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A PALAVRA, O ARTISTA E A LEITURA

A PALAVRA, O ARTISTA E A LEITURA


hoMenaGeM a théoPhile Gautier

Organização
Celina Maria Moreira de Mello
Pedro Paulo GarCia Ferreira Catharina
Sonia CriStina reiS

Rio de Janeiro
2014

PPG-LEN/UFRJ
CLA/UFRJ
CNPq
© 2014 Celina Maria Moreira de Mello, Pedro Paulo Garcia Ferreira
Catharina, Sonia Cristina Reis e autores

Coordenação editorial
Karla Melo
Márcio-André
Ronaldo Ferrito
Victor Paes

Projeto gráfico e capa


Alemterra Graphic Designs

Imagem da Capa
Obra de Stéphanie Devaux

Revisão
Pedro Paulo Garcia Ferreira Catharina
Victor Paes
Comercial
Fernando Monteiro

Mello, Celina Maria M. de; Catharina, Pedro Paulo G. F.; Reis, Sonia Cristina

A palavra, o artista e a leitura - Homenagem a Théophile


Gautier / Celina Maria M. de Mello, Pedro Paulo G. F.
Catharina, Sonia Cristina Reis (orgs.)
Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2014.
272p.: 140 x 220 mm
ISBN: 978-85-60676-64-4
1. Literatura - História. 2. Arte. 3. Linguística. I. Título.

CDD: 801 CDU: 82.0

CONFRARIA DO VENTO
Av. Treze de Maio, 13 Sala 2010
Cinelândia 20031-007 – Rio de Janeiro/RJ
Telefax (21) 2533-3587
www.confrariadovento.com
Impresso no Brasil / Printed in Brazil
SUMÁRIO

aPreSentação
7

LEITURAS E LEITORES: REPRESENTAÇÕES DA ALTERIDADE

literatura e Cultura eSCrita. eStabilidade daS obraS,


Mobilidade doS textoS, Pluralidade daS leituraS
Roger Chartier
13
a deSCoberta do leitor. da eStétiCa da reCePção
à SoCioloGia da reCePção
Joseph Jurt
29
ler na era diGital
Jean-Yves Mollier
48
a leitura CoMo MetaMorFoSe
Edson Rosa da Silva
67
MiChel butor leitor de euGène delaCroix
Márcia Maria Valle Arbex
82
uniFiCação italiana na Canção PoPular: releituraS
Flora de Paoli Faria
100
leituraS do haiti
Geraldo Pontes Jr.
129
o Período CrítiCo e o aPrendizado de línGua eStranGeira
Celso Novaes
145

HOMENAGEM A THÉOPHILE GAUTIER:


RELEITURAS DO CÂNONE

Sobre a viaGeM de théoPhile Gautier à arGélia:


reFlexõeS Sobre o orientaliSMo
Jean-Yves Mollier
163
théoPhile Gautier, CrítiCo de arte roMântiCo, e o realiSMo
Celina Maria Moreira de Mello
178
théoPhile Gautier e oS iMPaSSeS eStétiCoS do SéCulo xix
Maria Cristina Batalha
202
o eSCritor e o inSCritor eM ContoS de théoPhile Gautier:
a deFeSa da arte Pela arte
Sabrina Baltor de Oliveira
220
o “Sobre a leitura” de ProuSt. teSe Sobre a leitura e o SiGniFiCado
daS leituraS de inFânCia: théoPhile Gautier e o Capitão FraCasso
Luciana Persice Nogueira
245
Sobre oS autoreS
268
A DESCOBERTA DO LEITOR. DA ESTÉTICA DA
RECEPÇÃO À SOCIOLOGIA DA RECEPÇÃO

JoSePh Jurt

Os textos e sua gênese, e, por conseguinte, os autores, estiveram


muito tempo no centro das abordagens literárias. A importância
da leitura e dos leitores, resumindo, a dimensão da recepção foi um
pouco negligenciada.
Paul Ricoeur destacou a dupla dimensão do texto literário –
conjunto consistente e estruturado do ponto de vista do autor e, ao
mesmo tempo, aberto às interpretações dos leitores – que suscita
dois pontos de vista sobre a crítica literária – o da gênese e o da
recepção. O confronto dessas duas dimensões revela-se inevitável,
uma vez que o sentido parte do texto, mas se completa na leitura:

Uma dialética infinita é posta em movimento, entre a estruturação


interna do texto e todas as atividades de desestruturação – sendo
que a reestruturação está relacionada à leitura. Esta dialética faz da
obra o efeito comum do autor e do leitor. (RICŒUR, 1989, p. 226)

a leitura na teoria Sartreana da literatura

Jean-Paul Sartre foi um dos primeiros a considerar a leitura como


elemento constitutivo da constituição do sentido de uma obra. No

29
seu ensaio fundamental intitulado “O que é a literatura?”, ele define
a obra intelectual pelo público ao qual se dirige, recusando-se a levar
em conta, como fator determinante, a condição do autor:

