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Frigotto e Ciavatta - EB Brasil Dec de 1990 Sub Ativa Logica Capital PDF
Frigotto e Ciavatta - EB Brasil Dec de 1990 Sub Ativa Logica Capital PDF
Frigotto e Ciavatta - EB Brasil Dec de 1990 Sub Ativa Logica Capital PDF
GAUDÊNCIO FRIGOTTO*
MARIA CIAVATTA**
(Feuerbach)***
* Doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC- SP ) e professor titular na
Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF), Rio de Janeiro. E-mail:
frigotto@uol.com.br
** Doutora em Ciências Humanas (Educação) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
de Janeiro ( PUC - RJ ) e professora titular em Trabalho e Educação da Universidade Federal
Fluminense (UFF), Rio de Janeiro. E-mail: mciavatta@terra.com.br
*** Prefácio da 2ª edição de A essência do cristianismo, apud Débord, 1997, p. 13.
Introdução
s últimas décadas do século XX e o início do século XXI vêm mar-
cados por profundas mudanças no campo econômico, sociocultu-
ral, ético-político, ideológico e teórico. Em recente coletânea, por
nós organizada (Frigotto & Ciavatta, 2002), analisamos que essas mu-
danças se explicitam por uma tríplice crise: do sistema capital, ético-
política e teórica.
No plano mais profundo da materialidade das relações sociais está
a crise da forma capital. Depois de uma fase de expansão, denominada
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funções, quem pertencia à comunidade política como cidadão político
pleno, para que serviam o governo e o Estado.
Não obstante o conhecimento do pensamento liberal (Locke,
Montesquieu e a versão americana), o que prevaleceu se afastou do pacto
liberal. O pacto constitucional apoiado pela elite brasileira estabeleceu
que o poder imperial antecedia a criação da sociedade. O imperador era
o Poder Moderador e todos os poderes (Legislativo, Judiciário e Executivo)
e todos os ministros respondiam perante ele e não perante a comunidade
política.
A questão sobre quem pertencia à comunidade política recebeu
“nuances democráticas”. A primeira interpretação excluía da comunidade
política somente os criminosos, os estrangeiros e os religiosos. Mas, como
o pacto político deveria expressar as igualdades e desigualdades existentes
na sociedade que, no pensamento da época, eram naturais, definiu-se que
os homens de posses eram os responsáveis pela riqueza do país e
constituíam a comunidade política. O que se traduziu pelo critério
censitário, de renda para distribuição dos direitos de voto. Posterior-
mente, com o voto obrigatório universal, ampliaram-se os direitos de
votar e ser votado, sem que as condições adequadas de vida, trabalho e
educação tivessem se estendido, efetivamente, para toda a sociedade.
Mas a democracia, a cidadania, assim como os processos de
incorporação de toda a população à sociedade produtiva, não se exercem
em abstrato. Assistimos ao avultar dos problemas derivados do modelo
político perverso das origens do país, agravados pelos desafios do
desenvolvimento científico-tecnológico, das imposições do mercado e
de seus desdobramentos no nível da cultura.
Vivemos imersos em um mundo de altas tecnologias accessíveis
na vida cotidiana e de informações abundantes, caóticas e dispersas, em
que as imagens visuais prevalecem sobre a linguagem verbal, oral e
escrita. Só muito lentamente vamos percebendo que se gerou uma nova
sociabilidade e o que significa viver na “sociedade do espetáculo”, tal
como intuiu e teorizou Guy Débord nos anos de 1960. “O espetáculo
não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas
mediada por imagens.” É uma visão de mundo que se materializou e
não apenas o abuso da visão ou o produto de tecnologias sempre mais
sofisticadas. É um resultado e um modo de produção da existência.
Constitui o modelo atual de vida dominante na sociedade, sob todas
as suas formas: informação, publicidade, televisão, filmes, vídeos,
consumo de divertimentos. Não se trata apenas de novas linguagens,
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mas de uma nova forma de viver e de se inserir no mundo. “Toda a vida
das sociedades nas quais reinam as modernas condições de produção se
apresenta como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era
vivido diretamente se tornou representação” (Débord, 1997, p. 13-14).
Se a tese do autor faz sentido, não nos podemos espantar diante
da inconsistência dos valores e comportamentos que regem a vida neste
início de século. Há uma predominância da realidade fragmentada, como
se toda ela fora feita de partes que se combinam e se desprendem para
novas combinações aleatórias, como é possível fazer com um conjunto de
imagens fotográficas em que cada unidade é vista separadamente,
abstraída do contexto que lhe dá o significado, que explica sua gênese e
sua particularidade histórica.
O que está posto como desafio ao conhecimento e à ação é a
fragmentação do mundo e sua reunificação ilusória na sedução da
imagem. A escola, que sempre lidou com o discurso articulado do
pensamento cognitivo, vê-se diante de novas formas de conhecer,
aparentemente mais completas porque envolvem o sentimento, a emoção,
o desejo. Na presença da cultura de tendência hegemônica do visual, a
escola, supostamente, moderniza-se e incorpora acriticamente a imagem
como ilustração, como motivação.
O que é um problema da cultura da sociedade se torna um
problema de aprendizagem escolar. Não que o problema da aprendiza-
gem não exista, mas ele não é reconhecido em todas as suas dimensões.
Pensemos, por exemplo, no avançado desenvolvimento da ciência e na
necessidade de uma educação tecnológica que responda às exigências de
uma leitura atualizada do mundo. Ou pensemos na exaltação do mercado
não apenas como o padrão das relações econômicas, mas de todas as
relações humanas pela subsunção de tudo ao valor mercadoria. Pensemos
na destruição do planeta pelo saqueio inconseqüente das formas de ener-
gia não-renováveis (o carvão, o gás, o petróleo), na fome destruidora de
dois terços da humanidade e nos obstáculos para desenvolver um
comportamento solidário entre os povos.
A base conceptual da educação básica em um novo projeto é,
primeiro, o reconhecimento dos problemas maiores do mundo
globalizado, sob os quais temos que tomar decisões locais. Em segundo
lugar, assumir o direito inalienável do povo a uma escola pública de
qualidade, que garanta a todos os cidadãos a satisfação da necessidade
de um contínuo aprendizado. Neste sentido, a educação é tanto um
direito social básico e universal quanto vital para romper com a histórica
dependência científica, tecnológica e cultural do país, e fundamental
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para a construção de uma nação autônoma, soberana e solidária na
relação consigo mesma e com outras nações. A educação é, portanto,
ao mesmo tempo determinada e determinante da construção do
desenvolvimento social de uma nação soberana. Além de ser crucial para
uma formação integral humanística e científica de sujeitos autônomos,
críticos, criativos e protagonistas da cidadania ativa, é decisiva, também,
para romper com a condição histórica de subalternidade e de resistir a
uma completa dependência científica, tecnológica e cultural.
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Brasil seguro para o capital”. No campo da saúde e educação, áreas tidas
pelo Governo FHC como de extraordinário avanço e alvos de intensa e
permanente propaganda, segundo Oliveira, não se confirma “a melhoria
dos seus indicadores; pelo contrário, procedimentos metodológicos que
medem incrementos marginais dizem que houve uma desaceleração da
melhoria” (op. cit., p. 2).
