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48 Controle biológico de pragas, doenças e plantas invasoras

Controle biológico de pragas com entomopatógenos


Fernando Hercos Valicente'

Resumo - O manejo integrado de pragas (MIP) tem como base o uso de várias es-
tratégias de controle, tais como: plantas resistentes, inseticidas seletivos aos inimigos
naturais, medidas culturais, uso de parasitoides, predadores e patógenos. O controle
biológico com entomopatógenos pode ser definido como o uso de fungos, vírus, bac-
térias, nematoides e protozoários no controle de pragas. Vários fungos são usados
em programas de controle biológico como Metarhizium anisopliae, Beauveria bassiana e
Noumuraea rileyi. Dentre os baculovírus destacam-se os nucleopoliedrovírus (VPN) e
os granulovírus (VG). Entre as bactérias entomopatogênicas podem-se citar Bacillus
thuringiensis, Bacillus sphaericus, entre outras. Não há relatos no Brasil do uso de proto-
zoários em grande escala. Vários programas fazem uso de alguns entomopatógenos,
mas o porcentual ainda é pequeno perto do potencial de controle promovido por estes
agentes.

Palavras-chave: Fungo. Protozoário. Vírus. Bactéria.

INTRODUÇÃO FUNGOS com outros insetos, podem causar uma


epizootia. Os insetos infectados param de
Diante da demanda crescente de ali- Os fungos entomopatogênicos têm
alimentar e tomam-se mais lentos. Estes
mentos com o aumento contínuo da po- como hospedeiros primários os afídeos,
morrem relativamente rápido, às vezes em
pulação mundial, a utilização de produtos moscas-brancas, gafanhotos, moscas, be-
uma posição ereta, mas ainda presos na
químicos aumentou a partir de 1950, para souros, lagartas, tripes e ácaros. Possuem
folha ou no ramo. Isto pode ser observado
que se realizasse um controle fitossani- largo espectro de ação, capazes de coloni-
em locais mais elevados ou concentrados
tário eficiente. Porém, muitos problemas zar diversas espécies de insetos e ácaros e
ambientais apareceram com a aplicação na borda das culturas. O corpo do inseto
de causar, com frequência, epizootias em
de produtos químicos em larga escala, condições naturais (ALVES et al., 2008). morto pode ser firme e de consistência
tais como: intoxicação dos aplicadores, Esses patógenos também se diferem de ou- emborrachada ou de aparência oca. Várias
contaminação de rios e nascentes e dos tros grupos por ter a capacidade de infectar vezes observam-se insetos mortos de cor
produtos para consumo in natura, e morte todos os estádios de desenvolvimento dos creme, verde, avermelhada ou marrom,
de inimigos naturais. No final dos anos 50, hospedeiros (ALVES et al., 2008). em consequência do crescimento do
surgiu o conceito do manejo integrado de Os fungos invadem os insetos por fungo, quer seja envolvendo o corpo do
pragas (MIP), que tem como base o uso diversas vias, principalmente através da hospedeiro, quer seja saindo das juntas dos
de várias estratégias de controle: plantas cutícula ou pele (tegumento). Uma vez segmentos do corpo.
resistentes, inseticidas seletivos aos ini- dentro dos insetos, os fungos multiplicam- Fungos entomopatogênicos necessitam
migos naturais, medidas culturais, uso de se rapidamente por todo o corpo. A morte de umidade para propiciar a infecção, sen-
parasitoides e predadores, além do uso de é causada pela destruição dos tecidos e, do que as epizootias naturais são mais co-
entomopatógenos. ocasionalmente, pelas toxinas produzidas , muns durante períodos quentes e úmidos.
O controle biológico com entomopa- pelos fungos. Os fungos entomopatogê- O sucesso do uso de fungos no controle
tógenos pode ser definido como o uso de nicos frequentemente emergem do corpo biológico depende de ter o isolado que seja
fungos, vírus, bactérias, nematoides e pro- dos insetos, produzem esporos que, quando ativo contra o inseto-alvo, dependendo do
tozoários no controle de insetos-praga. espalhados pelo vento, chuva ou contato estádio de vida deste inseto, da umidade

