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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS

UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO


CURSO DE DIREITO

ALEXANDRE DOS SANTOS SILVA

A EFETIVAÇÃO DAS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA COMO CONDIÇÃO DE


POSSIBILIDADE PARA A HUMANIZAÇÃO DO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

SÃO LEOPOLDO
2018
Alexandre dos Santos Silva

A Efetivação das Audiências de Custódia como Condição de Possibilidade para a


Humanização do Processo Penal Brasileiro:

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado como requisito parcial para
obtenção do título de Bacharel em
Ciências Jurídicas e Sociais, pelo Curso
de Direito da Universidade do Vale do Rio
dos Sinos - UNISINOS

Orientador: Prof. Dr. Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth

São Leopoldo
2018
AGRADECIMENTOS

A DEUS, pelo dom da vida, e que até aqui me tem sustentado;

A minha amada esposa Sinara, que sempre me apoiou, lutou esses oito anos
ao meu lado, sempre me incentivando a nunca desistir, as filhas amadas Cassia e
Karen, pela compreensão, quando muitas vezes fechado no quarto de estudos,
tiveram que manter silencio para poder respeitar o tempo de estudo, leitura e
desenvolvimento desse trabalho. Enfim, graças a Deus e a vocês que acreditaram
nos meus sonhos e instarem a nunca desistir, agora chegamos juntos a essa
conquista;

A Minha mãe Nelci, mulher guerreira, venceu muitas dificuldades na vida para
oportunizar aos filhos educação. Levo dentro do meu coração um amor e um
sentimento de gratidão que jamais esquecerá tudo que fizestes por mim.

Ao meu tio Olmiro do Santos, que no ano mais difícil da minha vida, quando
tudo parecia dar errado e perdido, foi mais do que um pai, amigo, irmão, conselheiro.

Ao professor Dr. Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth, por ter aceito ser meu
orientador e de forma espetacular me assistiu em todas as minhas dúvidas, sempre
me orientando de forma clara, com ótimas indicações para minha pesquisa.

Aos amigos presentes, que fazem parte da realização desse sonho.


“Não existem pessoas de sucesso e pessoas fracassadas. O que
existem são pessoas que lutam pelos seus sonhos ou desistem
deles”.

(Augusto Cury)
RESUMO

O aumento anual da população carcerária, o déficit de vagas do sistema


prisional e o desrespeito aos princípios e garantias fundamentais dos indivíduos
reclusos tem atraído olhares para o sistema carcerário brasileiro. Diante deste
contexto, o presente trabalho tem como objetivo apresentar a efetivação das
audiências de custódia como condição de possibilidade para a humanização do
processo penal brasileiro e garantir efetividade aos tratados internacionais de
direitos humanos que o Brasil é signatário. Parte-se, para tanto, do seguinte
problema de pesquisa. As audiências de custódia, previstas na Convenção
Americana de Direitos Humanos (CADH) e na Resolução nº 213 do Conselho
Nacional de Justiça, podem ser consideradas enquanto instrumento para a
humanização do Processo Penal brasileiro? Quais as principais barreiras que o
processo penal brasileiro encontra para efetivar as audiências de custódia? Os
objetivos específicos da pesquisa, espelhados na estrutura (sumário) da monografia,
são: a) investigar a aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos e do
controle de convencionalidade no processo penal brasileiro, bem como a
aplicabilidade de normas de Direito Internacional no direito interno; b) analisar a
Resolução nº 213 do CNJ e sua aplicação no processo penal brasileiro, identificando
quais os prejuízos que os presos têm ao verem cerceados seus direitos na fase
inicial do inquérito policial com a ausência da audiência de custódia. O método de
pesquisa empregado foi o método de abordagem dedutivo e o método de
procedimento monográfico, com a utilização das técnicas de pesquisa bibliográfica e
documental. O enfoque principal do trabalho está centrado no estudo da audiência
de custódia, sua conceituação, evolução, positivação e implementação no Direito
Comparado e no Brasil. Para tanto, a análise de textos legislativos de outros países,
bem como de relatórios e resoluções acerca do tema no Brasil é de fundamental
importância. Para o desenvolvimento da pesquisa foram empregados dados obtidos
por meio de relatórios elaborados por órgãos oficiais do governo, referentes às
prisões no Brasil, além de pesquisas bibliográficas referentes à audiência de
custódia.

Palavras-chave: Processo penal. Audiência de custódia. Controle de


convencionalidade. Direitos humanos.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Demonstrativo de Torturas e Maus Tratos ................................................ 53


Figura 2 - Houve Violência? A Falta de Interesses das Instituições. ......................... 54
LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Número de pessoas presas ..................................................................... 27


LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Comparativo da redação do artigo 306 no atual CPP e no PLS 554/2011 .. 48


LISTA DE SIGLAS

ADEPOL Associação dos Delegados de Polícia do Brasil


APF Auto de Prisão em Flagrante
CADH Convenção Americana de Direitos Humanos
CESEC Centro de Estudos de Segurança e Cidadania
CNJ Conselho Nacional de Justiça
CPP Código de Processo Penal
DMF Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema
Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas
EC Emenda Constitucional
IDDD Instituto de Defesa do Direito de Defesa
LINDB Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro
MJ Ministério da Justiça
PIDCP Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos
RJ Rio de Janeiro
STF Supremo Tribunal Federal
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10
2 A CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E O CONTROLE DE
CONVENCIONALIDADE NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO........................... 13
2.1 A Convenção Americana de Direitos Humanos e as Garantias Processuais
Penais ....................................................................................................................... 17
2.2 O Processo Penal Não Democrático e o Controle de Convencionalidade ... 21
3 A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA NO DIREITO COMPARADO ................................ 26
3.1 Origem, Conceito e Evolução das Audiências de Custódia: uma análise a
partir do Direito Comparado................................................................................... 28
3.2 As audiências de Custódia no Brasil: a Resolução nº 213 do Conselho
Nacional de Justiça ................................................................................................. 34
4 A IMPLEMENTAÇÃO DAS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA NO BRASIL: ANÁLISE
CRÍTICA .................................................................................................................... 43
4.1 Dinâmica da Implementação das Audiências de Custódia no Brasil e
Perspectivas a partir do Projeto de Lei do Senado nº 554/2011.......................... 46
4.2 Análise Crítica da Implementação das Audiências de Custódia no Brasil a
partir do Relatório “Tortura Blindada” .................................................................. 51
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 59
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 61
10

1 INTRODUÇÃO

A falta de investimento na área de segurança preventiva, bem como nas


operações judiciárias, sem dúvida pode ser uma das principais barreiras para a
humanização do sistema de administração da justiça penal no Brasil.
Por um lado, há a falta de agentes públicos, a degradação dos materiais
técnicos e viaturas sem manutenções, quando não muito sem combustível, o que
torna a intervenção policial, na maioria dos casos, extremamente precária, violenta e
truculenta. Por outro lado, tem-se um judiciário abarrotado, fator ao qual se pode
acrescentar a falta de defensores públicos, situação que é explícita na maioria das
comarcas brasileiras. A percepção que se tem, diante deste contexto, é que o
Estado tem sido o maior violador de direitos, pois sua omissão o faz tão culpado
quanto o indivíduo que, ao ser preso, em tese poderá ser culpado ou confessar sua
culpa depois de sofrer agressões e maus tratos por parte da polícia.
A situação parece ser incontrolável, razão pela qual a ausência de
manifestação do Estado por meio do poder judiciário, tem feito reféns os direitos de
inúmeros indivíduos que tiveram seus direitos cerceados.
Nesse sentido, a efetivação das audiências de custódia pode ser apontada
como condição de possibilidade para que haja um maior controle da violência
despendida pelas agências que integram o sistema penal brasileiro, viabilizando,
assim, uma humanização do processo penal na medida em que significam um maior
controle jurisdicional da (i)legalidade das prisões – com um impacto positivo no
número de pessoas encarceradas em sede processual – e da prática de tortura e
maus-tratos pelas polícias. Este é o problema que orienta a presente pesquisa.
Como hipótese provisória, parte-se do entendimento de que as audiências de
custódia, previstas na Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) e na
Resolução nº 213 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), podem ser consideradas
enquanto instrumento para a humanização do Processo Penal brasileiro. A
Resolução do CNJ de 12/12/2015 expressamente trata o direito do preso de ser
ouvido pela autoridade judicial competente em até 24 horas a contar do flagrante,
com o objetivo de aferir a (i)legalidade do flagrante bem como averiguar a prática de
tortura/maus-tratos pela polícia. Busca-se, assim, resguardar a dignidade da pessoa
humana, que é um direito fundamental que reflete um valor inestimável e que se
configura enquanto base da República Federativa do Brasil. Nesse sentido, a
11

aplicação e a interpretação de todas as demais normas legais devem respeitar essa


garantia.
Como salientado, além de garantir o direito à liberdade e a dignidade da
pessoa presa, a audiência de custódia tem a incumbência de evitar e cessar os
riscos de incidência de um dos principais problemas verificados nessa fase inicial da
persecução penal, que é a ocorrência de violações à incolumidade física e/ou
psíquica, tais como tortura ou maus tratos dos indivíduos que tiveram sua liberdade
privada em razão de prisão cautelar ou definitiva.
Nesse sentido, a relevância do estudo em questão se revela pelo seu escopo
de detectar os problemas e omissões do Estado brasileiro quanto às audiências de
custódia. Serão observados, portanto, a partir de uma perspectiva crítica, os
Tratados Internacionais de Direitos Humanos já ratificados pelo Brasil –
notadamente a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) (Pacto de San
José da Costa Rica) –, bem como a Resolução nº 213 do CNJ que regulamentou as
audiências de custódia no país.
Esse trabalho, portanto, tratará das garantias fundamentais previstas nos
pactos internacionais, uma vez que frequentemente acompanha-se na mídia casos
de maus tratos e até mesmo de execuções sumárias de presos em flagrante
cometidos por policiais. Nesse ponto, é crucial recordar que os presos são também
um produto da ineficácia de um sistema penal falho e, assim, cabe o Estado cumprir
suas atribuições, garantindo aos presos seus direitos. Não se trata de defender o
suposto infrator, mas sim, pugnar para que o agente público, quando for executar a
prisão, a faça de forma legal, sem privar ou extinguir os demais direitos do indivíduo
além daqueles afetados diretamente pela sanção penal.
Em geral, o trabalho tem como objetivo verificar em que medida os Tratados
Internacionais ratificados pelo Brasil e a Resolução nº 213 do CNJ têm obtido
efetividade nas garantias ao preso em flagrante no que se refere à realização da
audiência de custódia.
Já de maneira mais específica, visa a investigar a aplicação da Convenção
Americana de Direitos Humanos (CADH) e do controle de convencionalidade no
processo penal brasileiro, bem como a aplicabilidade de normas de Direito
Internacional no direito interno e analisar a Resolução nº 213 do CNJ e sua
aplicação no processo penal brasileiro, identificando quais os prejuízos que os
12

presos têm ao verem cerceados seus direitos na fase inicial do inquérito policial com
a ausência da audiência de custódia.
O método de abordagem é dedutivo e o método de procedimento
monográfico, com a utilização das técnicas de pesquisa bibliográfica e documental.
O enfoque principal do trabalho está centrado no estudo da audiência de custódia,
sua conceituação, evolução, positivação e implementação no Direito Comparado e
no Brasil. Para tanto, a análise de textos legislativos de outros países, bem como de
relatórios e resoluções acerca do tema no Brasil é de fundamental importância.
No primeiro capítulo da monografia, abordar-se-á de forma analítica a
Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) (Pacto Internacional de San
Jose da Costa Rica), celebrado na cidade de São José da Costa Rica em 22 de
novembro de 1969 e promulgado pelo Brasil em por meio do decreto Lei nº 678 em
06 de novembro de 1992. Veremos a importância que tem para o controle da
convencionalidade no processo Penal Brasileiro, bem como a negligencia no
cumprimento diante do artigo 7º que trata da apresentação sem demora a presença
de um Juiz ou autoridade autorizada por Lei para exercer funções judiciais, com o
principal objetivo de promover uma análise cautelosa acerca da necessidade e
legalidade da prisão cautelar bem como averiguar o abuso no uso de força policial
na prisão em flagrante.
Já no segundo capítulo, busca-se no Direito comparado, os países onde já é
vigente a audiência de custódia, fazendo uma análise comparativa e critica com o
Direito interno bem como apresentar a origem, conceito e a evolução na
aplicabilidade dos Tratados Internacionais.
Por fim, o terceiro capítulo ocupa-se com a análise crítica da implementação
das audiências de custodia no Brasil a partida do relatório “Tortura Blindada”, que
visa combater os maus tratos contra o indivíduo no ato da prisão em flagrante bem
como a averiguação da legalidade das prisões nessas circunstâncias.
13

2 A CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E O CONTROLE DE


CONVENCIONALIDADE NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

A proposta desse capitulo não é apresentar questionamento se a audiência


de custodia deve ou não ser implantada, uma vez que tal discussão já está
consolidada pela doutrina nacional e internacional e, no âmbito doméstico, pelo
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Procura-se, sim, averiguar qual é a melhor forma de realizá-la para que as garantias
constitucionais e convencionais sejam cumpridas.
A Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), também denominada
“Pacto de São José da Costa Rica”, celebrada em São José da Costa Rica, em 22
de novembro de 1969, e promulgada no Brasil por meio do Decreto nº 678, de 6 de
novembro de 1992, visa a garantir os direitos fundamentais do ser humano, dentre
os quais estão os direitos previsto no seu artigo 7º, apartado 5:

Artigo 7º
[...]
5. Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, a
presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer
funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo
razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga
o processo. Sua liberdade pode ser condiciona a garantias que
assegurem o seu comparecimento em juízo.1

Dois importantes questionamentos exsurgem do artigo acima transcrito: 1)


qual o prazo ideal para apresentação em juízo sem que a demora seja considerada
uma violação à CADH? 2) a apresentação à autoridade policial ou ao Ministério
Público pode suprir a apresentação ao juiz?
Em relação ao segundo questionamento, de acordo com Enéas Romero
Vasconcelos, não se pode reconhecer o Ministério Público no Brasil como
autoridade judicial no que tange às garantias e direitos do indivíduo preso na
audiência de custódia, uma vez que o Ministério Público é parte no processo penal2.

1
COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). Convenção americana sobre
os direitos humanos: assinada na Conferência especializada interamericana sobre direitos
humanos, San José, Costa Rica, 22 nov. 1969. Disponível em: <http://www.cidh.org/Basicos/
Portugues/c.Convencao_ Americana.htm>. Acesso em: 22 nov. 2017.
2
VASCONCELOS, Eneas Romero de. Audiência de custódia. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2017. p. 30.
14

Já no que diz respeito ao prazo de apresentação do indivíduo ao juiz, a


Resolução nº 213 do CNJ expressamente trata o direito do preso de ser ouvido pela
autoridade judicial competente em até 24 horas, resguardando a dignidade da
pessoa humana, que é um direito fundamental que reflete um valor inestimável,
porquanto, a aplicação e a interpretação de todas as demais normas legais devem
respeitar essa garantia.
O prazo de 24 horas já encontra respaldo jurisprudencial, uma vez que o STF,
por meio do voto do Ministro Marco Aurélio, ao julgar a ADPF 347 MC/DF
reconheceu o prazo de 24 horas para a apresentação do indivíduo preso 3. Assim é
que se tem interpretado o artigo 8º, 1, da CADH:

Artigo 8º
1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e
dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente,
independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na
apuração de qualquer acusação pena formulada contra ela, ou para
que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil,
trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.4

No Brasil, o que tem ocorrido na prática, no entanto, é um total descaso com


a legislação internacional e a positivação interna no que tange às audiências de
custódia. Para Mazzuoli, a positivação interna do direito à liberdade, previsto no art.
5º, § 2º da CF/88, admitiu o ingresso dos tratados internacionais de proteção dos
direitos humanos no mesmo grau hierárquico das normas constitucionais, e com a
edição da Emenda Constitucional nº 45, de 2004, tratou de consolidar o que previa o
parágrafo anterior, incluindo o parágrafo 3º que deu a isonomia aos tratados e
convenções internacionais sobre direitos humanos, estabelecendo a equivalência às
emendas constitucionais5, in verbis:

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos


que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em

3
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADPF nº 347 MC. Relator: Min. Marco Aurélio – Tribunal Pleno.
Brasília, DF, julgado em: 09 de setembro de 2015, divulgado em 18 de fevereiro de 2016 e
publicado em 19 de fevereiro de 2016. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/
documento/informativo798.htm>. Acesso em: 21 nov. 2017.
4
COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). Convenção americana sobre
os direitos humanos: assinada na Conferência especializada interamericana sobre direitos
humanos, San José, Costa Rica, 22 nov. 1969. Disponível em: <http://www.cidh.org/Basicos/
Portugues/c.Convencao_ Americana.htm>. Acesso em: 22 nov. 2017.
5
MAZZUOLI, Valério de Oliveira O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo Revista dos Tribunais, 2011. p. 29-33. (Direito e ciências afins; v. 4).
15

dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros,
serão equivalentes às emendas constitucionais6.

