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07/05/2020 Acordão do Tribunal Central Administrativo Norte

Acórdãos TCAN Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte


Processo: 00646/07.6BEVIS
Secção: 2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão: 24-01-2017
Tribunal: TAF de Viseu
Relator: Paula Moura Teixeira
Descritores: OPOSIÇÃO EXECUÇÃO FISCAL
JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO
GERÊNCIA DE FACTO
ADMINISTRAÇÃO DE FACTO
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
Sumário: I. Decorre do n.º 1 do art.º 24.º da LGT que os administradores, e outras pessoas que exerçam, ainda
que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente
equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre.
II. Resulta da interpretação do artigo 24.º da LGT que a responsabilidade subsidiária é estabelecida em
função do exercício do cargo de administrador / gerente e reportada ao período do respetivo exercício.
A administração de facto constitui requisito da responsabilidade subsidiária dos gerentes, não sendo
necessário a titularidade do cargo, a gerência nominal ou de direito.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente: Fazenda Pública
Recorrido 1: L...
Decisão: Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do
Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, FAZENDA PUBLICA, não conformada com a sentença
proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu em 29.07.2011,
que julgou procedente a oposição deduzida por L..., contribuinte n.º
1…, na execução fiscal n.º 2720200401021273 e apensos, instaurada
originariamente contra a sociedade “M…, S.A.”, para pagamento da
quantia de € 161.384,37 respeitante a IVA do ano de 2004, Coimas
Fiscais dos anos de 2003 e 2004 e IRC de 2003.

A Recorrente no recurso jurisdicional formulou nas respetivas


alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

A) “ Nos presentes autos foi proferida sentença que julgou procedente a presente
oposição por falta de fundamento legal para a reversão operada contra o
revertido/oponente.

B) Está patente na decisão que: “(…) tal como consta dos factos provados, o
oponente, mesmo depois de renunciar ao seu cargo, celebrou um acordo, no
sentido de liquidar as dívidas de IVA e IRC reportadas ao período em que exercia
funções de administrador, no âmbito do PEF nº2720200401012649, tendo liquidado
a totalidade da dívida, o que demonstra a boa-fé do oponente, nomeadamente
por querer regularizar a situação fiscal da sociedade, no período em que as funções
de gestão lhe estavam adstritas.”

C) Contudo, entende a Fazenda Pública, que não é isso que resulta da prova
produzida, uma vez que:
· O acordo de pagamento não foi celebrado em sede de reversão, mas pela
originária devedora, tendo o Sr. L... assinado como seu administrador;
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· Os respectivos pagamentos foram efectuados pela sociedade;


· Em tal acordo de pagamento foram oferecidos bens à penhora, que consistiam
em activos da sociedade.

D) Estes pagamentos não foram, portanto, realizados pelo o oponente, pelo que
não nos encontramos perante o assumir de dívidas do período da sua gerência
(num acto demonstrativo de boa-fé!), mas sim face a verdadeiros actos de gestão
de facto, posteriores à renúncia de tais funções.

E) Deve atentar-se, ainda, às folhas de remuneração entregues na Segurança Social


pela devedora originária que comunicam o pagamento de remunerações ao
oponente até Dezembro de 2004, facto este não valorado na sentença recorrida.

F) A Fazenda Pública não pode também conformar-se com o que se retirou dos
autos de declarações dos funcionários da devedora originária, pois que, embora se
refiram ao Sr. F…, são unânimes ao afirmar que o Sr. L…, após Abril de 2004, deu
instruções aos funcionários, assinou cheques e ia com frequência à empresa.

G) Afigura-se-nos, pois, inquestionável que o oponente vinculou a devedora


originária através da assinatura do acordo de pagamento, autos de penhora,
assinaturas de cheques, nos termos do art.º 409º do CSC, actos de gestão de facto,
que desembocam na sua consideração como responsável subsidiário à luz do art.º
24º da LGT.

H) O oponente foi, então, gerente de facto tanto aquando do facto tributário


como aquando do seu prazo legal de pagamento, logo ser-lhe-á aplicável a alínea
b) do n.º 1 do art. 24º da LGT, da qual resulta uma presunção legal de culpa que lhe
caberia ilidir.

