre estruturas, tem a forma:
O vasto conjunto de soluções apresentadas, obtido numa larga gama de condições, atesta a validade da
aproximação que contém os parâmetros escalares da ondulação e o declive da estrutura. Mostra, ainda, que o
valor da constante C é variável, sendo:
a) menor, em regimes de agitação marítima regular. A irregularidade da agitação marítima tende a favorecer
o desenvolvimento de espectro mais largo, com incremento de ondas com maior período que geram maiores
alturas de espraio;
b) maior, em estruturas impermeáveis, que anulam o efeito de perda de carga por infiltração;
c) maior, em superfícies planas, onde as perdas de carga pelo efeito da rugosidade são menores.
Desta verificação resulta que a utilização de qualquer fórmula geral, com constante desenvolvida em
condições diversas das verificadas nas praias de Portugal, naturalmente incluirá um desvio relativamente à
realidade nacional. No sentido de obviar a essa limitação foi feito um esforço visando obter a constante válida
para o Algarve, como seguidamente se descreve.
e no sentido da determinação da constante válida para o litoral meridional sul do Algarve, foi recolhida uma série
de observações experimentais concentradas nas praias, mas abarcando também zonas rochosas,
nomeadamente zonas de arribas não alcantiladas.
No litoral sul do Algarve existem apenas dados de agitação marítima colhidos em um local (bóia de Faro),
pelo que toda a informação relativa aos parâmetros da agitação marítima se refere a este local. Os efeitos da
dissipação/concentração da energia da agitação em cada local reflectem-se sobretudo na inclinação da praia,
por sua vez condicionada pela granulometria das areias.
59
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A informação relativa aos parâmetros escalares da ondulação foi retirada dos dados produzidos pela bóia
ondógrafo fundeada ao largo de Faro, disponíveis no sítio do Instituto Hidrográfico (www.hidrografico.pt). A
transposição das características da ondulação registada na bóia (altura significativa – Hs - e período máximo -
Tmáx) para as condições ao largo de cada praia no momento da preia-mar foi feita tendo em consideração o
rumo e celeridade da ondulação (calculada a partir do período máximo registado na bóia) e a distância entre a
bóia e um ponto ao largo de cada praia (considerada a batimétrica dos 20m). Nas praias do Barlavento, a
agitação marítima de SE que atinge as praias e gera a linha de maré da preia-mar medida corresponde à
agitação marítima registada na bóia horas antes; o inverso sucede sob a incidência de agitação de SW, onde as
linhas de maré são produzidas nas praias antes de a agitação que as gerou ser registada na bóia. Em situações
de alteração do rumo de agitação marítima, este intervalo de tempo entre a chegada da agitação marítima às
praias e o seu registo na bóia origina períodos opacos, não sendo possível utilizar a informação da bóia, dada a
incerteza espacial e temporal da alteração da agitação marítima.
Para cada observação, em cada praia ou arriba, foi calculado o intervalo de tempo que medeia entre a
chegada da ondulação ao largo de cada praia durante a preia-mar e o correspondente registo na bóia, baseado
na celeridade da onda calculada a partir do registo do período máximo. No sentido de minimizar os erros
associados a esta observação, os valores dos parâmetros escalares da agitação marítima que chegam ao largo
de cada praia, assim obtidos, resultam da média de 3 registos e foram arredondados, ao decímetro, no caso da
altura significativa e ao segundo, no caso do período máximo. A opção de utilização do período máximo, em
detrimento do período médio, resulta do facto de diversos autores referirem que o espraio máximo depende
quase exclusivamente das ondas com menores frequências (e.g., Rudgiero et al., 2004), e tendo em
consideração que as soluções para os regimes naturais (com distribuições irregulares de espraio) tomarem
sempre em consideração o período de pico (e.g., CEM, 2002; Eurotop, 2007). Num qualquer espectro de
agitação marítima, as ondas que imprimem a linha de maré a cotas mais elevadas do areal são as ondas de
maior energia (associadas ao período de pico) ou as ondas com maior celeridade (com maior período).
A recolha de dados de campo foi feita através da execução de levantamentos de perfis topográficos
transversais à praia (no sentido da maior inclinação). Em cada local foi medida a cota da linha da maré impressa
60
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no areal na preia-mar que ocorreu imediatamente antes da execução do perfil (fig. 4.5). A altura máxima de
espraio (Rmáx) foi calculada através da diferença entre a cota da linha de maré impressa no areal e a cota da
preia-mar prevista na tabela de maré, corrigida de +10cm associados à subida do nível médio do mar (v. ponto
3.1). O declive da face da praia foi medido na franja do perfil onde se processa o espraio nas condições de preia-
mar, isto é, entre a linha da maré impressa no areal e o plano correspondente à cota da preia-mar prevista. Esta
opção de medição do declive pretende aproximar a metodologia com o procedimento utilizado nas soluções
desenvolvidas em taludes de obras de protecção costeira. As medições do declive processadas desta forma não
diferem significativamente dos declives médios da praia (medidos sobre o plano do nível médio do mar) excepto
nos casos em que o perfil é marcadamente convexo, em que a opção escolhida tende a produzir declives mais
fortes. A figura 4.6 contém perfis exemplificativos de algumas praias, com declives entre 2º e 8º.
Portim ão
10,000
Faro
-10,000
120,000 140,000 160,000 180,000 200,000 220,000 240,000 260,000
Figura 4.4 – Localização das 41 praias onde foram recolhidos dados experimentais mediante a execução de perfis
transversais.
Figura 4.5 – Levantamento do perfil de praia na praia da Luz (29 de Agosto de 2008).
61
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LPM
6 Cota PM prevista = 3.0m (ZH)
4 Altura espraio = 1.70m
Hs = 1.6m
2
Tmáx = 9s
0
0 20 40 60 80 100 120 140 160
distância (m )
a)
5
Cota PM prevista = 3.2m (ZH)
4
3
Altura espraio = 1.41m
2
Hs = 0.6m
1 Tmáx = 8s
0
0 20 40 60 80 100
distância (m )
b)
5
Cota PM prevista = 3.0m (ZH)
4
3
Altura espraio = 2.15m
2 Hs = 0.8m
1 Tmáx = 13s
0
0 20 40 60 80 100
distância (m )
c)
4
Cota PM prevista = 3.2m (ZH)
3
Altura espraio = 0.17m
2
Hs = 0.6m
1 Tmáx = 13s
0
0 20 40 60 80 100 120
distância (m )
d)
Figura 4.6 – Exemplos de perfis executados.
62
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
63
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
A série de dados recolhida cobre os intervalos temporais de Maio de 2002 a Dezembro de 2004 e Outubro
de 2007 a Janeiro de 2009. Foram também incorporados os elementos recolhidos e publicados por Pinto (2006)
nas praias da baía de Armação de Pêra, que contêm o mesmo tipo de informação. O quadro 4.I contém a
síntese da informação recolhida nas 41 praias, ao longo do litoral sul do Algarve, que cobre o espectro de:
Hs – Altura significativa - 0.3m a 3.0m (valores arredondados ao decímetro)
Tmáx – período máximo - 4s a 16 s (valores arredondados ao segundo)
β – declive da face da praia - 1.6º a 10.8º
5,0
altura do espraio medido (m)
4,5 y = 1,08x
4,0 r = 0,70
3,5
3,0
2,5
2,0
1,5
1,0
0,5
0,0
0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0
Hs Eom (m)
Figura 4.7 – Solução para cálculo da altura do espraio, baseada na totalidade dos dados experimentais (equação 4.24)
O conjunto de 342 valores obtidos foi utilizado para construir o gráfico da figura 4.7, que sintetiza a relação
entre a altura do espraio, os parâmetros escalares da ondulação ao largo e a inclinação da face da praia. A
equação que melhor se ajusta aos dados experimentais, obtida por regressão linear, tem a forma;
para:
Rmáx – altura do espraio máximo medido (m)
ξom – nº de Iribarren = tang β / (Hs/Lom)0.5
Hs – altura significativa da ondulação ao largo (m)
Lom – comprimento de onda ao largo (m), associado ao período máximo (Tmáx)
64
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Substituindo na equação geral (4.24) os valores médios anuais da altura significativa (Hs = 1.0m) e do
período máximo (Tmáx = 11.1s), obtém-se a fórmula simplificada que permite calcular a altura do espraio em
“condições médias de agitação do mar” para as praias do litoral sul do Algarve:
A solução geral para o cálculo da LMPMAVE para as praias do litoral sul do Algarve surge, naturalmente,
com a fórmula:
Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + Rmáx <=> Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + 15.0 tangβ (4.26)
A tradução gráfica da solução 4.26 está ilustrada na figura 4.8, válida para a gama de declives contidos nos
dados experimentais, entre 1.6º e 10.8º. Da aplicação desta solução para as praias do litoral sul do Algarve, se
considerado o declive médio, resulta a variação longilitoral da cota da LMPMAVE ilustrada na figura 4.9.
7,5
cota da LMPMAVE (m-ZH)
7,0
6,5
6,0
5,5
5,0
4,5
4,0
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
declive da face da praia (º)
Figura 4.8 – Solução gráfica para cálculo da cota da LMPMAVE nas praias do litoral sul do Algarve, considerando o seu
declive médio.
Os resultados mostram claramente que a cota da LMPMAVE não é uniforme, distinguindo-se uma série de
sectores com cotas diferentes, que reflectem a variação longilitoral do declive médio da face da praia, associado
à conjugação entre a exposição à agitação marítima e a granulometria das areias. Tendo presente a
variabilidade natural, a precisão associada aos levantamentos topográficos das praias e no sentido de facilitar a
leitura dos resultados, foram consideradas classes altimétricas com 0.5m de amplitude.
65
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
11
10
6.5m (ZH)
9
8
6.0m (ZH)
7
6
5
5.5m (ZH)
4
5.0m (ZH)
3
2
4.5m (ZH)
120,000 145,000 170,000 195,000 220,000 245,000 270,000
Figura 4.9 – Variação longilitoral do declive médio da face da praia no litoral sul do Algarve e da cota da LMPMAVE. A curva
a azul claro representa médias móveis (n=3). As linhas horizontais vermelhas marcam os limites dos intervalos dos declives
a que correspondem as cotas da LMPMAVE assinaladas a negro.
As cotas da LMPMAVE, calculadas a partir da equação geral obtida (equação 4.26) e do declive médio das
praias, atingem valores máximos de 6.5m (ZH) nas praias mais expostas à acção da agitação marítima, onde a
granulometria é mais grosseira, concentrando-se na vizinhança do cabo de Alfanzina (praia do Carvalho) e da
ponta do Castelo (praia do Evaristo). Nas praias mais abrigadas da agitação marítima dominante e onde a
granulometria é mais fina, a cota da LMPMAVE é apenas 5.0m (ZH). Tal sucede na praia da Rocha, em parcelas
da Meia-Praia e de Alvor e no sector a leste de Monte Gordo. Nas restantes praias as cotas da LMPMAVE,
calculadas a partir dos declives médios das praias, atingem valores entre 5.5m e 6.0m (ZH).
Na figura 4.10 estão representados os valores médios dos declives e da cota da LMPMAVE, calculada
através da solução obtida no presente estudo, das praias dos três sectores do litoral sul do Algarve, de acordo
com os limites geográficos dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira. Os resultados mostram que a cota
média da LMPMAVE no Barlavento (5.67m-ZH) é superior à cota dos restantes troços (quadro 4.II) e muito
próxima da cota prevista no Regulamento do POOC (Burgau-Vilamoura), de 5.5m (ZH), e à cota estimada em
1998 (5.42m-ZH), baseada na série experimental então obtida. Para as praias da Costa Vicentina e do
Sotavento, a cota média da LMPMAVE, calculada a partir da mesma equação, é, respectivamente, de 5.51m
66
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(ZH) e 5.55m (ZH), idênticas à cota prevista nos regulamentos dos respectivos POOC (Sines-Burgau e
Vilamoura-Vila Real de Santo António), que é de 5.5m (ZH) ou 3.5m (NMM).
6,5
cota da LMPMAVE (m-ZH)
6,0
Sotavento
Barlavento
5,5
Costa Vicentina
5,0
4,5
4,0
3 4 5 6 7 8 9
declive da face da praia (º)
Figura 4.10 – Valores médios do declive e da cota da LMPMAVE para os três sectores das praias do litoral do Algarve sul,
associados aos Planos de Ordenamento da Orla Costeira.
Estes resultados atestam a bondade das cotas de referência que constam dos Regulamentos dos POOC,
do litoral sul do Algarve, originalmente definidas com base numa série experimental mais expedita e com um
número muito inferior de dados. A coincidência de valores evidencia, ainda, a robustez do estimador média, que
não sofreu alterações significativas apesar do incremento muito significativo do volume de dados e do rigor da
série experimental que serve de base para a solução proposta.
67
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
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.
Dos resultados apresentados decorre que o valor de referência da cota da LMPMAVE utilizado pela
Comissão do Domínio Público Marítimo para a costa sul do Algarve (3.0NMM ou 5.0mZH), recentemente
incluído no Despacho Normativo nº 32/2008, de 20 de Junho, do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do
Território e do Desenvolvimento Regional está subestimado, necessitando de rectificação, devendo ser
doravante adoptado o valor de referência de 5.6m (ZH), ou 3.6 (NMM).
7,5
presente trabalho
7,0 Fórmula Mase
cota da LMPMAVE (m-ZH)
6,5
6,0
5,5
5,0
4,5
4,0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Figura 4.11 – Comparação entre os resultados da solução apresentada no presente estudo e os resultados decorrentes da
aplicação da fórmula de Mase (1989).
Confrontado os resultados da projecção da equação geral obtida no presente trabalho com os valores
decorrentes da aplicação da fórmula de Mase (1989) que, relembre-se, deve ser tida como envolvente máxima
dos valores admissíveis, verifica-se que a solução apresentada no presente estudo prevê valores para a altura
do espraio da ordem de metade a dois terços dos valores resultantes da aplicação daquela fórmula (fig. 4.11),
conformando a tendência já identificada por outros autores (CERC, 2002; Hughes, 2004), conferindo
verosimilhança acrescida à aproximação aqui apresentada.
68
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Figura 4.12 – As arribas rochosas mergulhantes a poente da praia da Luz, sob agitação marítima de SE (3 Abril 2008).
No caso das arribas, a morfologia do plano submetido à acção da agitação marítima é invariável no tempo,
pelo que a caracterização do comportamento do espraio da agitação marítima sobre elas é muito mais simples
do que no caso das praias, onde o declive é permanentemente variável. No sentido de avaliar a equação que
traduz o espraio das ondas sobre as arribas inclinadas da praia da Luz, foram realizadas medições nos níveis de
espraio sobre os taludes na preia-mar em sete dias diferentes com condições de agitação marítima diversa.
Apesar do esforço do trabalho de campo, dois desses dias coincidiram com períodos em que a bóia de Faro
esteve inoperacional, pelo que não é possível aceder directamente à informação das condições de agitação
marítima.
69
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Perante esta dificuldade, recorreu-se aos dados da bóia fundeada ao largo de Cádiz, no caso em que a
agitação marítima foi persistente de SE, conseguindo-se obter os parâmetros escalares da agitação marítima
para o dia 4 de Abril de 2008. Relativamente ao período da agitação marítima, esta bóia fornece informação
sobre período médio e período de pico. O quadro 4.III sintetiza a informação obtida.
Quadro 4.III – Síntese dos dados de agitação marítima recolhidos nas bóias ondógrafo
Data Cota PM prevista Bóia Hs (m) Tp (s) Tmáx (s) Rumo
em Lagos (m-ZH)
4 Abril 2008 3.30 Cádiz 0.9 7 SE
2 Maio 2008 3.08 Faro 0.7 9 SW
5 Maio 2008 3.60 Faro 0.6 10 WSW
2 Junho 2008 3.41 Faro 0.3 7 WSW
16 Junho 2008 2.98 Faro 0.6 9 WSW
29 Agosto 2008 3.49 Faro 0.8 8 SW
Em cada dia, os dados das cotas das linhas de maré recolhidos no terreno foram obtidos numa série de
pontos, cobrindo uma gama extensa de inclinações da arriba, desde 3º a 20º, sendo possível colher informação
diária em 10 a 20 pontos diferentes (fig. 4.14).
Em virtude de se tratar de um ponto específico do litoral com características próprias e onde foi possível
obter dados experimentais sob condições de agitação marítima diversa, os resultados foram agregados em
classes de rumos de ondulação, designadamente os rumos de SE, SW e WSW, representativos de mais de 90%
da agitação incidente no litoral sul do Algarve.
70
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5,0
4,5
4,0 y = 1,82x 0,66
r = 0,97
3,5
Rmáx (m)
3,0
2,5
2,0
1,5
1,0
0,5 4-Abr-08
0,0
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0
Hs Eop
2,5
y = 0,96x 0,42
2,0 r = 0,71
Rmáx (m)
1,5
1,0
0,5 2-Mai-08
29-Ago-08
0,0
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0
Hs Eom
2,0
1,8 y = 0,47x 0,81
1,6 r = 0,78
1,4
Rmáx (m)
1,2
1,0
0,8
0,6 5-Mai-08
0,4 2-Jun-08
0,2
16-Jun-08
0,0
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0
Hs Eom
Figura 4.14 – Soluções para cálculo da altura do espraio nas arribas mergulhantes da praia da Luz, em função do rumo da
agitação marítima incidente, baseada nos dados experimentais (equações 4.28 a 4.30).
71
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A partir desses dados e dos parâmetros escalares da agitação marítima obtidos ao largo nas bóias
ondógrafo, foram obtidas as seguintes equações por regressão linear (fig. 4.14):
Rmáx= 0.47 Hs ξom0.81 n=38 r=0.78 rumo WSW (bóia Faro) (4.30)
em que:
Rmáx– altura do espraio máximo medido (m)
ξom – nº de Iribarren = tang β / (Hs/Lom)0.5
ξop – nº de Iribarren = tang β / (Hs/Lop)0.5
tang β – inclinação da arriba mergulhante
Hs – altura significativa da ondulação ao largo (m)
Lom – comprimento de onda ao largo (m), associado ao período máximo (Tmáx)
Lop – comprimento de onda ao largo (m), associado ao período de pico (Tp)
Substituindo nas equações anteriores os valores médios anuais da altura significativa (1.0m), do período de
pico (8.2s) e do período máximo (11.1s), obtêm-se as seguintes fórmulas simplificadas que permitem calcular a
altura de espraio das ondas, sob condições médias de agitação do mar, nas arribas mergulhantes da praia da
Luz, para os três rumos:
Rmáx= 6.89 tang β 0.66 rumo SE (4.31)
Destas equações simplificadas, adicionando a cota da maré, resultam imediatamente as equações que
permitem o cálculo da LMPMAVE para as arribas mergulhantes da praia da Luz:
Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + Rmáx <=> Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + 6.89 tang β 0.66 rumo SE (4.34)
Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + Rmáx <=> Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + 4.56 tang β 0.42 rumo SW (4.35)
Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + Rmáx <=> Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + 2.97 tang β 0.81 rumo WSW (4.36)
A tradução gráfica das soluções 4.34 a 4.36 está patente na figura 4.15 e é válida para a gama de declives
contidos nos dados experimentais, entre 3º e 20º, nas arribas mergulhantes da praia da Luz. Dos resultados
ilustrados na mesma figura, é imediata a conclusão que os níveis da cota de espraio aumentam com a rotação
dextrógira da ondulação incidente, atingindo valores máximos com o rumo de SE. Este comportamento
72
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específico deve-se ao facto de o troço das arribas mergulhantes da praia da Luz ter orientação geral de N40ºE,
praticamente normal ao rumo da ondulação de SE. A agitação marítima proveniente de rumos mais rodados a
oeste atinge as arribas já muito refractada, pelo que os níveis de espraio atingem cotas mais baixas.
7
6
5
4
3 rumo SE
rumo SW
2
rumo WSW
1 praias geral
0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20
inclinação da estrutura (º)
Figura 4.15 – Soluções gráficas para o cálculo da LMPMAVE nas arribas mergulhantes da praia da Luz, em função do rumo
da agitação marítima incidente (equações 4.34 a 4.36) e para as praias (equação 4. 26).
Dado que o enunciado da Lei nº 54/2005 relativo à LMPMAVE se refere às linha máxima, a equação que
deve ser adoptada para o troço das arribas mergulhantes da praia da Luz, deve ser a equação obtida para o
rumo de SE, isto é, a equação 4.34. Da aplicação desta equação resultam cotas da LMPMAVE que oscilam
entre os 5.2m e os 7.5m (ZH), para a gama de declives medida no terreno.
73
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A título prospectivo elaborou-se a figura 4.16, que inclui o resultado da aplicação solução desenvolvida para
o Algarve (equação 4.24) a toda a frente costeira de Portugal Continental. Para o litoral ocidental foram
considerados os valores médios anuais da altura significativa e do período máximo inscritos no Quadro 3.II,
obtidos nas bóias da Figueira da Foz e Sines, e um valor de 4.0m (ZH) para a cota da preia-mar de águas-vivas
equinociais ao largo. A partir da equação de altura de espraio obtida (equação 4.24), obtém-se as equações
para:
Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + Rmáx <=> Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + 28.4 tangβ (4.38)
Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + Rmáx <=> Cota LMPMAVE (m-ZH) = 4m + 24.3 tangβ (4.40)
10
cota da LMPMAVE (m-ZH)
4
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
declive da face da praia (º)
Figura 4.16 – Aplicação da solução obtida no presente trabalho para a definição da cota da LMPMAVE nas praias do litoral
de Portugal Continental.
O gráfico da figura 4.16 contém a síntese da aplicação das soluções para os três troços costeiros de
Portugal Continental. As estimativas obtidas para o litoral ocidental apontam para cotas da LMPMAVE que
superam significativamente os valores de referência para a LMPMAVE utilizados pela Comissão do Domínio
74
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Público Marítimo para a costa ocidental (6.0m-ZH = 4.0m-NMM), recentemente incluídos no Despacho
Normativo nº 32/2008 do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.
No sentido de contribuir para a definição das equações válidas para o litoral ocidental sul, a ARH do Algarve
deu início ao levantamento de perfis de praia e ao registo dos declives da face da praia em oito praias do
Algarve, no troço compreendido entre Odeceixe e o cabo S. Vicente e em duas praias no litoral alentejano. Na
figura 4.17 ilustram-se os resultados obtidos no terreno, na praia de Almograve, com areia média, declive médio
de 6.8º (média de 8 observações) e suportada por arribas cortadas em rochas paleozóicas, localizada na costa
alentejana, a cerca de 35 Km a sul do cabo de Sines.
30 Março 2009
Maré prevista = 3.25m
Na bóia Sines:
Hs = 1.7m
Tmáx – 13s
Rumo - NW
Figura 4.17 – Linha de maré impressa no areal em 30 de Março de 2009 na praia do Almograve. Foto de 31 Março de 2009.