Uma análise de longa duração indica-nos que as políticas educa-
cionais dos anos 90, em realidade, ganham compreensão mais ampla e
profunda se as considerarmos como epílogo de três projetos societários
do Brasil que “conviveram e lutaram entre si durante todo o século XX”
(Fiori, 2002, p. 2).5
O primeiro projeto nasceu das idéias do liberalismo econômico,
“mas sua formulação econômica e moderna foi dada pela política
monetarista e ortodoxa e pela defesa intransigente do equilíbrio fiscal e
do padrão-ouro, dos governos paulistas Prudente de Moraes, Campos
Sales e Rodrigues Alves” (idem, ibid.). Ao longo do século XX é a
concepção dominante incorporada pelos ministros da fazenda, C.
Castro, Eugênio Gudin, Otávio Bulhões e Roberto Campos (no período
da ditadura de 1964).
Este projeto, destaca Fiori, “foi o berço da estratégia econômica do
Governo Cardoso” (idem, ibid.), cujo ministro, ao longo de dois man-
datos, foi Pedro Malan. Projeto que sempre se contrapôs ao que Fiori
denomina de “nacional desenvolvimentismo” ou “desenvolvimentismo
conservador” presente na Constituinte de 1891 e nos anos de 1930.
Mais enfaticamente se opunha a um terceiro projeto de “desenvolvimento
econômico nacional e popular”. Esta terceira alternativa “nunca ocupou
o poder estatal, nem comandou a política econômica de nenhum governo
republicano, mas teve enorme presença no campo da luta ideológico-
cultural e das mobilizações democráticas” (idem, p. 3).
Antes da denominada “era FHC” o Brasil experimentou uma década
de intensos debates na travessia da ditadura civil-militar para a redemo-
cratização. O centro desses debates foi canalizado pelo processo consti-
tuinte e, em seguida, pela elaboração da nova Constituição (1988).
Poderíamos arriscar afirmar que o capítulo da ordem econômico-social
incorporou amplas teses do projeto de desenvolvimento “nacional-
popular” e logrou ganhos significativos na afirmação de direitos econô-
micos, sociais e subjetivos.
É neste contexto que os educadores, mediante suas instituições
científicas, culturais, sindicais e políticas, que resistiram no período
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ditatorial, protagonizam inúmeras experiências em prefeituras e depois
em alguns estados, como demonstra detalhadamente Cunha (1991), e
iniciam a construção do projeto da Nova Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional e do Plano Nacional de Educação.
A travessia para a democracia, entretanto, ficou inconclusa. A
vitória de Collor de Mello, filho das oligarquias nordestinas, muda a
rota e assume o ideário ideológico que vinha se afirmando de todas as
formas, mormente mediante as poderosas redes de informação, de que
estávamos iniciando um “novo tempo”. Este ajustamento pressupunha
conter e restringir a esfera pública e efetivar-se de acordo com as leis da
competitividade do mercado mundial.
Collor de Mello, todavia, revelou-se um fracasso. Tratava-se de
uma solução política inesperada, expressão da incapacidade da classe
dominante de construir um candidato dentro dos quadros políticos
tradicionais. O impeachment, que ao final contou com o apoio até da
poderosa Rede Globo de Comunicação, resultou da sua incapacidade
política de afirmar um projeto de ajuste da sociedade brasileira à nova
(des)ordem mundial sob o signo da mundialização do capital e dos
setores internos a ela associados.
A burguesia brasileira encontra na figura de Fernando Henrique
Cardoso a liderança capaz de construir seu projeto hegemônico de longo
prazo, ao mesmo tempo associado e subordinado à nova (des)ordem da
mundialização do capital. Com efeito, como analisa Francisco de Oliveira
(1996 e 2001), a burguesia brasileira, pela primeira vez, busca um proje-
to de longo prazo, já que até o presente nossa história é uma sucessão de
ditaduras e golpes institucionais.
Cardoso construiu um governo de centro-direita e, sob a ortodoxia
monetarista e do ajuste fiscal, agora no contexto da férrea doutrina dos
organismos internacionais e sua cartilha do Consenso de Washington,
efetiva as reformas que alteram profundamente a estrutura do Estado
brasileiro para “tornar o Brasil seguro para o capital”. O fulcro deste
projeto, como aludimos acima, é a doutrina neoliberal ou, mais apropria-
damente, neoconservadora. Essa doutrina se baliza por alguns pressu-
postos que se constituem numa verdadeira bíblia desta nova hegemonia
em construção em nível global, mas, com mais ênfase e destroços práticos,
implanta-se em países como o Brasil.
O conjunto de pressupostos assumidos e partilhados pelo projeto
econômico-social do Governo Cardoso é extraído da cartilha neoliberal
do Consenso de Washington e pode ser resumido nos seguintes:
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primeiramente que acabaram as polaridades, a luta de classes, as
ideologias, as utopias igualitárias e as políticas de Estado nelas baseadas.
A segunda idéia-matriz é a de que estamos num novo tempo – da glo-
balização, da modernidade competitiva, de reestruturação produtiva, de
reengenharia –, do qual estamos defasados e ao qual devemos ajustar-
nos. Este ajustamento deve dar-se não mediante políticas protecionis-
tas, intervencionistas ou estatistas, mas de acordo com as leis do merca-
do globalizado, mundial.6
O ajuste ou “concertación” traduz-se por três estratégias articuladas
e complementares: desregulamentação, descentralização e autonomia e
privatização. A desregulamentação significa sustar todas as leis: normas,
regulamentos, direitos adquiridos (confundidos mormente com privilé-
gios) para não inibir as leis de tipo natural do mercado. No caso brasilei-
ro, para a reforma constitucional, a reforma da previdência e a reforma
do Estado, o fulcro básico é de suprimir leis, definir bases de um Estado
mínimo, funcional ao mercado.
A descentralização e a autonomia constituem um mecanismo de
transferir aos agentes econômicos, sociais e educacionais a responsabi-
lidade de disputar no mercado a venda de seus produtos ou serviços. Por
fim, a privatização fecha o circuito do ajuste. O máximo de mercado e o
mínimo de Estado. O ponto crucial da privatização não é a venda de
algumas empresas apenas, mas o processo do Estado de desfazer-se do
patrimônio público, privatizar serviços que são direitos (saúde, educação,
aposentadoria, lazer, transporte etc.) e, sobretudo, diluir, esterilizar a
possibilidade de o Estado fazer política econômica e social. O mercado
passa a ser o regulador, inclusive dos direitos.
Desse ajuste resulta uma realidade perversa e cínica que Renato
Janine Ribeiro (2000) sintetizou como sendo “a sociedade contra o
social”, onde “no discurso dos governantes ou no dos economistas a
‘sociedade’ veio a designar o conjunto dos que detêm o poder econômico,
ao passo que o ‘social’ remete, na fala dos mesmos governantes ou dos
publicistas, a uma política que procura minorar a miséria” (Janine, 2000,
p. 19). Isso nos permite entender o protagonismo dos organismos
internacionais, mormente do Banco Mundial e do Banco Interamericano
de Desenvolvimento, nas reformas sociais e educacionais da última
década.
Em seu conjunto, o projeto educativo do Governo Cardoso
encontra compreensão e coerência lógica quando articulado com o
projeto de ajuste da sociedade brasileira às demandas do grande capital.
As demandas da sociedade organizada são substituídas por medidas
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produzidas por especialistas, tecnocratas e técnicos que definem as
políticas de cima para baixo e de acordo com os princípios do ajuste.
