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OPÚSÇULOS DE FORMAÇÃO
Para uso das Congregações Marianas
1. Série
CU R SO DE F O R M A Ç A O RELIGIOSA
2. O p ú s c u lo :
O DRAMA
DA
HUMANIDADE
PUBLICAÇÕES
d«
/ CONFEDERAÇÃO NACIONAL DAS CONOREOAÇÕES MARIANAS
Rl« d* — Ru« S«n«d«r D«nt«s, 118 • P.® ■
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DA
HUMANIDADE
por
P. WALTER MARIAUX S. J.
D i r e t o r do S e c r e t a r i a d o G e r a l das
C o n g r e g a ç õ e s M a r i a n a s em Roma
Prefaciado pelo P. L E O N E L F R A N C A S . J .
COLÊQkO anchíeta
..-t Í, N. Fflburgo - Cst. do Ri°
■ \ t' -' Biblioteca
C EOlTORAt •
ED IÇÕ ES T É C N IC A S BRASILEIRAS LTDX
Rua da Figueira, S0»B • Caixa 3798 - TeL 3-5345 - S. Paulo
O DRAMA
DA
HUMANIDADE
Imprimi potest
Rio de Janeiro, 8 de Setembro de 1941
P. Luiz Riou S. J.
Prep. Prov. do Bras. Central.
Imprimatur
+ Sebastião
Cardial Arcebispo do Rio de Janeiro
R E C O M E N D A Ç Ã O
dos “Opúsculos de Formação”
por
S.a Emin. o Sr. Cardial Leme
17 de Janeiro de 1941.
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J:
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T^iejáció
dó 7^e. £eóneê- 'frumca vf.
P. Leonel Franca S. J.
Introdução
Manhã de domingo. Um congregado mariano
ençontrou-se com um amigo:
Vai à igreja?
0 outro hesitou: Não; estou pensando em ir
assistir ao culto dos Protestantes.
Você, Protestante? Como é possível?
Há pouco presenciei uma cerimônia dêles, e ouví
o sermão do pastor. Se visse, como falou bem, cheio
de sentimento, e com voz tão simpática! Disse ex
pressamente que sua religião procura satisfazer ao
coração, inundando-o de sentimentos nobres e divinos,
em oposição à religião católica que obriga os fiéis a
crer num sem número de dogmas, fomentando assim
um “inteledualismo” frio. O Protestantismo culti
va a vida espontânea, não se entretendo com discus
sões e. polêmicas inúteis; cada um pode crer no qxie
lhe apraz. 0 que importa é ter confiança em Nosso
Senhor Jesús Cristo.
E daí? '
Daí. . . acho esta religião muito mais simples do
que. a católica. Satisfaz muito mais ao meu cora
ção ... A religião católica sempre me causou, uma
impressão de frièza. Lembra-se daquelas mil' per
guntas de catecismo que devíamos decorar cegamen
te? Quantas vêzes me perguntava: para que saber
13
tudo isto? De que serve para minha vida religiosa?
Acho que se pode muito bem ser cristão, sem saber
responder a tantas perguntas! ...
O congregado ficou surpreso sem saber que res
posta dar. Nunca pensara em tal. De repente,
ocorre-lhe uma idéia. Desculpe, disse, porém fala
remos nisto mais tarde. Quer acompanhar-me? Vou
assistir a uma cerimônia comemorativa. Trata-se de
um amigo que morreu há vários anos.
Ah, e hoje é o dia aniversário?
Sim, mas seus amigos organizam uma cerimônia
cada semana.
Cada semana?
Sim, pois êle o merece! Sabe que lhe devo
tudo? E sua morte foi muito singular. Morreu
assassinado.
Assassinado?
Sim, e morreu como herói!
Mas isto è deveras comovente!
E’... Muitos há entretanto que se interessam
pouco por êle; mesmo alguns que se dizem amigos,
não querem mais assistir a tais cerimônias comemo
rativas ...
Que vergonha!