1Eng~ AgI"", Ph.D., Pesq. Embrapa Milho e Sorgo, Caixa Postal 151, CEP 35701-970 Sete Lagoas - MG. Correio eletrônico:
valicent@cnpms.embrapa.br

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relativa e da temperatura. Os esporos fún- anisopliae. O fungo é aplicado de forma 2% dos frutos broqueados (NEVES et aI.,
gicos, que podem ser transportados pelo inoculativa ou inundativa, utilizando-se 2006). Normalmente, são usados entre
vento e pela água, devem entrar em contato uma dosagem mínima de 1 x 1012 conídiosl 1 x 1012 e 2 x 1012 conídios em 200 a
com o hospedeiro para causar infecção. Os ha, o que corresponde a aproximadamente 400 L/ha. A calda deve atingir os pontos
principais fungos entomopatogênicos usa- 20 g de conídios puros, pulverizados com da planta com maior concentração da
dos em programas de controle biológico 200 a 300 L de água/ha. broca. Este fungo tem sido muito usado
no Brasil são: Metarhizium anisopliae e em plantios orgânicos de café e já atinge
Beauveria bassiana. Vale ressaltar fungos Cupins-de-montículo e da
cerca de mil hectares.
de ocorrência natural como Nomuraea cana-de-açúcar
Os fungos também podem ser usados
rileyi. Este fungo provoca epizootias na Os cupins do gênero Cornitermes em iscas atrativas, no controle do perce-
lagarta-da-soja, Anticarsia gemmatalis, alimentam-se das plantas e constroem ni- vejo-de-renda em seringueira e pragas em
desde que as condições ambientais sejam nhos nas pastagens, dificultando os tratos cultivos protegidos.
favoráveis ao desenvolvimento do fungo, culturais mecanizados. Vários trabalhos
entre 26°C e 27°C, e umidade relativa aci- comprovaram a eficácia dos fungos M PROTOZOÁRIOS
ma de 60% (ALVES et aI., 2008). anisopliae e B. bassiana. Usa-se a estra-
Os protozoários são um grupo diverso e
tégia inundativa e a aplicação é feita com
Controle biológico com heterogêneo de microrganismos eucarion-
fungos entomopatogênicos uma polvilhadora, de 3 a 6 g de conídios
tes unicelulares. Ao contrário dos outros
no Brasil puros ou de 6 a 12 g da formulação pó
entomopatógenos, poucos protozoários
seco. O produto deve ser introduzido no
Os principais programas de controle possuem alta virulência ou ação rápida
ninho por meio de um orifício feito com
biológico com fungos entomopatogêni- nos hospedeiros invertebrados (GARCÍA
uma barra de ferro, até o seu centro. O
cos no Brasil são relatados por Alves et et aI., 2008). A maioria das espécies produz
importante é uma boa distribuição do
al. (2008) e algumas considerações são infecções crônicas caracterizadas por uma
produto dentro do ninho.
apresentadas a seguir. debilidade geral do inseto, matando seus
Gafanhotos hospedeiros lentamente. As pesquisas
Ciga rri nhas-da-cana-de-
indicam que poucos protozoários ento-
açúcar As principais espécies de gafanhotos
mopatogênicos apresentam potencial para
As cigarrinhas Mahanarva posticata e existentes no Brasil são: Schistocerca
o uso em programas de MIP (GARCÍA
M fim brio lata são importantes pragas da pallens, Stiphra robusta e Rhammatocerus
et aI., 2008). Além do controle de alguns
cana-de-açúcar no Brasil, que causam pre- schistocercoides. Ocorrem nas Regiões
insetos-praga, os protozoários podem-se
juízos econômicos que chegam a 11% na Centro-Oeste, Norte e Nordeste e infes-
tomar problema, como contaminantes em
produção e 15% no rendimento industrial, tam áreas de cultivo de cana-de-açúcar,
sistema de criação artificial de insetos.
nas Regiões Sudeste e Nordeste. O fungo pastagem e arroz. O fungo utilizado é o
M anisopliae é aplicado nos estados de Metarhizium flavoride, isolado no País e NEMATOIDES
Pernambuco, Alagoas, Paraíba, Rio Gran- produzido em arroz pré-cozido. O produto
é aplicado em ultra baixo volume (UBV), Os nematoides podem ser encontrados
de do Norte e vários locais do Sudeste.
usando-se de 2 a 3 L/ha, tendo como alvo em formulações comerciais nos Estados
São aplicadas concentrações de 5 x 1012
conídios, ou seja, 500 g de conídios do ninfas recém-eclodidas. Foi comprovada a Unidos e na Europa, para o controle de

