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oriso da Medusa (1975) Héléne Cixous aldrei da escritura feminina: do que ela fara. E preciso que a mulher se escreva: que a mulher escreva sobre mulher e traga as mulheres a escrita, de onde elas foram tao violentamente distanciadas quanto foram de seus corpos; pelas mesmas razées, pela mesma lei, com a mesma letal finalidade. A mulher precisa se colocar no texto - como no munds, e na historia -, através de seu proprio movimento. O futuro nao pode mais ser determinado pelo passado. Naonego que os efeitos do passado estejam ainda aqui. Mas me recuso a consolida-los, repetindo-os; a lhes conceder um mandato equivalente a um destino; a confundir 0 bioldgico eocultural. A antecipacao se impée como urgente. Como tais reflexées esto caminhando em uma regiao prestes a se descobrir, levam necessariamente a marca do entretempo em que vivemos, aquele em que 0 Novo se desengata do antigo, e, mais exatamente, em que “anova” se separa do antigo. Eis por que, como nao ha um lugar onde assentar um discurso, e sim um solo milenar e arido a ser cindido, o que digo tem ao menos duas faces e duas intencSes: destruir, quebrar; prever 0 imprevisto, projetar. Escrevo isto como mulher para as mulheres. Quando digo “a mulher”, falo da mulher em sua luta inevitavel com o homem clissico; e de uma mulher-sujeito universal, que deve levar as mulheres até sua(s) consciéncia(s) e sua histéria. Mas, antes de tudo, é preciso dizer que, mesmo nos dias de hoje, apesar da enormidade da repressao que as manteve nessa “escuridao” a qual se tenta fazé-las reconhecer como sendo seu atributo, nao ha uma mulher geral, uma mulher tipo. O que elas tém em comum, eu Scanned with CamScanner oa Mas 0 que me surpreende é a infinita riqueza de Singulares constituicdes: nao sé pode falar de uma Sexualidade feminina, uniforme, omogenea, COM Perc Codificdvel, nem tampouco de um inconsciente semelhante, O imaginario das mulheres é inesgotavel, como a musica, a pintura, a escritura: as efusdes fe seus fantasmas sio tei com uma mulher inauditas. Mais de uma vez me encan descrevendo um mundo s6 seu, habitado por ela desde a pequena infancia. Mundo de busca, de elabora¢ao de um saber, a partir de uma expe! jmentagao sistematica dos funcionamentos do corpo, de uma interrogacao precisa e fascinada por sua erogeneidade. Esta Pritca, de uma riqueza inventiva extraordinaria, em Part lara da masturbagao, s¢ prolonga ou € acompanhada le uma producéo de formas, de uma verdadeira atividade estética, ozo inscreve uma visao sonora, mais proibida. em que cada momento de g z e uma composi¢ao, algo belo. A beleza nao sera Portanto, gostaria que ela escrevesse € proclamasse este império unico, para que outras mulheres, outras soberanas nao declaradas, assim se exclamem: eu também transbordo, meus desejos inventaram novos desejos, meu corpo conhece cantos inauditos, quantas vezes eu também me senti repleta ao ponto de explodir torrentes luminosas, de formas muito mais belas do que aquelas que, emolduradas, sao vendidas por qualquer massa fétida. E eu também no disse nada, nao mostrei nada; nao abri a boca, nao pintei novamente minha metade do mundo. Tive vergonha. Tive medo e / engoli minha vergonha e meu medo. Dizia a mim mesma: i estés louca! O que significam esses transbordamentos, inundagées, vaporizagées? Que mulher efervescente € infinita, antes imersa em sua ingenuidade, mantida no obscurantismo e autodesprezo pelo punho parental- conjugal-falogocéntrico, nao teve vergonha de seu poder? Que TN, da: Termo da psicanilise para desi i uma zona erdgena. Herat lesignar a capacidade de uma regido do corpoas*t Scanned with CamScanner mulher, surpresa e aterrorizada pela comogao fantastica de suas puls6es (pois a fizeram acreditar que uma mulher bem comportada, normal, é de uma calma... divina), nao ja foi acusada de ser monstruosa? Que mulher, ao se contorcer de uma vontade estranha (de cantar, de gritar, de proferir, enfim, de expressar coisas novas), nao se imaginou doente? Todavia, sua doenga vergonhosa é que ela resiste 4 morte e _ isso da muito pano pra manga. ~ _ E por que nao escreves? Escreve! A escrita é para ti, tu és para ti, teu corpo é teu, agarra-o. Eu sei por que nao escreveste. (E por que eu mesma nAo escrevi antes de vinte e sete anos.) Porque a escrita é ao mesmo tempo o demasiado 0, o demasiado grande para ti, é reservado aos grandes, ‘seja, aos “grandes-homens”; que “besteira’! Alias, este um pouco, porém as escondidas. Isso nao é bom, ie era escondido, tu te punias por escrever, e nao o fim; ou, ao escrever, irresistivelmente, como nos 10s as escondidas, n&o era para ir mais longe, mas ar um pouco a tensdo, apenas o suficiente para asiado cessasse de atormentar. E, em seguida, amos, nos precipitamos a nos culpabilizar perdoar -; ou a esquecer, a enterrar, até a e e ninguém te segure, que nada te detenha: _nem maquina capitalista imbecil na qual as J itivos astutos e servis dos imperativos a que funciona contra nds e nas nossas iro ae de mulheres, textos com sexos 0 Os agi made: da-lhes medo. Causa e colecdo e patroes not necessario que a 1 mulher 0 homem. Portanto, aqui obliqua em relagao ao ndo sua masculinidade - Perspectives eftias feminists (1970-2010) | 131 e sua feminilidade: isso nos diré respeito quando eles tiverem aberto os olhos para se enxergarem? Elas voltam de longe: de sempre: de “fora”, das terras ‘onde as bruxas se manifestam em vida; debaixo, aquém de sua “cultura”; de suas infiincias que eles tem tanta dificuldade em fazé-las esquecerem, que eles condenam ao in pace. Empa- redadas as meninas dos corpos “mal educados”. Conserva- das, intactas de si mesmas, no gelo. Tornadas frigidas. Mas, como se mexe 14 embaixo!! Quantos esforgos precisam fazer os vigilantes. do sexo, sempre a recomegar, para barrar s seu re- . torno ameacador! De uma parte e de outra, uma tal expansig de forcas que durante séculos a uta imobilizou no equilibria trémulo de um ponto morto. wet Eeis que voltam as que estao sempre chegando: porque 0 inconsciente é inexpugnavel. Elas vagaram em circulo no quarto apertado de ‘bonecas onde foram trancadas; onde tiveram uma educacao descerebrada, criminosa. De fato, é possivel encarcerar, desacelerar, conseguir durante muito tempo o golpe do apartheid, mas apenas por um tempo, Assim que elas comegam a falar, podem ensiné-las, ao mesmo tempo em que 0 nome delas, que a sua regiao é negra: porque és Africa, és negra. Teu continente € negro. 