O meio é uma força propulsora; o público, ao contrário, é uma ex-


pectativa, um vazio por preencher, uma aspiração, no sentido próprio
e figurado. […] E longe de mim rejeitar a explicação da obra pela
situação do homem, uma vez que sempre considerei o projeto de
escritura como a liberdade de ir além de uma determinada situação
humana e total. (SARTRE, 1970, p. 96)

A obra escrita visando um público existe apenas enquanto


possibilidade. Somente a leitura pode dar a vida aos signos abs-
tratos da obra. O efeito calculado pelo artista só se atualiza no
momento em que é percebido pelo leitor. No entanto, a noção
tradicional de leitura revelou-se inapta para elucidar esse processo;
a leitura não é somente a percepção passiva de um objeto dado
definitivamente e para o qual poderíamos olhar, sem nenhum
investimento pessoal.
A leitura é um processo ativo que foi, perfeitamente, apre-
sentado por Sartre: “O leitor inventa tudo em um perpétuo ir
além da coisa escrita” (SARTRE, 1970, p. 57). O autor de O que é
a literatura? sugere, para este ato de leitura, que constitui o modo
de existência da obra de arte, a fórmula feliz da “criação dirigida”
(SARTRE, 1970, p. 57):

De fato, por um lado, o objeto literário somente possui como subs-


tância a subjetividade do leitor [...] Mas, por outro lado, as palavras só
estão presentes como armadilhas para suscitar nossos sentimentos e
os refletir em nossa direção. [...] Dessa forma, para o leitor, tudo está
por fazer e tudo já foi feito; a obra só existe no nível exato de suas
capacidades. (SARTRE, 1970, pp. 57-58)

A obra só existe – esta é a tese central de Sartre – após ter


sido lida. A leitura – “síntese da percepção e da criação” – requer o
texto escrito. Deste modo, escritura e leitura são as duas faces de um
mesmo processo.

30
o PaPel do reCePtor na teoria da CoMuniCação

O que, em Sartre, é apenas uma intenção genial é exposto de


forma sistemática pela teoria da comunicação elaborada por Karl
Bühler e em seguida desenvolvida por Jakobson e Umberto Eco. A
teoria da comunicação possui a vantagem de não isolar nenhuma
instância, nem o autor, nem o leitor; esse modelo atribui ao leitor
ou ao intérprete de uma obra um papel específico na qualidade
de receptor de uma mensagem.
Longe de querer limitar as relações entre autor, obra e leitor
a um simples ato de comunicação, a teoria semiológica esforçou-
-se para captar a natureza específica da mensagem estética. Esta
se destaca, segundo Jakobson, pela predominância da função
poética, ou seja, por uma estruturação intencional de todos os
níveis do texto. Essa estruturação terá como consequência tornar
ambígua a mensagem literária. Portanto, a ambiguidade é, nas
palavras de Jakobson, “uma propriedade intrínseca, inalienável,
de qualquer mensagem centrada sobre si mesma, em suma, trata-se
de um corolário obrigatório da poesia” (JAKOBSON, 1970, p.
238). Consequentemente, a comunicação estética não pode ser
unívoca, como a comunicação comum (na qual predomina a
função referencial), ela é necessariamente plurívoca.
À dialética entre o fechamento da estrutura e a abertura
da mensagem estética corresponde, portanto, o caráter dialé-
tico da atividade do intérprete. Esta se manifestará ao mesmo
tempo enquanto fidelidade e iniciativa. Se uma obra tão famosa
como o Don Quixote de Cervantes sobreviveu até hoje, não é
devido ao contexto de sua publicação nem ao público imedia-
to ao qual se destinava, mas à sua natureza estruturalmente
polissêmica que suscitou a série diacrônica de interpretações
sucessivas, sem que nunca pudéssemos esgotar o sentido da
obra. “Uma obra é eterna”, segundo Roland Barthes, “não
por impor um sentido único a homens diferentes, mas por
sugerir sentidos diferentes a um homem único, que fala sem-
pre a mesma língua simbólica através dos tempos múltiplos”
(BARTHES, 1966, pp. 51-52).