A proposta feita por Mazzuoli, de acrescentar um parágrafo no artigo 5º da


Carta de 1988, tinha por escopo dar uma inclusão ao § 2º do mesmo artigo. Para o
autor, a ratificação do Estado de um Tratado Internacional, com a aprovação
parlamentar simples ou pela maioria, já seria o suficiente para tornar o Tratado
equivalente à norma constitucional. Assim escreve Mazzuoli:

Os tratados internacionais referidos pelo parágrafo anterior, uma vez


ratificados, incorporam-se automaticamente na ordem interna
brasileira com hierarquia constitucional, prevalecendo, no que forem
suas disposições mais benéficas ao ser humano, às normas
estabelecidas por esta Constituição7.

Observa-se, nesse sentido, que a Emenda Constitucional (EC) nº 45/2004


não seguiu o que se esperava, na medida em que aprovou o § 3º, segundo o qual os
Tratados Internacionais serão equivalentes às normas constitucionais se aprovados
em dois turnos por três quintos de votos dos membros do Congresso Nacional. Isso
é o equivalente ao quórum para aprovação de uma Emenda Constitucional.8
Diante do exposto, tudo continua da mesma forma como antes da EC
45/2004, ou seja, os Tratados devem ser aprovados pelo Congresso por decreto
legislativo, mas podendo o Parlamento decidir se com o quórum de Emenda
Constitucional ou sem ele.
Nesse trabalho, que estuda as audiências de custódia, vale lembrar que a
CADH já foi ratificada por meio do Decreto nº 678/1992. Portanto, em tese e por
analogia, pode-se afirmar que as audiências de custódia são constitucionais por
integrarem materialmente a ordem jurídica estabelecida pela Carta Magna. Porém,
Mazzuoli destaca que há diferenças, e ela consiste na única e exclusiva serventia do
imperfeito § 3.º do art. 5.º da Constituição, fruto da Emenda Constitucional 45/2004,
que dá equivalência e não igualdade aos Tratados e Normas Internas. Assim, o texto
constitucional reformado, que trata dos Tratados ratificados pelo Brasil, que já têm

6
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 22 mar.
2018.
7
MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Direitos humanos, Constituição e os tratados internacionais:
estudo analítico da situação e aplicação do tratado na ordem jurídica brasileira. São Paulo: Ed.
Juarez de Oliveira, 2001. p. 348.
8
MAZZUOLI, Valério de Oliveira O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 36. (Direito e ciências afins; v. 4).
16

status de norma constitucional, nos termos do § 2.º do art. 5.º, poderão ainda ser
formalmente constitucionais e equivalentes às emendas constitucionais, desde que,
a qualquer momento, depois de sua entrada em vigor, sejam aprovados pelo quorum
do § 3.º do mesmo art. 5.º da Constituição.9 Conclui o autor afirmando que

[...] o direito brasileiro está integrado com um novo tipo de controle


das normas infraconstitucionais, que é o controle de
convencionalidade das leis, tema que antes da Emenda
Constitucional 45/2004 era totalmente desconhecido no Brasil. 10

Já no plano que diz respeito à implantação das audiências de custódia dentro


do Código de Processo Penal (CPP), o artigo 306, no § 1º, destaca a necessidade
da imediata (24 horas) comunicação ao juiz de que alguém foi preso, com posterior
remessa do auto de prisão em flagrante para homologação ou relaxamento da
prisão.
Há, porém, a excepcionalidade do prazo do artigo 1º, § 4º da Resolução nº
213 do CNJ – texto que, atualmente, regula a realização das audiências de custódia
no país –, que prevê que a pessoa presa acometida de grave enfermidade, ou
havendo circunstância comprovadamente excepcional que a impossibilite de ser
apresentada ao juiz no prazo do caput, deverá ser assegurada a realização da
audiência no local em que ela se encontre e, nos casos em que o deslocamento se
mostre inviável, deverá ser providenciada a condução para a audiência de custódia
imediatamente após restabelecida sua condição de saúde ou de apresentação. 11
Nesse caso, defende Melo12 que a audiência de custodia deve ser realizada mesmo
sem a presença do réu.
Outro ponto também enfrentado pelo judiciário é a realização de audiências
de custódia nos dias não úteis. Caso o indivíduo tenha sido apreendido numa sexta-
feira, a audiência na segunda-feira, ultrapassaria os prazos previstos na Resolução.
A solução nesses casos, para Melo, é a realização de audiência de custódia em
horários mais estendidos ou mesmo durante a madrugada, bem como nos dias não

9
MAZZUOLI, Valério de Oliveira O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 52-53. (Direito e ciências afins; v. 4).
10
MAZZUOLI, Valério de Oliveira O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 167. (Direito e ciências afins; v. 4).
11
CONSELHO NACIONAL DA JUSTIÇA (CNJ). Resolução nº 213 de 15/12/2015. Dispõe sobre a
apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Disponível em: <http://
www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 16 jan. 2018.
12
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016.
p. 151-152.
17

úteis ter um funcionamento do judiciário no horário das 07:00 às 23:00, como ocorre
nos juizados especiais criminais.13
Diante das dificuldades que o sistema processual penal brasileiro vem
apresentando, o doutrinador Cândido Furtado Maia Neto, afirma que elas são, em
boa medida, resquícios do fato de que o sistema processual pátrio não é
democrático, pois restringe os direitos fundamentais dos indivíduos: “[...] o código de
processo penal brasileiro é ditatorial (Estado Novo, Dec-lei nº 3.689/41), porque teve
como base o regime jurídico-penal na ideologia fascista de Mussolini e no nazismo
de Hitler”.14
Em face destas características, a leitura constitucional – e também
convencional – do processo penal se impõe. Isso como condição de possibilidade
para que haja uma maior aproximação entre o direito interno com o direito
internacional de proteção dos Direitos Humanos. Este é o objetivo do presente
capítulo, ou seja, apresentar uma leitura constitucional e convencional do processo
penal.

2.1 A Convenção Americana de Direitos Humanos e as Garantias Processuais


Penais

Umas das principais funções da audiência de custódia é promover uma


análise cautelosa acerca da necessidade e da (i)legalidade da prisão. A audiência
de custódia supera o simples envio do papel no qual se consubstancia o flagrante ao
juiz competente e oportuniza ao preso o contraditório, bem como evita – na medida
em que se propõe a instaurar o procedimento investigativo competente nos casos
em que detectados – os maus tratos e a tortura pelos agentes policiais.
Nesse sentido, deve-se analisar alguns pontos importantíssimos que a
Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) instituiu e as garantias
processuais penais que asseguram o cumprimento das convenções.
A evolução dos Direitos Humanos passou por um processo de
internacionalização e universalização. Em 1966, com a Carta Internacional dos

13
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. p.156.
14
MAIA NETO, Cândido Furtado. Direitos humanos individuais fundamentais no processo penal
democrático: blindagem das garantias constitucionais ou vítimas do crime de abuso de poder.
Brasília, DF, 10 ago. 2006. Disponível em: <https://www.anadep.org.br/wtk/pagina/materia?
id=1498>. Acesso em: 09 out. 2017
18

Direitos Humanos (International Bill of Rights), integrada pela Declaração Universal


de 1948, pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e Pacto Internacional
dos Direitos Econômicos e Sociais, inaugurou um sistema global de proteção de
direitos, que até então estavam em uma espécie de “limbo jurídico”. Para o
doutrinador Antônio Carlos Cançado Trindade, esses Direitos são de proteção dos
mais fracos, vulneráveis e vítimas de violações. 15 Os tratados de Direitos Humanos,
concedem um tratamento especial no plano do direito interno, indicando vias de
compatibilização dos dispositivos convencionais com o direito interno.16
No panorama jurídico internacional a importância do direito à liberdade
pessoal reside no fato de que a sua violação geralmente representa, também, a
violação a outros direitos humanos. Dessa forma, proteger diretamente a liberdade
significa proteger, indiretamente, os outros direitos humanos.
O direito da liberdade pessoal está diretamente vinculado ao devido processo
legal, na medida que o processo penal é o principal meio utilizado pelo Estado para
privar a liberdade dos indivíduos. As regras do devido processo legal, como o
contraditório e a ampla defesa, limitam e condicionam essa atuação estatal para que
ela não ocorra de modo arbitrário. Quando a privação da liberdade pessoal é ilegal,
isso geralmente decorre da violação do direito ao devido processo legal, o que torna
a detenção ilegal e arbitrária. Com efeito, quando o indivíduo preso em flagrante tem
restringido seu direito à audiência de custódia, e é conduzido a um presídio para
aguardar audiência, que pode levar meses ou – não raro – ano, essa prisão, em
tese, deveria ser caracterizada ilegal.17
A liberdade pessoal não é um direito absoluto, mas o indivíduo só pode ser
dela privado como resultado de lei que estabeleça as condições em que uma prisão
é possível, desde que a proteção judicial seja assegurada.
Para Mazzuoli18, compreender os elementos básicos que envolvem o controle
de convencionalidade, à luz do Direito Brasileiro atual, deve-se conhecer os
conceitos de vigência, validade e eficácia das leis no Brasil, especialmente em face
dos tratados internacionais de direitos humanos. Diferentemente do positivismo
15
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado internacional de direitos humanos. 1. ed. Porto
Alegre: Sergio Fabris Editor, 1997. v. 1, p. 44-45.
16
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado internacional de direitos humanos. 1. ed. Porto
Alegre: Sergio Fabris Editor, 1997. v. 1, p. 554.
17
O’DONNELL Daniel. Derecho internacional de los derechos humanos. 2 ed. México: Tribunal
Superior de Justicia del Distrito Federal, 2012. p. 300.
18
MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. (Direito e ciências afins; v. 4).
19

clássico, que confunde vigência com validade, o autor traz a visão constitucional e
humanista que defende que não se poderá mais confundir vigência com validade,
uma vez que a vigência pressupõe a publicação da lei e seu eventual período de
vacatio legis; se não houver vacatio, segue-se a regra do art. 1º da Lei de Introdução
às Normas do Direito Brasileiro (LINDB): “[...] salvo disposição contrária, a lei
começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente
publicada”19. Conforme já mencionado, a Emenda Constitucional 45/2004, que
acrescentou o § 3.º ao art. 5.º da Constituição, trouxe a possibilidade de os tratados
internacionais de direitos humanos serem aprovados com um quorum qualificado, a
fim de passarem de um status materialmente constitucional para a condição de
tratados “[...] equivalentes às emendas constitucionais”20. Esse acréscimo
constitucional trouxe ao direito brasileiro um novo tipo de controle das normas de
direito interno, o controle de convencionalidade das leis. Portanto, as normas
domésticas também se sujeitam a um controle de convencionalidade com os
tratados de direitos humanos em vigor no país.21 Assim sendo, uma determinada lei
interna poderá ser até considerada vigente por estar formalmente de acordo com o
texto constitucional, mas não será válida se estiver materialmente em desacordo ou
com os tratados de direitos humanos.
Mazzuoli salienta, no que tange aos tratados internacionais de proteção dos
direitos humanos, que no Brasil foi adotada a concepção “[...] monista
internacionalista kelsiana”, ou seja, basta que os tratados sejam ratificados para
produzirem efeitos jurídicos tanto no plano internacional quanto nas legislações
internas. Acrescenta, ainda, que a incorporação dos tratados de direitos humanos na
ordem jurídica interna do país se dá pela incorporação automática e imediata a partir
do ato da ratificação.22
Assim, conclui Mazzuoli acerca da validade e vigência dos tratados
internacionais de direitos humanos frente ao ordenamento jurídico brasileiro:

19
BRASIL. Decreto-lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do Direito
Brasileiro. Redação dada pela Lei nº 12.376, de 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm>. Acesso em: 30 mar. 2018.
20
MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 36. (Direito e ciências afins; v. 4).
21
MAZZUOLI, Valério de Oliveira O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed. rev.,
atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 92-100. (Direito e ciências afins; v. 4).
22
MAZZUOLI, Valério de Oliveira Direitos humanos, constituição e os tratados internacionais:
estudo analítico da situação e aplicação do tratado na ordem jurídica brasileira. São Paulo: Editora
Juarez de Oliveira, 2001. p. 260.
20

Em Suma, tendo ingressado tais tratados pela porta de entrada do §


2º do art. 5ª da Carta Magna de 1988, passam eles, da mesma forma
que aqueles direitos garantidos no texto constitucional: a) a estar
dentro dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º.
Inc.II a V); b) a permanecer os objetivos fundamentais do Estado
brasileiro (art. 3º, inc I, III e IV); c) a ser diretrizes que regem as
relações internacionais da República Federativa do Brasil (art. 4º, inc.
II); e; d a constituírem clausula pétrea do texto constitucional ( art. 60,
inc. IV), dando lugar a intervenção federal em caso de sua não-
observância (art. 34, inc. VII, b). 23

Para Raphael Melo, o Princípio constitucional da presunção de inocência,


previsto no artigo 5º, LVII, da CF , impõe as medidas restritivas no curso do
24

processo penal como cautelares. Caso contrário, a regra seria a presunção da culpa,
com a pena assumindo caráter de cumprimento antecipado. Esse cenário de
descumprimento da Constituição era notório até 2011, quando, após o auto de
prisão em fragrante, a autoridade policial o encaminhava ao Juiz competente, que se
limitava a proferir o despacho homologando a prisão em flagrante, considerando
apenas o estado de flagrância, não sendo apontada qualquer necessidade cautelar,
violando assim o princípio da presunção de inocência e configurando, notoriamente,
a antecipação de pena.25 Conclui o autor que somente após a lei 12.403/2011, que
reformou parcialmente o CPP e modificou o art. 310, deixando claro que o Juiz, ao
receber o auto de prisão em flagrante, deve se manifestar fundamentando sua
decisão. As modificações que a Lei nº 12.403/2011 trouxe ao CPP, serão abordadas
com maior ênfase nos tópicos subsequentes dessa pesquisa.
Ainda, Melo refere que há outras garantias que os tratados internacionais de
direitos humanos introduziram ao processo penal brasileiro: como já citado acima,
anteriormente à Lei nº 12.403/2011, o Juiz decidia sobre a liberdade da pessoa
presa sem que ela e seu defensor tivessem a garantia de se manifestar, afrontando
mais um princípio, o da ampla defesa, uma vez que em um Estado Democrático de
Direito, somente o contraditório efetivo, legitima uma possível restrição de liberdade
individual antes da condenação. Melo critica o fato de que, somente 30 anos após a
promulgação da Constituição, uma verdadeira processualização no controle da
23
MAZZUOLI, Valério de Oliveira Direitos humanos, constituição e os tratados internacionais:
estudo analítico da situação e aplicação do Tratado na Ordem Jurídica Brasileira São Paulo:
Editora Juarez de Oliveira, 2001. p. 265.
24
Art. 5º, LVII o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas
hipóteses previstas em lei. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao
compilado.htm>. Acesso em: 22 mar. 2018.
25
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. p. 168.
21

prisão em flagrante e a de outras prisões, tem deixado de ser um ato solitário dos
Juízes e se torna uma decisão participativa, sobretudo da pessoa cuja liberdade está
em discussão.26
Ocorre que, mesmo com a alteração do art. 306 do CPP pela Lei nº
12.403/2011, não ficou claro que a pessoa detida em flagrante deveria ser
conduzida a presença de um Juiz. Assim sendo, a não observância do dispositivo no
direito doméstico, do direito do preso à audiência de custódia, foi preponderante
para a edição da Resolução nº 213 do CNJ. Trata-se, em suma, de fazer uma leitura
convencional do processo penal brasileiro, tema com o qual se ocupará o tópico
seguinte.