Você tem razão, ê uma vergonha... Eis-nos
chegados. Entremos.
M as... isto ê uma igreja?
Precisamente.' Vamos assistir à comemoração
da morte do nosso melhor amigo; vai ser agora.
14
Que quer dizer isto?
Você não sabe, que ê a morte heróica de Jesús,
que se representa, ou melhor, que se renova no altar,
na Santa Missa? E’. esta a história comovente, que
nos ensina o dogma “frio e seco” e todo o Catecismo
com suas “mil perguntas”. Elas não fazem mais que
explicar, quem enviou aquele' nosso amigo Jesús
Cristo, quem foi Jesús Cristo, como viveu, porque
morreu e que espera de nós.
0 amigo ficou pensativo. A partir daqUêle mo
mento começou a desvendar-se para ele o verdadei
ro significado dos dogmas e a conexão da doutrina
católica com a vida religiosa.
Quantos não se encontram na situação triste
daquele amigo?... E porque? Porque não conhe
cem bastante sua religião e a concebem duma manei
ra superficial. Conhecem, apenas, fragmentos da
doutrina católica. Toda d Fé católica lhes parece
uma coleção de dogmas empilhados como um montão
de pedras, e só sabem lastimar-se das infinitas per
guntas do catecismo. Além disso contentam-se com
aprendê-las- de cor, trabalho de memória, sem jamais
tirar as consequências das verdades aprendidas, sem
familiarizar-se com o mundo sobrenatural, sem re
fletir. Por isso estas verdades da Fê permanecem
estéretSj descoradas, abstratas, extranhas à vida.
Podemos afàáo.extranhar que com tinta tal con
cepção, cada vez mais esmoreça o entusiasmo, a ale
gria espiritual e a.fôrça viva da convicção religiosa?
15
Não há dúvida alguma que, nas apostasias da
Igreja, desempenha papel decisivo esta ignorância e
superficialidade no campo dos conhecimentos reli
giosos.
E’ este mal que queremos remediar com as ex
plicações seguintes. Por isso exporemos as verda
des da Fé na sua conexão mútua e na sua transcen
dência para a vida.
Eis o nosso apelo, jovem católico, donzela ca
tólica, e mais que ninguém, congregado mariano:
aprende a conhecer a tua Fé.' A Fé integral, o dog
ma sem restrições, o mistério da Santíssima Trin
dade, do Homem-Deus Jesús Cristo, da Igreja, —
todas as verdades desde a creação do mundo até o
juízo universal e a vida eterna.
Hoje em dia, não basta mais estar ao par de
uma ou outra verdade apenas. Lê, estuda, pois, con
gregado mariano, êstes opúsculos, que, em sua série,
tc apresentam, na íntegra, o dogma católico.
Duas cousas, como o evidenciamos há pouco, no
exemplo aduzido, duas cousas sobrelevam a todas em *
importância: conhecer os dogmas na sua coesão orgâ
nica e conhecer-lhes a projeção sôbre a vida prática.
Àpresentamos primeiro uma vista de conjunto.
No decorrer do cur.so, a cada passo faremos sobres
sair a articulação dos diversos dogmas entre si.
Além disto, pretendemos mostrar a irradiação das
doutrinas da Igreja sôbre a vida cristã. Encontras,
pois, aqui esplanada a. moral católica, que quanto
16
for possível, apresentaremos em suas dependências
com as verdades da Fé.
Sem dúvida, o estudo aprofundado destes opús
culos exige paciência e energia. Porém, sem receio,
confiamos que a juventude desta terra tradicional-
mente católica está possuída de uma alta e entranhada
estima das doutrinas da Igreja.
Quando tiveres assimilado bem esta série de
opúsculos, repetiremos nossa pergunta: Conhecer
a Fé, significa conhecer o maior número possível de
téses isoladas? E constituirão elas um amálgama
sem unidade ou uma Catedral unida e coesa? Além
disto: as verdades da Fé são apenas conhecimentos
platônicos da inteligência, ou influenciam sobre a
vida? São um museu de antiguálhas ou uma nascen
te de vida?