31
a eStétiCa da reCePção

A contribuição mais especificamente alemã parece ser a estética da


recepção desenvolvida pela École de Constance, cujos pais funda-
dores foram o romanista Hans Robert Jauss e o anglicista Wolfgang
Iser (ISER, 1985; JURT, 1983, 1979). A “aula inaugural” de Jauss,
pronunciada em Constance em 1967, foi considerada o manifesto des-
ta nova escola (Literaturgeschichte als Provokation der Literaturwissenschaft,
1970). Essa “aula” foi sem dúvida também inspirada pelo contexto,
pelo novo ímpeto que caracterizava esta nova universidade à beira
do lago de Constance, destinada na época a tornar-se uma Harvard
alemã. O impacto foi enorme na Alemanha; o texto de Jauss foi inú-
meras vezes citado; vários congressos foram realizados sobre o tema
e, rapidamente, os textos “canônicos” da escola foram publicados
em antologias. A influência foi tamanha que a Academia de Ciências
da República Democrática Alemã decidiu responder através de um
volume organizado por Manfred Naumann, Gesellschaft – Literatur –
Lesen. Literaturrezeption in theoretischer Sicht.1 Na Alemanha do início dos
anos 1970, não era possível deixar de assumir uma posição frente à
estética da recepção. Jauss realizara, assim, um golpe teórico, espe-
cialmente ao definir, ele mesmo, sua abordagem como uma mudança
de paradigma científico (referindo-se à análise de Thomas S. Kuhn
sobre a estrutura das revoluções científicas)2. O grupo da estética da
recepção também possuía instrumentos de poder simbólicos muito
eficientes: seminários interdisciplinares anuais publicados paralela-
mente aos debates, com o título Poetik und Hermeneutik3, uma revista
de alto nível, próxima das teses da escola, Poetica, e – o que constitui
em primeiro lugar uma escola – alunos que ocupavam cátedras im-
portantes por toda a Alemanha.
Através do título de sua aula inaugural (a história literária como
desafio), Jauss indicava que ele pretendia restaurar a historicidade da
literatura, banida pela análise imanente. Ao mesmo tempo, tratava-se,
para ele, de se opor ao objetivismo histórico. Em sua Aula, Jauss
declarou que desejava substituir a estética da produção tradicional
por uma estética da recepção e do efeito. A historicidade do fato
literário não residiria na produção, mas na recepção. O fato histórico

32
é, para ele, a leitura, a atualização do texto pelo leitor. De acordo com
essa visão, trata-se da história das atualizações sucessivas do texto
pelo leitor: “A história da literatura é um processo de recepção e de
produção estética que se realiza na atualização dos textos literários
pelo leitor que lê, pelo crítico que pensa e pelo escritor que produz
novamente” (JAUSS, 1970, p. 172). A fim de não limitar a história
da recepção a um inventário de reações individuais e puramente
psicológicas, Jauss introduz o conceito de “horizonte de expec-
tativa”, que vem da sociologia de Mannheim e é projetado como
um sistema de referência transindividual. O momento da leitura é
descrito como a fusão do horizonte intratextual e do horizonte de
expectativa da época. Este conceito de fusão dos horizontes é tira-
do de Gadamer (que considera a leitura como um diálogo entre o
intérprete e o texto, uma integração do passado no presente, o leitor
sendo influenciado pela tradição e, por sua vez, a influenciando).
A história da recepção está, portanto, vinculada à história do efeito
(Wirkungsgeschichte), sugerida por Gadamer, ao mesmo tempo que se
apresenta como uma mudança radical de perspectiva na abordagem
literária (estética da recepção vs estética da produção). A proposta
de Jauss se insere na tradição da tendência filosófica dominante na
Alemanha: a hermenêutica. Esta ressalta a importância do sujeito e da
situação histórica no momento do processo de percepção (contra
o objetivismo) e eleva a tradição (das interpretações anteriores) para
a categoria transubjetiva (contra o subjetivismo). Jauss apresenta a
“distância estética” como um critério de avaliação estética dos textos,
ou seja, o afastamento entre a obra e o horizonte de expectativa
constituído pela tradição de um gênero, a tópica, as metáforas. O
afastamento ou a inovação serve de parâmetro para medir o valor
estético. Esse parâmetro vem dos formalistas russos; dessa forma
concedemos a uma categoria histórica, que é no máximo pertinente
para a literatura moderna, uma pertinência universal. Por outro lado,
atribui-se ao horizonte de expectativa intraliterária (os sinais do texto)
a prioridade diante do horizonte extraliterário. Ao situar as normas
na obra, Jauss retorna a uma ontologização da obra que ele havia
decidido evitar. Para Jauss, a sociedade está presente externamente
ao fato literário, na qualidade de contexto. As repercussões são, para