2.2 O Processo Penal Não Democrático e o Controle de Convencionalidade

Mesmo após a Constituição de 1988, ainda é possível encontrar, na


legislação infraconstitucional brasileira e na práxis de nossas instituições, resquícios
do longo período em que o país viveu sob regime ditatorial. A característica da
inquisitoriedade do processo penal brasileiro e das instituições que integram o
sistema punitivo do país, deve ser analisada levando em consideração que nosso
Código de Processo Penal é datado de 1941. Logo, é imprescindível que a
legislação interna sofra diretamente influência dos tratados Internacionais que dão
as garantias convencionais na aplicabilidade do CPP, particularmente frente às
prisões em flagrante. Para Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth, uma das provas de
que o Processo Penal brasileiro não é democratizado é a demora para implantação
da audiência de custódia ratificada pelo Brasil. Como já salientado, há mais de
décadas, e somente em 2015, por força da edição da Resolução nº 213, do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ)27 algumas capitais brasileiras começaram a
colocar em prática esta garantia que já estava presente em nosso ordenamento –
via ratificação do Decreto 678 – desde 1992.
Isso significa, de acordo com Lopes Jr. e Paiva, que, na contemporaneidade,
ao se aplicar o Código de Processo Penal “[...] mais do que buscar a conformidade

26
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016.
p.169-170.
27
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução nº 213, de 15/12/2015. Dispõe sobre a
apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Disponível em:
<http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 01 maio 2018.
22

constitucional” deve-se “[...] observar também a convencionalidade da lei aplicada,


ou seja, se ela está em conformidade com a Convenção Americana de Direitos
Humanos”.28
O controle de convencionalidade tem por finalidade compatibilizar as normas
domésticas com os tratados internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo
Estado. Para Mazzuoli, os tratados internacionais ratificados pelo Brasil são
recepcionados como normas constitucionais ou normas infraconstitucionais,
independentemente se ratificados antes da emenda constitucional 45/2004, ou
depois. Assim destaca o autor:

Em verdade, não importa o momento em que o tratado de direitos


humanos foi ratificado, se antes ou depois da Emenda 45/2004.
Entender que os tratados ratificados anteriormente à reforma
constitucional serão recepcionados como normas constitucionais, ao
passo que os ratificados posteriormente valerão como normas
infraconstitucionais, enquanto não aprovados pela maioria qualificada
estabelecida pelo § 3.º do art. 5.º, é prestigiar a incongruência. Em
ambos os casos (ratificação anterior ou posterior à Emenda 45) o
tratado terá status de norma constitucional, por integrar o núcleo
material do bloco de constitucionalidade, como já dissemos por mais
de uma vez.29

Isso significa dizer que os tratados internacionais de direitos humanos


ratificados pelo Brasil podem ser imediatamente aplicados pelo Poder Judiciário, no
Processo Penal, independentemente de serem aprovados de acordo com a regra do
§ 3.º do art. 5.º da Constituição (regra esta que já foi analisada no introito deste
capítulo). Assim sendo o controle de convencionalidade no Processo Penal poderá
será realizado tanto em âmbito doméstico quanto pela Corte Interamericana de
Direitos Humanos. Sobre o tema, sintetiza Mazzuoli:

Para os fins que interessam a este estudo, o que importa destacar é


o seguinte: quando não exercido o controle de convencionalidade
pelo Judiciário interno, a Corte Interamericana (em sua função
complementar das jurisdições nacionais) é que irá realizá-lo. De
modo que esse tipo de controle sempre será exercido, se não pelo

28
LOPES JR., Aury Celso; PAIVA, Caio. Audiência de custódia e a imediata apresentação do preso
ao juiz: rumo à evolução civilizatória do processo penal. Revista Liberdades, São Paulo, n. 17, p.
11-23, 2014. Disponível em: <http://revistaliberdades.org.br/_upload/pdf/22/artigo01.pdf>. Acesso
em: 25 mar. 2018.
29
MAZZUOLI, Valério de Oliveira O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 68.
23

Judiciário local, pelo órgão competente para realizar a interpretação


última da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.30

Diante do exposto, deve-se adequar os precedentes jurisprudenciais das


cortes internacionais que dão a interpretação adequada das normas convencionais.
Desse modo, a redação do art. 306 do CPP não pode ter o condão de afastar a
aplicação imediata dos artigos de tratados internacionais recepcionados pelo Brasil.31
A forma protocolar com que as audiências de custódias têm sido realizadas no
Brasil, demostra que no processo penal constitucional estamos avançando
vagarosamente. Há, ainda, muito a percorrer rumo à convencionalização e
efetivação dos Direitos Humanos nas práticas punitivas no País.32
No raciocínio de Mazzuoli, a Corte Interamericana, no exercício de sua
competência consultiva, não controla propriamente a convencionalidade das leis
perante os Estados-partes, ou seja, ela faz a aferição da convencionalidade e
determinada norma ou ato administrativo interno, tendo como paradigma a
Convenção Americana ou outro tratado de direitos humanos, conforme dispõe o art.
64, 1, da CADH33. Ainda caber citar o art. 64, 2, da CADH,34 que traz a
disponibilidade de um Estado membro, solicitar à corte a compatibilidade de suas
leis internas. Portanto, essa verificação da compatibilidade das leis internas com os

30
MAZZUOLI, Valério de Oliveira O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 164-165.
31
WERMUTH, Maiquel Ângelo Dezordi. Audiências de custódia e proteção/efetivação de direitos
humanos no Brasil. Revista Direitos Sociais e Políticas Públicas (unifafibe), Bebedouro, v. 5, n.
1, p. 330-349, 2017.
32
WERMUTH, Maiquel Ângelo Dezordi. A experiência das audiências de custódia no processo penal
e a crise da jurisdição brasileira: uma impossibilidade flagrante. Revista dos Instituto de
Hermenêutica Jurídica: RIHJ, Belo Horizonte, ano 9, n. 9/10, p. 200, 2011.
33
Art. 64.1 “Os Estados membros da Organização poderão consultar a Corte sobre a interpretação
desta Convenção ou de outros tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos
Estados americanos. Também poderão consultá-la, no que lhes compete, os órgãos enumerados
no capítulo X da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de
Buenos Aires”. COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). Convenção
americana sobre os direitos humanos: assinada na Conferência especializada interamericana
sobre direitos humanos, San José, Costa Rica, 22 nov. 1969. Disponível em: <http://www.
cidh.org/Basicos/ Portugues/c.Convencao_Americana.htm>. Acesso em: 22 nov. 2017.
34
Art. 64.2 “A Corte, a pedido de um Estado membro da Organização, poderá emitir pareceres sobre
a compatibilidade entre qualquer de suas leis internas e os mencionados instrumentos
internacionais.” COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). Convenção
americana sobre os direitos humanos: assinada na Conferência especializada interamericana
sobre direitos humanos, San José, Costa Rica, 22 nov. 1969. Disponível em: <http://www.cidh.
org/Basicos/ Portugues/c.Convencao_Americana.htm>. Acesso em: 22 nov. 2017.
24

tratados internacionais de direitos humanos, no âmbito da competência consultiva da


Corte, é que se deve nominar de aferição de convencionalidade.35
“A Corte, a pedido de um Estado membro da Organização, poderá emitir
pareceres sobre a compatibilidade entre qualquer de suas leis internas e os
mencionados instrumentos internacionais.”36
A incompatibilidade das normas domésticas com o texto constitucional torna
inválidas as leis assim declaradas. Sobre o tema, Luiz Flávio Gomes explica que a
lei que conflita com a Constituição é inconstitucional e inválida e a lei que conflita
com os Direitos Internacionais dos Direitos Humanos, mesmo seja anterior ou
posterior, também é inválida. Na era do Estado de Direito a produção da lei achava-
se cercada tão somente de limites formais (legitimidade para legislar, quorum
mínimo de aprovação de uma lei, procedimento para sua edição, forma de
publicação etc.). Porém, a partir do novo paradigma do Estado Constitucional de
Direito, a produção legislativa encontra mais limites formais e materiais, ou seja, não
pode violar o núcleo essencial de cada direito, não pode fazer restrições aos direitos
fundamentais.37
Dessa forma, na própria Constituição de 1988, entende-se que em se
tratando de Direitos Humanos provenientes de tratados internacionais em que o
Brasil seja parte, há de ser sempre aplicado, o princípio “pro homine”,
expressamente assegurado pelo art. 4.º, II, da Constituição.38
Nesse sentido, para Melo uma simples leitura da Resolução 213 do CNJ é
suficiente para constatar a importância ao tema que atende a diversas finalidades.
Entre elas, cita o autor que as principais são a prevenção e apuração de eventuais
maus-tratos e tortura contra os presos, a ampliação e aperfeiçoamento do controle
da legalidade e cautelaridade da prisão, sendo que, conforme veremos no decorrer
dessa pesquisa, o Brasil tem números enormes de presos provisórios, que nunca
estiveram na frente de um Juiz, réus que são presos provisoriamente e ao final do

35
MAZZUOLI, Valério de Oliveira O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 92-93.
36
COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). Convenção americana sobre
os direitos humanos: assinada na Conferência especializada interamericana sobre direitos
humanos, San José, Costa Rica, 22 nov. 1969. Disponível em: <http://www.cidh.org/Basicos/
Portugues/c.Convencao_ Americana.htm>. Acesso em: 30 mar. 2017.
37
GOMES, Luiz Flávio. Estado constitucional de direito e a nova pirâmide. 1. ed. São Paulo:
Premier Máxima, 2008. p. 65.
38
MAZZUOLI, Valério de Oliveira O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 129.
25

processo são absolvidos ou condenados a penas não privativas de liberdade. Ainda,


para Melo, a audiência de custódia é uma forma de instrumentalizar a garantia ao
contraditório em relação às medidas cautelares pessoais, principalmente a prisão
em flagrante. Sem mensurar ainda que a cada preso provisório, segundo o Ministro
Ricardo Lewandowiski, presidente do CNJ em 2017, orçou que o custo chegaria a
R$ 3.000,00 por mês. Se a audiência de custódia se desenvolvesse regularmente e
50% das prisões provisórias recebessem liberdades condicionadas, deixaria de
prender cerca de 120 mil pessoas em média, que não oferecem perigo a sociedade,
uma economia de mais de R$ 4 Bilhões de Reais aos cofres públicos.39
Em Porto Alegre a situação parece piorar, uma vez que a Defensoria Pública
acusa o Estado e o Judiciário de não cumprirem com as audiências de custódia,
acumulando pessoas presas em viaturas em frente às delegacias de polícia,
algemadas no sol dentro das viaturas, sem o mínimo de dignidade da pessoa
humana. Os números do ano de 2017 mostram que, entre janeiro e setembro de
2017, 58% das audiências de custódia não foram feitas, sendo que foram marcadas
1,5 mil, mas 880 delas não aconteceram. A situação tornou-se mais crítica a partir
de maio, quando o percentual de audiências não feitas passou de 65%, em junho,
para 79%, em setembro.40
“Em suma, todos os tratados que formam o corpus juris convencional dos
direitos humanos de que um Estado é parte servem como paradigma ao controle de
constitucionalidade/convencionalidade das normas infraconstitucionais”,41 nesse
sentido, concluímos esse capitulo, com base nos doutrinadores citados, que o
Processo Penal, embora com certo avanço, caminha de forma lenta para a
democratização.

39
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016.
p.161-165
40
JUSTIÇA e governo do RS são acusados de não fazerem audiência de custódia. Consultor Jurídico,
São Paulo, 10 jan. 2017. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-nov-10/defensoria-rs-afirma-
estado-nao-faz-audiencias-custodia> Acesso em: 19 abr. 2018.
41
MAZZUOLI, Valério de Oliveira O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 153.
26

3 A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA NO DIREITO COMPARADO

Neste capitulo, abordar-se-á como os países americanos e europeus têm se


posicionado frente à efetivação das audiências de custódia, bem como o atraso do
Legislativo e do Judiciário brasileiros para a adaptação e implantação de tal
procedimento no processo penal doméstico, uma vez que outros países da América
Latina já incorporaram o direito à audiência de custódia nas suas legislações internas –
a exemplo da Argentina, do Chile, da Colômbia e do México.
Observa-se que, diferentemente do que acontece na grande maioria das
comarcas brasileiras, nas quais um preso chega a levar mais de um ano para ter
acesso à primeira audiência, em países na América do Sul, esta audiência de
apresentação pode ocorrer em até 24 horas.
Nessa comparação cabe citar que, desde 1995, no artigo 236, §2º, do Código
Eleitoral brasileiro, já se prevê uma espécie de audiência de custódia para os
cidadãos presos cinco dias antes ou até 48 horas depois do processo eleitoral. 42

Art. 236. Nenhuma autoridade poderá, desde 5 (cinco) dias antes e


até 48 (quarenta e oito) horas depois do encerramento da eleição,
prender ou deter qualquer eleitor, salvo em flagrante delito ou em
virtude de sentença criminal condenatória por crime inafiançável, ou,
ainda, por desrespeito a salvo-conduto.
§ 2º Ocorrendo qualquer prisão o preso será imediatamente
conduzido à presença do juiz competente que, se verificar a
ilegalidade da detenção, a relaxará e promoverá a responsabilidade
do coator. (Grifo nosso)43

Nesse sentido, diante da ausência de uma disposição específica sobre a


audiência de custódia no direito interno brasileiro, passa-se, na segunda parte deste
capítulo, a uma abordagem acerca da Resolução nº 213 do CNJ, a qual, em face do
vácuo legislativo, tem servido como principal fonte de regulação das audiências de
custódia no país.
Preliminarmente, no entanto, convém salientar que o diagnóstico de pessoas
presas no Brasil, pesquisa realizada pelo Departamento de Monitoramento e
Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas

42
TÓPOR, Klayton Augusto Martins; NUNES, Andréia Ribeiro. Audiência de custódia: controle
jurisdicional da prisão em flagrante. 1. ed. Florianópolis, 2015. p. 119.
43
BRASIL. Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 [Código Eleitoral]. Institui o Código Eleitoral.
Disponível em: <https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/91631/codigo-eleitoral-lei-4737-65#
art-236>. Acesso em: 22 nov. 2017.
27

Socioeducativas (DMF), já mostrava em 2015 que o Brasil lidera o ranking de pessoas


presas comparado com países da América, Europa e África, sendo que no ranking
mundial, passou a ocupar a terceira posição, perdendo apenas para USA e China, se
computadas as prisões domiciliares.
O crescente número de pessoas presas no Brasil tem chamado atenção das
autoridades políticas e judiciárias, uma vez que esse número ultrapassou os 726 mil
presos em 2016, conforme demonstrado no gráfico abaixo, o que representa um
aumento superior a 700% quando comparado com a década de 1990. O índice
acendeu o sinal de alerta no sistema carcerário brasileiro, uma vez que, do número
total de presos, cerca de 40% são presos provisórios. 44

Gráfico 1 - Número de pessoas presas

Fonte: Santos. 45

Tais dados revelam a importância e a urgência da implementação das


audiências de custódia no país, uma vez que, em contrapartida, os índices mostram
que, após a implantação das audiências de custódia, mesmo não sendo ainda
realizadas conforme determinam as convenções internacionais, como se verá mais
adiante, elas têm contribuído para a redução de prisões temporárias, demonstrando
eficácia no combate à superlotação no sistema carcerário brasileiro, além de

44
SANTOS, Thandara (Org.). Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias: INFOPEN
atualização - junho de 2016. Colaboração Marlene Inês da Rosa. Brasília, DF: Ministério da Justiça e
Segurança. Departamento Penitenciário Nacional, 2017. p. 9. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/
news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil/relatorio_2016_junho.pdf>. Acesso em: 22 nov. 2017.
45
SANTOS, Thandara (Org.). Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias: INFOPEN
atualização - junho de 2016. Colaboração Marlene Inês da Rosa. Brasília, DF: Ministério da Justiça e
Segurança. Departamento Penitenciário Nacional, 2017. p. 9. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/
news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil/relatorio_2016_junho.pdf>. Acesso em: 22 nov. 2017.
28

contribuir para o sistema funcionar melhor, reduzindo, reflexamente, o gasto


orçamentário da União com o sustento dos presos.

