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Didática do Ensino Superior

Autora
Jane Rangel Alves Barbosa

2009
© 2003-2006 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do
detentor dos direitos autorais.

B238 Barbosa, Jane Rangel Alves. / Didática do Ensino Superior. /


Jane Rangel Alves Barbosa. — Curitiba : IESDE Brasil S.A.,
2009.
124 p.

ISBN: 85-7638-248-2

1. Curso Normal. 2. Educação. I. Título.

CDD 378

Todos os direitos reservados.


IESDE Brasil S.A.
Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482 • Batel
80730-200 • Curitiba • PR
www.iesde.com.br
Sumário
A docência no Ensino Superior...............................................................................................7
Profissionalização continuada e construção da identidade profissional...................................................10
Concluindo................................................................................................................................................12

Universidades e faculdades isoladas: diversos locais de trabalho dos professores..............17


Ensino Superior e docência......................................................................................................................17
A Lei de Diretrizes e Bases e o Ensino Superior......................................................................................17
A Lei de Diretrizes e Bases e a formação de docentes.............................................................................19
Finalidades da universidade no contexto atual.........................................................................................21
Instituições de Ensino Superior: os diversos locais de trabalho dos professores.....................................22
Seleção e carreira do magistério superior.................................................................................................22
Ensino Superior brasileiro: desafios a enfrentar.......................................................................................23

Elementos para a compreensão do cotidiano e o processo didático.....................................27


O conceito de educação como fundamento da ação educativa.................................................................28
Objetivos da educação brasileira..............................................................................................................30
Funções sociais da educação....................................................................................................................31
Perspectivas atuais....................................................................................................................................32
Crises e alternativas..................................................................................................................................32

Prática educativa, pedagogia e didática................................................................................37


Prática educativa na sociedade.................................................................................................................37
O papel da pedagogia na sociedade..........................................................................................................38
O que é pedagogia?...................................................................................................................................38
E, o que é didática?...................................................................................................................................40
Didática e metodologia.............................................................................................................................40
Tendências pedagógicas da prática escolar...............................................................................................41
Concluindo................................................................................................................................................44

Ensinar e aprender: a construção do conhecimento................................................................49


Analisando a realidade atual.....................................................................................................................49
O ensino e a aprendizagem na vida humana.............................................................................................49
O que é ensino?.........................................................................................................................................50
O que é aprendizagem?.............................................................................................................................51
Ensinar e aprender: significados e mediações..........................................................................................52
Refletindo sobre sua prática docente........................................................................................................53
Ensinar e aprender no Ensino Superior....................................................................................................53
Características da aprendizagem no Ensino Superior...............................................................................54
Aprender a aprender.................................................................................................................................55
Concluindo................................................................................................................................................56
Planejamento da ação didática: uma prática em questão......................................................59
Planejamento: níveis e suas relações........................................................................................................59
Tipos de planejamento na área da educação.............................................................................................60
O planejamento no Ensino Superior.........................................................................................................65
Objetivos do programa de disciplina........................................................................................................67
Conteúdos programáticos.........................................................................................................................69
E a metodologia de ensino?......................................................................................................................69
Como o professor universitário avalia seus alunos?.................................................................................70
Bibliografia básica....................................................................................................................................70
Bibliografia complementar.......................................................................................................................70

Planejamento de ensino numa perspectiva crítica................................................................73


O processo de planejamento no Ensino Superior.....................................................................................74
Planejamento: ação pedagógica essencial................................................................................................75
Planejamento de ensino: processo integrador entre a universidade e o contexto social...........................76
Concluindo................................................................................................................................................77

Objetivos, conteúdos e metodologias...................................................................................81


Introdução.................................................................................................................................................81
A formulação de objetivos educacionais..................................................................................................82
O que são objetivos?.................................................................................................................................83
Os conteúdos de ensino............................................................................................................................87
Metodologias............................................................................................................................................89
Concluindo................................................................................................................................................91
O trabalho interdisciplinar no Ensino Superior........................................................................................93

Repensando a aula universitária no dia-a-dia.......................................................................97


Introdução.................................................................................................................................................97
O que é aula expositiva?...........................................................................................................................97
Como utilizar uma aula expositiva?.........................................................................................................98
Vantagens e limitações da aula expositiva................................................................................................98
Repensando a aula universitária...............................................................................................................100
Conceito de sala de aula universitária......................................................................................................101
Como substituir o paradigma de ênfase no ensino pela ênfase na aprendizagem?..................................102
Como colocar na prática o novo paradigma da aula universitária no dia-a-dia?......................................103
Concluindo................................................................................................................................................104

Avaliação da aprendizagem: avaliar não é o que muita gente pensa....................................107


Introdução.................................................................................................................................................107
Um momento de auto-avaliação...............................................................................................................109
O que faz um professor universitário em sua atividade profissional no dia-a-dia?..................................111
O conceito de avaliação de aprendizagem e as concepções pedagógicas................................................111
Ensino para competências.........................................................................................................................113
“Professor, eu sabia tudo, eu estudei tudo, mas na hora da prova, fiquei nervoso e deu um branco”......115
Avaliação da aprendizagem......................................................................................................................116
A prova: ressignificando a Taxionomia de Bloom....................................................................................117

Referências............................................................................................................................119
Apresentação

A
Educação Superior, ontem, era uma mais exigência de aprimoramento intelectual. Porém,
hoje, é uma exigência de sobrevivência e desenvolvimento de um país.
A Educação Superior, até bem pouco, tinha caráter humanístico, era privilégio
de poucos, quase todos provenientes de famílias dominantes no cenário político e econômico do
país. Seus estudantes buscavam mais um “aprimoramento pessoal” do que uma profissão. Mas, a
importância que adquire, hoje, as questões da ciência, da tecnologia e da comunicação no mundo
globalizado, provoca sensíveis transformações nas sociedades contemporâneas em todos os sentidos,
sinalizando a construção de uma nova sociedade, uma nova realidade social, obrigando a educação
escolar vincular-se às práticas sociais e ao mundo do trabalho.
No que se refere à formação de professores para o Ensino Superior, as pesquisas recentes na
área de educação mostram que os professores são profissionais essenciais nos processos de mudança
das ­sociedades. Por isso, é preciso investir na formação e no desenvolvimento profissional dos
­professores.
Como a educação superior está inserida no contexto social global, é preciso situar a
instituição de Ensino Superior, analisá-la e criticá-la como instituição social que tem compromissos
­historicamente definidos.
No decorrer das últimas décadas, a instituição universitária vem experimentando muitas
alterações, colocando em discussão esses compromissos e a sua relação com a sociedade em que está
inserida.

Jane Rangel Alves Barbosa


A docência
no Ensino Superior
Jane Rangel Alves Barbosa*
Na sensação humana de aprender... está a divina
alegria de ensinar.

Albert Einstein

E
ntendendo que a profissão docente constitui uma unidade, qualquer que seja
o nível de atuação – Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Mé-
dio e Ensino Superior –, a profissão de professor adquirirá características
peculiares conforme o nível de escolaridade em que atue, sem prejuízo de sua
identidade básica.
A formação de professores para o Ensino Superior no Brasil não está re-
gulamentada sob a forma de um curso específico como na educação básica. De
um modo geral, a Lei de Diretrizes e Bases admite que esse profissional seja
preparado nos cursos de pós-graduação tanto stricto sensu como lato sensu. En-
tretanto, a exigência legal de que todas as instituições de Ensino Superior tenham
um ­mínimo de um terço de seus docentes titulados na pós-graduação stricto sensu
aponta para o ­fortalecimento desta, como o lugar para a formação do docente.
Paralelamente à questão legal, a docência universitária constitui tema re-
levante em diferentes países e, no nosso, só se admite a necessidade de as ins-
tituições de Ensino Superior desenvolverem programas de preparação de seus
professores para o exercício da docência. Preparação esta que os coloque a par
da problemática e complexidade do ensinar e do formar no Ensino Superior, do
formar profissionais, do formar pesquisadores e do formar professores. Daí, per-
guntarmos: Qual o papel da didática na formação de professores?
D outora e m Filo s o fia
O papel da didática na formação de professores não está, para muitos, ade- pela U n iv e rs id a d e Fe -
quadamente definido, o que gera indefinição do seu próprio conteúdo. Alguns deral do R i o d e J a n e i r o
(U FRJ). M e s tre e m Ed u -
estudiosos têm a sensação de que, ao tentar superar uma visão meramente ins- cação pe l a U n i v e r s i d a d e
do G rand e R io (U n i-
trumental da didática, esta se limita a suplementar conhecimentos de Filoso-
granrio). Es p e c ia lis ta
fia, Sociologia, Psicologia, passando a ser “invadida” por diferentes campos do em A dmin is tra ç ã o Es c o -
­conhecimento e perdendo especificidade própria. Outros consideram que a didáti- lar, Supe rv is ã o Es c o la r,
didática d o En s in o Su -
ca deve ser entendida como um elemento articulador dos conhecimentos produzi- perior e Orie n ta ç ã o Ed u -
dos pelas disciplinas de Fundamentos da Educação e Prática Pedagógica. cacional p e l a F a c u l d a d e
Somley n o R io d e J a n e i-
ro. G rad u a d a e m Pe d a -
Trata-se de conhecimento de mediação, sendo, portanto, importante que se gogia pe la U n iv e rs id a -
baseie nas diferentes disciplinas da área de Fundamentos. Sua especificidade é ga- de Fede r a l F l u m i n e n s e
(U FF) e p e la Fa c u ld a d e
rantida pela preocupação com a ­compreensão do processo ensino-aprendizagem e de Filoso fia , C iê n c ia s e
a busca de formas de intervenção na prática pedagógica. Letras de N o v a Ig u a ç u .
Didática do Ensino Superior

A didática tem por objetivo o “como fazer” a prática pedagógica, mas este
só tem sentido q­ uando articulada ao “para que fazer” e ao “por que fazer”.
O ensino de didática parte de uma visão de totalidade do processo ensino-
aprendizagem, de uma perspectiva multidimensional; as dimensões humana, téc-
nica e político-social da prática pedagógica devem ser compreendidas e trabalha-
das de forma articulada.
Nessa linha de pensamento, a competência técnica e a competência política
do professor se exigem mutuamente e se interpenetram. Não é possível dissociar
uma da outra. A dimensão técnica da prática pedagógica tem de ser pensada à luz
do projeto político-social que a orienta.
Assim, a didática passa por um momento de revisão crítica. Há consciência
da necessidade de superar uma visão meramente instrumental e pretensamente
neutra do seu conteúdo. Trata-se de um momento de perplexidade, de denúncia e
anúncio, de busca de caminhos que têm de ser construídos por meio de um tra-
balho conjunto de profissionais da área com os professores da educação básica. É
pensando a prática pedagógica concreta articulada com a perspectiva de transfor-
mação social, que emergirá uma nova configuração para a didática.
O ensino de didática durante muito tempo tem dado prioridade ao estudo
das diferentes teorias do processo ensino-aprendizagem procurando ver as aplica-
ções e implicações destas teorias na prática pedagógica. Este modo de focalizá-lo
está formado por uma visão em que teoria e prática são momentos justapostos.
É necessário rever esta postura, partindo da prática pedagógica, procurando re-
fletir e analisar as diferentes teorias em confronto com ela. Trata-se de trabalhar
continuamente a relação entre teoria e prática procurando, inclusive, reconstruir a
própria teoria a partir da prática.
Estudos e pesquisas propõem discutir as questões referentes à docência no
Ensino Superior, destacando a importância dos professores e do seu trabalho ­nesse
nível de escolaridade, esta importância é relegada a planos inferiores tanto pelas
instituições quanto pelos próprios docentes.
Essa questão aponta para a problemática profissional do professor do Ensino Su-
perior, tanto no que se refere à identidade, que diz sobre o que é ser professor, quanto
no que se refere à profissão, que diz sobre as condições do exercício profissional.
Ao tratar da construção da identidade do professor, problematiza-a em relação
às diversas configurações das instituições universitárias, que têm seu corpo docente
composto de um conjunto de profissionais de diferentes áreas que, em sua maioria,
não tiveram formação inicial ou continuada para o exercício da profissão.
No tocante à formação de professores, os estudos têm mostrado que:
...o professor universitário aprende a sê-lo mediante um processo de socialização em parte
intuitiva, autodidata ou [...] seguindo a rotina dos “outros”. Isso se explica, sem dúvida, de-
vido à inexistência de uma formação específica como professor universitário. Nesse pro-
cesso, joga um papel mais ou menos importante sua própria experiência como aluno, o mo-
delo de ensino que predomina no sistema universitário e as reações de seus alunos, embora
não há que se descartar a capacidade autodidata do professorado. Mas ela é insuficiente.
(BENEDITO, 1995, p. 131).

8
A docência no Ensino Superior

Tal constatação tem favorecido inúmeras iniciativas, que caracterizam a


formação continuada ou em serviço, mediante cursos, palestras, semanas acadê-
micas, seminários, disciplinas de pós-graduação lato sensu etc. No entanto, essas
iniciativas não constituem regra geral, pois há um certo consenso de que a docên-
cia no Ensino Superior não precisa de qualquer formação no campo do ensinar,
sendo suficiente o domínio de conhecimentos específicos, o que significa dizer
que o que identifica é a pesquisa e/ou o exercício profissional no campo. Nesse
conceito, o professor é aquele que ensina, isto é, dispõe os conhecimentos aos
alunos. Se estes aprenderam ou não, não é problema do professor, especialmente
do aluno.
Na maioria das instituições de ensino superior, incluindo as universidades, embora seus
professores possuam experiência significativa e mesmo anos de estudos em suas áreas
específicas, predomina o despreparo e até um desconhecimento científico do que seja o
processo de ensino e de aprendizagem, pelo qual passaram a ser responsáveis a partir do
instante em que ingressam na sala de aula. (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 37).

Como se percebe, a questão da docência no Ensino Superior ultrapassa os


processos de sala de aula, colocando em discussão as finalidades dos cursos de
graduação.
No atual panorama nacional e internacional, há preocupação com o ­crescente
número de profissionais não qualificados para a docência universitária em ­atuação.
Considere-se, também, o contexto da globalização e da sociedade globalizada que
estão a exigir um posicionamento da comunidade universitária sobre essa neces-
sária profissionalização.
Entendendo que a profissão docente é atividade de educação, discutem-se os
significados desta na sociedade da informação e do conhecimento e o papel dos
professores universitários.
Examinando o panorama internacional, constata-se, nas instituições educa-
tivas dos países mais avançados, um crescimento da preocupação com a formação
e o desenvolvimento profissional dos professores universitários e com as inova-
ções no campo da didática.
Sem dúvida, tal fato se explica pela expansão quantitativa da educação
superior e o conseqüente aumento do número de docentes. No entanto, em sua
­maioria, são professores improvisados, não preparados para desenvolver a fun-
ção de pesquisadores e sem formação pedagógica, segundo os dados da Unesco
(UNESCO/CRESALC, 1996).
Também notamos a preocupação com a qualidade dos resultados do Ensino
Superior, sobretudo do ensino na graduação, apontando para a importância da
preparação no campo específico e no campo pedagógico de seus docentes. Além
­disso, novas demandas são postas sob a responsabilidade desses profissionais,
impulsionando estudos e pesquisas na área.
Expressando preocupações com temas do campo educacional até então au-
sentes na docência universitária, o documento da Conferência Internacional sobre
Ensino Superior – uma perspectiva docente (Paris, 1997) destaca temas como a
qualidade da educação, a educação a distância e as novas tecnologias, a gestão e o

9
Didática do Ensino Superior

controle do Ensino Superior, o financiamento do ensino e da pesquisa, o mercado


de trabalho e a sociedade, a autonomia e as responsabilidades das instituições, os
direitos e liberdades dos professores do Ensino Superior, as condições de trabalho,
entre outros.
Estes temas têm conduzido à preocupação dos docentes universitários, pois
o grau de qualificação é fator fundamental no fomento da qualidade em qualquer
profissão, especialmente na educação, que experimenta constantes mudanças.
O professor que deseja melhorar suas competências profissionais e meto-
dológicas de ensino, além da própria reflexão e atualização sobre o conteúdo da
matéria ensinada, precisa estar em estado permanente de aprendizagem.
É certo que a sociedade contemporânea está mudando o papel das institui-
ções de ensino e dos professores, os quais devem se pôr em dia com a tecnologia.
No entanto, o professor que quer ser visto sempre como um “mestre” precisa ter
consciência de que sua ação profissional competente não será substituída pelas
máquinas nem convertida em suportes e ajudantes da aprendizagem.
Qualquer que seja a solução dada às questões colocadas até o momento, não
desobriga o professor de adotar novas posturas em relação ao novo aluno que cada
ano chega às salas de aula.
Os professores exercem papel imprescindível, essencial e insubstituível nos
processos de mudança da sociedade.
No pensamento de Pimenta e Anastasiou,
é interessante destacar que, embora o sistema não se preocupe com a profissionalização
dos docentes e não estabeleça princípios e diretrizes para a profissionalização dos do-
centes do Ensino Superior, realiza uma série de verificações externas sobre a docência:
os resultados que os alunos obtêm no provão, os índices de professores com mestrado e
doutorado nas instituições, o prazo em 2004 para que seja feita a avaliação dos definidores
de qualidade. (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 143).

Profissionalização continuada
e construção da identidade profissional
Constatada e reconhecida a importância do desenvolvimento profissional da
profissão docente para os professores que atuam na universidade, vários caminhos
são experimentados nos últimos anos.
Primeiro, a inclusão da disciplina Metodologia do Ensino Superior, resumi-
da a uma duração de 60 horas em média, a única oportunidade de uma reflexão
­sistemática sobre a sala de aula, o papel do docente, o ensinar e o aprender, o pla-
nejamento, a organização dos conteúdos curriculares, a metodologia, as técnicas
de ensino, o processo avaliatório, o curso e a realidade social em que atuam.
Estudos mais recentes mostram que ações mais efetivas para a formação
docente ocorrem em processos de profissionalização continuada que contemplam

10
A docência no Ensino Superior

diversos elementos, entrelaçando os vários saberes da docência: os saberes da


experiência, do conhecimento e os saberes pedagógicos, na busca da construção
da identidade profissional, vista como processo de construção do profissional con-
textualizado e historicamente situado (PIMENTA, 1996).
Segundo Pimenta e Anastasiou (2002, p. 111-112), nos processos de profis-
sionalização continuada e de construção da identidade do docente, ­destacam-se os
aspectos relativos aos sujeitos presentes no universo da docência; aos determinan-
tes do processo educativo; à ação do docente na universidade.

Sujeitos presentes no universo da docência


O professor como pessoa e como profissional.
O aluno como sujeito do processo cognitivo.
Os processos cognitivos compartilhados entre os diferentes sujeitos.

Determinantes do processo educativo


O Projeto Político-Pedagógico institucional e sua inserção no contexto
social.
O projeto de curso e os dados da realidade institucional.
A teoria didática praticada e a desejada na sala de aula.
A responsabilidade com a atuação técnica e social do profissional no
mercado de trabalho.

Ação do docente na universidade


A construção coletiva interdisciplinar.
A definição de conteúdos e os enfoques metodológicos.
O acompanhamento do processo mediante a avaliação.
Esses aspectos revelam um quadro teórico complexo, considerando a carac-
terística essencialmente reflexiva da profissão docente e dos processos de profis-
sionalização continuada.
Ao tratar da construção da identidade docente, Nóvoa (1992) destaca que três
processos são essenciais:
o desenvolvimento pessoal, que se refere aos processos de produção da
vida do professor;
o desenvolvimento profissional, que se refere aos aspectos da profissio-
nalização docente;
o desenvolvimento institucional, que se refere aos investimentos da ins-
tituição para a consecução de seus objetivos educacionais.
Assim, podemos dizer que os processos de profissionalização continuada
bem conduzidos se assentam nesse tríplice investimento.

11
Didática do Ensino Superior

Concluindo
Para se tornar professor universitário hoje, dependendo da instituição a que
o professor se vincule, será exigido dele um tipo específico de produção: docência,
atividades de extensão e pesquisa, sendo a docência a atividade comum a todas as
instituições que compõem o Ensino Superior.
Assim, a relação profissional do professor com as instituições de Ensino
Superior inicia-se pelo papel de docente.

A didática e a formação profissional do professor


(LIBÂNEO, 1998, p. 27-29)
A formação profissional do professor é realizada nos cursos de Habilitação ao Magistério em
nível de 2.º grau e superior. Compõe-se de um conjunto de disciplinas coordenadas e articuladas
entre si, cujos objetivos e conteúdos devem confluir para uma unidade teórico-metodológica do
curso. A formação profissional é um processo pedagógico, intencional e organizado, de prepara-
ção ­teórico-científica e técnica do professor para dirigir competentemente o processo de ensino.
A formação do professor abrange, pois, duas dimensões: a formação teórico-científica,
­incluindo a formação acadêmica específica nas disciplinas em que o docente vai especializar-se e
a formação pedagógica, que envolve os conhecimentos da Filosofia, Sociologia, História da Edu-
cação e da própria pedagogia que contribuem para o esclarecimento do fenômeno educativo no
contexto histórico-social; a formação técnico-prática visando à preparação profissional específica
para a docência, incluindo a didática, as metodologias específicas, à Psicologia da Educação, a
pesquisa educacional e outras.
A organização dos conteúdos da formação do professor em aspectos teóricos e práticos de
modo algum significa considerá-los isoladamente. São aspectos que devem ser articulados. As
disciplinas teórico-científicas são necessariamente referidas à prática escolar, de modo que os
estudos específicos realizados no âmbito da formação acadêmica sejam relacionados com os de
formação pedagógica que tratam das finalidades da educação e dos condicionantes históricos,
sociais e políticos da escola. Do mesmo modo, os conteúdos das disciplinas específicas precisam
ligar-se às suas exigências metodológicas. As disciplinas de formação técnico-prática não se redu-
zem ao mero domínio de técnicas e regras, mas implicam também os aspectos teóricos, ao mesmo
tempo em que fornecem à teoria os problemas e desafios da prática. A formação profissional do
professor implica, pois, uma contínua interpenetração entre teoria e prática, a teoria vinculada aos
problemas reais postos pela experiência prática e ação prática orientada teoricamente.
Nesse entendimento, a didática se caracteriza como mediação entre as bases teórico-­científicas
da educação escolar e a prática docente. Ela opera como que uma ponte entre o “o quê” e o “como”
do processo pedagógico escolar. A teoria pedagógica orienta a ação educativa escolar mediante
objetivos, conteúdos e tarefas da formação cultural e científica, tendo em vista exigências sociais
concretas; por sua vez, a ação educativa somente pode realizar-se pela atividade prática do profes-

12
A docência no Ensino Superior

sor, de modo que as situações didáticas concretas requerem o “como” da intervenção pedagógica.
Este papel de síntese entre a teoria pedagógica e a prática educativa real assegura a interpenetra-
ção e interdependência entre fins e meios da educação escolar e, nessas condições, a didática pode
constituir-se em teoria do ensino. O processo didático efetiva a mediação escolar de objetivos,
conteúdos e métodos das matérias de ensino. Em função disso, a didática descreve e explica os
nexos, relações e ligações entre o ensino e a aprendizagem, investiga os fatores co-determinantes
desses processos; indica princípios, condições e meios de direção do ensino, tendo em vista a
aprendizagem, que são comuns ao ensino das diferentes disciplinas de conteúdos específicos. Para
isso, recorre às contribuições das ciências auxiliares da Educação e das próprias metodologias es-
pecíficas. É, pois, uma matéria de estudo que integra e articula conhecimentos teóricos e práticos
obtidos nas disciplinas de formação acadêmica, formação pedagógica e formação técnico-prática,
provendo o que é comum, básico e indispensável para o ensino de todas as demais disciplinas de
conteúdo.
A formação profissional para o magistério requer, assim, uma sólida formação teórica e
­prática. Muitas pessoas acreditam que o desempenho satisfatório teórico-prático do professor na
sala de aula depende de vocação natural ou somente da experiência prática, descartando-se a
teoria. É verdade que muitos professores manifestam especial tendência e gosto pela profissão,
assim como se sabe que mais tempo de experiência ajuda no desempenho profissional. Entretanto,
o domínio das bases teórico-científicas e técnicas, e sua articulação com as exigências concretas
do ensino, permitem maior segurança profissional, de modo que o docente ganhe base para pensar
sua prática e aprimore sempre mais a quantidade do seu trabalho.
Entre os conteúdos básicos da didática figuram os objetivos e tarefas do ensino na nossa so-
ciedade. A didática se baseia em uma concepção de homem e sociedade e, portanto, subordina-se
a propósitos sociais, políticos e pedagógicos para a educação escolar a serem estabelecidos em
função da realidade social brasileira.
O processo de ensino é uma atividade conjunta de professores e alunos, organizado sob a
­direção do professor, com a finalidade de prover as condições e meios pelos quais os alunos
­assimilam ativamente conhecimentos, habilidades, atitudes e convicções. Este é o objetivo de
estudo da ­didática. Os elementos constitutivos da didática, o seu desenvolvimento histórico, as
características do processo de ensino e aprendizagem, e a atividade de estudo como condição do
desenvolvimento intelectual.
Os objetivos, conteúdos, métodos e formas organizativas do ensino, especialmente a aula,
constituem o objeto da mediação escolar.

1. Com base no texto complementar A didática e a formação profissional do professor, responda:


a) Por que se afirma que a didática é o eixo da formação profissional do professor?

13
Didática do Ensino Superior

b) Que dimensões a formação do professor abrange na opinião do autor?

14
A docência no Ensino Superior

2. Atividade individual.

Leia o capítulo “Educação, identidade e profissão docente” do livro Docência no Ensino Supe-
rior de Léa das Graças Anastasiou e Selma Garrido Pimenta.

3. Atividade em grupo.

Partindo da ótica das autoras, discuta e apresente as conclusões sobre as questões da identidade
e profissão docente.