Cunha (1995), ao analisar as propostas educacionais dos candidatos
Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio da Silva (Lula), observava:
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Em diferentes análises, Neves (1994, 1995, 1999, 2000a,
2000b e 2002) efetiva um detalhado exame das políticas educacionais
das décadas de 1980 e 1990 e de quais os determinantes estruturais e
conjunturais, dentro da nova ordem mundial, que nos permitem
entender a presença dominante do pensamento empresarial na educação
no Brasil.
O projeto de educação básica do Governo Cardoso afirma-se sob a
lógica unidimensional do mercado, explicitando-se tanto no âmbito
organizativo quanto no do pensamento pedagógico. Como as idéias de
um projeto de desenvolvimento “nacional popular” e autônomo passaram
a ser ridicularizadas, também o foi a perspectiva de uma educação básica
omnilateral, politécnica ou tecnológica (Saviani, 2003).
A ausência de uma efetiva política pública, com investimentos no
campo educacional, compatíveis com o que representa o Brasil em termos
de geração de riqueza, vai conduzindo a medidas paliativas que reiteram
o desmantelamento da educação pública em todos os seus níveis. Uma
das estratégias utilizadas por alguns estados para diminuir os custos na
educação básica tem sido a utilização do teleensino, mediante compra de
pacotes do Telecurso 2000 da Rede Globo de Televisão.7
A dimensão talvez mais profunda e de conseqüências mais graves
situa-se no fato de que o Governo Fernando H. Cardoso, por intermédio
do Ministério da Educação, adotou o pensamento pedagógico empresa-
rial e as diretrizes dos organismos e das agências internacionais e regio-
nais, dominantemente a serviço desse pensamento como diretriz e
concepção educacional do Estado. Trata-se de uma perspectiva pedagó-
gica individualista, dualista e fragmentária coerente com o ideário da
desregulamentação, flexibilização e privatização e com o desmonte dos
direitos sociais ordenados por uma perspectiva de compromisso social
coletivo. Não é casual que a ideologia das competências e da empregabili-
dade8 esteja no centro dos parâmetros e das diretrizes educacionais e dos
mecanismos de avaliação.
Maria H. Guimarães Castro, secretária da Secretaria de Ensino
Superior (SESU) do Ministério da Educação (MEC) e diretora do Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), responsável pela
Avaliação Nacional do Ensino Superior (Lei nº 9.131, o “Provão”), pelo
Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e pelo Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica ( SAEB), 9 explicita claramente que as
competências que devem ser avaliadas são aquelas que os empresários
indicam como desejáveis.
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Em uma pesquisa recente realizada pelo MEC, sobre o que o mercado de
trabalho esperava dos alunos ao final do Ensino Médio de cursos profissio-
nalizantes, revelou-se que as empresas querem que esses estudantes tenham
domínio de Língua Portuguesa, saibam desenvolver bem a redação e se co-
municar verbalmente. Esta é uma das competências gerais que o ENEM pro-
cura avaliar e que a Reforma do Ensino Médio procura destacar. Em segun-
do lugar, os empresários querem que os futuros trabalhadores detenham os con-
ceitos básicos de matemática e, em terceiro lugar, que tenham capacidade de
trabalhar em grupo e de se adaptar a novas situações. Portanto o que os em-
presários estão esperando dos futuros funcionários são as competências ge-
rais que só onze anos de escolaridade geral podem assegurar. (Castro,
2001; grifos nossos)
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duramente combatidos e rejeitados. Foi por isso, também, que o
projeto de LDB oriundo das organizações dos educadores, mesmo sendo
coordenado, negociado e desfigurado pelos relatores do bloco de
sustentação governamental, foi rejeitado pelo governo. Todas as decisões
fundamentais foram sendo tomadas pelo alto, pelo Poder Executivo,
por meio de medidas provisórias, decretos ou por leis conquistadas no
Parlamento mediante o expediente da troca de favores.
A demora do governo para aprovar projeto substitutivo do senador
Darcy Ribeiro, que desfigurava o projeto dos educadores que tramitava
na Câmara, também nada teve de inocente. Tratava-se de uma estratégia
para, ao mesmo tempo, ir transformando esse substitutivo em projeto
adequado aos interesses do governo e ir impondo sua política de ajuste
pontual e tópico no campo educacional.
A Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9.394/96), finalmente aprovada
pelo Congresso, resultou da iniciativa personalista do senador Darcy
Ribeiro e representou, para Florestan Fernandes (1991) uma dupla
traição: fez uma síntese deturpada do longo processo de negociação do
projeto negociado com a sociedade organizada e deu ao governo, que não
tinha projeto de LDB, o que este necessitava. Coerentemente, então, como
evidencia Saviani, em minuciosa análise dos projetos de LDB em disputa,
deveria ser uma LDB minimalista e, portanto, em consonância com a
proposta de desregulamentação, de descentralização e de privatização e
“compatível com o Estado Mínimo” (Saviani, 1997, p. 200).
Poderíamos dizer, sem exagero, que a nova LDB é uma espécie de
ex-post cujo formato, método de construção e conteúdo se constituem
em facilitador para medidas previamente decididas e que seriam, de
qualquer forma, impostas. Exemplar, neste particular, como veremos
adiante, é o que veio a se denominar de educação profissional. Apesar
de a LDB já dar as diretrizes, o Decreto nº 2.208 de 1997, que é uma
cópia quase fiel do Projeto de Lei nº 1.603/96, veio regulamentar a
Lei, embora tenha encontrado ampla resistência, no Parlamento,
mediante a pressão das organizações que compunham o Fórum
Nacional em Defesa da Escola Pública.
Durante os anos da ditadura e na transição, um dos espaços
profundamente comprometidos e envolvidos em negociatas com os
grupos do privatismo foi o Conselho Federal de Educação. Ao longo dos
anos constituiu-se como uma espécie de câmara de troca de favores junto
ao Ministério da Educação, concebido como um órgão da Administração
Federal e subordinado ao Poder Executivo. Por isso, no contexto do amplo
movimento de redemocratização da sociedade brasileira, a natureza e a
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composição do Conselho Federal de Educação foi alvo de intensos deba-
tes. Como reflexo disto, o projeto de LDB apresentado na Câmara pelo
deputado Otávio Elísio, em 1988, propunha um Conselho Nacional de
caráter deliberativo e legislativo com autonomia econômica, financeira e
administrativa. Este teria uma composição com a indicação de um terço
pelo ministro da Educação, um terço pela Câmara Federal e um terço
pelas entidades representativas do magistério. O mesmo espírito foi
mantido pelo substitutivo Jorge Hage e aprovado na Câmara. Tratava-se
de um extraordinário avanço.
Esta perspectiva autônoma do Conselho e a forma democrática
de sua composição se confrontam com as diretrizes gerais da conforma-
ção da educação ao ajuste estrutural proposto pelo governo no âmbito
das reformas do Estado. O substitutivo do senador Darcy Ribeiro,
como demonstra Saviani (op. cit., p. 207), não fazia nenhuma menção
ao Conselho e, na tramitação, fez-se uma referência no inciso IX do
artigo 9º, mantido na versão final aprovada e sancionada, que diz: “Na
estrutura educacional, haverá um Conselho Nacional de Educação, com
funções normativas e de supervisão e atividade permanente, criado por
lei”. Esta formulação, como bem analisa Saviani, permitiu manter o
Conselho Nacional de Educação tutelado e sob o controle do Executivo
e, portanto, em direção oposta ao projeto aprovado pela Câmara Federal
em que o “CNE tinha um outro caráter: era uma instância com funções
deliberativas no âmbito da educação análogas àquelas exercidas pelo
Legislativo e Judiciário no âmbito da sociedade como um todo” (idem,
p. 208).