3.1 Origem, Conceito e Evolução das Audiências de Custódia: uma análise a


partir do Direito Comparado

No contexto legislativo americano, a primeira menção à audiência de custódia


surgiu em 1966, com o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos. Em seu
artigo 9º, item 3, o referido Tratado preconiza:

3. Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração


penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de
outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o
direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em
liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento
não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá estar
condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da
pessoa em questão à audiência, a todos os atos do processo e, se
necessário for, para a execução da sentença46.

Da mesma forma, a CADH, promulgada em 1969, no mesmo sentido da


disposição do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, em seu artigo 7º,
apartado 5, dispõe que:

5. Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à


presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer
funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo
razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga
o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que
assegurem o seu comparecimento em juízo.47

Cabe lembrar que os tratados supracitados, foram ratificados pelo Brasil em


06 de julho de 1992 e 06 de novembro de 1992 respectivamente. A ratificação
significa que, diante do cenário internacional, desde então, o Brasil deve cumprir os
tratados.

46
BRASIL. Decreto nº 592 de 06 de julho de 1992. Atos Internacionais. Pacto Internacional sobre
Direitos Civis e Políticos. Promulgação. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
decreto/1990-1994/d0592.htm>. Acesso em: 26 jan. 2018.
47
COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). Convenção americana sobre
os direitos humanos: assinada na Conferência especializada interamericana sobre direitos
humanos, San José, Costa Rica, 22 nov. 1969. Disponível em: <http://www.cidh.org/Basicos/
Portugues/c.Convencao_ Americana.htm>. Acesso em: 22 nov. 2017.
29

A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte-IDH), sobre as


audiências de custódia e o que elas representam, já salientou que elas se afiguram
como

[...] um meio de controle idôneo para evitar as capturas arbitrárias e


ilegais. O controle judicial imediato é uma medida tendente a evitar a
arbitrariedade ou ilegalidade das detenções, tomando em conta que
num Estado de Direito corresponde ao julgador garantir os direitos do
detido, autorizar a adoção de medidas cautelares ou de coerção
quando seja estritamente necessário e procurar, em geral, que se
trate o não culpado de maneira coerente com a presunção de
inocência. (CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS,
Caso Acosta Calderón Vs. Equador, 2005, tradução nossa).48

Do exposto, evidencia-se que a Corte Interamericana de Direitos Humanos,


através dos tratados internacionais de Direitos Humanos acima mencionados, tem
ressaltado a importância e a necessidade da realização das audiências de custódia.
Para Pablo Rodrigo Alflen, durante algum tempo foi entendido que as audiências de
custódias seriam apenas para aqueles presos em flagrante delito. Porém, com uma
análise cuidadosa dos textos internacionais, o autor estabelece que o direito está
previsto para as pessoas presas ou detidas. Referindo-se ao primeiro grupo, cita
aquelas presas em virtude de uma prisão cautelar ou definitiva; já a pessoa detida
seria aquela que sofre privação de liberdade por ter sido pega em flagrante delito.
Assim, coube à jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos
esclarecer que o público-alvo da audiência de custódia seria composto tanto pelas
pessoas detidas em flagrante quanto por aquelas pessoas presas a título de início
de cumprimento de pena.49
Alflen completa o raciocínio salientando que as audiências de custódias têm
por objetivo cessar ou evitar o risco de ocorrências de violação à incolumidade física
ou psíquica, tais como maus-tratos dos indivíduos que tiveram sua liberdade privada
em razão de prisão cautelar ou definitiva,50 Para Cristian Vicencio Arias os objetivos
da audiência de custódia consistem em: a) averiguar a ocorrência de algum tipo de

48
CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Acosta Calderón Vs. Ecuador.
Sentencia de 24 de junio de 2005 (Fondo, Reparaciones y Costas). [S.l.], 2005. Disponível em: <http://
www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_129_esp1.pdf> Acesso em: 01 maio 2018.
49
ALFLEN, Pablo Rodrigo. Resolução 213 do CNJ - artigo 1º. In: ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN,
Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia: comentários à Resolução 213 do Conselho Nacional de
Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017. p. 17-18.
50
ALFLEN, Pablo Rodrigo. Resolução 213 do CNJ - artigo 1º. In: ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN,
Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia: comentários à Resolução 213 do Conselho Nacional de
Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017. p. 19-21.
30

violência porventura praticada contra a pessoa apresentada, em particular, tortura e


maus-tratos; b) identificar corretamente a pessoa apresentada, a fim de confirmar se
ela é realmente a pessoa contra quem foi expedida a ordem de prisão; c) ouvir a
pessoa apresentada acerca das circunstâncias que realizou a prisão pelas
autoridades públicas; d) verificar a legalidade do ato da prisão, bem como se não se
encontra extinta a punibilidade. 51
Observando a realização das audiências de custódia em países europeus e
latinos, Thiago André Pierobom de Ávila relata em sua pesquisa as várias e
semelhantes formas adotadas pelos países em favor do cumprimento das
Convenções Internacionais que preveem a realização das referidas audiências.
Em Portugal, por exemplo, em casos urgentes nos quais não é possível
apresentar imediatamente o detido ao juiz de instrução, poderá ocorrer um
interrogatório sumário pelo Ministério Público, seguido do posterior interrogatório
pelo juiz de instrução. Naquele país, quando uma pessoa é detida, ela deve ser
apresentada, no prazo máximo de 48 horas, ao juiz de instrução. Esse primeiro
interrogatório deverá ser realizado por um juiz e não pela autoridade policial.
Verifica-se, assim, um cuidado especial da legislação portuguesa para com o
primeiro interrogatório do investigado detido, momento que as arbitrariedades são as
mais excessivas.52
Na Itália, nos casos de pessoas presas em flagrante delito, a polícia poderá
realizar o interrogatório do investigado em três ocasiões: a) mediante conversa
informal no local dos fatos e logo após a prática da infração penal; b) mediante
entrevista com o investigado que não está preso; c) mediante interrogatório por
delegação específica do Ministério Público, apenas para o caso de investigado solto.
Em seguida, a legislação italiana prevê a necessidade de se requerer ao juiz a
audiência de convalidação. Nesse ato, o juiz avalia os requisitos para manter ou não
as medidas cautelares. Isso significa que, se o investigado está em liberdade,
aceita-se a possibilidade de o interrogatório ser realizado pela Polícia, mas se ele
está preso em flagrante, reserva-se a realização do interrogatório ao Ministério
Público, como uma garantia adicional de que ele não sofrerá quaisquer formas de

51
ARIAS, Cristian Vicencio. El control jurisdicional de la detención. REJ – Revista de Estudios de la
Justiça, Santiago de Chile, n. 6, p. 245-246, 2005.
52
ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Audiência de custódia Avanços e desafios. RIL, Brasília, DF, ano
53, n. 211, p. 306-307, jul./set. 2016. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/525429/001078852.pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 abr. 2018.
31

pressão indevidas no ambiente policial. O prazo para esse interrogatório é de no


máximo de 48 horas da detenção.53
Na Alemanha, a legislação prevê que toda pessoa presa deve ser levada, até
o final do dia seguinte à sua prisão, à presença de um juiz, mesmo que o preso
tenha sido detido em razão do cumprimento de um mandado de prisão. O Juiz será
o primeiro a fazer o interrogatório do investigado preso. Após, o magistrado definirá
se decreta a prisão preventiva ou se libera a pessoa presa para responder ao
processo em liberdade. Após a oitiva do acusado pelo juiz, o Ministério Público e a
polícia poderão colher novos interrogatórios, a fim de prosseguir com o curso da
investigação. O prazo não pode ultrapassar o final da tarde seguinte à realização da
prisão. Assim, caso o Juiz competente não possa realizar a audiência de custódia, a
pessoa presa será apresentada ao Juiz local que fará a oitiva no prazo estipulado.54
A Espanha estabelece como regra apresentar o preso em no máximo 24
horas ao juiz mais próximo ao local da detenção. Não sendo possível a observância
desse prazo, a pessoa detida deverá ser colocada em liberdade, sob pena de
responsabilidade criminal do agente que manteve a constrição. Embora o prazo
previsto seja de 24 horas, entre os países estudados da Europa nesse capítulo, a
Espanha é a que mais alonga o prazo para a oitiva da pessoa presa perante o Juiz,
uma vez que determina o prazo de 72 horas. Ainda, se por motivos de força maior
não for possível a realização da audiência nesse prazo, é possível ao juiz decidir
monocraticamente e designar outra audiência para as 72 horas seguintes, e não é
vedada a realização do interrogatório também pela polícia. Somente após é que o
juiz decidirá, convertendo a detenção em prisão ou concedendo liberdade ao réu.55
Na França, diferentemente dos demais países acima estudados, a polícia
pode analisar em até 24 horas se a manutenção da detenção é necessária, se os
direitos do detido estão sendo respeitados e, a qualquer momento, pode ordenar a
apresentação da pessoa detida ao Ministério Público, que fará o interrogatório por
vídeo conferência, que poderá pedir pela prisão preventiva, sua imediata liberação,

53
ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Audiência de custódia Avanços e desafios. RIL, Brasília, DF, ano
53, n. 211, p. 307-308, jul./set. 2016. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/
id/525429/001078852.pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 abr. 2018.
54
ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Audiência de custódia Avanços e desafios. RIL, Brasília, DF,
ano 53, n. 211, p. 308, jul./set. 2016. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/525429/001078852.pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 abr. 2018.
55
ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Audiência de custódia Avanços e desafios. RIL, Brasília, DF,
ano 53, n. 211, p. 309, jul./set. 2016. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/525429/001078852.pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 abr. 2018.
32

ou a prorrogação da detenção por mais 24 horas em nos casos de criminalidade


ordinária e por mais 48 horas em casos de criminalidade organizada. Observa-se
que na França, o Juiz necessariamente não ouvirá o preso, assim como não é
vedado o interrogatório policial.56
Olhando para os países latinos, pode-se aferir que, no Chile, o interrogatório
perante a polícia só se dará na presença do defensor do acusado. Ainda, o Código
de Processo Penal chileno determina que, em casos de flagrante, o suspeito seja
apresentado dentro de 12 horas a um promotor, que poderá soltá-lo ou apresentá-lo a
um juiz no prazo de 24 horas da prisão57.
No México, o recente Código de Processo Penal nacional, prevê que o
investigado preso terá oportunidade de prestar declarações apenas na audiência de
custódia, na presença do juiz, Ministério Público e defensor. Naquele país, para a
maioria dos tipos penais, as pessoas detidas em flagrante precisam ser entregues
imediatamente aos promotores, que devem apresentar os suspeitos a um juiz no prazo
de 48 horas ou liberá-los58.
A regra semelhante existe na Argentina, que a partir de 2014, através de
alterações no Código de Processo Penal, proibiu o interrogatório perante a polícia,
permitindo-o apenas perante o Ministério Público ou o juiz de controle. O Código de
Processo Penal argentino exige que, em casos de prisão sem ordem judicial, o detento
compareça perante uma autoridade judicial competente no prazo de seis horas após a
prisão 59.
Por fim, é possível observar regra semelhante no direito processual penal
colombiano. Na Colômbia, o Código de Processo Penal prevê que, em casos de
flagrante, o detento precisa ser apresentado ao juiz no prazo de 36 horas60.

56
ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Audiência de custódia Avanços e desafios. RIL, Brasília, DF,
ano 53, n. 211, p. 310, jul./set. 2016. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/525429/001078852.pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 abr. 2018.
57
ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Audiência de custódia Avanços e desafios. RIL, Brasília, DF,
ano 53, n. 211, p. 310, jul./set. 2016. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/525429/001078852.pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 abr. 2018.
58
ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Audiência de custódia Avanços e desafios. RIL, Brasília, DF,
ano 53, n. 211, p. 310, jul./set. 2016. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/525429/001078852.pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 abr. 2018.
59
ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Audiência de custódia Avanços e desafios. RIL, Brasília, DF,
ano 53, n. 211, p. 310, jul./set. 2016. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/525429/001078852.pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 abr. 2018.
60
ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Audiência de custódia Avanços e desafios. RIL, Brasília, DF,
ano 53, n. 211, p. 310, jul./set. 2016. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/525429/001078852.pdf?sequence=1>. Acesso em: 26 abr. 2018.
33

Observa-se, do exposto, que inúmeros países vêm adaptando suas


legislações internas às convenções internacionais de proteção de direitos humanos.
Nesse breve panorama do Direito estrangeiro, há evidências da tendência para que
haja um procedimento de apresentação imediata e pessoal do preso ao juiz para se
converter a detenção policial em prisão preventiva, protegendo-o, assim, do arbítrio
policial.
No âmbito doméstico, na Constituição Federal, no Código de Processo Penal
– consoante análise já empreendida no capítulo anterior –, e na Resolução nº 213 do
CNJ, é possível extrair algumas citações reportadas à audiência de custódia. No
Texto Constitucional, cumpre salientar a disposição no sentido de que “[...] a prisão
de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente
ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada (artigo 5º,
LXII)61.
Já a Resolução 213 do CNJ, que será ponto de estudo do próximo tópico, é
explícita ao determinar, em seu art. 1º, que

[...] toda pessoa presa em flagrante delito, independentemente da


motivação ou natureza do ato, seja obrigatoriamente apresentada,
em até 24 horas da comunicação do flagrante, à autoridade judicial
competente, e ouvida sobre as circunstâncias em que se realizou sua
prisão ou apreensão62.

Observa-se, nesse sentido, que na Constituição de 1988, o Brasil já tinha


previsto dentre os direitos fundamentais a garantia do indivíduo preso ter acesso à
comunicação imediata ao juiz e à família. Porém, anos antes, em 16 de dezembro
de 1966, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos já previa em sua
redação ao artigo supracitado, que o Brasil veio a ser signatário somente com o
Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992. Do mesmo modo a já citada CADH, ratificada
pelo Brasil através do Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992.
Diante do exposto, observa-se a jornada que deu origem à implementação da
audiência de custódia no Brasil. Comparado com os países citados neste tópico,
evidencia-se que o Brasil segue com um longo atraso, uma vez que somente no

61
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao compilado.htm>.
Acesso em: 22 mar. 2018.
62
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução nº 213, de 15/12/2015. Dispõe sobre a
apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Disponível em:
<http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 01 maio 2018.
34

Estado de São Paulo, no período entre os dias 20 de dezembro de 2016 e 6 de


janeiro de 2017, presos que não tiveram acesso à audiência de custódia, somaram o
número de 134163.
A seguir, será abordada com maior ênfase a posição do Direito interno brasileiro
frente à Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça, a fim de se entender como
esta Resolução surgiu e como vem sendo aplicada pelo Judiciário nacional.