15
Didática do Ensino Superior

16
Universidades
e faculdades isoladas:
diversos locais de trabalho
dos professores

Ensino Superior e docência

A
Educação Superior, ontem, era mais uma exigência de aprimoramento intelectual. Porém,
hoje, é uma exigência de sobrevivência e desenvolvimento de um país.
A Educação Superior, até bem pouco tempo, tinha um caráter humanístico, era privi-
légio de poucos, quase todos provenientes de famílias dominantes no cenário político e econômico
do país. Seus estudantes buscavam mais um “aprimoramento pessoal” do que uma profissão. Mas,
a importância que adquire, hoje, as questões da ciência, da tecnologia e da comunicação no mundo
globalizado, provoca sensíveis transformações nas sociedades contemporâneas em todos os sentidos,
sinalizando a construção de uma nova sociedade, uma nova realidade social, obrigando a educação
escolar vincular-se às práticas sociais e ao mundo do trabalho, e, ao mesmo tempo, provocando mu-
danças significativas na Educação Superior brasileira.
No que se refere à formação de professores para o Ensino Superior, as pesquisas recentes na
área de educação mostram que os professores são profissionais essenciais nos processos de mudança
das sociedades. Por isso, é preciso investir em sua formação e desenvolvimento profissional.
Como a Educação Superior está inserida no contexto social global, é preciso situar a instituição
de Ensino Superior, analisá-la e criticá-la como instituição social que tem compromissos historica-
mente definidos.
No decorrer das últimas décadas, a instituição universitária vem experimentando muitas altera-
ções, colocando em discussão esses compromissos e sua relação com a sociedade na qual está inserida.

A Lei de Diretrizes e Bases e o Ensino Superior


A Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, também conhecida como Lei Darcy Ribeiro, define a
educação escolar brasileira em dois níveis:
Educação Básica – compreendendo a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Médio;
Educação Superior – com os cursos seqüenciais, de graduação, pós-graduação e extensão.
Didática do Ensino Superior

Segundo o artigo 22 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a Educação


Básica tem por objetivo: “desenvolver o educando e assegurar-lhe a formação co-
mum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer ao educando meios
para progredir no trabalho e em estudos posteriores”.
A Educação Superior tem os seguintes objetivos:
I – estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento
reflexivo;
II – formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em
setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e
colaborar na sua formação contínua;
III – incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando ao desenvolvi-
mento da ciência, da tecnologia e da criação e difusão da cultura e, desse modo, desenvol-
ver o entendimento do homem e do meio em que vive;
IV – promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que consti-
tuem patrimônio da humanidade, e comunicar o saber por meio do ensino, de publicações
ou de outras formas de comunicação;
V – suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar
a correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão sendo adquiridos
numa estrutura intelectual sistematizadora do conhecimento de cada geração;
VI – estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os na-
cionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta
uma relação de reciprocidade;
VII – promover a extensão aberta à participação da população, visando à difusão das con-
quistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica
geradas na instituição. (LDB, art. 43).

Conforme o artigo 44 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, os cursos


e programas da Educação Superior são:
I – cursos seqüenciais, por campo de saber, de diferentes níveis de abrangência, abertos a
candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos pelas instituições de ensino;
II – de graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o Ensino Médio ou equiva-
lente e tenham sido classificados em processo seletivo;
III – de pós-graduação, compreendendo programas de mestrado e doutorado, cursos de
especialização, aperfeiçoamento e outros abertos a candidatos diplomados em cursos de
graduação e que atendam às exigências das instituições de ensino;
IV – de extensão, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos em cada
caso pelas instituições de ensino. (grifos nossos).

Outros aspectos importantes a serem destacados, conforme a Lei de Dire-


trizes e Bases vigente:
a autorização, o reconhecimento e o credenciamento das universidades
e instituições de Ensino Superior terão prazos limitados e renovados,
­periodicamente, após processo regular de avaliação;
o ano letivo, independentemente do ano civil, tem, no mínimo, 200 dias
de trabalho efetivo, excluindo o tempo reservado aos exames finais,
quando houver;
os programas de cursos e demais componentes curriculares, sua duração,
requisitos, qualificação dos professores, recursos disponíveis e critérios de
18
Universidades e faculdades isoladas: diversos locais de trabalho dos professores

avaliação, assim como a organização de cumprir tais condições, serão obri-


gatoriamente informados aos interessados pelas respectivas instituições;
a freqüência dos alunos e professores é obrigatória, a não ser nos progra-
mas de educação a distância;
os diplomas expedidos por universidades serão por elas mesmas registra-
dos e terão validade nacional. Os de instituições não ­universitárias, por
universidades indicadas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) e
terão, também, validade nacional;
a transferência de alunos regulares poderá ser aceita se houver vagas e
mediante processo seletivo.
É importante destacar, também, que a Lei de Diretrizes e Bases da Educa-
ção (art. 13) define de forma pioneira, as atribuições dos professores, que são:
I – participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;
II – elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabeleci-
mento de ensino;
III – zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV – estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento;
V – ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidos, além de participar integralmente
dos períodos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional;
VI – colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade.

Na sociedade brasileira contemporânea, as rápidas transformações no ­mundo


do trabalho, o avanço tecnológico configurando a sociedade virtual e os meios de
informação e comunicação, invadem fortemente a instituição de Ensino Superior,
aumentando os desafios para torná-la uma conquista democrática efetiva.
O desafio é educar as pessoas, propiciando-lhes um desenvolvimento hu-
mano, cultural, científico e tecnológico, de modo que adquiram condições para
enfrentar as exigências do mundo contemporâneo.

A Lei de Diretrizes e Bases


e a formação de docentes
No contexto brasileiro, a Lei 9.394/96, que define as diretrizes e bases da
educação nacional, e o Decreto 2.207/97, que regulamenta o Sistema Federal de
Ensino, fazem referência explícita à preparação pedagógica para o exercício da
docência no Ensino Superior ao exigirem que as instituições de Ensino Superior
tenham professores titulados em nível de pós-graduação:
Art. 66. A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-
graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.

E, em seu parágrafo único, trata do “notório saber, reconhecido por univer-


sidade com curso de doutorado em área afim, poderá suprir a exigência de título
acadêmico”.
19
Didática do Ensino Superior

Como podemos observar, a Lei não concebe a docência universitária como


um processo de formação, mas como preparação para o exercício do magistério
superior, que será realizada prioritariamente em pós-graduação stricto sensu.
Esta questão tem sido considerada, tanto no âmbito da pesquisa sobre os
processos de formação como nas formulações das políticas de Ensino Superior,
no que se refere ao ensino e à pesquisa, exigências que caracterizam o exercício
da profissão em geral.
E, por sua vez, a didática e as licenciaturas, caminhos tradicionalmente per-
corridos na formação de professores para a Educação Básica (Educação Infantil,
Ensino Fundamental e Ensino Médio), são sempre lembradas ao lado das críticas
que historicamente foram construídas sobre elas.
Torna-se consensual a idéia de que a formação de professores deve ser con-
tínua e continuada, muito além da graduação específica, mesmo em nível supe-
rior, em processos institucionalizados e de contínua avaliação, nas mais variadas
formas de pesquisa e investigação.
A formação exigida para o exercício do magistério superior, conforme a Lei
de Diretrizes e Bases, pode ser assim resumida:
pós-graduação lato sensu em cursos de especialização em diferentes áreas
de conhecimento, com, no mínimo, 360 horas-aula com direito a certifica-
dos após cumprimento de todas as exigências da Instituição formadora;
pós-graduação stricto sensu prioritariamente em programas de mestrado
e doutorado, com duração de três e cinco anos respectivamente, com
­direito a diplomas.
Entendemos que a valorização da docência no Ensino Superior é ­fortemente
impregnada do significado que se atribui à universidade na ­sociedade contempo-
rânea.
A universidade como instituição educativa tem por finalidade o permanente
exercício da crítica, que se sustenta no ensino, na pesquisa e na extensão.
Para Edgard Morin (2000, p. 9-10), “a universidade conserva, memoriza,
integra e ritualiza uma herança cultural de saberes, idéias e valores que acaba por
ter um efeito regenerador, porque a universidade se incumbe de ­reexaminá-la e
transmiti-la”.
Assim, as funções da universidade podem ser sistematizadas, segundo
­Pimenta e Anastasiou (2002, p. 163), nas seguintes:
criação, desenvolvimento, transmissão e crítica da ciência, da técnica e
da cultura;
preparação para o exercício de atividade profissional que exija a aplica-
ção de conhecimentos e métodos científicos e para a criação artística;
apoio científico e técnico ao desenvolvimento cultural, social e ­econômico
das sociedades.
O sentido da educação é a humanização. A educação possibilita que todos
20
Universidades e faculdades isoladas: diversos locais de trabalho dos professores

os seres humanos tenham condições de serem partícipes e, ao mesmo tempo, pos-


sam desfrutar dos avanços e progressos da civilização construída historicamente,
e também sejam compromissados com a solução de seus problemas.
Ao consolidar a condição humana, a educação é atravessada por uma inten-
cionalidade teórica, sendo uma prática simultaneamente técnica, ética e política.
O ensino na universidade se constitui num processo de busca, de construção cien-
tífica e de crítica ao conhecimento produzido. Este é, portanto, o papel da univer-
sidade na construção da sociedade.
Nas sociedades contemporâneas, essas atribuições do ensino universitário
exigem uma ação docente na qual o professor universitário precisa atuar como
profissional reflexivo, crítico, responsável e competente no âmbito de sua discipli-
na, diferentemente do que ocorria no passado. Além disso, ele precisa ter capaci-
dade para exercer a docência e realizar atividades de investigação.
Neste contexto, destacamos três aspectos que impulsionam o desenvolvi-
mento profissional do professor universitário:
a transformação da sociedade, de seus valores e de suas formas de orga-
nização e trabalho;
o avanço exponencial das ciências nas últimas décadas;
a consolidação progressiva de uma Ciência da Educação, possibilitando
a todos o acesso aos saberes elaborados no campo da pedagogia. (PI-
MENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 165).
Assim, o desenvolvimento profissional do professor envolve a formação
inicial e continuada, articulada num processo de valorização de sua identidade
profissional. Logo, a docência constitui um campo específico de intervenção pro-
fissional na prática social.
Essa percepção possibilita ao professor universitário, mediante a ação edu-
cativa, a construção de sua consciência crítica, criativa e transformadora numa
sociedade contemporânea globalizada e complexa.

Finalidades da universidade
no contexto atual
As universidades são instituições pluridisciplinares de formação dos qua-
dros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão, de domínio e cultivo
do saber humano, que se caracterizam por:
I – produção intelectual institucionalizada mediante o estudo sistemático dos temas e
problemas mais relevantes, tanto do ponto de vista científico e cultural quanto regional e
nacional;
II – um terço do corpo docente, pelo menos, com titulação acadêmica de mestrado ou
doutorado;
III – um terço do corpo docente em regime de tempo integral. (LDB, art. 52).

21
Didática do Ensino Superior

Além dessas características, a Lei de Diretrizes e Bases define como facul-


tativa a criação de universidades especializadas por campo do saber.
A universidade, enquanto instituição social, caracteriza-se como ação
e prática social, pautando-se por um conhecimento guiado por suas necessida-
des, tanto no que se refere à descoberta e invenção quanto à transmissão desse
­conhecimento. Desde sua origem, a universidade buscou efetivar os princípios de
formação, ­criação, reflexão e crítica, tendo sua legitimidade fundamentada na au-
tonomia do saber. Mas, no contexto atual, ela vem perdendo esta característica.
A partir dos anos 90, a formação de profissionais nessa universidade resu-
me-se à transmissão rápida de conhecimentos, habilitação rápida para graduados
que precisam entrar rapidamente no mercado de trabalho. Assim, busca-se res-
tringir o papel da universidade ao treinamento, permitindo inúmeras críticas.
Na opinião de Chauí (2001, p. 55), “a universidade, exatamente como a em-
presa, está encarregada de produzir incompetentes sociais, presas fáceis da domi­
nação e da rede de autoridades”.
Nessa perspectiva, a universidade está a serviço de suas próprias concep-
ções, deixando de cumprir suas responsabilidades enquanto instituição social.

Instituições de Ensino Superior:


os diversos locais de trabalho
dos professores
A Lei de Diretrizes e Bases admite uma variedade de tipos de instituições
de Ensino Superior:
universidade – caracteriza-se pela autonomia didática, administrativa e
financeira, por desenvolver ensino, pesquisa e extensão e, portanto, con-
tar com um número expressivo de mestres e doutores;
centro universitário – caracteriza-se por atuar em uma ou mais áreas,
com autonomia para abrir e fechar cursos e vagas de graduação e ensino
de excelência;
faculdades integradas – reúnem instituições de diferentes áreas do co-
nhecimento e oferecem ensino e, às vezes, extensão e pesquisa;
institutos ou escolas superiores – atuam em áreas específicas do conhe-
cimento e podem ou não fazer pesquisa, além do ensino, mas dependem
do Conselho Nacional de Educação para criação de novos cursos.

Seleção e carreira do magistério superior


A seleção para o magistério superior é feita de diferentes maneiras, ­atendendo
às exigências de elevar a qualidade do ensino:
22
Universidades e faculdades isoladas: diversos locais de trabalho dos professores

por concurso de provas e títulos – em que o candidato põe à prova pública


a sua habilitação em conteúdo e didática, da disciplina a ser lecionada;
por concurso de títulos – em que é convidado o que conseguir maior
número de pontos segundo uma tabela previamente preparada;
por convite – após indicação realizada pelos professores da instituição
de Ensino Superior, o critério recai sobre a reconhecida competência
profissional do convidado na área de atuação específica, relacionada à
­disciplina que passará a lecionar;
por convocação em jornais – em que o candidato encaminha curriculum
vitae para análise e posterior convocação, de acordo com os critérios da
instituição de Ensino Superior.
Na carreira do magistério superior, temos as seguintes categorias de
­professores:
professor titular – com título de doutor;
professor adjunto – com título de doutor ou mestre;
professor assistente – com título de mestre;
professor auxiliar – com título de especialista ou cursando mestrado.
Temos também nas universidades, principalmente públicas:
professor visitante – professor de outra instituição de Ensino Superior,
nacional ou estrangeira, que se propõe a fazer determinados estudos,
prontificando-se, em colaboração, a ajudar na execução de parte de um
programa ou a dar cursos de extensão referentes à sua especialidade;
professor convidado – professor renomado, que seria convidado por de-
terminado tempo, a fim de orientar pesquisas ou ministrar cursos regulares
ou especiais, assistidos por professores titulares, adjuntos e assistentes.
É bom lembrar que o Plano de Carreira do Magistério Superior define a
mudança de categoria e nível, respectivamente, de acordo com a titulação e a pro-
dução científica dos professores.

Ensino Superior brasileiro:


desafios a enfrentar
O Ensino Superior apresenta problemas diversos. Apresentamos abaixo as
questões mais comumente levantadas.

Tamanho reduzido do sistema


O Brasil possui uma das mais baixas taxas de escolarização superior da
América Latina: cerca de 9% da população de 18 a 24 anos. Na Bolívia e no Peru,
essa taxa alcança 20,6% e 33,1% respectivamente. Nos últimos oito anos, a matrí-
23
Didática do Ensino Superior

cula nas instituições públicas foi de apenas 28%, enquanto nas particulares foi de
86% em razão da redução do orçamento para o Ensino Superior, especialmente,
para as universidades públicas.

Desigualdade de acesso
O processo seletivo do sistema público de Ensino Superior tende a excluir os
estudantes das camadas sociais menos favorecidas. Isto quer dizer que esse siste-
ma gratuito atende, em geral, aos estudantes oriundos das elites, já privilegiadas.

Má distribuição de recursos
Os cursos destinados ao sistema de Ensino Superior, especialmente, o sis-
tema público, estariam muito concentrados na região Centro-sul e Sudeste, em
detrimento de outras mais necessitadas.

Qualidade de ensino
A qualidade do Ensino Superior brasileiro e, sobretudo, a sua relevância
para o mercado de trabalho tem sido objeto de grandes discussões. Ficando a ima-
gem que o Ensino Superior deixa muito a desejar.
Tais questões nos levam a refletir sobre a formação de professores e sua
prática pedagógica nessas instituições.
No contexto das profundas transformações que são consideradas ­necessárias
ao sistema de Ensino Superior brasileiro, alguns pontos já são consensuais. Apre-
sentamos alguns dentre eles.

Expansão do sistema
O sistema de Ensino Superior brasileiro precisa se expandir e, pelo menos,
duplicar-se nos próximos dez anos.
O governo Lula propõe-se a ampliar as vagas, especialmente nas institui-
ções públicas, em taxas compatíveis com o Plano Nacional de Educação, que pre-
vê atingir 30% da faixa etária de 18 a 24 anos.

Sistema de avaliação mais eficaz


O atual sistema de avaliação das instituições de Ensino Superior ainda
c­ arece de uma análise mais vigorosa quanto aos mecanismos associados aos sis-
temas permanentes de avaliação de desempenho, que permitam a avaliação da
qualidade do ensino e do preparo do universitário para o exercício da profissão
que escolheu.

24
Universidades e faculdades isoladas: diversos locais de trabalho dos professores

1. Leia individualmente o capítulo “Tornar-se professor universitário hoje” do livro Docência no


Ensino Superior de Léa das Graças Anastasiou e Selma Garrido Pimenta.

2. Entreviste professores universitários sobre o seu ingresso e atuação nas instituições de Ensino
Superior.

3. Discuta em grupo os resultados da entrevistas com professores universitários, tirando conclu-


sões sobre “como se tornar professor universitário hoje”.

25
Didática do Ensino Superior

26
Elementos para a
compreensão do cotidiano
e o processo didático

N
este milênio, o debate sobre as questões educacionais, em que a escola é chamada a ser mais do
que um locus de apropriação do conhecimento socialmente relevante, o ­científico, um espaço
de diálogo entre diferentes saberes científico, social... e linguagens, muitas são as formas de
acesso ao conhecimento, não se podendo atribuir à escola a quase exclusividade desta função.
A instituição social educativa assim concebida “é um espaço de busca, construção, diálogo e
confronto, prazer, desafio, conquista de espaço, descoberta de diferentes possibilidades de expressão
e linguagens, aventura, organização cidadã, afirmação da dimensão ética e política de todo o processo
de educativo”. (CANDAU, 2002, p. 18).
O impacto dos meios de comunicação de massa e, principalmente, da informática, está
­revolucionando as formas de construir conhecimentos. Estas formas estão sendo chamadas a se mul-
tiplicar nos próximos anos. Por outro lado, a cultura escolar se relaciona com a articulação entre
igualdade e diferença, do aqui “são todos iguais”. Assim, as instituições educativas estão cada vez
mais desafiadas a enfrentar os problemas decorrentes das diferenças e da pluralidade cultural, étnica,
­social... dos seus sujeitos e atores.
Hoje, os movimentos sociais são situados cada vez mais na perspectiva da promoção de uma
educação verdadeira intercultural e da construção de uma nova cidadania, como princípio configu-
rador de um sistema educacional como um todo e não somente orientada a determinadas situações e
grupos sociais.
Nessa nova escola para novos tempos e espaços, a questão da cidadania é fundamental; a ­partir
de uma abordagem que conceba a cidadania como prática social cotidiana, que perpassa os ­diferentes
âmbitos da vida, articula o cotidiano, o conjuntural e estrutural, assim como o local e regional, numa
progressiva ampliação do horizonte, sempre na perspectiva de um projeto ­diferente de sociedade e
humanidade.
Assim, a educação é um típico “que fazer” humano, ou seja, um tipo de atividade que se
­caracteriza fundamentalmente por uma preocupação, por uma finalidade a ser atingida. A educação
dentro de uma sociedade não se manifesta como um fim em si mesma, mas como um instrumento
de manutenção ou transformação social. Assim, ela necessita de pressupostos, de conceitos que fun-
damentem e orientem os seus caminhos. A sociedade, dentro da qual a educação está, deve possuir
alguns valores norteadores de sua prática educativa.
A profissão docente é uma prática educativa, ou seja, como tantas outras, é uma forma de inter-
vir na realidade social, no caso, mediante a educação.
Didática do Ensino Superior

O conceito de educação
como fundamento da ação educativa
O problema fundamental com que se depara o professor ao planejar e imple-
mentar a ação educativa consiste na necessidade que tem de conceituar educação,
visto que a ação educativa é função direta do conceito de educação. Antes de ana-
lisar os aspectos didáticos, é muito importante refletir um pouco sobre o sentido
da atividade docente. Para ter consciência do sentido de sua atividade profissional,
o professor precisa se perguntar:
– Para que ensino?
– Para que serve o que estou fazendo?
Isso não quer dizer que os aspectos didáticos não sejam importantes. Isto
significa dizer que eles devem estar subordinados à definição de propósitos edu-
cativos válidos para orientar o trabalho docente.
E como, num sentido amplo, a educação considera a interação de todos os
aspectos da pessoa humana com a sociedade na qual está inserida, são múltiplos
os posicionamentos tomados pelos professores e, em decorrência, muitos são os
conceitos estabelecidos sobre a educação.
Necessariamente, um conceito de educação considera o homem e a ­sociedade.
Daí, decorrem os questionamentos:
– Que tipo de homem desejamos obter com o produto do nosso trabalho?
– Que tipo de sociedade interage com esse homem que pretendemos for-
mar?
Quanto ao tipo de homem que pretendemos formar, a educação é um
­processo que se desenvolve no tempo, considerando:
o homem desenvolvido em todos os aspectos, que tem consciência de
suas possibilidades e limitações, munido de uma cultura que lhe permita
conhecer, compreender e refletir sobre o mundo;
o homem independente, mas não isolado, que, conhecendo suas capaci-
dades físicas, intelectuais e emocionais e dotado de uma visão crítica da
realidade, seja capaz de atuar de forma eficaz e eficiente nessa realida-
de.
Em relação à sociedade, a educação deve considerar o seu importante papel
de transformação social, tomando como pontos referenciais:
uma sociedade que supere os modelos econômicos e políticos de hoje,
em busca de uma solidariedade entre as pessoas e os povos;
uma sociedade que, apesar de integrar os indivíduos e os povos, respeite
profundamente as características individuais, favorecendo o desenvolvi-
mento das sociedades.
O professor necessita ter em mente a educação como um processo que se

28
Elementos para a compreensão do cotidiano e o processo didático

desenvolve num tempo dinâmico e num espaço que sofre transformações cons-
tantes. Essas transformações por que passam o mundo ocorrem em decorrência,
sobretudo, dos avanços tecnológicos, da reestruturação do sistema de produção e
desenvolvimento, da compreensão do papel do Estado e das mudanças no sistema
educacional, na organização do trabalho e nos hábitos de consumo. ­Paralelamente,
a instituição social educativa é questionada acerca do seu papel ante as transfor-
mações econômicas, sociais, políticas e culturais do mundo contemporâneo.
Embora a didática se preocupe primordialmente com o “como ensinar”,
ou seja, com os métodos e técnicas de ensino, julgamos importante, antes de
­estudá-los, refletir sobre o seu fundamento, sobre as raízes do seu emprego e sobre
os fatores que intervêm em sua aplicação. Caso contrário, corremos o risco de nos
converter em escravos dos instrumentos (métodos e técnicas). Para evitar isso, é
de fundamental importância refletirmos sobre a educação.

O que é educação?
Num mundo globalizado como o de hoje, faz-se necessário rever com ur-
gência os conceitos sobre a educação. Não se trata simplesmente de inventar no-
vas metodologias para melhorar o que existe. Faz-se necessário repensar, desde as
raízes, todo o sistema de educação. De nada adianta a reformulação dos métodos
e dos meios, se a educação oferecida não corresponde ao homem moderno.
O professor deve estar atento a este aspecto, a fim de planejar uma ação
educativa capaz de conduzir o aluno a um discernimento quanto aos valores e
concepções de vida, de homem e de sociedade.
Sintetizando, é necessário que o professor considere fundamentalmente a
educação um processo de ação da sociedade sobre o aluno, visando integrá-lo,
seguindo seus padrões sociais, econômicos, políticos e seus interesses. Portanto,
a educação tem como características:
um fato histórico, pois se realiza no tempo;
ser um processo que se preocupa com a formação do homem em sua
plenitude;­
buscar a integração dos membros de uma sociedade ao modelo social
vigente;
simultaneamente, buscar a transformação da sociedade em benefício de
seus membros;
ser um fenômeno cultural, pois permite a cultura de um contexto de for-
ma global;
direcionar o aluno para a autoconsciência;
ser ao mesmo tempo, conservadora e inovadora.
Dessa forma, a educação é fundamental na manutenção da vida de um grupo ou
mesmo da sociedade. À medida que vai aumentando a complexidade da vida de um
grupo, a educação vai se tornando cada vez mais relevante, a tal ponto que, na socie-
dade contemporânea, a educação está sempre presente em lugar de destaque.

29
Didática do Ensino Superior

O objetivo da educação é a socialização do indivíduo, ou seja, por meio da


educação, o indivíduo adquire as condições pessoais necessárias para engajar-se
adequadamente ao grupo a que pertence e no qual desempenhará suas funções.
Logo, não há uma forma única de educação nem um modelo de educação.
Em cada sociedade ou país, existe uma maneira diferente de educar. A educação
é inerente à sociedade humana.
Conclui-se que a educação é um processo que se baseia na reflexão sobre a
reali­dade e, ao mesmo tempo, assimila suas necessidades e a crítica em suas inconsis­
tências, agindo no sentido de atendê-la em muitos aspectos. Portanto, está embasada
na Filosofia, na Sociologia, na Psicologia, na Antropologia e no contexto histórico.

Objetivos da educação brasileira


Segundo Dermeval Saviani, em face da realidade concreta do homem brasi-
leiro, temos os objetivos gerais da educação brasileira, conforme abaixo.

Educação para a subsistência


O homem brasileiro não sabe tirar proveito das possibilidades da situação e,
por não sabê-lo, freqüentemente, acaba por destruí-la. Isto nos revela a ­necessidade
de uma educação para a subsistência. É preciso que o homem aprenda a tirar da
situação adversa os meios para sobreviver.