A linha de maré impressa no areal em 30 de Março de 2009 (cota da preia-mar prevista no porto de Sines
- 3.25m ZH), na praia do Almograve atingiu a cota 6.60m (ZH), sendo que a inclinação da face da praia foi de
6.7º, idêntica às condições médias (o valor médio de 8 observações é de 6.8º). Da mesma maneira, as
condições de agitação marítima registadas na bóia de Sines, que geraram essa linha de maré foram também
idênticas às condições médias anuais registadas nesta bóia (Hs = 1.7m e Tmáx = 13s, vide quadro 3.II). No
mesmo dia, verificou-se que na praia do norte de Sines, com areia grosseira, a linha da mesma maré atingia a
cota 7. 65m (ZH), sendo que o declive da face da praia era de 7.1º (nesta praia, o declive médio da face da
praia, resultante de um universo de 16 medições, é de 7.5º).
75
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Tendo em consideração que a cota da maré prevista para o dia 30 de Março de 2009 é cerca de 0.65m
inferior à máxima maré astronómica, os resultados experimentais colhidos nestas duas praias alentejanas
mostram que, no litoral ocidental, a cota da LMPMAVE pode atingir valores que excedem o plano dos 8.0m (ZH),
como é o caso da praia norte de Sines. Os resultados obtidos no terreno nestas duas praias indiciam, ainda, que
as curvas propostas, a título prospectivo, para o litoral ocidental, na figura 4.16, constituem referencial com
grande potencial e verosimilhança.
No caso das arribas, onde não existe variação da morfologia, a aplicação das soluções no terreno é
imediata bastando, para tanto, associar a LMPMAVE à curva de nível correspondente à cota de espraio obtida
na equação 4.34 para o declive da arriba em causa.
Já para as praias, onde a variação morfológica é diária, a associação da LMPMAVE à cota extraída da
equação 4.24, tendo em consideração o declive médio da face da praia, levanta desde logo o problema da
representatividade do levantamento onde se implantará a LMPMAVE. Como é do conhecimento geral e
particularmente de quem lida diariamente com a dinâmica morfológica das praias, neste ambiente não existem
dois levantamentos iguais; qualquer levantamento executado na praia após a incidência da ondulação fica
inevitavelmente desactualizado. Mesmo conhecendo a cota da LMPMAVE de cada praia, a materialização dessa
curva de nível só pode ser associada à data do levantamento topográfico. Qualquer outro levantamento,
executado em data diversa, terá a mesma curva de nível em local diferente.
Desta incerteza resultou a necessidade de olhar para o problema de forma diversa, mais abrangente, tendo
em mente o espírito da Lei e a necessidade de sua concretização no terreno. Desse esforço resultou a solução
apresentada e discutida no capítulo seguinte que pretende ultrapassar os constrangimentos que a interpretação
literal da Lei oferece para os organismos responsáveis pela administração do leito e da margem das águas do
mar.
76
MINISTÉRIO DO AMBIENTE,
DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
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O objectivo final do presente trabalho é fornecer a informação técnico-científica que permita a materialização
da LMPMAVE no terreno, de forma a definir o limite entre o leito e a margem das águas do mar, definidos na Lei
nº 54/2005. No capítulo anterior foi apresentada uma solução que associa a LMPMAVE a uma cota, variável em
função do declive da praia ou da arriba. O problema seguinte a resolver é a escolha do levantamento topográfico
onde se deverá marcar essa cota. Se no caso do litoral rochoso, a escolha do levantamento a utilizar não levanta
qualquer problema, já no caso das praias se torna muito difícil, face à dinâmica natural que as caracteriza,
desactualizando imediatamente após a execução qualquer levantamento que se faça. Este não é um problema
específico da LMPMAVE; também na materialização da linha do NMM, que marca o limite das cartas
topográficas é escolhida uma linha que reproduz a linha do NMM no momento da execução do levantamento (p.
ex. o momento da recolha da fotografia) ou, na melhor das hipóteses, uma linha média das várias posições que
a linha do NMM toma ao longo do tempo. Se no caso do litoral rochoso resistente (e.g. em arribas mergulhantes)
essa linha é imutável à escala humana, já em zonas de praia, submetidas a variações morfológicas diárias, o
carácter errático da linha é flagrante.
77
MINISTÉRIO DO AMBIENTE,
DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
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Apesar desta série de condicionantes, a observação directa pode fornecer informação relevante, tendo em
consideração o pressuposto óbvio que a LMPMAVE deve ser marcada para além de qualquer linha de maré
impressa no areal sob condições de agitação igual ou inferior à agitação média, durante uma preia-mar de cota
igual ou inferior à máxima preia-mar de águas vivas equinociais.
Para ilustrar a variabilidade do conteúdo sedimentar das praias e a dificuldade de escolha do levantamento
topográfico para a definição da LMPMAVE, vejam-se os resultados patentes na figura 5.1, que reproduzem a
evolução do perfil de praia transversal da praia do Inatel (Albufeira) suportada por arriba subvertical, num
período de 7 anos. Entre Maio de 2000 e Fevereiro de 2007, a cota máxima do areal variou entre 4.7m (ZH), em
Abril de 2003, e 6.4m (ZH) em Outubro de 2004. A LMPMAVE do equinócio de Março de 2003 atingiu a base da
arriba mas a LMPMAVE do equinócio de Setembro de 2004 não atingiu a base da arriba.
6 22-Jun-01 4-Set-01
2-Out-01 15-Jan-02
5
cota (m-ZH)
15-Abr-02 10-Jul-02
4 8-Out-02 3-Abr-03
15-Jul-03 14-Out-03
3
14-Jan-04 6-Abr-04
2 6-Jul-04 15-Out-04
10-Fev-05 9-Jun-05
1
21-Set-05 20-Dez-05
0 19-Abr-06 23-Ago-06
0 20 40 60 80 100 27-Fev-07
Distância (m)
Figura 5.1- Variação do perfil de praia do Inatel (Albufeira), entre Maio de 2000 e Fevereiro de 2007.
Utilizando a equação da solução sintética do espraio válida para o litoral sul do Algarve (equação 4.24), isto
é, estimando a cota de espraio atingida sob condições de agitação média em preia-mar de águas vivas
equinociais, se a praia tivesse o perfil levantado em cada momento, obter-se-ia a variação das cotas da
LMPMAVE representadas na figura 5.2. Na mesma figura está representada a cota do areal na base da arriba no
momento da execução de cada perfil. Da confrontação das suas séries cronológicas resulta que, da série de 27
perfis levantados num período de 7 anos, em três períodos (Abr-Jul 2003, Jan-Abr 2004 e Fev 2005) a cota da
LMPMAVE atingiria a base na arriba (fig.5.2). Estas circunstâncias ocorreram ou após a incidência de ondulação
de tempestade que gera o rebaixamento generalizado da praia, diminuindo as cotas do areal na base da arriba,
78
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
ou sob condições de robustecimento do areal, em que os declives da praia tendem a aumentar, permitindo a
subida do espraio até níveis mais elevados. Em Fevereiro de 2008, após a incidência de ondulação de
tempestade de SE, com alturas significativas de 4m registadas na bóia de Faro, a praia do Inatel foi novamente
sujeita a rebaixamento generalizado de que resultou a exumação da plataforma de abrasão (fig.5.3). Após a
tempestade, nos dias subsequentes, com a incidência de ondulação com condições de agitação média, a linha
da PM atingiu a base da arriba. O mesmo se verificou na preia-mar equinocial de Março de 2008.
6,5
6,0
cota (m-ZH)
5,5
5,0
Figura 5.2 - Praia do Inatel. Variação temporal da cota máxima da praia e da cota do espraio das ondas estimada para
condições de agitação média do mar e sob preia-mar de águas vivas equinociais
Figura 5.3 - Praia do Inatel após a incidência de ondulação de tempestade de SE, em 17 Fevereiro de 2008, quando
ocorreu rebaixamento generalizado do areal, com um máximo de 3m na base da arriba.
79
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Dos valores apresentados resulta que, na praia do Inatel, em 8 anos, por 4 vezes ocorreu a incidência da
linha de PM na base da arriba sob condições de agitação média do mar, o mesmo é dizer que a incidência da
LMPMAVE na base da arriba teve um período de retorno médio de 2 anos. Noutras praias, estas circunstâncias
têm período de retorno inferior, como no caso de Vale de Centeanes (Lagoa), ilustrado na figura 5.4, onde a
LMPMAVE atinge anualmente a base da arriba.
No caso da praia de Vale de Centeanes, a escolha do ano de observação é indiferente para a definição da
LMPMAVE (que coincide com a base da arriba) mas, para a praia do Inatel, a escolha aleatória induz a
disparidades significativas. Se se adoptassem os dados recolhidos no triénio 2000-2003 considerar-se-ia que
nesta praia a LMPMAVE não atinge a base da arriba, mas se se tiver presente os dados do triénio 2003-2005
imediatamente se concluiria que, na praia do Inatel, a LMPMAVE atinge a base da arriba.
a) b)
c) d)
Figura 5.4 - Praia de Vale de Centeanes. a) 10 de Março de 2005, após a ocorrência de ondulação de SE, rotação do areal
para W (areia na gruta do promontório); b) 20 de Abril de 2006, na baixa-mar de águas mortas, c) 20 de Janeiro de 2006
sob ondulação de tempestade, em preia-mar de águas-mortas. d) 31 de Março de 2006, na estofa da baixa-mar de águas
vivas equinociais; a linha de maré da PM (equivalente à LMPMAVE) anterior varreu toda a praia e atingiu a base da arriba
(inclinação da face da praia 9º).
80
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Como é do conhecimento geral, os fenómenos naturais que condicionam a LMPMAVE, a maré e a agitação
marítima, têm ciclos próprios. O ciclo lunar nodal tem um período de 18.6 anos; embora ainda não
completamente conhecidos e quantificados, os elementos do clima que influenciam o regime de agitação
marítima e da precipitação são também sujeitos a ciclos associados ao forçamento externo, de que se destacam
o ciclo de manchas solares, com período de cerca de 11 anos. As normais climatológicas são definidas para
períodos convencionais de 30 anos. Desta multiplicidade de ciclos dos fenómenos naturais resulta uma
oscilação plurianual da LMPMAVE, contida entre uma franja com amplitude tanto maior quanto maior for o
período considerado, na medida em que a probabilidade de os ciclos se encontrarem em fase é maior.
Assim, afigura-se razoável considerar que a definição da LMPMAVE deve basear-se num horizonte
temporal mais largo e nunca restringir-se à observação aleatória num determinado ano, numa qualquer maré
equinocial, sob pena de se desvirtuar o espírito da Lei nº 54/2005. Para reforçar a razoabilidade desta opção
atente-se ao facto de o legislador referir expressamente que para definição das cheias médias, descritas no nº 2
do artigo 2º do Decreto-Lei nº 468/71, devem utilizar-se “as que podem prever-se com a possibilidade de
ocorrência de uma vez de cada quatro ou cinco anos“ (Amaral e Fernandes, 1978, p. 84). Não obstante, e dado
que o nº 2 do artº 10 da Lei nº 54/2005 alude expressamente à linha da máxima preia-mar de águas-vivas
equinociais sob condições de agitação média, deverá considerar-se sempre a linha máxima observada. Assim,
nos dois exemplos ilustrados, a praia do Inatel e a praia de Vale Centeanes, deve considerar-se a LMPMAVE
coincidente com a base da arriba.
Sobre o conjunto de ciclos dos fenómenos naturais sobrepõem-se os ciclos regulamentares dos Planos de
Ordenamento do Território que regulam as ocupações e usos, nomeadamente os Planos Regionais do
Ordenamento do Território e os Planos de Ordenamento da Orla Costeira, cujas revisões ocorrem com período
de 10 anos. A conjugação dos ciclos dos fenómenos naturais com a periodicidade da revisão das normas
regulamentares, que determinam a gestão dos usos e ocupações do leito e da margem das águas do mar,
deverá obrigar a que o intervalo temporal associado à definição da LMPMAVE seja ancorado num horizonte de,
pelo menos, a ordem da década, sob pena de impossibilitar a estabilidade dessa linha durante o período de
eficácia daqueles Planos. Esta opção metodológica, que se considera assente no espírito da Lei nº 54/2005,
obriga ao conhecimento pormenorizado da evolução das praias à escala temporal da década, em particular no
que se refere à oscilação do areal, por forma a definir o traçado da máxima LMPMAVE durante o mesmo
período.
Neste ponto interessa introduzir os conceitos de avanço e recuo das águas, vertidos nos artigos 13º e 14º
da Lei nº 54/2005, nos mesmos termos dos artigos 6º e 7º do Decreto-Lei nº 468/71:
81
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ARTIGO 13º
(Recuo das águas)
Os leitos dominiais que forem abandonados pelas águas, ou lhes forem conquistados, não acrescem às
parcelas privadas da margem que porventura lhes sejam contíguas, continuando integrados no domínio
público se não excederem as larguras fixadas no artigo 10º, e entrando automaticamente no domínio
privado do Estado no caso contrário.
ARTIGO 14º
(Avanço das águas)
1. Quando haja parcelas privadas contíguas a leitos dominiais, as porções de terrenos corroídas lenta e
sucessivamente pelas águas consideram-se automaticamente integradas no domínio público, sem que
por isso haja lugar a qualquer indemnização.
2. Se as parcelas privadas contíguas a leitos dominiais forem invadidas pelas águas que nelas permaneçam
sem que haja corrosão dos terrenos, os respectivos proprietários conservam o direito de propriedade, mas
o Estado pode expropriar essas parcelas.
A redacção destes artigos é clara quanto à natureza jurídica dos terrenos sujeitos às alterações dos limites
do leito das águas do mar. Nas praias, no caso de o mar avançar (ou a LMPMAVE recuar, por acção da erosão
associada a uma tempestade), a fracção da praia corroída integra automaticamente o domínio público. No caso
de as águas recuarem (ou a LMPMAVE avançar no sentido do mar, por crescimento da praia), as parcelas
abandonadas permanecem no domínio público, desde que mantenham as características de praia (Amaral e
Fernandes, 1978, p. 121). Da conjugação destes artigos resulta que as praias permanecem sempre no domínio
público, independentemente das flutuações morfológicas associadas à sua dinâmica natural.
82
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Figura 5.5. Esquema ilustrativo da variação morfológica do perfil de praia em praias suportadas por arribas no litoral
meridional do Algarve.
Com intuito ilustrativo, na figura 5.6 apresentam-se alguns exemplos de praias em que esse fenómeno foi
detectado após a ocorrência de ondulação de tempestade. No caso de arribas rochosas, a exumação da
plataforma de abrasão é acompanhada pela presença de depósito residual de blocos, correspondente ao nível
de base das praias, sobre o qual se acumula a areia. Nas arribas do litoral meridional do Algarve, cortadas em
rochas mesozóicas (desde Porto de Mós até à praia do Beliche), este depósito residual de blocos tem grande
expressão e corresponde aos resíduos resistentes dos produtos dos movimentos de massa das arribas.
Nas praias encaixadas, contidas entre promontórios resistentes, além das flutuações transversais da praia
verificam-se oscilações sazonais do crescente de areia associadas ao transporte longilitoral induzido pelo rumo
da ondulação incidente. No litoral sul do Algarve, rumos de sudoeste tendem a gerar acumulação (traduzida no
aumento da largura da praia) no extremo nascente das enseadas e erosão (traduzida na diminuição da largura
da praia) no extremo oposto. Fenómeno inverso ocorre sob a incidência de mar de levante. Esta variação do
crescente das praias verifica-se ao longo do ano nas pequenas praias encaixadas, onde o conteúdo sedimentar
oscila longilitoralmente de forma rápida com o rumo da ondulação incidente, de tal modo que a LMPMAVE no
decurso dessa oscilação acaba por varrer a totalidade da base da arriba (figura 5.7). A frequência com que o
varrimento da base da arriba pela LMPMAVE ocorre depende da largura e do comprimento da praia. Esse
fenómeno ocorre com maior frequência em praias pequenas e estreitas (tipicamente todos os anos), tornando-se
menos frequente em praias mais largas ou mais compridas.
Nas praias mais compridas, incluindo as enseadas de Armação de Pêra e Albufeira, a oscilação do
crescente de praia faz-se sentir apenas nos extremos das enseadas. Nas figuras 5.8 e 5.9 ilustra-se a expressão
deste fenómeno sazonal, verificado nas baías de Armação de Pêra e Albufeira, com alterações da largura da
praia que podem atingir mais de 50m, fazendo com que a LMPMAVE incida na base da arriba, pendular e
alternadamente, nas praias dos extremos das baías.
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a) Cabanas Velhas (31 Dezembro 2007) b) Porto de Mós (28 Fevereiro 2008)
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Figura 5.7 – Esquema de variação espacial do crescente de praia e da LMPMAVE em praias encaixadas, associada à
variação do rumo da ondulação incidente.
4
4
3
3
2
2
1 1
0 0
0 20 40 60 80 100 0 20 40 60 80 100
Distância (m) Distância (m)
13-05-2002 13-06-2002 12-07-2002 22-08-2002 24-09-2002 13-05-2002 13-06-2002 12-07-2002 24-09-2002 10-10-2002
10-10-2002 08-11-2002 12-12-2002 10-01-2003 07-02-2003 08-11-2002 12-12-2002 10-01-2003 07-02-2003 20-03-2003
20-03-2003 16-04-2003 03-06-2003 03-07-2003 27-08-2003 16-04-2003 03-06-2003 03-07-2003 27-08-2003 30-09-2003
30-09-2003 30-10-2003 26-11-2003 28-01-2004 25-03-2004 30-10-2003 26-11-2003 28-01-2004 25-03-2004 22-04-2004
22-04-2004 17-06-2004 20-07-2004 31-08-2004 17-06-2004 20-07-2004 31-08-2004
A1 A2
Figura 5.8 – Variação sazonal de perfis de praia localizados nos extremos de praias da baía de Armação de Pera: A1 - Vale
Olival (Lagoa), localizado no extremo poente; A2 - Galé (Albufeira), localizado no extremo nascente (Pinto, 2006).
Praia do Peneco
7 Forte de S. João
7
6
6
5
cota (m-ZH)
5
cota (m-ZH)
4
4
3
3
2
2
1
1
0
0
0 20 40 60 80 100 0 20 40 60 80 100
distância (m) distância (m)
23-Mai-00 19-Jul-00 31-Ago-00 13-Dez-00 13-Fev-01 24-Abr-01 23-Mai-00 19-Jul-00 31-Ago-00 13-Dez-00 13-Fev-01 24-Abr-01
22-Jun-01 4-Set-01 2-Out-01 15-Jan-02 15-Abr-02 10-Jul-02 22-Jun-01 4-Set-01 2-Out-01 15-Jan-02 15-Abr-02 10-Jul-02
8-Out-02 21-Jan-03 3-Abr-03 15-Jul-03 14-Out-03 14-Jan-04 8-Out-02 21-Jan-03 3-Abr-03 15-Jul-03 14-Out-03 14-Jan-04
1-Mai-05 1-Set-05 1-Dez-05 10-Fev-05 9-Jun-05 21-Set-05 1-Mai-05 1-Set-05 1-Dez-05 10-Fev-05 9-Jun-05 21-Set-05
20-Dez-05 19-Abr-06 23-Ago-06 25-Fev-07 10-Jun-07 20-Dez-05 19-Abr-06 23-Ago-06 25-Fev-07 10-Jun-07
B1 B2
Figura 5.9 – Variação sazonal de perfis de praia localizados nos extremos da enseada de Albufeira. B1- praia do Peneco, no
extremo poente da enseada; B2 - praia do Forte S. João, no extremo nascente da enseada.
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Quadro 5.I – Praias suportadas por arriba em que a LMPMAVE coincide com a base da arriba
Concelho Praia (*) Concelho Praia (*)
Beliche (1) Cova Redonda (2)
Tonel (1) Lagoa Tremoços (1)
Vila do Bispo Mareta (1) Beijinhos (1)
Salema (1) Vale Olival (1)
Cabanas Velhas (1) Galé (1)
Burgau (1) Galé Oeste (1)
Porto de Mós (1) Manuel Lourenço (2)
Canavial (1) Evaristo (3)
Camilo (1) Castelo (2)
Lagos D. Ana (2) Coelha (1)
Pinhão (1) Arrifes (1)
Estudante (1) Peneco (2)
Batata (2) Albufeira Inatel (2)
3 Irmãos (2) Alemães (Forte S. João) (2)
Prainha (1) Aveiros (1)
Barranco das Canas (2) Oura (3)
Portimão Vau (2) Oura Leste (1)
Careanos (1) Santa Eulália (1)
Amado (1) Maria Luísa (2)
Três Castelos (1) Olhos Àgua (1)
Molhe (1) Belharucas (2)
Pintadinho (2) Falésia (2)
Caneiros (1) Alfamar (2)
Carvoeiro (3) Vilamoura (2)
Vale Centeanes (1) Quarteira (2)
Lagoa Carvalho (2) Forte Novo (1)
Benagil (2) Almargem (1)
Marinha (2) Loulé Cavalo Preto (1)
Albandeira (1) Loulé Velho (1)
Nova (1) Vale do Lobo (1)
Sra da Rocha (3) Garrão (1)
(*) 1 – período de retorno de 1 ano ou inferior; 2 - período de retorno de 2-5 anos; 3- período de retorno de 5-10 anos.
No litoral sul do Algarve, a coincidência da LMPMAVE com a base da arriba verificou-se nas praias
suportadas por arriba identificadas no quadro 5.I. No mesmo quadro incluiu-se informação relativamente ao
período de retorno da coincidência da LMPMAVE com a base da arriba, baseada em dados recolhidos no
terreno no período entre 1995 e 2008. O período de retorno tende a ser maior nas praias mais largas (ex.
Carvoeiro, Sra da Rocha, S. Rafael), em que a LMPMAVE atinge a base da arriba uma ou duas vezes por
década, enquanto que em praias estreitas a LMPMAVE atinge a base das arribas pelo menos uma vez por ano.
Os resultados apresentados mostram que, se se considerar um intervalo de observação da ordem da década, na
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totalidade das praias naturais (isto é, sem qualquer intervenção humana) suportadas por arriba a LMPMAVE
coincide com a base da arriba.
Na figura 5.10 apresentam-se alguns exemplos do traçado da LMPMAVE em praias suportadas por arribas
alcantiladas. Nestes casos, de acordo com o disposto no nº 6 do artº 11º da Lei nº 54/2005, a margem das águas
do mar deve ser contada a partir da crista da arriba. Os critérios utilizados para o traçado da crista da arriba são
enunciados e discutidos no capítulo 6.