Tu mesmo, partindo de tuas íntimas convicções
formularás a resposta: A Fé católica é o mais gran
dioso monumento levantado no mundo; nele palpita o
gênio do artífice — o Filho de Deus.
Ser cristão, católico, significa alimentar e fe
cundar a vida humana com as torrentes do mais ine
fável mandai de vida, com a vida do próprio Deus
uno e trino.
Capitulo I.
Unidade dos dogmas
Os dogmas da Igreja! Talvez 6 leitor extra-
nhe, ouvindo a palavra “dogma”, que instintiva-
mente lhe evocará a idéia de soleníssimos Concílios,
como o de Trento,‘ no século XVI, em que quasi 250
Arcebispos e Bispos reunidos em 25 sessões baixa
ram numerosos decretos e cânones, fixando verdades
dogmáticas; ou como o último Concilio universal do
Vaticano, em que mais de 700 Arcebispos e Bispos,
sob a presidência do Papa, definiram entre outras
coisas a infalibilidade do Sumo Pontífice... Pen
sará em definições solenes como a da Imaculada
Conceição dá Santíssima Virgem Maria, feita em
1854 pelo Papa Pio IX ...
E ’, pois, a estas definições dos Concílios e do
Papa, cabeça infalível da Igreja, que chamamos
dogmas ?
Certamente, mas a palavra / ‘dogma” abrange
muito mais ainda, pois dogmas são todas as verdades
reveladas por Deus e propostas pelo magistério in
falível da Igreja como objeto obrigatório da Fé.
Ora, não é só nas definições solenes que a Igre
ja propõe certas verdades como tais, mas também
na pregação regular e quotidiana. Pois, a Igreja
identifica-se com o Cristo místico; e é Deus mesmo
que por sua boca fala aos homens.
Dogmas são portanto a totalidade das verdades
reveladas e comunicadas aos homens pela Igreja,
como objetos obrigatórios da nossa Fé.
Mas, não são estes dogmas fórmulas rígidas,
mortas e inalteráveis, ém que ninguém pode jamais
tocar? E só por tê-lo tentado, não foram muitos
estigmatizados como hereges?... A Igreja não nos
impõe teses cristalizadas, em lugar de nos comunicar
vida verdadeira e estuante?...
Responderemos ainda mais pormenorizada-
mente a estes pontos. Por enquanto baste dizer que
os dogmas são a palavra de Deus, são comunicações
feitas por êle mesmo à Igreja, que sob a assistência
do Espírito Santo as revestiu duma fórmula verbal.
Comunicações divinas! Quem havería de pen
sar que o Deus vivo nos tenha querido impor fór
mulas sem vida! Não, os dogmas significam rea
lidades grandiosas e fecundas.
Mas, é antes de tudo necessário encarar o con
junto, a conexão das verdades dogmáticas. Pois,
os dogmas constituem uma unidade.
I — Uma parábola.
Ouçamos, para começar, uma pequena história.
Um magnata da indústria, por pura bondade,
dignou-se tratar com distinção um casal de operá-
19
rios. Adota-o, e o constitue herdeiro de sua imen
sa fortuna. Um dia, porém, dá-se uma cena de dis-
senção veemente: o casal adotado desprezando a ami
zade do benfeitor, renuncia para si e para seus des
cendentes à fortuna e à herança.
Mas, coisa curiosa! o rico aproveita desta oca
sião para um rasgo grandioso de bondade. Come
ça a cumular o casal de operários e seus filhos com
sinais de benevolência. Não desiste apesar de vêr
que seu amor não encontra correspondência nem
compreensão. Parece mesmo que quanto maior se
torna a caridade do senhor, tanto mais cresce o ódio
dos operários.
Um dia, envia-lhes seu próprio Filho, que se
hospeda com os operários, come e bebe com êles, tor
na-se mesmo operário. Êles contudo o odeiam, es
carnecem dêle, e, finalmente o assassinam.