Educação para a libertação


Como pode o homem utilizar os elementos da situação se ele não é capaz
de intervir nela, decidir, engajar-se e assumir pessoalmente a responsabilidade de
suas escolhas? As condições de liberdade do homem brasileiro são tão precárias,
marcadas por uma tradição de inexperiência democrática, marginalização eco-
nômica, política e cultural. Daí, decorre a necessidade de uma educação para a
libertação: é preciso saber escolher e ampliar as possibilidades de ação.

Educação para a comunicação


Como intervir na situação sem uma consciência das suas possibilidades e
dos seus limites? Esta consciência só se adquire por meio da comunicação. Daí,
o terceiro objetivo – educação para a comunicação. É preciso que se adquiram os
instrumentos aptos para a comunicação intersubjetiva.

Educação para a transformação


Tais objetivos só serão atingidos com uma mudança sensível do panorama
nacional atual, quer geral, quer educacional. Daí, o quarto objetivo – a educação
para a transformação.

30
Elementos para a compreensão do cotidiano e o processo didático

Funções sociais da educação


As ações humanas estão sempre impregnadas de crenças e valores que as
orientam para determinadas finalidades. Consciente ou inconscientemente, explí-
cita ou implicitamente, quem vive possui uma filosofia de vida, uma concepção de
homem, de sociedade e de mundo.
Pela busca do senso crítico da educação, os professores podem entendê-la,
segundo Luckesi (1994, p. 39-51), de três maneiras diferentes, ou seja, cumprindo
as funções sociais de redentora da sociedade, reprodutora da sociedade e transfor-
madora da sociedade.

Redentora da sociedade
A função redentora concebe a sociedade como um conjunto de seres hu-
manos que vivem e sobrevivem num todo orgânico e harmonioso, com desvios
de grupos e indivíduos que ficam à margem desse todo. Ou seja, a sociedade
está naturalmente composta com todos os seus elementos, o que importa é
integrar em sua estrutura tanto os novos elementos (novas gerações), quanto
os que, por qualquer motivo, encontram-se à sua margem. A educação como
instância social que está voltada à formação da personalidade dos indivíduos
para o desenvolvimento de suas habilidades e para a veiculação dos valores
éticos necessários à convivência social, que nada mais tem que fazer do que
se estabelecer como redentora da sociedade, integrando harmonicamente os
indivíduos no todo social já existente.

Reprodutora da sociedade
A função reprodutora afirma que a educação faz, integralmente, parte da
sociedade e a reproduz. Aborda a educação como uma instância dentro da socie-
dade e exclusivamente ao seu serviço. A educação atua sobre a sociedade como
uma instância corretora dos seus desvios, tornando-a melhor e mais próxima do
modelo de perfeição social harmônico idealizado.

Transformadora da sociedade
A função transformadora compreende a educação como mediação de um
projeto social. Ou seja, ela nem redime nem reproduz a sociedade, mas serve de
meio, ao lado de outros meios, para realizar um projeto de sociedade, que pode ser
conservador ou transformador. Não coloca a educação a serviço da conservação.
Pretende demonstrar que é possível compreender a educação dentro da sociedade,
com seus determinantes e condicionantes, mas com a possibilidade de trabalhar
pela sua democratização.

31
Didática do Ensino Superior

Além disso, Dermeval Saviani (1983, p. 36) nos alerta para a dificuldade,
dizendo-nos o seguinte:
O caminho é repleto de armadilhas, já que os mecanismos de adaptação acionados perio-
dicamente a partir dos interesses dominantes podem ser confundidos com anseios da clas-
se dominada. Para evitar esse risco, é necessário avançar no sentido de captar a natureza
específica da educação, o que nos levará à compreensão das complexas mediações pelas
quais se dá sua inserção contraditória na sociedade capitalista.

Concluindo, o autor indica a necessidade de cuidar daquilo que é específico


da escola, para que esta venha a cumprir um papel de mediação, num projeto de-
mocrático de sociedade.

Perspectivas atuais
Estamos no Terceiro Milênio sob o signo da perplexidade, da crise de con-
cepções e paradigmas em todos os campos das ciências, da cultura e da sociedade.
É um momento novo e rico de possibilidades.
Entretanto, para não sermos omissos, vamos apresentar algumas tendências
atuais, apoiados naqueles educadores e filósofos que tentaram apontar caminhos
em meio a essa perplexidade.

Crises e alternativas
A educação tradicional e a educação nova têm um traço comum que é o de
conceber a educação como um processo de desenvolvimento pessoal e individual.
O traço mais original deste século, na educação, é o deslocamento da for-
mação puramente individual do homem para o social, o político, o ideológico. A
educação deste fim de século tornou-se permanente e social.
Há tendências universais, entre elas, a de considerar como conquista deste
século a idéia de que não existe idade para a educação, de que ela se estende pela
vida e que não é neutra.
Caminhamos para uma mudança da própria função social da escola. Entre
nós, chamamos essa nova educação de educação popular, não porque ela seja
destinada apenas às camadas populares, mas pelo caráter popular, socialista e
democrático que essa concepção traz.
Parece-nos que o melhor caminho de superação da crise educacional é
­vivê-la intensamente, evidenciando suas contradições e disfunções. Contudo,
como a crise da educação e da sociedade são inseparáveis, o desenvolvimento das
contradições escolares e a sua transformação também são inseparáveis do desen-
volvimento e da superação das contradições sociais.
Falar em futuro da educação é, à luz da história da educação, antever os pró-
ximos passos associando teoria pedagógica e prática educacional a uma análise
sócio-histórica.
32
Elementos para a compreensão do cotidiano e o processo didático

Observando o desenvolvimento educacional do século XX, podemos afir-


mar que a educação tornou-se instrumento de luta e de emancipação, associando
a luta social à luta pedagógica.
Não se trata mais de reforçar apenas a “escola para todos”, burocrática, uni-
formizadora, que é a essência da teoria educacional burguesa. Uma educação para
todos não pode ser conseqüência de uma concepção elitista: os privilégios não são
estendidos, mas eliminados, se se quer atingir a democracia.
A democracia na educação, quantitativa e qualitativamente, não pode ser um
ato de pura “recomendação”, como pretendem os teóricos da educação da década de
70. A educação, instrumento da paz, é o resultado da luta, do movimento popular.

O compromisso social e ético dos professores


(LIBÂNEO, 1998, p. 47-48)
O trabalho docente constitui o exercício profissional do professor e este é o seu primeiro com-
promisso com a sociedade. Sua responsabilidade é preparar os alunos para se tornarem cidadãos
ativos e participantes na família, no trabalho, nas associações de classe, na vida cultural e política.
É uma atividade fundamentalmente social, porque contribui para a formação cultural e científica
do povo, tarefa indispensável para outras conquistas democráticas.
A característica mais importante de atividade profissional do professor é a mediação entre o
aluno e a sociedade, entre as condições de origem do aluno e sua destinação social na sociedade,
papel que cumpre provendo as condições e os meios (conhecimentos, métodos, organização do en-
sino) que assegurem o encontro do aluno com as matérias de estudo. Para isso, planeja, desenvolve
suas aulas e avalia o processo de ensino.
O sinal mais indicativo da responsabilidade profissional do professor é seu permanente em-
penho na instrução e educação dos seus alunos, dirigindo o ensino e as atividades de estudo de
modo que estes dominem os conhecimentos básicos e as habilidades, e desenvolvam suas forças,
capacidades físicas e intelectuais, tendo em vista equipá-los para enfrentar os desafios da vida
prática no trabalho e nas lutas sociais pela democratização da sociedade.
O compromisso social, expresso primordialmente na competência profissional, é exercido
no âmbito da vida social e política. Como toda profissão, o magistério é um ato político porque
se realiza no contexto das relações sociais onde se manifestam os interesses das classes sociais.
O compromisso ético-político é uma tomada de posição frente aos interesses sociais em jogo na
sociedade. Quando o professor se posiciona, consciente e explicitamente, do lado dos interesses
da população majoritária da sociedade, ele insere sua atividade profissional – ou seja, sua compe-
tência técnica – na luta ativa por esses interesses: a luta por melhores condições de vida e de tra-
balho e ação conjunta pela transformação das condições gerais (econômicas, políticas, culturais)
da sociedade.

33
Didática do Ensino Superior

Estas considerações justificam a necessidade de uma sólida preparação profissional face às


exigências colocadas pelo trabalho docente. Esta é a tarefa básica do curso de habilitação ao ma-
gistério e, particularmente, da didática.

1. Com base no texto complementar O compromisso social e ético dos professores, como se con-
cretiza o compromisso social e ético do professor na prática de sala de aula?

34
Elementos para a compreensão do cotidiano e o processo didático

2. Discuta a posição dos autores sobre o conceito de educação (MARTINS, 1985, p. 31):
a) Álvaro Vieira Pinto (1982)
Que é Educação?
Em sentido amplo a educação diz respeito à existência humana em toda a sua duração e em todos os seus aspec-
tos. Dessa maneira, deve-se justificar lógica e sociologicamente o problema da educação de adultos. Daqui deriva
a verdadeira definição de educação:
“a educação é o processo pelo qual a sociedade forma seus membros à sua imagem em função de seus interesses.”

b) Pierre Furter (1976)


Se a educação contemporânea tende cada vez mais a ser passada no desenrolar de um tempo dinâmico, é, tam-
bém, evidente que o espaço em que se situa a sua ação está em franca expansão. Este mundo, isto é, a imagem que
o homem faz, em certa época, da relação entre a sua terra e o universo, é hoje um mundo planetário.

3. Em grupo integrado, procure identificar a contradição de Furter e o ensino conservador.

35
Didática do Ensino Superior

4. Utilizando a Técnica Phillips 66, estude a colocação feita por Russel (1978):
Três diferentes teorias da educação têm seus defensores atualmente. Dessas três, a primeira considera que o
exclusivo propósito da educação é proporcionar oportunidades de progresso e afastar influências negativas. A se-
gunda sustenta que o propósito da educação é proporcionar cultura ao indivíduo e desenvolver suas capacidades
ao máximo. A terceira sustenta que a educação deve ser considerada mais em relação à comunidade do que em
relação ao indivíduo e que sua função é adestrar cidadãos úteis.

5. Organize uma Mesa Redonda e discuta que tipo de homem a sociedade solicita, sob os aspectos
físico, intelectual e integração na sociedade.
Bertrand Schwartz (1976)
Todo projeto social reduz-se imediatamente a certa perspectiva quanto à personalidade dos homens que o anima-
rão e quanto às relações que esses homens manterão entre si. A questão que se coloca é, pois, de saber qual é o
homem que fará viver nossa Europa no ano 2000.

6. Considerando os fundamentos da educação e o posicionamento dos autores citados, estabeleça


um conceito de educação.

36
Prática educativa,
pedagogia e didática

Prática educativa na sociedade

O
trabalho docente é parte integrante do processo educativo mais global pelo qual os mem-
bros da sociedade são preparados para a participação na vida social. A educação, ou seja,
a prática educativa, é um fenômeno social e universal, sendo uma atividade humana neces-
sária à existência e ao funcionamento de todas as sociedades.
Cada sociedade precisa cuidar da formação dos indivíduos, auxiliar no desenvolvimento de suas
capacidades, prepará-los para a participação ativa e transformadora nas várias instâncias da vida social.

Não há sociedade sem prática educativa


nem prática educativa sem sociedade
A prática educativa não é apenas exigência da vida em sociedade, mas também o processo de
prover os indivíduos de conhecimentos e experiências culturais que os tornam aptos a atuar no meio
social e transformá-lo em função de suas necessidades econômicas, sociais e políticas.
Pela ação educativa, o meio exerce influências sobre os indivíduos e estes, ao assimilarem e
recriarem essas influências, tornam-se capazes de estabelecer uma relação ativa e transformadora em
relação ao meio social.
Tais influências se manifestam por meio de conhecimentos, experiências, valores, crenças, ­modos
de agir, técnicas e costumes acumulados por muitas gerações de indivíduos e grupos, transmitidos, as-
similados e recriados pelas novas gerações. Assim, educação é um fenômeno social complexo.
Significa que a prática educativa – especialmente os objetivos, os conteúdos de ensino e o traba-
lho docente – está determinada por fins e exigências sociais, políticas e ideológicas. Ela é determinada
por valores, pelas normas e pela estrutura social.
A prática educativa é parte integrante da dinâmica das relações sociais e das formas da organi-
zação social. Então, a prática educativa, a vida cotidiana, as relações professor-aluno, os objetivos da
educação e o trabalho docente, estão carregados de significados sociais que se constituem na dinâmi-
ca das relações sociais.
Nesse sentido, a educação é inerente à sociedade humana, conforme Brandão (1981) afirma:
A educação está presente em casa, na rua, na igreja, na mídia em geral e todos nos envolvemos com ela, seja para
aprender, para ensinar e para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias
misturamos a vida com a educação. Com uma ou com várias [...] Não há uma forma única nem um único modelo
de educação; a escola não é o único lugar em que ela acontece; o ensino escolar não é a única prática, e o professor
o profissional não é seu único praticante.
Didática do Ensino Superior

Assim, a educação é um processo natural que ocorre na sociedade humana


pela ação de seus agentes sociais como um todo, configurando uma sociedade
pedagógica (BEILLEROT, 1985).
Desenvolvendo essa idéia, podemos citar vários exemplos com inúmeras
­situações da presença do pedagógico na sociedade. Nas mídias, dentre outros
exemplos, há intervenção pedagógica na televisão, no rádio, nas revistas, nos jor-
nais e em todo material informativo, pois a mídia atua na modificação dos esta-
dos ­mental e afetivo das pessoas e nos modos de pensar, disseminando saberes
e modos de agir e de sentir. No entanto, segundo Libâneo (1998, p. 21), é “sur-
preendente que instituições e profissionais cuja atividade está permeada de ações
pedagógicas ­desconheçam a teoria pedagógica”.

O papel da pedagogia na sociedade


Para tornar efetivo o processo educativo, é preciso dar-lhe uma orientação sobre
as finalidades e os meios da sua realização, conforme as opções que se façam quanto
ao tipo de indivíduo que se deseja formar e ao tipo de sociedade a que se aspira.
Esta tarefa pertence à pedagogia como teoria e prática do processo educativo.

O que é pedagogia?
A palavra pedagogia vem do grego pais, paidós que significa criança; agein
que é conduzir e logos que quer dizer trabalho, ciência.
Na Grécia antiga, eram chamados de pedagogos os escravos que acompa-
nhavam crianças que iam para a escola. Como escravo, ele era submisso à criança,
mas tinha que fazer valer sua autoridade quando necessária. Por esse motivo, es-
tes escravos desenvolveram grande habilidade no trato com as crianças.
Hoje, pedagogo é o especialista em assuntos educacionais, e pedagogia é o
conjunto de conhecimentos sistemáticos relativos ao fenômeno educativo. Então,
pedagogia é o campo de conhecimento que investiga a natureza das finalidades da
educação numa determinada sociedade, bem como os meios apropriados para a for-
mação dos indivíduos, tendo em vista prepará-los para as tarefas da vida social.
Uma vez que a prática educativa é o processo pelo qual são assimilados co-
nhecimentos e experiências pela prática social da humanidade, cabe à pedagogia
assegurá-lo, orientando-o para finalidades sociais e políticas, e criando um conjunto
de condições metodológicas e organizativas para viabilizá-lo. Então, a pedagogia,
sendo a ciência da e para a educação, estuda a educação, a instrução e o ensino.
Conforme Libâneo (1998, p. 24), “a pedagogia é um campo de conhecimen-
tos sobre a problemática educativa na sua totalidade e historicidade e, ao mesmo
tempo, uma diretriz orientadora da ação educativa”.

38
Prática educativa, pedagogia e didática

A pedagogia, enquanto campo teórico da prática educacional, não se res-


tringe à didática da sala de aula nos espaços escolares, mas está presente nas ações
educativas da sociedade em geral.
Para tanto, a pedagogia compõe-se de ramos próprios como a Teoria da Edu-
cação, a didática, a Organização Escolar e a História da Educação e da pedagogia.
Ao mesmo tempo, busca, em outras ciências, os conhecimentos teóricos e práticos
que concorrem para o esclarecimento do seu objeto, o fenômeno educativo. São
elas: a Filosofia da Educação, a Sociologia da Educação, a Psicologia da Educação,
a Política Educacional, a Biologia da Educação, a Economia da Educação, a Antro-
pologia e outras.
Assim compreendida,
A pedagogia [...] possibilita que as instituições e os profissionais cuja atividade está per-
meada de ações pedagógicas se apropriem criticamente da cultura pedagógica para com-
preender e alargar a sua visão das situações concretas nas quais realizam seu trabalho,
para nelas imprimir a direção de sentido, a orientação sociopolítica que valorizam, a fim
de transformar a realidade. Incluindo também a atividade de ensinar, que tem na didática
sua sistematização teórica. (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 66).

Concluindo, a pedagogia é a reflexão sistemática sobre o ideal de educação


e da formação humana, podendo se ressignificar à medida que tomar a ação como
a referência da qual parte e para a qual se volta.
Entretanto, enquanto as Ciências da Educação abordam o fenômeno educa-
tivo na perspectiva dos conceitos e métodos que lhes são próprios, a pedagogia
postula o educativo propriamente dito. Seu campo compreende as ações educati-
vas e seus agentes contextualizados, tais como:
o aluno como sujeito do processo de socialização e de aprendizagem;
os agentes de formação (entre eles as mídias, a família, os agentes de
­saúde, as escolas e os professores);
as situações concretas em que se dão os processos formativos (entre eles
o ensino);
o saber (como objeto de produção e constituição do humano);
o contexto socioinstitucional das instituições (entre elas os sistemas de
ensino, as políticas governamentais, inclusive as escolas e as salas de
aula).
Em síntese, conforme Libâneo (1988, p. 30), o objetivo pedagógico se confi-
gura na relação entre os elementos da prática educativa e:
o sujeito que se educa;
o educador;
o saber;
os contextos em que ocorrem.

39
Didática do Ensino Superior

E, o que é didática?
Agora que já vimos o que estuda a pedagogia e que situamos a didática den-
tro da pedagogia, vejamos o que é didática.
A didática é o principal ramo de estudo da pedagogia que investiga os fun-
damentos, as condições e os modos de realizar a educação mediante o ensino.
­Sendo o ensino uma ação historicamente situada, a didática vai constituir-se como
teoria do ensino.
À didática cabe:
converter objetivos sociopolíticos e pedagógicos em objetivos de ensino;
selecionar conteúdos e métodos em função dos objetivos de ensino;
estabelecer os vínculos entre ensino e aprendizagem, tendo em vista o
desenvolvimento das capacidades dos alunos.
A didática se divide em:
didática geral – estuda os princípios, as normas e as técnicas que devem
regular qualquer tipo de ensino, para qualquer tipo de aluno. Ela nos dá
uma visão geral da atividade docente.
didática especial – estuda os aspectos científicos de uma determinada
disciplina ou faixa de escolaridade. Analisa os problemas e as dificul-
dades que o ensino de cada disciplina apresenta e organiza os meios e
as sugestões para resolvê-los. Assim, temos as didáticas especiais das
línguas (inglês, espanhol etc.), as didáticas especiais das ciências (­física,
química etc).

Didática e metodologia
A didática e a Metodologia estudam os métodos de ensino. No entanto, há
diferença quanto ao ponto de vista de cada uma. A metodologia estuda os méto-
dos de ensino, classificando-os e descrevendo-os sem fazer juízo de valor.
A didática, por sua vez, faz um julgamento ou uma crítica do valor dos mé-
todos de ensino. Podemos dizer que a Metodologia nos dá juízos de realidade e a
didática, juízos de valor.
Juízos de realidade são juízos descritivos e constativos, como por exemplo:
três mais três são seis;
acham-se presentes na sala 45 alunos.
Juízos de valor são juízos que estabelecem valores ou normas, como por exemplo:
os idosos merecem nosso respeito;
a democracia é a melhor forma de governo.
Assim, é possível concluir que podemos ser metodológicos sem ser didáticos,

40
Prática educativa, pedagogia e didática

mas não podemos ser didáticos sem ser metodológicos, pois não podemos julgar sem
conhecer. Por isso, o estudo da Metodologia é importante, porque, para escolher o
método mais adequado de ensino, precisamos conhecer os métodos que existem.
Os princípios, as normas e as técnicas de ensino são postos em prática por
meio das atividades de planejamento, orientação e controle do processo ensino-
aprendizagem.
Planejamento – previsão e programação dos trabalhos escolares para
todo o ano letivo e/ou semestre letivo.
Orientação – o professor executa o que planejou.
Controle – supervisão constante do processo de aprendizagem.

Tendências pedagógicas da prática escolar


Agora que compreendemos as diferentes tendências da educação, cabe ao pro-
fessor, criticamente, descobrir qual a tendência que orientará o seu trabalho docente.
O que não podemos é ficar sem nenhuma delas, pois, como dissemos, quan-
do não pensamos, somos dirigidos por outros.
Vamos abordar as diferentes tendências teóricas que pretenderam dar conta
da compreensão e da orientação da prática educacional em diferentes momentos e
circunstâncias da história humana.

Pedagogia liberal
Tradicional
Renovadora progressista
Renovadora não diretiva
Tecnicista

Pedagogia progressista
Libertadora
Libertária
Crítico-social dos conteúdos

Pedagogia liberal
O termo liberal não tem o sentido de avançado, democrático, como costuma
ser usado.
A doutrina liberal defende a predominância da liberdade e dos interesses indivi-
duais da sociedade e estabelece uma forma de organização social baseada na proprie-
dade privada dos meios de produção, também denominada sociedade de classes.
41
Didática do Ensino Superior

A pedagogia liberal sustenta a idéia de que a escola tem por função preparar os
indivíduos para o desempenho de papéis sociais, de acordo com as aptidões indivi-
duais, por isso os indivíduos precisam aprender a se adaptar aos valores e às normas
vigentes na sociedade de classes por meio do desenvolvimento cultura individual.

Pedagogia liberal tradicional


Na tendência tradicional, a pedagogia liberal se caracteriza por acentuar o
ensino humanístico, de cultura geral, no qual o aluno é educado para atingir, pelo
próprio esforço, sua plena realização como pessoa.
Em suas várias correntes, caracteriza as concepções de educação em que
predomina a ação de agentes externos na formação do aluno, a prioridade do
objeto de conhecimento, a transmissão do saber constituído na tradição e nas
grandes verdades acumuladas pela humanidade e uma concepção de ensino como
impressão de imagens propiciadas ora pela palavra do professor ora pela observa-
ção sensorial.

Pedagogia liberal renovada progressista


Acentua, igualmente, o sentido da cultura como desenvolvimento das apti-
dões individuais. Mas a educação é um processo interno, ela parte das necessidades
e interesses individuais necessários para a adaptação ao meio. A escola renovada
propõe um ensino que valorize a auto-educação (o aluno como sujeito do conhe-
cimento), a experiência direta sobre o meio pela atividade, um ensino centrado no
aluno e no grupo. Esta tendência apresenta-se, também, como renovada progressista
ou pragmatismo, principalmente na forma difundida pelos pioneiros da educação
nova, entre eles se destaca Anísio Teixeira, Montessori, Decroly e Piaget.

Pedagogia liberal renovada não diretiva


Orientada por objetivos de auto-realização (desenvolvimento pessoal) e para
as relações interpessoais, na formulação de Carl Rogers.
A pedagogia liberal renovada não diretiva propõe uma educação centrada
no aluno, visando formar sua personalidade por meio da vivência de experiên-
cias significativas que lhe permitam desenvolver características inerentes à sua
­natureza. O professor é um especialista em relacionamento pessoal e autêntico.

Pedagogia liberal tecnicista


A pedagogia liberal tecnicista subordina a educação à sociedade, tendo
como função a preparação de recursos humanos. À educação escolar compete
organizar o processo de aquisição de habilidades, atitudes e conhecimentos espe-
cíficos, úteis e necessários para que os indivíduos se integrem na máquina do sis-
tema social global. Seu interesse imediato é o de produzir indivíduos competentes
para o mercado de trabalho, transmitindo, eficientemente, informações precisas,
objetivas e rápidas.
42
Prática educativa, pedagogia e didática

Pedagogia progressista
O termo progressista, emprestado por Snyders, é usado para designar as
tendências que, partindo de uma análise crítica das realidades sociais, sustentam
as finalidades sociopolíticas da educação, implicitamente. Há de ser um instru-
mento de luta dos professores ao lado de outras práticas sociais.
As tendências de cunho progressista interessadas em propostas pedagógicas
voltadas para os interesses da maioria da população foram adquirindo a ­importância
a partir dos anos 80. São também denominadas teorias críticas da educação.

Tendência progressista libertadora


Conhecida como pedagogia de Paulo Freire, não tem uma proposta explí-
cita de didática. A atividade escolar é centrada na discussão de temas ­sociais e
­políticos, poderia-se falar de ensino centrado na realidade social. O trabalho esco-
lar não se assenta nos conteúdos de ensino, mas no processo de participação ativa
nas ­discussões e nas ações políticas sobre questões da realidade social imediata.

Pedagogia progressista libertária


A pedagogia progressista libertária espera que a escola exerça uma transfor-
mação na personalidade dos alunos no sentido libertário e de autogestão. A idéia
básica é introduzir modificações institucionais, com base na participação grupal,
mecanismos de mudança (assembléias, conselhos, eleições, reuniões, associações
etc.). Outra forma é criar grupos de pessoas com princípios educativos autoges­
tionários (grupos informais, associações etc.).
Há, portanto, um sentido político, à medida que se afirma o indivíduo como
produto do social e que o desenvolvimento individual somente se ­realiza no coletivo.

