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tecnologia
ISSN: 1415-0549
revistadafamecos@pucrs.br
Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul
Brasil
Recuero, Raquel
Diga-me com quem falas e dir-te-ei quem és: a conversação mediada pelo computador e
as redes sociais na internet
Revista FAMECOS: mídia, cultura e tecnologia, núm. 38, abril, 2009, pp. 118-128
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
Porto Alegre, Brasil
ABSTRACT
The following work discusses how social networks within
Como compreender as redes
social network sites can be studied through conversation
analysis. We argue that conversation can be used to map the
estabelecidas nos sites de
social networks underlying these systems, based on structural
and semantic aspects that can reveal social ties and social
redes sociais a partir do
capital built by the actors. We also discuss how conversation
can reveal more “live” or “emergent” networks in those sites,
estudo da conversação? Como
rather than the mere study of links exchanged by the actors. observar essas redes a partir
KEY WORDS da conversação? Que tipo de
social networks
computer-mediated conversation informação podemos obter
conversation analysis
através desta perspectiva?
No entanto, os trabalhos que discutem a construção
do espaço de conversação e da influência desta
conversação nas redes sociais que ali se constituem
são raros. Boyd e Herr (2006) discutem os perfis do
Friendster² (um dos primeiros sites de redes sociais
a despontar nos Estados Unidos) como formas de
conversação, entretanto, focados na performance. Boyd
(2007) aponta para o fato de que sites de redes sociais
Raquel Recuero alteram significativamente as conversações por conta da
Professora do Programa de Pós-Graduação em Letras e do Centro de invisibilidade da audiência para a qual as interações são
Educação e Comunicação da UCPel/RS/BR colocadas, tomando como estudo de caso o Facebook³
raquelrecuero@terra.com.br e o MySpace4 nos Estados Unidos. Há a consciência
proporciona, pela mediação do computador, que as características enumeradas por Marcuschi (2006) são
interações persistam no tempo e possam ser acessadas muito mais evidentes, já que os pares conversacionais
em momentos temporais diferentes daquele em que são facilmente discerníveis, bem como o centramento da
foram emitidas (Boyd, 2007). Finalmente, a CMC é um interação, e a identidade temporal (vide, por exemplo,
tipo de comunicação que ainda privilegia especialmente Negretti, 1999; Oliveira, 2006 dentre outros). Já a
o texto, mais do que o som e o vídeo (apesar de seu conversação assíncrona é aquela que acontece em um
desenvolvimento em hipermídia, a maior parte das (ou mais) espaços, onde as interações ocorrem em uma
ferramentas de comunicação ainda é principalmente identidade temporal alargada, mas que se assemelham
textual – vide, por exemplo, weblogs5, Twitter6 e Plurk7, às conversações na estrutura de trocas entre dois ou mais
Fóruns8, chats9, mensageiros instantâneos10 e e-mails). interagentes, mas cuja identidade temporal é alargada,
A mediação pelo computador, no entanto, impõe podem ocorrer em vários espaços ao mesmo tempo
barreiras tecnológicas para a interação que a comunicação (por exemplo, nos comentários de vários weblogs de
face-a-face não possui. Assim, para compreender uma mesma rede), mas que estão centrados em um
como a conversação é estabelecida nesses ambientes, tópico (vide McElhearn, 1996; Noblia, 1998; De Moor
é preciso, também, compreender a ferramenta como & Efimova, 2004; Herring et. al 2005 dentre outros).
meio. Herring (2002) explica que a CMC varia de Esses dois tipos de conversação possuem formas de
acordo com a tecnologia na qual está baseada, ou seja, organização diferenciadas, especialmente no que diz
as formas de conversação são também limitadas pela respeito à negociação dos turnos, embora possuam
ferramenta tecnológica. A maior parte das ferramentas marcadores conversacionais bastante semelhantes por
de CMC disponíveis hoje é focada na interação textual¹¹, conta da oralidade e da apropriação da ferramenta
por exemplo. E as ferramentas textuais possuem (Recuero, 2008).
limitações que influenciam as conversações como,
por exemplo, a dificuldade do uso de linguagem não
verbal e a dificuldade de negociação de turnos ¹² (ambas A grande diferença entre sites
apontadas por Herring, 1999).