Então o capitalista declara aceitar a morte do
Filho como' expiação das gravíssimas injúrias rece
bidas. Estava pronto a perdoar tudo e a comuni
car de novo os bens e direitos que outorgara ao pri
meiro casal operário. Os que então se mostrassem
dignos do seu favor seriam admitidos, um dia, à
comunidade de vida com êle, em sua casa.
Uma simples narração, é verdade.. Porém, os
dogmas mais importantes estão compreendidos nela.
Basta trocar os nomes às pessoas da nossa his
torieta, dar-lhe um sentido universal, e teremos —
o drama da Redenção divina do munido.
20
As partes da parábola correspondem a o s
dogmas seguintes:
0 magnate da indústria Dogma de Deus, Senhor do
Universo, infinitamente fe
liz na sua unidade miste
riosa de Pai, Filho e Es
pirito Santo, habitando na
"luz inacessível".
REVELAÇAO — CRISTIANISMO
REDENÇÃO
Com efeito, qualquer um destes títulos: “Reve
lação’'. “Cristianismo”, “Redenção” se enquadra
perfeitamente nos sucessos da nossa narração.
.-V • ; .;
laridades.
Esta magnífica unidade levará de vencida mil
dificuldades. Muitos catolicos hoje se extraviam
da fé por objeçõezinhas miseráveis. Ouvem falar
de um sacerdote de má nota, não alcançam o sentido
de uma disposição da autoridade eclesiástica — no
fundo não passa isto de um pequeno abalo — e se
desviam da Igreja. Porque? Conheciam apenas a
superfície, nunca penetraram o íntimo de sua reli
gião. Deixam-se empeiar por minúcias, e não go
zaram nunca de uma vista de conjunto.
E’ preciso que nos persuadamos intimamente
desta concatenação essencial de nossos dogmas-
Dêmo-nos ao trabalho de descer ao sentido profun
do de nossas práticas religiosas. Mandamentos e
proibições, deveres humanos e dons divinos, trave-
35
,mos sempre tudo isto no vasto sistema que nêste ca
pítulo aqueceu o nosso espírito. Aos primeiros cris
tãos, sem dúvida, eram muito familiares estas arti
culações de nosso dogma. Não extranharíamos
hoje o júbilo que manifestavam em seus escritos,e
em face dos tiranos, se nos lembrássemos que eles
tinham consciência da grandiosidade da redenção.
Oxalá tivéssemos hoje em dia mais cristãos,
que, como êles, solidamente apanhassem o sentido
fecundo e a opulência de nossa religião. Esforcê-
mo-nos, pois, sempre que fôr possível, por expôr o
conteúdo de nossa fé, em breves traços e com pala
vras próprias. Aproveitemos de todas as oportuni
dades para formular estas idéias. E com boa von
tade, se acham sempre tais ocasiões.
Se és, por ex., pai de família, não podes então pro
porcionar a teus filhos, sob a forma de uma narração ca
tivante, a grande história de nossa salvação? Se és o ir
mão mais velho, não podes fazer o mesmo com teus ir
mãos menores? Pois ainda que êles já tenham aprendido
no catecismo muitas particularidades, uma narração assim
compacta tem extraordinário valor para a concepção de
nossos dogmas como tuna realidade viva. Tens amigos,
conhecidos, cuja fé talvez agoniza? Fala-lhes da beleza
e da sublimidade dos dogmas de nossa fe, da-lhes a ler
êste capítulo, e incita-os a falar também disto a saus
filhos.
4?
Capítulo III
Necessidade dos dogmas
A grandiosa unidade e inefável beleza da dou
trina da Igreja obrigam-nos a ser gratos para com
Deus que no-la doou em sua revelação; esta reve
lação torna supérflua quaisquer interrogações a res
peito da necessidade dos dogmas. Contudo não dei
xa de ser útil tratar sôbre ela, uma vez que muitos
a contestam. Os dogmas são necessários, eis o que
afirmamos.