I) Invocou o oponente que não teria culpa pela insuficiência do património dado
não ser gerente de facto à data dos factos.

J) Todavia, provado que está que este era gerente de facto naquele momento,
deveria cumprir o estipulado no art.º 64º do CSC, competindo-lhe promover a
dissolução e liquidação da empresa, assim como a respectiva cessação de
actividade para efeitos de IVA e IRC, que foi efectuada oficiosamente pela
Administração Fiscal.

K) No que toca à valoração da prova, a decisão discrimina os factos provados e não


provados, fazendo um exame crítico sobre os mesmos, vide art.º 659º do CPC,
sendo aqui que andou mal a sentença exarada nos autos pois a prova documental
produzida impunha uma decisão em sentido diverso.

L) Em conclusão, deve sublinhar-se que do acordo celebrado entre a M… S. A. e a


Administração Fiscal outra ilação não se poderá retirar que não a de que este é um
acto de gerência de facto praticado pelo oponente, no qual obriga a devedora
originária a um plano de pagamento em prestações e oferece à penhora bens
daquela, onerando-os.

M) Face ao que antecede, discordamos do entendimento da Mmª Juiz “a quo”, de


que a oposição deve proceder por falta de prova da gerência de facto do
revertido.. (…)”

O Ministério Público junto deste tribunal teve vista nos autos emitiu

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parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso, por


verificado erro de julgamento.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o


processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR


E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente,
estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das
respetivas alegações, sendo as de saber se a sentença recorrida
incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao ter decidido
que a Recorrente não provou que o Recorrido exerceu a administração
efetiva ou de facto na sociedade originária devedora.

3. JULGAMENTO DE FACTO
No Tribunal a quo, o julgamento da matéria de facto foi efetuado nos
seguintes termos:
“(…) A) Nos autos de execução n.º 2720200401021273 e apensos, instaurados
contra a sociedade “M…, S.A.”, visa-se a cobrança coerciva da quantia de €
161.384,37 (cento e sessenta e um mil, trezentos e oitenta e quatro euros e trinta e
sete cêntimos), respeitante a IVA do ano de 2004, Coimas Fiscais dos anos de 2003
e 2004 e IRC de 2003.
B) O oponente cessou as suas funções, enquanto membro do Conselho de
Administração, mais precisamente enquanto Presidente daquele, mediante
renúncia, em 6 de Abril de 2004, tendo esta sido registada na Conservatória do
Registo Comercial de Viseu através da Ap. 81/20050620, vide fls. 142 dos autos;
C) Após a data da renúncia mencionada no antecedente ponto, o oponente
assumiu um acordo de pagamento no âmbito do processo executivo n.º
2720200401012649, comprometendo-se a liquidar o montante de € 33.517,04,
relativamente a dívidas fiscais de IVA e IRC do período da sua administração,
montante que liquidou na totalidade – cfr. Docs. 1 a 19, juntos com a petição inicial.
D) Por despacho para audição de 5 de Fevereiro de 2007 do Chefe de Finanças do
SF de Viseu - 1, constante de fls. 145 e 146 dos presentes autos, foi determinada a
preparação do processo para efeitos de reversão da execução fiscal contra o
oponente, na qualidade de administrador da devedora principal;
E) Por despacho de 7 de Março de 2007, a execução reverteu contra o responsável
subsidiário, o aqui oponente, L...;
F) Do despacho de reversão, com interesse para a decisão da causa, consta, para
além do mais:
“…
Através da análise do presente processo, constata-se a inexistência/insuficiência de
bens, pertencentes à originária devedora, M..., S.A., NIPC 5..., com sede em Campo,
Viseu, que garantam o pagamento da dívida exequenda e acrescido.
Assim, em 2007-02-05, foi proferido despacho para reversão da presente execução
contra o seguinte administrador:
- L... (...)
Como sendo subsidiário responsável por toda a dívida exequenda, que está na
origem da instauração do presente procedimento executivo, referente a:
- IVA de 2004 (de Abril a Agosto), no valor de € 66.760,12.
- Coimas relativas ao ano de 2004, no valor de € 21.742,00.
- IVA de 2004 (Setembro e Outubro), no valor de € 22.585,75.
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- IVA de 2004 (Novembro), no valor de € 10.784,96.