Pedagogia progressista crítico-social dos conteúdos


A pedagogia progressista crítico-social dos conteúdos propõe uma síntese
superadora das pedagogias tradicional e renovada, valorizando a ação pedagógica
enquanto inserida na prática social concreta. Entende a escola como mediação
entre o individual e o social, exercendo aí a articulação entre a transmissão dos
conteúdos e a assimilação ativa por parte do aluno concreto, ou seja, inserido num
contexto de relações sociais, resultando dessa articulação o saber crítico. Assim, a
difusão dos conteúdos é a tarefa primordial, mas conteúdos vivos, concretos e in-
dissociáveis das realidades sociais. A valorização da escola como instrumento de
apropriação do saber, já que a escola pode contribuir para eliminar a seletividade
social e torná-la democrática.
Nesse sentido, a educação é entendida como uma atividade meiadora no
seio da prática social global. Dentro dessas linhas, podemos citar: Makarenko,
B. Charlot, Manacorda, G. Snyders, Dermeval Saviani. Atribuem grande impor-
tância à didática, cujo objeto de estudo é o processo de ensino nas suas relações
e ­ligações com a aprendizagem. Toma o partido dos interesses majoritários da
43
Didática do Ensino Superior

sociedade, atribuindo à instrução e ao ensino o papel de proporcionar aos alunos


o domínio dos conteúdos científicos, os métodos de estudo e habilidades, e há-
bitos de raciocínio científico, de modo a formarem a consciência crítica face às
realidades sociais e capacitando-se a assumir no conjunto das lutas sociais a sua
condição de agentes ativos de transformação da sociedade e de si próprios.

Concluindo
Para melhor compreender o significado da prática docente como prática
educativa, Sacristán (1999) estabelece diferença entre prática e ação. A prática
é institucionalizada, são as formas de educar que ocorrem em diferentes contex-
tos institucionalizados, configurando a cultura e a tradição das instituições. Essa
tradição seria o conteúdo e o método da educação. A ação refere-se aos sujeitos,
seus modos de agir e pensar, seus valores, seus compromissos, suas opções, seus
desejos, seu conhecimento, seus esquemas teóricos de leitura do mundo.
Essa imbricação de sujeitos com instituições, de ação com prática, que é
preciso compreender, se se pretende alterar as instituições de Ensino Superior
com a contribuição das teorias.
A didática ocupa-se da busca do conhecimento necessário para a compre-
ensão da prática pedagógica e da elaboração de formas adequadas de intervenção,
de modo que o processo ensino-aprendizagem se realize de maneira que de fato
viabilize a aprendizagem dos educandos. Não para criar regras e métodos válidos
para qualquer tempo e lugar, mas para ampliar nossa compreensão das demandas
que a atividade de ensinar produz com base nos saberes acumulados.
E quem sabe com eles aprender, encontrar respostas, criar novos caminhos
de como proceder à educação nos espaços escolares, campo mais freqüente do
trabalho profissional dos professores.
Dessa forma, a didática oferece uma contribuição indispensável à formação
de professores, sintetizando, no seu conteúdo, a contribuição de conhecimentos
de outras disciplinas que convergem para o esclarecimento dos fatores condicio-
nantes do processo de instrução e ensino, intimamente vinculado com a educação
e, ao mesmo tempo, provendo os conhecimentos específicos necessários para o
­exercício das tarefas docentes.

Conceituação de didática
(LIMA, 1984)
A princípio concebida como arte, foi pouco a pouco evoluindo e adquiriu matizes de ciência,

44
Prática educativa, pedagogia e didática

sobretudo quando se enriqueceu dos subsídios da Psicologia, da Sociologia e da Biologia, sem


jamais perder seu caráter técnico. Por outro lado, mesmo quando devidamente alicerçada em
princípios científicos, exige do professor a arte ou habilidade especial da aplicação ao ensino das
descobertas advindas das Ciências Humanas. Esse savoir-faire, a um tempo artístico e científico,
é muito raro e a sua ausência tem sido responsável por alguns piagetismos ou rogerianismos, in-
devidamente maquiados.
O professor Luiz Alves de Mattos, pioneiro da didática na América do Sul, define-a como:
o conjunto sistemático de princípios, normas e procedimentos específicos que todo o professor deve conhecer
e saber aplicar para orientar com segurança seus alunos na aprendizagem das matérias programadas, tendo
em vista seus objetivos educativos.
Sua discípula, a Professora Irene Mello de Carvalho, prefere considerar a didática como “arte
e técnica de orientar a aprendizagem.”
De modo geral, os conceitos mais defendidos da didática Moderna apelam para uma espécie
de arte e ciência de ensinar a aprender e se referem a princípios, métodos, técnicas e recursos que
visam a facilitar o processo ensino-aprendizagem.
Neste estudo, preferiu-se ampliar os conceitos vigentes de didática, anexando-lhes, como de-
corrência da pretendida melhoria da aprendizagem, a própria visão do mundo e da vida. À didática
caberia, pois, a dinamização do processo ensino-aprendizagem, mobilizando-se simultaneamente
contribuições tecnológicas, científicas e, sobretudo, pessoais. Uma ampla didática transcenderia
de sua rotina diária de planejar, executar e avaliar, para abrir também espaços de relacionamento,
de bem-estar mútuos: o professor e os alunos despiriam as suas funções habituais e estereotipadas
para investir-se como pessoas que trocam entre si novas idéias, a partir das velhas, que comun-
gam principalmente o que são, pois se colocam sempre no que fazem. A Ampla didática foge à
pobreza do “pedagogez” e tenha que enriquecê-lo com outras linguagens, que o redimensionam
sem deturpá-lo.

Criatividade
O termo criatividade ainda não rendeu tudo quanto poderia e já está desgastado. A expressão
como que se esvaziou, utilizada aqui e ali, a propósito de tudo ou de nada. Em nome da criativida-
de se fazem tolices e alguns atos criativos são tidos como perigosos e subversivos, pois “o criativo
é tomado como louco pelas pessoas padronizadas e acomodadas. Sua coragem de ser diferente
provoca a ira dos que não ousam Ser e Criar, conformando-se com o Ter e Imitar.”
A inserção da criatividade em seu contexto maior – o Imaginário – talvez pudesse ­restituir-lhe
seu sentido primeiro: a valorização do irreal, do que ainda não existe. Afinal, que seria da reali-
dade se não fosse o sonho?
Em geral, a Criatividade, retornando Guilford, aparece ligada ao novo, ao original, ao di-
vergente, ao flexível. Para Arthur W. Foshap, “ser criativo significa dar forma ao que é informe”.­
É realmente um processo cujo produto pode ser a beleza ou um significado novo que venha inte-
grar o que se conhece dentro do que se acaba de descobrir. Processo e produto, o ciclo da Criati-
vidade se completa na produção de algo novo pelo menos para quem produz.
Criatividade exige investimento pessoal, envolvimento do eu, corte em amarras impeditivas
de um desabrochar, como os hábitos arraigados, os estereótipos, o vício de olhar o mundo sempre
com o mesmo olhar. A pessoa criativa é capaz de ver os fenômenos de sempre com os olhos de
nunca, de aventurar-se rumo ao desconhecido, com garra, porque, mesmo na incerteza, se sente
segura. Não se arrisca pelo simples arriscar-se, mas animada pelo algo mais que encontrará do
outro lado e que pode completá-la de suas imitações.

45
Didática do Ensino Superior

Como quem cria, não cria do nada (só Deus o teria feito), a Criatividade exige um lastro ante-
rior, pré-requisitos que justificam um insight, ou a coragem de romper com padrões conformistas;
exercida sobre estes a reflexão, verifica-se que muitos não têm razão de ser e merecem, pois, uma
ultrapassagem. A mera adesão ao status quo pode obstruir o futuro; além disso, “a ênfase na lei e
ordem pode, por si mesma, contribuir para a violência e se constituir num dos fatores que tornam
uma revolução mais sangrenta”.
O Criativo é aquele que critica o hoje e o ontem e equipado com o que sobrou da sua crítica,
vislumbra e enfrenta o amanhã.
Neste estudo, opta-se por considerar a Criatividade como a atitude ou capacidade de assumir
com ousada alegria até mesmo a possibilidade de errar...
Como a didática, a Criatividade é vista aqui como elemento mediador para atingir-se a fins
maiores. A Associação da didática à Criatividade seria o alicerce primeiro da construção de uma
Ampla didática, que se supõe possa [sic] aumentar também as suas possibilidades mediadoras.
Ou seja, a Ampla didática se faz criativa quando se coloca além do usual, quando admite riscos,
quando rompe o equilíbrio em busca de melhores resultados, porque também para ela “romper o
equilíbrio é um ato pedagógico: significa impulsionar os homens para a frente.”

1. Após a leitura do texto complementar, responda as questões abaixo.


a) Estabeleça o seu conceito de didática, que norteará o seu trabalho daqui em diante.

b) Você se considera um(a) professor(a) tradicional ou com idéias contemporâneas?

46
Prática educativa, pedagogia e didática

c) Exemplifique, por meio de fatos ocorridos com você em sua sala de aula, o que é ser um
professor contemporâneo ou tradicional.

d) Você se julga um(a) professor(a) criativo(a)? Por quê? Dê exemplos de sua vivência
­profissional que ilustrem a sua afirmativa.

47
Didática do Ensino Superior

2. Leia individualmente os capítulos “Prática Educativa, pedagogia e didática” e “didática e De-


mocratização do Ensino” do livro Didática, de José Carlos Libâneo.

3. Em grupo, organizem uma discussão sobre a didática e a formação profissional do professor,


apresentando as conclusões.

48
Ensinar e aprender:
a construção do conhecimento

Analisando a realidade atual

O
s últimos anos têm sido marcados em nosso país por uma rigorosa reflexão crítica sobre a pro-
blemática educacional e pela busca de caminhos para a promoção de uma ação efetiva realmente
comprometida com a construção de uma sociedade mais humana, solidária e democrática.
Nesse contexto, situam-se os sistemas educacionais que não constituem os únicos espaços de
formação e de produção de conhecimento. Mas, desde a construção dos modernos sistemas de edu-
cação de massa, iniciada na Europa na transição do século XVIII para o século XIX, que a escola se
tornou um espaço central de integração social e de formação para o trabalho.
A massificação dos sistemas educacionais conduz a uma mudança de forma da escola. ­Significa
transportar para a escola todos os problemas sociais que, desse modo, tornam-se problemas escolares.
A escola para todos, uma conquista social dos ideais democráticos modernos, ao abrir suas
portas a novos públicos escolares, torna-se uma realidade qualitati­vamente distinta, com a qual a
formulação de políticas públicas, os professores, os alunos, suas famílias e a escola têm dificuldade
de entender e lidar.
O modelo de escola de massa atual foi construído na base do princípio de ensinar a muitos como
se fosse a um só. Assim, durante anos e anos, professores e estudiosos procuraram encontrar os mais
eficazes métodos de ensino e as melhores formas de organização.
Se entendermos que a construção da cidadania se faz na dialética entre a igualdade e a diferen-
ça, a escola para todos precisa encontrar os meios e as estratégias de valorização dos percursos e das
experiências de vida dos alunos.

O ensino e a aprendizagem na vida humana


O ensino e a aprendizagem são processos tão antigos quanto a própria humanidade. Com o
passar do tempo, o ensino e a aprendizagem adquiriram cada vez mais importância. Por isso, muitas
pessoas começaram a se dedicar exclusivamente a tarefas relacionadas com o ensino. Também, surgi-
ram as escolas que são instituições voltadas a essas tarefas.
Em nossos dias, tal é a importância do ensino e da aprendizagem que ninguém pode deixar de
refletir sobre o seu significado, principalmente, os professores.
Afinal, o que é ensino e o que é aprendizagem? Para responder a esta pergunta, podemos partir
da seguinte constatação: não é só na escola que se aprende ou que se ensina. Em casa, na rua, no
trabalho, no lazer, em contato com os produtos da tecnologia ou em contato com a natureza, estamos
sempre aprendendo. Enfim, em todos os ambientes e situações, podemos aprender e ensinar.
Didática do Ensino Superior

Cada situação pode ser uma situação de ensino e aprendizagem, que ­consiste
em ser capaz de indagar, pesquisar, procurar alternativas, experimentar, analisar,
dialogar, compreender, ter uma atitude científica perante a realidade. Hoje, mais
do que nunca, é necessário ter uma atitude indagadora perante tudo o que se
­relaciona com a educação.

O que é ensino?
Segundo o conceito etimológico, ensinar é “colocar dentro”, “gravar no es-
pírito”. De acordo com esse conceito, ensinar é gravar idéias na cabeça do aluno.
Nesse caso, o método de ensino é o de marcar e tomar a lição.
Desse conceito, surgiu o conceito tradicional de ensino: ensinar é transmitir
conhecimentos. O método utilizado baseia-se em aulas expositivas e explicativas.
O professor fala aquilo que sabe sobre determinado assunto e espera que o aluno
saiba reproduzir o que ele lhe disse. Esse tipo de ensino passou a receber críticas
dando origem a um novo conceito de ensino.
Com a Escola Nova, o eixo da questão pedagógica passa do intelecto para o
sentimento, do aspecto lógico para o psicológico, dos conteúdos cognitivos para
os métodos e processos pedagógicos, do professor para o aluno, do esforço para
o interesse, da disciplina para a espontaneidade, da quantidade para a qualidade,
de uma pedagogia com inspiração filosófica para uma pedagogia de inspiração
experimental, baseada nas contribuições da Biologia e da Psicologia. Ensinar é
criar condições de aprendizagem. O importante não é aprender, mas aprender a
­aprender. O professor passa a ser o estimulador e orientador da aprendizagem.
Na concepção tecnicista, o ensino se inspirou nos princípios de raciona­
lidade, eficiência e produtividade. Por isso, deve-se planejar a educação e o
­ensino de maneira a evitar as interferências subjetivas que possam pôr em ris-
co sua ­eficiência. Devem-se operacionalizar os objetivos e, em certos aspectos,
­mecanizar o ­processo.

Resumindo
Concepção tradicional do ensino
A iniciativa cabe ao professor, que é, ao mesmo tempo, o sujeito do
­processo, elemento decisivo e decisório no ensino.
A questão pedagógica é aprender.

Concepção escolanovista do ensino


A iniciativa desloca-se para o aluno e o centro da ação educativa,
­­situa-se na relação professor-aluno.
A questão pedagógica é aprender a aprender.

50
Ensinar e aprender: a construção do conhecimento

Concepção tecnicista do ensino


O elemento principal passa a ser a organização racional dos meios,
e o professor e o aluno ocupam posição secundária – executores do
­processo cuja concepção, planejamento, coordenação e controle fi-
cam a cargo de especialistas habilitados.
A questão pedagógica é aprender a fazer.

O que é aprendizagem?
O ensino visa à aprendizagem. Mas o que é aprendizagem? É um fenômeno
bastante complexo, mas existem hoje muitas teorias sobre a aprendizagem.
Aprendizagem não é apenas um processo de aquisição de conhecimentos,
conteúdos ou informações. Aprendizagem é um processo de aquisição e assimila-
ção de novos padrões e formas de perceber, ser, pensar e agir. Assim, podemos dizer
que a aprendizagem é a mudança de comportamento, ou seja, são todas as transfor-
mações que o professor provoca no aluno nas maneiras de pensar, agir e sentir.

Há diferentes tipos de aprendizagem


Aprendizagem motora
A aprendizagem motora consiste na aprendizagem de hábitos que incluem
simples habilidades motoras, por exemplo: aprender a andar, aprender a dirigir um
carro, aprender a falar e a escrever.

Aprendizagem cognitiva
A aprendizagem cognitiva abrange a aquisição de informações e conheci-
mentos, por exemplo: aprender os princípios e teorias educacionais.

Aprendizagem afetiva ou emocional


A aprendizagem afetiva ou emocional diz respeito aos sentimentos e as
emoções, por exemplo: apreciar uma obra de arte.
Mas é importante observar, com relação aos tipos de aprendizagem, que não
se aprende uma só coisa de cada vez, aprendemos várias. Para que alguém apren-
da, é necessário que queira aprender. Por isso, é muito importante que o professor
saiba motivar seus alunos.
O professor pode criar uma situação favorável à aprendizagem, por meio de
uma variedade de recursos, métodos e procedimentos de ensino. Para criar essa
situação, o professor deve:
conhecer os interesses atuais dos alunos para mantê-los ou orientá-los
nas aulas;

51
Didática do Ensino Superior

buscar uma motivação duradoura para conseguir do aluno uma atividade


interessante e alcançar o objetivo da aprendizagem.
Entre motivação e aprendizagem, existe uma mútua relação que o professor
não deve esquecer:
sem motivação, não há aprendizagem;
os motivos geram novos motivos;
o êxito na aprendizagem reforça a motivação.
Concluindo:
Não há ensino sem aprendizagem.
Há uma relação entre o ensino e a aprendizagem.
Ensinar e aprender são processos complementares na construção do
­conhecimento.

Ensinar e aprender:
significados e mediações
Aprender e ensinar constituem duas atividades muito próximas da ­experiência
de qualquer ser humano. Aprendemos quando introduzimos alterações na nossa
forma de pensar e de agir, e ensinamos quando partilhamos com o outro, ou em
grupo, a nossa experiência e os saberes acumulados.
Refletir sobre a aprendizagem é, sobretudo, indagar-se sobre a natureza e a
variedade de aprendizagens a que estamos expostos, as variáveis e os mecanis-
mos que interferem no processo, as propostas que os estudiosos encontraram para
explicá-las e incrementá-las. Portanto, antes de aderir a qualquer concepção sobre
o modo como ensinar, o importante é refletir sobre a sua finalidade.
No desempenho adequado do papel de professor, o que não se pode deixar
de cumprir são as funções inerentes ao exercício de uma docência produtiva:
dar ao aluno o conhecimento de seus limites e fazer cumprir as regras previa-
mente estabelecidas;
selecionar os conteúdos que serão desenvolvidos em cada período;
apresentar aos alunos a programação da disciplina, incluindo as formas
de avaliação por ela privilegiadas, avaliação esta que deve ser contínua,
visando proporcionar eventuais correções de rumo tanto por parte dos
alunos como do professor;
planejar suas aulas, prevendo técnicas, materiais e conteúdos;
ouvir seus discentes e acatar, quando adequadas, as sugestões por eles
oferecidas, justificando quando não for aceitá-las;
considerar as experiências específicas de seus alunos, incorporando-as

52
Ensinar e aprender: a construção do conhecimento

ao conteúdo da disciplina, lembrando-se de que a significação é um dos


requisitos para que a aprendizagem seja efetivada;
ser competente e atualizado, tanto no domínio do conteúdo a ser minis-
trado como nas formas de apresentá-lo;
não hesitar diante de situações que exijam sua firmeza e decisão; e
acima de tudo, não esquecer que seu aluno é seu parceiro e, como tal, tem
vez no desenvolvimento de seu curso, dando-lhe ritmo próprio. (VAS-
CONCELOS, 2003, p. 77).
Para o professor tornar efetiva “a sua atuação profissional enquanto docente,
não há como ignorar o fato de que o centro de toda e qualquer ação didático-
pedagógica está sempre no aluno e, mais precisamente, na aprendizagem que esse
aluno venha a realizar.” (VASCONCELOS, 2003, p. 22).

Refletindo sobre sua prática docente


As aprendizagens, que hoje são propostas a diversos níveis de ensino, são
formulações de descobertas, relatos e elaborações que levaram anos para se cons-
tituírem como corpo de conhecimentos. No passado, os conhecimentos foram
organizados em disciplinas autônomas que faziam parte dos currículos escolares
e, por vezes, foi incrementada uma aprendizagem de tipo cumulativo de cada uma
delas. Hoje, fala-se da visão parcial por elas veiculada e apela-se para um conhe-
cimento cada vez mais holístico e integrado.
Nessa proposta, compete ao aluno orientar a sua vontade de aprender, tendo
em conta as suas potencialidades e aptidões, concentrando a sua atenção e seus
esforços em tarefas fundamentais, de modo a construir a sua estrutura do saber e
do saber fazer, de forma organizada, clara e significativa.
Cabe ao professor, como mediador entre a comunidade, os saberes e o alu-
no, dominar a estrutura dos conteúdos, estar atento à estrutura do sujeito, ter em
conta as expectativas da comunidade em que se integra e escolher a forma mais
adequada para a comunicação pedagógica.

Ensinar e aprender no Ensino Superior


O professor universitário precisa substituir a ênfase no ensino pela ênfase
na aprendizagem.
Quando falamos em aprendizagem, estamos nos referindo ao desenvolvi-
mento de uma pessoa, no nosso caso, de um universitário nos diversos aspectos
de sua personalidade:
desenvolvimento de suas capacidades intelectuais – de pensar, de ra-
ciocinar, de refletir, de buscar informações, de analisar, de criticar, de
argumentar, de dar significado pessoal às novas informações adquiridas,
53
Didática do Ensino Superior

de relacioná-las, de pesquisar e de produzir conhecimento;


desenvolvimento de habilidades humanas e profissionais que se espe-
ram de um profissional atualizado – trabalhar em equipe, buscar novas
informações, conhecer fontes e pesquisas, dialogar com profissionais de
outras especialidades dentro de sua área e com profissionais de outras
áreas que se complementam para realização de projetos ou atividades
em conjunto, comunicar-se em pequenos e grandes grupos, apresentar
trabalhos;
desenvolvimento de atitudes e valores integrantes à vida profissional
– a importância da formação continuada; a busca de soluções técnicas
que contemplem o contexto da população, do meio ambiente e das ne-
cessidades da comunidade; as condições culturais, políticas e econô-
micas da sociedade, os princípios éticos na condução de sua atividade
profissional.
Assim, a ênfase na aprendizagem no Ensino Superior alterará o papel dos
participantes do processo ensino-aprendizagem:
quanto ao universitário – cabe o papel central de sujeito que exerce
ações necessárias para que aconteça sua aprendizagem (buscar as infor-
mações, trabalhá-las, produzir conhecimento, adquirir habilidades, mu-
dar atitudes e adquirir valores). Essas ações serão realizadas com outros
participantes do processo (os professores e os colegas de turma), pois
a aprendizagem não se faz isoladamente, mas em parceria, em contato
com os outros e com o mundo;
quanto ao professor universitário – terá substituído seu papel de trans-
missor de conhecimentos para o de mediador pedagógico ou de orienta-
dor do processo ensino-aprendizagem de seus alunos.

Características
da aprendizagem no Ensino Superior
Segundo Masetto (2003, p. 85-88), a aprendizagem universitária pressupõe por
parte do universitário:
aquisição e domínio de um conjunto de conhecimentos, métodos e técni-
cas científicas de forma crítica;
iniciativa para buscar informações, relacioná-las, conhecer e analisar vá-
rias teorias e autores sobre determinado assunto, compará-las, discutir
sua aplicação em situações reais com as possíveis conseqüências para a
sociedade;
autonomia na aquisição dos conhecimentos, desenvolvendo sua capa-
cidade de reflexão e a realização de uma formação continuada que se
prolongará por toda a vida.

54
Ensinar e aprender: a construção do conhecimento

Integração do processo ensino – aprendizagem


com a atividade de pesquisa tanto do aluno como
do professor
O universitário começa a se responsabilizar por buscar informações, apren-
der a localizá-las, analisá-las, relacionar as novas informações com seus conhe-
cimentos anteriores, dando-lhes significado próprio, redigir conclusões, observar
situações de campo e registrá-las, trabalhar com esses dados e procurar chegar à
solução dos problemas etc.
Dificilmente o universitário incluirá a investigação em seu processo de
aprendizagem se o professor universitário também não o fizer em sua atividade
docente.

Toda a aprendizagem precisa


ser significativa para o universitário
É preciso envolver o universitário como pessoa: idéias, inteligência, senti-
mentos, cultura, profissão e sociedade. Isso exige que:
a aprendizagem do novo se faça a partir do universo de conhecimentos,
experiências e vivências anteriores dos universitários;
se dê importância a motivar e despertar o interesse do universitário pelas
novas aprendizagens com uso de estratégias apropriadas;
o incentivo à formulação de perguntas e questões que digam respeito ao
seu interesse;
se permita ao universitário entrar em contato com situações concretas e
práticas de sua profissão e da realidade que o envolve;
o universitário assuma o processo de aprendizagem como seu e possa fa-
zer transferências do que aprendeu na universidade para outras ­situações
profissionais.

Colocação do universitário
mais em contato com sua realidade profissional
Em geral, a aprendizagem se realiza mais facilmente e com maior compreen-
são e retenção quando acontece nos vários ambientes profissionais, fora da sala de
aula, do que nas aulas tradicionais.

Aprender a aprender
Hoje, há um consenso de que “aprender a aprender” é o papel mais impor-
tante de qualquer instituição educacional.
55
Didática do Ensino Superior

É mais do que uma técnica de como se faz. É a capacidade de reflexão do


universitário sobre sua própria experiência de aprender, identificar os procedi-
mentos necessários para aprender, suas melhores opções, suas potencialidades e
suas limitações.

Concluindo
O exercício do magistério superior se caracteriza pela atividade de ensino
das disciplinas. Nele se combinam objetivos, conteúdos, métodos e formas de
organi­zação do ensino, tendo em vista a assimilação ativa, por parte dos universi-
tários, de conhecimentos, habilidades e hábitos, e o desenvolvimento de suas ca-
pacidades cognoscitivas. Portanto, há uma relação entre a atividade do professor
universitário (ensino) e a atividade do estudo dos universitários (aprendizagem).
As reflexões procuraram demonstrar que, para repensarmos nossas aulas,
não podemos deixar de analisar e discutir o paradigma que as orientará.
A didática deve partir de uma visão de totalidade do processo ensino-
a­ prendizagem, de uma perspectiva multidimensional; as dimensões humana, téc-
nica e político-social da prática pedagógica devem ser compreendidas e trabalha-
das de forma articulada.
Nessa linha, a competência técnica e a competência política do professor se
exigem mutuamente e se interpenetram. Não é possível dissociar uma da outra.
A dimensão técnica da prática pedagógica tem de ser pensada à luz do projeto
­político-social que a orienta.

1. Responda as questões abaixo.


a) O que o professor pode fazer para criar uma situação favorável à ­aprendizagem?

