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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001103-07.2014.8.19.0209


RELATORA: JDS DES. KEYLA BLANK DE CNOP

APELANTE: JULIANA PEREDO TRINDADE


APELADO: SPE GUANUMBI EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO LTDA

APELAÇÃO CÍVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. AÇÃO


INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E
MORAIS. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE
IMÓVEL. RESCISÃO CONTRATUAL. SENTENÇA DE
IMPROCEDÊNCIA. APELO DA AUTORA.
Embora a controvérsia trazida aos autos trate acerca do
percentual de retenção quando da rescisão da promessa
de compra e venda do imóvel, verifica-se que houve
distrato anteriormente realizado por escritura pública, no
qual foi dada quitação ampla, plena e geral, sem direito de
arrependimento. Ausência de violação a norma de ordem
pública. Distrato que deve ser preservado, observando-se
a segurança jurídica. Sentença mantida. Negado
seguimento ao recurso da autora. Sentença mantida.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Adoto, na forma regimental (art. 92, § 4º, do RITJERJ), o relatório


constante da sentença, que passo a transcrever:

Trata-se ação proposta pelo procedimento sumário por


Juliana Peredo Trindade em face de SPE Guanambi -
Empreendimento Imobiliário Ltda. A parte autora alega
que: pactuou com a ré promessa de compra e venda de um
imóvel, mas desistiu do negócio quando já havia pago parte
das prestações; '...teve um gasto com o mencionado
investimento, até a data da rescisão, de R$ 75.801,70...'
(fl. 4); pactuou com a ré resilição bilateral por força da
qual esta lhe devolveu R$ 50.000, que equivalem a
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Assinado em 15/12/2015 18:29:54


KEYLA BLANK DE CNOP:000024713 Local: GAB. JDS. DES. KEYLA BLANK DE CNOP
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aproximadamente 65,96% da quantia antes indicada;


acredita ter direito a 80%, com base na cláusula 13.2.1 da
promessa resilida, que resultaria em haver ainda a
receber R$ 25.801,70; '...tal inconveniente vem gerando
um desconforto e aborrecimento muito grande para a
autora...' (literalmente assim, fl. 4).
Formula os seguintes pedidos: (i) Condenação da ré a
devolver R$ 25.801,70. (ii) Condenação da ré ao
pagamento de indenização de danos morais.
Audiência do art. 277 do CPC, fl. 139. Contestação, fl.
87. A parte ré alega que: foi pactuada a resilição bilateral
e a devolução de R$ 50.000; o negócio é válido e deve ser
cumprido; o total que a autora aponta ter dispendido com
o negócio não está correto, pois há várias quantias que não
representavam prestações, como por exemplo corretagem
e emolumentos para registro de promessa de venda; na
verdade, a autora pagou prestações na quantia total de R$
70.178,31 dos quais recebeu, por força da resilição, R$
50.000; a retenção foi, portanto, inferior a 30% da
quantia das prestações pagas; tal porcentual não implica
prática abusiva e é amparado pela jurisprudência sobre a
matéria; a cláusula contratual invocada pela autora não
disciplina a hipótese de resilição por iniciativa imotivada
do promissário e não é sequer razoável invocá-la por
analogia; ao pactuarem a resilição, as partes se
orientaram pela cláusula 12.10, esta que, embora também
não preveja expressamente a hipótese de resilição, por
tratar de inadimplemento absoluto do promitente-
comprador, é a que mais razoavelmente pode disciplinar a
hipótese.

A r. sentença julgou improcedente os pedidos formulados da inicial e


condenou a autora ao pagamento do processo e honorários advocatícios arbitrados
em R$2.500,00.

Em suas razões recursais, acostadas às fls. 149/155 (e.doc. 00149),


a autora requer a reforma da sentença e a condenação do réu na devolução do
percentual de 18,75% do valor retido indevidamente, além da condenação nas custas
e honorários.
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As contrarrazões dos autores estão às fls. 171/180 (e.doc. 00171),


apresentadas de forma tempestiva, em prestígio ao julgado.

É O RELATÓRIO. DECIDO.

Presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade


recursal, deve a apelação ser conhecida, de modo que passo à análise de seu mérito.

A relação existente entre os litigantes é de caráter consumerista,


devendo, pois, a controvérsia ser dirimida sob a as diretrizes estabelecidas no
Código de Proteção e de Defesa do Consumidor.

O fato discutido aqui já foi amplamente debatido nas Câmaras Cíveis


e nos Tribunais Superiores, razão por que, nos termos do art. 557, do Código de
Processo Civil, permite seja decidido monocraticamente.

Sustenta a autora, ora apelante, que o percentual de retenção na


proporção de 28,75% utilizado pelo apelado é considerada prática abusiva, devendo,
portanto, ser reduzido tal percentual para 18,75%.

Com efeito, a controvérsia dos autos trazida pela autora cinge na


restituição dos valores pagos pela apelante.

Todavia, a apelante informa às fls. 04 (e.doc. 0003) que efetuou


rescisão do contrato com o apelado. Isto é, autora afirma já ter, antes do
ajuizamento da ação, efetuado o distrato da promessa de compra e venda, conforme
consta às fls. 25/27 (e.doc. 00025).