87
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cota (m-ZH)
5
4
4
3
3
2 2
1 1
0 0
0 20 40 60 80 100 0 20 40 60 80 100 120
distância (m) distância (m)
13-05-2002 13-06-2002 12-07-2002 22-08-2002 24-09-2002 13-05-2002 13-06-2002 12-07-2002 22-08-2002 24-09-2002
10-10-2002 08-11-2002 12-12-2002 10-01-2003 07-02-2003 10-10-2002 08-11-2002 12-12-2002 07-02-2003 20-03-2003
20-03-2003 16-04-2003 03-06-2003 03-07-2003 27-08-2003 16-04-2003 03-06-2003 03-07-2003 27-08-2003 30-09-2003
30-10-2003 26-11-2003 28-01-2004 25-03-2004 22-04-2004 30-10-2003 26-11-2003 28-01-2004 25-03-2004 22-04-2004
17-06-2004 20-07-2004 31-08-2004
.
17-06-2004 20-07-2004 31-08-2004
C1 C2
Figura 5.11 – Variação de perfis de praia suportados por dunas (baía de Armação de Pêra; Pinto, 2006). C1 – praia Grande
(Silves); C2 - praia dos Salgados (Albufeira).
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Em condições extremas, sob ondulação de tempestade, toda a praia é varrida e rebaixada, podendo
verificar-se a erosão e consequente recuo da duna, morfologicamente expresso através da formação de escarpa
(fig. 5.12). Após o desvanecimento da tempestade, nos dias subsequentes, durante a preia-mar o espraio das
ondas atinge a base da duna ou a base da escarpa de erosão.
Ao contrário das praias estreitas suportadas por arribas, onde a vulnerabilidade da praia à acção das
tempestades é máxima, nas praias suportadas por dunas a incidência da ondulação de tempestade sobre a base
da duna é um fenómeno relativamente pouco frequente. Nas praias do litoral sul, este fenómeno foi registado
sistematicamente apenas 4 vezes nos últimos 18 anos, nos Invernos de 1989/90, 1995/96, 1996/97 e 2007/2008,
quando a generalidade das praias suportadas por arribas foi também totalmente varridas pelas ondas. No
entanto, todos os anos, é possível registar fenómenos idênticos, dispersos pelas praias suportadas por cordões
dunares. Para citar alguns casos recentes, ao longo do litoral sul do Algarve escarpas de erosão nas dunas
foram registadas em Abril de 2005 na praia de Alvor Poente (Portimão), no Inverno 2005/06 nas praias de S.
Roque (Lagos) e do Cabeço (Castro Marim), em Janeiro de 2007 nas praias do Ancão (Loulé) e da Barreta
(Faro).
Figura 5.13 – Extracto do registo do período da bóia ondógrafo de Faro, entre 30 de Julho de 2008 e 29 de Agosto de 2008
(Instituto Hidrográfico).
89
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O varrimento completo das praias pelo espraio das ondas pode ainda acontecer sob condições de agitação
marítima com grandes períodos, como verificado durante a preia-mar de águas vivas de 19 de Agosto de 2008.
Cerca de 4 horas antes da estofa da preia-mar, com altura prevista de 3.55m (ZH), a bóia de Faro registou um
comboio de ondas de WSW, com altura significativa de cerca de 0.70m e períodos máximos de 15 a 17s (fig.
5.13). Este comboio de ondas atingiu as praias a nascente do Cabo Santa Maria, progressivamente de poente
para nascente, incidindo na barra da Fuzeta cerca de 1.5 horas antes da estofa da preia-mar.
Figura 5.14 – Linha de maré de águas vivas impressa em 19 de Agosto de 2008 na base da duna do extremo poente da ilha
de Tavira. Foto obtida 3h após a estofa da preia-mar.
Figura 5.15 – Linha de maré de águas vivas impressa em 19 de Agosto de 2008 na base da duna do extremo nascente da
praia da Fuzeta. Foto de 20 Agosto 2008.
90
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No terreno foi possível observar a linha de maré impressa por esse comboio de ondas, atingindo a base das
dunas, a cotas mais elevadas do que as atingidas durante a estofa da preia-mar (fig. 5.14). No dia seguinte a
esta ocorrência foi possível confirmar in situ que, no troço compreendido entre a praia da Armona (Olhão) e a
praia do Barril (Tavira), a linha de maré gerada por este comboio de ondas incidiu na base das dunas (fig. 5.15 e
5.16).
Figura 5.16 – Linha de maré de águas vivas impressa em 19 de Agosto de 2008 na base da duna do extremo nascente da
praia da Armona. Foto de 20 Agosto 2008.
Tal como descrito para as praias suportadas por arribas, também nas enseadas contendo praias suportadas
por dunas se verifica a oscilação do crescente de praia associado à variação do rumo da ondulação (v. fig. 5.7).
Sob condições de tempestade, quando se combina o efeito do rebaixamento do areal com o transporte
longilitoral, nas praias localizadas no troço barlamar das enseadas pode verificar-se a formação de escarpa de
erosão nas dunas. Nestes casos, após a passagem da tempestade, nas marés subsequentes, o espraio das
ondas varre toda a praia incidindo na base da escarpa de erosão gerada. Este foi o caso registado em Março de
2008, quando a ocorrência de tempestade de SE, com alturas significativas de 6m registadas na bóia de Faro,
foi responsável pela erosão das praias localizadas nos extremos nascente das células de circulação sedimentar
balizadas pelos molhes de acesso às barras de Alvor e de Faro-Olhão. Na maré equinocial que ocorreu nos dias
seguintes à passagem da tempestade, a LMPMAVE incidiu na base das escarpas, cortadas nas dunas que
suportam as praias da Meia Praia Nascente e da Deserta, acumuladas de encontro aos molhes poente,
respectivamente, das barras de Alvor e de Faro-Olhão (fig. 5.17).
91
MINISTÉRIO DO AMBIENTE,
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Figura 5.17 – Escarpa de erosão na base das dunas das praias acumuladas contra os molhes ocidentais das barras de
Alvor e de Faro-Olhão. A linha de maré equinocial da madrugada de 10 de Março de 2008 (preia-mar prevista de 3.7m-ZH-
Lagos e 3.6m-ZH-Faro) atingiu a base da escarpa de erosão. Fotos de Marcos Rosa.
a)
b)
Figura 5.18 - Praia de Alvor Nascente em condições de preia-mar de águas vivas equinociais. a) 28 Setembro de 2007,
(cota preia-mar prevista 3.8m-ZH-Lagos); b) 11 de Março de 2008 (cota preia-mar prevista 3.5m-ZH-Lagos).
O mesmo padrão foi verificado no troço nascente da baía de Lagos, na praia do Alvor Nascente, onde os
efeitos da erosão da base da duna se fizeram sentir numa frente de mar de cerca de 500m (fig. 5.18). Este tipo
de fenómeno extremo, com período de retorno de cerca de 10 anos, foi também registado nos Invernos de
1989/90 e 1996/97 (v. fig. 5.12). A figura 5.18 mostra a praia do Alvor sob condições de preia-mar de águas-
92
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-vivas equinociais, sendo flagrante a diferença da localização das linhas de maré impressas no areal, apesar de
diferirem apenas de 6 meses, em equinócios sucessivos. Em Setembro de 2007 a linha de maré distou cerca de
50m da base da duna, enquanto que em Março de 2008 a linha de maré atingiu a base da duna. Este caso
específico ilustra exemplarmente a imprecisão associada à escolha aleatória de um qualquer levantamento ou
de uma qualquer maré equinocial. Se, por hipótese, a LMPMAVE de Setembro de 2007 fosse considerada como
o limite do leito das águas do mar, as dunas de Alvor Nascente estariam todas fora da margem das águas do
mar 9 , pelo que as eventuais ocupações não careciam de qualquer título de utilização dos recursos hídricos. Um
semestre depois, em Março de 2008, a LMPMAVE coincidiu com a base da duna, pelo que os terrenos contidos
numa faixa de 50m para terra da base da duna integram a margem das águas do mar e toda a praia fica incluída
no leito.
O exemplo de Alvor mostra inequivocamente que o ordenamento e a boa gestão dos recursos hídricos, do
leito e da margem das águas do mar são incompatíveis com a alteração semestral dos seus limites físicos. Para
ultrapassar este absurdo é indispensável a definição de limites claros e estáveis no tempo. A opção de utilizar a
linha da máxima preia-mar de águas vivas equinociais registada durante um intervalo temporal de, pelo menos,
uma década surge como uma solução que se considera adequada e que não só vai de encontro às
recomendações expressas pelos autores do Decreto-Lei nº 468/71, cujo texto foi plasmado na Lei nº 54/2005,
como se enquadra quer nas disposições regulamentares dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira e do
Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve, com elementos cartográficos que se manterão em
vigor até à sua revisão com periodicidade de uma década. Note-se, a favor desta opção, que a frente de mar de
Alvor, sujeita ao episódio erosivo de Março de 2008, já havia sentido fenómenos idênticos em 1990 e 1996. A
LMPMAVE gerada nos fenómenos erosivos anteriores não difere significativamente da desenhada em Março de
2008 e equivale ao limite máximo (para terra) da franja de variação da LMPMAVE, considerando um intervalo
temporal de uma década.
9
Note-se que a natureza de praia da margem (a praia, ela mesma) tem 50m, pelo que o limite da margem coincide com o limite da praia
e o início da duna (c.f. nº 5 do artº 11 da Lei nº 54/2005 de 15 de Novembro).
93
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Dado o carácter sazonal do escoamento fluvial, por regra nestas ribeiras a comunicação com o mar está
assegurada durante as marés equinociais de Março, sendo rara durante as marés equinociais de Setembro.
Deste padrão natural da dinâmica fluvial resultam, obviamente, diferentes LMPMAVE consoante a época do ano
(figs. 5.20 e 5.21). Durante o equinócio de Setembro, quando a barreira está mais robusta, a LMPMAVE localiza-
-se geralmente na praia mas durante as marés equinociais de Março, quando a barreira está rasgada por uma
94
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
barra, as águas do mar penetram no interior das linhas de água desenhando uma LMPMAVE que segue o
contorno dos canais interiores das várzeas ou do canal principal da ribeira. No caso de o caudal fluvial ser
significativo, a barra rasgada na barreira ocupa todo o espaço desta (fig. 5.21), pelo que as barreiras são todas
incluídas no leito das águas do mar.
a) b)
Figura 5.20 - Lagoa do Martinhal (Vila do Bispo) em condições de preia-mar de águas vivas. a) em 13 Agosto 2007, (cota
preia-mar prevista 3.3m-ZH- Lagos); b) em 11 de Março de 2008 (cota preia-mar prevista 3.5m-ZH).
a) b)
Figura 5.21 - Lagoa dos Salgados (Silves-Albufeira) em condições de preia-mar de águas vivas equinociais. a) em 28
Setembro de 2007, (cota preia-mar prevista 3.8m-ZH); b)em 11 de Março de 2008 (cota preia-mar prevista 3.5m-ZH).
a) b)
Figura 5.22 - Praia do Vau (Portimão) em condições de preia-mar de águas vivas equinociais. a) em 28 Setembro de 2007,
(cota preia-mar prevista 3.8m-ZH); b) em 11 de Março de 2008 (cota preia-mar prevista 3.5m-ZH), quando as águas do mar
inundaram o canal de escoamento aberto no areal pelo caudal fluvial descarregado pela ribeira que desagua na praia.
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Mesmo nas praias onde desaguam pequenas linhas de água, o caudal fluvial tende a gerar canais de
escoamento rasgados nos areais das praias, inundados pelo mar durante a estofa da preia-mar (fig. 5.22). Se o
escoamento fluvial persistir, estes canais rasgados e inundados pelo mar na praia tendem a adquirir carácter
divagante, podendo varrer uma parte muito significativa desses areais. Desta dinâmica resulta que essas praias
integram necessariamente o leito das águas do mar.
Nas praias da Costa Vicentina, as áreas das zonas vestibulares das linhas de água não atingidas pelo
escoamento fluvial das ribeiras e pelas águas do mar correspondem às zonas onde se acumulam pequenas
dunas, cuja base marca o limite da LMPMAVE (fig. 5.23). Confrontando a cartografia dessas áreas executada
pelo signatário em 1989 com as manchas actuais verifica-se que, por regra, as áreas se mantêm estáveis, pelo
que a linha definida pela base destas dunas constitui a referência para o traçado da LMPMAVE.
96
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2. O leito das águas do mar, bem como das demais águas sujeitas à influência das marés, é limitado pela linha da máxima
preia-mar de águas vivas equinociais. Essa linha é definida, para cada local, em função do espraiamento das vagas em
condições médias de agitação do mar, no primeiro caso, e em condições de cheias médias, no segundo.
O enunciado da lei distingue as águas do mar das águas que, não sendo do mar, são igualmente
influenciadas pela maré. Estas últimas correspondem as águas residentes nos troços superiores dos estuários
com franca influência da água superficial continental, em que o caudal continental, embora de água doce, ainda
é influenciado pela maré. Face ao regime marcadamente sazonal e torrencial que caracteriza o escoamento
superficial das bacias hidrográficas do Algarve, no litoral sul da região este tipo de situação só ocorre durante
picos excepcionais de cheia. Salvos estes episódios paroxismais, a circulação hídrica nos estuários, lagunas e
lagoas costeiras é exclusivamente assegurada por água do mar que transita pelas barras e embocaduras desses
sistemas. Assim, nas lagunas, estuários e lagoas costeiras do Algarve meridional, a linha limite entre o leito e a
margem das águas do mar é a LMPMAVE, sendo que a largura da margem é de 50m, contada dessa linha,
conforme disposto no nº 2 do artº 11º (noção de margem; sua largura) da Lei nº 54/2005.
Nos sistemas confinados, na ausência de escoamento fluvial, a linha de máxima preia-mar depende
exclusivamente das condições de admissão e propagação da maré. Nos sistemas estuarino-lagunares a
propagação da maré não é instantânea, nem uniforme, dependendo prioritariamente das condições de admissão
das embocaduras e da morfologia dos canais distributários interiores, bem como do balanço entre as perdas de
amplitude da maré decorrentes do atrito lateral e o incremento associado ao efeito de convergência das margens
(fig. 5.24).
Figura 5.24 - Variação da propagação da maré em função da morfologia do estuário ou laguna (adaptado de Freire, 1993).
97
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A título ilustrativo, apresentam-se três casos do território de Portugal Continental em que a variação da
amplitude de maré e a LMPMAVE nas águas interiores seguem padrões distintos em função da morfologia
diversa.
Ria de Aveiro – Com uma superfície inundável pela maré de mais de uma centena de quilómetros quadrados,
intensamente recortada por complexa rede de canais e alimentada por uma única barra, esta laguna reúne as
condições favoráveis para o desenvolvimento de acentuados desfasamentos da maré. A amplitude de maré
decresce à medida que a distância relativamente à barra aumenta, sobretudo à custa da elevação dos níveis da
baixa-mar, revelando efeito preponderante do atrito lateral (fig. 5.25). Aqui, a cota da LMPMAVE decresce
suavemente para montante, com uma variação máxima de 0.5m.
Figura 5.25 – Variação da altimetria dos planos notáveis de maré na Ria de Aveiro (Teixeira, 1994).
Estuário do Guadiana – A influência da maré no estuário do Guadiana sente-se até Mértola, a mais de 60 km
da foz. Os níveis atingidos durante uma maré de águas-vivas, medidos em Outubro de 1964 (fig. 5.26), mostram
incremento progressivo das cotas da onda de maré para montante, evidenciando o predomínio do efeito de
convergência das margens do estuário na deformação da onda de maré. A 50 km da foz, a cota da LMPMAVE
situa-se mais de um metro acima da LMPMAVE registada na barra.
98
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Figura 5.26 – Propagação da maré de águas vivas no estuário do Guadiana (adaptado de González, 1995).
Figura 5.27 – Variação dos níveis de maré de águas vivas na Ria de Alvor, anteriormente à construção dos molhes,
segundo Oliveira e Gamito (1990).
99
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Ria de Alvor – Nesta laguna, em que a área sujeita à influência da maré é inferior às áreas dos sistemas
atrás ilustrados, os atrasos da propagação da maré são menos significativos. Os registos referentes a uma maré
de águas vivas, recolhidos anteriormente à construção dos molhes em 1991 e publicados por Oliveira e Gamito
(1990), mostram diminuição da amplitude de maré para montante (fig. 5.27), revelando o efeito do atrito lateral
idêntico ao sentido na Ria de Aveiro. As curvas de maré evidenciam também que, apesar da diminuição de
amplitude, as cotas dos planos da preia-mar permanecem constantes em todas as estações medidas e iguais à
cota do plano da maré registado ao largo. A recente construção dos molhes da barra do Alvor e a dragagem do
principal canal de navegação de acesso à vila de Alvor terão contribuído para a melhoria da propagação da maré
na Ria, que se terá traduzido na diminuição dos atrasos e no incremento da amplitude da maré, feita
exclusivamente à custa do rebaixamento dos planos da baixa-mar.
Nos ambientes lagunares, em que a LMPMAVE não é dependente da agitação marítima, e em que a
contribuição das linhas de água é pouco significativa, nomeadamente na Ria Formosa e na Ria de Alvor, a
observação do terreno é muito facilitada, podendo ser levada a cabo semestralmente. Nos segmentos mais
externos destes sistemas, próximos das barras, deve considerar-se que a cota da LMPMAVE coincide com a
cota do plano da máxima preia-mar ao largo e equivale à curva de nível de 4.0m (ZH), coincidindo com o limite
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
da colonização das biocenoses da vegetação halófita que ocupam os andares mais elevados dos sapais. Nas
figuras 5.28 e 5.29 apresentam-se exemplos do traçado da LMPMAVE nas lagunas da Ria Formosa e na Ria de
Alvor.
Figura 5.28 – A demarcação da LMPMAVE no canal do Ancão, na Ria Formosa. Base cartográfica utilizada – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
Figura 5.29 – A demarcação da LMPMAVE na barreira da Ria de Alvor. Base cartográfica utilizada – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
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Nas zonas mais externas dos estuários permanentes, nas imediações das barras, os critérios utilizados para
o traçado da LMPMAVE não diferem dos critérios utilizados para os sistemas lagunares, uma vez que nessas
áreas a deformação da maré não é significativa, devendo considerar-se a curva de nível equivalente à máxima
preia-mar registada ao largo (4.0m-ZH), adequando o seu traçado com a distribuição espacial da vegetação
halófita e os dados obtidos no terreno em condições da máxima preia-mar (fig. 5.30 e 5.31)
Figura 5.30 – A inundação da ribeira de Quarteira pelas águas do mar durante a preia-mar de águas vivas do equinócio de
Setembro de 2007. (28 Setembro de 2007).
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A morfologia característica deste tipo de estuários consiste num canal de escoamento principal, geralmente
único, entalhado numa planície aluvial subhorizontal, que corresponde ao leito de cheia máxima e que encosta
às vertentes do vale. Quando ocorre o rompimento da barreira com a formação de uma barra, depois de
escoado o caudal fluvial, as águas do mar penetram no canal principal, propagando-se para montante, mas
sempre confinadas aos limites dos canais, sem inundar as várzeas aluviais, acumuladas acima da LMPMAVE.
Na baixa-mar o caudal que inunda o canal tende a ser completamente escoado.
Praia dos Rebolinhos (13 Agosto 2006) Praia dos Rebolinhos (7 Abril 2008)
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Praia das Furnas (13 Agosto 2006) Praia das Furnas (7 Abril 2008)
Praia da Boca do Rio (20 Julho 2007) Praia da Boca do Rio (19 Janeiro 2007)
Figura 5.32 – Alteração sazonal da morfologia das barreiras acumuladas nas fozes dos estuários temporários que
desaguam nas praias do litoral sul da Costa Vicentina. Sem influência das águas do mar no Verão e com galgamento da
barreira e admissão de água do mar durante o Inverno hidrológico.
104
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Dado o carácter efémero e esporádico da inundação dos canais distributários das fozes destes estuários, a
distribuição espacial das comunidades halófitas é muito irregular, não permitindo cartografia segura dos limites
da inundação da água do mar sendo que, em qualquer dos casos, o traçado da LMPMAVE nunca deve atingir
cotas inferiores a 4.0m (ZH). Os dados obtidos no terreno, por observação directa em condições de preia-mar de
águas vivas, constituem aqui a melhor fonte de informação para o traçado dos limites da inundação dos canais
pelas águas do mar. Os limites da LMPMAVE traçados nestes estuários resultam sobretudo da observação feita
nas marés equinociais de Março e Abril de 2008 (fig. 5.33 e 5.34).
Figura 5.33 – Demarcação da LMPMAVE no estuário temporário da praia Nova (lagoa), a partir da observação real em 11
de Março de 2008. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
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Figura 5.34 – Demarcação da LMPMAVE no estuário temporário da ribeira do Benaçoitão (praia do Barranco), a partir da
observação real em 11 de Março de 2008. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002;
ortofotografia de 2005.
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A dinâmica hidrológica das lagoas costeiras assemelha-se à dinâmica de um açude construído numa linha
de água, em que a barreira arenosa da praia tem função estrutural de retenção do caudal acumulado na lagoa.
Em regime natural, a lagoa acumula o caudal fluvial drenado pelas linhas de água até ao momento em que o
plano de água interior ultrapassa a cota da barreira. Nessas circunstâncias é rasgada uma barra escoando em
poucas horas a quase totalidade da água acumulada na lagoa. Se não se verificar escoamento fluvial
significativo, a barra tende a permanecer aberta por um período de duas a três semanas, período em que se
verifica a penetração das águas do mar no interior das lagoas, findo o qual ocorre a colmatação da barreira pela
acção construtiva da agitação marítima. O período de retorno das aberturas destas lagoas costeiras é igual ou
inferior a um ano sendo que, em regime normal, a barra é aberta durante o Inverno. Desta dinâmica natural
resulta que as cotas atingidas pelos níveis de cheia no interior das lagoas depende apenas das cotas das
barreiras arenosas, sendo muito pouco variáveis no tempo e iguais às cotas máximas de construção da praia,
que oscilam entre os 5.5 e os 6.5m (ZH).
O critério utilizado para a demarcação da LMPMAVE nas lagoas costeiras e estuários colmatados não difere
do critério adoptado para os estuários temporários, devendo ser utilizado, na ausência de outro qualquer
referencial, a curva de nível dos 4.0m (ZH), correspondente ao plano da máxima preia-mar registada ao largo,
considerando a comunicação em equilíbrio entre o plano de água ao largo e o plano de água no interior das
lagoas costeiras em situação de barra aberta. A figura 5.35 ilustra a demarcação da LMPMAVE na lagoa costeira
do Martinhal, a partir da observação real obtida em águas vivas em Abril de 2008, quando o plano de água no
interior da lagoa atingiu a cota 4.0m (ZH).
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Figura 5.35 – Demarcação da LMPMAVE na lagoa costeira do Martinhal, a partir da observação real em 7 de Abril de 2008.
Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
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Figura 5.36 – Demarcação da LMPMAVE no estuário colmatado de Alcantarilha, a partir dos dados de observação real em
28 Setembro de 2007. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2007.
No estuário colmatado da ribeira de Alcantarilha, quando a barra está aberta, na preia-mar de águas vivas
equinociais, as águas do mar inundam o canal principal da ribeira bem como a extensa rede de valas de
drenagem (fig. 5.36), de que resulta uma LMPMAVE de contorno muito recortado.