0 negro é perigoso. No escuro, nao vés nada, tens medo. Nao te mexas, pois podes cair. Principalmente nao vas 4 floresta. O horror ao escuro nés o interiorizamos. 2 Eles ainda tém tudo a dizer, os homens, sobre sua sexualidade, e tudo a escrever. Poist maior parte do que enunciaram deriva da oposicio atividade/passividade, da relagio de forca na qual eles fantasiam uma virilidade obrigatoria, invasora, colonizadora, a mulhet sendo, entdo, fantasiada como “continente negro” a ser penetrada e “pacificada” (sbe- © que pacificar quer dizer como escotomizacio do outro e desconhecimento de si). 9 conquistar, logo se afastam das bordas, perdem-se de vista e de corpo. A maneifs © homem tem de sair de si mesmo, naquela que ele toma nao como 0 outto, mas 8 sendo sua, o prva, ele o sabe, de seu proprio territério corporal. Ao se confundircons pénis e partir para o ataque, é compreensivel que ele tenha ressentimento © et __“pego” pela mulher, de se perder nela, de ser absorvido, ou 86. 132 | lzabel Brando | ldney Cavalcanti | Cleudia de Lima Costa | Ana Cecfia Acioli Lime Contra as mulheres, eles ¢o, levaram-nas, insidiosamente, oa ee One mulheres, aserem suas répriag = entamente, jmenso poder contra elas mesm; 'Migas, da sua tarefa viril. AS, a sey 8 execu Fizeram-lhes um. antinarcisism, , tantes se quer apenas Para se fazer amar poly vot PAtCsismo que fabricaram a légica infame do antiame Qe Nao se tem! Eles, Nés, as precoces, nds, a belas bocas amordacadas, interrompidos, nés, isoteados; as roubadas? Negras" Tempestuosas, o que é nosso Bras” e somos belas, que temamos nos enfraquecer: nosso: sorrisos escapam, 0s risos de todas as Nossas bocas, ni sangues escoam ends nos propagamos sem nos esgot: — nossos pensamentos, nossos signos, nossos Se no os retemos e nem tememos que nos faltatio. Felicidade Para nos, omissas, afastadas da cena das herangas, NOs nos inspiramos e nos expiramos sem falta de ar, estamos em toda parte! Nés, as recém-chegadas de sempre, se dizemos a partir de agora, quem poderia nos interditar? E tempo de libertar a Nova da Antiga, conhecendo-a, gostando que ela se saia bem; tempo de ultrapassar a Antiga sem atraso, indo na frente do que a Nova sera, como a flecha deixa a corda, de uma s6 vez, juntando e separando as ondas musicalmente, a fim de ser mais do que ela mesma.) Digo que é preciso: visto que nunca houve, sé algumas excegdes, uma escrita que inscrevesse feminilidade. Tao raras que nao se pode, percorrendo a literatura ao longo do tempo, linguas e culturas, voltar apenas amedrontada desta quase va derrota: sabe-se que o numero de mulheres : Qrbitran (onde furman tide rues pou Veta AB Maule: X\ *'N. da: No original, “les voldes”. A autora joga aqui com a duplicidade do ‘ere 6 francis, que tanto pode significar “as roubadas” (participio passado do verbo “coler” no feminino plural), quanto designar “os voos", “0s arremessos" sevsn eta ints 1970-2010) | 133 Scanned with CamScanner ZeustSeh ct, século xX) sempre foi irrelevante. aa ore . iusérig desta espécie de escritoras nao se sul aaa ‘amen S a imensa maioria cuja feitura nao S¢ “ eu = Nad da escrita masculina, em que a mulher Gate oon ta, e que se reproduzam as representagoes Cia a mulhe, ivel-intuiti etc.).4 (sensivel-intuitiva-sonhadora : vend : Abro aqui um paréntese: estou di 0 escriturs masculina. Sustento, sem equivoco, que existem escritura, bem caracteristicas; que a escritura tem sido, até o momento, repressora, de maneira bem mais acentuada do que se Possa suspeitar, ou confessar, gerada por uma economia libidinay e cultural - portanto politica, tipicamente masculina ~, yp, lugar em que se reproduz mais ou menos conscientemente, e de maneira temivel, pois frequentemente ocultada, adornada com os charmes mistificadores da ficc&o, a repressao da mulher; um lugar que zombou grosseiramente de todos os signos da oposi¢ao sexual (e nao da diferenca) e em que a mulher nunca teve seu discurso. Isto & tao grave e imperdodvel que justamente a escritura é a propria possibilidade da mudanca, 0 espago de onde pode se lancar um pensamento subversivo, o movimento precursor de uma transformacao das estruturas sociais e culturais, 8 hz Entio quaissio 0s escritos dos quais poder lizer que slo “femininos’ 0 leria se d “femini 2 op Bt i 134 1 tet Roense+ 2 Scanned with CamScanner Salvo excegées, pois eu (eu-mulher, Sobrevivent Zo , na enorme Maquina que roda @ ro sitatla escrevendo — séculos, houve Poetas que a gual ce © sua “verdade ha algo de heterogéneo 4 tradiggo home Preco transmitiram oamor; de amar entao os outros de ae capazes de amar a mulher que Tesistiria ao esmagamenin no de pensar em um sujeito espléndido, igual 1 ya Se, Constituiria insustentavel no quadro social a aac entio, 36 pode desejé-la ao quebrar og cé< mulher ai, o poeta Ss codigos qu i le a ne; aparecimento levando, necessariamentc seni gam. Seu u ao a uma SSS eee que o baluarte era imutavel —, pelo ed explosies. As vezes, aids, éna fi que acontece um terremoto, na ocasiao aa ura radical das coisas por uma virada material, aaa as estruturas sao por um momento desorientadas, e fa uma efémera selvageria varre a ordem, que o poeta, por um breve entretempo, transmite algo de mulher: assim fez Kleist, a ponto de morrer por querer que vivam as irmas- amantes, filhas-maternais, maes-irmas que nunca baixaram a cabeca. Diante disto, uma vez os palacios de magistratura reerguidos, tem que se pagar: imediata e sangrenta execuga0 daqueles elementos incontrolaveis. Somente os poetas, ndo os romancistas solidarios da representacao. Os poetas porque a poesia é apenas 0 fortificar-se no inconsciente e o inconsciente, o outro campo ‘sem limites, é o lugar onde sobrevivem os recalcados: as mulheres ou, como diria Hoffmann, as fadas. =r preciso que ela se escreva, porque é a invengao de uma escrita nova, insurgente que, no chegado momento de sua liberagéo, Ihe permitird efetuar as rupturas € as transformagdes indispensaveis em sua historia, primeiramente em dois niveis inseparaveis: ; (@) individualmente: ao se escrever, a mulher fara voltar aquele corpo que lhe confiscaram, 0 qual tornaram um estranho em seu ninho, 0 doente ou © morto, e que uve falh; as — fe) ng Sem as quais tentnten trormconnon | 195, Scanned with CamScanner nheiro, causa e Jy, mente ¢ ° mau compar nsura-se, ao mest to frequentement rat 0 COFPOr : das inibigoes. 