3.2 As audiências de Custódia no Brasil: a Resolução nº 213 do Conselho


Nacional de Justiça

Antes de introduzir o estudo das audiências de custódia a partir da análise da


Resolução nº 213 do CNJ, cabe analisar os principais motivos que levaram o referido
órgão, em 15 de dezembro de 2015, a editar a Resolução em comento. Conforme será
apresentado no próximo capítulo, mesmo após a reforma parcial que alterou alguns
artigos do CPP, entre eles o art. 306, a alteração não deixou claro que a pessoa detida
em flagrante delito deveria ser apresentada, juntamente com o auto de prisão em
flagrante, perante um Juiz, no prazo “breve” a que se referem os tratados internacionais.
Assim, em 2015, o CNJ, visando a cumprir as exigências convencionais,
considerando o art. 9º, item 3, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos
das Nações Unidas, 64 bem como o art. 7º, item 5, da Convenção Americana sobre
Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica)65, e, ainda, a decisão liminar
proferida pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da Arguição de Descumprimento

63
DEFENSORIA cobra que juízes ouçam os 1.341 presos em São Paulo durante o recesso.
Consultor Jurídico, São Paulo, 10 jan. 2017. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-
jan-10/defensoria-cobra-juizes-oucam-1341-presos-sp-recesso> Acesso em: 12 fev. 2018.
64
Art. 9ª, item 3º. “Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser
conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer
funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A
prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a
soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em
questão à audiência, a todos os atos do processo e, se necessário for, para a execução da
sentença.” BRASIL. Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992. Atos Internacionais. Pacto
Internacional sobre Direitos Civis e Políticos. Promulgação. Anexo o Pacto internacional sobre
direitos civis e políticos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/
d0592.htm>. Acesso em: 01 maio 2018.
65
Art. 7º, item 5. “Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um
juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada
dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o
processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento
em juízo.” COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). Convenção
americana sobre os direitos humanos: assinada na Conferência especializada interamericana
sobre direitos humanos, San José, Costa Rica, 22 nov. 1969. Disponível em: <http://www.cidh.org/
Basicos/Portugues/c.Convencao_ Americana.htm>. Acesso em: 22 nov. 2017.
35

de Preceito Fundamental nº 347, que considerou cabível arguição de


descumprimento de preceito fundamental pela situação degradante das
penitenciárias no Brasil, violação massiva de direitos fundamentais e falhas
estruturais e a não observância obrigatória das audiências de custódia, editou a
Resolução que será nesse tópico analisada com maior profundidade.
Ainda, o CNJ levou em consideração, na edição da Resolução em comento, o
que dispõe a letra "a" do inciso I do art. 96 da Constituição Federal, que defere aos
tribunais a possibilidade de tratarem da competência e do funcionamento dos seus
serviços e órgãos jurisdicionais e administrativos. Também foram levadas em
consideração:

a) a decisão prolatada na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5240 do


Supremo Tribunal Federal, declarando a constitucionalidade da disciplina
pelos Tribunais da apresentação da pessoa presa à autoridade judicial
competente;
b) o relatório produzido pelo Subcomitê de Prevenção à Tortura da ONU;
c) o diagnóstico de pessoas presas apresentado pelo CNJ e o INFOPEN do
Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça (DEPEN/MJ);
d) o fato de que a prisão, conforme previsão constitucional (CF, art. 5º, LXV,
LXVI), é medida extrema que se aplica somente nos casos expressos em lei e
quando a hipótese não comportar nenhuma das medidas cautelares
alternativas;
e) as inovações introduzidas no Código de Processo Penal pela Lei 12.403, de 4
de maio de 2011;
f) a prevenção prevista no art. 5.2 da Convenção Americana de Direitos
Humanos e no art. 2.1 da Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos
ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes;
g) o disposto na Recomendação CNJ 49 de 1º de abril de 2014 e a decisão
plenária tomada no julgamento do Ato Normativo 0005913-
65.2015.2.00.0000, na 223ª Sessão Ordinária, realizada em 15 de dezembro
de 2015.66

66
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução nº 213, de 15/12/2015. Dispõe sobre a
apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Disponível em:
<http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 01 maio 2018.
36

Frente a essas diretrizes, a Resolução nº 213 do CNJ veio dar um “norte”,


para a realização das audiências de custódias no Brasil. A partir da Resolução, foi
que as audiências de custódias tiveram um regramento interno, o que já era
proposta de Projeto de Lei do Senado desde 2011, conforme veremos salientado no
capítulo a frente. As regularizações das audiências de custódias começam a dar,
então, uma visão mais ampla e concreta de como seria a sua realização dentro do
ordenamento jurídico Brasileiro e frente às disposições do Código de Processo
Penal.
A Resolução nº 213 expressa, em seu artigo 1º, que toda pessoa presa em
flagrante delito, independentemente da motivação ou natureza do ato, deve ser
obrigatoriamente apresentada, em até 24 horas da comunicação do flagrante, à
autoridade judicial competente, e ouvida sobre as circunstâncias em que se realizou
sua prisão ou apreensão. Já o artigo 2º dispõe que, no caso de aplicação da prisão
preventiva, será de responsabilidade da Secretaria de Administração Penitenciária
ou da Secretaria de Segurança Pública, a apresentação do indivíduo no prazo
supracitado ao poder judiciário.67
O texto da Resolução ainda trata especificamente como deve ser realizada a
audiência de custódia. Douglas Fischer68, em Comentários à Resolução 213,
descreve os procedimentos durante a realização da audiência de custódia, previstos
no artigo 8º da Resolução. O juiz deverá esclarecer à pessoa presa que se trata de
audiência de custódia, ressaltando as questões que serão analisadas naquele
momento, advertindo o preso o direito de permanecer calado bem como a não
obrigatoriedade do uso de algemas, observando a Súmula Vinculante nº 1169 do
Supremo Tribunal Federal, que dispõe que

Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado


receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por
parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por
escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do
agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato

67
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução nº 213, de 15/12/2015. Dispõe sobre a
apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Disponível em: <http:
//www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 01 maio 2018.
68
FISCHER, Douglas. O procedimento da audiência de custódia nos termos da Resolução 213 do CNJ -
artigo 8°. In: ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia:
comentários à Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2017. p. 101-102.
69
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula vinculante nº 11. Disponível em: <http://www.stf.jus.
br/portal/jurisprudencia/menuSumario.asp?sumula=1220>. Acesso em: 01 maio 2018.
37

processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do


Estado. (Publicado no DJ de 22.8.2008)

Os primeiros três incisos do artigo 8º da Resolução dispõem que a autoridade


judicial, ao entrevistar a pessoa presa em flagrante, deverá:

I - esclarecer o que é a audiência de custódia, ressaltando as


questões a serem analisadas pela autoridade judicial;
II - assegurar que a pessoa presa não esteja algemada, salvo em
casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à
integridade física própria ou alheia, devendo a excepcionalidade ser
justificada por escrito;
III - dar ciência sobre seu direito de permanecer em silêncio. (Grifo
nosso)70.

Seguindo a interpretação de Fischer, e de acordo com o inciso IV do art. 8º da


Resolução, na sequência o juiz deve reforçar ao preso que os seus direitos
constitucionais sejam garantidos, além do já citado direito de permanecer em
silêncio (inciso III), também o de consultar um advogado e comunicar-se com a sua
família. Para o sobredito autor, a soma desses incisos integra o rol das garantias
constitucionais de ampla defesa previstas na Constituição Federal (art. 5º, LXIII).71
Nos incisos V a VI, o art. 8º da Resolução dispõe que o juiz deverá indagar o
preso acerca das circunstâncias de sua prisão, bem como sobre o tratamento por
ele recebido em todos os lugares pelos quais passou antes da apresentação na
audiência de custódia, a fim de aferir se houve ocorrência de torturas ou maus
tratos. Dispõem os referidos dispositivos:

IV - questionar se lhe foi dada ciência e efetiva oportunidade de


exercício dos direitos constitucionais inerentes à sua condição,
particularmente o direito de consultar-se com advogado ou defensor
público, o de ser atendido por médico e o de comunicar-se com seus
familiares;
V - indagar sobre as circunstâncias de sua prisão ou apreensão;
VI - perguntar sobre o tratamento recebido em todos os locais por
onde passou antes da apresentação à audiência, questionando sobre

70
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução nº 213, de 15/12/2015. Dispõe sobre a
apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Disponível em: <http://
www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 01 maio 2018.
71
Art. 5º LXIII –o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado,
sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado. BRASIL. Constituição (1988).
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 03 maio 2018.
38

a ocorrência de tortura e maus tratos e adotando as providências


cabíveis; 72

No inciso VII do art. 8º da Resolução aborda-se o exame de corpo de delito:


se foi realizado de forma correta, se não foi realizado e/ou seus registros são
insuficientes. Nesse último caso, se o Juiz competente reputar que os dados
existentes no laudo de exame de corpo de delito são insuficientes, deverá mandar
que outro seja feito. Segue-se a mesma previsão caso os exames de corpo de delito
foram realizados antes do preso sofrer tortura e maus tratos, hipótese na qual
deverão ser realizados novos exames73:

VII - verificar se houve a realização de exame de corpo de delito,


determinando sua realização nos casos em que:
a) não tiver sido realizado;
b) os registros se mostrarem insuficientes;
c) a alegação de tortura e maus tratos referir-se a momento posterior
ao exame realizado;
d) o exame tiver sido realizado na presença de agente policial,
observando-se a Recomendação CNJ 49/2014 quanto à formulação
de quesitos ao perito;

Os incisos seguintes, VIII e IX, estabelecem ser vedado ao juiz formular


perguntas investigativas referentes ao ato ilícito que originou a prisão em flagrante.
Isso significa que a audiência de custódia não tem a finalidade de produzir provas.
Pelo contrário, ela tem por objetivo aferir se na prisão não houve violação de direitos
fundamentais, bem como se será possível ou não a aplicação de medidas cautelares
que não sejam a prisão e, ainda, sanar possíveis irregularidades no ato de prisão em
flagrante.74

VIII - abster-se de formular perguntas com finalidade de produzir


prova para a investigação ou ação penal relativas aos fatos objeto do
auto de prisão em flagrante;

72
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução nº 213, de 15/12/2015. Dispõe sobre a
apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Disponível em: <http://
www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 01 maio 2018.
73
FISCHER, Douglas. O procedimento da audiência de custódia nos termos da Resolução 213 do CNJ -
artigo 8°. In: ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia:
comentários à Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2017. p. 104.
74
FISCHER, Douglas. O procedimento da audiência de custódia nos termos da Resolução 213 do CNJ -
artigo 8°. In: ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia:
comentários à Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2017. p. 105 e 107.
39

IX - adotar as providências a seu cargo para sanar possíveis


irregularidades;75

No inciso X do art. 8º da Resolução, resta evidente o dever do Juiz de analisar


visualmente e perguntar a hipótese de gravidez, a existência de filhos ou
dependentes, histórico de doenças graves incluindo transtornos psíquicos e
dependências químicas, para assim analisar a possibilidade de liberdade provisória,
sem ou com medidas cautelares. Logo após, o Ministério Publico fará as perguntas,
podendo ser indeferidas perguntas com finalidades investigativas sobre o mérito que
levou à prisão em flagrante:

X - averiguar, por perguntas e visualmente, hipóteses de gravidez,


existência de filhos ou dependentes sob cuidados da pessoa presa
em flagrante delito, histórico de doença grave, incluídos os
transtornos mentais e a dependência química, para analisar o
cabimento de encaminhamento assistencial e da concessão da
liberdade provisória, sem ou com a imposição de medida cautelar.

Por fim, a defesa técnica poderá considerar suas perguntas, sempre nessa
ordem: oitiva do preso – Ministério Público – Defesa76. Logo após, o Juiz definirá as
medidas constantes dos incisos do § 1º do art. 8º, a saber:

§ 1º Após a oitiva da pessoa presa em flagrante delito, o juiz


deferirá ao Ministério Público e à defesa técnica, nesta ordem,
reperguntas compatíveis com a natureza do ato, devendo indeferir as
perguntas relativas ao mérito dos fatos que possam constituir
eventual imputação, permitindo-lhes, em seguida, requerer (grifo
nosso)
I - o relaxamento da prisão em flagrante;
II - a concessão da liberdade provisória sem ou com aplicação de
medida cautelar diversa da prisão;
III - a decretação de prisão preventiva;
IV - a adoção de outras medidas necessárias à preservação de
direitos da pessoa presa. (Grifo nosso).77

75
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução nº 213, de 15/12/2015. Dispõe sobre a
apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Disponível em: <http://
www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 01 maio 2018.
76
FISCHER, Douglas. O procedimento da audiência de custódia nos termos da Resolução 213 do
CNJ - artigo 8°. In: ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de
custódia: comentários à Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2017. p. 105-106.
77
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução nº 213, de 15/12/2015. Dispõe sobre a
apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Disponível em: <http://
www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 01 maio 2018.
40

Os incisos seguintes são procedimentos previstos que tratam de ações que


não são novidades no Processo Penal Brasileiro. A gravação da oitiva da pessoa
presa deve ser, preferencialmente em mídia, a qual já é prevista no art. 405, § 1º do
CPP. Assim, garante-se comprovação de que todas as medidas foram adotadas
durante a audiência de custódia e a fiel reprodução de tudo que foi dito pela pessoa
presa, contendo na ata apenas o resumo e a deliberação fundamentada do Juiz
quanto à legalidade e manutenção da prisão, cabimento de liberdade provisória sem
ou com imposição de medidas cautelares. O Juiz também deverá fazer constar em
ata as medidas tomadas quanto à existência de indícios de tortura ou maus tratos.
Concluindo a audiência, deverá entregar cópia da ata ao preso em flagrante, ao
defensor e ao Ministério Público78:

§ 2º A oitiva da pessoa presa será registrada, preferencialmente, em


mídia, dispensando-se a formalização de termo de manifestação da
pessoa presa ou do conteúdo das postulações das partes, e ficará
arquivada na unidade responsável pela audiência de custódia.
§ 3º A ata da audiência conterá, apenas e resumidamente, a
deliberação fundamentada do magistrado quanto à legalidade e
manutenção da prisão, cabimento de liberdade provisória sem ou
com a imposição de medidas cautelares diversas da prisão,
considerando-se o pedido de cada parte, como também as
providências tomadas, em caso da constatação de indícios de tortura
e maus tratos.
§ 4º Concluída a audiência de custódia, cópia da sua ata será
entregue à pessoa presa em flagrante delito, ao Defensor e ao
Ministério Público, tomando-se a ciência de todos, e apenas o auto
de prisão em flagrante, com antecedentes e cópia da ata, seguirá
para livre distribuição.79

O Juiz poderá, após concluir a audiência de custódia, adotar três medidas: a)


relaxar a prisão por ilegalidade no flagrante; b) conceder liberdade com ou sem
medidas cautelares; c) determinar o imediato arquivamento do inquérito80. Tal é o
teor do § 5º do art. 8º da Resolução em análise:

78
FISCHER, Douglas. O procedimento da audiência de custódia nos termos da Resolução 213 do CNJ -
artigo 8°. In: ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia:
comentários à Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2017. p. 110-111.
79
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução nº 213, de 15/12/2015. Dispõe sobre a
apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Disponível em: <http://
www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 01 maio 2018.
80
FISCHER, Douglas. O procedimento da audiência de custódia nos termos da Resolução 213 do CNJ -
artigo 8°. In: ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia:
comentários à Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2017. p. 112.
41