- IRC de 2003, no valor de € 3.489,74.
- IRC de 2003, no valor de € 722,60.
- IVA de 2004 (Dezembro), no valor de € 17.030,61.
- Coimas relativas ao ano de 2004, no valor de € 7.916,36.
- Coima relativa ao ano de 2004, no valor de € 3.808,26.
- Coimas, relativas ao ano de 2004, no valor de 6.018,22.
- Coima, relativa ao ano de 2003, no valor de € 525,75.
Notificado para os efeitos do disposto no n°4 do art.° 23° e 26° da L.G.T. (Lei Geral
Tributária), o administrador supra citado veio exercer o seu direito de audição, cfr.
fls. 558 a 563, tendo alegado, resumidamente, o seguinte:
• Deixou de ser administrador da Firma executada originária em 16/04/2004, por
carta enviada pelo Conselho de Administração, tendo junto, como prova do
alegado, uma cópia da certidão de registo da Firma na Conservatória do Registo
Comercial de Viseu.
• Desde essa data que não é administrador da Firma nem exerce qualquer cargo
na mesma, pelo que é parte ilegítima na reversão movida contra si.
Importa desde já referir que o referido revertido não veio trazer qualquer
elemento novo ao processo, uma vez que o Despacho para reversão, contra si
proferido, teve em conta que o mesmo deixou de ser o Presidente do Conselho de
Administração em 16/04/2004.
No entanto, não foi nessa qualidade que o mesmo foi chamado à reversão, pois,
nos termos do Art° 24 da L.G.T., podem também ser consideradas responsáveis
subsidiárias em relação às dívidas da Firma, "outras pessoas que exerçam, ainda
que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas
e entes fiscalmente equiparados".
Ora, de acordo com a escritura de constituição de sociedade (...) e a certidão
relativa ao registo da mesma na Conservatória do Registo Comercial de Viseu (...)
foram administradores da firma aqui executada:
• De 25/10/2002 a 15/04/2004:
- A... (...)
• De 16/04/2004 a 13107/2005:
- I... (...)
- Luz... (...)
No entanto, tendo em conta diligências efectuadas, nomeadamente os autos de
declarações de ex funcionários da Firma aqui executada (...) chegamos a
diferentes conclusões.
Assim, até Abril de 2004 quem de facto exercia funções de administrador era o Sr.
L..., marido de A... (administradora em termos oficiais,), uma vez que era ele quem
contratava os funcionários, dava instruções, angariava clientes e e:fectuava
pagamentos em nome da Firma.
Posteriormente, e embora na Certidão de Registo surja o nome de Ivone Parecida
Muller e Luzineth da Silva como sendo as administradoras, nos períodos supra
referidos, o que é certo é que as mesmas nunca foram vistas na empresa por
nenhum dos funcionários que prestaram declarações, a não ser pelo Sr. José
Figueiredo e mesmo este entende que elas não exerciam função de
administradoras (...).
No entendimento dos funcionários, era o Sr. F... quem exercia funções de
administrador, pois era o mesmo que tratava de tudo relacionado com a Firma,
emboria raramente fosse visto, havendo também quem afirmasse que ele, por não
ser de Viseu, delegaria essas funções no Sr. L... (...).
Pese embora as várias tentativas para identificação do referido F...,
nomeadamente junto da Conservatória do Registo Comercial de Viseu, as mesmas
mostraram-se infrutíferas, pelo que o mesmo tem número de contribuinte e
paradeiro desconhecidos.
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Para ultrapassar tal dificuldade, foram solicitadas informações ao administrador