1 étego, a fala. teu tempo, 0 félego 218" gue : " Pecrove-te! ép a sas riquezas do inconscienie Assim, irao jorrar oF res ouro ou negro, espalhara sobre Nossa nafta, sem dla ados que mudarao as Tegras dq Et ti o mundo valores nao col velho jogo- - Escrever a sexualidade, com sey da mulher com ae des-censurada da do-lhe 0 acesso a suas Préprias ist bens, seus prazeres, seus ser-mulher, devol cae frgas: que Ine devo ios corporais mantidos sob Srgaos, seus Trvncaré da estrutura superegocentrada® na roe vam sempre 0 mesmo lugar de culpada a “a ee todas as vezes: de ter desejos, de nio ne 5 fri ida, de ser “quente” demais; de nao ser os oe mesmo de ser demasiadamente mae ou is ao mesmo tempo; a es © suficiente; de ter filhos e de nao ter; de amamentar e de ndo amamentar...) por esse trabalho de pesquisa, de anélise, de iluminagao, essa maravilhosa liberagao do texto dela mesma que ela deve urgentemente aprender a falar. Uma mulher sem corpo, muda, cega néo pode ser uma boa combatente. Ela é reduzida a ser a serva do militante, sua sombra. E preciso matar a falsa mulher que impede a viva de respirar. Inscrever 0 alento da mulher inteira; b) ato também que marcaré a Tomada da Palavra pela mulher, portanto, sua estrondosa entrada na Historia que sempre se constituiu em sua supressdo. Escrever para forjar a arma antilogos. Para se tornar, enfim, parte interessada e iniciadora de acordo com sua vontade, para seu direito, em todo amma simbélico, em todo processo politico. eons Jempo de a mulher deixar suas Marcas na lingua corpo se faca entende, “realizara” a relacig (2 Em francés, “surmoisée”, Trata-se do adjetivo de ‘superego. Scanned with CamScanner Toda mulher Conhecey 9 ton ral, 0 coracio batende ae ae da chegada da fala paca as ae ol apm Vous ape eo De eS eres de tanto que falar 6 para a mulher aa Buaseesquivando, -,em publico, uma temeridade, uma tra ene Sto, pale mesmo se ela tranggride ‘ANsgressaio, Dupla eerste masculise Sua fala cai quase Goeaince masculine ” We 86 escuta na lingua E escrevendo, de e desafio do discurso cae ey ‘ ene ‘ eee ee x oe a mulher ira foi reservado, em e pelo simbo 19, OU sej a ae - ela saia do siléncio aprisionador, Que nao deen oes aceitando por dominio amargem ou o harem. means Escuta falar uma indo perdeu dolorosamen € 0 félego} ela nao ‘Tanca no ar seu corpo trémulo, e se “solta” ‘ia (se ela fala”, ela “ogi * Sua carne fala a verdade. Ela se expoe. De fato, ela materializa carnalme: Z nte © que pensa significa com seu corpo. De certa forma, ela inscreve -o-que diz, porque nio Tejeita seu lado indisciplinavel e apaixonado pela fala, provocado pela pulsao. Seu discurso, mesmo “tedrico” ou politico, nao é nunca simples ou linear, ou_“objetivado”, Seneralizado: ela insere na historia sua histori: Nao ha aquele corte, aquela divisio que o homem comum estabelece entrea légica do discurso orale aldgicado texto, tao tensa pela antiga relacdo escravizante, calculista, de dominio. Dai 0 discurso mesquinho, a contragosto, que apenas envolve a parte menor do corpo e, ainda assim, a mascara. Tanto na fala quanto na escritura feminina nunca para de ressoar 0 que, tendo um dia nos atravessado, tocado imperceptivelmente, profundamente, guarda o poder de Nos afetar: a canta a nrimeira miisica. aduela da primeira fed Tuultin Puro Vive, Weg AL como | quar Scanned with CamScanner % \ 4 “wt, que toda mulher preserva viva. FOr qua telacdo Privilepiade com a voz? Porque nenhuma mute acumula tantas defesas antipulsionals quanto um h em jo te Sustentas, nao constrdis como ele, ae afastas tig “prudentemente” do prazer. Mesmo se a mistcagio fl; Contaminou geralmente as boas relagoes, er ny est longe da “mae” (que enten a “mae” como nao nome e CO Persiste nela pelo menos um pouco (Ela escreve com tinta branca: Un, do como sem nenhum Papet mo fonte de bens), i do bom leite de Mig et Mulher para mulheres: na mulher ae se mantén a forga produtora do outro, Papa ape | Mulher, Nela, matricial, acalentadora-doadora, ela mesma sua meg sua filha, ela mesma sua filha-irma. Dizes-me: e aquela que éahistérica prole de uma mae ma? Tudo mudaré, quando q mulher der a mulher a outra mulher. Nela, latente, Sempre pronta, ha fonte; e lugar para a outra. A mde também éuma metafora: é necessario e suficiente que o melhor de si mesma seja dado & mulher por outra mulher para que ela possa se amar e retribuir em amor 0 corpo em que “nasceu”, Tu, viva e sem nome, se quiseres, toca-me, acaricia-me, dé-mea mim, como eu mesma. A relacao com a “mae”, assim como arelacao com a infancia (a crianca que ela foi, que ela é, que ela faz, refaz, desfaz, no lugar onde ela mesma se faz outra), enquanto prazeres intensos e violéncias, nao se rompe. Texto, meu corpo: atravessado Por fluxos cantantes; escuta- me, nao éuma “mae” grudenta, envolvente; é, tocando-te, a equivoz que te atinge, te leva do teu seio até chegar na fnguagem, que lanca tua forca; é o ritmo que te sort; 0 aa oe que torna Possiveis e desejaveis todas do que deus, a ana (corpo? panes gna pag deseritivel fe espacie Fe re ouo Outro; a parte de ti que te entra, #4 escrever na lingua teu estilo de mulher. AAR be Scanned with CamScanner ; mulher algo da ma sempre na ler algo da mae que . ¢ resiste & separacao, que conforta e alimenta, uma forga que na ras nao se deixa cortar, ‘mas sufoca 0s codigos. Re-pensaremos a mulher a partir de todas as formas e todos os tem; i 10s di a jin os lebram as americas ou sn es a mulher, nao facas Oqueelestefizeram. Porque sua “economia” pulsional é prodiga, ela nao de, ao tomar a palavra, deixar de transformar direta e jndiretamente todos os sistemas de trocas fundados sobre a economia masculina. Sua libido produzird efeitos de