§ 5º Proferida a decisão que resultar no relaxamento da prisão em


flagrante, na concessão da liberdade provisória sem ou com a
imposição de medida cautelar alternativa à prisão, ou quando
determinado o imediato arquivamento do inquérito, a pessoa
presa em flagrante delito será prontamente colocada em liberdade,
mediante a expedição de alvará de soltura, e será informada sobre
seus direitos e obrigações, salvo se por outro motivo tenha que
continuar presa. (grifo nosso).81

Conclui-se, do exposto, que grande parte dos procedimentos adotados para a


realização da audiência de custódia já se encontram positivados no ordenamento
jurídico brasileiro. Mesmo assim, como já tratado nesse trabalho de pesquisa, o
Processo Penal nacional, não democratizado, ainda necessita da criação de uma
Resolução pelo Conselho Nacional de Justiça para atentar para o cumprimento
mínimo da proteção de direitos humanos imposta pelos tratados internacionais.
De acordo com Mauro Fonseca Andrade, os conflitos de interesses entre as
polícias judiciárias e o poder judiciário, por um lado, em apresentar o sujeito preso e,
por outro, de predefinir os horários para a apresentação, respectivamente, geram
articulações que começam a ser feitas para que o preso em flagrante, ao invés de
ficar na delegacia (onde não há o mínimo de estrutura para a permanência superior
ao prazo de 24 horas), seja levado ao presídio e de lá apresentado ao poder
judiciário, ficando, assim, a polícia penitenciária responsável pela apresentação. A
crítica vem justamente por levar o indivíduo entrar no sistema prisional, colidindo
justamente com o caput do artigo 2º da Resolução, que dispõe que o ingresso do
sujeito flagrado em unidade prisional somente se dará em razão do decreto de
prisão preventiva. Por outro lado, o mesmo artigo cita a Secretaria da Administração
Penitenciária. Porém, se refere a presos que já possuem condenação ou preventiva
decretada e que com sua localização, após a lavratura da prisão, nada impede de
ser levado ao sistema prisional e de lá a polícia penitenciária apresentá-lo à
audiência de custódia.82

81
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Atos administrativos resolução nº 213 de 15/12/
2015. Dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24
horas. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059>. Acesso em: 12
fev. 2018.
82
ANDRADE, Mauro Fonseca. Resolução 213 do CNJ - artigo 2º. In: ANDRADE, Mauro Fonseca;
ALFLEN, Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia: comentários à Resolução 213 do Conselho
Nacional de Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017. p. 45-46.
42

Para Andrade, “[...] a intenção daquela norma e dos próprios textos


internacionais mencionados, é que haja uma prevenção do sujeito preso ou detido,
de modo a ele não ter contato indevido com outros sujeitos já institucionalizados”. 83
Outrossim, chama a atenção o caput do artigo 4º da Resolução: “[...] a
audiência de custódia será realizada na presença do Ministério Público e da
Defensoria Pública, caso a pessoa detida não possua defensor constituído no
momento da lavratura do flagrante.” Para Caio Paiva, a controvérsia deste artigo
com o artigo subsequente, que faculta à pessoa presa a constituir advogado de sua
confiança, não havendo de se falar, portanto, em assistência jurídica compulsória
pela defensoria pública, uma vez que tal direito é garantido pela Constituição
Federal/88 em decorrência da ampla defesa (Artigo 5°, LV), está expressamente
assegurado em tratados internacionais de Direitos Humanos que o Brasil
voluntariamente ratificou, a exemplo o PIDCP (art. 14.3.b.d) e a CADH (art. 8.e.d).
Por outro lado, caso o preso em flagrante não tenha advogado privado, a LC
80/1994 prevê, como dever dos membros da Defensoria Pública, “atender ao
expediente forense e participar dos atos judiciais quando for obrigatória sua
presença” (Art. 45, V, 90, V, e 129, V).84
Pode-se dizer que se encontra um grande problema para que as audiências
de custódia possam desde logo ser realizadas em todas as comarcas do território
nacional. Por conhecimento de causa no atendimento às famílias carentes no
programa de atendimento sócio jurídico da instituição na qual se apresenta essa
monografia, atende-se inúmeros casos de pessoas desassistidas pela Defensoria
Pública pela falta de defensor para atender a demanda. Nesse caso, além dos
pontos arguidos, barra-se nesse que, sem dúvida, será o principal desafio para que
a audiência de custódia seja efetuada no prazo da Resolução do CNJ.

83
ANDRADE, Mauro Fonseca. Resolução 213 do CNJ - artigo 2º. In: ANDRADE, Mauro Fonseca;
ALFLEN, Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia: comentários à Resolução 213 do Conselho
Nacional de Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017. p. 45-46.
84
PAIVA, Caio. Resolução 213 do CNJ - artigo 5º. In: ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo
Rodrigo (Org.). Audiência de custódia: comentários à Resolução 213 do Conselho Nacional de
Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017. p. 69.
43

4 A IMPLEMENTAÇÃO DAS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA NO BRASIL: ANÁLISE


CRÍTICA

Em fevereiro de 2015, o CNJ, em parceria com o Ministério da Justiça (MJ) e


o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), lançou o projeto “Audiência de
Custódia”, que deu garantias para a apresentação do preso a um juiz nos casos de
prisões em flagrante. Antes de adentrar propriamente na análise do referido projeto,
no entanto, faz-se necessário buscar compreender os motivos pelos quais ele foi
lançado.
Conforme já salientado nos capítulos anteriores, a crise no sistema carcerário
brasileiro vem se agravando muito nos últimos anos. O Levantamento Nacional de
informações Penitenciárias (INFOPEN) relativo ao ano de 2016 apontou que o
número de pessoas presas no Brasil ultrapassou os 726 mil. Do número total de
presos, cerca de 40% são provisórios.85 O Instituto de Defesa do Direito de Defesa
(IDDD), organização da sociedade civil, com interesse público, fundada em julho de
2000, que trabalha pelo fortalecimento do Direito de Defesa, identificou o agravamento
da situação carcerária do Brasil especialmente pela consolidação da cultura punitiva
entre membros do Poder Judiciário, dos resultados da política de drogas de cunho
proibicionista, da flexibilização e desvalorização dos direitos e garantias individuais e do
constante aumento da criminalidade. 86
Nesse sentido, a implantação das audiências de custódia no Brasil afigura-se
como medida de suma importância, tendo em vista que o tempo para a audiência de
instrução – na qual a pessoa detida em flagrante delito comparecerá frente ao
magistrado – em algumas cidades do país chega a meses ou até mais de um ano. Isso
significa dizer que o preso permanecerá sem dar a um juiz sua versão dos fatos e se,
porventura, tiver ocorrência de alguma violência, tortura e maus tratos, os sinais já terão
se perdido com o decurso de todo esse tempo.
Em abril de 2015, o IDDD, na tentativa de lutar pelo fim do uso abusivo das
prisões preventivas, foi convidado a cooperar com a implementação do projeto

85
SANTOS, Thandara (Org.). Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias: INFOPEN
atualização - junho de 2016. Colaboração Marlene Inês da Rosa. Brasília, DF: Ministério da Justiça e
Segurança. Departamento Penitenciário Nacional, 2017. p. 9. Disponível em: <http://www.justica.
gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil/relatorio_2016_junho.pdf>. Acesso em: 22 nov.
2017.
86
INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA (IDDD). Monitoramento das audiências de
custódia em São Paulo. São Paulo, maio 2016. p. 6.
44

“Audiência de Custódia” e celebrou um Termo de Cooperação Técnica com o


Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Ministério da Justiça (MJ), com o objetivo de
conjugar esforços para viabilizar a sua realização.87 Ocorre que, já no início do
projeto, a Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (ADEPOL) impetrou uma
Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (ADI nº 5240)
contra o provimento do TJSP, argumentando que mecanismo de tal natureza jurídica
não poderia legislar sobre matéria de processo penal ao atribuir o prazo de 24 horas
para a audiência, já que a competência para essa matéria é exclusiva da União. A
ADI foi julgada improcedente no dia 20 de agosto de 2015, por maioria dos votos,
sob o argumento de que não houve violação de lei federal já que a implementação
das audiências visa cumprir a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, já
ratificada pelo Brasil desde 1992.88
O projeto foi implantado como “piloto” no Estado de São Paulo, no qual,
segundo o INFOPEN, concentra-se a maior população carcerária do Brasil. Nesse
Estado, o IDDD monitorou durante dez meses cerca de 700 audiências de custódia.
Um dos maiores problemas encontrados em São Paulo, foi o impasse
enfrentado no recesso forense. Segundo a Defensoria Pública do Estado de São
Paulo, nesse período (entre os dias 20 de dezembro de 2016 e 6 de janeiro de 2017)
foram somados 1341 presos89 que não foram submetidos às audiências de custódia.
Como já salientado no capítulo anterior, a implementação das audiências de
custódia está prevista em pactos e tratados internacionais ratificados pelo Brasil,
como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção
Interamericana de Direitos Humanos. Logo, o fato de o Poder Judiciário entrar em
recesso não pode servir como mote para descumprir os tratados já ratificados e
incorporados ao ordenamento jurídico doméstico.
Cabe salientar que a Resolução nº 213 do CNJ foi publicada posteriormente
ao início do projeto piloto das audiências de custódia em São Paulo. A Resolução,

87
INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA (IDDD). Monitoramento das audiências de
custódia em São Paulo. São Paulo, maio 2016. p. 8.
88
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 5240. Requerente :Associação dos Delegados de Polícia
do Brasil - ADEPOL-BRASIL, Intimados: Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
e Corregedor-geral do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo [...]. Relator: min. Luiz
fux.Brasília, DF, Julgado em; 20 de agosto de 2015. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/
paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10167333>. Acesso em 05 maio 2018.
89
DEFENSORIA cobra que juízes ouçam os 1.341 presos em São Paulo durante o recesso.
Consultor Jurídico, São Paulo, 10 jan. 2017. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-jan-
10/defensoria-cobra-juizes-oucam-1341-presos-sp-recesso>. Acesso em: 12 fev. 2018.
45

como já salientado anteriormente, veio dar direção e organizar de forma nacional os


procedimentos da audiência de custódia, uma vez que, como observou o IDDD, na
experiência em São Paulo, não havia sequer local apropriado para que a defesa
tivesse uma conversa com o preso antes da audiência de custódia, sendo
necessário usar o corredor, ao lado da porta na qual o preso permanecia algemado,
aguardando ser chamado. Outra crítica que deve ser levada em consideração
refere-se ao fato de que, mesmo antes da edição da Resolução nº 213 – cujo art. 8º,
inciso II, assegura que a pessoa presa não seja algemada, salvo em casos de
resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou
alheia – no Estado de São Paulo a prática era recorrente. Ocorre que, mesmo que a
Resolução nº 213 ainda não tivesse sido publicada, já estava em vigor a Súmula
Vinculante nº 11 do Supremo Tribunal Federal, cujo teor já foi mencionado no
capítulo precedente. Nesse sentido, os relatos do IDDD demonstraram que o Estado
sequer cumpre a legislação interna, quanto mais está aparelhado para cumprir com
as orientações dos Tratados Internacionais que o Brasil ratificou. 90
Durante os dez meses em que o IDDD acompanhou informações coletadas
durante as audiências de custódia, foi se consolidando um importante conjunto de
dados, os quais trazem um levantamento sobre o perfil das pessoas presas em
flagrante, a dinâmica adotada nessas audiências, o perfil dos crimes que as pessoas
presas eram suspeitas de terem praticado, as decisões proferidas pelos juízes, bem
como a relação entre as audiências de custódia e o combate e prevenção à tortura,
maus tratos e tratamentos cruéis e degradantes.
De acordo com o Tribunal de Justiça de São Paulo, entre fevereiro de 2015 e
março de 2016, foram realizadas 19.472 audiências de custódia na cidade de São
Paulo, conforme tabela abaixo: 91

90
INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA (IDDD). Monitoramento das audiências de
custódia em São Paulo. São Paulo, maio 2016. p. 15.
91
INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA (IDDD). Monitoramento das audiências de
custódia em São Paulo. São Paulo, maio 2016. p. 24.
46

Tabela 1 - Demonstrativo das audiências de custódia realizadas entre fev. 2015 a


mar. 2016

Fonte: IDDD 92

Feitas essas considerações preliminares, busca-se, com o presente capítulo,


analisar criticamente os percalços que tem sido observado para a implementação
das audiências de custódia no país, a partir de relatórios já elaborados acerca do
tema, com destaque para o Relatório “Tortura Blindada”, publicado pela Organização
Não-Governamental “Conectas Direitos Humanos”.

4.1 Dinâmica da Implementação das Audiências de Custódia no Brasil e


Perspectivas a partir do Projeto de Lei do Senado nº 554/2011

Conforme dados já publicados no capítulo anterior do Ministério da Justiça


(INFOPEN, 2017), o Brasil possui a terceira maior população carcerária do mundo,
ficando apenas atrás dos Estados Unidos e China. Porém, ao contrário desses
países, que têm reduzido o ritmo de encarceramento por meio da adoção de
políticas públicas, o Brasil vem aumentando sua população prisional.
92
INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA (IDDD). Monitoramento das audiências de
custódia em São Paulo. São Paulo, maio 2016. p. 24.
47

As audiências de custódia, nesse sentido, têm sido apresentadas como uma


possível solução para a redução desse número crescente de presos no Brasil. Como já
salientado, apesar de a Convenção Americana sobre Direitos Humanos prever que “[...]
toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz”93
(art. 7º, apartado 5), até 2014 tal dispositivo era ignorado na prática criminal brasileira.
Com efeito, o primeiro contato entre juízo e acusado se dava meses após o
recebimento da denúncia, na audiência de instrução e julgamento. Na maioria dos
casos, o primeiro contato com o defensor público responsável pelo caso também
acontecia nesta mesma data, gerando impactos negativos para a defesa da pessoa
acusada. Durante todo esse período, a pessoa permanecia presa, sem ser ouvida
sobre os fatos. Eventual denúncia de tortura e maus-tratos sofridos no momento de sua
prisão seria realizada apenas na audiência de instrução e julgamento, meses após o
fato, o que prejudicava sobremaneira a apuração dos fatos narrados, inclusive por
tornar-se prejudicada a possibilidade de se fazer prova da violência sofrida por meio do
exame de corpo do delito, diante do longo tempo decorrido desde a lesão.94
Para Raphael Melo, a “audiência de apresentação95” – terminologia preferida
pelo autor –, representa justamente o ato de apresentar o preso à autoridade judicial,
como já previsto para as prisões realizadas em período eleitoral (art. 236 do Código
Eleitoral, Lei nº 4.737/65) e na apresentação do adolescente infrator (art. 171 da Lei nº
8069/90).96
Com a reforma operada pela Lei nº 12.403/2011, os legisladores brasileiros
debateram sobre alterar os dispositivos do CPP relativos à prisão processual, fiança,
liberdade provisória e demais medidas cautelares. A lei passou, então, a tratar do
encaminhamento ao juiz competente do auto de prisão em flagrante em até 24 horas
(art. 306, §1º). Porém, não dispôs acerca da apresentação do indivíduo preso em
flagrante no mesmo prazo em audiência de custódia, desconsiderando, assim, mais
uma vez, o disposto no art. 7º, apartado 5, da CADH, que desde o ano de 1992, por