fungolha. O custo do fungo varia de US$ eficiência de campo para as concentrações pragas de solo. Informações detalhadas
10 a US$ 20 e as aplicações são efetuadas de 5 x 1012 a 2 x 1013 conídioslha. sobre nematoides entomopatogênicos e
via terrestre, com um gasto de 50 a 200 L seu uso no controle biológico de pragas
de água/ha. Broca - d o -cafee i ro podem ser encontradas no artigo: controle
biológico de pragas com nematoides, desta
O café ocupa uma área de aproxi-
Ciga rri nhas-das- pastagens revista.
madamente 2,2 milhões de hectares, A
As cigarrinhas do gênero Mahanarva, broca-do-café Hypothenemus hampei é
VíRUS
Deois e Zulia são as principais pragas das uma praga importante e encontra-se dis-
pastagens no Brasil e podem ocorrer em seminada em todas as regiões produtoras, Os baculovírus são o grupo mais co-
até 10 milhões de hectares. Podem reduzir atacando frutos. O patógeno B. bassiana mum e mais estudado dentre os grupos de
a massa verde em até 15%. Esse grupo de pode ser pulverizado sobre toda a planta, vírus entomopatogênicos. Isto deve-se ao
insetos também é suscetível ao fungo M quando a infestação atinge entre 1% e fato de que são os vírus com o maior poten-

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cial a ser usado como agentes de controle uma proteína básica e forma um "core" ci- Vírus (ICTV dB, 2006) e está representada
biológico de pragas, sendo conhecidos líndrico. O gênero VPN é caracterizado por esquematicamente na Figura 2. As Figuras
mais de 20 grupos de vírus patogênicos a possuir dois subgêneros: "Vírus de Simples lD e lE ilustram tecidos de Spodoptera
insetos (MARTIGNONI; IWAI, 1986). Nucleocapsídeo" (SNPV), onde apenas frugiperda infectados experimentalmente
Os baculovírus pertencem à família um capsídeo é encontrado por envelope, e por um nucleopoliedrovírus.
Baculoviridae. Essa família é composta de aqueles chamados "Vírus de Múltiplos Nu- A oclusão das partículas virais em
vírus com uma simples fita dupla circular cleocapsídeos" (MNPV), nos quais vários matriz proteica é uma característica extre-
de DNA, que infecta um grande número nucleocapsídeos são encontrados em um mamente importante, pois é o que garante
de artrópodes e contém os gêneros: nucle- envelope comum (Fig. IA e lB). Os VGs proteção e possibilita a transmissão hori-
opoliedrovírus (VPN) e granulovírus (VG). possuem apenas um capsídeo por envelope, zontal do vírus, isto é, de um inseto para
Todos os baculovírus têm uma mesma as oclusões virais são na forma de grânulo, outro (BLISSARD; ROHRMANN, 1990).
estrutura básica: um capsídeo coberto de contendo um e raramente dois ou mais vi- As oclusões virais, portanto, são estruturas
forma arredondada. O nucleocapsídeo é rions por grânulo (Fig. IC) (HUNTER-FU- de resistência e permitem que os vírus man-
um "core" cilíndrico de DNA e proteína. lITA et al., 1998). Essa divisão da família tenham a infectividade mesmo fora do hos-
Dentro do nucleocapsídeo, a fita dupla de Baculoviridae segue a classificação atual pedeiro (HUNTER-FUJITA et al., 1998).
DNA associa-se heterogeneamente com do Comitê Internacional de Taxonomia de Além disso, é o que permite a obtenção de

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formulações de bioinseticidas, que podem


ser armazenados até serem utilizados para
Família Baculoviridae
o controle de pragas no campo.