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A intensa e crescente procura do litoral, e das praias em particular tem vindo a modificar, em alguns locais,
este padrão natural, de que resultaram alterações morfológicas com reflexo directo no traçado da LMPMAVE. As
alterações morfológicas mais significativas desencadeadas por intervenção humana, com reflexos na
demarcação da LMPMAVE, são a alimentação artificial de praias e a destruição da vegetação dunar. Ambas têm
como consequência o aumento da largura da praia e a redução temporária da frequência com que a LMPMAVE
incide sobre a estrutura de suporte da praia (duna ou arriba). A construção de estruturas físicas é outro tipo de
intervenção humana que gera alterações morfológicas no litoral, de forma directa ou indirecta, obrigando a uma
análise específica das suas consequências no traçado quer da LMPMAVE, quer do leito das águas do mar.
A – Praia da Baleeira
Na praia da Baleeira (Vila do Bispo), onde o mar (e a LMPMAVE) incidia directamente na base da arriba, as
alterações da dinâmica natural foram desencadeadas pela construção do porto da Baleeira, concluído no final da
década de 1970 (fig. 5.37). A construção do molhe deste porto induziu a rotação da praia no sentido dextrógiro e
conferiu abrigo acrescido à acção directa da agitação marítima com rumos de sul e sudoeste. Da conjugação
dos efeitos desta obra resultou a acumulação de edifício dunar de dimensões modestas na base da arriba,
tornando a arriba inactiva (fig. 5.38). Em 1991 este cordão dunar já apresentava as dimensões que se
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
mantiveram até ao presente, sem alterações significativas. Uma década foi suficiente para a acumulação de um
edifício dunar na praia da Baleeira. Resultados idênticos foram observados por Andrade (1990) nas praias da
Ria Formosa, estimando entre 7 a 10 anos, o intervalo mínimo necessário para se organizar uma duna frontal de
altura modesta.
a) (1972) b) 1983
c) 1991 d) 2005
Figura 5.37 – Evolução da praia da Baleeira nas últimas quatro décadas, associada à construção do molhe do porto da
Baleeira.
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Figura 5.38 – Praia da Baleeira em 10 de Março de 2008. A linha de maré gerada pela ondulação incidente foi depositada
na preia-mar com altura prevista em Lagos de 3.6m (ZH). Note-se que a linha de maré praticamente coincide com a base
das dunas e com a base da arriba, no troço onde não existem dunas (à direita na foto).
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a)1958 b)1983
c)1991 d) 2005
Figura 5.40 – Evolução da praia da Rocha Baixinha Nascente resultante da construção dos molhes de acesso à marina de
Vilamoura. A linha a ponteado vermelho marca o limite sul das dunas.
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a) 1991 b) 1997
c) 2002 d) 2005
Figura 5.42 - Evolução da expressão espacial dos corpos dunares na praia da Rocha Baixinha. A linha a ponteado
vermelhos marca o limite sul dos edifícios dunares.
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Os dois exemplos de alteração da estrutura de suporte da praia (arriba para duna) foram desencadeados
pela introdução artificial de estruturas de engenharia costeira que alteraram localmente a configuração e a
dinâmica do litoral. No caso da praia da Baleeira, as alterações introduzidas estão estabilizadas há cerca de
duas décadas, mas na praia da Rocha Baixinha ainda não foi atingida a situação de equilíbrio, prevendo-se que
a frente do prisma de acumulação continue a sua progressão para poente.
Nestes casos, a autoridade responsável pela gestão e licenciamento deverá considerar a LMPMAVE mais
recente, que marca o limite actual da frente dos cordões dunares, procedendo à sua actualização periódica,
idealmente a par com a revisão do respectivo Plano de Ordenamento da Orla Costeira.
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70
60
50
40 Largura natural
30
20
0.70 Mm3 0.37 Mm3
10
0
Jun-97
Jun-98
Jun-99
Jun-00
Jun-01
Jun-02
Jun-03
Jun-04
Jun-05
Jun-06
Jun-07
Jun-08
Jun-09
Jun-10
Figura 5.43 – Evolução da largura da praia de Vale de Lobo entre Outubro de 1997 e Agosto de 2009, baseada nos
resultados de seis perfis transversais levantados ao longo da extensão da zona submetida a alimentação artificial. Largura
da praia definida como a distância entre a base da arriba e a curva do Nível Médio do Mar (+2m-ZH). A largura natural,
assinalada a tracejado, corresponde à largura natural da praia sem o efeito da alimentação artificial.
Nesta praia, se tomado literal e semestralmente o enunciado da lei, no equinócio de Setembro de 1998 a
margem deveria ser contada a partir da crista da arriba, mas em Março de 1999, o limite do leito já deveria ser
marcado na praia e o limite terrestre da margem coincidiria com a base da arriba. Com a perda de areia da
alimentação, em cada semestre a margem avançaria para terra até ao equinócio de Setembro de 2004, quando
retomaria os limites anteriores ao primeiro enchimento da praia. Com a segunda intervenção de alimentação
artificial da praia, no equinócio de Setembro de 2006, a LMPMAVE retomaria a sua posição na praia, mas
previsivelmente recuará para a base da arriba num período estimado em dois anos.
A flutuação semestral da LMPMAVE, associada à alimentação artificial da praia de Vale de Lobo, mostra
exemplarmente a necessidade de optar por considerar a LMPMAVE como uma linha convencional e estável no
tempo. Nesta praia, a LMPMAVE a considerar deve ser a LMPMAVE original, na base da arriba (fig. 5.44),
anterior à alteração imposta pela alimentação artificial da praia, pelo que a margem deve ser contada a partir da
crista da arriba. Esta deve ser a norma a adoptar nas intervenções de alimentação artificial com longevidades
normalmente reduzidas e inferiores à década.
116
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Figura 5.44 – Traçado da LMPMAVE na praia de Vale do Lobo. Base ortofotografia de 2005.
B - Praia da Rocha
A praia da Rocha constitui uma excepção notável ao padrão normal da longevidade da alimentação artificial
de praias (fig. 5.45). A primeira alimentação artificial da praia teve lugar em 1970, quando foram depositados
cerca de 0.9 Mm3 de sedimentos dragados na barra e anteporto de Portimão (Gomes e Weinholtz, 1971) e,
posteriormente em 1983, mais 0.1Mm3 (Psuty e Moreira, 1990). A construção dos molhes de acesso ao porto de
Portimão tem assegurado a estabilidade do enchimento da praia desde então (fig. 5.46).
As sucessivas operações de enchimento das praias a nascente da praia da Rocha, no troço entre as praias
do Vau e da Rocha, em 1983 (0.4 Mm3), 1996 (0.64 Mm3), e 1998 (0.51Mm3; Teixeira, 1999b), com longevidades
inferiores a uma década devido às perdas para o largo e para leste, permitiram o reforço do areal da praia da
Rocha, que capturou parte muito significativa dos sedimentos transportados pela deriva litoral (fig. 5.47). O
incremento sucessivo da largura da praia da Rocha permitiu que actualmente o areal já não seja totalmente
varrido pelas ondas, ao contrário do que se verifica nas praias naturais, independentemente da estrutura de
117
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suporte da praia. Assim, no caso específico da praia da Rocha, a base da arriba não serve como linha
convencional para a demarcação da LMPMAVE, devendo ser utilizado outro tipo de linha convencional.
a) 1991 b)2005
Figura 5.46 – Evolução da praia da Rocha entre 1991 e 2005. Ortofotografias de 1991 e 2005.
Desde 1996 que se procede ao levantamento periódico e sistemático de quatro perfis transversais dispersos
ao longo do areal, visando o conhecimento da dinâmica sazonal e das tendências evolutivas a longo prazo. Na
figura 5.48 está representada a evolução temporal de um desses perfis, a uma escala temporal mais alargada e
mais fina. A figura 5.48a contém o perfil anteriormente à alimentação artificial (1968), após a alimentação
artificial de 1970 (Agosto 1973) e após a alimentação artificial de 1983 (Julho 1986), que mostram
inequivocamente o efeito imediato do aumento da largura da praia decorrente dos enchimentos da praia. Desde
Julho de 1986 até ao início de 1997 a praia manteve-se relativamente estável, iniciando novo ciclo de
acumulação até ao presente, mas desta feita associado ao alargamento da praia resultante da incorporação de
sedimentos transportados das praias a poente (troço entre o Vau e a Rocha) pela deriva litoral, submetidas a
alimentação artificial em 1996 e 1999 (v. fig. 5.47). Na figura 5.48b representa-se a evolução temporal do mesmo
perfil na última década, sendo notório o crescimento da praia e a variação morfológica sentida, que se estende
118
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ao longo de todo o perfil até um ponto distando 50m da origem, onde a variação é insignificante. Esse ponto
marca o limite das variações do perfil associadas à acção do mar e pode ser utilizado como referência do ponto
onde se acumularia a frente marítima dos edifícios dunares se a praia não fosse pisoteada. Este ponto é,
portanto, coincidente com a LMPMAVE à escala temporal da década.
200
largura da praia (m)
160
120
80
40
esporão
data
Figura 5.47 – Evolução da largura da praia da Rocha e das praias entre o Vau e os Três Castelos, entre Setembro de 1996
e Janeiro de 2009. Ver foto aérea da área na fig. 2.19. Largura da praia medida no plano do nível médio do mar, e
resultante do valor médio de quatro perfis transversais levantados periodicamente em cada praia. Note-se que a largura da
praia da Rocha aumenta de forma rápida, imediatamente após o enchimento das praias localizadas a barlamar, e de forma
mais suave, no período subsequente.
6 6
5 5
cota (m-ZH)
cota (m-ZH)
4 4
3 3
2 2
1 1
0 0
0 50 100 150 200 250 300 0 50 100 150 200 250 300
distância (m) distância (m)
Jan-68 Ago-73 Jul-86 Fev-90 14-Jan-97 9-Jun-97 14-Jan-98
24-Jun-98 24-Nov-98 22-Mar-99 14-Set-99 20-Jun-00 15-Dez-00 07-Jun-01
17-Jan-02 26-Set-02 15-Mai-03 16-Set-03 14-Fev-05 19-Out-05 17-Fev-06
Jan-68 Ago-73 Jul-86 Fev-90 14-Jan-97 17-Jan-02 19-Out-05 12-Jul-07 09-Nov-06 23-Mar-07 12-Jul-07 11-Jan-08 06-Mai-08
a) b)
Figura 5.48 – Evolução temporal do perfil transversal na praia da Rocha nos últimos 30 anos. Os perfis anteriores a 1997
foram retirados de levantamentos topográficos disponíveis: levantamentos de Agosto 1973, Julho 1986 e Fevereiro 1990
executados pela Direcção de Serviços de Obras da Direcção Geral de Portos, à escala 1/2000.
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Figura 5.49 – Traçado da LMPMAVE convencional actual na praia da Rocha. Base ortofotografia de 2005
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Aplicando o mesmo procedimento para todos os perfis levantados na praia da Rocha e definindo em cada
um o ponto limite de oscilação do areal, associado à acção do mar, obtém-se uma série de pontos que definem a
linha limite da potencial acumulação das dunas, que equivale à linha convencional da LMPMAVE, à escala da
década (fig. 5.49). A LMPMAVE assim definida coincide aproximadamente com a linha definida pelas
arrecadações dos apoios balneares, que marcam os limites do espraio das ondas que atingem a praia em
condições de tempestade (fig. 5.50), circunstância que confere elevada verosimilhança à aproximação proposta.
Figura 5.51 – Traçado da LMPMAVE na praia Verde (Castro Marim) definida através do alinhamento dos cordões dunares
contíguos intactos.
121
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Em praias com maior utilização e onde a destruição do coberto vegetal pelo pisoteio das dunas é mais
expressiva, o traçado da LMPMAVE é mais dificultado. Este tipo de ocorrência regista-se apenas em duas praias
do litoral sul do Algarve, na barreira de Armação de Pêra que isola a várzea da ribeira de Alcantarilha e na praia
da zona urbana de Monte Gordo. A destruição do coberto vegetal verifica-se durante os meses de utilização
balnear mas durante o período de Inverno é possível identificar a linha de vegetação que teima em instalar-se
todos os anos. Como primeira aproximação, pode considerar-se uma LMPMAVE convencional equivalente à
linha definida pelos retalhos da vegetação dunar incipiente, anualmente renovada, mas que mantém os seus
limites físicos estáveis de ano para ano.
No caso da praia de Monte Gordo, o traçado da linha de vegetação dunar incipiente é relativamente simples
e coincide com as soleiras das fachadas dos apoios de praia (fig. 5. 52) implantados no areal.
Figura 5.52 – A LMPMAVE convencional na praia de Monte Gordo, traçada a partir da linha definida pela vegetação dunar
incipiente. Ortofotografia de 2005 e foto aérea oblíqua de 19 de Novembro de 2007.
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Em Armação de Pêra essa linha localiza-se a sul dos apoios de praia, não sendo possível identificá-la na
zona ocupada pela comunidade piscatória (fig. 5.53), que, utilizando a praia durante todo o ano, impossibilita o
desenvolvimento da vegetação dunar. Seguindo a orientação do limite da zona dunar na praia Grande (a
nascente) e os retalhos da duna incipiente existente na barreira de Armação de Pêra, é possível definir uma
linha que reproduzirá os limites da duna que existiria na ausência de pisoteio, conforme se ilustra na figura 5.53.
A LMPMAVE convencional assim definida coincide com a curva dos 7.0m (ZH) presente no levantamento
aerofotogramétrico encomendado pelo INAG em 2002. A cota 7.0m (ZH) corresponde na praia Grande ao limite
entre a praia e a duna, conferindo grande verosimilhança à aproximação utilizada.
Figura 5.53 – A LMPMAVE convencional no extremo nascente da praia de Armação de Pêra, traçada a partir da linha
definida pela vegetação dunar incipiente e linha definida pelo limite entre a praia e a duna, na praia Grande (a nascente).
Base ortofotomapa de 2005 e foto aérea obliqua de 11 de Março de 2008.
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a) Praia do Pinhão (Lagos) 21 Junho 2006 b) Praia do Peneco (Albufeira) 21 Junho 2006
c) Praia dos Pescadores (Albufeira) 21 Junho 2006 d) Praia do Inatel (Albufeira) 21 Junho 2006
Figura 5.54 – Exemplos de estruturas de contenção e protecção das arribas construídas em praias do litoral sul do Algarve.
Como ponto prévio à reflexão, interessa recordar que no caso de arribas alcantiladas, em que a LMPMAVE
atinge a base da arriba, os limites da margem são contados a partir da crista da arriba. A interpretação deste
critério enunciado no nº 6 do artº 11º da Lei nº 54/2005 (com a mesma redacção do que o nº 6 do artº 3º do
Decreto-Lei nº 468/71), já consagrada pela jurisprudência desde 1964, é a de que a face da arriba é tratada pela
lei como se fosse o leito do mar (Amaral e Fernandes, 1978, p. 82).
As intervenções de defesa das arribas incidem sempre no sopé da vertente, podendo estender-se a toda a
face da arriba; incidem, portanto, sobre parcelas do leito do mar. O ponto fulcral da reflexão do efeito das obras
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de defesa centra-se na simples opção de considerar se a arriba alcantilada se mantém como elemento
morfológico (e, então, mantêm-se os limites do leito e da margem, anteriores à intervenção) ou, pelo contrário,
se a morfologia da arriba é alterada, modificando os limites da LMPMAVE e, consequentemente, os limites do
leito e da margem das águas do mar (fig. 5.55).
Figura 5.55 – Efeito das estruturas de contenção construídas na base das vertentes, no traçado da LMPMAVE e da margem
das águas do mar. A) antes da intervenção; B) assumindo que as estruturas construídas integram a face da arriba; C)
considerando as estruturas como elementos autónomos, sem ligação morfológica à arriba.
Tomando o exemplo da intervenção da aplicação de pano de betão projectado sobre a face da arriba (fig.
5.54c), é imediata a percepção de que a arriba mantém a sua morfologia e que, portanto, a intervenção não tem
consequências no traçado da LMPMAVE. Se se considerar, em vez do betão projectado, uma intervenção mais
pesada, como a construção de muro de suporte (fig. 5.54a), também não é difícil aceitar que a morfologia da
arriba se mantém, embora com nova roupagem. Em ambos os casos, as intervenções mantiveram a morfologia
da arriba (que permanece alcantilada), com a LMPMAVE atingindo a sua base, pelo que os critérios de
demarcação da LMPMAVE e da margem das águas do mar não são alterados relativamente à situação inicial.
Considerando uma intervenção mais localizada, o caso dos muros de suporte construídos no sopé da arriba
que incidem apenas sobre a parte inferior da face da vertente, é indubitável que a morfologia da arriba não é
significativamente alterada, mantendo-se alcantilada. Neste caso a LMPMAVE continua a incidir sobre a base da
arriba, com a particularidade de esta conter um elemento artificial adicional, que constitui tão somente uma nova
irregularidade na superfície da face da arriba, que deve ser vista como se uma bancada resistente se tratasse (v.
ponto 6.1.1.1).
O mesmo tipo de raciocínio pode ser estendido para o caso de vias de acessos construídos na face da
arriba. Em corte, este tipo de intervenção não é mais do que a repetição em sequência de muros de suporte
escalados em patamares ao longo da face da arriba (fig. 5.56). Dado que a morfologia da arriba no essencial não
é alterada, permanecendo alcantilada, a LMPMAVE, bem como os limites da margem das águas do mar, não
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devem sofrer alterações decorrentes da execução deste tipo de obras. Se se considerar que, após as
intervenções, a LMPMAVE não incide sobre a base da arriba alcantilada, desta opção pode resultar que uma
fracção da face da arriba não fique integrada na margem, gerando uma série de conflitos que necessariamente
se iniciam antes da conclusão da própria obra. Veja-se que, após a conclusão do primeiro muro de suporte, a
entidade mandatada por lei para gerir a margem, quando iniciar a construção do último muro de suporte estará já
a trabalhar em terrenos fora da margem.
Figura 5.56 – Corte representativo das alterações associadas à construção de vias de acesso na face da arriba. A) limites
da margem antes da intervenção; B) limites da margem após a intervenção (v. explicação no texto).
Da discussão anterior decorre que, quer as estruturas de defesa das arribas (muros de suporte,
enrocamentos, etc.), quer as vias de acesso construídas na face da arriba, devem ser encaradas apenas como
elementos artificiais implantados na face das arribas (no leito das águas do mar), não alterando a natureza
original das vertentes, pelo que os limites da margem das águas do mar não devem ser alterados.
A construção de marinas na frente costeira induz alterações no traçado do leito e da margem das águas do
mar, em consequência da inundação de parcelas anteriormente abrigadas da influência directa do mar,
126
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induzidas pela escavação da bacia. No litoral meridional do Algarve foram construídas duas marinas, cujo
acesso ao mar é assegurado através de canais dragados em zonas de praia.
A marina de Vilamoura, concluída no início da década de setenta, foi construída na várzea da ribeira de
Quarteira (fig. 5.57), onde a comunicação com o mar tinha carácter efémero e descontínuo, à semelhança do
que actualmente se verifica nas lagoas costeiras e nos estuários temporários. Esta obra veio tornar a inundação
do mar perene, com a consequente redefinição da LMPMAVE que coincide com as estruturas de enrocamento
que delimitam o espelho de água. Na área molhada da marina, sem influência da agitação marítima, a cota da
LMPMAVE coincide com a curva de nível de 4.0m (ZH) ou 2.0m (NMM), critério idêntico ao utilizado nos
estuários e lagunas submetidos à influência permanente da maré.
Figura 5.57 – Morfologia do litoral de Quarteira, anteriormente à construção da marina de Vilamoura. Fotografia aérea de
1958.
A construção da marina de Vilamoura incluiu ainda a construção de terraplenos na área adjacente ao plano
de água, acima da cota de inundação pelas águas do mar. Desta intervenção resultou que uma parte da área do
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estuário da ribeira de Quarteira anteriormente inundada pelas águas do mar foi excluída do leito, redesenhando
os limites da LMPMAVE. Na figura 5.58 está demarcada a LMPMAVE actual, na área de construção da marina
de Vilamoura.
Figura 5.58 – Demarcação da LMPMAVE actual na área da marina de Vilamoura e do porto de pesca de Quarteira (Loulé).
Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2007.
A marina de Albufeira foi construída no final da década de 1990, no vale tifónico da Orada, onde
anteriormente a esta obra não se registava qualquer inundação da maré. O vale foi escavado a cotas abaixo do
Zero Hidrográfico e cortado o canal de acesso nas arribas da desaparecida praia da Baleeira. Desta obra
resultou a inundação do vale pela maré, surgindo novas parcelas do leito e da margem das águas do mar. Os
limites do leito coincidem com as estruturas de contenção da marina, e seguem o contorno da curva de nível dos
4.0m (ZH).
128
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
1991
2005
Figura 5.59 – A demarcação da LMPMAVE na área da marina de Albufeira e do porto de abrigo de Albufeira. Ortofotografia
aérea de 2005.
129
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
À semelhança da construção das marinas, a implantação dos portos de pesca construídos no litoral sul do
Algarve também acarretaram alterações no traçado dos limites do leito e da margem das águas do mar. Os
terraplenos do porto da Baleeira (fig. 5.37), construídos na base das arribas da Atalaia, cessaram a incidência
directa da agitação marítima nestas vertentes. A construção de terraplenos e aterros enquadra-se no disposto do
nº 1 do artº 13º (recuo das águas) da Lei nº 54/2005, que prevê expressamente “os leitos que forem
abandonados pelas águas, ou lhes forem conquistados”. Da construção de terraplenos (leitos conquistados)
associados aos portos de pesca resulta que a LMPMAVE deve ser marcada nos limites dos terraplenos,
conforme ilustrado na figura 5.35.
Nos portos Quarteira e da Albufeira foram também construídos aterros, em zonas de praia ou na base das
arribas, com a consequente migração da LMPMAVE para o mar, conforme ilustrado nas figuras 5.58 e 5.59. A
alteração dos limites da LMPMAVE acarreta modificações nos limites da margem analisadas no capítulo
seguinte.
130
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
O objectivo último do presente estudo é a demarcação da margem das águas do mar, de acordo com o
disposto na Lei nº 54/2005, por forma a definir a área territorial terrestre de intervenção dos organismos com
competências na gestão, fiscalização e licenciamento do domínio hídrico. Nos pontos anteriores foram já
apresentados e discutidos os critérios que suportaram a definição da LMPMAVE no litoral meridional do Algarve.