Prevalecendo o caráter consultivo do CNE e sob a égide do MEC, ao
longo dos oito anos de mandato do Governo Cardoso o ministro Paulo
Renato Souza nomeou os conselheiros em número mais que suficiente
para que nada, que fosse fundamental ao projeto educativo preconcebido,
escapasse do seu controle. Na primeira composição foram incluídos
alguns nomes sugeridos pelas entidades do magistério, mas sem força
suficiente para além de retardar ou dificultar algumas medidas. No
segundo mandato do ministro (1998-2002), o CNE, reeditando o
passado, foi espaço de legitimação do projeto mercantilista e privatista
do Governo Cardoso.
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em vigor em estratégias de cumprimento da lei. Esse procedimento supõe
uma ampla negociação com a sociedade e com o Legislativo de modo que
se garanta a orientação política da lei por meio da destinação efetiva de
recursos e da elaboração de instrumentos legais complementares. No
Brasil, onde a tradição autoritária suplanta, freqüentemente, os procedi-
mentos democráticos, os planos educacionais aproximam-se da política e
assumem sua feição mais genérica, ficando a salvo do cumprimento de
metas definidas em função dos problemas a resolver.
As políticas e os planos educacionais, implementados em nível do
Estado, no Brasil, acompanham as vicissitudes da sociedade brasileira na
falência de não consolidar, até hoje, uma sociedade democrática e de não
incorporar amplos setores populares a um projeto superior de país.12
Os planos nacionais de educação, num primeiro momento da
vida nacional, adquirem o sentido de lei e se aproximam das políticas
educacionais em gestação (anos 20 e 30). Num segundo momento eles
são vistos como uma parte do planejamento estabelecido e refletem a
relação educação e desenvolvimento econômico (a partir do final dos
anos 40).
Neste sentido, ou a idéia de plano nacional de educação esvazia-se
e o plano assume o sentido restrito de plano de aplicação de recursos (na
LDBEN nº 4.024 de 1961) ou assume a forma de um plano de governo
contendo metas qualitativas e quantitativas que vão subsidiar os planos
posteriores. Os planos subseqüentes a 1964 saem gradativamente do
âmbito dos pedagogos, para os tecnocratas, economistas e engenheiros
da “nova” economia nacional dos anos 70 que se prolongou até a década
atual (Horta, 1982 e 1997).13
O atual Plano Nacional de Educação (PNE), na forma da Lei nº
10.172 de 9/1/2001, é uma resposta autocrática do Governo Cardoso
(1994-2002) ao Plano Nacional da Educação da Sociedade Brasileira,
elaborado sob a liderança do Fórum Nacional em Defesa da Escola
Pública, que também conduziu a elaboração do projeto da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a partir de 1986, juntamente
com a Constituinte de 1988.14 O que se deu por intermédio de
inúmeros encontros preparatórios e seminários temáticos, nos diversos
pontos do país. O deputado federal Ivan Valente analisa os dois projetos
em disputa como dois projetos de Brasil (Valente, 2001). O projeto
governamental foi orientado pelo centralismo de decisões, da formulação
e da gestão da política educacional, principalmente na esfera federal.
Pauta-se pelo progressivo abandono, por parte do Estado, das tarefas de
manutenção e desenvolvimento do ensino, por meio de mecanismos de
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envolvimento de pais, organizações não-governamentais, empresas e de
apelos à “solidariedade” das comunidades onde se situam as escolas e os
problemas. O que resultou em parâmetros privatistas para o funciona-
mento dos sistemas de ensino.
O projeto da sociedade brasileira reivindicava e continua a reivin-
dicar o fortalecimento da escola pública estatal e a democratização da
gestão educacional “como eixo do esforço para universalizar a educação
básica” (fundamental e média) e, progressivamente, o ensino superior. Na
prática, significaria passar do investimento de 4% do PIB em educação
para 10% ao final de dez anos de PNE.
A resposta governamental, quando trata da competência da União,
contorna “a necessidade de indicar prazos e de apontar o setor competen-
te pela execução da meta, contrariamente ao sentido, muitas vezes
invasivo, com que normatiza condutas e procedimentos aos estados e
municípios” e procede “à transferência de responsabilidades da União aos
entes subnacionais, como tentativa de remediar os males decorrentes de
ações anteriores do governo federal”, como é o caso do Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valoriza-
ção do Magistério (FUNDEF) (Davies, 1999, p. 11-12 e 35).15
Para o movimento civil organizado, que defendeu o PNE , o
Presidente FHC “veta o que faria do PNE um plano” e comunica os vetos ao
Parlamento (Mensagem nº 9 de 9/1/2001) informando que “quem
orientou a imposição dos vetos ao PNE foi a área econômica do governo,
através dos Ministérios do Planejamento e da Fazenda”, o que significa,
de modo especial, “as razões da política ditada pelo FMI” (Valente, 2001,
p. 37). A retração do Estado e a privatização dos serviços, ao contrário
do discurso oficial e publicitário, não trouxeram benefícios à população.
Ao contrário, privatizaram e elitizaram os serviços, transferiram o cliente-
lismo populista para o clientelismo junto às organizações da sociedade
civil e introduziram o voluntariado como uma questão de “cidadania”.
São políticas que visam a minorar os efeitos da expropriação econômica e
cultural que atingem as classes assalariadas (subempregados e desem-
pregados), marginalizados, em diversos níveis, dos benefícios sociais
propiciados pelo desenvolvimento das forças produtivas. São políticas
pobres para os pobres.16
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no Cardoso. Como assinalamos acima, não houve uma efetiva melhora
em seus indicadores básicos. Em estudo recente, Davies (2003) aponta
discrepâncias nas análises estatísticas do Ministério da Educação e
questiona a campanha de 1997/1998, “Toda criança na escola”, que teria
sido viabilizada pelo FUNDEF.17
Com efeito, a educação infantil, a educação de jovens e adultos, a
educação de nível médio e superior ficaram relegadas a iniciativas tópicas.
A educação infantil, ou de 0 a 6 anos, foi delegada aos governos muni-
cipais ou às famílias, com a penalização da classe trabalhadora. A
educação de jovens e adultos passou a se reduzir às políticas de formação
profissional ou requalificação deslocada para o Ministério do Trabalho ou
para iniciativas da sociedade civil. Na educação média, a política foi de
retroceder ao dualismo estrutural entre o ensino médio acadêmico e
técnico. No nível superior apostou-se deliberadamente na expansão de-
senfreada do ensino privado.18 Um aumento de 80% nos oito anos do
Governo Cardoso, sendo que aproximadamente 76% no nível privado.
Em alguns estados da União, como no caso do Rio de Janeiro, houve um
decréscimo na oferta do ensino superior público de 2,6%.