mudanga politica e social muito mais radicais do que se quer imaginar. Comosempre, ela chega, viva;estamosnoiniciodeuma nova historia, ou melhor, de um futuro com varias histérias entrecruzando-se umas nas outras. Enquanto sujeita & histéria, a mulher acontece sempre simultaneamente em varios lugares. Ela des-pensa® a histéria unificadora, ordenadora, que homogeneiza e canaliza as forgas, levando contradicdes para um sé campo de batalha. Na mulher recorta-se a historia de todas as mulheres, sua histéria pessoal, a historia nacional e internacional. Como combatente, a mulher faz corpo com todas as liberacées. Ela deve ver longe. Nao passo a passo. Ela prevé que sua liberagéo fara mais do que 2 modificar as relagdes de forga ou do que lancar a bola no outro campo provocaré uma “mutacao da: do pensamento, de todas - as; , da luta de classes, que ela impulsiona a um movimento mais vasto. Nao que para ser uma mulher-em-luta(s) seja preciso sair da luta de classes ou nega-la; mas é preciso abri-la, rompé-la, empurra-la, enché-la da luta fundamental, a fim de impedir que a luta de classes, ou qualquer, outra luta de libertagao de uma classe ou dé tim povo, funcione como instAncia repressora, ae a8 prati eo . N. da T: No original, “dé-pense”. Trata-se de um neologismo formado pelo verbo penser", portanto, em portugués, “des-pensar”, mas também pelo “depenser” que ‘Significa “dispensar”. Scanned with CamScanner a finda! inevitavel, da altera,; ue sirva de pretexto para diferir 4 eaetdel prodicas fd “Perturbadora das relacées de fors sta ai: nos EUA individualidades. Esta alterasa0 J? O tevando a fami, exemplo, onde milhdes de ignaros sviabilidade american, a pular fora e a desintegrar to“ ree sonho, mas ultrapase, - Anova nee ee por isso: ela vai priyg. tos de rast peda conceitual e comega arruinando sy, IS sua 0! maquina de iscas. F ma pratica feminina da Impossivel_de_@7e sue se manterd_por nig escrifura, uma imy vicar tal pratica, fecha-la,, codifica-Ja se poder ane e ela nao exista. Mas ela excederg © que néo signi a a rege o sistema falocéntrico; ela tem sempre 0 areas a territérios subordinados a dominagig eters es rica. Ela s6 se deixard pensar pelos sujeitos los6! $s automatismos, 0S corredores da orla que e rompem 0: ‘ no sao subjugados por nenhuma autoridade. ee Dai anecessidade de afirmar os adejos dessa escritura, de informar suas passagens, as vias proximas e longinquas. Comegando por lembrar: 1) que a oposicao sexual que sempre foi feita em proveito do homem, ao ponto de reduzir a escritura também a suas leis, é apenas um limite histérico- cultural. Ha agorae havera, cada vez mais fortee rapida, uma ficgéo que produzird efeitos de feminilidade irredutiveis; 2) que € por desconhecimento que a maior parte dos leitores, criticos, escritores dos dois sexos hesitam em admitir ou negam realmente a possibilidade ou a pertinéncia de uma com fregutinie Se aera masculina. Dir-se-4, 4 » cescartando a diferenca sexual: que toda sscntura, na medida em que ela a arece, é feminina: e a esctitaéoequivalenteaumam, Pa s rece, € feminina; ¢ Bee s ‘asturbacao masculina (assim, N.daT:No, original, “taunee” Scanned with CamScanner a mulher que escreve adquire y; ee m pénis d wie jue a escritura é bissexual, Portanto, a pape ou, ainda, diferenciacao. Admitir que Se ‘a, expulsando a ‘ justamente trabalh (no) entre, interrogar 0 proce: : es (oe) emfaal nada vive, roresso do mesmo e do outro destazer o mo trabalho da morte, é primeiramente querer os dois, e os dois juntos, 0 eae de um e outro nao congelado nas sequéncias de luta e d expulsao ou outta via para a morte, mas acon = infinito por uma incessante troca de um e outro a ito deferente, conhecendo-se e Tecomegando-se apenas Ei das bordas vivas do outro: percurso roulette se aes aberto a milhares de encontros e transformagées do ae no outro e no entre, de onde a mulher toma suas formas (e ohomem, por sua vez; mas é sua outra histéria). Eu precisei: “bissexual, portanto, neutro”, referindo- se a concepsao classica da bissexualidade que, curvada pelo signo do medo da castragao, com ajuda do fantasma de um. ser “total” (mas feito de duas metades), quer escamotear a diferenca sentida como operagao de perda, como marca de temivel cisao. A esta bissexualidade amalgamada, apagadora, que pretende conjurar a castracao (0 escritor que anuncia: aqui se escreve bissexual, podem apostar, vocés vao ver que nao se trata nem de um nem de outro), eu oponho a outra bissexualidade, aquela na qual cada sujeito nao fechado no falso teatro da representagao falocéntrica institui seu universo erético. Bissexualidade quer dizer ter sua propria referéncia, individualmente, insistente ¢ diferentemente manifesta em cada um e em cada uma, da presenca de ambos os sexos, a nao exclusao da diferenca ou de um sexo, e,a partir desta “permissao” que é dada, multiplicagao dos efeitos de inscricao do desejo em todas as partes de meu corpo e do outro corpo. Por razoes histérico-culturais, é possivel que: atualmente, nessa bissexualidade em transes - que nao anula as diferengagg mas) megs urmer 98 PESENS . ‘RADUGOES OA ARTUR Pepsi ris tas 19702010) \141 acrescenta - seja a mulher qu‘ e se beneficiando dela: de Ee bisexual”. Nao é se ra re sca mOnOsse i sradoparaconq' i Bo tae afer o primado ag pe falocratica, a pratica a ideologia faloc como mulher, eu fiquei en’ cetro, enquanto me diziam: 4 ameacas. Mas, 20 mesmo tempo, meee esse grotesco @ pode-se imaginar, pouco invejavel d de ser reduzido a um tinico idolo com colhées de como observa Freud e seus seguidores, de ter tanto m de ser uma mulher! Pois, se 4 psicandlise se consti partir da mulher e ao recalcar a feminilidade da se: masculina (recalque este nao bem-sucedido, homens claramente o demonstram), sua explicagado, dificilmente refutavel; como todas as ciéncias “hum ela reproduz o masculino, do qual é um dos efeitos. Aqui, encontramos o inevitavel homem-d erguido soberbamente em seu velho campo de forma tal que, levando-o para 0 que a eee como “novo”, Lacan o conserva no > Phallus “ao abrigo” da falta de castragéo! Seu ae tem o poder; nés, as semeadoras da ‘da nossi ‘0s muito bem. Mas nada nos obriga Hossas vidas em seus bancos da falta; a id lo sujeito em termos de dein ¥ eee COI coberta pela grande son dore-0, aquele que | reservou-se a0 que era negro demais m fazer acreditar sublagao falogocéntrica est4 dos velhos esquemas, Eles nao mudaram realidade! Que tre nossas sextas!