56
Ensinar e aprender: a construção do conhecimento

b) O que é preciso para que haja ensino e aprendizagem em sala de aula?

2. Trabalho em grupo.
Qual o conceito de ensino e aprendizagem predominante entre os professores?

57
Didática do Ensino Superior

3. Após as tarefas individuais e de grupo, discutam as respostas e registrem suas conclusões.

58
Planejamento
da ação didática:
uma prática em questão

Planejamento: níveis e suas relações

N
as últimas décadas, a sociedade passou por mudanças profundas, especialmente a educação,
que precisa acompanhar todos os processos de mudança nas sociedades.
Para melhor responder aos imperativos do momento e compreender a vida em socie-
dade, o homem precisa, basicamente, de reflexão e planejamento. Pela reflexão, o homem desenvolve
níveis cada vez mais aprimorados de discernimento, compreensão e julgamento da realidade, favo-
recendo a conduta inteligente em situações novas de vida. Pelo planejamento, o homem organiza e
disciplina a sua ação, partindo sempre para realizações cada vez mais complexas.
Assim, podemos concluir que planejamento é um conjunto de ações coordenadas entre si, que
concorrem para a obtenção de um resultado desejado. Cada vez mais a atitude de planejar ganha
importância e torna-se mais necessária, principalmente nas sociedades complexas do ponto de vista
organizacional.

Mas, afinal, o que é planejamento?


Planejar é analisar uma dada realidade, refletindo sobre as condições existentes, e prever as for-
mas alternativas de ação para superar as dificuldades ou alcançar objetivos desejados. Nesse sentido,
planejar é uma atividade tipicamente humana e está presente na vida de todos os indivíduos, nos mais
variados momentos.
Para Nélio Parra (1972, p. 6), planejar consiste em prever e decidir sobre:
O que pretendemos realizar?
O que vamos fazer?
Como vamos fazer?
O que e como devemos analisar a situação, a fim de verificar se o que pretendemos foi atingido?
O planejamento requer que se pense no futuro. É composto de várias etapas interdependentes,
as quais, por meio de seu conjunto, possibilitam atingir os objetivos. Assim, o planejamento é a base
para a ação sistemática. Hoje, em todos os setores da atividade humana, fala-se em planejamento.
Vejamos, no texto de Paulo Freire, em que consiste o planejamento e qual a sua importância.
Didática do Ensino Superior

Tinha chovido muito toda noite. Havia enormes poças de água nas partes
mais baixas do ­terreno. Em certos lugares, a terra, de tão molhada, tinha vi-
rado lama. Às vezes, os pés apenas escorregavam nela, às vezes, mais do que
escorregar, os pés se atolavam na lama até acima dos tornozelos. Era difícil
andar. Pedro e Antônio estavam a transportar, numa camionete, cestos cheios
de cacau, para o sítio onde deveriam secar.
Em certa altura, perceberam que a camionete não atravessaria o atoleiro
que tinham pela frente. Pararam, desceram da camionete, olharam o atoleiro,
que era um problema para eles. Atravessaram a pé uns dois metros de lama, de-
fendidos pelas suas botas de cano longo. Sentiram a espessura do lamaçal. Pen-
saram. Discutiram como resolver o problema. Depois, com a ajuda de ­algumas
pedras e de galhos secos de árvores, deram ao terreno a consistência mínima
para que as rodas da camionete passassem sem atolar.
Pedro e Antônio estudaram. Procuraram compreender o problema que
­tinham de resolver e, em seguida, encontraram uma resposta precisa. Não se
­estuda apenas nas escolas. Pedro e Antônio estudaram enquanto trabalharam.
Estudar é assumir uma atitude séria e curiosa diante de um problema.
LEITE, L. C. I. Encontro com Paulo Freire. Revista Educação e Sociedade.
São Paulo: Cortez e Moraes, n. 3, p. 68-69, maio, 1979.

Planejar é, portanto, “assumir uma atitude séria e curiosa diante de um problema”.


O planejamento é, hoje, uma necessidade em todos os campos da ativi-
dade humana.

Tipos de planejamento
na área da educação
Na área de educação e do ensino, há vários níveis de planejamento, que va-
riam de abrangência e complexidade:
planejamento de um sistema educacional;
planejamento geral das atividades de uma escola;
planejamento de currículos;
planejamento didático ou de ensino: plano de curso, plano de unidade e
plano de aula.

60
Planejamento da ação didática: uma prática em questão

Planejamento educacional
O planejamento de um sistema educacional é feito em nível sistêmico, isto
é, em nível nacional, estadual e municipal. Consiste no processo de tomada de
decisões sobre a educação no conjunto do desenvolvimento geral do país. A ela-
boração desse tipo de planejamento requer a proposição de objetivos a longo prazo
que definam uma política da educação.

Planejamento escolar
O planejamento geral das atividades de uma escola é o processo de tomada
de decisão quanto aos objetivos a serem atingidos e a previsão das ações, tanto
pedagógicas como administrativas, que devem ser executadas por toda a equipe
escolar para o bom funcionamento da escola.

Planejamento curricular
O planejamento do currículo consiste na formulação de objetivos educacio-
nais a partir dos objetivos gerais expressos nos documentos oficiais. Nesse senti-
do, a escola deve procurar adaptá-los às situações concretas, selecionando aquelas
experiências que mais poderão contribuir para alcançar os objetivos dos alunos,
das suas famílias e da comunidade.

Planejamento de ensino
O planejamento de ensino é a previsão das ações e procedimentos que o
professor vai realizar junto a seus alunos e a organização das atividades discentes
e das experiências de aprendizagem, visando atingir os objetivos educacionais
estabelecidos. Nesse sentido, o planejamento de ensino é a especificação e opera-
cionalização do plano curricular.
Existem três tipos de planejamento de ensino, de acordo com seu nível de espe-
cificidade crescente:
planejamento de curso;
planejamento de unidade;
planejamento de aula.

Planejamento de curso
Planejamento de curso é a previsão dos conhecimentos a serem desenvolvi-
dos e das atividades a serem realizadas em uma determinada classe, durante um
período de tempo, geralmente durante o ano ou semestre letivos.
O resultado desse processo é o plano de curso que é a previsão de um de-
terminado conjunto de conhecimentos, atitudes e habilidades a ser alcançado por
uma turma num certo período.

61
Didática do Ensino Superior

Esquema de um plano de curso


Identificação
Escola: Série/Período:

Disciplina: Ano letivo:

Curso: Professor:

Número previsto de aulas:

Objetivos gerais

Estratégias
Objetivos Tempo Formas de
Conteúdos Procedimentos
específicos Recursos provável avaliação
de ensino

Bibliografia

62
Planejamento da ação didática: uma prática em questão

Planejamento de unidade
Planejado de unidade é uma especificação maior do plano de curso. Uma unidade é formada de
assuntos inter-relacionados.

Esquema para o planejamento de unidade


Identificação
Escola: Série/Período:

Disciplina: Ano letivo:

Curso: Professor:

Número previsto de aulas:

Tema central

Apresentação

Desenvolvimento

Integração

Bibliografia

63
Didática do Ensino Superior

Planejamento de aula
Planejamento de aula é a seqüência de tudo o que vai ser desenvolvido em um dia letivo. É a
especificação dos comportamentos esperados do aluno e dos meios – conteúdos, procedimentos e
recursos – que serão utilizados para sua realização.

Como elaborar o plano de aula?


Indicar o tema central da aula.
Estabelecer objetivos.
Indicar o conteúdo que será objeto de estudo.
Estabelecer os procedimentos e recursos de ensino.
Prever como será feita avaliação.
Apresentamos, a seguir, um esquema que poderá facilitar o trabalho de planejamento de aula.

Esquema de um plano de aula


Identificação
Escola: Série/Período:

Disciplina: Ano letivo:

Curso: Professor:

Número previsto de aulas:

Tema central

Estratégias
Objetivos Tempo Formas de
específicos
Conteúdos Procedimentos provável avaliação
Recursos
de ensino

Bibliografia

64
Planejamento da ação didática: uma prática em questão

Importância do planejamento de ensino


Planejar as atividades de ensino é importante pelos seguintes motivos:
evita a rotina e a improvisação;
contribui para a realização dos objetivos visados;
promove a eficiência do ensino;
garante maior segurança na direção do ensino;
garante economia de tempo e energia.

Características de um bom planejamento de ensino


Um bom planejamento de ensino deve ter as seguintes características:
ser elaborado em função das necessidades apresentadas pelos alunos;
ser flexível, isto é, deve dar margem a possíveis reajustamentos sem quebrar
a unidade e a continuidade, podendo ser alterado quando se fizer necessário;
ser claro e preciso, isto é, os enunciados devem apresentar indicações
exatas e sugestões concretas para o trabalho a ser realizado;
ser elaborado em íntima correlação com os objetivos visados;
ser elaborado, tendo em vista as condições reais e imediatas de local,
tempo e recursos disponíveis.

O planejamento no Ensino Superior


Quando o docente trabalha no Ensino Superior, ele participa do ­planejamento
de todas as atividades acadêmico-pedagógicas da instituição de Ensino ­Superior
da qual está vinculado, especialmente das que dizem respeito ao(s) curso(s) de
graduação em que ministra aulas.
No Ensino Superior, cada curso de graduação possui um projeto pedagógico ou
projeto acadêmico de curso, documento importante para ­conhecimento dos docentes,
já que nele encontramos todas as informações sobre o curso em que ­trabalhamos.
O planejamento da ação didática se apresenta de diferentes maneiras:
ementa;
programa de disciplina;
plano de aula ou plano de ensino;
cronograma de atividades.

Ementa
A palavra ementa vem do latim ementum, que quer dizer idéia, pensamen-
to, sumário, resumo.

65
Didática do Ensino Superior

Cada disciplina que compõe o currículo do curso possui sua respectiva


ementa, dando origem a outro documento chamado ementário.
Ementário é o livro ou caderno de ementas que contém todas as ementas de
disciplinas que compõe o currículo de um determinado curso de graduação.
Como se elabora uma ementa de disciplina?
Quando se redige uma ementa de disciplina, o docente deve respeitar as
seguintes normas:
a ementa deve ser redigida em forma de um parágrafo;
deve conter, no máximo, 40 palavras (isto não quer dizer que não possa
ter menos ou um pouco mais de 40 palavras);
ser clara, resumir o que vai ser estudado/ensinado pelo docente em um
curso;
lembre-se que, por meio da ementa, as pessoas devem ter uma visão mais
completa possível do que vai acontecer em um curso;
quando não se tem experiência em redação de ementas, deve-se subli-
nhar os tópicos mais importantes de cada unidade de ensino, depois ten-
tar j­untá-los num todo.
Tente exercitar, tendo como base os conteúdos abaixo.

Disciplina: didática do Ensino Superior


Conteúdos programáticos
Unidade 1: didática
1.1 Conceituação.
1.2 Teorias e práticas didáticas por meio da literatura e da troca de vi-
vências pedagógicas.
1.3 O contexto histórico das idéias pedagógicas.
Unidade 2: Perfil do professor e do universitário
2.1 Perfil do professor.
2.2 Perfil do universitário.
2.3 Literatura e observação do professor e do universitário em sala de
aula.
Unidade 3: Planejamento de ensino
3.1 Ementa: distribuição de conteúdos e carga horária; orientação meto-
dológica e avaliação.
3.2 Aspectos técnicos da elaboração de planejamento de Ensino ­­Superior
por meio de atividades práticas em sala de aula.

66
Planejamento da ação didática: uma prática em questão

Unidade 4: Avaliação
4.1 Tipos e funções.
4.2 Testes: tipos e construção do testes.
4.3 Avaliação para testes objetivos e dissertativos.
Unidade 5: Recursos de ensino
5.1 Do quadro ao computador.
5.2 Estudo da literatura específica ligada ao uso desses recursos em sala
de aula.
5.3 Avaliação de livros didáticos, seleção e utilização de textos em sala
de aula.

Redija a ementa.

Agora que você tentou redigir a ementa da disciplina Didática do Ensino


Superior, confira com a que está a seguir.
EMENTA
Didática. Perfil do professor e do universitário. Planejamento de ensino.
Avaliação. Recursos de ensino.
Se você se enrolou um pouco, não desista. Tudo na vida é uma questão de
treinamento e de exercício. Pegue outros conteúdos e tente redigir a ementa.

Objetivos do programa de disciplina


Ao professor, cabe responsabilizar-se pelos resultados de seu ensino. Esses
67
Didática do Ensino Superior

resultados estão relacionados a seu sistema de ensinar, que toma como base a des-
crição específica do que se espera que o universitário possa fazer depois de viver
o processo ensino-aprendizagem.
Assim, o professor precisa definir de início o que o universitário será capaz
de fazer ao final do aprendizado.
Muitos professores acham difícil estabelecer os objetivos. Diria que é
­trabalhoso. No entanto, uma hora que se perca planejando, ganha-se em qualidade
de trabalho.

Revendo a formulação de objetivos


Objetivo geral é a formulação geral da competência que se espera do uni-
versitário ao terminar uma disciplina, uma unidade de ensino ou um curso.
Objetivo específico são as proposições específicas sobre mudanças no com-
portamento dos universitários, que serão atingidos gradativamente no processo de
ensino e aprendizagem.
Sempre que os universitários têm dificuldades e/ou dúvidas entre objetivo
geral e específico, sugiro que se faça a analogia da escada, na qual o patamar ou
topo seria o objetivo geral, e os degraus que temos que subir para atingir o topo
são os objetivos específicos.

Exemplificando
O objetivo geral da disciplina didática do Ensino Superior é:
capacitar profissionais de diversas áreas do conhecimento ao exercício
do magistério superior, por meio do desenvolvimento de atividades e
estudos teórico-práticos.
Este é o topo da escada. Mas, para que eu diga que preparei docentes univer-
sitários, é necessária uma série de passos ou “subidas” de degraus, não é mesmo?
Tente estabelecer objetivos. Lembre-se que já temos a ementa, os conteúdos
programáticos e estamos trabalhando os objetivos.
Agora que você já estabeleceu os objetivos específicos, compare os seus
com os meus e tire conclusões.
Conceituar didática.
Estabelecer as mudanças das idéias pedagógicas em determinada faixa
de tempo.
Traçar o perfil do docente por meio da literatura (perfil teórico) e de ob-
servações (perfil real).
Identificar as partes componentes de um programa de disciplina.
Elaborar programas de disciplina.

68
Planejamento da ação didática: uma prática em questão

Identificar os tipos e as funções da avaliação.


Construir um teste com questões de múltipla escolha e dissertativa.
Estabelecer critérios de avaliação para cada atividade pedagógica.
Selecionar recursos de ensino que colaborem no sentido de melhorar a
aprendizagem dos universitários.
Avaliar livros didáticos a partir de um guia de análise.
Muitos outros degraus poderiam ser inseridos, porém estes já são suficien-
tes para se chegar à idéia do que é capacitar profissionais.

Conteúdos programáticos
Quando você divide a carga horária da disciplina, deve levar em conta dois
princípios – o da seqüência e o da complexidade –, isto é, dar menor número de
horas/aula para os conteúdos menos complexos e maior número de horas/aula para
os que oferecem grau maior de dificuldade de aprendizagem.
Os conteúdos de ensino devem ser organizados em unidades didáticas,
­conforme a carga horária disponível para disciplina, podendo ter, no máximo,
oito unidades.
Mas, podemos ter menos unidades ou mais unidades dependendo da carga
horária da disciplina (30, 60, 90 e 120 horas, por exemplo).
O importante é não esquecer que os conteúdos de ensino estão relacionados
aos objetivos propostos para o processo ensino-aprendizagem.

1. Estabeleça um objetivo geral e desdobre-o em objetivos específicos.

2. Faça a distribuição da carga horária da disciplina (60 horas), levando em consideração os prin-
cípios de seqüência e complexidade.

E a metodologia de ensino?
O professor universitário, no exercício de suas funções, deve utilizar uma
variedade de metodologias, que contribuam para tornar suas aulas mais interes-
santes, dinâmicas e vivas.
Nesta parte, o professor cita os métodos e as técnicas de ensino utilizados
para desenvolver o programa.

69
Didática do Ensino Superior

Como o professor
universitário avalia seus alunos?
A avaliação do rendimento escolar envolve a freqüência e o aproveitamento.
Ao avaliar o universitário, o professor deve utilizar técnicas diversas e
instrumentos variados, pois quanto maior for a amostragem, mais perfeita será
a avaliação.

Estabelecido o paradigma de avaliação, estabeleça em seu programa de disciplina como você


avaliará seus alunos no semestre letivo.

A parte final do programa de disciplina trata da bibliografia.

Bibliografia básica
Ao indicar os livros básicos, o professor deve ter em mente a leitura mínima
obrigatória, parte do processo da aprendizagem fundamental.

Bibliografia complementar
A bibliografia complementar é a leitura recomendada para aumentar os co-
nhecimentos sobre determinados assuntos, criando a oportunidade de o aluno
adentrar nas idéias de diferentes autores.
Ao listar as obras, o professor universitário deverá obedecer às normas téc-
nicas vigentes da ABNT.

Organize a bibliografia básica de uma disciplina de seu interesse e de sua área de conhecimento.
Aproveite para adequá-la às normas técnicas da ABNT.

1. Atividade individual.
a) Na escola em que você trabalha, é feito algum tipo de planejamento?
70
Planejamento da ação didática: uma prática em questão

b) Como é feito o planejamento?

c) Esse planejamento tem alguma importância para o desenvolvimento da atividade docente?

71
Didática do Ensino Superior

2. Atividade em grupo.
Discutir as respostas das questões acima e tirar conclusões.

72
Planejamento de ensino
numa perspectiva crítica

R
efletindo sobre a prática pedagógica universitária, observa-se que trata da metodologia do ­Ensino
Superior, da prática pedagógica e das didáticas, da epistemologia da prática ­profissional, da
sala de aula universitária e de sua gestão pedagógica, e da inovação na educação, entre outros.
Trata-se de um campo de possibilidades infinitas, em que o diálogo com os professores é fundamental
(GUSDORF, 1967, p. 56).
Assim, é abandonada a exclusividade atribuída à técnica, e os professores universitários mos-
tram-se favoráveis a um professor acolhedor, confiante no universitário, dialógico, questionador e
provocador. Em relação à disciplina ministrada, surge uma proposta mais global, relacionada a con-
teúdos, sentimentos, cooperação, participação e incertezas.
Nessa direção, temos a compreensão de que:
...não se pode falar em uma pedagogia universitária, mas sim pedagogias universitárias, quanto em relação aos
diferentes campos profissionais. Vive-se, assim, uma tensão constante entre o específico e o geral, entre o indiví-
duo e o coletivo, que interagem em processos em decisões pedagógicas na instância de cada curso e que adentram
na formação do professor e nas suas práticas pedagógicas, sem que, na maioria das vezes, se tenha consciência
dessas tensões e arbitrariedades presentes na estrutura de poder de cada profissão. (FERNANDES, 1999, p. 3).

Isso implica a necessidade de se promover um permanente “diálogo epistêmico” entre o conteú-


do específico de cada campo do conhecimento e o conteúdo pedagógico. Busca-se assim a construção
de uma epistemologia que produza, dissemine e ressignifique, na formação de professores, a docência
como um campo profissional com conhecimentos próprios, interagindo com espaço-tempo que está
sendo vivido e por viver, o que constitui o cerne da pedagogia universitária.
Pensar a prática pedagógica e investigativa como um processo ativo e crítico conduz à apren-
dizagem de como fazê-la, favorecendo a formação de uma nova cultura organizacional (NÓVOA,
1992), que produz:
a vida do professor, na perspectiva de desenvolvimento pessoal;
a profissão docente, na perspectiva de desenvolvimento profissional;
a universidade, na perspectiva de desenvolvimento organizacional.
Nesse tipo de comunidade, concretiza-se a investigação-formação mobilizadora da experiência,
além da dimensão pedagógica, para a produção de saberes, por meio da criação de autoformação par-
ticipada, decisiva para o profissional docente, para a socialização profissional e para a afirmação da
própria profissão docente (NÓVOA, 1992).
A universidade, na perspectiva de desenvolvimento organizacional, por sua vez, consolida-se
como espaço de formação, na articulação pela investigação participativa.
Nessa perspectiva, a abordagem de situações-problema vivenciadas pelos professores, na práti-
ca cotidiana, em um contexto de partilha de experiências, possibilita ver o dia-a-dia como passível de
mudanças, exigindo repostas práticas.
Didática do Ensino Superior

Entendendo a prática pedagógica como uma prática intencional de ensino e


aprendizagem, é fundamental compreender o processo de planejamento inovador
no Ensino Superior.

O processo de planejamento
no Ensino Superior
No contexto atual, o processo de planejamento de ensino tem sido obje-
tivo de constantes reflexões, indagações e críticas quanto à sua validade como
um instrumento de intervenção, mudança e de melhoria da qualidade do tra-
balho docente.
A vivência do cotidiano universitário evidência situações questionáveis nes-
se sentido:
a) os objetivos educacionais propostos nos currículos dos cursos de graduação apresen-
tam-se confusos e desvinculados da realidade social;

b) os conteúdos a serem trabalhados, por sua vez, são definidos de maneira autoritária, pois
os professores, via de regra, não participam dessa tarefa;

c) percebe-se, também, que os recursos disponíveis para o desenvolvimento do trabalho


didático tendem a ser simples instrumentos de ilustração das aulas, reduzindo-se a equi-
pamentos e objetos, muitas vezes, inadequados aos objetivos e conteúdos;

d) quanto à metodologia utilizada pelo professor, observa-se que esta se caracteriza pela
predominância de atividades transmissoras de conhecimentos, com pouco ou nenhum
espaço para discussão e análise crítica dos conteúdos;

e) o aluno se mostra mais passivo do que ativo e, por decorrência, seu pensamento criativo
é mais bloqueado do que estimulado;

f) a avaliação da aprendizagem é resumida ao ritual das provas periódicas, quais é verifi-


cada a quantidade de conteúdos assimilada pelo aluno. (LOPES, 1991, p. 41-42).

Diante dessa realidade, o professor universitário, assumindo a autoridade


institucional, direciona o processo ensino-aprendizagem de forma isolada dos
condicionantes históricos presentes na experiência de vida dos universitários.
Nesse contexto, o processo de planejamento de ensino se apresenta desvin-
culado da realidade socioeconômica e cultural caracterizando-se como uma ação
mecânica e burocrática do professor, pouco contribuindo para elevar a qualidade
da ação pedagógica nas instituições de Ensino Superior.
No meio universitário, quando se faz referência a planejamento da ação do-
cente, a idéia é aquela que identifica o processo pelo qual são definidos: os objeti-
vos, o conteúdo programático, os procedimentos de ensino, os recursos didáticos
e a sistemática de avaliação da aprendizagem.

74
Planejamento de ensino numa perspectiva crítica

Este é o padrão de planejamento de ensino adotado pela maioria dos profes-


sores universitários e que, em nome da eficiência do ensino, passou a ser ­valorizado
apesar de sua dimensão técnica.
É claro que a definição dos componentes do plano de ensino de maneira
fragmentada e desarticulada do todo social é que tem gerado uma concepção de
planejamento ineficaz de dinamizar e facilitar o trabalho docente.
Numa concepção transformadora, o processo de planejamento de ensino visto
sob a perspectiva crítica da educação, passa a extrapolar a simples tarefa de se elabo-
rar um documento contendo todos os componentes tecnicamente recomendáveis.
Sentimos que o processo de planejamento de ensino precisa ser repensado. En-
tendemos que um planejamento dirigido para uma ação crítica e transformadora pos-
sibilitará ao professor um universitário com maior segurança para lidar com a relação
educativa que ocorre na sala de aula e na instituição de Ensino Superior como um todo.
Assim, o planejamento “adequado” bem como o seu resultado – um bom
plano de ensino – se traduzirá pela ação pedagógica direcionada de maneira a se
integrar dialeticamente ao concreto do universitário, buscando sua transformação.
Numa perspectiva crítica da educação, a instituição universitária tem o sig-
nificado de “local de acesso” ao saber sistematizado historicamente acumulado.
No pensamento de Saviani (1983, p. 9), a escola existe “para propiciar a aquisi-
ção dos instrumentos que possibilitam o acesso ao saber elaborado (ciência), bem
como o próprio acesso aos rudimentos desse saber”.
Assim, os conteúdos que constituem esse saber elaborado não poderão ser
considerados de forma estática e acabada, pois se tratam de conteúdos dinâmicos
e, por isso, articulados dialeticamente, com a realidade histórica. Logo, precisam
ser conduzidos de forma que, ao mesmo tempo em que transmitam a cultura acu-
mulada, contribuam para a produção de novos conhecimentos.
Isto significa dizer que produzir conhecimentos tem o significado de processo
de reflexão permanente sobre os conteúdos aprendidos, buscando analisá-los sob
diferentes pontos de vista. Significa, ainda, desenvolver a atitude de ­curiosidade
­científica, de investigação da realidade, não aceitando como conhecimentos pron-
tos e acabados os conteúdos transmitidos pela instituição universitária.

Planejamento: ação pedagógica essencial


Nessa perspectiva, o planejamento do ensino na instituição universitária
não poderá ser compreendido de maneira mecânica, desvinculado das relações
entre a instituição educativa e a realidade histórica.
Nessa ótica, os conteúdos a serem trabalhados por meio do currículo precisa-
rão estar estreitamente relacionados com a experiência de vida dos ­universitários.
Lembrando que essa relação é condição necessária para que, ao mesmo tempo em
que ocorra a transmissão de conhecimentos, proceda-se a sua relação com vistas
à produção de novos conhecimentos.

75
Didática do Ensino Superior

Conseqüentemente, o resultado dessa relação dialética será aplicação dos


conhecimentos aprendidos sobre a realidade social no sentido de intervir para
­transformá-la.
Assim, podemos concluir que a tarefa de planejamento passa a existir como
uma ação pedagógica essencial ao processo de ensino e de aprendizagem, supe-
rando sua concepção mecânica e burocrática. Espero, então, ter provocado mu-
dança na sua concepção de planejamento em uma instituição universitária.