Em que sentido se pode afirmar que o resultado da prioridade do
ensino fundamental foi pífio? Como indicamos no item 2, a concepção
organizativa e pedagógica do projeto educativo do Governo Cardoso
funda-se nos critérios mercantilistas, economicistas e, portanto, num
caráter instrumental. O dogma de não comprometer o ajuste fiscal não
poupou a prioridade do ensino fundamental. O governo aumentou as
estatísticas de acesso,19 o que é um dado positivo, mas insuficiente, pois
degradou as condições de democratização do conhecimento.
A análise criteriosa feita por Saviani dos projetos de LDB da Câmara,
do Senado e da lei aprovada sinaliza um aspecto muito sutil, mas
revelador de que o Governo Cardoso não queria comprometer-se com
mais gastos na educação fundamental. A LDB aprovada restringiu, no
Direito, Dever e Liberdade de Educar, o preceito constitucional que diz:
“O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito subjetivo” (art. 208,
inciso VII, parágrafo I). Na LDB está escrito: “o acesso ao ensino
fundamental é direito publico subjetivo” (art. 5º) (Saviani, 1997, p.
203). Para Saviani, esta restrição tanto abre a possibilidade de o governo
não se obrigar à gratuidade como pode ter sido uma medida preventiva
para não estender a obrigatoriedade e a gratuidade ao nível médio de
ensino, as quais haviam sido aprovadas no projeto da Câmara, elaborado
com intensa participação do Fórum Nacional em Defesa da Escola
Pública.
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O não-comprometimento efetivo com a melhoria da educação
fundamental se manifesta pela descentralização autoritária dos encargos
de manutenção da educação infantil e fundamental pelos municípios sem
garantir, em sua maioria, condições mínimas de manter um atendimento
qualitativo. Com a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento
do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) para
permitir um gasto mínimo aluno/ano no ensino fundamental, os
municípios aceleraram o processo de incorporação das matrículas depois
que perceberam que poderiam, com isso, aumentar suas receitas compul-
sórias. Em certos casos houve matrículas fantasmas.20
O FUNDEF, todavia, funcionou como uma espécie de condomínio
onde o governo federal induz a transferência dos estados aos municípios
e centraliza outros recursos e os redistribui para os que não atingem o
teto mínimo, menos de 400 reais aluno/ano. Isso se confirma pelas
conclusões a que chega José M. de Rezende Pinto:
Educ. Soc., Campinas, vol. 24, n. 82, p. 93-130, abril 2003 115
Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>
No plano pedagógico duas políticas do governo federal no ensino
fundamental – os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e a avaliação
(SAEB) – explicitam, ao mesmo tempo, o caráter dedutivo e, pelo alto das
propostas educacionais do Governo Cardoso, apontadas acima por
Cunha, a sua perspectiva economicista e mercantilista.
Esta característica de definição pelo alto não só se contrapôs a lutas
históricas e a inúmeros estudos construídos com base na realidade socio-
cultural e econômica do país, mas na forma em que se realiza está repleta
de incongruências. Por diferentes ângulos as análises de Edith Frigotto,
Lucíola L. de P. C. Santos e de Alicia Bonamino e Silvia A. Martinez
realçam estas contradições e seus efeitos imobilizadores que interferem
negativamente sobre os processos de construção do conhecimento.
Para Edith Frigotto (1999), o governo proclama a importância de
as escolas produzirem, dentro de suas realidades e de forma participativa,
seus currículos e propostas político-pedagógicas. Essas propostas, todavia,
vêm sendo atropeladas por diferentes mecanismos e exigências que
transformam, na prática, os PCNs, produzidos por especialistas e consulto-
res distanciados das condições concretas da realidade brasileira, numa
imposição obrigatória. A autora destaca como mecanismos que induzem
ao constrangimento obrigatório, entre outros, o Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica (SAEB), montado a partir dos PCNs, a política
do livro didático e a formação nacional dos professores da educação básica
em serviço.
Lucíola L. de P. C. Santos (2002), numa mesma perspectiva de
análise, mostra que a concepção dos PCNs, tal qual foi proposta, apresenta-
se inviável, tanto do ponto de vista da natureza do processo de construção
curricular, que implica constante construção e reconstrução a partir de
realidades concretas, quanto das condições objetivas de sua realização e
avaliação. A pesquisadora pergunta:
116 Educ. Soc., Campinas, vol. 24, n. 82, p. 93-130, abril 2003
Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>
efetivam os sistemas municipais de educação ratifica-se de forma
emblemática no fato de, como mostram Alicia Bonamino e Silvia A.
Martinez, o Ministério da Educação ignorar os estudos e as próprias
Diretrizes Curriculares Nacionais produzidas pelo Conselho Nacional
de Educação. Para as autoras o processo de constituição dos PCNs pelo
MEC e das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) pelo CNE estabeleceu
uma inversão e uma omissão mútua. “Percebemos que se tratava de
uma política construída num movimento invertido, no qual os PCNs,
apesar de serem instrumentos normativos de caráter mais específico,
foram construídos e encaminhados de forma a reorientar um instrumen-
to de caráter mais geral como as DCNs” (Bonamino & Martinez, 2002,
p. 385). A inversão a que se referem é coerente com a decisão do Execu-
tivo de impor à sociedade um Conselho Nacional de Educação consulti-
vo e subordinado ao MEC e não um Conselho, como analisamos acima,
autônomo e deliberativo.
O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB)22
constitui-se em mais um instrumento coercitivo, também produzido pelo
alto, e que tem um efeito desagregador e inócuo se consideramos os
aspectos acima apontados por Santos (op. cit.). O que o MEC recolhe são
dados que, se efetivamente analisados como o faz uma pesquisa da
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, acabariam
reprovando o conjunto de políticas do próprio Ministério.23 Trata-se de
uma avaliação que não avalia as condições de produção dos processos de
ensino e que não envolve diretamente o corpo docente, portanto não é
avaliação e sim uma mensuração simples. A forma de divulgação e o uso
desta “medida” como avaliação punitiva pelo Ministério da Educação ou
a sua utilização seletiva como critério de acesso ao nível superior e ao
emprego ampliam as suas deformações. Ressaltamos que não se trata de
negar o direto e o dever do Estado de avaliar, o que está em questão é o
método, o conteúdo e a forma autoritários e impositivos de sua
implementação.
Educ. Soc., Campinas, vol. 24, n. 82, p. 93-130, abril 2003 117
Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>
de nível médio técnico, mas também cursos de nível superior (graduação
e pós-graduação em engenharia industrial e tecnólogos, licenciaturas
plena e curta nas áreas de formação de professores e especialistas, cursos
de extensão, especialização e aperfeiçoamento, e pesquisas na área técnico-
industrial – art. 2º). Na prática, o governo do general Ernesto Geisel dava
uma nova função às escolas que ministravam cursos de engenharia de
operação, naquele momento em situação delicada porque a procura maior
era a engenharia plena das universidades.
A “educação tecnológica” pode ter sido apenas mais um novo
nome para a realidade que se desejava criar. No entanto o desenvolvi-
mento científico-tecnológico, que fazia parte do ideário nacional-
desenvolvimentista dos militares no poder desde 1964, era uma reali-
dade em expansão no mundo ocidental.
Nas últimas décadas, o desenvolvimento científico-tecnológico
responde por um novo fator fundamental: disponibilidade ampla da
microeletrônica e baixos custos no processamento da informação. Toma
força um processo de profunda reestruturação do aparato produtivo
com a incorporação de tecnologias intensivas em informação com base
na microeletrônica (Ciavatta, 2002, p. 60). Eleva-se a composição
técnica do capital e altera-se a divisão internacional do trabalho, sua
divisão social, sexual e de reprodução humana (Gitahi & Rabelo,
1997). Surge um novo perfil ocupacional no qual é sensível o aumento
dos requisitos educacionais para o mercado formal. Há uma progressiva
substituição da força física pelas “capacidades intelectuais”.