Infecção e modo de ação


dos baculovírus
Gênero Nucleopoliedrovírus (NPV) Granulovírus (GV)

Os baculovírus possuem dois tipos de .>: -------


"progênies" infecciosas: uma forma oclusa Vírus de Múltiplo Vírus de Simples
Nucleocapsídeos Nucleocapsídeo
do vírus, responsável pela transmissão de (MNPV) (SNPV)
inseto para inseto, e outra não oclusa, res- I I
ponsável pela transmissão de célula para
célula, em um mesmo indivíduo (GRANA-
DaS; FEDERICI, 1986).
A rota principal de infecção dos ba-
culovírus é via ingestão dos poliedros e
penetração dos vírus através das células
epiteliais do intestino médio dos insetos. Figura 2 - Representação esquemática da classificação dos baculovírus

Com a ingestão dos poliedros pelos insetos, FONTE: Dados básicos: Almeida (2005).
a matriz proteica é dissolvida no intestino
médio pelo fato de o pH ser fortemente
alcalino (8-11). Com a dissolução da ma-
triz proteica, há a liberação dos vírions no
lúmen digestivo e as partículas infectivas
ODVs são liberados
penetram nas células epiteliais do intestino no intestino médio Infecção primária
médio, mediadas por receptores específi- das células

cos. Os nucleocapsídeos são transportados ODVs


ao núcleo, que libera o seu DNA, iniciando
o processo de replicação viral. A replicação
do vírus produz a forma não oclusa do vírus
que passa a infectar os demais tecidos. A
forma oclusa somente é produzida nos
Poliedros são ..., ...•.
ingeridos quando o .
estádios finais da infecção viral, onde os inseto se alimenta
I,
vírions são "envelopados" e produzidos ,,
os poliedros. Nos estádios finais, ocorre \
\
a ruptura das células e a liberação dos
poliedros. É onde acontece a morte do
'-.•...•..
inseto, seguida da liquefação dos tecidos
BVs
(FEDERICI, 1997, 1999). Os sintomas
típicos da infecção vão desde mudanças -_ -...,
....••.. Infecção
comportamentais a morfológicas, que le-
" secundária
células
das
vam à morte do inseto, após alguns dias.
Pode ser observada redução na alimentação Acúmulo de
e diminuição do crescimento, descoloração poliedros no
núcleo
do tegumento e, ao morrer, rompimento
BVs: forma não oclusa
deste, o que vem a liberar os poliedros no
ODVs: forma oclusa
ambiente, possibilitando novos ciclos de
infecção (FEDERICI, 1997, 1999). Uma Figura 3 - Infecção de um inseto hospedeiro por baculovírus
visão simplificada do ciclo de infecção é FONTE: Dados básicos: Szewczyk et aI. (2006).
mostrada na Figura 3. NOTA: ODVs - Occlusion-derived virus; BVs - Budded virus

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Programas de controle Nucleopoliedrovírus de utilizando-se lagartas sadias, criadas arti-