Planejamento de ensino: processo


integrador entre a universidade
e o contexto social
Superando a dimensão técnica, o planejamento de ensino seria a ação resul-
tante de um processo integrador entre a universidade e o contexto social, efetivada
de forma crítica, criativa e transformadora.
Isso significa que as atividades seriam planejadas tendo como referência a
problemática sociocultural, econômica e política do contexto no qual a instituição
universitária está inserida.
Nessa perspectiva, o planejamento de ensino estaria voltado eminentemente
para a transformação da sociedade no sentido de torná-la mais humana, igualitá-
ria e justa.
Então, como se efetiva essa forma de planejamento de ensino no cotidiano
universitário?
Essa proposta tem como fundamento os princípios do planejamento parti-
cipativo, forma de trabalho coletivo que se caracteriza pela integração de todos
os setores da atividade humana, numa ação globalizante, com vistas à solução de
problemas comuns. O que implica numa convivência de profissionais que discu-
tam e avaliem atividades propostas coletivamente.
A partir dessa convivência, o processo educativo passa a desenvolver mais
facilmente seu papel transformador, pois, à medida que discutem, as pessoas re-
fletem, questionam, conscientizam-se de problemas coletivos e decidem-se por se
enganjar na luta pela melhoria da qualidade da educação e do ensino.
No contexto universitário, o planejamento participativo caracteriza-se pela
busca da integração efetiva entre instituição universitária e a realidade social, pri-
mando pela articulação entre teoria e prática. Logo, a participação de professores,
alunos, especialistas e demais pessoas envolvidas no processo educativo, seria o
ponto de convergência das ações direcionadas para a produção do conhecimento,
tendo como base a realidade histórica.
Para Lopes (1991, p. 46-50), o processo de planejamento de ensino, na insti-
tuição universitária, caracteriza-se por diferentes momentos:

76
Planejamento de ensino numa perspectiva crítica

diagnóstico da realidade sociocultural da clientela escolar – o que


possibilita a caracterização dos interesses e necessidades para os quais a
ação pedagógica será planejada;
organização do trabalho didático – que inclui a definição dos objetivos
a serem perseguidos, a sistematização do conteúdo programático e a se-
leção dos procedimentos de ensino a serem utilizados.
Na definição dos objetivos, será essencial a especificação dos diferentes
­níveis de aprendizagem a serem atingidos: aquisição, reelaboração dos conheci-
mentos e produção de novos conhecimentos. Para tanto, deverão expressar ações,
tais como a reflexão crítica, a curiosidade científica, a investigação e a criativida-
de.
Os conteúdos a serem estudados deverão passar por uma análise crítica com
vistas à identificação daquilo que representa o essencial.
Propostos os objetivos e os conteúdos a serem estudados em metodologia de
ensino, passamos à articulação de procedimentos que deverão ser concretizados,
respeitando os diferentes níveis de aprendizagem e a natureza da matéria de ensi-
no proposta. Assim, o critério básico para a seleção de procedimentos de ensino
deverá ser a criatividade. A tarefa do professor universitário é articular uma me-
todologia de ensino que se caracterize pela variedade de atividades estimuladoras
dos universitários.
A avaliação da aprendizagem não poderá ter o sentido classificatório dos
r­ esultados do ensino. Num processo educativo em que a metodologia de ensi-
no ­privilegia a criatividade dos universitários, a avaliação terá o caráter de
­acompanhamento desse ­processo, num julgamento conjunto de professores e uni-
versitários.
Dessa forma, não deverá existir preocupação com a verificação da quanti-
dade de conteúdos aprendidos, mas tão-somente com a qualidade da reelaboração
e produção de conhecimentos ­empreendida por cada universitário a partir da ma-
téria estudada.

Concluindo
O projeto político-pedagógico é um documento sempre provisório que afir-
ma publicamente aquilo que acredita numa determinada comunidade educativa e
que busca fundamentar uma prática pedagógica concreta.
Este projeto tem origem num processo participativo de construção de
­significados, no esforço de definir e configurar uma nova identidade à instituição,
t­raduzindo, ao mesmo tempo, a intenção do que se pretende realizar: projeções,
­inovações, mudanças e rupturas e, principalmente, a coragem e a ousadia para
­propô-las.
Desse modo, traz de forma implícita a utopia impulsionadora de uma coleti-
vidade que busca o novo e o desejado, constituindo uma prática vivida, num dado

77
Didática do Ensino Superior

espaço e tempo histórico-cultural.


Logo, o projeto político-pedagógico institucional exige a construção de um
processo participativo com a busca de adesão voluntária daqueles (todos que ­fazem
parte da comunidade educativa) que contribuam com conhecimentos ­próprios e
como protagonistas capazes de discutir, refletir e propor decisões.
Faz-se necessário enfatizar que:
a caracterização de momentos ou etapas do planejamento não deverá ser
entendida como o desenvolvimento de partes distintas e estanques dentro
desse processo, porque não é possível compartimentar-se uma ação que
por sua natureza é contínua, dinâmica e globalizante;
o planejamento deverá ser integrador em toda a sua extensão, que pro-
porcionará um ensino voltado para a formação de pessoas críticas, ques-
tionadoras e atuantes;
uma educação integradora na qual professores e universitários produzam
conhecimentos a partir da participação da instituição universitária na so-
ciedade e vice-versa. Formaremos universitários com possibilidades de
contribuir concretamente para a transformação da sociedade;
o processo de planejamento de ensino exigirá do professor universitário
uma postura comprometida não só com o pedagógico, mas também com
o social.
Finalizando, o planejamento de ensino deverá ser assumido pelo professor
universitário como uma ação pedagógica consciente e comprometida com o proces-
so educativo inovador e transformador.

1. Leia o texto O planejamento educacional e a prática dos educadores de José Cerchi Fusari,
publicado na Revista Ande.

2. No início do texto, o autor descreve uma situação que de fato acontece nas instituições de Ensi-
no Superior: a resistência de alguns professores universitários de fazer um plano por escrito.
Analise a situação descrita pelo professor Fusari, tentando indicar suas causas e possíveis soluções.

3. Responda as questões em grupo.


a) Quais seriam as principais dificuldades para a elaboração de um planejamento de ensino nas
instituições universitárias?

78
Planejamento de ensino numa perspectiva crítica

b) Qual é a opinião do grupo sobre a necessidade do planejamento no Ensino Superior?

4. Discuta e apresente as respostas, tirando conclusões.

79
Didática do Ensino Superior

80
Objetivos, conteúdos
e metodologias
Em busca de um caminho

Não vê que somos viajantes?

E você me pergunta:

– Que é viajar?

Eu respondo com uma palavra: é avançar!

Experimenta isso em você.

Que sempre te desagrade ser o que você é,

Para que seja um dia aquilo que você ainda não é.

Com efeito, no dia em que você parar de avançar e disser:

– Até aqui já basta, então você já está morto.

Avance sempre, ande sempre.

Não fique parado no caminho.

Está imóvel aquele que não avança.

Está andando de marchá-ré aquele que volta de onde partiu.

E perde o caminho aquele que se afasta de um ideal.

Santo Agostinho

Introdução

E
xiste hoje, em todos os setores da sociedade, uma pressão muito forte para a mudança. Isso
­porque estamos vivendo uma situação de instabilidade geral, em que as coisas acontecem e se
­transformam muito rapidamente. O tempo parece ter adquirido novas dimensões. São as marcas
dessa nova realidade que se sucedem à modernidade.
Em todas as partes, em todos os campos de atividade, as pessoas buscam o “novo”, as formas
alternativas e pouco convencionais de agir, em que possam imprimir a sua marca, o seu diferencial.
Nesse contexto, não estamos seguros quanto aos valores, atitudes e comportamentos que deve-
riam ser estimulados por meio do processo educativo.
Diante desse quadro, a relação professor-aluno se funda na criatividade epistemológica, no
compromisso com o rigor metódico e ético com os sujeitos que interagem a teia de relações que en-
volvem o conhecimento como categoria nos processos de ensinar e aprender.
Didática do Ensino Superior

O educador democrático não pode negar-se o dever de, na sua própria prática docente,
reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade, suas tarefas primordiais e
trabalhar com os educandos a rigorosidade metódica com que devem se “aproximar” dos
objetivos cognoscíveis. (FERNANDES; FREIRE, 1997, p. 28).

Entendendo a didática como um campo de conhecimentos e saberes de plu-


ralidade epistêmica, em que questões de teoria e prática, ensino e aprendizagem,
conteúdo e forma estão relacionadas, será exigida do professor universitário uma
postura diferenciada de diálogo permanente entre estas questões, em contínuo
movimento de construção social e cultural.
Assim, assenta-se em uma prática pedagógica corporificada nos sujeitos
que a fazem, professores e universitários ensinando e aprendendo, nos processos
de ensinar e aprender, situando-se nos conhecimentos plurais de seu campo em
suas especificidades e nos diálogos que faz com outras ciências numa perspectiva
interdisciplinar e dialógica.
Estas reflexões nos fazem perceber como é importante o professor univer-
sitário determinar, de início, o que o universitário será capaz de fazer ao final do
aprendizado. O professor universitário deve ter capacidade e competência para
construir o próprio processo pedagógico, articulando o ensino e a pesquisa, de
acordo com os avanços científico-tecnológicos e as necessidades e capacidades
dos universitários.
Na realidade, o professor universitário deve estar atento ao fato de que o sis-
tema social faz exigências ao sistema educacional, que acabam por determinar os
fins da educação. A partir daí, cabe-lhe a importante missão de refletir sobre tais
exigências, identificando aquelas que devem ser satisfeitas e aquelas que devem
sofrer influências transformadoras por parte do seu trabalho. Só então deverá pen-
sar na formulação de objetivos, seleção de conteúdos e metodologias adequadas
para o desenvolvimento do processo de ensino e de aprendizagem.
Em síntese, o processo didático se caracteriza pela mediação escolar de
objetivos, conteúdos de ensino e métodos, apoiada no processo de ensino e
de aprendizagem.

A formulação de objetivos educacionais


A educação, sendo uma atividade humana, realiza-se em função de pro-
pósitos e metas. Assim, no processo pedagógico, a atuação dos docentes e dos
universitários está voltada para a consecução de objetivos educacionais. Portanto,
a formulação explícita dos objetivos educacionais dá maior segurança ao docente,
pois orienta sua atuação pedagógica, ajudando-o na seleção dos meios mais ade-
quados para realizar o seu trabalho.

Então, qual a importância dos objetivos de ensino?


Podemos compreender a importância dos objetivos de ensino, lendo esta
fábula criada por Robert Mager.
82
Objetivos, conteúdos e metodologias

Certa vez, um Cavalo-marinho pegou suas economias e saiu em busca de


fortuna. Não havia andando muito, quando encontrou uma Águia que lhe disse:
– Bom dia, amigo. Para onde vai?
– Vou em busca de fortuna – respondeu o Cavalo-marinho com muito ­orgulho.
– Está com sorte – disse a Águia. Pela metade do seu dinheiro deixo que
leve esta asa, para que possa chegar mais rápido.
– Que bom! – disse o Cavalo-marinho. Pagou-lhe, colocou a asa e saiu
como um raio. Logo encontrou uma Esponja, que lhe disse:
– Bom amigo. Para onde vai com tanta pressa?
– Vou em busca da fortuna – respondeu o Cavalo-marinho.
– Está com sorte – disse a Esponja. Vendo-lhe este scootter de propulsão
por muito pouco dinheiro, para que chegue mais rápido.
Foi assim que o Cavalo-marinho pagou o resto do seu dinheiro pelo scoot-
ter e sulcou os mares com velocidade quintuplicada. De repente encontrou um
Tubarão que lhe disse:
– Para onde você vai, meu bom amigo?
– Vou em busca da fortuna – respondeu o Cavalo-marinho.
– Está com sorte. Se tomar este atalho – disse o Tubarão, apontando para a
sua imensa boca – “ganhará muito tempo”.
– Está bem, eu lhe agradeço muito – disse o Cavalo-marinho, e se lançou
ao interior do Tubarão, sendo devorado.
MAGER, R. F. Objetivos para o ensino efetivo. Rio de Janeiro: Senai – Departamento Nacio-
nal/Divisão de Ensino, 1972. p. 11.

Segundo Mager, a moral desta fábula é a seguinte:


Se o professor universitário não tem certeza para onde vai, pode acabar indo
para onde não pretendia.
Assim, ele precisa determinar antes de iniciar seu trabalho o que o universitá-
rio será capaz de fazer ao final do aprendizado. A isso chamamos definir objetivos.
Se o professor universitário não define os objetivos, não pode avaliar de
maneira objetiva o resultado de sua atividade de ensino e não tem condições de
escolher os procedimentos de ensino mais adequados.

O que são objetivos?


Os objetivos antecipam resultados e processos do trabalho conjunto do
professor e dos universitários, expressando conhecimentos, habilidades e hábi-
tos (conteúdos) a serem assimilados de acordo com as exigências metodológicas

83
Didática do Ensino Superior

(nível dos universitários, peculiaridades das disciplinas do currículo do curso e


características do processo de ensino e aprendizagem).
Dessas considerações, podemos concluir que objetivo é a descrição clara
do que se pretende alcançar como resultado da nossa atividade docente. Os
objetivos são o ponto de partida do processo pedagógico.

Os objetivos educacionais e seus níveis


Os objetivos educacionais são os resultados desejados e previstos para ação
educativa. Logo, são os resultados que o professor espera alcançar com a criati-
vidade pedagógica. Os objetivos da educação resultam da filosofia que ­orienta
a vida dentro de uma cultura, ou seja, representam os atributos que a sociedade
espera e necessita encontrar em seus membros, delineando o perfil de homem que
a sociedade espera formar.
Os objetivos educacionais podem ser expressos em dois níveis.
Objetivos gerais – expressam propósitos mais amplos acerca do papel
da escola e do ensino diante das exigências postas pela realidade social e
diante do desenvolvimento da personalidade dos universitários. Então, são
as proposições gerais sobre as mudanças comportamentais desejadas.
Objetivos específicos – são proposições específicas sobre mudanças no
comportamento dos universitários, que serão atingidos gradativamente
no processo ensino-aprendizagem.
Embora os diferentes tipos de objetivos representem três domínios do ser
humano (cognitivo, psicomotor e afetivo), a divisão serve apenas para análise da
função didática.
Segundo Bloom (1972), a formulação de objetivos tem a finalidade de:
classificar para o professor as mudanças desejadas no universitário;
orientar o professor na escolha de conteúdos, metodologias, experiências
de aprendizagem e processo de avaliação.

Taxionomia dos objetivos de Bloom


Na Taxionomia de Bloom, os objetivos são hierarquizados em ordem cres-
cente de complexidade e abstração.

84
Objetivos, conteúdos e metodologias

Como definir objetivos específicos?


Para definição adequada de objetivos específicos, Mager (1972) sugere algu-
mas normas. Os objetivos:
devem referir-se aos comportamentos dos universitários e não do professor;
devem indicar claramente a intenção do professor e não dar margem a
muitas interpretações;
devem especificar o que o universitário deve realizar;
devem estabelecer as condições em que o universitário deverá ser capaz
de fazer (no final do curso, da unidade ou da aula), o que está previsto
no objetivo;
podem especificar o grau de perfeição que se espera do universitário.

Como elaborar objetivos?


Ao enunciar um objetivo, é importante que se faça a seguinte pergunta:
O que o universitário precisa fazer a fim de demonstrar que aprendeu o que
você, professor, deseja que ele aprenda?
A resposta satisfatória a esta pergunta exige enunciados de objetivos que
satisfaçam às seguintes condições:
Começar com um verbo de ação que descreva uma atividade ou um com-
portamento específico do universitário. Exemplos:
fazer;
adquirir.
Após o verbo de ação, representar o conteúdo referente ao assunto em
estudo. Exemplos:
fazer uma caixa de madeira;
adquirir conhecimentos sobre a civilização grega.
Terminar com o rendimento padrão em termos de avaliação. Exemplos:
fazer uma caixa de madeira em duas horas;
adquirir conhecimentos sobre a civilização grega, enfatizando a filoso-
fia socrática.
A seleção do verbo de ação que descreve o comportamento que se dese-
ja do universitário não é fácil.
Os objetivos devem indicar claramente a intenção do professor e não podem
dar margem a muitas interpretações. Para evitá-las, devemos utilizar verbos que
não permitam que isso ocorra.

85
Didática do Ensino Superior

Verbos que admitem poucas interpretações:


identificar comparar
diferenciar contrastar
escrever selecionar
resolver justificar
aumentar criticar
verbalizar distinguir
localizar construir
escolher

Isso não quer dizer que outros verbos de ação não possam ser utilizados na
formulação de objetivos. Na verdade, eles podem ser utilizados, mas é necessário
indicar como essa aprendizagem vai ser identificada ou reconhecida no compor-
tamento do universitário.
Consideremos, por exemplo, o seguinte objetivo:
“Levar universitários a conhecer fatos básicos relativos à saúde e à doença.”
Como podemos observar, esse objetivo é muito vago, pois conhecer fatos
pode dar margem a muitas interpretações, tais como: memorizar preceitos de pro-
teção à saúde, lembrar nomes de doenças, lembrar sintomas de doenças, distinguir
sintoma de causa etc.
Em síntese, o professor deve vincular os objetivos específicos nos objetivos
gerais sem perder de vista a situação concreta (da escola, da disciplina e dos uni-
versitários) em que serão aplicados.
Algumas recomendações a serem observadas pelo professor no momento da
elaboração dos objetivos:
especificar conhecimentos, habilidades, capacidades que sejam funda-
mentais a serem assimiladas e aplicadas em situações futuras, na univer-
sidade e na vida prática;
observar a seqüência lógica, de forma que os conceitos estejam inter-
­relacionados, possibilitando uma compreensão de conjunto;
expressar os objetivos com clareza, de modo que sejam compreensíveis
aos universitários e permitam, assim, que estes introjetem os objetivos
de ensino como objetivos seus;
dosar o grau de dificuldades, de modo que expressem desafios, proble-
mas, questões estimulantes e também viáveis;
formular objetivos como resultados a atingir, facilitando o processo de
avaliação;
indicar os resultados do trabalho dos universitários (o que devem saber, com-
preender, aplicar...)

86
Objetivos, conteúdos e metodologias

Por último, devemos lembrar que, para a educação escolar ser instrumen-
to de transformação social, nós, professores universitários, não podemos perder
de vista a formação de um cidadão consciente, crítico e participativo, capaz de
compreender a realidade em que vive e nela intervir, participando do processo de
construção da sociedade.

Os conteúdos de ensino
O professor universitário, ao planejar sua ação junto aos universitários, deve
considerar que o conteúdo é o conhecimento sistematizado e organizado de modo
dinâmico, sob a forma de experiências educativas. É sobre ele que se apóia a prá-
tica das operações mentais. Além disso, o conteúdo é o ponto de partida tanto para
a aquisição de informações, conceitos e princípios úteis como para o desenvolvi-
mento de hábitos, habilidades e atitudes.
Portanto, é por meio do desenvolvimento dos conteúdos programáticos que
atingimos os objetivos propostos para o processo ensino-aprendizagem. Assim,
quando o objetivo está formulado de forma clara e precisa, ele ajuda a selecionar
os conteúdos mais significativos e relevantes. Por outro lado, os conteúdos curri-
culares constituem uma fonte importante para a escolha dos objetivos, auxiliando
na sua definição.
Assim, os conteúdos de ensino devem ser “meios” para alcançar fins visa-
dos pelo processo ensino-aprendizagem.

E o que são conteúdos?


Os conteúdos de ensino são o conjunto de conhecimentos, habilidades, há-
bitos, modos valorativos e atitudinais de atuação social, organizados pedagógica
e didaticamente tendo em vista a assimilação e aplicação pelos universitários na
sua prática de vida.
Englobam, portanto, conceitos, idéias, fatos, processos, princípios, leis ­científicas,
regras, habilidades cognitivas, modos de atividade, métodos de ­compreensão e aplicação,
hábitos de estudo, de trabalho e de convivência social, valores convicções, atitudes.
Os conteúdos são organizados em matérias de ensino e dinamizados pela
articulação de objetivos, conteúdos, métodos e formas de organização do ensino,
nas condições reais em que ocorre o processo de ensino.
Na escolha dos conteúdos de ensino, portanto, leva-se em conta não só a he-
rança cultural manifesta nos conhecimentos e habilidades, mas também a experi-
ência da prática social vivida no presente pelos universitários, isto é, os problemas e
desafios existentes no contexto em que vivem. Além disso, os conteúdos de ensino
devem ser elaborados numa perspectiva de futuro, uma vez que contribuem para a
negação das ações sociais vigentes tendo em vista a construção de uma sociedade
mais humana. Trata-se de uma questão muito importante no trabalho docente.

87
Didática do Ensino Superior

Como selecionar conteúdos?


Para selecionar conteúdos, em função dos objetivos propostos, o professor
deve considerar aqueles que são mais importantes e significativos para uma deter-
minada realidade e época.
Vejamos a seguir os critérios que podem ser aplicados na seleção de conteúdos.

Validade
Os conteúdos devem estar adequados e vinculados aos objetivos estabeleci-
dos para o processo de ensino e aprendizagem. O professor precisa fazer ajustes
na sua programação, incorporando os conhecimentos mais atualizados.

Utilidade
Quando há possibilidade de aplicar o conhecimento adquirido em situações
novas, ou seja, adequados às exigências e condições do meio em que os universi-
tários vivem, satisfazendo suas necessidades e expectativas, e quando têm valor
prático para eles, ajudando-os na vida cotidiana a solucionar seus problemas e a
enfrentar as situações novas.

Significação
Quando o conteúdo estiver relacionado às experiências vivenciadas pelos uni-
versitários. É a ligação do conhecido e vivenciado ao desconhecido e novo que torna
o conteúdo significativo e interessante.

Flexibilidade
Quando houver possibilidade de fazer alterações nos conteúdos seleciona-
dos, a fim de reajustá-los ou adaptá-los às reais condições, necessidades e interes-
ses dos universitários.

Adequação ao nível de desenvolvimento do universitário


O conteúdo deve respeitar o grau de maturidade intelectual do universi-
tário e estar adequado ao nível de suas estruturas cognitivas. Os conteúdos a
serem assimilados devem corresponder às aprendizagens essenciais e desejáveis
­contribuindo para o desenvolvimento de suas potencialidades.

E, como organizar os conteúdos?


Os conteúdos de ensino devem apresentar uma seqüência e, também,
­reforçar-se mutuamente. Isto é conseguido pela organização do conteúdo.
A ordenação dos conteúdos é feita:
no plano temporal – dispondo os conteúdos ao longo dos períodos e/ou
séries. É a organização vertical do currículo;

88
Objetivos, conteúdos e metodologias

no plano de um mesmo período e/ou série – fazendo a relação de uma


área com a outra. É a organização horizontal do currículo.
Há três critérios básicos na organização dos conteúdos: a continuidade, a
seqüência e a integração. Além desses critérios, há dois princípios básicos que
necessitam ser considerados na ordenação dos conteúdos: o lógico (estabelecer re-
lações entre seus elementos) e o psicológico (indicar relações).
Portanto, ao organizar os conteúdos para desenvolvê-los nas aulas, cabe
ao professor:
considerar o nível de desenvolvimento dos universitários, levando em
conta suas estruturas cognitivas e as aprendizagens anteriores;
partir de situações-problema vinculadas à realidade deles;
fazer a relação dos novos conhecimentos transmitidos com as experiên-
cias anteriores dos universitários;
sistematizar as idéias principais, dando condições para que eles possam
organizar e aplicar os conhecimentos assimilados.

Metodologias
O processo de ensino se caracteriza pela combinação das atividades do
professor e dos universitários. Estes, pelo estudo das matérias de ensino, sob a
direção do professor, atingem progressivamente o desenvolvimento de suas capa-
cidades mentais.
O sucesso na direção desse processo depende do trabalho sistematizado do
professor que, tanto no planejamento como no desenvolvimento das aulas, conju-
ga objetivos, conteúdos, métodos e formas organizativas do ensino.
Os métodos são determinados pela relação entre objetivo, conteúdo e refe-
rem-se aos meios para alcançar os objetivos gerais e específicos do ensino, ou seja,
os “como” do processo de ensino, englobando as ações a serem realizadas pelo
professor e pelos universitários para atingir objetivos e conteúdos.
Assim, temos as características dos métodos de ensino:
estão orientados para objetivos;
implicam uma sucessão planejada e sistematizada de ações, tanto do pro-
fessor quanto dos universitários;
requerem a utilização de meios.
Em virtude da necessária vinculação dos métodos de ensino com os obje-
tivos, a decisão de selecioná-los e utilizá-los nas aulas universitárias depende de
uma concepção metodológica mais ampla do processo educativo.
Nesse sentido, dizer que o professor universitário “tem método” é mais do

89
Didática do Ensino Superior

que dizer que domina procedimentos e técnicas de ensino, pois o método deve
expressar, também, uma compreensão ampla do processo educativo na sociedade:
os fins sociais e pedagógicos do ensino, as exigências e desafios que a realidade
social coloca, as expectativas de formação dos universitários para que possam
­atuar na sociedade de forma crítica e criadora, as implicações da origem socioe-
conômica e cultural dos universitários no processo de aprendizagem, a relevância
social dos conteúdos e outras.

O que é método de ensino?


Método é o caminho para atingir um objetivo. No cotidiano universitário,
estamos sempre perseguindo objetivos. Mas, estes não se realizam por si mesmos,
sendo necessária a atuação do professor, ou seja, a organização de uma seqüência
de ações para atingi-los. Assim, os métodos são os meios mais adequados para
realizar objetivos. Portanto, a direção do processo de ensino e de aprendizagem
requer o conhecimento de princípios e diretrizes, métodos, procedimentos e for-
mas organizativas.
Podemos dizer, então, que os métodos de ensino são as ações do professor
pelas quais se organizam as atividades de ensino e dos universitários para atingir
objetivos do trabalho docente em relação a um conteúdo específico. Eles regulam
as formas de interação entre ensino e aprendizagem, entre professor e universitá-
rios, cujo resultado é a assimilação consciente dos conhecimentos e o desenvolvi-
mento das capacidades cognoscitivas e operativas dos universitários.
Assim, a escolha e a organização dos métodos de ensino devem correspon-
der à necessária unidade entre objetivos, conteúdos, métodos e formas de organi-
zação do ensino e às condições concretas das situações didáticas.