"de facto", o Sr. L..., (...) uma vez que foi através deste que ocorreu a transmissão
das acções ao portador para o Sr. F..., tendo o mesmo respondido que não
dispunha de qualquer elemento relativo à Firma aqui executada (...).
Posteriormente, via telefone, indicou duas possíveis moradas, na área de Leiria e
de Lisboa, as quais não aparecem no sistema central de gestão de contribuintes,
pelo que se presumem inexistentes.
A todo o exposto acresce que, segundo o teor de alguns documentos constantes
do processo, o revertido L... Costa exerceu, de facto, a administração da firma aqui
executada originária depois de Abril de 2004, conforme se retira do Acordo de
pagamento elaborado em 07/10/2004, assinado pelo mesmo na qualidade de
administrador da Firma, (...), da consulta ao cadastro da Firma, onde surge como
administrador em 10/08/2005 e 31/08/2006 (...) e das Folhas de Remunerações
remetidas pela Segurança Social, Centro Distrital de Viseu, onde o mesmo surge
como pertencendo ao órgão estatutário da Firma desde Abril a Dezembro de 2004
(...).
Deste modo, tendo em conta todas as diligências efectuadas, e atrás explicitadas,
forçoso é concluir que o revertido L... é responsável subsidiário relativamente às
dívidas da Firma M..., S.A., pois, para além de não ter ilidido a presunção de culpa
que sobre si recaía, nos termos dos preceitos já citados, existe prova de que o
mesmo exerceu de facto a administração da Firma, pelo menos até finais de 2004,
data a que correspondem as dívidas em cobrança no presente processo de
execução fiscal e apensos.
Assim, constatada a insuficiência/inexistência de bens da originária devedora e
tendo como fundamento legal o disposto no art. 23° da L.G.T., e art. 153°, n°2, alínea
a) e b), do C,. P. P. T.,
ORDENO A REVERSÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL,
contra o subsidiário responsável L..., relativamente às dívidas acima descritas, no
valor global de € 161.384,37 (ainda sem acrescido), e que está na base da
instauração do processo de execução fiscal n.° 2720200401021273 e apensos.
…” - cfr. fls. 155 a 158 dos presentes autos.

Factos não provados


Os que indiciem que o Oponente tenha exercido, de facto, efectivamente, a
gerência/administração da Originária devedora. Quanto à gestão fundou-se a
Entidade Exequente nos autos de declarações de ex-funcionários da firma, aqui
devedora originária, não obstante os actuais funcionários terem afirmado que era
outro, que não o aqui oponente, quem exercia as funções de administrador, não
tendo a AF diligenciado no sentido de excluir tal facto. Mais, a falta de alegação e
prova resulta também, ainda que por exclusão, dos factos provados,
nomeadamente dos despachos de reversão.

*
A base probatória radica nos documentos neles referidos. (…)”
*
3.1. Alteração à matéria de facto.

Nos termos do art.º 712.º, nº 1, al. a), do CPC (atual n.º 1 do 662.º do CPC)
por estar documentalmente demonstrada nos autos altera-se o facto
da alínea C), nos termos seguintes:

C) Em 07.10.2004, o Oponente compareceu nos Serviços de Finanças,


na qualidade de administrador da firma M…, S.A., onde assumiu um
acordo de pagamento no âmbito do processo executivo n.º
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2720200401012649, comprometendo-se a liquidar o montante de €


33.517,04, relativamente a dívidas fiscais de IVA propondo-se fazer
pagamento por conta, quinzenalmente, no valor mínimo de 2000.00€
oferecendo para penhora como garantia da dívida, outros bens, sendo
um semi-reboque da marca Viberti, modelo 36503A1 e trator pesado
marca Scania de matricula …MH. (fls.19 a 23 dos autos)