biológico no Brasil, usando Spodoptero frugiperdo ficialmente, como hospedeiras. As lagartas
vírus entomopatogênicos (SfMNPV) em milho necessitam ser de tamanho uniforme para
Os trabalhos com o baculovírus para propiciar uma infecção eficiente, facili-
Nucleopoliedrovírus da
Anticorsio gemmoto/is o controle da lagarta-do-cartucho no tando o processo de sua coleta depois de
(AgMNPV) em soja Centro Nacional de Pesquisa de Milho e mortas. As lagartas devem ser infectadas
Sorgo (CNPMS) da Empresa Brasileira de em um tamanho ideal (sete dias de idade),
Este é o maior programa de controle
Pesquisa Agropecuária (Embrapa), atual para que produzam uma maior quantidade
biológico que usa vírus entomopatogênicos
Embrapa Milho e Sorgo, iniciaram em de poliedros/lagarta e, consequentemente,
no Brasil. A lagarta-da-soja, A. gemmatalis,
1984. Foi realizado um levantamento dos
é a principal praga da cultura da soja no haja a redução do número de lagartas equi-
principais inimigos naturais desta praga
Brasil e ocorre da Argentina até o sudeste valente para pulverizar 1 ha.
em diversas regiões produtoras de milho
dos Estados Unidos. A aplicação do produ- Para a produção do B. spodoptera em
do estado de Minas Gerais, incluindo o
to chegou a quase 2 milhões de hectares de Sul de Minas, Vale do Rio Doce e Alto larga escala, um dos fatores limitantes é a
soja no País, porém, em consequência de Paranaíba. Durante o levantamento, entre liquefação do tegumento da lagarta ime-
alguns problemas técnicos, a produção pela 1984 e 1989, foram co1etadas mais de diatamente após a sua morte (Fig. 4). Este
Cooperativa Central de Pesquisa Agrícola 14 mil lagartas, onde foram encontrados fator é crucial pelo fato de que as larvas
(Coodetec) foi encerrada. O Baculovirus diversos parasitoides das ordens Diptera morrem e se liquefazem, fazendo com que
anticarsia ainda é produzido por algumas e Hymenoptera, e várias lagartas mortas todo o líquido interno extravase. Desse
cooperativas no sul do País. Espera-se que por vírus (VALICENTE, 1989). Esse modo, há a necessidade de congelar as la-
haja uma retomada, em breve, do sistema levantamento estendeu-se até o estado do
gartas mortas, para depois serem coletadas
de produção desse produto. Paraná, onde foi detectado um alto índice
com pinças e congeladas novamente até o
de lagartas parasitadas e mortas por vírus
Granulovírus do mandarová processamento e a formulação. Este fator
(VALICENTE; BARRETO, 1999). Atu-
da mandioca almente, o banco de baculovírus conta implica em maior gasto de mão-de-obra,
com 22 isolados, amostrados em diversas energia e freezers, o que resulta em um
Ressalta-se o programa do controle
regiões do Brasil. Esses isolados foram produto final com custo mais elevado.
do mandarová da mandioca, Erinnyis ello
(EeGV) com um vírus de granulose, que estudados, caracterizados e sua eficiência Os baculovírus que matam a lagarta-
avaliada em relação à lagarta-do-cartucho do-cartucho apresentam dois genes, catep-
foi isolado no estado de Santa Cata rina
(BARRETO et aI., 2005). Dentre os isola- sina e quitinase, que são responsáveis pelo
(SCHMITT, 1984). A produção do vírus
dos mais estudados e eficientes no controle rompimento do tegumento da lagarta ime-
era realizada em laboratório, com coleta
de S. frugiperda, o isolado 19 já teve seu
de lagartas mortas infectadas pelo vírus e, diatamente após a sua morte (HAWTIN et
genoma totalmente sequenciado (WOLFF
posteriormente, era feita a distribuição aos aI., 1997). O isolado 6 (Fig. 4), pertencente
et aI., 2008), o que é importante para que
agricultores. Hoje, não se tem documenta- ao banco de baculovírus da Embrapa Milho
se saiba a estrutura, a sequência e a função
da a expansão deste projeto piloto. e Sorgo, apresenta uma característica única
de cada gene.
A linha de pesquisa atual está voltada de não causar a liquefação do tegumento
Nucleopoliedrovírus da
para o desenvolvimento de um sistema de imediatamente após a sua morte (VALI-
lagarta-do-á lamo
produção que possibilite a obtenção de CENTE et aI., 2007, 2008).
Outro programa importante e com um bioinseticida à base do baculovírus A temperatura é um dos fatores mais
grande potencial é o uso do nucleopoliedro- que infecta a lagarta-do-cartucho, o vírus importantes durante todo o processo de
vírus da lagarta-do-álamo, Condylorrhiza da poliedrose nuclear de S. frugiperda
produção, sendo que todos os ambientes
vestigialis (CvMNPV). O álamo é plantado (SfMNPV) ou Baculovirus spodoptera.
dentro de uma biofábrica devem ter a
em regiões de várzea, cerca de 5.500 ha, Vários avanços foram obtidos durante a
temperatura controlada. Faz-se necessário
nos estados do Paraná e Santa Catarina. A evolução do projeto de pesquisa, mostran-
madeira é usada na indústria de palitos de o uso de ar condicionado e de aquecimento
do a possibilidade de produção em larga
fósforos, porém, a lagarta-do-álamo causa escala do bioinseticida. (onde necessário), com a ajuda de circula-
uma grande desfolha das árvores. Na fase dores de ar, para que as temperaturas igua-
inicial desse programa, consegue-se tratar Produção de baculovírus em lem-se dentro das salas de multiplicação.
larga escala A umidade relativa do ar deve ser mantida
cerca de 1 ha/dia com baculovírus (365
ha/ano). A meta é tratar cerca de 2 mil A produção em larga escala do B. dentro das salas, para que não haja resse-
hectares por ano. spodoptera é realizada em laboratório, camento da epiderme dos insetos.