® Azar ° deles Se se aniquilam ao descobrir que as mulheres nao sao homens, ou que a mae nao tem. Mas sera que esse medo nao lhes convém? O Ppior nao seria, nao é, realmente, se a mulher nio fosse castrada, que sé Earn nao escutar mais as sereias (pois as sereias eram homens) para que a historia mudasse de sentido? Basta olharmos a Medusa de frente para vé-la: e ela nao é mortal. Ela é bela eri. ae e © € militante, reprodutora ai los no dogma da castracdo. nada: teorizaram seus desejos para a ‘Mam os padres, vamos mostrar-lhes Eles falam que ha duas coisas irrepresentaveis: a morte e o sexo feminino. Eles tém necessidade de que a feminilidade seja associada a morte; eles se excitam de medo! Para eles mesmos! Eles tém necessidade de ter medo de nds. Olha os Perseus, tremendo, avancgarem até nds, carreados de apotropeus, recuando! Belas costas! Nenhum minuto a perder. Saiamos. Apressemo-nos: 0 continente nao é de um negro impenetravel. Estive frequentemente ali. Um dia encontrei 14 com alegria Jean Genet. Foi em Pompas finebres: ele conseguiu, levado por seu Joao. Ha homens (tao poucos) que nao tém medo da feminilidade.’ Sobre feminilidade as mulheres tém quase tudo a escrever: de sua sexualidade, quer dizer, sobre a infinita e TN daT- A sexta hora desde onascer do sol, aproximadamente leet Naliturgia cat6lica, corresponde a uma das horas do oficio (entre a terga € . * Cf. Jean Genet (1953, p: 185-186). {TRADUGHES DA CULTURA - Perspectives eicas femiitas cag70-2010 | 143 mével complexidade, sua erotizacao, ignigdes fulgurantes de tal infima-imensa regiao de seus corpos, nao sobre © destino, mas sobre a aventura de tal pulsao, viagens, travessias, rastreamentos, bruscos e lentos despertares, descobertas de uma zona outrora timida daqui a pouco emergente. O corpo da mulher, aos mil e um lares de ardor, quando ~ destruindo os jugos e censuras — ela o deixara articular a abundancia das significagdes que em todos os sentidos o percorre; com bem mais de uma lingua ele vai reverberar a velha lingua materna de um s6 sulco. Nés nos desviamos de nossos corpos, os quais vergonhosamente nos ensinaram a ignorar, a bater com o bestial pudor; aplicaram-nos 0 golpe do mercado de pobres ingénuas: cada um amard 0 outro sexo. Eu te darei teu corpo e tu me dards o meu. Mas quem sao os homens que dao as mulheres os corpos que elas lhes entregam cegamente? Por que tao poucos textos? Porque bem poucas mulheres ainda recuperam seus corpos. E preciso que a mulher escreva pelo seu corpo, que invente a lingua inexpugnavel que rompe as clausuras, classes e retéricas, receitas e cddigos; que ela submerja, libere o “discurso-de-reserva” Ultimo, incluindo aquele que sorri por ter que dizer a palavra “siléncio”, aquele que, visando ao impossivel, fica parado diante da palavra “impossivel” e a escreve como “fim”. Eis a poténcia feminina, levando embora a sintaxe, rompendo esse famoso fio (apenas um fiozinho, dizem) que serve aos homens como substituto de cordao, sem o que eles nao gozam, para assegurd-los de que a velha mae sempre estara atras deles, a olha-los fazer falo, elas iro ao impossivel. wee “O Recalcado” de sua cultura e de sua sociedade ao voltar, é de um retorno explosivo, absolutamente arruinadoy arrebatador, de uma forca nunca liberada, na Proporeaig "144 | tbe reno | trey Coen | Ct ge ime Canta | Ae ce ina x LE e aig : 5 i & i : i SS or fees EASE da mais formidavel das repressGes: pois, no término da época do Falo, as mulheres estarao ou aniquiladas ou seri: erguidas 4 mais alta e violenta incandescéncia. Ao longo iG sua silenciada historia, elas viveram em sonhos, em corpos, mas calados, em siléncios, em revoltas afénicas. : E com que forga em sua fragilidade: “fragilidade” yulnerabilidade, na proporcao de sua incompardvel jntensidade. Elas nao sublimaram. Felizmente: elas salvaram sua pele, sua energia. Elas nao se empenharam em organizar 0 impasse das vidas sem futuro. Furiosamente, moraram naqueles corpos suntuosos: admiraveis histéricas que propiciaram a Freud tantos voluptuosos e vergonhosos momentos, bombardeando a estdtua mosaico de suas carnais e apaixonadas “palavras-de-corpo”, obsedando-o com suas inaudiveis e fulminantes denunciagdes, mais que nuas sob os sete véus dos pudores, deslumbrantes. Aquelas que, com uma unica palavra do corpo, escreveram a imensa vertigem de uma histéria expulsada como uma flecha de toda a histéria dos homens, da sociedade biblico- capitalista, sao as mulheres, as torturadas de ontem, que chegam como precursoras das novas mulheres, depois das uais nenhuma relagao intersubjetiva podera ser a mesma. Es tu, Dora, indomavel, 0 corpo pottico, a verdadeira “dona” do Significante. Tua eficiéncia, trabalhando antes de amanhi, quando tua palavra nao conseguira mais entrar, aponta voltada para teu seio, mas se inscrevera ao encontro da outra. Em corpo: mais que o homem, convidado as conquistas sociais, a sublimacao, as mulheres séo corpo. Quanto mais corpo, entao, mais escritura. Durante muito tempo, era EL corpo que ela respondia as intimidag6es, a empresa familiar-conjugal de domesticagao, as repetidas tentativas de castrd-la. Aquela que revirou dez mil vezes sete vezes we PAREN y ariciat » mattresse’, cuia polissemt ey Signific. iginal, “maitresse”, cuja polissemia do termo é abrangente, podendo ' dona, professora, amante. w-eaormonim | 145 , x ela esti Sua lingua na boca antes para nao ee 3 jae aa , ou ela conhece mais sua lingua € eae rompimento age Agora eu-mulher vou explodir Be jogo, em sua lingua ra Possivel e inevitavel; e que $64 eae armadilha por un Nao nos deixemos cait cnatismos: cer rtamente sli dos antigos aren p ; Tinguceer ae eaconde um oponente Hee a é em Ati amatica. les a lingua dos homens e sua oa ja mais deles do que 0 que permitir um tinico lugar qe es nao desejamos que s¢j@ Laan Bae 1 “dentro” do discursy 1m, 5 naar Se a mulher me sempre referido ao significante do homem, sign