4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. A principal questão que cumpre resolver, consiste em apreciar se
houve erro de julgamento de facto e de direito da sentença recorrida
ao ter decidido que a Recorrente não fez prova que o Recorrido
exerceu a administração efetiva ou de facto na sociedade originária
devedora.
Importa referir que a execução fiscal tem por objeto a cobrança
coerciva por dívidas provenientes de IVA e IRC de 2003 e 2004 e coimas
Fiscais dos anos de 2003 e 2004.
A responsabilidade dos administradores ou gerentes de sociedades
pelas dívidas tributárias, responsabilidade está prevista no artigo 24.º
da LGT.
O artigo 24.º da LGT estabelece o seguinte: “1- Os administradores,
directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto,
funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente
equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e
solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período
de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha
terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua
que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou
insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha
terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes
foi imputável a falta de pagamento.”.
A responsabilidade subsidiária dos administradores / gerentes, por
dívidas da executada originária, tem por pressuposto o exercício
efetivo do cargo.
Na Lei Geral Tributária retira-se da interpretação do exórdio do n.º 1 do
art.º 24.º, onde se menciona expressamente o exercício de funções. “Os
administradores, […] e outras pessoas que exerçam […] funções de
administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente
equiparados…”
A responsabilidade subsidiária aí prevista não exige a gerência nominal
ou de direito quando refere que “ Os administradores, directores e gerentes
e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de
administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados”
(destacado nosso).
Desde logo, resulta do citado normativo, que a responsabilidade
subsidiária é atribuída em função do exercício do cargo de
administrador / gerente e reportada ao período do respetivo exercício.
Ou seja, administração / gerência de facto constitui requisito da
responsabilidade subsidiária dos administradores e gerentes,
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independentemente da titularidade do cargo, a gerência ou


administração nominal ou de direito.
E é esta também a jurisprudência pacífica deste Tribunal espelhada nos
acórdãos n.ºs 00349/05.6 BEBRG de 11.03.2010, 00207/07.0 BEBRG de
22.02.2012, 001517/07.1 BEPRT de 13.03.2014, 01944/10.7 BEBRG de
12.06.2014 e 01943/10.9 BEBRG de 12.06.2014 e do Pleno da secção do
CT do Supremo Tribunal Administrativo de 28.02.2007, proferido no
processo 01132/06 e 0861/08 de 10.12.2008 entre outros.
Assim, decorre do n.º 1 do art.º 24.º da LGT que os administradores, e
outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de
administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente
equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e
solidariamente entre si.

Resulta da interpretação do artigo 24.º da LGT que a responsabilidade


subsidiária é estabelecida em função do exercício do cargo de
administrador / gerente e reportada ao período do respetivo exercício.
A administração de facto constitui requisito da responsabilidade
subsidiária dos gerentes, não sendo necessário a titularidade do cargo,
a gerência nominal ou de direito.

Incumbe à Administração Tributária, na qualidade de exequente e


titular do direito de reversão, o ónus de alegar e provar os
pressupostos que lhe permitem reverter a execução fiscal contra o
administrador / gerente da devedora originária, designadamente, os
factos integradores do efetivo exercício da gerência de facto em
conformidade com a regra geral de quem invoca um direito tem que
provar os respetivos factos constitutivos (artigo 342º, nº 1, do CC e
artigo 74º, nº 1, da LGT).

No caso sub judice importa apurar se os factos dados como provados


na sentença recorrida permitem afirmar que o Recorrido não exerceu a
administração de facto.

Antes de mais, cumpre salientar que a gerência de facto de uma


sociedade comercial consiste no efetivo exercício das funções que lhe
são próprias e que passam, nomeadamente, pelas relações com os
fornecedores, com os clientes, com as instituições de bancárias e com
os trabalhadores, tudo em nome, e no interesse e em representação
dessa sociedade.

Para que se verifique a administração / gerência de facto é


indispensável que o administrador / gerente use, efetivamente, dos
respetivos poderes, que seja um órgão atuante da sociedade, tomando
as deliberações consentidas pelo facto, administrando e
representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a
vontade social perante terceiros - nestes termos, Rúben Anjos de
Carvalho, Francisco Rodrigues Pardal, Código de Processo das

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Contribuições e Impostos, anotado e comentado, 2ª Edição, Coimbra,


1969, p. 139 - citado, entre outros, nos acórdãos do TCAN de 18/11/2010
e de 20/12/2011, Processos 00286/07 e 00639/04, respetivamente.