Da escritura de rescisão de promessa de compra e venda consta o


teor seguinte nos itens 2, 3 e 4:

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Assim, pela dicção do artigo 472 do Código Civil, o distrato, que nada
mais é que o trato em sentido contrário, que elimina a eficácia do negócio quanto ao
futuro, de modo que o contrato deixa de produzir efeitos, pois os distratantes
concordam plenamente que, entre eles, não há desacordo ou desentendimento, vez
ambos, obviamente, querem distratar.

De forma que, se entendia a apelante que a devolução de


R$50.000,00 era abaixo do que lhe cabia, deveria ter deixado isso consignado, ou
sequer aceitado realizar o distrato, buscando, desde logo o Poder Judiciário.
Portanto, a apelante ao dar plena, rasa e geral quitação no momento do distrato,
renunciou a qualquer direito de rediscutir o conteúdo do referido documento.

Nesse contexto, não se registrando violação a qualquer norma de


ordem pública, notadamente do Código do Consumidor, desprestigiar os fundamentos
expostos no presente apelo implicaria em ofensa à segurança jurídica, por
desconsideração ao ato jurídico perfeito e acabado.

Neste sentido é o precedente do E. Superior Tribunal de Justiça,


consoante o excerto abaixo colacionado:

REsp 809.565, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy


Andrighi, Julgamento: 22/03/2011, DJ 29/06/2011
(...) A QUITAÇÃO PLENA E GERAL, PARA NADA
MAIS RECLAMAR A QUALQUER TÍTULO,
CONSTANTE DO ACORDO EXTRAJUDICIAL, É
VÁLIDA E EFICAZ, DESAUTORIZANDO INVESTIDA
JUDICIAL PARA AMPLIAR A VERBA
INDENIZATÓRIA ACEITA E RECEBIDA. AINDA
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QUE, NOS TERMOS DO ART. 1.027 DO CC/16, A


TRANSAÇÃO DEVA SER INTERPRETADA
RESTRITIVAMENTE, NÃO HÁ COMO NEGAR
EFICÁCIA A UM ACORDO QUE CONTENHA
OUTORGA EXPRESSA DE QUITAÇÃO AMPLA E
IRRESTRITA, SE O NEGÓCIO FOI CELEBRADO SEM
QUALQUER VÍCIO CAPAZ DE MACULAR A
MANIFESTAÇÃO VOLITIVA DAS PARTES.
SUSTENTAR O CONTRÁRIO IMPLICARIA OFENSA
AO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA, QUE
POSSUI, ENTRE SEUS ELEMENTOS DE
EFETIVIDADE, O RESPEITO AO ATO JURÍDICO
PERFEITO, INDISPENSÁVEL À ESTABILIDADE DAS
RELAÇÕES NEGOCIAIS.

Destarte, a quitação operada entre as partes, na amplitude do teor


dos termos, implicou em transação de direitos, pela outorga de mútuas concessões
com a finalidade de prevenir litígios, autêntico negócio jurídico material, plenamente
válido e com reflexo no processo (Dinamarco, Fundamentos do Processo Civil
Moderno, vol. 11/1.048, Malheiros Editores, 2.000; José Roberto Bedaque, Direito e
Processo, pág. 98, Malheiros Editores, 1.995; Caio Mário, Instituições, vol.II/226,
Forense, 1.976).

É este o entendimento desta Corte:

0298936-88.2011.8.19.0001 – APELAÇÃO – DES.


LUCIANO SILVA BARRETO – Julgamento:
26/11/2014 – VIGÉSIMA TERCEIRA CÂMARA
CÍVEL CONSUMIDOR
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR.
RELAÇÃO CONTRATUAL. AÇÃO COM PRETENSÃO
DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR
LUCROS CESSANTES E DANOS EMERGENTES, E
REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS, COM PEDIDO DE
ANTECIPAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA TUTELA.
CONTRATO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA DE
UNIDADE IMOBILIÁRIA. ATRASO NA ENTREGA DO
IMÓVEL. CELEBRAÇÃO DE DISTRATO NO CURSO
DA LIDE. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO E DE
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IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS, NA FORMA


ABAIXO. RECURSO DO AUTOR. PLEITO DE
RECONHECIMENTO DE NULIDADE DO DISTRATO E
DE ACOLHIMENTO DOS PEDIDOS DA EXORDIAL.
PACTO CELEBRADO ENTRE PESSOAS MAIORES E
CAPAZES. QUITAÇÃO MÚTUA, PLENA,
IRREVOGÁVEL E IRRETRATÁVEL. NULIDADES NÃO
VISLUMBRADAS. ATO JURÍDICO PERFEITO.
SENTENÇA QUE SE PRESTIGIA. RECURSO A QUE
SE NEGA SEGUIMENTO, NA FORMA DO ARTIGO
557, CAPUT, DO CPC.

Dessa forma, correta a r. sentença.

Isso posto, NEGA-SE SEGUIMENTO AO RECURSO DA AUTORA,


nos termos do artigo 557, caput, do CPC, mantendo-se a R. Sentença tal qual lançada.

Rio de Janeiro, na data constante da assinatura digital.

JDS DES. KEYLA BLANK DE CNOP


Relatora

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