Esta é a base do que Adam Schaff (1990) chamou de “sociedade
informática”, assinalando tendências, hoje, em grande parte realizadas,
tais como sociedade do tempo livre/sociedade do desemprego,
qualificação/desqualificação, centralização/descentralização, autonomia/
controle etc. É o que hoje se denomina “sociedade do conhecimento”,
cujas análises destacam a nova sociabilidade do capital. Na competição
entre os capitais e na subordinação do trabalho ao capital, essas análises
elidem a questão das classes sociais. Neste contexto, no plano político-
ideológico, ganham divulgação as teses da sociedade pós-industrial,
pós-capitalista, pós-moderna, sociedade sem classes, fim da história,
fim das ideologias, interpretações parciais de processos complexos, teses
que não revelam seus interesses particulares e sua própria ideologia.
Neste trabalho, consideramos que o projeto educacional, em seu
conjunto, não pode estar desvinculado do projeto social mais amplo.26
Antes, deve estar articulado às políticas de desenvolvimento econômico
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locais, regional e nacional; às injunções do desenvolvimento científico-
tecnológico; às políticas de geração de emprego, trabalho e renda, junta-
mente com aquelas que tratam da formação e da inserção econômica e so-
cial da juventude. Supõe que se mobilize a capacidade produtiva nacional
em favor do crescimento, aproveitando toda a capacidade técnica, empre-
endedora e criadora do povo.
A reforma educacional praticada pelo Governo FHC, no seu conjun-
to e, em particular, em relação à educação tecnológica e à formação
profissional, foi coerente com o ideário do liberalismo conservador em
termos econômicos e sociais, tanto na concepção quanto na ação prática.
O Decreto nº 2.208/97 é uma síntese emblemática desse ideário. Esse
decreto foi complementado, como instrumento coercitivo, pela Portaria
do MEC nº 646 de 1997, que obriga os Centros Federais de Educação
Tecnológica a restringirem em 50% as matrículas do nível médio integra-
do, das oferecidas em 1966, com o indicativo de extensão futura. A arma
do MEC para isso era a concessão de mais ou menos recursos de acordo
com a adesão à portaria. No plano pedagógico, a Resolução nº 04/99 e o
Parecer CNE/CEB nº 16/99, que traçam as Diretrizes Curriculares Nacio-
nais para os cursos técnicos de nível médio, escancaram a perspectiva
economicista, mercantilista e fragmentária mediante a pedagogia das
competências e a organização do ensino por módulos, sob o ideário da
ideologia da empregabildiade.
Ele reinstaura uma nova forma de dualismo na educação ao separar
a educação média da educação técnica. Por isso ele é incompatível, teori-
camente e em termos de ação política, com um projeto democrático de
educação adequado ao baixo nível de escolaridade básica e de formação
profissional da população economicamente ativa, no sentido de superar
essa realidade.
Ainda não há um acúmulo de conhecimento para se saber,
exatamente, os termos de implantação da reforma nos CEFETs a partir
do Decreto nº 2.208/97. Algumas instituições aderiram ao projeto do
governo. Outras estudam sua adaptação. A Câmara de Ensino do
Conselho de Diretores dos CEFETs (CONCEFET) e o Fórum de Diretores
de Ensino dos CEFETs, a partir do projeto pedagógico implementado
nas instituições federais de educação tecnológica, elaboraram um
documento onde registram “um novo modelo pedagógico pautado no
desenvolvimento de currículos por competências”.27 De outra parte,
defendem que “a educação tecnológica deve abranger todas as dimen-
sões da vida e desenvolver todas as potencialidades científicas, sociais,
políticas e culturais”, sinalizando que isso “ultrapassa os limites do
Educ. Soc., Campinas, vol. 24, n. 82, p. 93-130, abril 2003 119
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ensino tradicionalmente chamado técnico, ao integrar o saber e o fazer”
e a reflexão sobre significado destas ações em uma sociedade em que os
valores humanos estão em transformação (Conselho, 2002).
Coerentemente com as reflexões e experiências teórico-políticas de
especialistas e trabalhadores da educação em todos os níveis do sistema
educacional no país, acumuladas historicamente, cabe a defesa de uma
escola unitária, que supere o dualismo da organização social brasileira,
com conseqüências para a organização do sistema educacional. O que
significa a superação definitiva da concepção que separa a educação geral,
propedêutica, da específica e profissionalizante, a primeira destinada aos
ricos, e a segunda, aos pobres. Essa perspectiva não admite subordinar a
política educacional ao economicismo e às determinações do mercado,
que a reduz aos treinamentos para preenchimento de postos de trabalho
transitórios. Isso supõe recuperar, no plano conceitual, o debate da con-
cepção de educação tecnológica ou politécnica, fundamental na orienta-
ção da educação básica e, em especial, do ensino médio das escolas
técnicas federais e estaduais e dos Centros Federais de Educação Tecnoló-
gica. Por essa concepção, a educação básica estrutura-se em consonância
com o avanço do conhecimento científico e tecnológico, fazendo da
cultura técnica um componente da formação geral, articulada com o
trabalho produtivo. Isso pressupõe a vinculação da ciência com a prática,
bem como a superação das dicotomias entre humanismo e tecnologia, e
entre formação teórica geral e técnica instrumental.
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médio e técnico com forte acento nos cursos breves, modularizados para
a crença na “empregabilidade”.
O Governo Cardoso deixa de herança uma enorme dívida social
com o agravamento de todos os indicadores sociais – “o pior período na
história republicana desde Prudente de Moraes” –, como demonstram as
análises de Francisco de Oliveira e Perry Anderson acima sinalizadas.
Concordamos com a análise de Sader (2002) de que “foi o fracasso
do neoliberalismo tardio de Cardoso que propiciou o favoritismo de Lula
nas eleições de 2002”. A vitória das forças políticas e sociais, e dentre
estas, de uma maioria que efetivou resistência ativa tanto à ditadura “civil-
militar” quanto à ditadura do capital mediante as políticas neoliberais,
tem a tarefa e o compromisso ético-político de uma inversão de direção
primeiramente do modelo econômico, condição de mudanças concomi-
tantes na esfera social e educacional. Mas é bom que se tenha presente
que a herança Cardoso, paradoxalmente, em seus efeitos de compromis-
sos, acordos e “dogmas” institucionais, perdura como uma esfinge a ser
decifrada pelo atual governo ou este será por ela devorado.
Em face desta herança, o novo governo precisa, como exorta Celso
Furtado, “de muita coragem” para enfrentar a situação de um Brasil
“ameaçado de um processo de desagregação. O governo Lula tem o
desafio de conter essa desagregação” (Furtado, 2003, p. 7-8). Nos dois
primeiros meses de governo, mesmo sob intensa popularidade, de um
modo geral, a inversão de direção, salvo em alguns setores, ainda é
tímida. Na área econômica, núcleo central e decisivo para qualquer
mudança substantiva, os sinais, paradoxalmente, são de estranha
continuidade. Por isso, Francisco de Oliveira, um dos intelectuais de
esquerda fundadores do Partido dos Trabalhadores e renomado cientista
social, cobra que o governo ouse “ultrapassar” a “era FHC”. “O governo
Lula ou ultrapassa a ‘era FHC’ ou estará definitivamente classificado dentro
dela e, no futuro, historiadores e sociólogos reconhecerão um longo
período de hegemonia neoliberal que engloba FHC e seus sucessores por
um tempo que, hoje, não é previsível” (Oliveira, 2002, p. 6).