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Figura 4 - Lagartas de Spodoptera frugiperda mortas por 8acu/ovirus spodoptera
NOTA: A - Lagartas em que houve o rompimento do tegumento; B - Lagartas infectadas com o isolado que não causa o rompimento
imediato do tegumento após a morte.

A sala de criação do inseto hospedeiro mosquitos transmissores da dengue e da aos mamíferos. Outra vantagem é a es-
sadio deve ficar separada fisicamente febre amarela. pecificidade em relação aos insetos-praga
do local de infecção com o baculovírus das diferentes culturas. A nomenclatura
e do local das coletas de larvas mortas. 8acillus thur;ng;ens;s até 1998 abrangia cinco genes principais:
A separação é importante, para que não O B. thuringiensis (Bt) é uma bactéria cryI, cryII, cryIII, cryIV e cryY. Hoje, pelo
ocorra contaminação indesejada dos in- gram-positiva, que pode ser caracterizada grande número de genes que são estudados
setos sadios. pela sua habilidade de formar cristais pro- e sequenciados, usam-se números arábicos:
teicos durante a fase estacionária e/ou de cry I, cry2, cry3, cry4 ... até cry51. Os
BACTÉRIAS esporulação. O Bt ocorre naturalmente em genes cry 1, cry2 e cry9 são específicos
diversos habitats incluindo solo, filoplano, em relação aos lepidópteros, cry2, cry4A,
o gênero Baci/lus constitui um grupo
cry l Ü, cry l l, cryl Z, cry19, cry24, cry25,
resíduos de grãos, poeira, água, matéria ve-
homogêneo de bactérias em forma de
getal e insetos. O cristal proteico também cry27, cry29, cry30, cry32, cry39 e cry40
bastonete, aeróbicas e que produzem es-
chamado deltaendotoxina possui proprie- são ativos contra dípteros e, cry3, cry? e
poros. Em Bacillus são encontradas várias cry8 contra coleópteros, cry 5, cry 12, cry 13
dades inseticidas específicas. Esse cristal
espécies, dentre as quais alguns sorovares e cry14 são ativos contra nematoides.
proteico é responsável por 20%-30% da
são entomopatogênicos e letais para de- Diante do grande número de coleções de
proteína total da célula (BOUCIAS; PEN-
terminados insetos-praga, principalmente Bt no mundo, as sequências gênicas de Bt
DLAND, 1998) e pode ter várias formas
para as ordens Lepidoptera, Diptera e Co- tais como: bipiramidal (Fig. 5), esférico, podem ser encontradas na intemet".
leoptera. Bacillus thuringiensis e Bacillus retangular, cuboide (Fig. 6) e irregular. Estimam-se mais de 60 mil cepas de
sphaericus são ativos contra vários dípte- A degradação dos cristais proteicos por Bt em todo o mundo, e este patógeno vem
ros, sendo que o B. thuringiensis sorovar enzimas proteolíticas libera proteínas tóxi- sendo usado como bioinseticida há déca-
israelensis (Bti) é tóxico para mosquitos cas menores, chamadas deltaendotoxinas. das (GLARE; O'CALLAGHAN, 2000).
(Culicidae) e borrachudos (Simuliidae). A atividade das deltaendotoxinas estão Atualmente, mais de 200 genes específicos
São vários os programas de controle restritas ao trato digestivo dos insetos. Este que produzem deltaendotoxina são conhe-
biológico no Brasil que usam Baci/lus patógeno é ativo contra várias espécies de cidos, embora não sejam muito eficientes
para o controle de dípteros, incluindo os insetos e considerado seguro em relação no controle da S. frugiperda.