Esta linha de referência define o limite marítimo da margem das águas do mar, por regra, com uma largura de
50m. Interessa agora aplicar essas conclusões à realidade física do terreno. O litoral do Algarve é
morfologicamente muito diversificado, pelo que esse traçado deve ser adequado ao contexto morfológico,
sistematizado em três grandes tipos: litoral de arriba, litoral de duna e ambientes confinados submetidos
permanente ou temporariamente à influência da maré. Em cada um destes tipos foram diferenciados sub-tipos
com particularidades específicas com reflexos na demarcação física da margem das águas do mar:
arriba rochosa
arribas com litologia homogénea arriba branda
não alcantilada
algares
morfologias singulares cones de dejecção
fajãs
estável
duna em erosão
em acumulação
pisoteada/destruída
131
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Nos pontos seguintes serão apresentados os critérios propostos para a demarcação da margem das águas
do mar no litoral do Algarve, ilustrados com exemplos concretos, que poderão servir como orientação para a
aplicação em todo o território nacional, em contextos geomorfológicos idênticos.
Figura 6.1 – As margens em arribas alcantiladas (adaptado de Amaral e Fernandes, 1978). A face da arriba tem inclinação
de 75º.
O esquema apresentado por Amaral e Fernandes (1978) para traduzir esta disposição legal, que tem vindo
a ser utilizado quer pela Comissão do Domínio Público Marítimo, quer pelo próprio Instituto da Água, está
representado na figura 6.1. A explicação das figuras, transcrita do texto de Amaral e Fernandes (1978, p. 90):
132
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“Designa-se por arriba a margem elevada e por alcantil a margem a pique (cfr. Morais, 10ª ed, Confluência,
1949). As arribas alcantiladas são, pois, as margens que, pelo seu declive, não permitem praticamente qualquer
das utilizações de que as margens normais são susceptíveis. Segundo Afonso Queiró as “arribas do mar”
entraram a fazer parte do domínio público em 22 de Março de 1868 (…).”
As definições utilizadas pelos autores do texto são claras e são equivalentes às definições de face da arriba
e de topo da arriba utilizadas na terminologia geomorfológica (fig. 6.2). A designação da crista do alcantil
equivale à crista da arriba, a partir da qual são medidas as faixas de risco para terra das arribas, constantes da
generalidade dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira. Assim, no caso de a LMPMAVE atingir a base da
arriba, a margem deve ser contada, para terra, a partir da crista da arriba.
A arriba é uma vertente costeira submetida a acção directa ou indirecta do mar e cuja evolução se processa
por uma sequência descontínua de movimentos de massa (Marques, 1997, 1998; Teixeira, 2006). A morfologia
das arribas é fortemente condicionada pelas características geológicas dos materiais em que é talhada, que
determinam o tipo de perfil das vertentes. Os critérios utilizados para demarcar a crista da arriba (o limite
marítimo da margem das águas do mar) foram hierarquizados numa escala de condicionantes geomorfológicas
que assentam, sequencialmente, na homogeneidade litológica da arriba, no tipo de materiais em que arriba é
cortada e, finalmente, no tipo de perfil da face da arriba.
133
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As figuras 6.4 e 6.5 ilustram exemplos de aplicação no terreno da demarcação no terreno das linhas
notáveis do domínio público marítimo: a LMPMAVE na base da arriba, a linha da crista da arriba e a margem,
distando 50m da crista da arriba. Em planta, quanto mais inclinada for a face da arriba mais próximas se situam
as linhas da crista da arriba e da LMPMAVE, até ao limite de arribas verticais, em que as duas linhas são
coincidentes. A linha que marca o limite da margem corresponde ao conjunto de pontos que distam 50m da
crista da arriba.
134
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Figura 6.4 - Exemplo de demarcação no terreno das linhas notáveis do leito e da margem das águas do mar, nas arribas
alcantiladas mergulhantes do cabo S. Vicente (Vila do Bispo). A LMPMAVE atinge a base da arriba pelo que a margem,
com largura de 50m, é contada a partir da crista da arriba. Foto aérea oblíqua de 22 Novembro de 2006; base cartográfica –
mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
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Figura 6.5 - Exemplo de demarcação no terreno das linhas notáveis do leito e da margem das águas do mar, nas arribas
alcantiladas contíguas à praia do Mato (Lagoa). A LMPMAVE atinge a base da arriba pelo que a margem, com largura de
50m, é contada a partir da crista da arriba. Foto aérea oblíqua de 13 Agosto de 2006; base cartográfica – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
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a) Praia dos Aveiros (Albufeira) 7 Janeiro 2005 b) Praia do Carvoeiro (Lagoa) 17 Agosto 2007
Figura 6.6 – Exemplos de arribas rochosas cortadas em litologias homogéneas, com plataformas estruturais na face da
arriba, cortada em calcarenitos do Miocénico (tipo C, fig. 6.11).
Em rochas mais resistentes acontece, por vezes, que o recuo da arriba foi tão lento que os últimos cinco mil
anos (quando o nível do mar se situaria já a menos de 2m abaixo do nível actual; Teixeira et al., 2005) não foram
suficientes para a formação plena da arriba. Nestes segmentos o troço superficial da arriba ainda conserva a
morfologia original de uma vertente continental. Desta circunstância resulta um perfil composto, com um troço
inferior subvertival e um troço superior de contorno tipicamente côncavo. Nestas condições, o traçado da crista
da arriba suscita algumas dúvidas já que, em rigor, não existe uma ruptura de declive óbvia, mas um gradiente
de declives entre 90º (o troço inferior da arriba subvertical) e 0º (o topo da arriba subhorizontal). A observação
pormenorizada de toda a frente costeira do Algarve com perfil côncavo permitiu verificar que os trilhos de pé-
posto existentes mais próximos do mar nunca ultrapassam o ponto do perfil em que a inclinação excede 25º
(1:2.14) a 30º (1:1.73), coincidindo geralmente com a linha limite da vegetação. O limiar da inclinação entre 47%
(25º) e 58% (30º) é, assim, um limitador natural quer em termos de manutenção do solo (e consequentemente
da fixação de vegetação), quer em termos da segurança de circulação para os utilizadores a pé.
Perante estes dados, com cariz essencialmente prático e baseado na observação no terreno, optou-se por
traçar a crista da arriba de perfil côncavo, seguindo a linha que limita o pendor de 50% (26.6º; 1:2). Este critério
vai, aliás, de encontro à interpretação da noção de arribas alcantiladas defendida pelos autores do Decreto-Lei
nº 468/71, que sustentam que estas vertentes são “as margens que, pelo seu declive não permitem qualquer das
utilizações de que as margens são susceptíveis “ (Amaral e Fernandes, 1978, p. 90). Na figura 6.7 está ilustrado
um exemplo de aplicação deste critério nas arribas a nascente da praia do Carvalho (Lagoa), sendo notória a
coincidência entre o pendor de 30º, a linha limite da vegetação e o trilho de pé-posto existente. O traçado dos
limites do leito e da margem das águas do mar da mesma zona, implantado sobre cartografia, está patente na
figura 6.8. Nas praias do Carvalho e de Benagil, a LMPMAVE atinge a base da arriba, pelo que a margem é
137
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contada a partir da crista da vertente. A crista da arriba é interrompida na praia de Benagil, na foz da ribeira que
desagua nesta praia, pelo que, na boca do vale, o limite da margem dista 50m directamente da LMPMAVE.
Figura 6.7 – Traçado da crista da arriba em arribas com perfil côncavo (tipo B, fig. 6.11), cortadas em calcarenitos do
Miocénico. A crista coincide com o limite do caminho de pé posto existente, trilhado no ponto da vertente com pendor de 30º
(1:1.7). Foto aérea oblíqua de 10 Julho 2006.
Figura 6.8 – Demarcação dos limites do leito e da margem das águas do mar em arribas com perfil côncavo (tipo B, fig.
6.11), cortadas em calcarenitos do Miocénico. Note-se que a crista da arriba é interrompida no extremo poente da praia de
Benagil (v. texto). Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
138
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a) Praia do Trafal (Loulé) 5 Nov 2004 b) Praia da Falésia (Albufeira) 22 Nov 2006
Figura 6.9 – Exemplos de arribas brandas cortadas em litologias homogéneas. a) Praia do Trafal, com perfil plano (tipo D,
fig. 6.11); b) Praia da Falésia, com perfil convexo (tipo E, fig. 6.11).
Figura. 6.10 – A demarcação do leito e da margem das águas na praia da Falésia (Albufeira). Base cartográfica utilizada –
mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
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Homogeneidade Morfologia da
litológica Tipo de arriba face da arriba Perfil característico da arriba *
alcantilada
Plana (A)
Côncava (B)
Rochosa CA- β >1:2 (50%)
Homogénea
Quebrada (C)
Plana (D)
Branda
Convexa (E)
Figura 6.11 – Síntese dos critérios utilizados para demarcação da crista de arribas alcantiladas, cortadas em litologias
homogéneas.
140
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Figura 6.12 – Exemplo da demarcação da crista da arriba e da margem das águas do mar em arribas rochosas alcantiladas
com heterogeneidade litológica, onde a LMPMAVE incide na base da vertente (Cerro dos Toiros – Lagos). A crista é
marcada na aresta superior do alcantil, que marca a zona mais elevada da face da arriba. Foto aérea oblíqua de 10 Julho
2006. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
141
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Independentemente do tipo de perfil das arribas com heterogeneidade litológica, a crista da arriba deve ser
marcada no ponto onde termina a face da arriba que, previsivelmente, será renovada aquando da ocorrência de
um movimento de massa que envolva toda a altura da arriba (fig. 6.12). A linha que reproduz a demarcação do
limite da margem corresponde à linha que dista 50m da crista da arriba.
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Na figura 6.16 ilustra-se um exemplo de demarcação da crista da arriba num sector costeiro entre as praias
Maria Luísa e de Santa Eulália, onde a LMPMAVE incide sobre a base da arriba alcantilada. O troço inferior da
vertente é cortado em calcarenitos do Miocénico, submetidos à acção diária da agitação marítima; o troço
superior é formado por areias pouco consolidadas, já sem acção directa da agitação marítima e com evolução
condicionada pelo efeito dos agentes subaéreos. Apenas o segmento inferior reúne as características de arriba,
pelo que a crista deve ser marcada na ruptura de declive dos calcarenitos. O limite da margem das águas do
mar deve ser marcado a partir desta crista da arriba activa e dela dista 50m.
Figura 6.16 – Demarcação da crista da arriba e da margem das águas do mar em sector com morfologia descontínua. Troço
entre as praias da Maria Luísa e Santa Eulália. Foto aérea oblíqua de 21 Junho 2006. Base cartográfica utilizada – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
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Plana (F)
Rochosa
Quebrada (G)
heterogénea
Plana (H)
Branda
Quebrada (I)
Contínua (J)
Mista
Descontínua (K)
Figura 6.17 – Síntese dos critérios utilizados para demarcação da crista da arriba em vertentes cortadas em litologias
heterogéneas.
145
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Dada a variabilidade das condições naturais em que estas arribas ocorrem, não é possível definir um padrão
específico, devendo ser analisadas as ocorrências caso a caso, em função da morfologia específica e tendo
presente o espírito da Lei na sua definição de margem. Para ilustrar esta complexidade são apresentados
exemplos reais de alguns pontos do litoral do Algarve sul, onde o traçado da crista da arriba é menos óbvio e
requer discussão adicional.
Figura 6.18 - Afloramento de eolinitos que fossilizam a arriba na ponta de Sagres. Foto de 2 Maio 2008.
10Eolinitos são rochas detríticas formadas em consequência da cimentação de depósitos dunares, geralmente de grão
médio e com cimento carbonatado.
146
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Figura 6.19 - Demarcação da margem das águas do mar na ponta de Sagres. Foto aérea oblíqua de 22 de Novembro de
2006. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
A base da superfície dos eolinitos assenta directamente sobre a arriba fóssil, que mantém o perfil
subvertical, com uma crista bem desenvolvida que marca a transição para a extensa plataforma de abrasão
marinha que culmina toda a área. O troço da arriba formada pelos eolinitos aproxima-se da morfologia das
arribas não alcantiladas, com forte inclinação. No entanto, em corte, esta arriba tem perfil quebrado, do tipo I (fig.
6.17), com um segmento inferior correspondente aos eolinitos com 30º de inclinação e um segmento superior
147
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
subvertical, correspondendo à arriba fossilizada por aquelas rochas, cortada nos dolomitos jurássicos. Assim,
quer a inclinação superior ao limiar de utilização (50%), quer o perfil global da arriba, impele à sua inclusão nas
morfologias das arribas alcantiladas, sendo que a crista do alcantil corresponde à crista da arriba cortada nos
dolomitos. Desta discussão decorre que, neste afloramento, a crista deve ser marcada na ruptura de declive dos
dolomitos, conforme ilustrado na figura 6.19.
Figura 6.20 – Geologia das arribas da ponta das Ferrarias (Lagos). Foto de 2 de Agosto de 2006.
Se considerada a inclinação da arriba da ponta das Ferrarias na sua vertente sul (30º), poderiam surgir
dúvidas quanto à demarcação da crista da arriba, uma vez que o pendor se aproxima do valor limite para a sua
utilização. No entanto, dado que os flancos apresentam pendores muito mais elevados, superiores a 70º, e
também são igualmente submetidos à acção directa da agitação marítima (a LMPMAVE incide na sua base), é
148
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imediata a escolha da opção da crista da arriba no limite superior, na continuidade da arriba adjacente (fig. 6.21).
Este critério deve ser aplicado em todos os pontais existentes no litoral do Algarve sul, onde a demarcação da
crista da arriba deve ser analisada em todos os pontos de cada promontório.
Figura 6.21 – Demarcação da margem das águas do mar na ponta das Ferrarias. Base cartográfica utilizada – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
149
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Figura 6.22 – Geologia do pontal que separa as praias do Burgau e do Cerro da Canela (Vila do Bispo). Foto de 10 Julho de
2006.
À semelhança do critério utilizado nas arribas com litologia heterogénea com perfil quebrado, a crista da
arriba a considerar na demarcação da margem das águas do mar é a crista correspondente às arribas activas,
aquelas que serão mobilizadas aquando da ocorrência de um movimento de massa das arribas decorrente da
actuação da agitação marítima. No exemplo concreto, as cristas das vertentes activas da arriba correspondem
às rupturas de declive nos três flancos do promontório (E, W e S). A evolução da crista da vertente situada a
norte do promontório é exclusivamente condicionada pelos agentes subaéreos pelo que, para a demarcação em
causa, não deve ser considerada como crista de arriba.
Figura 6.23 – Demarcação das cristas das arribas no pontal que separa as praias do Burgau e do Cerro da Canela.
Orofotografia de 2005.
150
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Figura 6.24 – Demarcação da crista da arriba activa e da margem das águas do mar no pontal que separa as praias do
Burgau e do Cerro da Canela (Vila do Bispo). Ortofotografia de 2005.
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Nas vertentes alcantiladas o limite da margem é contado 50m a partir da crista da arriba. Nas vertentes não
alcantiladas a margem é contada a partir da LMPMAVE. Não havendo escarpado definido, o limite marítimo da
margem coincide com o limite da praia, facilmente identificado com a primeira linha de vegetação acumulada na
base da vertente. Em termos de traçado, o critério aqui utilizado para a demarcação da LMPMAVE é idêntico ao
adoptado para as praias suportadas por edifícios dunares. Na figura 6.26 ilustra-se um exemplo de demarcação
da LMPMAVE na praia do Barranco (Vila do Bispo), acumulada na foz da ribeira de Benaçoitão, onde coexistem
todos os grandes tipos morfológicos do litoral: praia, duna, arriba alcantilada, arriba não alcantilada e onde a
LMPMAVE penetra para montante da foz da linha de água.
152
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Figura 6.26 – Traçado da LMPMAVE e da crista da arriba na praia do Barranco (Vila do Bispo). Foto de 22 de Novembro de
2006, obtida de sul para norte.
Figura 6.27 – Traçado da LMPMAVE e dos limites da margem na praia do Barranco (Vila do Bispo). Base cartográfica
utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
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No universo das arribas não alcantiladas merecem referência especial as arribas de morfologia
condicionada pela estrutura das formações em que as vertentes são talhadas. No Algarve, este tipo particular
aparece apenas no sector imediatamente a poente da praia da Luz. Aqui, a morfologia da arriba é condicionada
pela estrutura das rochas, sendo a superfície da arriba coincidente com a estratificação, que inclina cerca de 8-
22º no sentido do mar. Ao longo deste sector, individualizam-se pequenos troços onde existem arribas
alcantiladas, com crista bem definida (fig. 6.28).
Figura 6.28 – Morfologia das arribas no sector poente da praia da Luz. Nas arribas alcantiladas está marcada a crista da
arriba; nos segmentos em que a arriba não é alcantilada está marcada a inclinação da face da arriba, medida entre as
curvas de nível de 4m e 6m (ZH), onde se processa o espraio das ondas em condições de preia-mar de águas vivas
equinociais sob agitação média do mar. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002;
ortofotografia de 2005.
Nos segmentos em que a arriba é alcantilada, a demarcação da margem é feita considerando 50m contados
da crista; nos segmentos em que a arriba é rampeada e mergulhante, a demarcação da margem é feita
considerando 50m contados da LMPMAVE.
As arribas não alcantiladas da praia da Luz são o único caso em que é possível associar a LMPMAVE a
uma cota que depende da inclinação da arriba, medida na franja altimétrica onde se processa o espraio das
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ondas durante a preia-mar de águas vivas equinociais e sob condições de agitação marítima média, conforme
exposto pormenorizadamente no capítulo 4. Na zona em causa distinguem-se dois sectores: um, mais ocidental,
em que a inclinação da arriba toma valores de cerca de 16-22º e outro, mais oriental, em que a arriba inclina
cerca de 8º. De acordo com a equação definida com base nos dados experimentais, as cotas da LMPMAVE em
condições de agitação média do mar para aqueles declives são respectivamente de 6 e 7 m (ZH). Assim, a
demarcação da LMPMAVE é imediata e coincide com a curva de nível 6.0m (ZH) nos segmentos em que o
pendor das arribas é de 8º e equivale à curva de nível de 7.0m (ZH) nos segmentos em que as arribas inclinam
cerca de 18º.
A implantação da LMPMAVE no terreno revela que esta linha coincide ou ultrapassa a faixa definida pela
colonização de líquenes, de tom castanho-escuro, facilmente identificável em fotografia aérea (fig.6.29). O limite
da franja de colonização de líquenes é, pelo exposto, um limite expedito e imediato para o traçado da
LMPMAVE, que poderá ser utilizado nos litorais rochosos com arribas não alcantiladas.
Figura 6.29 – Demarcação da margem nas arribas não alcantiladas na praia da Luz. Note-se que, nos troços em que a
arriba é alcantilada, o limite da margem é contado da crista da arriba; nos casos em que não existe alcantil, o limite marítimo
da margem coincide com o limite superior da franja de colonização dos líquenes (castanho mais escuro). Base cartográfica
utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
155
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Morfologia da
Tipo de arriba face da arriba Perfil característico da arriba*
Continua (L)
Rochosa β<50%
Figura 6.30 – Síntese dos critérios utilizados para demarcação da margem em arribas não alcantiladas.
Conforme atrás discutido, o pendor de 50% (1:2) da face das vertentes constitui limitador natural da normal
utilização das arribas. Assim, os critérios utilizados para a demarcação da margem nas arribas não alcantiladas
devem ser restritos aos casos em que as vertentes apresentam inclinações iguais ou inferiores àquele valor.
Para pendores superiores deve procurar-se a ruptura de declive correspondente à crista e demarcar a margem
50m a partir dessa linha (fig. 6.30).
6.3.1 Algares
No litoral sul do Algarve, como na generalidade dos litorais carbonatados, a carsificação imprime morfologia
própria que requer apreciação especial, nomeadamente os algares. Os algares correspondem a cavidades
cársicas, de desenvolvimento vertical e secção circular, formadas por dissolução. No Algarve, o carso está muito
156
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desenvolvido, em particular nas formações carbonatadas do Miocénico, que constituem uma parte considerável
da faixa costeira do Barlavento. Da exumação do endocarso associada à erosão costeira e à erosão da
cobertura plistocénica que preenche as cavidades cársicas resultou a penetração das águas marinhas para o
interior do maciço. Nalguns locais, existem algares com comunicação directa com o mar a mais de 150m da
crista das arribas, como é o caso do troço entre as praias da Marinha e Albandeira (fig. 6.31).
Sendo os algares vertentes abruptas, subverticais e submetidas à acção directa do mar, portanto com
afinidades óbvias com as arribas, o rebordo superior das cavidades deve ser interpretado como se de uma crista
da arriba se tratasse. Assim, os algares com expressão à superfície devem ser incluídos no leito das águas do
mar e a margem a eles associada deve ser marcada a partir da crista do rebordo superior. A figura 6.32 ilustra a
aplicação deste critério ao troço compreendido entre as praias da Marinha e de Albandeira, de que resulta um
traçado irregular do limite da margem.
No traçado da área do domínio hídrico do litoral do Algarve meridional foram consideradas todos os algares
existentes à superfície e marcada a respectiva margem das águas do mar, com uma largura de 50m, contada do
rebordo superior destas cavidades.
Figura 6.31 – Algares entre as praias da Marinha e de Albandeira (Lagoa). Limite marítimo da margem das águas do mar
(crista da arriba). Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
157
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Figura 6.32 – Demarcação dos limites do leito e da margem das águas do mar no segmento costeiro compreendido entre as
praias da Marinha e de Albandeira (Lagoa). Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002;
ortofotografia de 2005.
.
Nas arribas rochosas, os cones de detritos acumulados, contendo elementos de todas as granulometrias,
tendem a formar um depósito compacto acumulado na base e na face da arriba que impede a acção directa do
mar na base da arriba (fig. 6.33). Com o tempo, fruto da incidência directa das ondas, os elementos finos são
remobilizados, permanecendo no sopé os elementos maiores (blocos) que, embora funcionem como elementos
de protecção da base da arriba, não impedem que, nos interstícios, as águas do mar circulem e incidam na base
da vertente. Desta dinâmica resulta que, nestes casos, não se deve considerar qualquer alteração no critério de
demarcação da margem, pelo que mesmo após a ocorrência de movimento de massa, deve ser sempre utilizada
a crista da arriba. Esta metodologia equivale a considerar que os cones de detritos são temporários e enquanto
persistem fazem parte da face da arriba.
158
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Figura 6.33 - Cone de dejecção de movimento de massa registado em 22 de Março de 1998. Foto de 2 Agosto de 2006.
Este critério deve ser estendido para as arribas arenosas, em que os cones de dejecção são constituídos
por sedimentos areno-argilosos que podem permanecer por mais de um ano no sopé da vertente, como sucede
na generalidade do troço que contem as escarpas da praia da Falésia (Albufeira). Nos anos em que a agitação
marítima é mais forte, ocorre a remoção dos cones de dejecção e a LMPMAVE atinge a base da arriba como
sucedeu nos Invernos de 1995/96 e 2007/2008. A LMPMAVE gerada no equinócio subsequente de Março de
2008 atingiu a totalidade da base da arriba. Nos anos posteriores, a tendência é para a acumulação de cones,
até ocorrer um temporal que procede à sua remoção.
