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Semiótica 2016-2017 Semestre 1

Recensão Crítica

Pape Satàn Aleppe


Crônicas de uma sociedade líquida

Júlia Orige Oliveira


50093

O mundo está mudando. Sempre mudou, agora mais rápido e sem direção. Pape Satàn
Aleppe - Crônicas de uma sociedade líquida (ECO, 2016, pág. 123-159) é uma
compilação de textos que falam sobre a sociedade, a forma que se vê o mundo e como
se age sobre ele. As crônicas foram escritas por Umberto Eco para o jornal italiano
L’Espresso a partir do ano 2000. O autor usa o termo sociedade líquida emprestado de
Bauman para descrever uma sociedade marcada pelas crises do Estado, das ideologias e
dos valores de uma lógica de vida tradicional. A sociedade líquida é individualista,
subjetiva e não sabe o que pode tomar como referência. São pessoas que agem, sem

saber como ou quando, mas agem.

A passagem para uma sociedade líquida implica mudanças na forma de ver o mundo e
de reagir. Eco fala sobre as transformações na comunicação social, tanto na maneira de
fazer comunicação como na de recebê-la. O autor abre a crônica “A hipnose
radiofônica” falando sobre as diferenças na memória de quem acompanhou a Segunda
Guerra Mundial pela rádio e quem acompanha hoje os conflitos mundiais pela TV.
Seria o telejornal tão marcante e imersivo quanto a rádio?

McLuhan, teórico de comunicação, diz que os media podem ser divididos entre meios
quentes e frios, pelo grau de imersão e de interação. Um meio quente tem uma força
hipnótica, um frio pode ser abandonado a qualquer momento. Nos primeiros anos,
enquanto ainda não havia TV, a rádio era um meio quente, feito para ser ouvido com a
maior atenção.

Hoje, a maioria das estações ocupa a sua programação com músicas e anúncios. Poucas
são as estações all news e já não há rádionovelas. Mesmo os rádiojornais são feitos para
serem ouvidos enquanto o público faz algo. Porque a maioria das pessoas ouve a rádio
no carro, enquanto cozinha ou limpa a casa. O rádiojornalismo busca ser mais simples,
compreensível a todos, mesmo que não tenham a atenção completamente virada para a
rádio.

A rádio já não é um meio quente, não é mais imersivo como fora antes. E, como não é
consumido como meio quente, não é feito para ser um meio quente. Ainda assim, não
quer dizer que não faça uma comunicação de qualidade.

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A construção de um programa radiofônico leva em consideração tudo o que pode ser


ressignificado pelo receptor da informação. Em uma reportagem, por exemplo, ao falar
de manifestações insere-se o ruído de pessoas, mesmo que esse ruído não seja realmente
capturado naquela manifestação específica. Usam-se até sons produzidos em estúdio
para complementar as notícias e passar uma certa mensagem. A comunicação da rádio,

eisso
de outros mídia,
acontece. é produzida
O público não épara
umaser entendida
caixinha de uma
vazia, ondeforma específica.
se pode Nem sempre
incutir ideias, como
dizia a Teoria Hipodérmica. O ouvinte da rádio já tem em si conhecimentos prévios que
o levarão a analisar o que ouve. A mesma lógica pode ser aplicada aos outros meios de
comunicação de massa.

Eco fala sobre os efeitos do e no público em “O público faz mal à televisão?”. Os


programas jornalistícos e de entretenimento são compostos por uma série de signos, que
devem ser o mais claro possível. Mas mesmo com todo o esforço dos produtores
“observava-se que o que as mensagens intencionalmente diziam não era
necessariamente o que o público nelas lia” (ECO, 2016). A isso não se pode denominar
exatamente ‘falhas de comunicação’, porque pode ser previsto. Há mais entre o emissor
e o receptor do que a mensagem. Conhecendo o público e produzindo conteúdo com
maior clareza, segundo os sistemas de signos usados e a cultura local, pode-se evitar
grande parte dessas falhas.

Os meios de comunicação têm sistemas de interpretação próprios. A imprensa trabalha


com a escrita e com imagens. A rádio já não tem a escrita, nem as imagens, trabalha
antes com som. Por isso, cada meio desenvolveu uma maneira de contar estórias
diferente. Com o tempo, o público se acostumou e já espera da imprensa uma coisa, da
rádio outra e da TV ainda outra. Tudo é importante para construir a informação. No
rádiojornal as mudanças de vozes fazem mais do que dar ritmo às notícias, elas indicam
mudanças de assunto. As diferentes vozes informam o ouvinte sobre a identidade e o
contexto dos locutores. O jornalismo é marcado pela intertextualidade, pelo que é dito
nas entrelinhas e aqui, no caso do rádiojornal, são os sons que complementam as
notícias.

“A hipnose radiofônica” de Eco é como “A Era do Rádio” de Woody Allen, sobre um


tempo nostálgico onde a rádio afetava efetivamente a vida do seu público. Mas ele
afirma que hoje a rádio já não é mais que ruído de fundo para uma vida agitada.
Contudo, “a história dos meios de massa não permite profecias” (Eco, 2016) e talvez o
papel da rádio volte a ser o principal.

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Referências bibliográficas

ECO, Umberto. Pape Satàn Aleppe: crônicas de uma sociedade líquida. 2016

MEDITSCH, Eduardo. A Nova Era do Rádio: o discurso do rádiojornalismo enquanto


produto intelectual eletrônico. XX Congresso Brasuleiro de Ciências da Comunicação,

1997.

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