2Consultar o site: http://www.biols.susx.ac.uklhomelNeil_ CrickmorelBtl

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Figura 5 - Seta indica o cristal de forma bipiramidal da cepa 344 Figura 6 - Seta indica o cristal de forma cuboide da cepa 1644 de
de Bacil/us thur;ng;ens;s em microscópio de varredura Bacil/us thur;ng;ens;s em microscópio de varredura
FONTE: Valicente e Souza (2004). FONTE: Valicente e Souza (2004).

Os esporos bacterianos dormentes são de Microbiologia e Genética da Universi- entretanto, é necessário certificar se toda
extremamente resistentes e capazes de so- dade do Vale do Rio dos Sinos (Uni sinos) a cultura foi bem pulverizada e usar espa-
breviver sob condições desfavoráveis por e pelo Laboratório de Patologia e Controle lhante adesivo, pois este otimiza a persis-
um longo período. Entretanto, é raramente Microbiano de Insetos da Escola Superior tência do produto na planta.
encontrado na natureza, causando epizoo- de Agricultura "Luiz de Queiroz" (Esalq),
tia em populações de insetos. da Universidade de São Paulo (USP), REFERÊNCIAS
dentre outros.
ALMEIDA, A.E Avaliação preliminar da
Produção comercial
viabilidade de produção in vitro de um
CONSIDERAÇÕES NA APLICAÇÃO isolado brasileiro de baculovírus Spodop-
A produção industrial de Bt é realizada
DE BIOPESTICIDAS OU INSETICIDAS lera frugiperda MNPV. 2005. 97p. Disser-
por grandes companhias, que dominam o
MICROBIANOS tação (Mestrado) - Universidade Federal do
mercado mundial. Mas há produção em Rio Grande do Norte, Natal.
pequena escala que favorece o desenvol- Armazenar os bioinseticidas em locais ALVES, S.B.; LOPES, R.B.; VIElRA, S.A.;
vimento de tecnologia e um produto mais frescos e secos, sem luz, para uma melhor TAMAI, M.A. Fungos entomopatogênicos
específico para o inseto-alvo que se deseja conservação da qualidade do produto. usados no controle de pragas na América
controlar. Deve-se ter cuidado com o con- Latina. ln: ; (Ed). Contro-
o

Realizar a primeira pulverização assim


le microbiano de pragas na América Lati-
trole de qualidade e com a padronização que forem observados os primeiros sinais na:avanços e desafios. Piracicaba: FEALQ,
do produto final. Até o início da década de ataque das pragas, que pode ocorrer entre 2008. p.69-110.
de 90, somente três produtos estavam dis- os 5 e 15 dias após a germinação, variando
BARRETO, M.R.; GUIMARAES, C.T.; TEI-
poníveis no mercado, todos à base de Bt conforme a região. Fazer o monitoramento XElRA, EE; PAIVA, E.; VALICENTE, EH.
kurstaki (Dipel, Thuricide e Bactospeine) corretamente, pois a primeira aplicação é Effect of baculovírus Spodoptera isolates in
(HABIB; ANDRADE, 1991). Hoje, no fundamental, já que quanto menor estiver a Spodopterajrugiperda O.E. Smith) (Lepidop-
Brasil, é muito utilizado o Dipel, Thuri- tera: Noctuidae) larvae and their characteri-
lagarta, maiores serão as chances de contro-
zation by RAPD. Neotropical Entomology,
cide e XenTari, para o controle de várias le com os inseticidas microbianos. Londrina, v.34, n.l, p.67-75, Jan./Fev. 2005.
pragas, dentre elas: Alabama argillacea, Executar as pulverizações após às 16
BLISSARD, c.w, ROHRMANN, C.E Bacu-
A. gemmatalis, E. ello, Helicoverpa zea, horas, por causa da menor incidência de
lovirus deversity and molecular biologig.
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