A inversão de direção e a ultrapassagem da era Cardoso pressu-
põem recuperar ou, quiçá, construir e dilatar a face pública do Estado
brasileiro e torná-la efetivamente democrática para que se constitua em
formulador e coordenador de políticas que garantam os múltiplos direitos
sociais e subjetivos aos que, até o presente, foram excluídos. Para que isso
seja possível, como lembra Celso Furtado, “o povo precisa perceber que a
política não é jogo de elites, mas sim uma disputa pelo poder real”
(Furtado, 2003, p. 7). Trata-se de transformar em poder de fato o
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acúmulo teórico e prático construído pelos movimentos sociais, sindicatos
e partidos de esquerda na resistência mais longínqua dos 502 anos de
colonização reiterada e, mais recentemente, das ditaduras e dos golpes
contra a democracia efetiva. Em muitas oportunidades, vimos o Governo
Cardoso não reconhecer os movimentos sociais organizados como
interlocutores legítimos das negociações necessárias à superação de
algumas fases da crise permanente em que vivemos.28
A síntese a que chegamos, nesta breve análise, é de que no campo
educacional a “era Cardoso” foi de um retrocesso tanto organizativo como
em termos pedagógicos. A atual LDB resultou do desprezo do Executivo
ao longo processo de elaboração da Lei (de 1988 a 1996) pelo Fórum
Nacional em Defesa da Escola Pública. O Conselho Nacional de
Educação teve sua composição alterada para lhe retirar as prerrogativas
de deliberação e submetê-lo às decisões do MEC. O Plano Nacional de
Educação da sociedade brasileira, à semelhança da LDB, foi preterido pelo
expediente questionável de o Executivo não respeitar sua precedência na
entrada no Congresso. O ensino fundamental sofreu as imposições dos
PCNs e da “promoção automática” que, aplicada a todas as séries, elevou
as estatísticas oficiais, mas não os níveis de conhecimento dos alunos (o
que veio a ser demonstrado pelas últimas avaliações levadas adiante pelo
SAEB). A reforma do ensino médio e técnico foi imposta pelo Decreto nº
2.208/97 e pela Portaria nº 646 de 1997 à revelia da resistência de
muitas escolas ao conjunto de medidas que alteraram profundamente
suas instituições. Os PCNs também foram construídos pelo alto, por uma
comissão de especialistas que ignoraram décadas de debates dos pes-
quisadores e educadores da área. Sequer se levaram em conta as Diretrizes
Curriculares elaboradas pelo Conselho Nacional de Educação.
A ultrapassagem que se impõe, no campo educacional, como tarefa
para o novo governo, indica a necessidade de recuperar o imenso esforço
de teorização e de propostas estruturadas pelas 34 instituições científicas,
culturais, sindicais e políticas reunidas no Fórum Nacional em Defesa
da Escola Pública. Mais que isso, cabe apreender os avanços significativos
e ampliar as múltiplas experiências de governos populares municipais e
estaduais, cujos protagonistas políticos pertencem à mesma base do atual
governo e, muitos deles, compõem seus quadros dirigentes.
O foco organizativo e político-pedagógico deste resgate necessita
alargar a compreensão do educativo para além dos muros da escola e
impregnar-se da realidade dos múltiplos movimentos sociais e culturais
da classe trabalhadora e de suas estratégias de produção da vida pelo
trabalho. Este horizonte, sem dúvida, encontra uma síntese emblemática
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na pedagogia do Movimento dos Sem-Terra, para quem os processos
educativos da classe trabalhadora não começam na escola nem acabam
nela. Começam e acabam na sociedade, mas a escola pública, universal,
laica, gratuita, democrática e, portanto, unitária (síntese do diverso) é um
direito e uma mediação imprescindível nas suas lutas e na produção de
sua humanização e emancipação.
Notas
1. Ver a esse respeito Miriam Limoeiro Cardoso (1999).
2. As estratégias acordadas na Conferência previam: para necessidades diferentes, conteúdos, mei-
os e modalidades de ensino e de aprendizagem diversas; prioridade a grupos em situação de
privação: meninas, mulheres, portadores de necessidades especiais; sistemas de avaliação de
resultados; condições materiais, físicas e emocionais para aprender, incluindo saúde, nutrição
etc.; obrigação de o Estado fornecer educação básica com o concurso de organismos governa-
mentais e não-governamentais, setor privado, comunidades locais, grupos religiosos, famílias;
reconhecimento dos saberes tradicionais e do patrimônio cultural de cada grupo, por meio de
modalidades educativas formais e não-formais (Shiroma et al., 2002, p. 58-59).
3. Estas considerações constam originalmente de Frigotto & Ciavatta, 2002.
4. Parece-nos importante a análise de Luiz A. Cunha (2002) que sublinha a necessidade de
percebermos que não se trata linearmente de uma subordinação das elites brasileiras aos
organismos internacionais, gestores do grande capital. Inúmeros quadros de tecnocratas e
intelectuais brasileiros fazem parte desses organismos. O autor analisa especificamente o
caso da educação e evidencia que os protagonistas das reformas no Governo de Fernando
Henrique Cardoso, em grande parte, pertenciam a esses organismos. Maria Abadia da Sil-
va (2002) sintetiza esta relação como sendo de “intervenção e consentimento”.
5. Otavio Ianni (1978) oferece-nos também uma ampla análise sobre o movimento pendular
das propostas de desenvolvimento no Brasil desde os anos de 1930, ora pendendo para
uma associação subordinada com o grande capital internacional, ora buscando uma pers-
pectiva de desenvolvimento com relações no plano internacional, mas de forma autônoma.
6. O ajuste é, na realidade, um reordenamento do capital, em nível global, na busca de re-
cuperar taxas de lucro em queda. Vista de um ponto de vista histórico, a globalização,
como analisa Paul Singer (1996), é a vingança do capital contra as conquistas e os direitos
da classe trabalhadora.
7. Cabe ressaltar, como indica o Boletim Informação em Rede, da Ação Educativa, que “os
serviços e produtos da Fundação Roberto Marinho e da Editora Globo são adquiridos em
grandes quantidades, envolvendo valores elevados, sem concorrência ou licitação pública”.
Para se ter uma idéia da magnitude dos valores envolvidos, esse mesmo Boletim revela
que o governo estadual do Maranhão assinou um convênio de R$ 102 milhões com a Fun-
dação Roberto Marinho para a instalação de 3.750 telessalas. (Boletim Informação em Rede,
Ação Educativa, São Paulo, ago. 2001, 5, (38), p. 2).
8. Para uma ampla e profunda análise da perspectiva educacional centrada na “pedagogia das
competências”, ver Ramos (2001).