Reid (1991) em seu trabalho sobre o IRC¹³ aponta de redes sociais e outras formas
que a comunicação mediada pelo computador pode
ser compreendida como síncrona ou assíncrona a partir de Comunicação Mediada pelo
de suas ferramentas. As ferramentas síncronas seriam
aquelas que permitem uma expectativa de resposta Computador é o modo como os
imediata ou, em uma mesma identidade temporal, como
as salas de chat. Seriam ferramentas que simulariam primeiros permitem a visibilidade
uma troca de informações de forma semelhante a uma
interação face a face. Já nas ferramentas assíncronas, a e a articulação das redes sociais,
expectativa de resposta não é imediata, mas alargada
no tempo. Essas seriam ferramentas como o e-mail e os a manutenção dos laços sociais
fóruns da Web. Murphy & Collins (1999) e Ko (1996)
também fazem consideração semelhante, mas ressaltam estabelecidos no espaço offline.
que tais características podem decorrer do uso e não da
ferramenta em si. Ou seja, e-mails, por exemplo, apesar Outro fenômeno característico das conversações
de ser um tipo de comunicação inicialmente assíncrona, mediadas pelo computador diz respeito ao seu
podem ser utilizados de forma síncrona. Do mesmo espalhamento. Conversações mediadas pelo computador
modo, mensagens em um meio síncrono, como o MSN¹4 tendem a espalhar-se por diversas ferramentas e
podem facilmente serem enviadas enquanto o usuário sistemas, em um processo de migração conversacional
está desconectado, descaracterizando a sincronicidade também relacionado com a persistência das conversações
da resposta. assíncronas. Entretanto, apesar da ferramenta utilizada
Por conta dessas características especiais da para a conversação contribuir para o tipo de conversação
mediação, defendemos que a conversação mediada que dela emergirá, não é inteiramente determinante
pelo computador pode ser compreendida como desta (de forma oposta ao que argumenta Herring,
síncrona ou assíncrona e esta característica decorre do 1999). Por conta disso, o espalhamento ou migração das
modo através do qual uma determinada ferramenta é conversações entre as diversas ferramentas, bem como a
apropriada (Recuero, 2008). A conversação síncrona apropriação de mecanismos síncronos para conversação
seria aquela que se estabelece, normalmente, em um assíncrona e vice-versa, são comuns. Embora a
único espaço, onde as interações podem ocorrer em uma conversação assíncrona possua dinâmicas diferentes da
identidade temporal próxima, de forma semelhante à síncrona, especialmente no que se refere à organização
conversação face-a-face. Nesse tipo de conversação, as e ao espalhamento das plataformas utilizadas, ambas
possuem dinâmicas de linguagem bastante semelhantes é o modo como os primeiros permitem a visibilidade
(como o direcionamento, por exemplo). e a articulação das redes sociais, a manutenção dos
Finalmente, conversação mediada pelo computador laços sociais estabelecidos no espaço offline. Assim,
tem ainda outro aspecto muito importante: É através nessa categoria estariam os chamados fotologs 17
dela que são estabelecidas e evidenciadas as trocas (como o Flickr e o Fotolog, por exemplo); os weblogs18
que darão origem às redes sociais observadas no (embora sua definição não seja exatamente dentro
ciberespaço e, como defenderemos neste trabalho, que de um sistema limitado, como propõem as autoras,
é possível percebê-las. Essas trocas informacionais são defenderemos que são sistemas semelhantes); as
freqüentemente associadas à construção de valor social, ferramentas de microblogging atuais (como o Twitter e
interação e à conseqüente construção (e expressão) de o Plurk) além de sistemas como o Orkut19 e o Facebook,
redes sociais na Internet (Boyd, 2007; Herring et al., mais comumente destacados na categoria. Esses sites
2005) através de seus laços15 e capital social16. Para poderiam ser enquadrados dentro de todas as categorias
discutir essa influência, discutiremos ainda como elencadas pelas autoras, pois possuem mecanismos de
podem ser compreendidas as redes sociais a partir da individualização (personalização, construção do eu etc.);
conversação nos sites de redes sociais. mostram as redes sociais de cada ator de forma pública
e possibilitam que os mesmos construam interações
Sites de redes sociais e conversação mediada pelo nesses sistemas.