6.3.3 Fajãs
A litologia, a estratificação subhorizontal e a elevada fracturação das rochas, em que são talhadas as arribas
rochosas do Algarve sul, tendencialmente promovem movimentos de massa de vertente de relativa pequena
dimensão, com cones de detritos de dimensões modestas (deslocando volumes até 104 m3), rapidamente
remobilizados pela acção do mar. Na costa ocidental do Continente e, particularmente, no litoral das Regiões
Autónomas dos Açores e da Madeira, em que as arribas se elevam a centenas de metros, os movimentos de
massa podem atingir grandes dimensões, mobilizando volumes muito significativos. Rodrigues (2002) relatou um
grande movimento de massa na Ilha da Madeira, numa arriba com 400m de altura, que gerou um tsunami com
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ondas de 8m de altura, provocando a morte de 19 pessoas, numa praia situada a 500m do local da ruptura da
arriba.
Estes grandes movimentos de massa geram cones de dejecção de grandes dimensões acumulados na
base das arribas, sendo elementos geomorfológicos comuns e característicos das Ilhas, localmente designados
por fajãs. No litoral ocidental este tipo de depósito é relativamente frequente, embora com dimensões muito mais
modestas do que os seus equivalentes insulares. Face à sua dimensão, estes depósitos têm grandes
longevidades, sendo frequentemente seculares e, muitas vezes, milenares. Após a sua formação, a frente do
cone de dejecção passa a ser actuada pela acção directa da agitação marítima talhando tipicamente uma nova
escarpa cortada nos depósitos, com altura inferior à arriba onde se registou o colapso original (fig. 6.34). Esta
última deixa de ser actuada pela acção do mar (protegida pela presença do cone de dejecção) sendo a sua
evolução comandada pela erosão subaérea, adquirindo característica de arriba fóssil e inactiva enquanto o
depósito da fajã não for completamente removido pela acção da agitação marítima.
Figura 6.34 – Modelo de evolução das arribas onde se verificam grandes movimentos de massa, com formação de cones de
detritos com grande longevidade (fajãs). CAa – crista da arriba activa; CAf – crista da arriba fóssil.
No litoral do Algarve sul não há qualquer caso deste tipo de dinâmica dos grandes movimentos de massa.
Na orla costeira meridional, a remoção dos cones de dejecção é relativamente rápida, pelo que não existem
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arribas estritamente fósseis. Por se tratar de um caso particular, embora inexistente no litoral sul do Algarve, foi
analisado, a título de exemplo, um destes depósitos localizado no troço costeiro a norte da concha de S.
Martinho do Porto (Alcobaça), onde as arribas atingem alturas de cerca de uma centena de metros (fig. 6.35).
Aqui, as arribas são cortadas em rochas estratificadas do Jurássico, dispostas em sequências contendo siltitos,
argilitos, calcários margosos com fracturas de direcção NW-SE ou N-S (Marques, 1997b). A base das arribas
contém depósito de calhaus e blocos residuais de produtos de desmoronamentos, onde é bem visível a faixa
escura colonizada por líquenes, pelo que se concluiu imediatamente que a LMPMAVE incide na base das
vertentes.
Figura 6.35 – As arribas do sítio do Facho, em Alcobaça. Ao fundo à direita a baía de S. Martinho do Porto. Foto de Julho
2007 (Mota Lopes).
161
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A formação da fajã do Facho, constituindo um depósito de protecção do pé da arriba, tornou inactiva a arriba
original, cuja evolução actual é idêntica à evolução das vertentes continentais, dependendo exclusivamente dos
agentes mesológicos subáereos. No segmento costeiro onde se registou o movimento de massa, a arriba activa
foi transferida para a testa do cone de detritos (fig. 6.36), que recuou a taxas médias de cerca de 1m/ano na
segunda metade do século XX, de acordo com os resultados de Sequeira (2006).
Figura 6.36 – Morfologia da fajã do sítio do Facho (Alcobaça). Foto de Julho de 2007 (Mota Lopes).
Ao contrário do que se verifica no Cerro da Canela (v. ponto 6.1.4C), nas arribas do Facho a crista da
escarpa activa, embora mantendo a sua orientação paralela ao litoral, não tem continuidade espacial, sendo
constituída por dois segmentos distintos: um segmento a SE, implantado na arriba original a cerca de 70m de
altura, e outro segmento a NW, recortado na testa da fajã, a cerca de 10-20m de altura. Os elementos de ligação
destes dois segmentos correspondem às linhas da cicatriz do movimento de massa, com orientação NW-SE
(figs. 6.36, 6.37). Deste padrão complexo decorre que na área em apreço a margem das águas do mar tem
necessariamente descontinuidade espacial, sendo interrompida nas linhas de cicatriz da fajã.
No segmento da arriba mais elevada, que não foi afectado pelo movimento e que mantêm o seu perfil de
arriba alcantilada, a margem deve ser marcada a partir da crista do alcantil, deste distando 50m. O mesmo
procedimento deve ser feito na crista da arriba cortada na testa da fajã. As linhas da cicatriz do escorregamento
servem como delimitadores de fecho da margem, coincidindo com os limites laterais da margem na franja da
testa da fajã. Os dois pontos de intersecção entre as duas cicatrizes do escorregamento e a crista da arriba mais
elevada (a cerca de 70m) devem ser utilizados como referências para a demarcação da margem, ortogonal à
crista da arriba. O desenho final da demarcação da margem das águas do mar nas arribas do Facho está
patente na figura 6.37.
162
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Figura 6.37 – Demarcação da margem das águas do mar nas arribas do sítio do Facho (Alcobaça). Base: mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; Equidistância das curvas de nível 2m.
163
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como discutido no ponto 5.63, nestas zonas o traçado daquela linha deve acompanhar a orientação do limite dos
cordões dunares contíguos à zona pisoteada, distando o limite da margem 50m da LMPMAVE. Na figura 6.39
ilustra-se um exemplo da aplicação deste critério na praia Verde.
Figura 6.38 - Praia de Santo António (Vila Real de Santo António). Exemplo de traçado da LMPMAVE, coincidente com o
limite entre a praia e a duna. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de
2005.
Figura 6.39 – Traçado da LMPMAVE e da margem da praia Verde (Castro Marim). Base cartográfica utilizada – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
164
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Quadro 6.I – Periodicidade de revisão dos limites físicos da LMPMAVE, em função das taxas de recuo do litoral
Taxa de recuo da estrutura de Intervalo de revisão do traçado da Recuo acumulado no intervalo entre
suporte da praia (duna ou arriba) LMPMAVE revisões consecutivas
<0.5m/ano aquando da revisão do POOC <6m*
0.5-1m/ano 10 anos 5-10m
1-2m/ano 5 anos 5-10m
2-5m 2 anos 4-10m
(*) considerando intervalo realista de 12 anos entre a revisão sucessiva dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira
Apesar da estabilidade da baía de Armação de Pêra à escala milenar, o crescente de praia contido na baía
é sujeito a oscilações da sua configuração planar com intervalo temporal mais curto, relacionadas com as
alterações dos parâmetros da ondulação incidente. Da análise de uma série de documentos cartográficos e
fotográficos (levantamentos topográficos, ortofotomapas e fotografia aérea), Pinto e Teixeira (2003) e Pinto
(2006) puderam verificar a existência de variações significativas na configuração das praias da baía de Armação
de Pêra, nas últimas quatro décadas.
165
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As alterações registadas traduzem-se em variações na configuração planar da baía a longo prazo, com
oscilações do crescente de praia associadas à rotação da baía, cujo eixo se localiza no sector central, com
notável estabilidade ao longo do intervalo de tempo considerado. Nos extremos da baía (sectores oeste e leste)
aqueles autores verificaram variação da largura da praia, com tendência pendular persistente; a um incremento
da largura do sector ocidental corresponde uma redução da largura no sector leste. Os resultados obtidos
mostram que, ao longo do período de análise, o sentido da rotação da baía sofreu alterações. Assim, entre 1965
e 1972 a baía rodou no sentido dextrógiro, com alargamento da praia a leste (Galé) e diminuição a oeste (Vale
Olival); entre 1972 e 1997 verifica-se a rotação sinistrógira persistente, com alargamento em Vale Olival e
redução na Galé (figura 6.40).
Figura 6.40 – Esquema de rotação da baía de Armação de Pêra, identificado entre o início da década de 1970 e o fim da
década de 1990, segundo Pinto e Teixeira (2003).
Na figura 6.41 reproduzem-se pares de fotografias aéreas, obtidas nos anos de 1967 e 1995, que ilustram o
processo de rotação do crescente de praia, com diminuição da largura da praia no extremo nascente da baía
(Galé) e o incremento da extensão do areal no extremo poente (Vale Olival).
Até ao início da década 1990, as praias do extremo leste da baía eram suportadas por edifício dunar com
dimensões consideráveis, elevando-se a mais de 10 m de altura. A rotação da baía de Armação de Pêra, sentida
durante as décadas de 1970 a 1990, implicou a diminuição progressiva da largura da praia no extremo nascente
da enseada, aumentando a vulnerabilidade da estrutura de suporte da mesma à acção directa das ondas. A
diminuição da largura da praia foi acompanhada pelo recuo progressivo da duna, como se pode verificar na
166
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comparação entre dois levantamentos topográficos executados em 1985 e 1992, a partir dos quais se traçou o
perfil transversal reproduzido na figura 6.42.
Figura 6.41 – Variação da largura da praia nos extremos poente (Vale Olival, a, b) e nascente (Galé, c, d) da baía de
Armação de Pêra, entre 1967 e 1995 (Pinto e Teixeira, 2003).
20
15
cotas (m-ZH)
duna
10 praia
5 duna
praia
0
167
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Entre 1985 e 1992 a base da duna recuou cerca de 30m, de que resultou a alteração do seu perfil, com uma
inclinação inicial de 10º, para uma inclinação de 30º, próxima do valor limite do ângulo de atrito interno para
areias lavadas (fig. 6.42). O recuo do litoral foi acompanhado pela migração da praia para terra, e consequente
rebaixamento das cotas do areal na base da duna.
A erosão da estrutura de suporte da praia, e consequente migração da praia para terra, não é um processo
contínuo no tempo, mas intermitente, com picos de mobilidade associados à incidência de ondulação de
tempestade. De uma forma genérica, pode afirmar-se que a migração do litoral é tanto mais importante, quanto
maior for frequência da incidência de ondulação de tempestade e quanto mais concentrada no tempo for essa
acção. Analisando a série anual de registos de tempestades sentidas no litoral meridional do Algarve (fig. 3.5. e
3.6) é possível verificar que o Inverno de 1989/90 foi particularmente tempestivo, de que resultou a necessidade
de execução de uma série de obras de emergência no sentido de minimizar os efeitos da erosão instantânea na
praia de Faro, em Alvor, na praia de Santa Eulália, etc.. A maior parte do recuo do litoral sentido no sector leste
da baía de Armação de Pêra, entre 1985 e 1992, terá ocorrido durante o Inverno de 1989/90.
A vulnerabilidade do litoral em apreço ficou exposta durante a ocorrência das tempestades do Inverno de
1995/96, (com elevada frequência e concentração) quando as ondas produziram recuo generalizado do litoral,
obrigando a intervenção de emergência da Câmara Municipal de Albufeira na arriba do extremo leste da baía, no
sentido de preservar a estrada de acesso à Galé (fig. 6.43). O Inverno de 1995/96 foi, aliás, profícuo na
produção de episódios de erosão instantânea um pouco por todo o Algarve, com intensidade idêntica à
registada, uns anos antes, em 1989/90. O Inverno de 1996/97 foi igualmente severo, com níveis de
concentração de tempestades idênticos aos previstos para o ano anterior.
Figura 6.43 – Colocação de enrocamento de emergência na face da arriba na praia da Galé, em 23 de Janeiro de 1996.
168
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Figura 6.44 – Génese das arribas na zona da Galé, cortadas nos arenitos argilosos vermelhos, subjacentes às dunas
costeiras. 11 de Dezembro de 1996.
Nesta área, o rigor dos Invernos de 1995/96 e 1996/97 traduziu-se na produção de erosão costeira
instantânea de alguma intensidade, com o consequente recuo da estrutura de suporte da praia, pondo a
descoberto o substrato rochoso subjacente às dunas costeiras. Em consequência da erosão sentida no Inverno
de 1995/96, a morfologia do suporte da praia foi alterada; a praia que até então era suportada pela duna em
erosão, passou a encostar directamente a uma arriba, cortada em arenitos argilosos vermelhos (fig. 6.46).
Os elementos atrás expostos permitiram demonstrar que, no período entre 1985 e 2007, o litoral em apreço
sofreu recuo generalizado, com alteração da configuração da estrutura de suporte da praia, circunstância que
determinou a migração do leito e da margem das águas do mar, conforme definida na Lei nº 54/2005. Aplicando
os conceitos de margem definidos na mesma lei e com base na altimetria da linha da máxima preia-mar de
águas vivas equinociais (LMPMAVE), para as condições médias da inclinação desta praia (β=5.8º), construiu-se
a figura 6.47, que pretende reproduzir, num perfil representativo, a margem contemporânea dos três momentos
de que se dispõe de levantamentos topográficos da área em questão.
169
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
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medida que o recuo progredia. A comparação dos três levantamentos evidencia que a crista do alcantil se
manteve imutável desde 1992 até à actualidade, circunstância que permite concluir que, a partir do momento (no
Inverno de 1995/96) em que a arriba foi gerada (e a LMPMAVE passou a incidir sobre a base da costeira) e até
ao presente, a margem se mantém sem alterações significativas. A figura 6.48 mostra a demarcação da margem
das águas do mar actual na praia da Galé.
Figura 6.45 – Morfologia dunar no extremo leste da baía de Armação de Pêra, no Verão de 1991 (data confirmada pela
bandeira azul), com acentuados declives decorrentes do processo erosivo em curso. Note-se que a ocupação dos
veraneantes se estende sobre o próprio talude da duna em erosão. Reprodução de postal, produzido por Foto-Vista, Lda.
Figura 6.46 – Vista da praia da Galé, em 13 de Junho de 2008, já com arribas bem desenvolvidas. Compare-se com a
morfologia dunar patente na figura 6.45.
170
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
20
margem de 1995-2002
15
margem de 1992
cotas (m-ZH)
10
LMPMAVE (5.5m)
5
margem de 1985
Figura 6.47 - Evolução da localização da margem em 1985, 1992 e 2002, baseada nos levantamentos topográficos
disponíveis. Enquanto a praia é suportada pela duna, a margem é marcada directamente para terra da LMPMAVE (1985 e
1992); no caso de 2002, em que a LMPMAVE atinge a base da arriba, a largura da margem é contada a partir da crista do
alcantil.
Figura 6.48 - Demarcação da margem das águas do mar na praia da Galé. Base cartográfica utilizada – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
171
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Figura 6.49 - Demarcação da margem das águas do mar na praia da Deserta (Faro). Base cartográfica utilizada – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
No que respeita à dinâmica do litoral e à gestão dos usos e ocupações, o prazo para definição de uma
tendência de acumulação inequívoca não deverá ser nunca inferior a uma década. Note-se que o período de
construção de uma duna frontal modesta e estabilizada no Algarve é da ordem de 10 anos (v. ponto 5.5.1), a
dinâmica da LMPMAVE associada ao regime de tempestades no mar tem um horizonte temporal de cerca de
uma década e que a realidade mostra que os Planos de Ordenamento são efectivamente revistos em ciclos de
cerca de 12-15 anos. Assim, propõe-se que os limites das zonas dunares em crescimento sejam actualizados
em períodos da ordem da década, idealmente aquando da revisão dos Planos de Ordenamento da Orla
Costeira, com um alcance espacial mais alargado.
172
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
O crescimento espacial das zonas dunares em acumulação configura uma evolução nos termos definidos no
artº 13º (recuo das águas) da Lei nº 54/2005. Assim, as áreas dunares que sucessivamente forem sendo
acumuladas 11 , quando ultrapassarem a largura de 50m (contados da base da duna) vão, sucessivamente
integrando o domínio privado do Estado. A integração de parcelas do domínio público marítimo no domínio
privado do Estado pelo recuo das águas acarreta alteração maior no estatuto jurídico das parcelas envolvidas
pelo que a decisão de integração no domínio privado deverá ser fundamentada em prova cartográfica e
sustentada em estudos que assegurem a tendência inequívoca para a acumulação.
Figura 6.50 - Demarcação da margem das águas do mar na praia de Monte Gordo (Faro). Base cartográfica utilizada –
mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
11 A acumulação de dunas implica a migração da LMPMAVE no sentido do mar, pelo que esta dinâmica eólica configura
claramente a situação de “leitos dominiais abandonados pelas águas”, conforme disposto no artº 13º (recuo das águas) da
Lei nº 54/2005 de 15 de Novembro.
173
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As dunas pisoteadas conferem às parcelas destituídas da sua vegetação natural a morfologia de praia pelo
que, de acordo com o disposto no nº 5 do artº 11º da Lei nº 54/2005, se as áreas destruídas (com natureza de
praia) se localizarem a mais de 50m da LMPMAVE são integradas na margem, sendo o limite da margem
coincidente com o limite da natureza de praia. Um exemplo característico deste tipo de fenómeno é a praia de
Monte Gordo onde, na zona pisoteada, a largura da margem tem mais de 50m (fig. 6.50). Note-se que esta zona
é uma zona em franca acumulação e que, em meados do século XX, a LMPMAVE atingia o limite da zona
actualmente construída.
Figura 6.51 - Demarcação da margem das águas do mar na lagoa costeira do Martinhal. Base cartográfica utilizada – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
174
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Figura 6.52 - Demarcação da margem das águas do mar na península de Cacela da Ria Formosa. Foto aérea oblíqua de
28 Setembro 2008. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
175
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Figura 6.53 - Demarcação da margem das águas do mar no estuário temporário da ribeira da Torre (praia dos Rebolinhos).
Foto aérea oblíqua de 7 de Abril de 2008. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002;
ortofotografia de 2005.
176
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Como ponto prévio, importa recordar que a margem das águas do mar que se pretende definir não pode ser
dissociada da necessidade da estabilidade dos seus limites durante um intervalo temporal da ordem da década,
idealmente a par com o período de eficácia dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira. As alterações
impostas pela intervenção humana devem ser encaradas com a mesma perspectiva temporal. Interessa separar
claramente as intervenções que induzem alterações nos limites espaciais do leito e da margem das águas do
mar por um período curto como, por exemplo, a generalidade das operações de alimentação artificial de praias,
das intervenções mais duradouras, como a construção de uma marina ou de um porto de pesca, cujos efeitos
terão repercussões alargadas no tempo, por várias décadas.
A maior parte das intervenções duradouras, artificialmente impostas, de que resultam alterações dos limites
do leito e das águas do mar, traduzem-se em aterros ou escavações, enquadrados na Lei nº 54/2005,
respectivamente, nas figuras do recuo (artº 13º) e avanço das águas do mar (artº 14º), ou em alterações na
estrutura de suporte das praias.
6.6.1 Escavações
As escavações estão, via de regra, associadas à criação de planos de água para a navegação e implicam a
inundação de parcelas anteriormente excluídas do leito. Exemplo deste tipo de intervenção é a construção do
plano de água das marinas. Nestas situações, da intervenção resulta o avanço do mar (associado à inundação
das parcelas escavadas) com a consequente migração da LMPMAVE e do limite da margem para o interior. A
figura 6.54 ilustra as alterações do traçado da margem das águas do mar associadas à escavação da marina de
Albufeira, onde o plano de água actual assenta sobre parcelas anteriormente fora quer do leito quer da margem
das águas do mar. As alterações da morfologia do litoral associadas à construção desta marina têm longevidade
obviamente superior à década, pelo que deverão ser considerados os limites do domínio hídrico actuais, fixados
na sequência desta intervenção. O mesmo critério deve ser aplicado para a marina de Vilamoura, cuja
demarcação da LMPMAVE está ilustrada na figura 5.58.
177
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Figura 6.54 - A alteração dos limites da margem das águas do mar associadas à construção da marina e do porto de pbrigo
de Albufeira. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
178
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6.6.2 Aterros
Quando depositados no leito, as aterros correspondem à figura dos leitos dominiais conquistados às águas
enunciado no artº 13º da Lei nº 54/2005. Destas obras resulta a migração da LMPMAVE no sentido do mar e o
concomitante avanço da margem no mesmo sentido.
Os aterros depositados no porto de abrigo de Albufeira (fig. 6.54), nos portos de pesca de Sagres (fig. 6.55)
e Quarteira (fig. 5.54), sobre os quais foram construídas as infra-estruturas de apoio à pesca, são exemplos de
intervenções responsáveis pela migração do leito e da margem no sentido do mar. Nos casos dos portos de
Albufeira e Sagres, a implantação dos terraplenos implicou, ainda, a cessação da acção do mar nas arribas, pelo
que os limites da margem, anteriormente contadas a partir da crista da vertente, passaram a ser contados a
partir da LMPMAVE, no limite marinho do aterro. Da conjugação destes dois fenómenos (migração da
LMPMAVE e alteração da estrutura de suporte do litoral) resultou um avanço dos limites da margem de quase
uma centena de metros.
Figura 6.55 - A alteração dos limites da margem das águas do mar associadas à construção do porto de pesca de Sagres.
Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Figura 6.56 - Demarcação da margem na praia de Albufeira. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG
de 2002; ortofotografia de 2005.
Conforme discutido no ponto 5.6.4, também as estruturas de contenção de arribas (panos de betão
projectado, muros de suporte, enrocamentos, etc), não introduzem alterações nos limites da margem, na medida
em que a arriba permanece como elemento morfológico, sendo a sua crista o referencial para demarcação dos
limites da margem. Na figura 6.56 apresenta-se a demarcação da margem na praia de Albufeira, suportada por
arribas, onde foi realizada uma série de obras de defesa das vertentes. Destas obras resultou a migração local e
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
avulsa da LMPMAVE, mas os limites da margem não foram alterados, permanecendo ancorados à crista das
arribas, que não sofreram alterações com aquela série de intervenções.
Um outro tipo de intervenção visando minorar o risco associado à geodinâmica das arribas consiste no
reperfilamento da vertente, alterando o seu pendor, de modo a reduzir a instabilidade. Na praia de Vale de
Centeanes (Lagoa), onde a LMPMAVE incide sob a base da arriba (v. fig. 5.4) foi executada uma intervenção
deste tipo na Primavera de 2003. A conjugação das diferentes condicionantes da praia, nomeadamente, a
sensibilidade cénica do local, a inexistência de acesso à praia por terra e a impossibilidade de execução de
qualquer intervenção pesada que inclua a construção de estruturas de contenção ou de suporte da arriba,
implicou a redução drástica do leque de opções de intervenção na arriba. De facto, face à impossibilidade de
contrariar a instabilidade da arriba mantendo a sua morfologia actual, o único tipo de intervenção possível foi
aquele que incidiu sobre a própria arriba, promovendo o seu desmonte no sentido de alterar a sua inclinação e,
consequentemente, a sua instabilidade.