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ele, a consequência da comunicação literária. Por meio do ato de recep-
ção, escreve Jauss, a experiência literária pode entrar na vida prática
(Lebenspraxis) do leitor, pré-formar sua visão de mundo e, em seguida,
exercer uma influência em seu comportamento. Jauss desconhece
que o fato literário é, por si só, um fato social. Para ele, o contato com
a obra pode contribuir para ampliar a própria experiência do leitor
graças à experiência do outro, mas esta experiência não parece incidir
sobre a vida prática (JAUSS, 1984, p. 822). Claude Piché observa, a
respeito, com razão: “Por enquanto, só se pode conceber a aplicação
“estética” como sendo a experiência que contribui para que o leitor
fortaleça ou desloque os cânones reconhecidos da estética, e nada
mais” (PICHÉ, 1984, p. 187).
O segredo do sucesso da estética da recepção parece residir
no radicalismo de uma inovação verbal que é, de fato, uma síntese
eclética de elementos já presentes. A estética da recepção é con-
cebida como uma abordagem histórica, mas ela reduz, de fato, a
historicidade à história da recepção, deixando de lado a unidade
essencial entre produção e recepção; por meio de empréstimos ao
formalismo, a estética da recepção isola e privilegia a estética (espe-
cialmente através da categoria de “distância estética”) e, desse modo,
permanece fiel à concepção de uma (certa) autonomia da estética
em relação ao social ou ao psicológico. A estética da recepção não
nega o social, mas o reduz a um fator periférico. No ensaio Die
Partialität der rezeptionsästhetischen Methode (JAUSS, 1973), o próprio H.
R. Jauss reconheceu que o seu conceito de horizonte de expectativa
é marcado por sua origem intraliterária e que ele negligencia um
pouco as interferências extraliterárias. No entanto, não negaremos
que a introdução dos termos de “horizonte de expectativa” e de
“distância estética” tenha sido produtiva. Mas as propostas de Jauss
permanecem frequentemente no nível da teoria, são teses (ou melhor,
hipóteses) que devem ser verificadas à luz de pesquisas empíricas que
deveriam ser desenvolvidas em duas direções: por um lado, trata-se
de fundamentar a reconstituição do horizonte de expectativa de um
determinado momento em uma base documental representativa, até
mesmo exaustiva; por outro lado, é importante destacar os condi-
cionamentos extraliterários do processo de recepção.

34
Por uMa SoCioloGia da reCePção

Estes foram os dois centros de interesse que nos levaram a nos dedi-
carmos a um projeto de pesquisa, visando elucidar, mais de perto, o
processo da recepção. Esse processo nos parece perceptível, para um
período histórico, nos registros escritos deixados pela crítica literária.
Por esse motivo, inicialmente, elaboramos um inventário, que preten-
dia ser exaustivo, de todas as reações provocadas pela obra literária
de um autor do período entre as duas guerras mundiais, Georges
Bernanos4; também levamos em conta um determinado número de
reações suscitadas pelos romances de Gide e de Malraux. Todas essas
resenhas foram analisadas usando um gráfico que foi desenvolvido
com esta finalidade. Em uma síntese, a seguir, procuramos estabelecer
uma classificação significativa das reações, assim como uma listagem
dos critérios que informam o julgamento literário. Dessa forma,
classificamos as reações, de acordo com as orientações políticas da
imprensa, em oito correntes ideológicas (extrema direita, direita,
burguesia, católicos moderados, centro literário, esquerda radical, es-
querda socialista e esquerda comunista). Nossa análise evidenciou uma
grande coerência das reações no âmbito das correntes apresentadas;
foi possível constatar que os julgamentos literários são fortemente
influenciados por seus respectivos pressupostos ideológicos. Ao
examinar a forma das críticas, detectamos dois tipos de reação: por
um lado uma critica judicativa, que opera a partir de um modelo, de um
ideal (literária, referencial, sociocultural, moral, doutrinal [JURT, 1977,
pp. 87-98); a obra é, então, avaliada em sua conformidade com esse
ideal; por outro lado, identificamos uma crítica compreensiva – praticada
por uma minoria de intérpretes – que pretende compreender a obra
mais do que julgá-la; esta crítica não isola alguns aspectos particulares
da obra, ela procura, ao contrário, integrar, em sua interpretação, o
maior número de elementos do texto5.
À luz dos resultados de nossa análise, foi possível verificar os
principais pressupostos da estética da recepção, a qual, como vimos,
postula um horizonte de expectativa composto quase que exclusi-
vamente por experiências e conhecimentos literários. Essa hipótese
não foi confirmada por nossa análise. Os julgamentos dos intérpretes

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não são determinados, em primeiro lugar, por critérios estéticos; os
critérios de avaliação são na maioria das vezes de teor extraliterário;
os critérios estéticos são utilizados, repetidamente, para corroborar
um pré-julgamento ideológico prévio.
De acordo com uma segunda hipótese de H. R. Jauss, a crítica
literária tende a determinar as normas (estéticas) de uma época e
expressa, então, seu desapontamento quando a obra inova e trans-
gride o horizonte de expectativa estabelecido. No entanto, em nossa
análise, identificamos uma série de reações que valorizam os traços
inovadores e originais das obras literárias. Entretanto, os julgamen-
tos críticos, em sua maioria, são expressos a partir de um horizonte
de expectativa conservador, inspirando-se nos modelos já citados.
Considerando as valorizações divergentes da inovação, não podemos
manter o postulado de um horizonte de expectativa uniforme para uma
época em sua totalidade.
Conforme afirmou H. R. Jauss em seus primeiros escritos, a
estética da recepção não pode substituir uma estética da produção;
ela a complementaria ao destacar a presença do leitor no texto e a
importância do leitor real para a concretização. Mas não podemos
esquecer que o processo dinâmico engloba tanto a produção do
texto a partir de suas condições de possibilidade específica, quanto
a concretização do sentido a partir dos apelos inerentes ao texto. A
concretização é, por sua vez, enquanto produção de sentido, um
processo ativo que pode provocar novas produções textuais.