computador Há, portanto, dois elementos trabalhados por
O surgimento dos chamados sites de redes sociais, a Boyd e Ellison (2007) em sua definição: a apropriação
partir da década de 90, complexificou ainda os fluxos (sistema utilizado para manter redes sociais e dar-lhes
informacionais. Sites de redes sociais foram definidos sentido) e a estrutura (cuja principal característica é
por Boyd & Ellison (2007) como aqueles sistemas que a exposição pública da rede dos atores, que permite
permitem: i) a construção de uma persona através de mais facilmente divisar a diferença entre esse tipo de
um perfil ou página pessoal; ii) a interação através de site e outras formas de comunicação mediada pelo
comentários e iii) a exposição pública da rede social de computador). A apropriação refere-se, portanto, às
cada ator. Os sites de redes sociais seriam uma categoria formas de conversação que são expressas em um
do grupo de softwares sociais, que seriam softwares determinado tipo de site de rede social. Já a estrutura,
com aplicação direta para a comunicação mediada tem um duplo aspecto: Por um lado, temos a rede
por computador. Embora esses elementos sejam mais social expressa pelos atores em sua “lista de amigos”
focados na estrutura do sistema utilizado pelos autores ou “conhecidos” ou “seguidores”. Por outro, há a
é, entretanto, na apropriação que reside a principal rede social que está realmente viva através das trocas
diferença entre os dois tipos de site. conversacionais dos atores, aquela que a ferramenta
auxilia a manter. As conexões decorrentes das listas são
normalmente associadas a um link, a uma adição ou a
Há uma diferença fundamental uma filiação pré-estabelecida pela estrutura do sistema.
As conexões decorrentes das conversações, ao contrário,
entre as redes que são são emergentes.
Aqui está nossa primeira premissa para o estudo
publicamente disponibilizadas das redes em sites de redes sociais: Há uma diferença
fundamental entre as redes que são publicamente
pela ferramenta (chamaremos disponibilizadas pela ferramenta (chamaremos aqui de
redes de filiação) e as redes que estão realmente “vivas”,
aqui de redes de filiação) e emergentes através das conversações no sistema
(chamaremos aqui de redes emergentes). Embora
as redes que estão realmente ambas representem redes sociais anexas, representam
redes sociais diferentes. Enquanto as redes sociais
“vivas”, emergentes através decorrentes das conexões estruturais de um sistema
podem representar uma rede estática (por exemplo,
das conversações no sistema os “amigos” de alguém no Orkut), as redes sociais
emergentes são aquelas que mostram efetivamente,
(chamaremos aqui de redes com quem ele interage e como essas interações estão
influenciando sua rede estruturada pelo sistema. É
emergentes). para esta última categoria que a caracterização da
conversação permite que seja observada a rede.
A grande diferença entre sites de redes sociais e outras Como Boyd (2007b); Ellison, Steinfield & Lampe (2007);
formas de Comunicação Mediada pelo Computador Haythornthwaite (2005) e outros apontam, as redes
sociais expressas nesses sites não são desconectadas das pelo computador para nossa discussão é o fato de
redes offline. Se é verdade que os sites de redes sociais que a conversação conecta as interações mediadas
são apropriados como forma de manter redes sociais observadas nos sites de redes sociais, refletindo essas
pré-existentes - como Boyd & Ellison (2007) afirmam- redes. E defendemos que o estudo da estrutura dessas
é através das redes emergentes que essa manutenção conversações pode indicar elementos da qualidade das
ocorre. Por outro lado, as redes de filiação podem conexões estabelecidas entre os atores. Este constitui
apontar a estabilidade da rede e sua sedimentação. o aspecto estrutural das conversações mediadas.