ou asfixia Os sons iqui ia especifica, ue aniquila a energia Bi 8 ere: tempo de desmontar esse dentro”; que ie dele, que o fa o exploda, 0 devolva, se aproprle dele, q ca seu, ando-o na sua boca, €, que, com os ea ge awe e ela invente uma lingua orda a lingua, qu g oon d Sear verds com que facilidade ela poderé, a : lenta, estava agachada ~ para as de onde, sonol i “dentro”, de onde, Part 2° -, transbordar de suas espumas. ra jorrar dos labios i a ‘Nao se trata de se apropriar dos instrumentos deles, seusconceitos, seus lugares, nem de desejar-lhes sua Posicao de identificagéo nao de controle. Saber que ha um risco de ide c f significa que sucumbiremos. Deixe aos inquietos, 4 angustia masculina e 4 sua obstinada relacao com 0 funcionamento da dominagao o saber “como isso funciona” a fim de “nao fazé-lo funcionar”. Nao apreender para interiorizar, ou manipular, mas atravessar em linha reta, e “voar”. Todas. nés aprendemos a arte do furto/voo e suas varias técnicas, ha séculos s6 temos furt-vo-ando;" ha séculos temos vivido em um furto-voo, furt-vo-ando, encontrando, quando desejado, passagens_estreitas, _escondidas, transversais. Nao é por acaso que “furt-vo-ar” se define "" N, da T: Criamos 0 neologismo com a fusio dos verbos furtar e voar na busca de Scanned with CamScanner entre dois voos, gozando de um e do outro, e desviando os agentes do sentido. Nao é Por acaso que a mulher esté para © passaro e para o ladrao assim como o ladrao esta para a mulher e o péssaro: eleas'? passam, eleas desabalam, eleas gozam proveito ao borrar a ordem do espago, ao desorienté-lo, a0 mudar os méveis de lugar, as coisas, os valores, quebrando, res, que esvaziando as estruturas, virando o que € préprio de cabeca Para baixo. Que mulher nunca furt-vo-ou? Quem nunca sentiu, sonhou, adquiriu o gesto que entravaa sociabilidade? Quem. nao borrou, zombou da barra de separacao, inscrevendo com seu corpo o diferencial? Quem nao perfurou o sistema dos casais e OposigGes e nao fez desmoronar, por ato transgressor, 0 sucessivo, o encadeado, o muro da circunfuséo? Um texto feminino nao pode deixar de ser mais do que subversivo; se ele se escreve, é levantando, vulcanicamente, a velha crosta imobilizante, que carrega investimentos masculinos, e nao de outra forma; nao ha lugar para ela se elanado é um ele? Se ela é ela-ela, 06 para destruir tudo, para despedacar os fundamentos das instituicgdes, para jogar a lei para o alto, para entortar a “verdade” de tanto rir. Porque, ao tragar sua via no simbdlico, ela nao consegue deixar de fazer disso o cosmos do “pessoal”, de seus pronomes, de seus nomes e de sua carga de referentes. E, por conseguinte, aconteceu essa longa histéria de genocidio; como bem sabem os colonizados de ontem, os trabalhadores, os povos, as espécies das quais a Historia masculina tirou sua fortuna, aqueles que conheceram a ignominia da perseguicao e dela retiram um futuro e obstinado desejo de grandeza; os prisioneiros conhecem melhor do que seus carcereiros 0 gosto do ar livre. Gragas a histéria delas, as mulheres sabem (fazer e querer) hoje o que os homens sé saberao pensar muito mais tarde: estou = ® N. da T.: Em francés illes = jungdo de ils(eles) e elles(elas). TRADUCUES DA CULTURA - Perspectives crticas fominstan 11a7m.onam 1 407 Scanned with CamScanner pessoal”; COMO, Pela Jo; tura 0 “PC dematia ee dizendo que ela desestr™ amen o sempre extorduiram g. ens, C4 oem ue extorquiram Sey entiras, 3 a direitos, 20 I atO ‘fa alienacao mortal ela pq, nome, no proprl be jdade do “proprio”, a mesquinhe, ver de mais pe pole gubjetiva masculina-conjugal redutora da eoente! or um. Jado, ela se constitujy ual resiste dup nesta “ pessoa”, capaz de perder uma te der. Mas, secretamente se per seu foro intimo, ela se estende e go or outro lado, consegue sobreviver a jsso, tanto na relagao entre 4 economia & pulsao quanto na gestao do eu, de modo muito mais duradouro do que qualquer homem. Diferentemente do homem que se agarra zo seu titulo, aos seus titulos, a bolsa de valores, cabeca, coroa e tudo o que é do seu chefe, a mulher zomba muito do medo da decapitacao (ou castragao), aventurando-se sem o tremor masculino do anonimato com o qual ela lida sem se aniquilar: porque ela é doadora. Muito terei a dizer acerca da enganosa problematica do dom. £ claro que a mulher nao é essa mulher sonhada por Nietzsche, que s6 dé para (dar). Quem pode pensar 0 dom como “dom-que-toma” sendo justamente o homem que quer tomar tudo? Se ha algo “proprio” da mulher, é 2 , € paradoxalmente sua capacidade de se des-apropriar sem calculo: corpos sem fim, sem “pedaco”, sem “ ” principai 7 , sem “partes” principais; se ela é um todo, é um todo composto de Ao to simples objetos se to de Partes que s&o todos, nao _ da, ilimitado © , Mas conjunto que se move, que ime smo que Eros percorre sem repouso, imenso espaco astral nao organizad 1 mmais-astro” do que os outros lo em torno de um sol Isto nfo qui * ” indiferenciado, Loa oe que ela seja um magma ou seu desejo. Que 4 ‘e ela nao monarquiza seu corpo tomo do pénis, pan xualidade masculina gravita em lo esse corpo (anatomia politica) 1 48 | kt | Cs etmencne = = | arte de 5) silenciosamente, G multiplica, porquer Pi Scanned with CamScanner eoeace oe aditadura das Partes.J4amulhernaoopera ‘@ essa regionalizacao e1 i * '™M proveito do casal cabega-sexo, que s6 se inscreve no interior de fronteiras. 