Classificação dos métodos de ensino


No trabalho docente, o professor universitário seleciona e organiza vários métodos de
ensino e vários procedimentos didáticos em função das características de cada disciplina.
Em seu livro, O processo didático, a professora Irene Carvalho, classifica os
métodos de ensino da seguinte maneira:
Métodos individualizados de ensino – são aqueles que valorizam o aten-
dimento às diferenças individuais e fazem a adequação do conteúdo ao
nível de maturidade, à capacidade intelectual e ao ritmo de aprendiza-
gem de cada universitário. Como por exemplo, aula expositiva, estudo
dirigido, técnica de perguntas e respostas, fichamento etc.
Métodos socializados de ensino – são os métodos que valorizam a inte-
ração social, fazendo a aprendizagem efetivar-se em grupo. Como por
exemplo, trabalho de grupo, dramatização, estudo de casos etc.
Métodos socioindividualizados de ensino – são os que combinam as duas
atividades, a individualizada e a socializada, alternando em suas fases os
aspectos individuais e sociais. Como por exemplo, método de proble-
mas, método da descoberta, método de projetos etc.
90
Objetivos, conteúdos e metodologias

Assim, o professor universitário pode utilizar os mais variados procedi-


mentos de ensino e oferecer a seus alunos as mais diversas experiências de
aprendizagem.
Algumas normas didáticas que podem nortear o trabalho docente, qualquer
que seja o procedimento de ensino adotado:
incentivar sempre a participação dos universitários, criando condições
para que eles se mantenham numa atitude reflexiva;
aproveitar as experiências anteriores dos alunos, para que eles possam
associar os novos conteúdos assimilados às suas vivências significativas;
adequar o conteúdo e a linguagem ao nível de desenvolvimento cogniti-
vo da turma;
oferecer ao aluno oportunidade de transferir e aplicar o conhecimento
aprendido a casos concretos, particulares, nas mais variadas situações;
verificar, constantemente, por intermédio da avaliação contínua, se o alu-
no assimilou e compreendeu o conteúdo desenvolvido.

Concluindo
O professor universitário deve ter, perante a didática, uma atitude crítica.
Por isso, deve refletir sobre a melhor forma de ajudar seus alunos no processo de
reconstrução do conhecimento e sobre a eficácia de sua ação didática, expressa
nos resultados da avaliação do aproveitamento do aluno. A prática pedagógica
deve ser analisada e repensada continuamente pela reflexão.

Estabeleça a metodologia e os recursos auxiliares do seu programa de ­disciplina.

Técnica de ensino em grupo


Técnica de simpósio
Um exemplo de técnica de trabalho para grandes grupos é a técnica de sim-
pósio. Simpósio é uma reunião de pequenas palestras, discursos ou preleções sobre
vários aspectos de um só assunto. A técnica do simpósio não envolve a apresentação
de vários temas, e sim um tema central sob diversos ângulos ou posições. O simpó-
sio, portanto, é uma técnica que envolve “apresentação” e não permite debates.
A técnica de simpósio envolve:
um grande grupo, que assiste à apresentação;
um pequeno grupo, que apresenta o assunto.
91
Didática do Ensino Superior

O pequeno grupo reúne-se com antecedência para esquematizar a apresen-


tação, garantir o fracionamento lógico do conteúdo. A duração adequada para
cada apresentação não deve ultrapassar 20 minutos, e o simpósio geralmente não
vai além de uma hora e meia. Esta reunião é coordenada por um dos elementos do
pequeno grupo que coordenará todo o desenvolvimento do simpósio. Este elemen-
to do pequeno grupo recebe o nome de simposiarca (que coordena o simpósio).
Os elementos do pequeno grupo coordenados pelo simposiarca são chamados de
simposiastas. Ao final da apresentação pelos simposiastas, o simposiarca resume
as idéias apresentadas.
O grande grupo participa do simpósio redigindo e encaminhando pergun-
tas à mesa ao final das apresentações.
O simposiarca, ainda, analisa e encaminha aos simposiastas as perguntas
redigidas pelo grande grupo.
Resumindo, são funções do simposiarca:
coordenar o simpósio;
resumir as apresentações;
analisar e encaminhar as questões do grande grupo aos simposiastas.
É interessante usar o método do simpósio para:
apresentar informações básicas, fatos ou pontos de vista;
permitir uma exposição relativamente completa, sistemática e ininter-
rupta das idéias;
dividir um assunto (problema relativamente complexo) de acordo com:
suas partes componentes lógicas;
diferentes pontos de vista e interesses especiais;
propostas de outras soluções e suas conseqüências.
A interação entre os participantes é mínima. O interesse e a participação da
audiência dependem da força de empatia do orador e de seu domínio do assunto.
Daí, a limitação da técnica.

Técnica painel
Entre as técnicas para grandes grupos, destaca-se a de painel, que é a técni-
ca da “mesa redonda” desenvolvida em uma situação de auditório.
Uma das características da técnica de painel é a discussão informal perante
um grande grupo. Então, a técnica de painel se caracteriza por um pequeno grupo
de pessoas que mantém uma discussão informal perante um grande grupo.
Estas são as principais características da técnica de painel. Se estabelecês-
semos uma relação com a técnica de simpósio, constataríamos que são técnicas
muito semelhantes. Por exemplo, o simpósio se caracteriza por uma apresentação
do tema, o painel por uma discussão informal sobre o tema.

92
Objetivos, conteúdos e metodologias

Na técnica de painel, há um elemento que corresponde funcionalmente ao


simposiarca, que é chamado de moderador. Nesta mesma técnica, após as discus-
sões, o grande grupo dirige perguntas por escrito à mesa.
Finalmente, tanto na técnica de painel como na de simpósio, não é necessá-
rio chegar a uma conclusão.
A técnica de painel auxilia o grupo a enfrentar um assunto muito contro-
vertido.
Os participantes expõem e focalizam pontos de vista, fatos e atitudes dife-
rentes sobre um assunto, envolvendo o grupo na busca de soluções.
O método é útil quando a heterogeneidade é tal, que se torna aconselhável a
apresentação de diferentes pontos de vista e de fatos relativos ao assunto.

Recursos auxiliares
Recursos auxiliares são todas as modalidades que o professor utilizará du-
rante as atividades do semestre letivo. Textos, livros, apostilas, cartazes, transpa-
rências, computador e softwares educativos, quadros-de-giz e quadro branco, são
alguns dos recursos auxiliares mais usados pelos professores. A sua voz, profes-
sor, é o mais importante deles. Cuide bem dela!

Bibliografia
É necessária a organização de duas bibliografias: uma para o aluno e outra para
o professor. Na do professor, incluem-se os textos que serão usados, os exercícios,
número das páginas etc. A bibliografia deve ser redigida corretamente, seguindo as
Normas Técnicas vigentes da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

O trabalho interdisciplinar
no Ensino Superior
O trabalho interdisciplinar no Ensino Superior pode ocorrer e se concretizar:
em sala de aula, em disciplina isolada, no instante em que o professor liga
os conteúdos específicos que está lecionando a uma gama de tantos outros
conteúdos que os complementam dentro e fora do universo escolar;
por meio da disposição de concretizar os conteúdos aprendidos no
­cotidiano profissional;
pela oposição às fronteiras estabelecidas e consagradas – níveis de ensi-
no, tipos de escola etc.;
por meio da predisposição dos professores a ensinar a seus alunos a
aprender o que vem a ser pesquisa;
pelo desenvolvimento de exercícios constantes de pesquisa – questionar,
responder, avaliar.

93
Didática do Ensino Superior

A interdisciplinaridade, como afirma Fazenda (1991, p. 39), “depende, então,


basicamente de uma mudança de atitude perante o problema do conhecimento, da
substituição de uma concepção fragmentária pela unitária do ser humano”.
O que se quer, ao abraçar a atitude interdisciplinar, é se ter a visão total de
homem – por meio da conexão dos conteúdos e da aplicação destes em situações
concretas do cotidiano.
Esta atitude deve ser cultivada desde as séries iniciais da escolaridade, con-
cordando-se com Fazenda (1991, p. 111), quando afirma:
...outra questão que se põe à universidade é a superação da dicotomia ensino-pesquisa. Há
necessidade de transformar desde as séries iniciais dos cursos de graduação, em locais de
pesquisa e que não fique reservada apenas à pós-graduação.

Problemas da implantação da interdisciplinaridade no Ensino Superior:


falta de metodologia para o trabalho do grupo;
ausência de objetivos comuns ao grupo e de diagnóstico para a institui-
ção e para os discentes;
preconceito quanto à integração;
carência de projeto de trabalho coletivo na instituição;
ausência de coordenação adequada;
individualismo docente;
resistências à mudança;
desconhecimento do que é trabalho interdisciplinar;
carência de capacitação docente;
falta de divulgação de trabalhos interdisciplinares em andamento.



Pesquisa e comunicação.

1. Divididos em grupos, entrevistem três professores universitários para saber:


a) por que a definição dos objetivos de ensino é tão importante?

94
Objetivos, conteúdos e metodologias

b) como você ministra suas aulas, geralmente?

c) quais as principais limitações que você encontra para a utilização de métodos socializados
de ensino?

95
Didática do Ensino Superior

2. Após as entrevistas, cada grupo deverá apresentar uma síntese conclusiva das respostas aos
demais colegas e ao professor.

96
Repensando a aula
universitária no dia-a-dia

Introdução

N
as instituições de Ensino Superior, a técnica mais tradicional de ensino é a técnica expositiva
ou aula expositiva, que consiste na apresentação de um tema logicamente estruturado.
A aula é a forma predominante de organização do processo de ensino. Na aula, criam-
se e transformam-se as condições necessárias para que os universitários assimilem conhecimentos,
­habilidades, atitudes e convicções e, assim, desenvolvam suas capacidades.
Devemos entender a aula como o conjunto dos meios e condições pelos quais o professor di-
rige e estimula o processo de ensino e aprendizagem em funções da atividade própria do aluno no
processo de aprendizagem escolar, ou seja, a assimilação consciente dos conteúdos. Isto quer dizer
que o processo de ensino, por meio das aulas, possibilita o encontro dos alunos e a matéria de ensino,
preparada didaticamente no plano de ensino e nos planos de aula.
Mesmo que a aula expositiva possa ser empregada para atingir uma ampla gama de objetivos
educacionais, normalmente está voltada à transmissão de conhecimentos. Buscando, fundamental-
mente, a aquisição e compreensão de novos conhecimentos por parte dos alunos, ela tem sido fre-
qüentemente criticada por estimular situações que favorecem aprendizagens do tipo reprodutiva, uma
vez que, na exposição, o conteúdo daquilo que deverá ser aprendido é apresentado ao universitário na
sua forma final.
Assim, o aluno fica privado do exercício das habilidades intelectuais mais complexas, como
aplicação, análise, síntese e julgamento. Estas e outras críticas têm sido dirigidas à aula expositiva,
considerada por muitos como uma forma excessivamente passiva e tradicional de ensino. No entanto,
acreditamos que um exame cuidadoso desta técnica poderá esclarecer melhor o seu papel no Ensino
Superior. Será que num paradigma que valoriza a aprendizagem essa técnica ainda tem lugar?
Como a aula expositiva é a mais utilizada pelo professor universitário, a maneira de utilizá-la,
no entanto, deve ser adequada às novas exigências do ensino.

O que é aula expositiva?


A aula expositiva é entendida como um tempo de ensino ocupado inteiramente ou ­principalmente
pela exposição contínua do professor universitário.
Ao utilizar essa técnica de ensino, o professor pode assumir duas posições:
posição dogmática – é a posição em que a mensagem transmitida não pode ser contestada,
devendo ser aceita sem discussão e com obrigação de repeti-la;
Didática do Ensino Superior

posição do diálogo – a mensagem apresentada é simples pretexto para


desencadear a participação dos universitários, podendo haver discussão,
contestação e pesquisa, sempre que oportuno e necessário.
Hoje, a aula expositiva só é viável quando o professor universitário assume
a posição de diálogo, pois, na exposição aberta ou dialogada, o professor dialoga
com a turma, ouvindo o que o aluno tem a dizer, fazendo perguntas e respondendo
às dúvidas dos alunos. Portanto, na exposição dialogada, o aluno desempenha um
papel mais ativo, pois participa da aula do professor, fazendo comentários, relatan-
do fatos, dando exemplos, argumentando, expondo suas dúvidas e respondendo
perguntas. A aula expositiva, quando dialogada, favorece a participação dos alunos
e estimula sua atividade reflexiva.

Como utilizar uma aula expositiva?


Assim, para que a aula expositiva preencha os requisitos de uma boa expo-
sição didática, recomenda-se que o professor prepare a aula com antecedência,
considerando as características dos alunos e adaptando a aula ao seu grau de de-
senvolvimento.
Ao planejar a exposição, o professor deve:
estabelecer com clareza os objetivos da exposição;
planejar a seqüência dos tópicos que constituirão a exposição;
procurar manter os alunos em atitude reflexiva, propondo, de tempo em
tempo, questões que exijam raciocínio, com apresentação de situações
problemáticas, relacionadas ao tema;
dar certo “colorido” emocional à exposição;
utilizar gráficos, gravuras ou painéis que melhor ilustrem o tema apresentado;
promover exercícios rápidos e objetivos;
efetuar revisões das noções apresentadas para facilitar a compreensão de outras
questões que virão;
explorar as vivências dos alunos para enriquecer ou comprovar a exposição;
observar, durante o desenvolvimento da aula, todos os alunos;
ficar visível para toda a turma e movimentar-se durante a aula.

Vantagens e limitações da aula expositiva


Uma série de argumentos a favor da aula expositiva tem sido apresentada
pelos professores e discutida pelos estudiosos do assunto.

98
Repensando a aula universitária no dia-a-dia

Segundo Barcells e Martin (1985), tais argumentos podem ser assim resu-
midos nos seguintes aspectos:
polpa tempo dos professores, uma vez que é de fácil preparo, possibili-
tando, em um tempo curto, a transmissão de muitas informações;
oferece aos alunos uma primeira e sintética explicação acerca de um
novo conhecimento;
apresenta visão mais equilibrada quando o tema é polêmico;
oferece a possibilidade de o aluno ser motivado pelo professor, que já
possui um profundo conhecimento sobre a matéria.
Quanto às limitações, as mais apontadas, segundo Godoy (1988), são:
pouca participação do aluno em função da comunicação, unilateral, ca-
racterística desta técnica de ensino;
considera a turma como um grupo uniforme, não levando em conta o fato
de que os alunos possuem estilos de aprendizagem diferenciados;
desconhece que muitos alunos não possuem conhecimentos prévios;
não favorece o desenvolvimento das habilidades intelectuais mais com-
plexas (aplicação, análise, síntese e julgamento) que levem o aluno a
pensar sobre o assunto;
não possibilita que o professor realize a função de avaliação,
­acompanhando a aprendizagem do aluno.
Certamente, para que possamos tirar o máximo de proveito das vantagens
apontadas e minimizar as limitações, é necessário que o professor prepare e de-
senvolva suas aulas expositivas de forma adequada.
Para tal, apresentamos, a seguir, algumas sugestões que poderão auxiliar o
professor nesta tarefa.

Planejamento e desenvolvimento
da aula expositiva
Ao planejar uma aula expositiva, o professor universitário deve observar os
seguintes pontos:
dominar a matéria de ensino;
levar em conta o tipo de auditório a quem o expositor se dirigirá;
prever um começo (introdução), um núcleo (desenvolvimento) e um final
(conclusão);
planejar a estrutura da aula definindo exatamente o que o professor pre-
tende dar a conhecer à turma;

99
Didática do Ensino Superior

ressalta-se o uso de apontamentos, mesmo que a aula expositiva pos-


sa ser dada a partir de anotações elaboradas previamente, o professor
­precisa ter cautela;
destaca que o professor não deve perder de vista que ele está trabalhando
principalmente com a comunicação oral;
considerar a duração da aula expositiva;
definir os recursos didáticos bem relacionados aos objetivos da aula a
serem utilizados corretamente.

Desenvolvendo uma aula expositiva


É possível dizer que toda aula expositiva possui três etapas fundamentais,
conforme apresentaremos abaixo.

Primeira etapa – Introdução da aula


Etapa que se caracteriza pela preparação do aluno para o assunto – apresen-
tação dos objetivos da aula, relacionando-os ao conteúdo que será desenvolvido
na apresentação de seus aspectos essenciais –, e também é o momento em que o
professor procurará captar a atenção dos alunos, motivando-os para o que virá a
seguir.

Segunda etapa – Desenvolvimento da aula


Essa etapa envolve aquele espaço de tempo no qual o professor estará pre-
ocupado com a orientação da aprendizagem dos alunos. Para boa seqüência da
aula, o conteúdo deve ser discriminado, pelo professor, em suas partes essenciais
– princípios básicos e fundamentais, conceitos-chave, fatos específicos e exem-
plos concretos. O uso de recursos didáticos possibilita que o aluno perceba, com
mais facilidade, as relações entre os vários tópicos do conteúdo.

Terceira etapa – Conclusão


É preciso consolidar a aprendizagem supostamente adquirida. O fechamen-
to ou conclusão da aula pode ser feito por meio de tarefas de revisão, ­aplicações
ou extensão.

Repensando a aula universitária


Hoje, há um consenso de que “aprender a aprender” é o papel mais impor-
tante de qualquer instituição educacional.
O que me parece imprescindível destacar é que “aprender a aprender” é mais
do que uma técnica de como se faz. É a capacidade de o universitário refletir sobre
a sua própria experiência de aprender, identificar os procedimentos necessários
para aprender, nas melhores escolhas, suas potencialidades e suas limitações.

100
Repensando a aula universitária no dia-a-dia

Para repensar nossas aulas universitárias, não podemos deixar de refletir,


analisar e discutir o paradigma que as orientará.
Para iniciar, podemos aprofundar um pouquinho as questões a respeito do
“espaço aula” e as diferentes atividades que poderemos realizar para modificá-lo.

Conceito de sala de aula universitária


Podemos destacar dois paradigmas: tradicional e atual.

Paradigma tradicional
A sala de aula dos cursos de graduação de Ensino Superior se constitui
como um espaço físico e um tempo determinado durante o qual o professor uni-
versitário transmite seus conhecimentos e experiências aos universitários.
Podemos dizer que se trata de um tempo e espaço privilegiados para uma
ação do professor, cabendo aos universitários atividades como:
copiar a matéria;
ouvir as preleções do mestre;
fazer perguntas, às vezes;
repetir o que mestre ensinou, na maioria das vezes.
Temos, também, as aulas práticas, ora demonstrativas, quando o profes-
sor assume o papel de mostrar o fenômeno, ora de aplicação de conceitos apren-
didos nas aulas teóricas nos laboratórios ou em estágios. As aulas práticas são
mais raras.

Paradigma atual
Esse conceito de aula universitária faz com que ela transcenda seu espaço
corriqueiro e habitual de acontecer só na universidade. Compreender a aula uni-
versitária como espaço e tempo de aprendizagem por parte do universitário muda
completamente esse paradigma.
É preciso compreender que onde quer que possa haver uma aprendizagem
significativa buscando intencionalmente objetivos definidos, aí encontramos uma
“aula universitária”.
Assim, a sala de aula é espaço e tempo durante o qual os sujeitos de um
processo de aprendizagem (docentes e universitários) se encontram para, juntos,
realizarem uma série de ações (interações), como estudar, ler, discutir, debater,
ouvir o professor, consultar e trabalhar na biblioteca, redigir trabalhos, participar
de eventos científicos de sua área, solucionar dúvidas, orientar trabalhos de inves-
tigação e pesquisa, desenvolver diferentes formas de expressão e comunicação,
realizar oficinas e trabalhos de campo.

101
Didática do Ensino Superior

Nesse contexto, tão importante quanto a sala de aula, onde se ministram au-
las teóricas na universidade, e os laboratórios, onde se realizam as aulas práticas,
são os outros locais onde se realizam as atividades profissionais daquele universi-
tário: empresas, fábricas, escolas, postos de saúde, fóruns, escritórios de adminis-
tração e contabilidade, hospital, escritórios de advocacia, casas de detenção, can-
teiros de obras, plantações, hortas, pomares, organizações não-governamentais,
movimentos sociais, laboratórios de informática, exploração na internet, institui-
ções públicas e privadas, ambulatórios, clínicas, congressos, seminários e outros.
Esses “novos espaços e tempos de aula universitária” são muito mais esti-
mulantes na aprendizagem dos universitários, mais instigantes para o exercício da
docência superior porque envolvem a realidade profissional de ambos e como tal
se apresenta complexa.

Como substituir o paradigma


de ênfase no ensino pela ênfase
na aprendizagem?
Não se trata de o professor universitário utilizar apenas uma troca. Estamos
falando do paradigma que se volta para o desenvolvimento da aprendizagem e
conceber a aula universitária em seu novo espaço e tempo, aponta para novos
caminhos, novos desafios.
Penso que é importante enfrentar o desafio e procurar responder na univer-
sidade às questões relacionadas ao universitário e à docência universitária.

Universitário
Desenvolvimento de suas capacidades intelectuais – de pensar, de racio-
cinar, de refletir, de buscar informações, de analisar, de criticar, de argu-
mentar, de dar significado real às novas informações, de relacioná-las, de
pesquisá-las e de reproduzir conhecimentos.
Desenvolvimento de habilidades humanas e profissionais – trabalhar em
equipe, buscar novas fontes e pesquisas, dialogar com profissionais de
outras áreas, comunicar-se com pequenos e grandes grupos e apresentar
trabalhos.
Desenvolvimento de atitudes e valores integrantes à vida profissional – a
busca de soluções técnicas que, juntamente com o aspecto tecnológico,
contemplam o contexto da população, o meio ambiente, as necessidades
da comunidade, as condições culturais, políticas e econômicas da socie-
dade, os princípios éticos na condução de sua atividade profissional.
Pretendemos formar um profissional não apenas competente, mas também
comprometido com a sociedade em que vive.

102
Repensando a aula universitária no dia-a-dia

Docência universitária
Na universidade, no que diz respeito à docência superior:

Como colocar na prática o novo


paradigma da aula universitária no dia-a-dia?
Masetto (2003, p. 90-107), quando trata da “Docência universitária: repen-
sando a aula”, aponta alguns caminhos para a transformação e novo paradigma
das aulas universitárias:
Ao iniciar, o professor deve apresentar seu plano de trabalho.

103
Didática do Ensino Superior

Organizar a seqüência de uma aula que coloque o universitário e o pro-


fessor trabalhando juntos durante o tempo de aula e em tempo extraclas-
se (de que forma?).
Indicar leituras individuais.
Utilizar a aula expositiva como técnica.
Aplicar técnicas de dinâmica de grupo.
Utilização da mídia eletrônica.
Utilizar situações reais de atuação profissional.
Definir um processo de avaliação como uma atividade de verificar o que
foi aprendido e fazer o julgamento dos resultados.

Concluindo
A aula universitária então passa a ser, também, um espaço de avaliação, ou
seja, um espaço para o diagnóstico da aprendizagem, bem como de diálogo, dis-
cussões e sugestões para o seu desenvolvimento.
Pensar e repensar a docência universitária focalizada na transformação da aula
no Ensino Superior, produz reflexões que apontam para a necessidade de ­substituir
o paradigma de ensino por um “novo paradigma” que permita e dê fundamentação
às inovações que queremos fazer em nossas aulas.
Só a partir dessa concepção de aula universitária é que poderemos falar
em mudança, em dinamizar as aulas, em tornar nossas aulas “vivas”, em fazer
das aulas um espaço privilegiado de aprendizagem, de formação de profissionais
competentes, compromissados e cidadãos.

1. Situação-problema – a postura do professor universitário

Uma das qualidades indispensáveis a um docente, seja ele de que grau for, é a de ser um bom
ouvinte. Leia o texto abaixo e resolva a tarefa proposta.

Telefone
Michel Quoist

Pronto, desliguei! Mas por que terá telefonado?


Ah! Sim, senhor... eu já me lembro.

104
Repensando a aula universitária no dia-a-dia

É que falei demais e bem pouco escutei.


Perdão, senhor, recitei um monólogo e não dialoguei.
Impus minha opinião e não troquei idéias.
Por não ter escutado, eu nada aprendi,
por não ter escutado, nada levei comigo,
por não ter escutado, eu não comunguei.
Perdão, senhor, eu estava em comunicação.
E agora estamos cortados.

Após a leitura do texto Telefone, estabeleça as qualidades de um professor que é um bom ouvin-
te. Você também pode analisar os itens abaixo para embasar sua resposta.
Um bom ouvinte é capaz de:
questionar construtivamente;
controlar as ansiedades pessoais em prol dos componentes do grupo a que pertence;
prestar atenção ao que os outros dizem e/ou propõem;
levar as opiniões de seus colegas a sério;
simplesmente não complicar;
fazer ligações entre as contribuições dos que o cercam e/ou convivem com ele;
dar feedback sempre.
O texto desta tarefa deve conter:
análise minuciosa do texto Telefone;
comentário dos itens incluídos para aprofundamento;
ligação entre o texto e os itens que caracterizam um professor bom ouvinte;
ilustração com relatos de experiências (opcional).

105
Didática do Ensino Superior

2. Atividade individual.
a) Leia o capítulo “Docência universitária” do livro Ensinar e aprender no Ensino Superior:
por uma epistemologia da curiosidade na formação universitária, de António Teodoro e
Maria Lucia Vasconcelos.
Após a leitura, analise como organizar a seqüência de uma aula que coloque o universitário e o
professor trabalhando juntos durante o tempo da aula.