Desempenha funções de administrador / gerente de facto quem


exterioriza a vontade das sociedades nos seus negócios jurídicos,
quem manifesta a capacidade de exercício de direitos da sociedade,
praticando atos que produzem efeitos na esfera jurídica desta.
Em síntese, nas situações previstas nas alíneas a) e b) do art.º 24.º da
LGT, compete à Fazenda Pública, na qualidade de exequente o ónus da
prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do
administrador, o que significa que deve contra si ser valorada a falta de
prova sobre o efetivo exercício da administração ou gerência.
A Administração Fiscal, procedeu à reversão da dívida contra o L...,
uma vez que recolheu informação, constante dos autos, que o mesmo
apesar de ter renunciado à administração da sociedade executada em
06.04.2004, continuou a exercer as funções de administrador.
Assim, e como consta do despacho de reversão “A todo o exposto acresce
que, segundo o teor de alguns documentos constantes do processo, o revertido
L... exerceu, de facto, a administração da firma aqui executada originária depois
de Abril de 2004, conforme se retira do Acordo de pagamento elaborado em
07/10/2004, assinado pelo mesmo na qualidade de administrador da Firma, (...), da
consulta ao cadastro da Firma, onde surge como administrador em 10/08/2005 e
31/08/2006 (...) e das Folhas de Remunerações remetidas pela Segurança Social,
Centro Distrital de Viseu, onde o mesmo surge como pertencendo ao órgão
estatutário da Firma desde Abril a Dezembro de 2004 (...).
Deste modo, tendo em conta todas as diligências efectuadas, e atrás explicitadas,
forçoso é concluir que o revertido L... é responsável subsidiário relativamente às
dívidas da Firma M..., S.A., pois, para além de não ter ilidido a presunção de culpa
que sobre si recaía, nos termos dos preceitos já citados, existe prova de que o
mesmo exerceu de facto a administração da Firma, pelo menos até finais de 2004,
data a que correspondem as dívidas em cobrança no presente processo de
execução fiscal e apensos. (...)
A sentença recorrida entendeu que “Ora, conforme resulta dos factos
provados, o aqui Oponente renunciou à gerência em 6 de Abril de 2004, ou seja,
antes de constituídas as dívidas aqui exigidas e, não obstante a devedora
originária não ter procedido ao registo daquela renúncia na Conservatória do
Registo Comercial, a mesma produz efeitos decorridos que sejam 8 dias após a
deliberação, conforme dispõe o art.258.º, n.º 1 do CSC. “A renúncia de gerentes
deve ser comunicada por escrito à sociedade e torna-se efectiva oito dias depois
de recebida a comunicação.” A jurisprudência dos Tribunais superiores, tem
seguido esse entendimento, nomeadamente no que respeita à falta de registo da
renúncia. Veja-se o Acórdão do TCA Sul, de 7 de Novembro de 2006, in JusNet
5700/2006, Processo n.º 01291/06, do qual consta “O sócio que renuncia à
gerência de uma sociedade em data anterior à constituição das dívidas fiscais
não é subsidiariamente responsável pelo seu pagamento, ainda que o acto não
tenha sido inscrito na respectiva Conservatória, acto este imputável à sociedade.
A renúncia à gerência é um acto receptício que produz efeitos desde o seu
conhecimento na sociedade, independentemente da sua inscrição na
conservatória.” Assim, dúvidas não restam relativamente à impossibilidade de
responsabilização do aqui Oponente pelas dívidas, objecto da reversão fiscal. Aliás,
tal como consta dos factos provados, o oponente, mesmo depois de renunciar ao
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seu cargo, celebrou um acordo, no sentido de liquidar as dívidas de IVA e IRC