a reCePção literária tranSnaCional

A recepção literária foi, ademais, analisada preferencialmente dentro de


um espaço nacional homogêneo6. Se formos além, será principalmente
para estudar as relações entre os grandes nomes do cânone, entre Goethe
e Racine ou Verga e Zola. Isto também se explica pelo fato de que os
estudos literários são marcados até hoje pelo mito do “grande escritor”,
mito que os interessados não têm motivo algum para destruir. Desta
forma, Anne Boschetti lembrou que o autor de uma obra “original”
gozava de um prestígio superior ao de todas as outras categorias (editores,

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comentaristas, professores, tradutores), devido à crença no “gênio cria-
dor”, como um dom individual que seria a causa primeira e o princípio
explicativo da obra. Por outro lado, os demais agentes culturais também
seriam os primeiros a reconhecer implicitamente a superioridade da
“criação”, por ver em sua profissão um meio de serem criadores por
procuração (BOSCHETTI, 1994, pp. 51-52).
Quando analisarmos a recepção de obras literárias, não podere-
mos nos ater somente à categoria do “grande autor” ou da “grande
obra”. Teremos que levar em conta o conjunto dos agentes envol-
vidos no processo. Assim, não sem razão, foi criticada a “estética
da recepção”, que pretendia, em primeiro lugar, avaliar a qualidade
estética das obras, por meio da diferença estética entre o produto
criado e o horizonte de expectativa, por negligenciar as condições
sociais do processo de recepção. Somente explicaremos esse processo
se isolarmos um ou outro agente, mas unicamente considerando-os
como parte integrante de um conjunto ou de um sistema e que eu
defino, com Pierre Bourdieu, como um campo.
Se for necessário levar em conta todos os agentes envolvidos
no processo da recepção, não deveremos, de forma alguma, negligen-
ciar os fatores específicos que são considerados quando uma obra é
recebida em um campo estrangeiro. Foi Yves Chevrel que, em um
dos primeiros números dos Cahiers d’Histoire de Littératures Romanes,
identificou pertinentemente os traços específicos que caracterizam
a recepção crítica de obras estrangeiras. O que diferencia a obra es-
trangeira é, de acordo com Chevrel, a grande distância que a separa
do campo de chegada; o contexto extraliterário deve ser considerado,
por exemplo, o estatuto das relações oficiais com a nação de origem.
A literatura estrangeira está sempre sujeita a uma explicação, de acordo
com um processo que traz o desconhecido (o estrangeiro) ao conhe-
cido (a tradição francesa universalizante). O método mais comum
é o simples paralelo; a seguir, os leitores são incitados a descobrir a
marca de sua própria literatura, ou afirma-se que tudo já foi dito pela
literatura francesa. Yves Chevrel, a esse respeito, transcreve as obser-
vações feitas por Zola, em 1897, em La Revue blanche: “Do mesmo
modo que, dizem, nosso vinho de Bordeaux torna-se melhor com
a viagem às Índias, é certo que algumas de nossas ideias, passando

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pelo gênio do Norte, assumiram uma dimensão e uma intensidade
admiráveis” (CHEVREL, 1977).
Foi Pierre Bourdieu quem, de forma muito perspicaz, definiu
as condições específicas da recepção de obras científicas e literárias
estrangeiras. Ele constatou que os textos, frequentemente, circulam
sem o seu contexto. Os receptores, inseridos em um campo de pro-
dução distinto, os interpretam em função da estrutura de seu campo
de recepção. O sentido e a função de uma obra estrangeira seriam
dessa forma determinados, ao menos, tanto pelo campo de recepção
quanto pelo campo de origem. A função no campo de origem, por
um lado, seria frequentemente ignorada, por outro lado, a transfe-
rência de um espaço para o outro se daria por meio de uma série de
operações sociais, uma operação de seleção, uma operação de tagging
e uma operação de leitura; e os leitores muitas vezes aplicam à obra
categorias de percepção e problemáticas de seu próprio campo:

Os efeitos estruturais que, em prol da ignorância, tornam possíveis


quaisquer transformações e deformações criadas para usos estratégi-
cos dos textos e dos autores podem ocorrer sem qualquer intervenção
manipuladora. As diferenças entre as tradições históricas são tão
marcantes [...] que a aplicação, em um produto cultural estrangeiro,
das categorias de percepção e de apreciação adquirida graças à ex-
periência de um campo nacional, pode criar oposições fictícias entre
coisas semelhantes e falsas semelhanças entre coisas diferentes.
(BOURDIEU, 1990, p. 6)

A referência à nação e à cultura nacional de chegada desempenha


um papel relevante no momento da recepção, contudo, houve variações
históricas. Esse recurso tornou-se mais importante, a partir do roman-
tismo. A literatura do Século das Luzes definiu-se pelo seu universalis-
mo, embora tal universalismo tenha sido a expressão de uma reduzida
camada da população. Pode-se até afirmar que o cosmopolitismo do
Século das Luzes era universal apenas na aparência, pois não se tratava
realmente de uma troca de ideias e de obras entre parceiros culturais
iguais, mas da supremacia do modelo cultural francês, que funcionou
graças ao estratagema que consistia em declarar os valores da civilização
francesa como sendo universais. Essa supremacia, também, pôde fun-