3. Atividade em grupo.
Discutam e apresentem as respostas, tirando conclusões.

106
Avaliação da aprendizagem:
avaliar não é o que muita
gente pensa

Introdução

É
colega. Chegamos ao ponto mais delicado do planejamento de ensino – a avaliação. Mas, antes
de escolher o seu paradigma avaliativo, leia atentamente o texto Aprendendo a pensar (ou de
como avaliar as idéias dos outros). Faça uma auto-avaliação: pense na maneira pela qual você
vem desempenhando suas tarefas de avaliador(a).

Aprendendo a pensar
(ou como avaliar as idéias dos outros)
Observe as cinco figuras e selecione a que for diferente das demais.

a) b)

c) d)

e)
Didática do Ensino Superior

Onde se aprende a pensar? Uma fonte importante são os estudos formais


na escola. Através da educação, você aprende o que é adequado e o que não
é. Aprende muitas perguntas para sondar o ambiente. Aprende onde buscar
informação, a que tipo de idéias, prestar atenção e como pensar sobre elas. Em
suma, seu treinamento educacional fornece muitos dos conceitos que você usa
para ordenar e compreender o mundo.
(E você, professor, está preparado para ajudar seus alunos? Você foi trei-
nado a discernir as variadas facetas das variadas formas que seus alunos po-
dem apresentar ao expressar seu conhecimento sobre um tópico de conteúdo?
Como você age? De forma radical, como um “policial da aprendizagem” ou
estuda as outras maneiras de avaliar? Qual a sua posição a respeito?)
E por falar em educação, como você se saiu no exercício das cinco figuras
da página anterior? Se apontou a figura “b”, parabéns, você escolheu a respos-
ta certa. A figura “b” é a única que só tem linhas retas. Cumprimente-se com
uma palmadinha nas costas.
Pode ser, porém, que você tenha escolhido a figura “c”, por ser a única as-
simétrica. Se for isso, você também está certo. “c” é a resposta certa. A figura
“a” também é defensável, pois é a única sem pontos de ruptura. Portanto, “a”
também é a resposta certa. E que tal a “d”? Só ela tem uma linha curva e uma
linha reta. Portanto, “d” também é a resposta certa. E a figura “e”? Entre ou-
tras coisas, ela é a única que parece a projeção de um triângulo não-euclidiano
sobre o espaço euclidiano. Também é a resposta certa. Em outras palavras,
todas são certas, dependendo do ponto de vista.
Quase todo o nosso sistema educacional, porém, objetiva ensinar as pes-
soas uma única resposta certa. Na época em que a média das pessoas termi-
nam a faculdade, o rapaz ou a moça terá feito mais de 2.600 testes, exames e
provas muito semelhantes ao exercício que você acaba de fazer. É desse modo
que a abordagem da “resposta certa” fica profundamente enraizada em nossa
maneira de pensar. Isso pode ser ótimo em alguns problemas de matemática,
que realmente só têm uma resposta certa. O problema é que a vida geralmente
não é assim. A vida é ambígua. Nela, existem muitas respostas certas – e to-
das dependem do que você está procurando. Mas se pensar que só existe uma
resposta correta, é obvio que você vai parar de procurar outras e, portanto, só
vai encontrar uma.
(Autor desconhecido – trechos entre parênteses, adaptados para este estudo)

Se aplicarmos este texto ao seu cotidiano docente, você delinearia a sua


ação avaliativa? Será que não está faltando uma parada para questionar outra(s)
forma(s) de avaliação? Você tem duas opções: (a) adotar ou continuar adotando
uma postura tradicional, na qual o “certo e o errado” é o paradigma; ou (b) optar
por uma postura mais flexível, por meio do estudo de outra(s) teoria(s) avaliativa.
Leia com atenção o texto O círculo amplia-se, de Jussara Hoffman. Ele lhe mos-
trará uma outra visão da avaliação no Ensino Superior, pelo relato de uma experi-
ência. Leia, discuta e tente chegar a um paradigma para avaliar seus alunos.
108
Avaliação da aprendizagem: avaliar não é o que muita gente pensa

1. Definido o paradigma de avaliação, estabeleça, em seu programa de disciplina, como vocês


avaliarão seus alunos no semestre letivo.

Um momento de auto-avaliação
É uma grande responsabilidade selecionar e reunir itens de conteúdos para transmiti-los a
outros professores; missão árdua, mas desafiadora. A este respeito, só tenho uma certeza: tentarei
buscar o melhor. Nesta busca seletiva, surge o texto de Sant’Anna, que bem define aquele que vive
na “corda bamba” do conhecimento: equilibra, desequilibra, equilibra...

Desaprendendo a lição
Affonso Romano de Sant’Anna
“Há uma idade em que se ensina o que se sabe, mas em seguida vem outra idade em que se
ensina o que não sabe”. Esta frase de Roland Barthes é instigante. Desmistifica a prática usual
do ensino. Por isto, ele continua seu pensamento afirmando que é preciso “desaprender”, “deixar
trabalhar o imprevisível” até que surja a chamada “sapiência” uma sensação de “nenhum poder”,
“um pouco de saber”, mas com “o maior sabor possível”.
E num seminário em Paris praticando a errância do saber, propôs aos alunos que o encontro na
classe não tivesse tema predeterminado. O desejo inconsciente do saber é que deveria aflorar o tema.
Ali os alunos deveriam não apenas desejar, mas saber desejar. Desejar o saber é uma primeira etapa,
mas saber desejar é refinada atitude. Entre um e outro vai a distância do canibal ao gourmet.
Como derivação das colocações de Barthes se poderia dizer: o professor pensa ensinar o que
sabe, o que recolheu nos livros e na vida. Mas o aluno aprende do professor não necessariamente
o que o outro quer ensinar, mas aquilo que quer aprender. Assim o aluno pode aprender o avesso
ou o diferente do que o professor ensinou. Ou aquilo que o mestre nem sabe que ensinou, mas o
aluno reteve. O professor, por isso, ensina também o que não quer, algo de que não se dá conta e
passa silenciosamente pelos gestos e paredes da sala.
É, aliás, a mesma história que se dá com o texto. O autor se propõe a dizer uma coisa, mas
o leitor constrói sua leitura segundo suas carências e iluminações. Por isto se equivocou Jacques
Derridá ao dizer que o texto escrito segue livre sem paternidade, enquanto o discurso oral é tute-
lado pelo orador. O orador também não controla seu discurso, pelo simples fato de estar presente.
A palavra ao ser pronunciada já não nos pertence. O orador é falado pelo seu discurso. Fala-se o
que se pensa que se sabe, ouve-se o que se pensa que foi pronunciado. O sentido é construído a
muitas vozes e ouvidos, harmonicamente. Tinha razão o polifônico Sócrates: “a verdade não está
com os homens, mas entre os homens”.
Repitamos a frase de Barthes: “Há uma idade em que se ensina o que se sabe, mas em seguida
vem outra idade em que se ensina o que não se sabe”.
E adicionamos o seguinte raciocínio: em geral pensa-se que professor é aquele que “fala”, que
preenche com seu encachoeirado discurso uma aula de 50 minutos ou um seminário de três horas.
Este é um conceito de ensino como uma atividade “oracular” da parte do mestre, que se comple-
menta numa passividade “auricular” da parte do aluno. Contudo, assim como o espaço em branco

109
Didática do Ensino Superior

é importante no poema, assim como a pausa organiza a música, o saber pode brotar do silêncio.
O jorro contínuo de palavras pode ostentar apenas ansiedade. O conhecimento pode se ins-
talar no entreato. O silêncio também fala. É isto que se aprende durante as ditaduras. E, por outro
lado, durante as democracias se aprende que o discurso nem sempre diz.
Portanto, à audácia de desaprender o aprendido, soma-se astúcia do silêncio. No princípio era
o Verbo. A construção do silêncio exige muitas palavras. O escritor, por exemplo, constrói uma
casa de palavras para ouvir seu silêncio interior.
Comecei falando em Barthes. E aquela frase inicial dele remete não só para a questão do
“saber” e do “sabor”, mas do “saber” e do “poder”. Assim o melhor professor seria aquele que não
detém o poder nem o saber, mas que está disposto a perder o poder, para fazer emergir o saber
múltiplo. Nesse caso, perder é uma forma de ganhar, e o saber é recomeçar.
E para terminar, nada melhor que uma frase de outro desconstrutor de verdades, que é Gui-
marães Rosa: “Mestre não é quem ensina, mas aquele que, de repente, aprende”.

2. E você, professor onde se insere? Faça uma rápida auto-avalição antes de ­continuar o seu estu-
do. Se possível debata com seus colegas as idéias-chave do texto. A ­seguir, enumere as caracte-
rísticas básicas indispensáveis à composição do perfil de um bom professor universitário.

110
Avaliação da aprendizagem: avaliar não é o que muita gente pensa

O que faz um professor universitário


em sua atividade profissional no dia-a-dia?
Preparar e ministrar aulas, preparar e corrigir provas, na verdade, pode ilu-
dir o professor, tornando-se um pseudo-sucesso quando:
o universitário apenas repete o que o professor ensina;
o universitário obtém notas nas provas;
o professor universitário fala sem parar, e o universitário anota para re-
produzir.
Para Vasco Moretto (2002, p.16-18), o real sucesso no ensinar acontece quando:
o professor atinge os objetivos de ensinar, oportunizando a aprendiza-
gem significativa de conteúdos relevantes;
o ensino proporciona o desenvolvimento de habilidades e aquisição de
conhecimentos que conduzem às competências almejadas.
Interpretando seu pensamento, é preciso que o professor universitário:
estabeleça claramente seus objetivos ao preparar suas aulas;
compreenda que é de fundamental importância o estabelecimento dos
objetivos para que os conteúdos e as estratégias de ensino sejam ade-
quadamente escolhidos e para que o processo de ensinar seja sempre
reavaliado;
entenda que aprender significativamente é dar sentido à linguagem que
usamos, é relacionar o conhecimento elaborado com os fatos do dia-a-
­dia, vividos pelo sujeito da aprendizagem (o aluno).
As diretrizes curriculares nacionais para os cursos de graduação indicam
mudanças na intervenção pedagógica e, em conseqüência, mudança de meios para
alcançar objetivos do ensino.
Se a instituição de Ensino Superior se servir dos conteúdos selecionados para
desenvolver a capacidade de pensar e as habilidades de observar, relacionar, criticar,
inferir, entre outras, estará preparando o cidadão para o exercício de uma profissão.

O conceito de avaliação de aprendizagem


e as concepções pedagógicas
Concepção pedagógica tradicional
O termo avaliar tem sido constantemente associado a expressões como:
fazer prova;
fazer exame;
111
Didática do Ensino Superior

atribuir nota;
repetir ou passar de ano.
Essa concepção é resultado de uma concepção pedagógica ultrapassada,
mas tradicionalmente dominante. Nela, a educação é concebida como mera trans-
missão e memorização de informações prontas e o aluno é visto como um ser
passivo e receptivo. Em conseqüência, a avaliação se restringe a medir a quanti-
dade de informações obtidas.
Nessa abordagem, em que educar se confunde com informar, a avaliação
assume um caráter seletivo competitivo.

Concepção pedagógica contemporânea


Dentro de uma concepção pedagógica mais contemporânea, baseada na
Psicologia Genética, a educação é concebida como a vivência de experiências
múltiplas e variadas, tendo em vista o desenvolvimento motor, cognitivo, afetivo
e social do aluno.
Na sucessão de experiências vivenciadas, os conteúdos são os instrumentos
utilizados para ativar e mobilizar os esquemas mentais operatórios de assimilação.
Nessa abordagem, o aluno é um ser ativo e dinâmico, que participa da cons-
trução de seu próprio conhecimento.
Dentro dessa visão, em que educar é formar e aprender, é construir o pró-
prio saber, a avaliação assume dimensões mais abrangentes. Ela não se reduz
apenas à atribuição de notas. Sua conotação se amplia e se desloca, no sentido de
verificar em que medida os alunos estão alcançando os objetivos propostos para o
processo ensino-aprendizagem. Tais objetivos se traduzem em:
mudanças;
aquisição de comportamentos motores, afetivos e sociais.
Se o ato de ensinar e aprender consiste em tentar realizar esses objetivos, o
ato de avaliar consiste em verificar se eles estão sendo realmente atingidos e em
que grau se dá essa consecução para ajudar o aluno a avançar na aprendizagem
e na construção de seu saber. Nessa perspectiva, a avaliação assume um sentido
orientador e cooperativo.
A educação contemporânea não mudou apenas os métodos de ensino, que se
tornaram ativos, mas influiu também sobre a concepção de avaliação.

Ontem
A avaliação tinha um caráter seletivo, uma vez que era vista apenas como
uma forma de classificar e promover o aluno de uma série para outra ou de um
nível para outro.

Hoje
A avaliação assume novas funções, pois é um meio de diagnosticar e
112
Avaliação da aprendizagem: avaliar não é o que muita gente pensa

de verificar em que medidas os objetivos propostos para o processo ensino-


a­ prendizagem estão sendo atingidos.
Assim, a avaliação assume uma dimensão orientadora, pois permite que o
aluno tome consciência de seus avanços e dificuldades, para continuar ­progredindo
na construção do conhecimento.
Como podemos observar, o conceito de avaliação da aprendizagem está
ligado a uma concepção pedagógica mais ampla, isto é, a uma visão de educação.
Portanto, ele depende da postura filosófica adotada pelo professor universitário.
Além disso, a forma de encarar e realizar a avaliação reflete a atitude do professor
em sua interação com a classe, bem como suas relações com o aluno.
Por exemplo, um professor autoritário e inseguro poderá ver na avaliação
uma arma de tortura ou punição para o aluno.
Como outro exemplo, temos um professor, profissional comprometido, se-
guro de sua prática docente (que orienta as atividades de aprendizagem dos alu-
nos, colaborando com eles na construção do conhecimento), que tenderá a encarar
a avaliação como uma forma de diagnóstico dos avanços e dificuldades dos alunos
e como indicador para o replanejamento de seu trabalho docente.
Nessa perspectiva, a avaliação ajuda o aluno a progredir na aprendizagem,
e o professor a aperfeiçoar sua prática pedagógica.

Ensino para competências


No dia-a-dia, utilizamos expressões como:
Vou procurar um médico, mas quero que seja competente.
João é um engenheiro competente.
Andréa é uma aluna competente.
Parece claro que, na linguagem do senso comum, a competência está
­associada a um conjunto de elementos que permitam a um sujeito abordar uma
situação ­complexa e resolvê-la.
Nessa linha de pensamento, conceituaremos competência na educação no
contexto escolar, segundo proposta de Perrenoud.
Competência é a capacidade do sujeito mobilizar recursos, visando abordar uma
situação complexa.
O conceito relaciona três aspectos importantes a serem observados pelo pro-
fessor universitário:
atender a competência como uma capacidade do sujeito: “ser capaz de”;
ligado ao verbo mobilizar, que significa movimentar com força interior, o que
é diferente de apenas deslocar, que seria transferir de um lado para o outro;
está ligado à palavra recursos; a competência exige além dos conheci-
mentos intelectuais, recursos do domínio emocional.
113
Didática do Ensino Superior

Recursos disponíveis para mobilização ao abordar uma situação complexa:


conteúdos específicos;
habilidades e procedimentos;
linguagens;
valores culturais;
administração das emoções.

O professor competente no ensinar


Aplicando o conceito de competência aqui desenvolvido, apresentamos as
características de um professor competente no ensinar:
conhece o conteúdo específico de sua disciplina – sabe identificar os
­assuntos relevantes e estabelece relações significativas entre sua disci-
plina e outras;
tem habilidade no ensinar – o professor sabe administrar uma aula, esco-
lhe estratégias adequadas para os alunos e sabe utilizar constantemente o
método dialético no processo de interação;
identifica valores culturais ligados ao ensinar – esses valores constituem
elementos de um paradigma da instituição educativa que se estabelece ao
longo dos tempos, num determinado contexto cultural;
utiliza linguagem pertinente – o professor utiliza a linguagem adequa-
da para facilitar a construção de relações significativas por parte dos
alunos;
administra as emoções – o professor administra as emoções sem precisar
apelar para a punição, estabelecendo limites e possibilidades.

O professor competente no avaliar


Vasco Moretto (2002, p. 31-33) destaca os componentes que caracterizam o
professor competente no avaliar.
Sabe que a prova é um momento privilegiado de estudo e não de um
acerto de contas – o professor precisa, então, conhecer os diferentes ins-
trumentos para avaliar e da melhor maneira utilizá-los.
Elabora bem as questões da prova – elaborar bem as questões é saber
contextualizar de acordo com os objetivos estabelecidos; é perguntar de
forma clara e precisa; questionar apenas conteúdos relevantes, e não co-
locar “pegadinhas” para derrubar o aluno.
Administra valores culturais ligados à avaliação – o professor com-
petente precisa ter mais recursos para abordar uma situação complexa.
­Durante anos, foram construídos vários mitos sobre a avaliação, espe-
cialmente, sobre o conceito de prova:

114
Avaliação da aprendizagem: avaliar não é o que muita gente pensa

só se estuda se tiver prova;


só se estuda para a prova;
só se estuda se cair na prova;
só se estuda o que cair na prova.
Utiliza linguagem clara e precisa para o comando das questões – a lin-
guagem é um dos recursos fundamentais como indicador de competência
do professor.
Cria ambiente favorável ao controle das emoções – todo professor sabe
que o momento da avaliação é aquele em que as emoções dos alunos
­entram em ebulição.

“Professor, eu sabia tudo, eu estudei tudo,


mas na hora da prova, fiquei nervoso
e deu um branco”
Para resolver o “branco” na hora em que o aluno fará a avaliação, o ­­­­profes­­­­­­­­­­­­­­­­sor
poderá criar condições para que o aluno se sinta tranqüilo e sem estresse. O
­professor busca ter sucesso em sua atividade como mediador.
No livro Novas tecnologias e mediação pedagógica, Moran (2000) trata de
alguns pontos do processo de avaliação que podem modificar nossas aulas uni-
versitárias.
O processo de avaliação deverá estar integrado ao processo de
­aprendizagem, de tal modo que funcione como elemento motivador da
aprendizagem e não como um conjunto de provas e/ou trabalhos que
apenas v­ erificam se o aluno passou ou não.
Uma característica básica da avaliação é seu caráter de feedback ou de re-
troalimentação, que traga ao aprendiz informações necessárias, oportunas
e no momento em que ele precisa para que desenvolva sua aprendizagem.
Tanto no uso de técnicas presenciais quanto no uso de tecnologia a dis-
tância, encontram-se embutidas informações que permitem ao professor
e aos alunos se avaliarem com relação aos objetivos pretendidos. Basta
explorá-las.
Os vários participantes do processo de aprendizagem precisam de feed-
back: o aluno, o professor, os colegas ou o grupo de alunos e o programa
que está sendo desenvolvido. Todos precisam saber se estão colaborando
para consecução de objetivos abordados.
Tem sentido aplicar a auto-avaliação quando o próprio aluno consegue
diagnosticar o que aprendeu, quais são suas capacidades que facilitam o
aprendizado. Essas percepções irão ajudá-lo por toda a vida.

115
Didática do Ensino Superior

A aula universitária, então, passa a ser também um espaço para o diag-


nóstico da aprendizagem, bem como de diálogo, discussões e sugestões
para o seu desenvolvimento.

Avaliação da aprendizagem
A avaliação é parte integrante do processo ensino-aprendizagem. Portanto,
pressupõe a relação entre o professor, o aluno e o conhecimento. Aluno como
construtor do próprio conhecimento. Esta construção só se dá pela mediação do
­professor – o facilitador e orientador da aprendizagem.
A construção de conhecimento é um processo interior do sujeito da aprendi-
zagem, estimulado por condições exteriores criadas pelo professor.
Avaliar a aprendizagem dos alunos tem um sentido amplo. A avaliação é
feita de formas diversas, com instrumentos variados, sendo o mais comum em
nossa cultura a prova escrita.
Avaliar a aprendizagem tem sido um tema angustiante para professores e
estressante para os universitários.
A avaliação da aprendizagem é angustiante para muitos professores por não
saberem como transformar uma prova escrita num processo que não seja mera
cobrança de conteúdos aprendidos “de cor”, de forma mecânica e sem significado
para o universitário.
Sentenças como “anotem, pois vai cair na prova”, “se não ficarem calados,
vou fazer uma prova surpresa”, “prestem atenção nesse assunto porque semana
que vem tem prova” e outras, são indicadores da maneira repressiva que tem sido
utilizada a avaliação da aprendizagem.

Características de uma prova


escrita na perspectiva tradicional
Observem as características de uma prova escrita na perspectiva tradicional:
exploração exagerada da memorização;
falta de parâmetros para correção: o universitário fica na mão do profes-
sor;
utilização de palavras de comando sem previsão de sentido no contexto.
É preciso ressaltar, no entanto, que a avaliação da aprendizagem precisa
ser coerente com a forma de ensinar. Se a abordagem no ensino foi dentro dos
princípios da construção do conhecimento, a avaliação da aprendizagem seguirá
a mesma orientação.

116
Avaliação da aprendizagem: avaliar não é o que muita gente pensa

Características das provas


na perspectiva construtivista sociointeracionista
Nessa linha de pensamento e segundo Moretto (2002, p. 96), propomos al-
guns princípios que sustentam nossa concepção de avaliação da aprendizagem:
a aprendizagem é um processo interior ao aluno, do qual temos acesso
por meio de indicadores externos;
os indicadores (palavras, gestos, figuras, textos) são interpretados pelo
professor e nem sempre a interpretação corresponde ao que o aluno pen-
sa;
o conhecimento é um conjunto de relações estabelecidas entre os compo-
nentes de um universo simbólico;
o conhecimento é construído significativamente, é estável e estruturado;
o conhecimento adquirido mecanicamente é instável e isolado;
a avaliação da aprendizagem é um momento privilegiado de estudo e não
um acerto de contas.
Com base nos princípios e nos fundamentos da proposta construtivista so-
ciointeracionista, analisaremos as características da prova escrita:
contextualização – para responder, o universitário deverá buscar apoio
no enunciado da questão, para não inventar uma história;
parametrização – o professor faz a indicação clara e precisa dos critérios
de correção;
exploração da capacidade de leitura e de escrita do universitário – a
colocação de textos que obriguem a leitura, mesmo curta, para provocar
uma resposta, e também de forma escrita e com argumentação, que leve
o universitário a escrever.

Proposição de questões operatórias e não apenas transitórias


O professor deve colocar questões que exijam operações mentais mais ou
menos complexas ao responder.

A prova: ressignificando
a Taxionomia de Bloom
Sob o aspecto da complexidade, Vasco Moretto (2002) fez uma interpreta-
ção dos estudos de Bloom (1971) no assunto que ficou conhecido como Taxiono-

117
Didática do Ensino Superior

mia de Bloom, ou ainda, Taxionomia de Objetivos Educacionais, no qual destaca


apenas o que é pertinente para o enfoque dado à avaliação da aprendizagem.
Para o Moretto (2002), a ressignificação da Taxionomia de Bloom deu ori-
gem a algumas mudanças.

A prova escrita, a partir desses estudos, passa a ser um momento de apren-


dizagem, podendo o professor avaliá-la como fácil (quando predominam as pri-
meiras categorias) e difícil (quando predominam as últimas categorias).
Assim, o professor universitário deve elaborar a prova escrita, mesclando
questões objetivas e questões discursivas.
A prova escrita, apesar de muito criticada, deixa de ser um momento de acer-
to de contas para ser um momento privilegiado de aprendizagem e de estudos.

1. Atividade individual.
Leia o capítulo “Avaliar com eficácia e eficiência” do livro Prova: um momento privilegiado e
não um acerto de contas, de Pedro Vasco Moretto.

2. Atividade em grupo.
a) Após a leitura, apresentem as conclusões e discutam-nas.
b) Elaborem uma prova na perspectiva construtivista sociointeracionista.

118
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Hino Nacional
Poema de Joaquim Osório Duque Estrada
Música de Francisco Manoel da Silva

Parte I Parte II

Ouviram do Ipiranga as margens plácidas Deitado eternamente em berço esplêndido,


De um povo heróico o brado retumbante, Ao som do mar e à luz do céu profundo,
E o sol da liberdade, em raios fúlgidos, Fulguras, ó Brasil, florão da América,
Brilhou no céu da pátria nesse instante. Iluminado ao sol do Novo Mundo!

Se o penhor dessa igualdade Do que a terra, mais garrida,


Conseguimos conquistar com braço forte, Teus risonhos, lindos campos têm mais flores;
Em teu seio, ó liberdade, “Nossos bosques têm mais vida”,
Desafia o nosso peito a própria morte! “Nossa vida” no teu seio “mais amores.”

Ó Pátria amada, Ó Pátria amada,


Idolatrada, Idolatrada,
Salve! Salve! Salve! Salve!

Brasil, um sonho intenso, um raio vívido Brasil, de amor eterno seja símbolo
De amor e de esperança à terra desce, O lábaro que ostentas estrelado,
Se em teu formoso céu, risonho e límpido, E diga o verde-louro dessa flâmula
A imagem do Cruzeiro resplandece. – “Paz no futuro e glória no passado.”

Gigante pela própria natureza, Mas, se ergues da justiça a clava forte,


És belo, és forte, impávido colosso, Verás que um filho teu não foge à luta,
E o teu futuro espelha essa grandeza. Nem teme, quem te adora, a própria morte.

Terra adorada, Terra adorada,


Entre outras mil, Entre outras mil,
És tu, Brasil, És tu, Brasil,
Ó Pátria amada! Ó Pátria amada!

Dos filhos deste solo és mãe gentil, Dos filhos deste solo és mãe gentil,
Pátria amada, Pátria amada,
Brasil! Brasil!

Atualizado ortograficamente em conformidade com a Lei 5.765, de 1971, e com o artigo 3.º da Convenção Ortográfica
celebrada entre Brasil e Portugal em 29/12/1943.

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