Portanto, essas últimas, constituídas e complexificadas No entanto, uma conversação não é constituída
através da conversação, é que serão objeto de nossa unicamente de uma estrutura de mensagens. Ela é
proposta. igualmente constituída de um sentido construído
A conversação, nos sites de redes sociais, pode entre os interagentes. Este aspecto semântico auxilia
também ser constituída tanto de forma síncrona como na compreensão das relações entre as mensagens e na
assíncrona, como já discutimos. Enquanto alguns interpretação do sentido daquilo que é trocado.
proporcionam espaços mais assíncronos, outros O aspecto estrutural de uma conversação pode
proporcionam formas síncronas de comunicação. ser observado através da análise e negociação dos
Enquanto alguns sites proporcionam que seja utilizado turnos estabelecidos entre os atores, bem como de
som e imagem, para a maioria deles, há somente aspectos como entre as mensagens, de onde é possível
texto. Diante dessas condições, inúmeras estratégias se depreender a estrutura da rede social. O aspecto
conversacionais são apropriadas. Örnberg (2003), por semântico auxilia na compreensão do significado das
exemplo, explica que a CMC proporcionou uma nova mensagens, de onde é possível depreender o conteúdo
forma de linguagem, híbrida entre a linguagem escrita dos laços sociais. A partir desta premissa, enumeramos
e a oral, de forma a proporcionar uma maior fluência os aspectos a ser mapeados (Tabela 1).
nas conversações. Assim, nenhum site de rede social Aspectos Semânticos Aspectos Estruturais
pode ser visto apenas como linguagem escrita (Collot Conteúdo das interações Sequenciamento das interações
& Belmore, 1996) ou oral. Constituem-se em novos Identificação dos pares conversacionais Estrutura dos pares conversacionais
gêneros, com semelhanças e diferenças para cada uma Negociação dos turnos de fala Organização dos turnos de fala
dessas linguagens (Crystal, 2001), utilizadas a partir de Reciprocidade Persistência
contextos criados pelos interagentes. Por conta disso, Multiplexidade Migração
são meios de extrema complexidade, pois alteram o
contexto onde as interações comunicativas acontecem. Mas como compreender tais aspectos nos sites de
Uma vez que discutidos os elementos diferenciais redes sociais?
da conversação nos sites de rede social, passaremos a a) Conteúdo e Sequenciamento das Interações – O
sistematizar elementos para a análise das conversações primeiro aspecto que elencamos para a análise da
nesses sites a partir de suas características. conversação é o seqüenciamento e o conteúdo das
interações. Isso significa que, para que se compreenda
Redes sociais e conversação em sites de redes sociais a conversação, é preciso coletá-las e tentar compreender
Sites de redes sociais refletem estruturas sociais como se relacionam entre si. O seqüenciamento é a
construídas e modificadas pelos atores através forma de compreender qual turno vem antes ou depois
das ferramentas de comunicação proporcionadas e com qual interação é relacionado. O conteúdo auxilia
pelos sistemas, incluindo-se aí o aparecimento das na percepção do aspecto semântico que complementa
redes sociais e, aqui compreendidas como grupos e auxilia nessa percepção, afinal de contas, é preciso
de indivíduos (atores) cujas trocas conversacionais compreender o que se diz para que se compreenda
vão gerar laços e capital social. Nesses espaços, são também como se diz. Esta análise é fundamental
construídas conversações síncronas e assíncronas que para que se consiga identificar quais interações fazem
têm diferentes efeitos sobre a estrutura da rede social. parte de qual conversação. Os aspectos estruturais são
Este artigo busca, assim, explorar que efeitos são esses, analisados através de elementos como as marcações
a partir de um entrelaçamento conceitual de dois focos de direcionamento, links, data e horário das interações
teórico-metodológicos que são pouco trabalhados de e assinaturas. Os semânticos, através do estudo do
forma conjunta, aquele do estudo das redes sociais conteúdo das mensagens. Esses elementos permitem
na Internet (Wellman, 2001) e aquele da Análise da que se compreenda quem fala com quem e como a
Conversação (AC) (Marcuschi, 2004, 2006; Kerbrat- conversação está organizada.
Orecchioni, 2006). Interessa-nos, aqui, as redes que Em sites de redes sociais, o conteúdo e o
são efetivamente constituídas através da apropriação seqüenciamento das interações têm uma relação direta
desses sites como ferramentas de conversação, que com o tipo de conversação desenvolvida. Conversações
denominamos redes emergentes. assíncronas, por exemplo, possuem um seqüenciamento
O elemento mais importante da conversação mediada diferente das conversações síncronas.
ter a mesma função. identificação dos turnos e dos atores envolvidos. Ela
auxilia a compreender elementos como a simetria dos
laços estabelecidos entre os atores e está diretamente
relacionada ao capital social.