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9. O SAEB “relaciona-se às demandas do Banco Mundial sobre a necessidade de avaliação do
impacto do Projeto Nordeste, segmento Educação, no âmbito do IV Acordo MEC- BIRD (...),
aliadas ao interesse do MEC de implementar um sistema mais amplo de avaliação da educa-
ção”. O que redundou na criação do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Público de
1º grau (SAEP) no final dos anos 80. Sua implantação, por uma questão de recursos, veio a
ocorrer em 1990 quando a Secretaria Nacional de Educação Básica viabilizou o primeiro
ciclo do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Bonamino & Franco, 1999,
apud Martins, 2001, p. 431-432).
10. Esta perspectiva pedagógica daquilo que “serve ao mercado” era a máxima adotada nas séries
metódicas do SENAI desde sua origem e, agora, foi trazida para o sistema de educação básica.
Ver a esse respeito Frigotto (1977).
11. Um único parlamentar do Partido da Frente Liberal ( PFL ) da Bahia apresentou mais de
mil destaques ao projeto de LDB que tramitou na Câmara e que em sua elaboração teve a
participação massiva dos educadores.
12. Algumas das idéias desenvolvidas nesta seção constam de Ciavatta, 2002a.
13. Para citar os que conduziram à adoção do enfoque mão-de-obra para determinação de me-
tas educacionais, isto é, à fixação de metas com base em projeções de necessidades futuras
de mão-de-obra para o mercado de trabalho, a partir do Plano Nacional de Educação ela-
borado pelo Conselho Federal de Educação em 1962: Programa de Ação Econômica do
Governo (1964-1966); Plano Decenal de Desenvolvimento Econômico e Social (1967-
1976); Programa Estratégico de Desenvolvimento (1968-1970); V Plano Nacional de
Desenvolvimento da Nova República – 1986-1989, aprovado pelo presidente José Sarney
na forma da Lei nº 7.486 de 6/6/1986 (Horta, 1982, p. 127 ess. E 1997, p. 169 e ss.).
14. A elaboração do PNE da sociedade brasileira tem se realizado, a partir da aprovação da atual
LDB em 1996, por meio dos Congressos Nacionais de Educação (CONEDs). Buscando garan-
tir o espaço público de debate historicamente preenchido pelas Conferências Brasileiras de
Educação (CEBs, 1980 a 1991), o I CONED (1996) e os subseqüentes, II CONED (Belo Hori-
zonte, 1997), III CONED (Brasília, 2000), IV CONED (São Paulo, 2002), mantêm o mesmo
tema central, “Educação, Democracia e Qualidade Social”, como um esforço coletivo de con-
solidar um Plano Nacional de Educação que “garanta direitos, verbas públicas e vida digna”.
15. “Apesar da propaganda oficial em seu favor, o FUNDEF pode enfraquecer outros níveis e mo-
dalidades de ensino (educação infantil, ensino médio e supletivo), cujas matrículas de tra-
balhadores não são levadas em conta na distribuição do FUNDEF. Além disso, o discurso fe-
deral de valorização do ensino fundamental e do magistério não encontra a contrapartida
dos recursos federais que são ínfimos e bem menores do que os devidos legalmente”
(Davies, 1999, p. 1).
16. O fenômeno não é novo; ver Franco, 1984.
17. No balanço sobre o FUNDEF, divulgado pelo MEC em outubro de 2000 (www.mec.gov.br),
as matrículas estaduais e municipais no Ensino Fundamental Regular (EFR) “teriam cresci-
do 2,3 milhões nas redes públicas de 1997 a 1999, graças ao FUNDEF. Entretanto, a pro-
paganda oficial não revela que este aumento se deve em grande parte à inclusão, no EFR, de
785 mil matrículas de classes de alfabetização ( CA), de 100 mil de educação de jovens e
adultos (EJA), e cerca de 400 mil perdidas pelo setor privado e provavelmente incorpora-
das às redes municipais, sem falar na falsificação de matrículas, problema reconhecido
pelo próprio Ministério da Educação, e que gerou portaria cancelando matrículas de redes
de alguns governos ansiosos por aumentar a sua fatia do FUNDEF” (Davies, 2003, p. 1).
18. No momento em que estávamos produzindo este texto, o jornal O Globo apresentou uma
matéria sobre uma auditoria que estava sendo feita no Ministério da Educação, a qual nos
dá conta de que somente em dezembro de 2002, último mês do Governo Cardoso, foram
124 Educ. Soc., Campinas, vol. 24, n. 82, p. 93-130, abril 2003
Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>
autorizados 434 novos cursos superiores e que “entre as irregularidades encontradas está a
autorização de cursos em instituições universitárias que sequer estavam credenciadas para
funcionar” (O Globo, 26/2/2003, p. 10).
19. De acordo com o relatório do Banco Mundial de 2002, de 89% em 1996 para 96% em
2001. Ver Relatório do Banco Mundial nº 24413- BR – Educação Municipal no Brasil.
Recursos, Incentivos e Resultados. Vol. 1, dezembro de 2002.
20. Para uma compreensão mais ampla da descentralização da educação fundamental no con-
texto das políticas federativas do Governo Cardoso, ver Arretche (2002).
21. Se tomarmos os dados do relatório “Futuro em Risco”, patrocinado pela Inter-American
Dialogue e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, que trata da crise da educação na
América Latina e das conseqüências na estagnação econômica, veremos o quanto falaciosa e
enganosa é a propaganda de que as reformas educacionais, mormente do ensino fundamen-
tal, coadunam-se com os desafios da competitividade internacional no contexto de socieda-
des “globalizadas”. Ao passo que o custo aluno/ano, base do FUNDEF, é de aproximadamente
400 reais, aquele relatório nos mostra que o grau médio de gasto aluno/ano para o ensino
fundamental e médio, nos países desenvolvidos, é de 4.170 dólares (ver Frigotto, 2000).
22. O ENEM e o Provão, respectivamente no ensino médio e superior, reproduzem a mesma lógica.
23. Ver a esse respeito Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (1999 e 2001) e
Carlos Abicalil (2002).
24. Agradecemos à professora Maria Célia Freire de Carvalho as indicações legais e os comentá-
rios críticos sobre o tema.
25. Posteriormente, no Governo Itamar Franco (1992-1993), por intermédio da Lei nº 8.948
de 8/12/1994, fica instituído o Sistema Nacional de Educação Tecnológica (art. 1º), que vai
transformar todas as Escolas Técnicas Federais em Centros Federais de Educação Tecnológica
(CEFETs), obedecidos os critérios nos termos da Lei (art. 3º). Depois da promulgação da LDB,
Lei nº 9.394 de 20/12/96, e do Decreto nº 2.208 de 17/4/1997, o Decreto nº 2.406 de
27/11/1997 virá regulamentar o art. 40 da LDB e o art. 2º do Decreto nº 2.208 que distin-
gue três níveis da educação profissional, o básico, o técnico e o tecnológico, este último “cor-
respondente a cursos de nível superior na área tecnológica, destinado a egressos do ensino
médio e técnico” (inciso III).
26. Parte destas reflexões constam de Frigotto & Ciavatta, 2002.
27. O documento não se estende sobre o significado específico do modelo. Para uma revisão da
polêmica que envolve o conceito de competências, ver, entre outros, Deluiz, 1995; Ramos,
2001; Tanguy, 2002.
28. A primeira delas foi a resposta policial à greve dos petroleiros em 1996. No movimento
docente, greves prolongadas e desgastantes foram resultado da política do MEC de não rece-
ber os representantes dos servidores públicos para negociar as reivindicações da categoria.
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