93
COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). Convenção americana sobre
os direitos humanos: assinada na Conferência especializada interamericana sobre direitos
humanos, San José, Costa Rica, 22 nov. 1969. Disponível em: <http://www.cidh.org/
Basicos/Portugues/c.Convencao_ Americana.htm>. Acesso em: 22 nov. 2017.
94
CUSTÓDIO, Rafael; CALDERONI Vivian; APOLINÁRIO, Henrique. Tortura blindada: como as
instituições do sistema de Justiça perpetuam a violência nas audiências de custódia. 1. ed. São
Paulo: Conectas Direitos Humanos, fev. 2017. p. 21-22. Disponível em: <http://www.conectas.org/
arquivos/editor/files/Relato%CC%81rio%20completo_Tortura%20blindada_Conectas%20Direitos%
20Humanos(1).pdf > Acesso em: 08 ago. 2017.
95
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. p. 141.
96
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. p. 142.
48

força da ratificação do Pacto de San José da Costa Rica, integra o ordenamento jurídico
doméstico do Brasil.
O projeto de lei nº 554/2011, de autoria do Senador Antônio Carlos Valadares
(PSB/SE), propõe alterar o §1º do artigo 306 do CPP, para dispor que, no prazo
máximo de vinte e quatro horas após a realização da prisão, o preso deverá ser
conduzido à presença do juiz competente, juntamente com o auto de prisão em
flagrante, acompanhado das oitivas colhidas e, caso o autuado não informe o nome
de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.
O quadro a seguir sintetiza a principal mudança que o Projeto de Lei do
Senado opera no artigo 306, § 1º, do CPP:

Quadro 1 - Comparativo da redação do artigo 306 no atual CPP e no PLS 554/2011

Lei 12.403/2011 PLS nº 554/2011

Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o Art. 306. […]


local onde se encontre serão comunicados § 1.º para dispor que no prazo máximo de
imediatamente ao juiz competente, ao vinte e quatro horas após a realização da
Ministério Público e à família do preso ou à prisão, o preso deverá ser conduzido à
pessoa por ele indicada. presença do juiz competente, juntamente
§ 1º Em até 24 (vinte e quatro) horas após a com o auto de prisão em flagrante,
realização da prisão, será encaminhado ao acompanhado das oitivas colhidas e, caso o
juiz competente o auto de prisão em autuado não informe o nome de seu
flagrante e, caso o autuado não informe o advogado, cópia integral para a Defensoria
nome de seu advogado, cópia integral para Pública.
a Defensoria Pública.
Fonte: Antonio Carlos Valadares.97

Para Melo, deixar de cumprir o prazo previsto para realização da audiência de


custódia, e manter o indivíduo preso, caracteriza ilegalidade, uma vez que o prazo
máximo para um indivíduo permanecer preso em flagrante é de 48 horas. Após esse
prazo, a prisão somente poderá ser mantida por ordem judicial fundamentada98.
O PLS 554/2011 foi aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos em 26 de
novembro de 2013, chegando, depois, na Comissão de Constituição, Justiça e
Cidadania, onde foi distribuído para o senador Humberto Costa (relator) e recebeu, em
25 de junho de 2014, uma emenda substitutiva de autoria do senador Francisco

97
BRASIL. Senado Federal. Autoria: Senador. Antonio Carlos Valadares. Projeto de lei do Senado
n° 554, de 2011. Altera o § 1º do art. 306 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941
(Código de Processo Penal), para determinar o prazo de vinte e quatro horas para a apresentação
do preso à autoridade judicial, após efetivada sua prisão em flagrante. <https://www25. senado.
leg.br/web/atividade/materias/-/materia/102115>. Acesso em: 15 mar. 2018.
98
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. p.156.
49

Dornelles, que se limita basicamente a alterar a versão original do PLS para nele
estabelecer que a audiência de custódia também poderá ser realizada mediante o
sistema de videoconferência, sendo posteriormente aprovada a alteração, incluindo ao
Projeto Lei 554/2011, que em caso de dificuldades para a apresentação do preso
perante o juiz competente poderá ser estendido para, no máximo, 72 (setenta e duas)
horas, mediante decisão fundamentada do juiz, em decorrência de dificuldades
operacionais da autoridade policial ou excepcionalmente, por decisão fundamentada do
juiz competente e ante a impossibilidade de apresentação pessoal do preso, poderá ser
realizada por meio de sistema de videoconferência ou de outro recurso tecnológico de
transmissão de som e imagem em tempo real, respeitado o prazo estipulado no
parágrafo 10.99
Por derradeiro, o PLS 554/2011, foi aprovado pelo plenário do Senado
Federal e enviado para a Câmara dos Deputados em 06/12/2016, com a seguinte
redação no seu caput e parágrafos:

Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão


comunicados imediatamente pela autoridade policial responsável pela
lavratura do auto de prisão em flagrante ao juiz competente, ao
Ministério Público, à Defensoria Pública, quando o autuado não indicar
advogado, e à família do preso ou à pessoa por ele indicada.
§ 1º Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, a
autoridade policial encaminhará o auto de prisão em flagrante ao juiz
competente, ao Ministério Público e, caso o autuado não indique
advogado, à Defensoria Pública.
§ 4º No prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas após a lavratura
do auto de prisão em flagrante, o preso será conduzido à presença
do juiz e será por ele ouvido, com vistas às medidas previstas no art.
10 e para que se verifique se estão sendo respeitados seus direitos
fundamentais, devendo a autoridade judiciária tomar as medidas
cabíveis para preservá-los e para apurar eventuais violações.100

A redação prevista no projeto de Lei nº 554/2011 para o §1º, do artigo 306 do


CPP prevê o prazo de 24 horas para a lavratura e encaminhamento do Auto de Prisão
em Flagrante (APF) e o §4º do mesmo artigo estabelece o prazo de 24 horas para a
apresentação do preso à autoridade judicial. Desta forma, pode-se afirmar que o prazo

99
Art. 306, § 10 e 11. BRASIL. Senado Federal. Comissão Diretora. Parecer nº 927, de 2016. Redação
final do Substitutivo ao Projeto de Lei do Senado nº 554, de 2011. Disponível em: <https://www25.
senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/102115>. Acesso em: 08 maio 2018.
100
BRASIL. Senado Federal. Comissão Diretora. Parecer nº 927, de 2016. Redação final do
Substitutivo ao Projeto de Lei do Senado nº 554, de 2011. Disponível em: <https://www25.
senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/102115>. Acesso em: 08 maio 2018.
50

máximo para a realização da audiência de custodia é de 48 horas, contados a partir da


captura. Esse lapso temporal é a soma lógica dos dois prazos acima mencionados.101
Sistematizando, Melo narra os procedimentos do PLS 554/2011 dizendo que:
cumprido o prazo das primeiras 24 horas para o envio do APF, aviso dos familiares
ou quem o preso indicar, no mesmo prazo será entregue a nota de culpa ao preso.
Após abre-se o prazo de 24 horas para que o indivíduo que sofreu a privação de
liberdade seja apresentado ao juiz competente, na presença do Ministério Público e
Defensoria Pública, caso não tenha advogado constituído.102
Apesar do prazo de 48 horas, há previsão da excepcionalidade de adiamento,
quando a pessoa presa estiver acometida de grave enfermidade ou havendo
circunstâncias que impeçam de ser apresentada ao juiz, como internação hospitalar.
Nesse caso, deverá ser assegurada a audiência de custódia no local em que ela se
encontre e, nos casos em que o deslocamento se mostre inviável, deverá ser
providenciada a audiência de custódia imediatamente após a reabilitação de sua
saúde.103
O projeto Lei sob análise também prevê, nos §9º e §10º do artigo 306 do
CPP, o adiamento para o primeiro dia útil subsequente a prisão nos casos que a
autoridade judicial não o possa realizar por motivos devidamente comprovados e
certificados. Porém, salienta Melo que, se a prisão for na quinta feira, e a audiência
de custódia for realizada somente na segunda feira, o prazo será de 96 horas após a
captura, violando assim os tratados internacionais.104
Outra importante observação que o PLS 554/2011 traz, é o acréscimo do § 5º
ao art. 304 do CPP, que trata do direito do preso de ser assistido por defensor,
público ou particular, durante seu interrogatório policial, podendo-lhe ser nomeado
defensor dativo pela autoridade policial que presidir o ato.105
O PLS 554/2011 encontra-se parado na Mesa Diretora da Câmara dos
Deputados desde 23/03/2017, sem previsão de votação. Desta forma, os tribunais
nos Estados têm sido regidos através do que está previsto a partir da edição da
Resolução nº 213 do CNJ, conforme já exposto no capítulo anterior.
101
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. p.
151-152.
102
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. p. 160.
103
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. p. 152.
104
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. p. 153.
105
BRASIL. Senado Federal. Comissão Diretora. Parecer nº 927, de 2016. Redação final do
Substitutivo ao Projeto de Lei do Senado nº 554, de 2011. Disponível em: <https://www25.
senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/102115>. Acesso em: 08 maio 2018.
51

4.2 Análise Crítica da Implementação das Audiências de Custódia no Brasil a


partir do Relatório “Tortura Blindada”

O relatório que servirá como base principal para a construção do presente


tópico é um dos resultados do trabalho de campo realizado pela equipe da ONG
“Conectas Direitos Humanos” para avaliar qualitativamente a efetividade das
audiências de custódia no combate e na prevenção à tortura e outros tratamentos
cruéis, desumanos e degradantes cometidos por agentes do Estado no momento da
prisão. Com tal objetivo, entre julho e novembro de 2015, a ONG monitorou centenas
de audiências no Fórum Criminal da Barra Funda, na cidade de São Paulo-SP.
Conforme análise empreendida neste trabalho de pesquisa, verificou-se que as
audiências de custódia criadas pelos tratados internacionais visam a combater os maus
tratos e qualquer tipo de tortura contra o indivíduo no ato da prisão em flagrante, além
de aferir a (i)legalidade das prisões nessas circunstâncias. O relatório da pesquisa de
campo realizado pela equipe da ONG “Conectas Direitos Humanos”, não atentou sobre
a legalidade das audiências de custódia, uma vez que já é tema pacífico e consolidado
pelas resoluções internas. Antes teve como principal objetivo identificar os relatos de
violência policial no ato da prisão em flagrante e como as instituições do sistema de
Justiça – Magistratura, Ministério Público, Defensoria Pública e o Instituto Médico Legal
– absorvem as denúncias e lidam com elas. 106
Diante dos números apresentados no relatório de violência, tortura e maus
tratos narrados pelos indivíduos no ato da prisão em flagrante, ainda que em alguns
casos, mesmo sendo visíveis as agressões, não a comunicavam, emergiram os
casos mais graves em que sequer a pessoa apreendida estava em audiência, por
estar hospitalizada, por ter sofrido agressões, tortura ou maus tratos no ato, durante
e após a apreensão em flagrante. Observa-se que os policiais e membros da justiça
estavam cientes da pesquisa, e mesmo assim fizeram a audiência com o local onde
sentaria o acusado vazio, sem sequer questionar se o motivo que o deixara no
hospital poderia ser excesso ou violência na hora da prisão. Nem mesmo foi

106
CUSTÓDIO, Rafael; CALDERONI Vivian; APOLINÁRIO, Henrique. Tortura blindada: como as
instituições do sistema de justiça perpetuam a violência nas audiências de custódia. 1. ed. São
Paulo: Conectas Direitos Humanos, fev. 2017. p. 4. Disponível em: <http://www.conectas.org/
arquivos/editor/files/Relato%CC%81rio%20completo_Tortura%20blindada_Conectas%20Direitos
%20Humanos(1).pdf >. Acesso em: 08 maio 2018.
52

solicitado o exame de corpo de delito, sendo assim realizada o que foi denominada
pela “Conectas Direitos Humanos” de “audiência fantasma”.
Sobre as audiências de custódia fantasmas, assim narra o relatório de
pesquisa de campo realizado pela equipe da “Conectas Direitos Humanos”:

Audiência-fantasma é um termo usado pelos atores do sistema de


Justiça para designar a audiência de custódia realizada na ausência
da pessoa presa em flagrante, que nesta ocasião se encontrava no
hospital devido a ferimentos ocorridos durante a prisão. Na
audiência-fantasma, o rito é seguido normalmente por juízes,
promotores e defensores. A cadeira em que a pessoa presa se
sentaria permanece vazia. A Conectas observou três audiências-
fantasma no Fórum da Barra Funda entre julho e novembro de 2015.
Em nenhuma delas os juízes e promotores questionaram a ausência
da pessoa presa em flagrante. O fato de estar hospitalizada
tampouco levantou suspeitas da Magistratura ou do Ministério
Público sobre a ocorrência de possíveis atos de violência no
momento da prisão. Importante ressaltar que, talvez, os presos
internados em unidades hospitalares tenham sido justamente as
maiores vítimas da violência no momento da prisão. Em nenhum dos
casos foi determinada a realização de exame de corpo de delito na
pessoa presa ou se mencionou a possibilidade de fazer uma nova
audiência em sua presença depois da alta médica. Obviamente,
como está impossibilitada de comparecer em juízo, a pessoa não
tem a oportunidade de denunciar eventuais práticas de violência,
prejudicando totalmente a efetividade da audiência de custódia na
perspectiva do combate à tortura e maus-tratos. 107

Não é novidade para a maioria das pessoas que em muitos casos de prisão
em flagrante, falta estrutura psicológica e instruções técnicas para a realização do
procedimento. A análise dos 393 casos realizada pela equipe da “Conectas Direitos
Humanos”, relatou que houve sinais de tortura ou maus-tratos e as vítimas de
violência no momento da prisão, em sua maioria são homens, negros, acusados de
roubo, e os seus maiores agressores são os policiais militares. De acordo com os
relatos, a maior motivação das agressões no flagrante é obter confissões das
pessoas presas – o que ocorre tanto na rua quanto nas viaturas ou delegacias.108

107
CUSTÓDIO, Rafael; CALDERONI Vivian; APOLINÁRIO, Henrique. Tortura blindada: como as
instituições do sistema de justiça perpetuam a violência nas audiências de custódia. 1. ed. São
Paulo: Conectas Direitos Humanos, fev. 2017. p. 4. Disponível em: <http://www.conectas.org/
arquivos/editor/files/Relato%CC%81rio%20completo_Tortura%20blindada_Conectas%20Direitos
%20Humanos(1).pdf >. Acesso em: 08 maio 2018.
108
CUSTÓDIO, Rafael; CALDERONI Vivian; APOLINÁRIO, Henrique. Tortura blindada: como as
instituições do sistema de justiça perpetuam a violência nas audiências de custódia. 1. ed. São
Paulo: Conectas Direitos Humanos, fev. 2017. p. 7. Disponível em: <http://www.conectas.org/
arquivos/editor/files/Relato%CC%81rio%20completo_Tortura%20blindada_Conectas%20Direitos
%20Humanos(1).pdf >. Acesso em: 08 maio 2018.
53

A “Conectas Direitos humanos”, com base na oitiva das pessoas presas,


elaborou uma figura que mostra quem e por que são sofridos maus tratos e torturas.