reportadas ao período em que exercia funções de administrador, no âmbito do
PEF n.º 2720200401012649, tendo liquidado a totalidade da dívida, o que
demonstra a boa-fé do oponente, nomeadamente por querer regularizar a
situação fiscal da sociedade, no período em que as funções de gestão lhe estavam
adstritas.(…)”
Mas não podemos concordar com a sentença recorrida, a qual
demonstra que analisou o despacho de reversão bem como os demais
elementos que o sustentam de modo aligeirado e sem ponderar o seu
teor bem como os elementos juntos autos, senão vejamos:
Nas alínea B) e C) do probatório é dado como assente que oponente
cessou as suas funções, enquanto membro do Conselho de
Administração, na qualidade de presidente, mediante renúncia, em 6
de abril de 2004, tendo esta sido registada na Conservatória do Registo
Comercial de Viseu através da Ap. 81/20050620.
Em 07.10.2004, após a data da renúncia mencionada, o oponente
compareceu nos Serviços de Finanças, na qualidade de administrador
da firma M…, S.A., assumiu um acordo de pagamento no âmbito do
processo executivo n.º 2720200401012649, comprometendo-se a
liquidar o montante de € 33.517,04, relativamente a dívidas fiscais de
IVA propondo-se a fazer pagamento por conta, quinzenalmente, no
valor mínimo de 2000.00€ oferecendo para penhora como garantia da
dívida, outros bens, sendo um semi-reboque da marca Viberti, modelo
36503A1 e trator pesado marca Scania de matricula …MH.
Destes dois factos decorre de imediato que o Recorrido exerceu
funções de administrador, de facto em 07.10.2004, quando se
apresentou no Serviços de Finanças a fazer um acordo de pagamento,
na qualidade de Administrador, e em nome da executada originária e a
onerar o seu património, e não como refere a sentença recorrida em
nome próprio.
Acresce ainda, que a Administração realizou diligências tendo
procedido à audição de ex funcionários da empresa executada, tendo
consignado no despacho de reversão que “ (…) Assim, até Abril de 2004
quem de facto exercia funções de administrador era o Sr. L..., marido de A...
(administradora em termos oficiais,), uma vez que era ele quem contratava os
funcionários, dava instruções, angariava clientes e efectuava pagamentos em
nome da Firma.
Posteriormente, e embora na Certidão de Registo surja o nome de Ivone Parecida
Muller e Luzineth da Silva como sendo as administradoras, nos períodos supra
referidos, o que é certo é que as mesmas nunca foram vistas na empresa por
nenhum dos funcionários que prestaram declarações, a não ser pelo Sr. José
Figueiredo e mesmo este entende que elas não exerciam função de
administradoras Cfr. 536(...).
Da consulta ao cadastro da sociedade, o Recorrido surge como
administrador em 10.08.2005 e 31.08.2006 e das Folhas de
Remunerações remetidas pela Segurança Social, Centro Distrital de
Viseu, onde o mesmo surge como pertencendo ao órgão estatutário
desde Abril a Dezembro de 2004 e a auferir remuneração.
Assim, face à questão, entendemos que a Fazenda Pública, no
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despacho de reversão demonstra que o Recorrido exerceu de facto as


funções de gerente da sociedade executada.
Destarte, os elementos presentes nos autos são suficientes para
afirmar a prática de atos de administração efetiva pelo Recorrido, pelo
que a decisão incorreu em erro de julgamento de facto e de direito.
Tendo o Recorrente alegados outros vícios, nomeadamente relativos
ao despacho de reversão e à falta de culpa na insuficiência do
património e da sociedade executada, impõem-se a baixa dos autos ao
Tribunal de 1ª instância para a realização das diligências julgadas
necessárias e, após, ser proferida decisão em face dos elementos de
prova recolhidos, se nada obstar.

4.2.E assim formulamos as seguintes conclusões:

I. Decorre do n.º 1 do art.º 24.º da LGT que os administradores, e outras


pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de
administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente
equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e
solidariamente entre.

II. Resulta da interpretação do artigo 24.º da LGT que a


responsabilidade subsidiária é estabelecida em função do exercício do
cargo de administrador / gerente e reportada ao período do respetivo
exercício. A administração de facto constitui requisito da
responsabilidade subsidiária dos gerentes, não sendo necessário a
titularidade do cargo, a gerência nominal ou de direito.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de
Contencioso Tributário deste Tribunal, em conceder provimento ao
recurso anular a sentença recorrida, ordenando-se a baixa do processo
ao Tribunal de 1ª instância para conhecimentos das demais questões
equacionadas.
Sem custas.

Porto, 24 de janeiro de 2017

Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira

Ass. Mário Rebelo

Ass. Cristina Travassos Bento

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