O aspecto estrutural da reciprocidade é a persistência
(Boyd, 2007). A persistência das interações é um
No exemplo, temos um texto em um blog que comenta aspecto importante para o seguimento da conversação,
outro texto de outro ator, indicado pelo link. É uma que permite aos atores estabelecer as respostas e a
forma de organizar os turnos de fala quando se responde reciprocidade de sentimentos envolvidos em cada
a postagens diferentes. interação. Embora seja um aspecto mais estrutural do
O estudo dessas apropriações e das estruturas dos que semântico, a persistência das interações mostra o
sistemas também auxilia na compreensão de como tamanho da conversação e sua extensão no tempo. Ela
acontecem os turnos de fala, o que diretamente é é observada através das datas e horários publicados
refletido na estrutura da conversação e no sentido com as mensagens trocadas entre os atores, bem como,
construído entre os usuários (Herring, 1999). Com das assinaturas.
isso, percebem-se também as relações sociais que estão e) Multiplexidade e Migração– A quantidade de
contidas nessas conversações. No exemplo do Twitter, interações relacionadas entre si, de forma a compor uma
por exemplo, verificamos, novamente que a interação conversação, que ocorre através de várias relações em
em questão não é a primeira entre os atores envolvidos, várias ferramentas, por exemplo, pode ser um indicativo
pois demonstra certo nível de intimidade. interessante da força de um laço entre dois atores.
d) Reciprocidade e Persistência – Analisar uma única A conversação síncrona tende a ser menos multiplexa
mensagem trocada entre um par de atores ou um único que a assíncrona, pois utiliza menos ferramentas
par conversacional é insuficiente para que se percebam para estabelecer as relações sociais. A conversação
as relações sociais envolvidas e que se despreenda o laço síncrona exige, também, um esforço menor para o
social estabelecido. É preciso avaliar a quantidade de acompanhamento das interações, o que é mais complexo
mensagens parte de uma determinada conversação entre nas interações assíncronas. É comum, por exemplo, uma
um par de atores e suas inter-relações para determinar- conversação em um determinado sistema migrar para
se que tipo de conexão essas trocas constituem. Mais do outro e vice-versa. Essa migração indica claramente a
que isso, é preciso determinar como essas mensagens existência de outras relações entre os atores envolvidos.
constituem valores sociais reciprocamente construídos.
O nível de reciprocidade, assim, indica a persistência da Fotolog 1 said on 6/30/08 9:45 PM …
conversação em termos da quantidade e do valor das olha la no meu orkut e comenta!
interações, além de também permitir que se compreenda
o capital social envolvido no laço social (Wellman, 1997). No exemplo acima, vemos um turno de uma
Para o estudo do nível de reciprocidade, é preciso conversação em andamento, onde o ator indica ao
verificar o sentido construído pelos atores e sua outro que deve olhar em outro sistema (Orkut) para
percepção das interações que formam a conversação. a continuidade da conversação. Vemos aqui que os
Essa compreensão dá-se pela compreensão dos próprios atores em questão não apenas utilizam o fotolog como
usuários envolvidos nas interações (por exemplo, plataforma de interação, mas igualmente o Orkut e
através de entrevistas com os sujeitos) e pela própria que ambos sabem um o endereço do outro. Tal fato
análise das interações pelo pesquisador. é um indicativo de uma relação que supera o espaço
do fotolog, denotando, portanto, um laço social mais
Ator A: E amanheceu e eu continuo aqui. Daqui a multiplexo. Essa observação auxilia a compreender a
pouco estou indo pra agência de novo. força (Granovetter, 1973) dos laços estabelecidos entre
Ator B: mas que tanto trabalho é esse, tcheam? :-( os atores. Poderia ser também um forte indício da
Ator C: bah :-( existência do chamado capital social de manutenção
Ator A: ah... milhares de coisas.. campanha de verão (Ellison, Steinfield & Lampe, 2007).