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cionar porque membros de uma elite não francesa haviam internalizado
o modelo, ao mesmo tempo em que o instrumentalizaram como sinal
de distinção diante de classes inferiores7.
É contra esta civilização aristocrática de inspiração francesa, e
aparentemente transnacional, que consideravam superficial e alienante,
que os intelectuais alemães de origem burguesa opunham sua concep-
ção da Kultur. Foi especialmente Justus Möser quem em 1781, em uma
resposta a Frederico II, fez a defesa de uma identidade cultural alemã,
em seu ensaio Über die Deutsche Sprache und Literatur, acusando o ideal
literário francês de ser exclusivamente aristocrático e louvando Goethe e
os autores ingleses por terem integrado, em seus escritos, a dimensão do
povo. Em sua opinião, não poderia haver padrões poéticos universais e
ele recorria a uma concepção organicista da cultura. Haveria uma cultura
específica para cada povo, uma vez que a lei do universo é a variedade
e não a uniformidade. Esta concepção organicista da cultura prevale-
cerá, especialmente em Herder, para quem a individualidade de cada
povo se traduz por sua língua e que busca nos textos originais a forma
de pensamento, o princípio originário da natureza, seu “Volksgeist”. A
concepção organicista da cultura, que podíamos encontrar em Herder
e Möser, deveria ter conduzido a um reconhecimento da legitimidade
das outras culturas. No entanto, a literatura nacional alemã afirmou-
-se, já no final do século XVIII, em particular, contra a predominância
francesa. Herder via na tragédia francesa somente mentiras e disparates,
uma marionete desprovida de espírito, de vida e de verdade. Ao longo
do século XIX, haverá críticas recorrentes da orientação da literatura
alemã em conformidade com o modelo estrangeiro, sobretudo com
as literaturas romanas.
Contudo, o nacionalismo literário exclusivo não era a única
reação destinada a exceder o cosmopolitismo aristocrático. Um outro
modelo expressava-se no conceito da Weltliteratur de Goethe, que
estipulava o intercâmbio entre as literaturas, assim como nos escri-
tos de Mme de Staël. Mme de Staël também partia de uma concepção
cultural organicista. No entanto, para ela, a ideia da legitimidade de
uma literatura nacional implicava no reconhecimento da legitimidade
idêntica das literaturas das outras nações. Devia-se reconhecimento
ao que era estrangeiro em sua originalidade, referindo-a às condições

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históricas específicas, o que Mme de Staël tentou fazer em sua obra Da
literatura considerada em suas relações com as instituições sociais (1800). A partir
de tal reconhecimento mútuo, é possível que haja uma troca entre as
culturas. Dessa forma, Mme de Staël, segundo Pierre Macherey, foi
além do particularismo romântico que afirma a autonomia radical de
cada cultura e também do universalismo clássico que confunde todas
as culturas em um modelo ideal abstrato. A tese por ela formulada, já
no final do século XVIII, era totalmente inovadora: “Só existe iden-
tidade cultural dentro da relação cultural que reúne todas as culturas,
opondo-as entre si” (MACHEREY, 1988, p. 425).
A autonomia literária também se manifestou no campo dos es-
tudos universitários. A literatura que, por certo, havia-se inspirado nas
obras da Antiguidade e que havia integrado, ao longo do século XVIII,
o empirismo inglês, era considerada universal, mas, no final das contas,
essa universalidade era muito galocêntrica e pouco aberta a outras cul-
turas. Em um livro recente intitulado O paradigma do estrangeiro, Michel
Espagne conta que somente em 1830 foi criada, em Paris, a primeira
cátedra de literatura estrangeira, constituindo, desta forma, por oposição
uma “literatura francesa” desprovida de sua pretensão universalista.
Para a França do século XIX, o “estrangeiro” era a cultura alemã; e os
instrumentos intelectuais por meio dos quais se buscava compreender
as culturas estrangeiras provinham da tradição alemã: filologia, historis-
mo, teoria do espírito nacional. Contudo, não se tratava, em hipótese
alguma, de uma visão desinteressada da cultura estrangeira, que foi, ao
contrário, instrumentalizada em benefício das necessidades nacionais8.
O conceito de literatura estrangeira implicava, como observa Michel
Espagne, o princípio da diferenciação; a partir de 1879, foi instituída
uma cátedra para a literatura da Europa do Sul e, em 1901, foi criada
uma cátedra voltada para a língua alemã e a língua inglesa.
A referência nacional determinou a recepção da literatura, de
ambos os lados, ainda no século XX. Doris Harrer constata esse fato na
conclusão de sua tese sobre a recepção da literatura francesa, durante
a República de Weimar (Französische Literatur in der Weimarer Republik).
Segundo a autora, na Alemanha da República de Weimar, marcada
por uma crise de identidade nacional, a literatura francesa tornara-se
um modo para a busca de si própria; alguns pretendiam manter uma