Figura 1 - Demonstrativo de Torturas e Maus Tratos

Fonte: Rafael Custódio, Vivian Calderoni e Henrique Apolinário.109

A proibição da tortura está consagrada no direito internacional, na Declaração


Universal dos Direitos do Homem, no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e
Políticos e na Convenção contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis,
Desumanos ou Degradantes. A Lei Federal nº 9.455/1997, estabelece o crime de
tortura e comina pena de reclusão, de dois a oito anos, para o ato de “constranger
alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou
mental”, com a finalidade de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de
uma terceira pessoa.110
Observa-se que cerca de 92% dos agressores, conforme pesquisa de campo
realizada no Foro de Barra Funda, São Paulo, são agentes públicos, o que, ainda
conforme o § 2º do art. 1º da Lei 9.455/97, é circunstância agravante da pena.111

109
CUSTÓDIO, Rafael; CALDERONI Vivian; APOLINÁRIO, Henrique. Tortura blindada: como as
instituições do sistema de justiça perpetuam a violência nas audiências de custódia. 1. ed. São
Paulo: Conectas Direitos Humanos, fev. 2017. p. 8. Disponível em: <http://www.conectas.org/
arquivos/editor/files/Relato%CC%81rio%20completo_Tortura%20blindada_Conectas%20Direitos
%20Humanos(1).pdf >. Acesso em: 08 maio 2018.
110
Art. 1º. BRASIL. Lei nº 9.455, de 7 de abril de 1997. Define os crimes de tortura e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br /ccivil_03/leis/l9455.htm>. Acesso em:
08 maio 2018.
111
Art. 1º, § 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um terço: I - se o crime é cometido por agente público.
BRASIL. Lei nº 9.455, de 7 de abril de 1997. Define os crimes de tortura e dá outras providências.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br /ccivil_03/leis/l9455.htm>. Acesso em: 08 maio 2018.
54

A maioria dos relatos de tortura ou maus-tratos não são arguidos durante as


audiências de custódia, nem pelo juiz, que é quem conduz a audiência e é o primeiro a
fazer uso da palavra, tampouco se originam a partir da pergunta do Ministério Público,
e, por fim, até mesmo a defesa não faz a pergunta ao custodiado. Não necessariamente
que a comprovação de maus tratos e torturas sejam relevantes para a concessão de
liberdade provisória, porém, como não é o mérito o foco da audiência de custódia, e sim
uma das funções da audiência de custódia é inibir a violência, maus tratos e torturas
durante o ato de prisão em flagrante, deveria em tese, essa ser uma das perguntas em
destaque. O que se verifica na figura abaixo é também oriundo da pesquisa realizada
em São Paulo pela “Conectas Direitos Humanos”:

Figura 2 - Houve Violência? A Falta de Interesses das Instituições.

Fonte: Fonte: Rafael Custódio, Vivian Calderoni e Henrique Apolinário. 112

A pesquisa mostrou que nos casos em que eram perguntados e/ou os presos
denunciavam as agressões, maus tratos e torturas, algumas das vezes os juízes

112
CUSTÓDIO, Rafael; CALDERONI Vivian; APOLINÁRIO, Henrique. Tortura blindada: como as
instituições do sistema de justiça perpetuam a violência nas audiências de custódia. 1. ed. São
Paulo: Conectas Direitos Humanos, fev. 2017. p. 9. Disponível em: <http://www.conectas.org/
arquivos/editor/files/Relato%CC%81rio%20completo_Tortura%20blindada_Conectas%20Direitos
%20Humanos(1).pdf >. Acesso em: 08 maio 2018.
55

ignoravam e diziam que fazia parte da prisão o emprego de força. Quando o


acusado narrava quais eram as agressões, era desmentido pelo policial militar, que
tem “fé pública”, restando o relato da pessoa apreendida como mentiroso. Ainda, na
fase de verificação de maus tratos, em nenhum dos casos apurados houve
manifestação do Ministério Público sobre as agressões e torturas. Na maioria das
vezes em que se pronunciaram sobre o fato, os promotores contestavam os
testemunhos, desacreditando diretamente o relato da pessoa presa, dando mais
peso à palavra dos policiais. Outra maneira utilizada pelo Ministério Público para
desmerecer as alegações de tortura era realçar eventuais antecedentes criminais do
preso, até chegar ao extremo de se relatar a seguinte frase de um Promotor de
Justiça: “Se não estivesse roubando, não estava apanhando ”. 113
Para os autores e pesquisadores do Centro de Estudos de Segurança e
Cidadania (CESEC), em relatório intitulado “Liberdade mais que Tardia”, no que diz
respeito às audiências de custódia, o Brasil tem se caracterizado por ser um país
sem leis114. Criticam que um dos principais objetivos para a imediata apresentação
dos presos em flagrante à autoridade judiciária – aferição de prática de violência,
tortura ou maus-tratos – não tem sido observado durante a audiência de custódia.
Durante a pesquisa realizada nas comarcas do Rio de Janeiro (RJ), o CESEC
observou que, em mais de 1/3 dos casos, nem juízes nem promotores nem
defensores consultaram o custodiado a respeito da ocorrência de maus tratos.
Outrossim, evidenciou-se que menos da metade dos magistrados tomou alguma
medida – por exemplo, solicitação de exame de corpo de delito ou expedição de
ofício à corporação policial responsável – diante de casos em que se relatavam
agressões, mesmo que resguardar a integridade física e psíquica da pessoa presa
seja um dos principais fatos a ser averiguado na audiência de custódia, permitindo a
verificação de possíveis maus tratos ocorridos durante ou logo após a detenção e
contribuindo, com isso, para inibir tanto a violência policial no momento da prisão

113
CUSTÓDIO, Rafael; CALDERONI Vivian; APOLINÁRIO, Henrique. Tortura blindada: como as
instituições do sistema de justiça perpetuam a violência nas audiências de custódia. 1. ed. São
Paulo: Conectas Direitos Humanos, fev. 2017. p. 14. Disponível em: <http://www.conectas.org/
arquivos/editor/files/Relato%CC%81rio%20completo_Tortura%20blindada_Conectas%20Direitos
%20Humanos(1).pdf >. Acesso em: 08 maio 2018.
114
LEMGRUBER, Julita et al. Liberdade mais que tardia: as audiências de custódia no Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro: CESeC: Universidade Cândido Mendes: ISER, 2016. p. 6-10.
56

como a prática de arrancar confissões sob tortura enquanto o indivíduo permanece


na delegacia.115
Seguindo nesse âmbito, a realização da audiência de custódia proporciona,
indubitavelmente, ambiente mais favorável do que as delegacias de polícia para que
relatos sobre violência no momento da prisão sobrevenham. O PLS 554/2011
acrescenta o § 5º ao artigo 304 do CPP, com a previsão de toda pessoa, ao ser
interrogada na delegacia, ser assistida por seu advogado ou defensor público. Assim
traz a redação: “§ 5º O preso tem o direito de ser assistido por defensor, público ou
particular, durante seu interrogatório policial, podendo-lhe ser nomeado defensor
dativo pela autoridade policial que presidir o ato”.116
Durante pesquisa, o IDDD verificou que do total de casos acompanhados,
apenas 4,93% das pessoas presas contaram com assistência de um advogado
durante a lavratura do auto de prisão em flagrante.117
Outrossim, da análise sobre a estrutura física do espaço no qual são
realizadas as audiências de custódia, conclui-se que ainda é necessário avançar
muito nesse quesito: não há privacidade, há o uso indiscriminado de algemas e é
constante a presença de policiais militares, seja durante a entrevista com
defensores, seja antes ou durante a audiência. Muitas vezes o desconforto com a
presença de policiais militares estava implícito nas posturas observadas.118 Melo
defende que a autodefesa exercida na audiência de custódia deve obedecer ao
efetivo do art. 6º da Resolução 213 do CNJ, que garante ao preso, antes de ser
ouvido pelo Juiz, ter um local confidencial com seu advogado ou defensor, sem a
presença de policiais.119
Os relatos de tortura e maus-tratos que surgem nas audiências de custódia
são fundamentais para compreender o comportamento das instituições do sistema
criminal. O que tem muito ainda a aprimorar são as estruturas e condições para a
realização das audiências de custódia. No Fórum onde foi realizada a pesquisa da

115
LEMGRUBER, Julita et al. Liberdade mais que tardia: as audiências de custódia no Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro: CESeC: Universidade Cândido Mendes: ISER, 2016. p. 58-59.
116
Art 304, § 5º. BRASIL. Senado Federal. Comissão Diretora. Parecer nº 927, de 2016. Redação final
do Substitutivo ao Projeto de Lei do Senado nº 554, de 2011. Disponível em: <https://www25.
senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/102115>. Acesso em: 08 maio 2018.
117
INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA (IDDD). Monitoramento das audiências de
custódia em São Paulo. São Paulo, maio 2016. p. 35.
118
INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA (IDDD). Monitoramento das audiências de
custódia em São Paulo. São Paulo, maio 2016. p. 79.
119
MELO, Raphael. Audiência de custódia no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. p. 176.
57

ONG “Conectas Direitos Humanos”, por vezes os policiais militares – que são os
principais acusados pelas agressões – acompanhavam as sessões de perto,
inclusive durante a entrevista que deveria ser reservada com o defensor público. Ao
longo das audiências, os policiais disciplinavam o comportamento dos presos, que
permaneciam sempre algemados. 120 O uso de algemas foi discussão entre os
operadores do Direito: por um lado os Magistrados e Promotores declararam que o
uso de algemas seria necessário dado a estrutura momentânea para realização, já
os defensores acharam totalmente desnecessária o uso de algemas durante a
audiência de custódia, até porque, nos casos que era concedida a liberdade
provisória, o indivíduo continuava com o uso das algemas, contrariando a
justificativa dada em juízo. 121

É fundamental compreender que a tortura e os maus-tratos permeiam todo o


sistema de Justiça criminal e que as audiências de custódia são uma oportunidade
inegociável de combater essa cultura de violência institucional. No ano que completa
trinta anos da promulgação da chamada Constituição Cidadã, ainda se luta no Brasil
para fazer valer direitos básicos, sobretudo nas áreas de segurança pública, justiça
penal e sistema penitenciário, mesmo com cobertura ainda parcial, uma vez que a
implantação do projeto iniciou-se pelas capitais estaduais e só agora começa a
estender-se às comarcas do interior.122
Em conclusão com esse capitulo, cabe trazer à baila as críticas dos
professores Fabiana Spengler e Maiquel Wermuth, que apontam a crise do
Judiciário brasileiro às reformas urgentes de caráter físico, pessoal e político e que
intimamente ligado à crise de identidade está a crise de eficiência do Judiciário,
impossibilitando de responder de modo eficaz à complexidade social. Essas crises
são consequências de uma crise estrutural quanto à infraestrutura das instalações,
de pessoal, de equipamentos, de custos posteriores, da burocracia dos

120
CUSTÓDIO, Rafael; CALDERONI Vivian; APOLINÁRIO, Henrique. Tortura blindada: como as
instituições do sistema de Justiça perpetuam a violência nas audiências de custódia. 1. ed. São
Paulo: Conectas Direitos Humanos, fev. 2017. p. 19-22 Disponível em: <http://www.conectas.org/
arquivos/editor/files/Relato%CC%81rio%20completo_Tortura%20blindada_Conectas%20Direitos%
20Humanos(1).pdf>. Acesso em: 08 maio 2018.
121
INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA (IDDD). Monitoramento das audiências de
custódia em São Paulo. São Paulo, maio 2016. p. 49.
122
LEMGRUBER, Julita et al. Liberdade mais que tardia: as audiências de custódia no Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro: CESeC: Universidade Cândido Mendes: ISER, 2016. p. 2-6.
58

procedimentos forenses, da lentidão dos procedimentos e dos acúmulos das


demandas.123

123
SPENGLER, Fabiana Marion, WERMUTH, Maiquel Ângelo Dezorti. A experiência das audiências
de custódia no processo penal e a crise da jurisdição brasileira: uma impossibilidade flagrante.
Revista do Instituto de Hermenêutica Juridica – RIHJ, Belo Horizonte, ano 15, n. 22, p. 183-
203, jul./dez. 2017.
59

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho de pesquisa partiu do questionamento acerca das


audiências de custódia e sua efetivação como condição de possibilidade para a
humanização do processo penal brasileiro, a partir do cumprimento dos tratados
internacionais dos quais o Brasil é signatário.
Evidenciou-se, inicialmente, a falta de investimentos na segurança preventiva.
Outrossim, apontou-se o caos enfrentado pelo judiciário, abarrotado de processos,
assim como a superlotação dos presídios, penitenciárias, cadeias, etc., em boa
medida devido à grande parcela de presos provisórios existentes no país -
aproximadamente 40% do total da população carcerária brasileira124. Esses fatores
têm condicionando os operadores do Direito a uma verdadeira maratona para
possibilitar o direito previsto nos Tratados Internacionais.
Foi realizada uma síntese dos artigos da Convenção Americana de Direitos
Humanos (CADH) (Pacto San José da Costa Rica), ratificada pelo Brasil por meio do
Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992, bem como o Pacto Internacional sobre
Direitos Civis e Políticos (PIDCP), também ratificado pelo Brasil por meio do Decreto
Lei nº 592 de 06 de julho de 1992. Ambos, em suas redações, asseguram as
garantias de apresentação do indivíduo preso no prazo de 24 horas. O escopo do
primeiro capítulo da monografia foi, nesse sentido, apresentar a aplicabilidade do
CPP consonante às normas internacionais, traçando um paralelo entre os tratados
internacionais e o direito penal brasileiro não democratizado.
A proposta do segundo capítulo foi comparar a aplicabilidade dos tratados e
positivação interna frente ao direito comparado. Foram utilizadas como fontes de
pesquisa alguns países onde o tema das audiências de custódia já se encontra bem
mais avançado que no Brasil. A partir dessa comparação, observou-se que, mesmo
após a reforma parcial do CPP por meio da Lei 12.403/2011, não ficou claro que a
pessoa detida em flagrante deveria ser conduzida à presença de um Juiz. Assim
sendo, a não observância do dispositivo no direito doméstico e o total descaso com
os tratados internacionais ratificados pelo Brasil, no que se refere ao direito do preso

124
SANTOS, Thandara (Org.). Levantamento Nacional de informações Penitenciárias: INFOPEN
atualização - junho de 2016. Colaboração Marlene Inês da Rosa. Brasília, DF: Ministério da
Justiça e Segurança. Departamento Penitenciário Nacional, 2017. p. 9. Disponível em:
<http://www.justica. gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil/relatorio_2016_junho.pdf>.
Acesso em: 22 nov. 2017.
60

à audiência de custódia, foi fator preponderante para a edição da Resolução nº 213


do CNJ, que em sua redação redigiu artigos norteando o dever do Estado em
garantir ao preso em flagrante a realização da audiência de custódia, uma vez que
até a publicação da mencionada Resolução, não havia documento oficial que
disciplinasse a realização das audiências de custódia no Brasil, embora que antes
da publicação da Resolução 213 do CNJ, o TJSP já havia implantado o projeto piloto
para regulamentar as audiências de custódia em parceria com o Instituto do Direito
de Defesa.
No terceiro capítulo, foram apresentados dados acerca da experiência com a
implantação das audiências de custódia no Brasil. Houve uma análise crítica dos
dados coletados quanto à implantação do projeto piloto em São Paulo. Foi também
traçado um paralelo com o projeto Lei do Senado nº 554/2011, que na sua essência
traz a regularização das audiências de custódia no ordenamento jurídico brasileiro,
propondo alterar o artigo 306 do CPP, afim de incluir a garantia do preso em
flagrante à apresentação em audiência de custódia no prazo de 48 horas.
Apresentou-se, também, em uma análise crítica, a partir do Relatório “Tortura
Blindada”, como as audiências de custódia têm ocorrido no Brasil, mostrando que,
embora elas tenham sido paulatinamente efetivadas, ainda há um longo caminho
pela frente para arrostar a cultura autoritária que ainda permeia os órgãos que
integram o sistema penal brasileiro.
61

REFERÊNCIAS

ALFLEN, Pablo Rodrigo. Resolução 213 do CNJ – artigo 1º. In: ANDRADE, Mauro
Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia: comentários à
Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2017. p. 15-27.

ANDRADE, Mauro Fonseca. Resolução 213 do CNJ - artigo 2º. In: ANDRADE, Mauro
Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo (Org.). Audiência de custódia: comentários à
Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2017. p. 43-54.

ARIAS, Cristian Vicencio. El control jurisdicional de la detención. REJ - Revista de


Estudios de la Justiça, Santiago de Chile, n. 6, p. 245-246, 2005.

ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Audiência de custódia Avanços e desafios. RIL,
Brasília, DF, ano 53, n. 211, p. 306-307, jul./set. 2016. Disponível em: <http://www2.
senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/525429/001078852.pdf?sequence=1>.
Acesso em: 26 abr. 2018.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de


1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao
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