2 a tinuar sem nunca inscrever ou liscernir contornos, ousando essas travessias vertiginosas do outro, efémeras © apaixonadas jornadas nele, nelas, neles, que ela habita no tempo de contemplé-los o mais perto de seu inconsciente, desde o seu levantar; de am4-los o mais perto da pulsio, c € em seguida o mais longe; toda impregnada dessas bracadeiras identificatérias ela vai, e passa ao infinito. Ela sé quer conhecer por dentro aquilo do qual ela, excluida, nao cessou de ouvir a ressonancia da pré- linguagem. Ela deixou falar a outra lingua em mil linguas, nao conhece nem o muro nem a morte. Pela vida, ela nada recusa. Sua linguagem no contém, ela traz, nao retém, torna possivel. La onde isso se enuncia, incomoda, rejubila- se por ser varios, ela nao se defende contra as desconhecidas que se surpreendem por perceber ser, gozando do seu dom de alterabilidade. Eu sou Carne espacosa cantante, & qual. acrescento n&o se sabe qual eu mais ou menos humano, mas, primeiramente, vivo por estar em transformagao. Escreve! e teu texto procurando-se se conhece mais que carne e sangue, massa modelando-se, crescendo, de maneira insurrecional com ingredientes sonoros, perfumados, combinag&o movimentada de cores voadoras, folhagens e rios se jogando no mar que nés alimentamos. Ah! eis ai seu mar, ele me dira, o outro que me estende sua bacia cheia de 4gua da maezinha falica, da qual ele nao consegue se separar. Mas vé, nossos mares sao aqueles que fazemos, cheios de peixes ou nao, opacos ou transparentes, vermelhos ou negros, altos ou rasos, estreitos ou sem orlas, e “nés-mesmas” somos mar, areia, corais, algas, praias, marés, nadadoras, criancas, ondas. Mais ou menos de forma vaga, mar, terra, céu, que Matéria nos repeliria? Sabemos, todas, fala-los. ‘TRADUCES DA CULTURA - Perspectives crtices feministas (17n.on1m | 414, Scanned with CamScanner ¥ - ynforme seu alegre int Heterogénea, a deus heterogeneidage® ela é erogena, € 4 eee a nadadora aérea, a Voada” 6a si propria sncertante, desejosa e cay... Dispersavel, pr sera, de ser outra mulhe;, ser outra, outra mu st nao é, dele, de ti- i a8 3 medo de outros espacos, Nem Mulher, nao eee lingua, meus ouvidos, do mesmo. Meus olhos, inha boca, Meu COrpo = para — ( iz, minha pele, mi ") nariz, mi eu 0 queira para encher um buraco, Para outro, nao que defeito meu, ou fatalmente moldada Pela evitar qualquer nee e eu esteja condenada & cade: “inveja” feminina; nao qui Sia das substituigoes que leva os substitutos a ocuparem 4 objeto. Isso pode ocorrer com relacao aos contos do Pequeng Polegar que nos sussurravam as avOs Ogras servidoras de seus filhos paternos. Que eles acreditem, que eles necessidade de fazerem caso de si proprios, de acreditarem que nés morremos de vontade, de acreditarem que somos esse buraco cheio de vontade de seu pénis; isto é um antigo caso imemorial. Inegavelmente (nds 0 percebemos a nossa custa — Ineg: Pp mas também para a nossa diversao) — isso é Para nos fazer saber que eles estao excitados para que nds Ihes asseguremos (nds, maternais patroas de seu significante de bolso) que eles estao realmente assim, que eles continuam tendo que os homens 50 se estruturam emplumando-se. Na crianga, nao éo pénis que a mulher deseja, nao é ‘ set Seja, Nao 6 o famoso Pedago em torno do qual gravita todo o homem, A gestac3o nao é i salvo nos limites histéricos d, s ey ee essas substituicdes mecani a A280, 7 latices : uma eterna “invejosa” tg cas de que o inconsciente de Taras ie ma 0 lugar, nem ao Penisneid, 7 2° harcisismo, nem a uma hi : a mae-sempre-ai”. Fazer 4 a omossexualidade ligada 'm filho nao leva a mulher, nem que mai odiga, desco! her que 150 | ate ran. Ss o homem, a entrar inelutavelmente nos esquemas, nem a reeditar 0 circuito da reprodugio. Se risco houver, nao ha armadilha inevitavel: que no venha pesar sobre a mulher, sob o pretexto de tomada de consciéncia, um suplemento de interdigGes. Se queres ou nado uma gravidez, é problema teu. Que nada te ameace; que ao medo de seres apanhada lo tempo passado n§o te suceda o medo ao satisfazer teu desejo de tornar-te cimplice de uma socialidade. E tu, 6 homem, vais também, desculpando-te junto a todos por tua cegueira e passividade, temendo fazer do filho um pai, e que, portanto, a mulher faca da gestacdo nao mais que um mau golpe, assim gerando, ao mesmo tempo, o filho-a me- o pai- a familia? Nao. Compete a ti romper os velhos circuitos. Haverd, para a mulher e para o homem, que expirar a velha relaco e todas as suas consequéncias; pensar no langamento de um sujeito novo, em vida, com des-familiarizagéo. Antes uma de-mater-paternizagao, do que para evitar a recuperacao da procriacao, ter que privar amulher de viver uma apaixonante época do corpo. Vamos desfetichizar. Vamos sair da dialética que quer que o bom pai seja o pai morto, ou 0 filho, a morte dos pais. O filho €0 outro, mas o outro sem violéncia, sem passagem pela perda, pela luta. Estamos cansadas dos enjaulamentos, da fabrica de nds, sempre a ser retirada da ladainha da castragéo que se transmite e se genealogiza. Nao mais avangaremos por recuos. Nao vamos reprimir algo t&o simples como a vontade de viver. Pulso oral, pulsao anal, Pulsao vocal, todas as pulsdes sio nossas boas forgas, e entre elas a pulsdo da gestacao - assim como a vontade de escrever, uma vontade de viver dentro, uma vontade do ventre, da lingua, do sangue. Nés nao vamos recusar, Se isto nos encanta, as delicias de uma gravidez: alias, Sempre dramatizada, escamoteada, amaldigoada nos textos ‘assicos, Porque se ha um reprimir particular, é justo ai = €Ncontramos: tabu de mulher gravida, que diz bem Poder de que investida, entio, é que desde sempre TRADUCOES DA PLITIIRA . Deneon esta Scanned with CamScanner Se suspeita que, uma vez gravida, a mulher nao , dobra seu valor-mercadoria, mas, sobretudo, se vas enquanto mulher ante seus proprios olhos, € toma go tes sexo, inegavelmente. i e Hé mil maneiras de se viver uma Br: avidez, de se toy no se ter com o ainda invisivel uma relagao de intensiq, E se nao tens essa vontade, isto na0 significa UE etejas en falta. Cada corpo distribui de modo singular, sem mode. sem norma, a totalidade nao acabada e mutante de Ee desejos. Decide por ti, quanto a tua ree espaco dag contradigdes em que prazer € realida le se entranham, Poeg outro em vida: a mulher sabe viver 0 afastamento: parirniy 6 perder nem aumentar. B acrescentar a vida um outro, Ey os defensores da “teoria”, sonho? Eu desconhego? O vocés, ; os que dizem amém-amém ao Conceito, entronadores do falo (mas nao do pénis), vao gritar mais uma vez ao “idealismo” ou, pior ainda, voces vao me recriminar por ser “mistica”. E a libido, entéo? Sera que eu nao li “O significado do falo”? E a separacao, o fim de si que para nascer ty sofres, dizem eles, uma ablac&o que teu desejo vai sempre comemorar? Nao se v6, alids, em meus textos, que O pénis circula, e que eu lhe dou lugar e atrativo. Certamente. Eu quero tudo, Eu me quero toda com