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entidade alemã em oposição ao estrangeiro, encarnado pela literatura
francesa; em contrapartida, críticos próximos da esquerda pretendiam
ir além da “essência” alemã adaptando-se ao estrangeiro, também
representado pela literatura francesa. Aqueles que, como Walter
Benjamin, procuravam entender a literatura francesa enquanto tal se
encontravam mais à margem ou distantes dos grupos dominantes da
República de Weimar (HARRER, 1987, pp. 182-183).
Assim, em um artigo publicado em 1928, Ernst Robert Curtius
constatou que cada parceiro deste diálogo franco-alemão utilizava
inconscientemente as normas de sua própria cultura como critério
de apreciação da cultura do outro. Mas o próprio Curtius não con-
seguiu fugir dessa forma de percepção. Ele pretendia apresentar em
seu livro sobre os precursores da nova França (Die Wegbereiter des
neuen Frankreich [1919]) uma imagem diferente da França decadente;
mesmo assim, ele recorreu a estereótipos de convenção, ao associar
a França a um estado de agregação sólido e a Alemanha a um estado
líquido. Em autores como Gide, Romain Rolland, Claudel, Suarès,
Péguy, ele vislumbrava os representantes de uma “jovem” França,
que correspondia à imagem que a Alemanha tinha de si própria –
que representava o porvir. Curtius acreditou ter descoberto naqueles
autores um sentimento de valores que teria um “ponto comum”
com o dos alemães; ele ressaltava, nesses escritores, as categorias de
intensidade da vida e do vivido, um impulso novo que Bergson e
Nietzsche pareciam confirmar a partir de uma filosofia vital.
Por ocasião de uma recente pesquisa empírica sobre as moda-
lidades sócio-históricas da leitura, Jacques Leenhardt e Pierre Józsa
tiveram que se render à evidência que a ideia segundo a qual cada
leitor se encontra diante das obras-primas da literatura mundial, em
uma situação de leitura idêntica, deveria ser reavaliada:

O estudo empírico da leitura mostra, de fato, que a unidade da razão


e a unicidade do texto têm um papel secundário no ato da leitura.
De acordo com o local e o tempo, a hierarquização das categorias
da percepção e da avaliação varia a tal ponto que se torna necessário
considerar que o objeto visado no ato da leitura é a própria leitura,
mais ainda do que o texto. (LEENHARDT, 1988, pp. 75-76)

41
Durante a sua pesquisa empírica, Leenhardt e Józsa sugeriram
a leitura de um romance francês (Les Choses, de Pérec) e um romance
húngaro (Le cimetière de rouille, de Fejes) para uma amostragem repre-
sentativa de leitores na França e na Hungria. Os resultados não foram
idênticos, longe disso. Na Hungria, para o romance francês, preva-
leceu uma leitura moralista e, para o romance húngaro, uma leitura
sociológica, política, enquanto que na França, para os dois romances,
prevaleceu uma leitura analítica e sociológica. Se a questão política
evocada pelos romances transita na Hungria pela identificação, isso
comprova, aos olhos dos autores, que o discurso universalista não
está à disposição de qualquer um. Em contrapartida, a capacidade de
que dispõe, teoricamente, qualquer francês para apreender os pro-
blemas em toda a sua complexidade pode parecer como um efeito
da prevalência do discurso universalista, na França (LEENHARDT
& JÓZSA, 1982, pp. 332-341).
A análise da recepção das obras estrangeiras, que é aquela da
circulação internacional das obras e das ideias, não é somente um
tema acadêmico. No campo das trocas de bens materiais, a globali-
zação parece prevalecer cada vez mais; não é de forma alguma o que
ocorre no que se refere às trocas culturais, onde parece haver uma
evolução inversa. Os domínios linguísticos, mesmo no âmbito dos
Estados-nações se diferenciam cada vez mais. A Europa está dividi-
da por culturas nacionais estritamente separadas e cada país ignora
quase que totalmente o que se passa nos países vizinhos, tanto no
âmbito do debate das ideias quanto em termos de criação literária,
principalmente se eles não pertencerem à mesma área linguística9.
É, portanto, primordial analisar de perto os fatores que deter-
minam a transferência (ou a não transferência) de obras e de ideias
de um campo nacional para outro; isso facultaria, assim, que fossem
esclarecidas as causas de muitos dos mal-entendidos estruturais que
caracterizam as relações intelectuais transnacionais e que fosse aberto
o caminho para um diálogo racional10.