2008, dia dos pais, embalagens...20 A partir dos elementos elencados é possível
compreender a força dos laços sociais envolvidos nas
No exemplo acima, vemos uma conversação que interações. A estrutura e o conteúdo da conversação
acontece entre vários atores. A reciprocidade dá-se podem indicar a qualidade do laço social estabelecido
no momento onde os atores respondem ao Ator A e entre os atores, principalmente através da observação
demonstram solidariedade ao fato relatado, como o das variadas conversações. Wellman (2001), por
desejo de boa sorte e as “carinhas” tristes. exemplo, argumenta que a existência de mais de um
A reciprocidade pode ser observada tanto na tipo de relação social auxilia na construção de um laço
conversação síncrona quanto na assíncrona, a partir da multiplexo, o que indicaria a existência de laços mais
fortes entre aqueles atores. Além disso, elementos como para a percepção da estrutura da conversação,
intimidade, apoio social e informação dividida, típicos indicando as relações estabelecidas entre os atores e as
do capital social (Putnam, 2000) e construídos pelo possibilidades de existência de laços sociais entre um
grupo, compreendidos a partir da análise do sentido determinado par de nós. Os aspectos semânticos, por
das interações auxiliam entender a qualidade do laço sua vez, vão contribuir diretamente para a compreensão
que conecta os atores. Esse capital social é uma medida da qualidade da conexão estabelecida entre aqueles
do valor construído entre os atores. Independentemente atores. Embora os aspectos semânticos atuem mais
da forma de análise utilizada, o conceito auxilia na diretamente na interpretação do conteúdo rede, são os
compreensão daquilo que é construído entre os atores da aspectos estruturais que vão salientar a existência das
conversação. Esse capital social pode ser depreendido de conexões e a própria estrutura da rede. Tratam-se, assim,
conversações estabelecidas entre os atores nos diversos de aspectos complementares na percepção das redes
sistemas. sociais emergentes dos sites de redes sociais.
Este trabalho tinha por objetivo, assim, oferecer
Ator E: manda um beijãozããããão pros dois. tou com elementos para que possa ser discutida como a
dó de não poder participar do kerb :-( hehe²¹ conversação pode auxiliar a perceber as redes sociais
no âmbito dessas redesFAMECOS
No exemplo acima, vemos a resposta a um ator que
informou que sua família estava de aniversário. A NOTAS
mensagem informa apoio, felicitações e tristeza de não * Pesquisa financiada pelo CNPq
poder estar na festa. Vemos que a mensagem denota um
capital social de fortalecimento, pois mostra intimidade 1 Uma rede social é definida como um conjunto de
e um laço social multiplexo. A análise dessas interações, dois elementos: atores (pessoas, instituições ou
assim, é capaz de indicar a qualidade do laço social que grupos) e suas conexões (Wasserman & Faust, 1994;
conecta os atores em uma determinada rede. Degenne & Forsé, 1999). Trata-se, assim, de uma
O que defendemos neste trabalho, portanto, é que abordagem focada na estrutura social, onde “os
as conversações entre os atores de um site de rede indivíduos não podem ser isolados independente-
social podem indicar os laços sociais e o capital social mente de suas relações com os outros, ou podem as
negociado nas interações. Essas conversações são díades ser isoladas de suas estruturas de filiação”
capazes, assim, de criar, complexificar e mesmo, destruir (Degenne & Forsé, 1999, p.3). A abordagem de re-
as estruturas sociais estabelecidas no ciberespaço. Mais des sociais passou a ser utilizada para o estudo dos
do que isso, essas conversações comportam grande parte grupos sociais no ciberespaço principalmente com
dos impactos na dinâmica das redes decorrentes desses o trabalho de Wellman (2001, 2003).
sites de redes sociais.
2 <http://www.friendster.com>
Apontamentos finais
Neste trabalho, buscamos primeiramente discutir 3 <http://www.facebook.com>
elementos que indiquem como observar as redes sociais
que emergem das conversações estabelecidas nos sites 4 <http://www.myspace.com>
de redes sociais na Internet. Discutimos que sites de
redes sociais são, hoje, uma categoria abrangente, 5 Weblogs ou blogs são ferramentas de publicação
dentro da qual, propusemos o estudo das conversações na Internet, caracterizadas principalmente pelo seu
como o estudo de seu aspecto mais central, aquele formato de microconteúdo organizado de forma
das redes sociais que dão dinamismo ao sistema, do cronológica, com a possibilidade de que comentários
sistema “vivo”, em oposição às redes sociais estruturais, sejam acrescidos (Blood, 2002). Surgiram em 1999,
marcadas pela ferramenta técnica do próprio sistema. com a popularização do Blogger e tornaram-se
Defendemos, assim, que são as primeiras que se populares principalmente por conta da facilitação
constroem capazes de mostrar a dinâmica desses da publicação que proporcionaram na Internet. Fo-
sites conforme defendido por Boyd & Ellison (2007): ram inicialmente definidos como “diários pessoais”
a manutenção e a complexificação dos grupos sociais. (Lemos, 2002), tendo depois sua aplicação sido am-
A partir de uma discussão sobre como perceber as pliada para outras funções (jornalismo, informações,
conversações mediadas pelo computador e os sites etc.).