A arriba subvertical da praia de Vale Centeanes foi cortada, reduzindo-se o seu pendor para 65º, de que
resultou o recuo da crista da vertente em cerca de 15m (fig. 6.57). Esta intervenção não alterou o elemento
morfológico de suporte da praia (que permanece uma arriba alcantilada), apenas modificou a sua configuração,
pelo que os limites da margem continuam a marcados a partir da crista da vertente (fig. 6.58).
Figura 6.57 - Saneamento da arriba na praia de Vale de Centeanes (Lagoa). 24 Abril 2003.
181
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
2002
2005
Figura 6.58 - Alteração dos limites da margem das águas do mar na praia de Vale de Centeanes associados ao
reperfilamento da arriba. Base cartográfica utilizada – mapa aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2002 e
2005.
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As obras de protecção costeira que mais dúvidas levantam na alteração do traçado da margem são as
intervenções que contêm muros de suporte conjugados com a construção de aterros mais ou menos extensos
na base das arribas. Nestas situações, o fulcro do problema reside na avaliação se esse muro de suporte é
suficiente para impedir o ataque directo da agitação marítima nas arribas ou se, contrariamente, em condições
de tempestade, as ondas galgam a estrutura de suporte e continuam a incidir nas arribas, condicionando a sua
geodinâmica. Desta avaliação depende a decisão se as arribas permanecem activas, ou se, pelo contrário,
ficaram definitivamente fora da influência marinha passando, então, a comportar-se como vertentes continentais.
A análise destes situações deve ser feita caso a caso mas sempre tendo em consideração o horizonte
temporal de, pelo menos, uma década. No caso de permanecer a influência marinha, a margem deverá marcar-
se a partir da crista da arriba; no caso das arribas deixarem de evoluir sob acção da agitação marítima a margem
deverá ser contada a partir da LMPMAVE, na base do muro de suporte. No Algarve não existem situações deste
tipo mas são relativamente comuns no litoral Ocidental. Nas figuras 6.59 e 6.60 ilustram-se dois exemplos deste
género de intervenções, executados na praia do Norte da Ericeira (Mafra) e na praia da Figueirinha (Setúbal).
Figura 6.59 - Praia do Norte da Ericeira, em Julho 2007 (foto Mota Lopes).
Na praia do Norte da Ericeira, as estruturas de defesa da arriba foram construídas na face da escarpa e são
galgadas em condições de tempestade. Na zona central da fotografia (fig. 6.59) é possível identificar a mancha
escura da colonização dos líquenes que recobre parte do muro de suporte, comprovando o galgamento
183
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
frequente desta estrutura e, consequentemente, a incidência periódica do espraio das ondas na base da arriba.
Neste caso, a arriba permanece como elemento morfológico activo pelo que a margem deve ser marcada a partir
da crista da arriba.
Figura 6.60 - Praia da Figueirinha (Setúbal), em Julho 2007 (Foto Mota Lopes).
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Tomando o exemplo do praia de Vale de Lobo (v. ponto 5.6.2-A), suportada por arribas alcantiladas,
submetida a alimentação artificial com longevidade de cerca de 5-7 anos, o traçado da margem ilustrado na
figura 6.61 considera a LMPMAVE coincidente com a base da arriba, pelo que a margem é demarcada segundo
uma linha que dista 50m da crista da arriba.
Figura 6.61 - Demarcação da margem das águas do mar em Vale do Lobo. Base cartográfica utilizada – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
A praia da Rocha configura claramente uma excepção a este padrão de alimentação artificial, já que o
enchimento da praia evidencia uma estabilidade notável, em consequência quer da construção dos molhes de
acesso ao porto de Portimão, quer do reforço sucessivo que esta praia tem vindo a acusar em consequência da
captura dos sedimentos depositados nas praias a barlamar (v. ponto 5.6.2-B). Face à tendência persistente de
acumulação instalada, a margem deve ser demarcada tendo em consideração a LMPMAVE definida no ponto
5.6.2-B. Dado que o areal da praia a norte da LMPMAVE tem largura superior a 50m, os limites da margem
estendem-se até ao limite da praia, na base das arribas, de acordo com o disposto no nº 5 do artº 11º da Lei nº
54/2005 (fig. 6.62).
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Figura 6.62 - Demarcação da margem das águas do mar na praia da Rocha. Base cartográfica utilizada – mapa
aerofotogramétrico do INAG de 2002; ortofotografia de 2005.
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7. CONCLUSÕES
Com o presente estudo pretende-se contribuir para a definição da LMPMAVE no litoral meridional do
Algarve, de modo a fornecer os elementos necessários para a delimitação física do leito e da margem das águas
do mar enunciados na Lei nº 54/2005, de 15 de Novembro, que adoptou as mesmas definições anteriormente
consagradas no Decreto-Lei nº 468/71, de 5 de Novembro. Os resultados apresentados assentam em
informação cartográfica à escala 1/2000 ou superior e em catorze anos de observação e medições
experimentais sistemáticas no litoral do Algarve, que traduzem as condições morfológicas actuais.
Como ponto de partida, foram desenvolvidas equações empíricas, baseadas em dados experimentais
recolhidos no terreno do litoral sul do Algarve, para o cálculo da altura do espraiamento das vagas em condições
de agitação média do mar. A solução empírica obtida para as arribas não alcantiladas tem a fórmula geral: cota
LMPMAVE = 4m + 6.90 tan β. Da aplicação desta equação resultam cotas da LMPMAVE que oscilam entre os
5.2m e os 7.5m (ZH), para a gama de declives medida no terreno. No caso das arribas, onde não existe variação
da morfologia, a aplicação das soluções no terreno é imediata bastando, para tanto, associar a LMPMAVE à
curva de nível correspondente à cota de espraio obtida na equação para o declive da arriba em causa.
A equação sintética, que permite calcular a cota da LMPMAVE (m-ZH) em função do declive médio (β) das
praias, tem a forma: cota LMPMAVE = 4m + 15.0 tan β. As cotas da LMPMAVE, calculadas a partir da equação
e do declive médio das praias, atingem valores máximos de 6.5m (ZH) nas praias mais expostas à acção da
agitação marítima, onde a granulometria é mais grosseira, concentrando-se na vizinhança do cabo de Alfanzina
(praia do Carvalho) e da ponta do Castelo (praia do Evaristo). Nas praias mais abrigadas da agitação marítima
dominante e onde a granulometria é mais fina, a cota da LMPMAVE é apenas 5.0m (ZH). Tal sucede na praia da
Rocha, em parcelas da Meia Praia, da praia de Alvor e no sector a leste de Monte Gordo. Nas restantes praias,
as cotas da LMPMAVE, calculadas a partir dos seus declives médios, atingem valores entre 5.5m e 6.0m (ZH).
Os resultados da cota da LMPMAVE, calculada através da solução obtida no presente estudo, aplicada aos
três sectores do litoral sul do Algarve de acordo com os limites geográficos dos Planos de Ordenamento da Orla
Costeira, mostram que a cota média da LMPMAVE no Barlavento (5.67m-ZH) é superior à cota dos restantes
troços e muito próxima da cota prevista no Regulamento do POOC Burgau-Vilamoura, de 5.5m (ZH) e à cota
187
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
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estimada em 1998 (5.42m-ZH), baseada na série experimental então obtida. Para as praias da Costa Vicentina e
do Sotavento, a cota média da LMPMAVE calculada a partir da mesma equação é, respectivamente, de 5.51m
(ZH) e de 5.55m (ZH), idênticas à cota prevista nos regulamentos dos respectivos POOC (Sines-Burgau e
Vilamoura-Vila Real de Santo António), que é de 5.5m (ZH). Estes resultados atestam a precisão das cotas de
referência que constam dos Regulamentos dos POOC do litoral sul do Algarve, originalmente definidas com
base numa série experimental obtida de forma mais expedita e com um número muito inferior de dados. A
coincidência de valores evidencia, ainda, a robustez do estimador média, que não sofreu alterações significativas
apesar do incremento muito significativo do volume de dados e do rigor da série experimental que serve de base
para a solução proposta.
Dos resultados apresentados decorre que o valor de referência da cota da LMPMAVE utilizado pela
Comissão do Domínio Público Marítimo para a costa sul do Algarve (5.0m-ZH), recentemente incluído no
Despacho Normativo nº 32/2008, de 20 de Junho, do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do
Desenvolvimento Regional, está subestimado, necessitando de rectificação, devendo ser doravante adoptado o
valor de referência de 5.6m (ZH) ou 3.6m (NMM).
Desta limitação resultou a necessidade de olhar para o problema de forma diversa, mais abrangente, tendo
em mente o espírito da Lei e a necessidade da sua concretização no terreno. A alteração essencial reside na
abordagem do domínio público marítimo numa perspectiva assente no ordenamento e na gestão do território,
necessariamente condicionada pela dinâmica costeira associada aos fenómenos naturais, vista num intervalo
temporal alargado a ordem de, pelo menos, uma década, compatível quer com o período de eficácia dos
instrumentos de gestão territorial, quer com os ciclos de oscilação natural dos agentes mesológicos que
condicionam a evolução das praias (marés, agitação marítima, precipitação).
188
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Assente no pressuposto temporal da ordem da década, os resultados recolhidos no terreno num período
experimental de 14 anos permitem demonstrar que em praias naturais a LMPMAVE coincide com a base da
arriba (em praias suportadas por arribas), ou com a base da duna (em praias suportadas por dunas). Nas
barreiras arenosas acumuladas nas fozes de estuários temporários ou lagoas costeiras, onde existem cordões
dunares, a LMPMAVE também coincide com os limites das dunas (quadro 7.I). Nos troços em que os edifícios
dunares foram total ou parcialmente destruídos, a reconstituição da LMPMAVE deve orientar-se pelo
alinhamento dos cordões dunares contíguos. Estas conclusões permitem a demarcação imediata da LMPMAVE,
com base nos elementos físicos estáveis no espaço e no tempo e facilmente reconhecíveis no terreno ou em
fotografia aérea. Estes critérios de demarcação da LMPMAVE são válidos nas praias e barreiras que mantêm a
sua morfodinâmica natural, sem interferência humana, e pode ser estendido a todo o território nacional,
independentemente do regime de agitação média.
Nos ambientes confinados, sem a influência directa da agitação marítima, nas lagunas e estuários
permanentes, a LMPMAVE deve ser marcada caso a caso, em função das condições de admissão e propagação
da maré. Nas imediações das barras e embocaduras deve ser considerada a cota 4.0m (ZH). No caso dos
estuários temporários e lagoas costeiras, a LMPMAVE corresponde com a linha impressa pelas águas do mar
em situação de barra aberta e franca comunicação com o mar, coincidindo com a cota 4.0m (ZH).
À excepção dos locais onde a LMPMAVE incide sobre arribas alcantiladas, os limites da margem devem ser
marcados distando 50m daquela linha ou, nos casos em que a natureza de praia tem extensão superior, até
onde se verificar essa morfologia. No litoral sul do Algarve a última situação só ocorre em consequência da
intervenção humana, nas praias em que a vegetação dunar foi completamente arrasada (Armação de Pêra e
Monte Gordo) ou em praias submetidas a alimentação artificial de grande longevidade (praia da Rocha).
A análise da distribuição conjunta dos caminhos de pé-posto e da inclinação da face das arribas permitiu
verificar que o limite da utilização das vertentes coincide com o pendor de 50% (1:2), que constitui a barreira
física prática e real entre arribas alcantiladas e não alcantiladas.
Quando a LMPMAVE atinge a base de arribas alcantiladas, os limites da margem são contados a partir da
crista do alcantil, que equivale na terminologia geomorfológica à crista da arriba. Os critérios enunciados e
aplicados para definição da crista da arriba, em contextos litológicos muito diversos, são equivalentes aos
critérios utilizados na aplicação das faixas de risco destas vertentes e pressupõem a acção directa da agitação
marinha nas arribas.
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A disposição legal que determina a demarcação da margem a partir da crista das arribas alcantiladas é
extensível, por analogia morfológica, aos algares, onde as águas do mar inundam a base destas estruturas
cilíndricas e verticais, com crista bem definida. Quando os algares têm expressão à superfície, com alcantil bem
definido e a LMPMAVE incide sobre a sua base, a margem, com largura de 50m, é contada a partir da crista dos
algares.
Quadro 7.I Síntese dos critérios para demarcação da LMPMAVE e da margem no litoral sul do Algarve
Limite da Cota da Agitação Influência
Morfologia LMPMAVE margem LMPMAVE marítima da maré
arriba alcantilada (β≥ 50%) face da arriba 50m da crista da variável SIM SIM
arriba (>6.0mZH)
arriba não alcantilada (β< 50%) face da arriba 50m da variável SIM SIM
LMPMAVE (6.0-7.0mZH)
algar com expressão à superfície base do algar 50m da crista do variável SIM SIM
algar (>6.0mZH)
praia suportada por arriba base da arriba 50m da crista da variável SIM SIM
alcantilada arriba (5.0-6.5mZH)
praia suportada por duna base da duna 50m da base da variável SIM SIM
duna (5.0-6.0mZH)
barreira arenosa na foz de limite interior da 50m do limite da variável SIM SIM
estuário temporário ou lagoa barreira/base da barreira/base da (5.0-6.5mZH)
costeira duna duna
laguna linha da máxima 50m da 4.0m (ZH) NÃO SIM
maré LMPMAVE
estuário permanente linha da máxima 50m da variável NÃO SIM
maré LMPMAVE (4.0-4.5mZH)
estuário temporário linha da máxima 50m da 4.0m (ZH) NÃO SIM
maré LMPMAVE
lagoa costeira linha da máxima 50m da 4.0m (ZH) NÃO SIM
maré LMPMAVE
A análise das alterações nos limites da LMPMAVE e da margem das águas do mar impostas pela
intervenção humana deve ser feita caso a caso, tendo sempre em consideração o seu enquadramento no tempo
e no espaço. A longevidade dos efeitos dessa intervenção deve ser ponderada na perspectiva temporal da
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
ordem da década, idealmente a par com o período de eficácia dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira. As
alterações decorrentes da intervenção devem ser analisadas não só do ponto de vista da modificação do espaço
inundado pelas águas do mar mas devem, igualmente, atender às eventuais alterações da morfologia desse
espaço.
As intervenções que induzem alterações nos limites espaciais do leito e da margem das águas do mar com
um período curto (5-10 anos), como, por exemplo, a generalidade das operações de alimentação artificial de
praias, não devem ser consideradas na demarcação da margem, tomando como referência a morfologia anterior
à recarga da praia.
Nas intervenções mais duradouras, como a construção de uma marina ou de um porto de pesca, cujos
efeitos terão repercussões alargadas no tempo por várias décadas, deverão ser considerados os limites do
domínio hídrico actuais, fixados na sequência dessas intervenções.
As estruturas de contenção de arribas (panos de betão projectado, muros de suporte, enrocamentos, etc.),
não introduzem alterações nos limites da margem, na medida em que a arriba permanece como elemento
morfológico, mantendo-se a crista da arriba como referencial para demarcação dos limites da margem.
As obras de reperfilamento que visam minorar o risco associado à geodinâmica das arribas, alterando o seu
pendor, de modo a reduzir a instabilidade, não alteram o elemento morfológico, pelo que o limite da margem é
sempre marcado a partir da crista do novo alcantil.
Nas intervenções de protecção costeira que contêm muros de suporte conjugados com a construção de
aterros mais ou menos extensos na base das arribas, deve ser avaliado se esse muro de suporte é suficiente
para impedir o ataque directo da agitação marítima nas arribas ou se, contrariamente, em condições de
tempestade, as ondas galgam a estrutura de suporte e continuam a incidir nas arribas, condicionando a sua
geodinâmica. Desta avaliação depende a decisão se as arribas permanecem activas, e então a margem
permanece inalterada ou se, pelo contrário, ficaram definitivamente fora da influência marinha, passando então a
comportar-se como vertentes continentais e a margem é contada a partir da nova LMPMAVE, na base do muro
de suporte.
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AGRADECIMENTOS
O presente estudo resulta de treze anos de observação, experimentação e discussão e não poderia ser
concluído sem a contribuição de diversas pessoas e instituições que se prestaram a colaborar no decurso do
trabalho que se apresenta. O autor agradece reconhecidamente a toda a equipa dedicada e interessada da ex-
Direcção de Serviços do Litoral da CCDR Algarve, que transitou para o Departamento de Recursos Hídricos do
Litoral da ARH do Algarve, em particular, a Luís Santos, Ricardo Almeida, Luís Paulino, Fernando Engrácia e
Élia Cabrita, no levantamento periódico de perfis de praia e na medição de inclinação na face da praia, a João
Moura, a discussão dos aspectos jurídicos dos diplomas legais dos recursos hídricos, a Marcos Rosa, o
tratamento cartográfico da informação em SIG.. O autor agradece a disponibilidade dos especialistas na
discussão em torno da física da agitação marítima, César Andrade e Rui Taborda (Faculdade de Ciências de
Lisboa), Fernando Carvalho (Instituto de Meteorologia) e a Mariana Costa (Instituto Hidrográfico), pela pronta
colaboração na cedência de informação relativa aos registos da bóia ondógrafo de Faro. Uma nota de particular
apreço e agradecimento é devida ao círculo de qualidade, espontaneamente gerado para discussão das
questões da definição da LMPMAVE, da margem e da morfologia das arribas, incluindo as contribuições
entusiastas de António Mota Lopes (EPRL), Celso Pinto (ARH do Tejo), Francisco Reis (ARH do Tejo), Isabel
Pires (ARH do Algarve), Fernanda Ambrósio (INAG) e João Herdeiro (EPRL).
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FOTOGRAFIA AÉREA
Voo USAF, 1958, na escala 1/30.000, Instituto Geográfico do Exército
Voo, 1967, na escala 1/10.000, Instituto Geográfico de Portugal
Voo DGSFA, 1972, na escala 1/15.000, Artop
Voo FAP- Algarve, 1983 (cores), na escala 1/30.000, Instituto Geográfico do Exército
Voo IPPC, 1991, na escala 1/30.000, Instituto Português de Cartografia e Cadastro
Voo, 1995, na escala 1/15.000, Instituto Geográfico de Portugal
ORTOFOTOGRAFIA AÉREA
1991 - Instituto Português de Cartografia e Cadastro (escala 1/10.000)
1997 - IGEOE (escala 1/35.000)
2002 - INAG (escala 1/2.000)
2005 - IGEOE (escala 1/2.000)
2007 – CCDR Algarve (escala 1/2.000)
200
MINISTÉRIO DO AMBIENTE,
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A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º
Âmbito
1 - Os recursos hídricos a que se aplica esta lei compreendem as águas, abrangendo ainda os respectivos leitos e margens,
zonas adjacentes, zonas de infiltração máxima e zonas protegidas.
2 - Em função da titularidade, os recursos hídricos compreendem os recursos dominiais, ou pertencentes ao domínio
público, e os recursos patrimoniais, pertencentes a entidades públicas ou particulares.
Artigo 2.º
Domínio público hídrico
1 - O domínio público hídrico compreende o domínio público marítimo, o domínio público lacustre e fluvial e o domínio
público das restantes águas.
2 - O domínio público hídrico pode pertencer ao Estado, às Regiões Autónomas e aos municípios e freguesias.
Artigo 3.º
Domínio público marítimo
O domínio público marítimo compreende:
a) As águas costeiras e territoriais;
b) As águas interiores sujeitas à influência das marés, nos rios, lagos e lagoas;
c) O leito das águas costeiras e territoriais e das águas interiores sujeitas à influência das marés;
d) Os fundos marinhos contíguos da plataforma continental, abrangendo toda a zona económica exclusiva;
e) As margens das águas costeiras e das águas interiores sujeitas à influência das marés.
Artigo 4.º
Titularidade do domínio público marítimo
O domínio público marítimo pertence ao Estado.
Artigo 5.º
Domínio público lacustre e fluvial
O domínio público lacustre e fluvial compreende:
a) Cursos de água navegáveis ou flutuáveis, com os respectivos leitos, e ainda as margens pertencentes a entes
públicos;
b) Lagos e lagoas navegáveis ou flutuáveis, com os respectivos leitos, e ainda as margens pertencentes a entes
públicos;
c) Cursos de água não navegáveis nem flutuáveis, com os respectivos leitos e margens, desde que localizados em
terrenos públicos, ou os que por lei sejam reconhecidos como aproveitáveis para fins de utilidade pública, como a
produção de energia eléctrica, irrigação, ou canalização de água para consumo público;
d) Canais e valas navegáveis ou flutuáveis, ou abertos por entes públicos, e as respectivas águas;
e) Albufeiras criadas para fins de utilidade pública, nomeadamente produção de energia eléctrica ou irrigação, com os
respectivos leitos;
201
MINISTÉRIO DO AMBIENTE,
DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
f) Lagos e lagoas não navegáveis ou flutuáveis, com os respectivos leitos e margens, formados pela natureza em
terrenos públicos;
g) Lagos e lagoas circundados por diferentes prédios particulares ou existentes dentro de um prédio particular, quando
tais lagos e lagoas sejam alimentados por corrente pública;
h) Cursos de água não navegáveis nem flutuáveis nascidos em prédios privados, logo que transponham abandonados
os limites dos terrenos ou prédios onde nasceram ou para onde foram conduzidos pelo seu dono, se no final forem
lançar-se no mar ou em outras águas públicas.
Artigo 6.º
Titularidade do domínio público lacustre e fluvial
1 - O domínio público lacustre e fluvial pertence ao Estado ou, nas Regiões Autónomas, à respectiva Região, salvo nos
casos previstos nos números seguintes.
2 - Pertencem ao domínio público hídrico do município os lagos e lagoas situados integralmente em terrenos municipais ou
em terrenos baldios e de logradouro comum municipal.
3 - Pertencem ao domínio público hídrico das freguesias os lagos e lagoas situados integralmente em terrenos das
freguesias ou em terrenos baldios e de logradouro comum paroquiais.
4 - O disposto nos números anteriores deve entender-se sem prejuízo dos direitos reconhecidos nas alíneas d), e) e f) do n.º
1 do artigo 1386.º e no artigo 1387.º do CódigoCivil.
Artigo 7.º
Domínio público hídrico das restantes águas
O domínio público hídrico das restantes águas compreende:
a) Águas nascidas e águas subterrâneas existentes em terrenos ou prédios públicos;
b) Águas nascidas em prédios privados, logo que transponham abandonadas os limites dos terrenos ou prédios onde
nasceram ou para onde foram conduzidas pelo seu dono, se no final forem lançar-se no mar ou em outras águas
públicas; c) Águas pluviais que caiam em terrenos públicos ou que, abandonadas, neles corram;
d) Águas pluviais que caiam em algum terreno particular, quando transpuserem abandonadas os limites do mesmo
prédio, se no final forem lançar-se no mar ou em outras águas públicas;
e) Águas das fontes públicas e dos poços e reservatórios públicos, incluindo todos os que vêm sendo continuamente
usados pelo público ou administrados por entidades públicas.