ele por inteiro. Por que iria privar- me de uma parte de nés? E certo que ela tem vontade, uma vontade amante, nao de inveja. Nao porque ela seja castrada, uma diminuida que quer preencher-se; essa ferida que quer consolar-se, para vingar-se. Nao quero um pénis para adornar meu corpo. Mas desejo o outro enquanto outro inteiro, como outra inteira, porque viver é querer tudo 0 que é, tudo o que vive, e queré-lo em vida. A castracao? Para os outros. O que é um desejo que se origina de uma falta? Um pequeno desejo. A mulher que se deixa ameacar pelo grande falo. imnreceianada naln circo da inctancia falica, a foriugn wim Yorke fol, ohn der coaede CLOS anda. Scanned with CamScanner _ existem, vitimas faceis e numerosas da mais antiga farsa, seja porque elas estao distribuidas na primeira e muda versa0, € que sobre seus Corpos se desenha 4 moda antiga o monumento teérico ao falo de ouro que elas nunca veem, tits estendidas por sob as montanhas que elas fazem erigir- se por seus estremecimentos, Seja porque hoje, saindo de seu periodo infantil, de repente se veem assaltadas pelos construtores do império analitico, e a partir do momento em que formulam o novo desejo, nu, sem nome, e bem alegre de aparecer, ei-las de molho pelos novos velhos, e pronto! Obliquo, o deménio da interpretacdo vestido de modemidade lhes vende, sob falsos significantes, as mesmas algemas e outras joias que acorrentam: segunda versio, “a esclarecida”, de seu rebaixamento pudico. Que castracao preferes? De qual mais gostas, a do pai ou a da mie? Ai que olhinhos lindos, olhem que menininha linda! Compra meus éculos e verds a Verdade-Eu-Eu te dizer tudo em que deveras acreditar. Calca-os em teu nariz e dé uma olhada de fetichista (que tu és, e eu, o outro analista, te ensino) sobre teu corpo e o corpo do outro. Esté vendo? Nao? Espera, vamos te explicar tudo, e saberds, enfim, a que tipo de neurose estas ligada. Nao te mexas, vamos fazer teu retrato, para que logo, logo tu comeces a parecer com ele. Sim, elas ainda sao uma legiao, asingénuas de primeiro e de segundo grau. As recém-chegadas, se ousarem criar fora do tedrico, vao ser interpeladas pelos guardas do Significante, fichadas, advertidas sobre a ordem que se supde que conhecam, atribuida por forca de artificio, no lugar preciso da cadeia que sempre se molda em proveito de um “significante” privilegiado. Remendam-nos em fio na linha que, se nao leva ao Nome-do-Pai, para fazer mais Novo, leva, em vez disso, 4 mae-falica. Amiga, cuidado com o significante que quer Teconduzir-te 4 autoridade de um significado! Tem cuidado 60m os diagnésticos que gostariam de reduzir teu poder Retadar Qe nomes “comuns” também Sonomes plo’ prios Scanned with CamScanner ridad umando-anesta espécie,_ . - je, ar 4 asingula' iq clausura psicanalitica: 4 srebaixam tuasinB™ ey querebars nao fiques Rompe os circu jo i : - uma voltae atravess@- ea guerra de itbertagaaigat Be red Mas as mulheres ai estao, eu as em enganadas, as que nao gem qualquer risco, sem i inexpl qualquer desejo, sem qualquer re — inexplorado nelas, entre elas € outros, e em outros 2 , a a Ela nao fetichiza, nao renega, nao OC jeia; — s aproxima, busca ver aoutra mulher, © pale: amante, nao para consolidar seu narcisismo OU para ver car a solidez, ou a fraqueza do senhor, mas para melhor fazer amor, para inventar. : vi, as que nao serao terao medo do rise O Outro Amor: . No comeco, existem nossas diferencas. O novo amor ; ousa o outro, o quer, aspita a voos vertiginosos entre conhecimento e invencao. A que sempre chega nao se queda, vai por toda a parte, intercambia, ela é o desejo-que- da, (Nao encerrada no paradoxo do dom que toma, nem na ilusdo da fusao em um. A gente janao estA mais ai). Ela entra, entre ela, mim e ti, entre o outro eu onde o um é sempre infinitamente mais que um e mais que eu, temerosas de nunca atingir um limite, gozosas de nosso devir. Nés nao acabaremos! Ela transpée os amores defensivos, a condigao materna e a voracidade: para além do finreldderes avarento, pelo espaco movedico, aberto, transitivo, ela vai correndo seus riscos; para além da trégua da luta de morte, para além do amor belicoso 7 amor que pretende mol troca, e I dadiatenkcade Boos aus ochdio-anmaallll . ainda uma heranga, um resto, um assujei & ao falo. Amar, olhar- : Rescate deoteun A ‘ r, des-especular. E dificil e 0 ‘¢isto que alimenta a vida, 2 Nao éimp deste deseo inquieto de Pp ge o estranho, mas que se alegra com o intercambio que multiplica. La onde a histéria gira cor istOri rengs cians cares g mo historia da morte, 0 intercambio hierarquizante, a uta pelo controle que sé acaba com a morte de pelo menos um (um senhor-um escravo, ou dois no senhores = dois mortos), tudo isto resulta de um tempo governado pelos valores falocéntricos: que isto ainda haja no presente nao impede que a mulher comece, em algum lugar, a histéria da vida. Ela dd em outro lugar. Nao “sabe” o que da, nao o dimensiona; mas ela nao da nem troca o que nao tem. Ela da mais sem a certeza do que recebera em troca do que da, um beneficio, inclusive, imprevisto. Ela dd para viver, para pensar, para transformar. Essa “economia” ela ja nao pode tomar para si em termos de economia. La onde ela ama, todos os conceitos da velha gestio se acham ultrapassados. Ai ela nao encontra, em termos de um cdlculo mais ou menos consciente, sua conta, mas suas diferencas. Eu sou para ti o que queres que eu seja no momento em que me olhas tal como nunca me viste: a cada instante. Quando escrevo, sao todos os que nao sabemos que podemos ser os que se escrevem por “eu”, sem exclusdo, sem previsao, tudo o que seremos nos chama a irrenunciavel, inebriante, inapaziguadora busca de amor. Jamais a faltaremos a nds mesmas. Traducao de Luciana Eleonora de Freitas Calado Deplagne Fonte CIXOUS, Héléne. Le Rire de La Méduse et Autres Ironies. Paris: Galilée, 2010. p. 37-68. [1975] Referéncias GENET, Jean. Pompes Funébres. In: Oeuvres Completes. t. III. Paris: Gallimard, 1953. . Pompas finebres. Tradugao de Ronaldo Lima Lins e Irene M. Cubric. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. Scanned with CamScanner

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