de redes sociais, elencamos modos de analisar dois
aspectos considerados relevantes para o estudo dos 6 <http://www.twitter.com>
laços e capital social nas redes sociais modificadas por
esses sistemas: os aspectos semânticos e os aspectos 7 O Twitter e o Plurk são ferramentas que permitem,
estruturais. Os aspectos estruturais, assim, contribuem como os blogs, que as pessoas publiquem textos
curtos (até 140 caracteres) em páginas individuais 17 Os fotologs são sites geralmente constituídos de
na Internet. Essas publicações são visíveis para os um sistema de publicação de imagens que permite
amigos ou seguidores de cada um. Têm sido utili- o acréscimo de um texto (postagem) e comentários,
zadas também para notícias vide Zago (2008). além da rede social pública sob a forma de lista de
“amigos” ou “conhecidos”.
8 Fóruns são ferramentas de discussão na Internet,
normalmente caracterizadas pela postagem de men- 18 Apesar dos blogs terem nascido como sites focados
sagens em um mesmo espaço de discussão. na difusão de links (Blood, 2002), foi a emergência
dos serviços de publicação, como o Blogger.com,
9 Chats são as ferramentas de conversação por ex- em 1997, que deram aos usuários todo um novo
celência da Rede, as chamadas salas de bate-papo. arcabouço de apropriações. Os blogs tornaram-se
ferramentas e, por conta disso, passaram a ser defi-
10 Mensageiros são ferramentas que proporcionam ao nidos com base em sua estrutura (Schmidt, 2007).
usuário mostrar aos demais que está conectado e são
utilizadas principalmente para a conversação entre 19 <http://www.orkut.com>
dois atores. Permitem que um mesmo ator coloque
ali todos os seus amigos e que possa conversar en- 20 Exemplo retirado do Plurk <http://www.plurk.
quanto está na Internet de forma privada ou com com>.
mais de um ator. Como exemplos, temos o MSN, o 21 Exemplo retirado do Plurk <http://www.plurk.
ICQ, o GoogleTalk, e etc. com>.
13 O Internet Relay Chat é um tipo de sistema de con- ______& ELLISON, N. B. Social network sites: Definition,
versação bastante popular nos anos 90 que permitia history, and scholarship. In: Journal of computer-
a criação de canais (salas de bate-papo) e através de mediated communication, Vol 13, nº 1, article 11
mensagens privadas (PVTs). (2007). Disponível em: <http://jcmc.indiana.
edu/vol13/issue1/boyd.ellison.html>. Acesso
14 Mensageiro instantâneo. <http://www.msn.com> 10 jul 2008.
15 A conexão apresentada entre dois atores em uma ______ & HERR, J. Profiles as conversation: Networked
rede social é denominada laço social, de acordo com identity performance on Friendster. In: Proceedings
Wasserman & Faust (1994, p.18). of the 39th Hawai'i international conference on System
sciences, Persistent conversation track. Kauai:
16 O capital social, neste trabalho, é considerado a IEEE Press, 2006.
partir de Putnam (2000, p.19), “refers to connec-
tion among individuals - social networks and the BLOOD, R. The weblog handbook: Practical advice on
norms of reciprocity and trustwothiness that arise creating and maintaining your blog. Cambridge:
from them” . Para o autor o capital social refere-se Perseus Publishing, 2002.
principalmente às conexões e tem como elementos a
reciprocidade e a confiança, constituindo-se em três CRYSTAL, D. Language and the internet. Cambridge:
tipos na Internet: “maintened social capital, bridg- Cambridge University Press, 2001.
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