Artigo 8.º
Titularidade do domínio público hídrico das restantes águas
1 - O domínio público hídrico das restantes águas pertence ao Estado ou, nas Regiões Autónomas, à Região, no caso de os
terrenos públicos mencionados nas alíneas a) e c) do artigo anterior pertencerem ao Estado ou à Região, ou no caso de ter
cabido ao Estado ou à Região a construção das fontes públicas.
2 - O domínio público hídrico das restantes águas pertence ao município e à freguesia conforme os terrenos públicos
mencionados nas citadas alíneas pertençam ao concelho e à freguesia ou sejam baldios municipais ou paroquiais ou
consoante tenha cabido ao município ou à freguesia o custeio e administração das fontes, poços ou reservatórios públicos.
3 - O disposto nos números anteriores deve entender-se sem prejuízo dos direitos reconhecidos nas alíneas d), e) e f) do n.º
1 e no n.º 2 do artigo 1386.º, bem como no artigo 1397.º, ambos do Código Civil.
Artigo 9.º
Administração do domínio público hídrico
1 - O domínio público hídrico pode ser afecto por lei à administração de entidades de direito público encarregadas da
prossecução de atribuições de interesse público a que ficam afectos, sem prejuízo da jurisdição da autoridade nacional da
água.
2 - A gestão de bens do domínio público hídrico por entidades de direito privado só pode ser desenvolvida ao abrigo de um
título de utilização, emitido pela autoridade pública competente para o respectivo licenciamento.
Artigo 10.º
Noção de leito; seus limites
1 - Entende-se por leito o terreno coberto pelas águas quando não influenciadas por cheias extraordinárias, inundações ou
tempestades. No leito compreendem-se os mouchões, lodeiros e areais nele formados por deposição aluvial.
2 - O leito das águas do mar, bem como das demais águas sujeitas à influência das marés, é limitado pela linha da máxima
preia-mar de águas vivas equinociais. Essa linha é definida, para cada local, em função do espraiamento das vagas em
condições médias de agitação do mar, no primeiro caso, e em condições de cheias médias, no segundo.
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
3 - O leito das restantes águas é limitado pela linha que corresponder à estrema dos terrenos que as águas cobrem em
condições de cheias médias, sem transbordar para o solo natural, habitualmente enxuto. Essa linha é definida, conforme os
casos, pela aresta ou crista superior do talude marginal ou pelo alinhamento da aresta ou crista do talude molhado das
motas, cômoros, valados, tapadas ou muros marginais.
Artigo 11.º
Noção de margem; sua largura
1 - Entende-se por margem uma faixa de terreno contígua ou sobranceira à linha que limita o leito das águas.
2 - A margem das águas do mar, bem como a das águas navegáveis ou flutuáveis que se encontram à data da entrada em
vigor desta lei sujeitas à jurisdição das autoridades marítimas e portuárias, tem a largura de 50 m.
3 - A margem das restantes águas navegáveis ou flutuáveis tem a largura de 30 m.
4 - A margem das águas não navegáveis nem flutuáveis, nomeadamente torrentes, barrancos e córregos de caudal
descontínuo, tem a largura de 10 m.
5 - Quando tiver natureza de praia em extensão superior à estabelecida nos números anteriores, a margem estende-se até
onde o terreno apresentar tal natureza.
6 - A largura da margem conta-se a partir da linha limite do leito. Se, porém, esta linha atingir arribas alcantiladas, a largura
da margem é contada a partir da crista do alcantil.
7 - Nas Regiões Autónomas, se a margem atingir uma estrada regional ou municipal existente, a sua largura só se estende
até essa via.
Artigo 12.º
Leitos e margens privados de águas públicas
1 - São particulares, sujeitos a servidões administrativas, os leitos e margens de águas do mar e de águas navegáveis e
flutuáveis que forem objecto de desafectação e ulterior alienação, ou que tenham sido, ou venham a ser, reconhecidos
como privados por força de direitos adquiridos anteriormente, ao abrigo de disposições expressas desta lei, presumindo-se
públicos em todos os demais casos.
2 - No caso de águas públicas não navegáveis e não flutuáveis localizadas em prédios particulares, o respectivo leito e
margem são particulares, nos termos do artigo 1387.º do Código Civil, sujeitos a servidões administrativas.
3 - Nas Regiões Autónomas, os terrenos tradicionalmente ocupados junto à crista das arribas alcantiladas das respectivas
ilhas constituem propriedade privada.
Artigo 13.º
Recuo das águas
Os leitos dominiais que forem abandonados pelas águas, ou lhes forem conquistados, não acrescem às parcelas privadas
da margem que porventura lhes sejam contíguas, continuando integrados no domínio público se não excederem as larguras
fixadas no artigo 10.º e entrando automaticamente no domínio privado do Estado no caso contrário.
Artigo 14.º
Avanço das águas
1 - Quando haja parcelas privadas contíguas a leitos dominiais, as porções de terreno corroídas lenta e sucessivamente
pelas águas consideram-se automaticamente integradas no domínio público, sem que por isso haja lugar a qualquer
indemnização.
2 - Se as parcelas privadas contíguas a leitos dominiais forem invadidas pelas águas que nelas permaneçam sem que haja
corrosão dos terrenos, os respectivos proprietários conservam o seu direito de propriedade, mas o Estado pode expropriar
essas parcelas.
Artigo 15.º
Reconhecimento de propriedade privada sobre parcelas de leitos e margens públicos
1 - Quem pretenda obter o reconhecimento da sua propriedade sobre parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou
de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis pode obter esse reconhecimento desde que intente a correspondente acção
judicial até 1 de Janeiro de 2014, devendo provar documentalmente que tais terrenos eram, por título legítimo, objecto de
propriedade particular ou comum antes de 31 de Dezembro de 1864 ou, se se tratar de arribas alcantiladas, antes de 22 de
Março de 1868.
2 - Sem prejuízo do prazo fixado no número anterior, observar-se-ão as seguintes regras nas acções a instaurar nos termos
desse número:
a) Presumem-se particulares, sem prejuízo dos direitos de terceiros, os terrenos em relação aos quais, na falta de
documentos susceptíveis de comprovar a propriedade dos mesmos nos termos do n.º 1, se prove que, antes daquelas
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
datas, estavam na posse em nome próprio de particulares ou na fruição conjunta de indivíduos compreendidos em
certa circunscrição administrativa;
b) Quando se mostre que os documentos anteriores a 1864 ou a 1868, conforme os casos, se tornaram ilegíveis ou
foram destruídos por incêndio ou facto semelhante ocorrido na conservatória ou registo competente, presumir-se-ão
particulares, sem prejuízo dos direitos de terceiros, os terrenos em relação aos quais se prove que, antes de 1 de
Dezembro de 1892, eram objecto de propriedade ou posse privadas.
3 - Não ficam sujeitos ao regime de prova estabelecido nos números anteriores os terrenos que, nos termos da lei, hajam
sido objecto de um acto de desafectação nem aqueles que hajam sido mantidos na posse pública pelo período necessário à
formação de usucapião.
Artigo 16.º
Constituição de propriedade pública sobre parcelas privadas de leitos e margens de águas públicas
1 - Em caso de alienação, voluntária ou forçada, por acto entre vivos, de quaisquer parcelas privadas de leitos ou margens
públicos, o Estado goza do direito de preferência, nos termos dos artigos 416.º a 418.º e 1410.º do Código Civil, podendo a
preferência exercer-se, sendo caso disso, apenas sobre a fracção do prédio que se integre no leito ou na margem.
2 - O Estado pode proceder à expropriação por utilidade pública de quaisquer parcelas privadas de leitos ou margens
públicos sempre que isso se mostre necessário para submeter ao regime da dominialidade pública todas as parcelas
privadas existentes em certa zona.
3 - Os terrenos adquiridos pelo Estado de harmonia com o disposto neste artigo ficam automaticamente integrados no seu
domínio público.
Artigo 17.º
Delimitação
1 - A delimitação dos leitos e margens dominiais confinantes com terrenos de outra natureza compete ao Estado, que a ela
procede oficiosamente, quando necessário, ou a requerimento dos interessados.
2 - Das comissões de delimitação, que podem ser constituídas por iniciativa do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do
Território e do Desenvolvimento Regional, fazem sempre parte representantes do Ministério da Defesa Nacional e das
administrações portuárias afectadas no caso do domínio público marítimo, representantes dos municípios afectados e
também representantes dos proprietários dos terrenos confinantes com os leitos ou margens dominiais a delimitar.
3 - Sempre que às comissões de delimitação se depararem questões de índole jurídica que não estejam em condições de
decidir por si, podem os respectivos presidentes requerer a colaboração ou solicitar o parecer do delegado do procurador da
República da comarca onde se situem os terrenos a delimitar.
4 - A delimitação, uma vez homologada por resolução do Conselho de Ministros, é publicada no Diário da República.
5 - A delimitação a que se proceder por via administrativa não preclude a competência dos tribunais comuns para decidir da
propriedade ou posse dos leitos e margens ou suas parcelas.
6 - Se, porém, o interessado pretender arguir o acto de delimitação de quaisquer vícios próprios deste que se não traduzam
numa questão de propriedade ou posse, deve instaurar a respectiva acção especial de anulação.
Artigo 18.º
Águas patrimoniais e águas particulares
1 - Todos os recursos hídricos que não pertencerem ao domínio público podem ser objecto do comércio jurídico privado e
são regulados pela lei civil, designando-se como águas ou recursos hídricos patrimoniais.
2 - Os recursos hídricos patrimoniais podem pertencer, de acordo com a lei civil, a entes públicos ou privados, designando-
se neste último caso como águas ou recursos hídricos particulares.
3 - Constituem designadamente recursos hídricos particulares aqueles que, nos termos da lei civil, assim sejam
caracterizados, salvo se, por força dos preceitos anteriores, deverem considerar-se integrados no domínio público.
Artigo 19.º
Desafectação
Pode, mediante diploma legal, ser desafectada do domínio público qualquer parcela do leito ou da margem que deva deixar
de ser afecto exclusivamente ao interesse público do uso das águas que serve, passando a mesma, por esse facto, a
integrar o património do ente público aque estava afecto.
Artigo 20.º
Classificação e registo
1 - Compete ao Estado, através do Instituto da Água, como autoridade nacional da água, organizar e manter actualizado o
registo das águas do domínio público, procedendo às classificações necessárias para o efeito, nomeadamente da
navegabilidade e flutuabilidade dos cursos de água, lagos e lagoas, as quais devem ser publicadas no Diário da República.
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
2 - Em complemento do registo referido no número anterior deve a autoridade nacional da água organizar e manter
actualizado o registo das margens dominiais e das zonas adjacentes.
3 - Os organismos que dispuserem de documentos ou dados relevantes para o registo referido no n.º 1 devem informar de
imediato desse facto o Instituto da Água, coadjuvando-se na realização ou correcção do registo.
Artigo 21.º
Servidões administrativas sobre parcelas privadas de leitos e margens de águas públicas
1 - Todas as parcelas privadas de leitos ou margens de águas públicas estão sujeitas às servidões estabelecidas por lei e
nomeadamente a uma servidão de uso público, no interesse geral de acesso às águas e de passagem ao longo das águas
da pesca, da navegação e da flutuação, quando se trate de águas navegáveis ou flutuáveis, e ainda da fiscalização e
policiamento das águas pelas entidades competentes.
2 - Nas parcelas privadas de leitos ou margens de águas públicas, bem como no respectivo subsolo ou no espaço aéreo
correspondente, não é permitida a execução de quaisquer obras permanentes ou temporárias sem autorização da entidade
a quem couber a jurisdição sobre a utilização das águas públicas correspondentes.
3 - Os proprietários de parcelas privadas de leitos e margens de águas públicas devem mantê-las em bom estado de
conservação e estão sujeitos a todas as obrigações que a lei estabelecer no que respeita à execução de obras hidráulicas
necessárias à gestão adequada das águas públicas em causa, nomeadamente de correcção, regularização, conservação,
desobstrução e limpeza.
4 - O Estado, através das administrações das regiões hidrográficas, ou dos organismos a quem estas houverem delegado
competências, e o município, no caso de linhas de água em aglomerado urbano, podem substituir-se aos proprietários,
realizando as obras necessárias à limpeza e desobstrução das águas públicas por conta deles.
5 - Se da execução das obras referidas no n.º 4 resultarem prejuízos que excedam os encargos resultantes das obrigações
legais dos proprietários, o organismo público responsável pelos mesmos indemnizá-los-á.
6 - Se se tornar necessário para a execução de quaisquer das obras referidas no n.º 4 qualquer porção de terreno particular
ainda que situado para além das margens, o Estado pode expropriá-la.
Artigo 22.º
Zonas ameaçadas pelo mar
1 - Sempre que se preveja tecnicamente o avanço das águas do mar sobre terrenos particulares situados além da margem,
pode o Governo, por iniciativa do Instituto da Água, como autoridade nacional da água, ou do Instituto da Conservação da
Natureza, no caso de áreas classificadas, classificar a área em causa como zona adjacente.
2 - A classificação de uma área ameaçada pelo mar como zona adjacente é feita por portaria do Ministro do Ambiente, do
Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, ouvidas as autoridades marítimas em relação aos trechos
sujeitos à sua jurisdição, devendo o referido diploma conter a planta com a delimitação da área classificada e definindo
dentro desta as áreas de ocupação edificada proibida e ou as áreas de ocupação edificada condicionada.
3 - Nas Regiões Autónomas podem ser classificadas como zonas adjacentes as áreas contíguas ao leito do mar, nos
termos do n.º 5 do artigo 24.º
Artigo 23.º
Zonas ameaçadas pelas cheias
1 - O Governo pode classificar como zona adjacente por se encontrar ameaçada pelas cheias a área contígua à margem de
um curso de águas.
2 - Tem iniciativa para a classificação de uma área ameaçada pelas cheias como zona adjacente:
a) O Governo;
b) O Instituto da Água, como autoridade nacional da água;
c) O Instituto da Conservação da Natureza, nas áreas classificadas;
d) O município, através da respectiva câmara municipal.
3 - A classificação de uma área como zona adjacente é feita por portaria do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do
Território e do Desenvolvimento Regional, ouvidas as autoridades marítimas em relação aos trechos sujeitos à sua
jurisdição e as entidades referidas nas alíneas b), c) e d) do n.º 2 se a iniciativa não lhes couber.
4 - A portaria referida no número anterior contém em anexo uma planta delimitando a área classificada.
5 - Podem ser sujeitas a medidas preventivas, nos termos do capítulo II do Decreto-Lei n.º794/76, de 5 de Novembro, as
áreas que, de acordo com os estudos elaborados, se presumam venham a ser classificadas ao abrigo do presente artigo.
6 - As acções de fiscalização e execução de obras de conservação e regularização a realizar nas zonas adjacentes podem
ser exercidas em regime de parceria a que se refere o artigo8.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro.
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DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Artigo 24.º
Zonas adjacentes
1 - Entende-se por zona adjacente às águas públicas toda a área contígua à margem que como tal seja classificada por se
encontrar ameaçada pelo mar ou pelas cheias.
2 - As zonas adjacentes estendem-se desde o limite da margem até uma linha convencional definida para cada caso no
diploma de classificação, que corresponde à linha alcançada pela maior cheia, com período de retorno de 100 anos, ou à
maior cheia conhecida, no caso de não existirem dados que permitam identificar a anterior.
3 - As zonas adjacentes mantêm-se sobre propriedade privada ainda que sujeitas a restrições de utilidade pública.
4 - O ónus real resultante da classificação de uma área como zona adjacente é sujeito a registo, nos termos e para efeitos
do Código do Registo Predial.
5 - Nas Regiões Autónomas, se a linha limite do leito atingir uma estrada regional ou municipal, a zona adjacente estende-
se desde o limite do leito até à linha convencional definida no decreto de classificação.
Artigo 25.º
Restrições de utilidade pública nas zonas adjacentes
1 - Nas zonas adjacentes pode o diploma que procede à classificação definir áreas de ocupação edificada proibida e ou
áreas de ocupação edificada condicionada, devendo neste último caso definir as regras a observar pela ocupação edificada.
2 - Nas áreas delimitadas como zona de ocupação edificada proibida é interdito:
a) Destruir o revestimento vegetal ou alterar o relevo natural, com excepção da prática de culturas tradicionalmente
integradas em explorações agrícolas;
b) Instalar vazadouros, lixeiras, parques de sucata ou quaisquer outros depósitos de materiais;
c) Realizar construções, construir edifícios ou executar obras susceptíveis de constituir obstrução à livre passagem das
águas;
d) Dividir a propriedade em áreas inferiores à unidade mínima de cultura.
3 - Nas áreas referidas no número anterior, a implantação de infra-estruturas indispensáveis, ou a realização de obras de
correcção hidráulica, depende de licença concedida pela autoridade a quem cabe o licenciamento da utilização dos
recursos hídricos na área em causa.
4 - Podem as áreas referidas no n.º 1 ser utilizadas para instalação de equipamentos de lazer desde que não impliquem a
construção de edifícios, mediante autorização de utilização concedida pela autoridade a quem cabe o licenciamento da
utilização dos recursos hídricos na área em causa.
5 - Nas áreas delimitadas como zonas de ocupação edificada condicionada só é permitida a construção de edifícios
mediante autorização de utilização dos recursos hídricos afectados e desde que:
a) Tais edifícios constituam complemento indispensável de outros já existentes e devidamente licenciados ou que se
encontrem inseridos em planos já aprovados; e, além disso,
b) Os efeitos das cheias sejam minimizados através de normas específicas, sistemas de protecção e drenagem e
medidas para a manutenção e recuperação de condições de permeabilidade dos solos.
6 - As cotas dos pisos inferiores dos edifícios construídos nas áreas referidas no número anterior devem ser sempre
superiores às cotas previstas para a cheia com período de retorno de 100 anos, devendo este requisito ser expressamente
referido no respectivo processo de licenciamento.
7 - São nulos e de nenhum efeito todos os actos ou licenciamentos que desrespeitem o regime referido nos números
anteriores.
8 - As acções de fiscalização e a execução de obras de conservação e regularização a realizar nas zonas adjacentes
podem ser efectuadas pelas autarquias, ou pelas autoridades marítimas ou portuárias, a solicitação e por delegação das
autoridades competentes para a fiscalização da utilização dos recursos hídricos.
9 - A aprovação de planos de urbanização ou de contratos de urbanização bem como o licenciamento de quaisquer
operações urbanísticas ou de loteamento urbano, ou de quaisquer obras ou edificações relativas a áreas contíguas ao mar
ou a cursos de água que não estejam ainda classificadas como zonas adjacentes, carecem de parecer favorável da
autoridade competente para o licenciamento de utilização de recursos hídricos quando estejam dentro do limite da cheia
com período de retorno de 100 anos ou de uma faixa de100 m para cada lado da linha da margem do curso de água
quando se desconheça aquele limite.
10 - A autoridade competente para o licenciamento do uso de recursos hídricos na área abrangida pela zona adjacente é
competente para promover directamente o embargo e demolição de obras ou de outras instalações executadas em violação
do disposto neste artigo, observando-se o disposto nas alíneas seguintes:
a) A entidade embargante intima o proprietário ou o titular de direito real de uso e fruição sobre o prédio, ou
arrendatário, se for o caso, a demolir as obras feitas e a repor o terreno no estado anterior à intervenção no prazo que
lhe for marcado. Decorrido o prazo sem que a intimação se mostre cumprida, proceder-se-á à demolição ou reposição
por conta do proprietário, sendo as despesas cobradas pelo processo de execução fiscal e servindo de título executivo
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DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL
a certidão passada pela entidade competente para ordenar a demolição extraída dos livros ou documentos, donde
conste a importância gasta;
b) As empresas que prossigam obras ou acções que estejam embargadas, nos termos da alínea anterior, mesmo não
sendo proprietárias, podem, sem prejuízo de outros procedimentos legais, ser impedidas de participar em concursos
públicos para fornecimentos de bens e serviços ao Estado por prazo não superior a dois anos ou ser privadas de
benefícios fiscais e financeiros; c) As sanções previstas na alínea anterior são comunicadas à Comissão de
Classificação de Empresas de Obras Públicas e Particulares, a qual pode determinar a aplicação, como sanção
acessória, da suspensão ou cassação do respectivo alvará.
Artigo 26.º
Contra-ordenações
1 - A violação do disposto no artigo 25.º por parte dos proprietários, dos titulares de outros direitos reais de uso e fruição
sobre os prédios, ou dos arrendatários, seus comissários ou mandatários, é punível como contra-ordenação, cabendo à
autoridade competente para o licenciamento de utilização dos recursos hídricos na área em causa a instrução do processo,
o levantamento dos autos e a aplicação das coimas.
2 - O montante das coimas é graduado entre o mínimo e o máximo fixados pela Lei da Água.
3 - O produto das coimas aplicadas ao abrigo da presente lei é repartido da seguinte forma:
a) 55% para o Estado;
b) 35% para a autoridade que a aplique;
c) 10% para a entidade autuante.
4 - A tentativa e a negligência são sempre puníveis.
Artigo 27.º
Expropriações
1 - Sempre que, em consequência de uma infra-estrutura hidráulica realizada pelo Estado ou por ele consentida a um
utilizador de recursos hídricos, as águas públicas passarem a inundar de forma permanente terrenos privados, o Estado
deve expropriar, por utilidade pública e mediante justa indemnização, estes terrenos, que passam a integrar o domínio
público do Estado.
2 - Se o Estado efectuar expropriações nos termos desta lei ou pagar indemnizações aos proprietários prejudicados por
obras hidráulicas de qualquer natureza, o auto de expropriação ou indemnização é enviado à repartição de finanças
competente para que se proceda, se for caso disso, à correcção do valor matricial do prédio afectado.
Artigo 28.º
Aplicação nas Regiões Autónomas
1 - A presente lei aplica-se às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira sem prejuízo do diploma regional que proceda
às necessárias adaptações.
2 - A jurisdição do domínio público marítimo é assegurada, nas Regiões Autónomas, pelos respectivos serviços
regionalizados na medida em que o mesmo lhes esteja afecto.
3 - O produto das coimas referido no artigo 26.º reverte para as Regiões Autónomas nos termos gerais.
Artigo 29.º
Norma revogatória
São revogados o artigo 1.º do Decreto n.º 5787-IIII, de 18 de Maio de 1919, e os capítulos I e II do Decreto-Lei n.º 468/71,
de 5 de Novembro. Artigo 30.º Entrada em vigor A presente lei entra em vigor no momento da entrada em vigor da Lei da
Água.
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