Tradução de Savvas Karydakis

42
notaS

1 Ver também a esse respeito Billaz, 1981.


2 Cf. JAUSS, 1969, p. 4 e JAUSS, 1975, p. 327.
3 O grupo Poetik und Hermeneutik tornou-se hoje um objeto central da his-
tória intelectual da Alemanha. Na Universidade de Constance, um grupo
importante de pesquisadores dedica-se a esse tema; um número especial
da revista Internationales Archiv für Sozialgeschichte der deutschen Literatur, tomo
35, 2010 é dedicado à história intelectual do grupo Poetik und Hermeneutik.
4 Este inventário foi publicado em forma de bibliografia: JURT, J.
Georges Bernanos, 1. Essai de bibliographie des études en langue française: tome 1
(1926-1948), 1972; tome 2 (1949-1961), 1975; tome 3 (1962-1971), 1976.
5 Os resultados de nossas pesquisas, muito tempo depois, suscitaram
um debate crítico, por meio de uma análise paralela de VERDRAGER,
2001, 2007; PARISOT, 2001; BERTELLI, 2005.
6 O que também ocorreu quando propusemos trabalhos em vista da
constituição de uma sociologia da recepção: JURT, 1979; 1980. Os
trabalhos com esta abordagem eram igualmente dedicados ao estudo
da recepção no âmbito de um espaço nacional homogêneo. Ver, então,
GALSTER, 1986; AHLSTEDT, 1954; ARPIN, 1995. Há, entretanto,
igualmente, trabalhos que, partindo de nossas propostas, analisaram
a recepção em um espaço estrangeiro. Ottmar Ette (1991) estudou a
recepção de José Martí em três espaços: o espaço cubano; o espaço dos
cubanos exilados; o espaço estrangeiro. Dois trabalhos abordaram a
recepção de Sartre na Alemanha: HÄUßLER, 1989 e RAHNER, 1993.
7 Ver a esse respeito Michel Espagne & Michaël Werner: “A cultura fran-
cesa dos séculos XVIII e XIX, geralmente, passa por ser pouco aberta
para o mundo exterior. Historicamente, este egocentrismo fundamenta-se
em uma posição dominante no âmbito da Europa. Fortalecida por sua
irradiação junto às elites europeias; a cultura nacional, por assim dizer,
bastava-se a si própria. A Revolução Francesa imitou, politizando-a, tal
atitude, que, como devemos destacar, é amplamente anterior ao despertar
dos nacionalismos e confunde-se em grande parte com o universalismo
das Luzes” (ESPAGNE & WERNER, 1987, p. 971).
8 “Os professores responsáveis por esta disciplina, ao contrário, têm com
frequência a sensação de destacar uma difusão da França, pela Europa;

43
a escolha dos autores estrangeiros de que eles se ocupam permanece
muito limitada e determinada por considerações puramente nacionais,
por necessidades específicas da cultura de chegada [...]. Em contrapar-
tida, o que ocorre é uma instrumentalização variada e complexa das
culturas vizinhas, uma instrumentalização que talvez seja inconsciente,
mas cujas diversas figuras são suficientemente marcadas para que sejam
explicadas, em sequência” (ESPAGNE, 1993, pp. 15-16).
9 Ver o que afirma Roger-Paul Droit a este respeito: “Conversamos por
satélite entre dois continentes. Imagens de televisão, mensagens de fax,
ordens informatizadas transitam, instantaneamente, entre os dois lados
do mundo. Mas são necessários longos anos, por vezes décadas, para
que uma obra importante atravesse o rio Reno, a cordilheira dos Alpes
ou dos Pirineus, o canal da Mancha ou o mar Mediterrâneo. Ignoramos,
com persistência, pensadores importantes dos países vizinhos que nos
tocariam intimamente, enquanto somos avisados que um trem descar-
rilou ou que há casos de vaca louca. Este não é o menor paradoxo do
século: as questões, políticas ou financeiras, e também os fatos fúteis
ignoram as distâncias e o tempo, enquanto o comércio das ideias é
afinal de contas mais limitado e menos intenso do que nos tempos dos
cocheiros, das pousadas para muda e das prensas manuais” (Le Monde,
12 de abril de 1991, p. 22).
10 Para um estudo de caso cf. JURT, 2009; 2006. A partir das propos-
tas de Pierre Bourdieu foi constituída uma rede de pesquisas finan-
ciada pela comunidade europeia, denominada ESSE, que se dedicou
à análise dos processos de recepção transnacionais da literatura e das
ideias. Trata-se de determinar os mecanismos de importação e de
exportação das obras das duas últimas décadas, em um plano inter-
nacional. O ângulo sociológico de percepção, nesse caso, amplia-se
para o direito e a economia, uma vez que se trata da troca de bens
materiais e simbólicos. Especificamente, trata-se de considerar o
contexto da globalização (econômica) e suas consequências para a
troca intelectual. Nesse contexto, Gisèle Sapiro organizou e publicou
três obras coletivas voltadas para a problemática da recepção vista
pelo viés das traduções: Translatio. Le marché de la traduction en France à
l’heure de la mondialisation (2008); Les contradictions de la globalisation édi-
toriale (2009), L’espace intellectuel en Europe: de la formation des Etats-nation
à la mondialisation XIXe-XXIe siècle (2009). Nesse contexto, convém
mencionar a obra de Gustavo Sorá, Traducir el Brasil. Una antropología
dela circulación de ideas (2003).

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