I — Porque asseguram a palavra de Deus contra
a desagregação.
Muito raramente se resolve a Igreja infalivel
de Cristo a uma definição dogmática. Infundado,
portanto, e inútil é o temor de certos espíritos que
receiam ser oprimidos sob um fardo insuportável de
injunções doutrinárias.
Se porém a Igreja declara um dia uma verda
de como dogma, não o faz tiranicamente. E ’ de
suma importância que entendamos bem o verdadeiro
sentido de cada definição dogmática: não é a ambi
ção de dominar o§ espíritos, é simplesmente delimi
tar e assegurar a posição de uma verdade, cujo autor
é Deus.
37
E em direito, não deve Deus, revelador das rea
lidades tão transcendentais, que em singela narração
resumimos nos capítulos anteriores, — verdades, em
torno das quais giram o céu e o inferno, a nossa
eterna salvação e a nossa eterna condenação —, não
deve Deus defendê-las do perigo da destruição, do
esfacelo e da falsificação? De outra forma não
haveria risco de que, com a negação de uma só ver
dade, viesse a ruir tôda a construção, e de que a
economia da salvação se tornasse uma irremediável
ilusão ?
Encontram-se sempre alguns espíritos fortes
que condenam e rejeitam estas declarações precisas
e exatas, frutos de longa e madura consideração
diante de Deus; e menoscabando o que o próprio di
vino Espírito Santo inspirou, apelidam-nas impia-
mente de formulação conceituai e “inteletualista”.
Mas deveríam esses espíritos refletir seriamen
te, uma vez siquer, sobre os nefandos resultados que
traria consigo um texto dogmático, vago e indeter
minado, sem palavras claras e precisas, sem a distin
ção exata e minuciosa do verdadeiro e do falso; do
verdadeiro para se crer, e do falso para se rejeitar.
Porque senão, uma interpretação errônea, um.
mal entendido voluntário ou involuntário, uma falsi
ficação enfim de um dogma, seria a ruína da ver
dade e uma perpétua fonte de ânsias, temores, du
vidas e incertezas sôbre a integridade de sua fe, para
as almas ávidas e bem dispostas de inumeráveis
fiéis. Por isso é imprescindível, é absolutamente.
38
necessária uma exatidão e precisão escuipulosa no
formular e definir verdades de fé.
Vejamos alguns exemplos:
' Foi por acaso supérfluo apresentar como dog
ma a união da natureza divina e humana em Cristo .J
Mas não depende por acaso todo o merecimento da
sua Paixão e com ela tôda a obra da salvação, por
tanto o Cristianismo mesmo, de que Cristo possua
tanto a natureza divina, como também a humana in
tegral e verdadeira? Pois, se tivessem razão aque
les mestres do êrro que afirmam ter Cristo uma só
vontade, a divina, como teria Êle podido oferecer
por nós satisfação digna, mediante sua Paixão e
Morte, uma vez que, onde não há verdadeira e livre
. vontade no homem, não há também merecimento
moral ?
Ou foi acaso supérfluo, definir a infalibilidade
do Papa? Mas nao clama bem alto, ein nossos dias,
a irremediável decomposição de tôdas as crenças re
ligiosas, pela necessidade de uma suprema' autori
dade em matéria de fé, completamente digna de con
fiança?
Ou foi talvez supérfluo declarar, como artigo
de fé, a presença real de Cristo na Hóstia consagra
da e a Transubstanciação (a íntima mudança subs
tancial), isto é, a mudança do pão e do vinho na Car-,
ne e no Sangue de Jesús ? Durante a Santa Missa
dirige-se o Sacerdote aos fiéis com estas palavras:
Eis o Cordeiro de Deus, que tira os pecados do
mundo . Os fiéis batem no peito, em adoração,.
convencidos de que Cristo mesmo lhes é apresentado
sob as • espécies eucarísticas. Como o sabem êles ?
Pelo dogma da Igreja! E sem esse dogma, que
confusão de idéias!
Basta olhar o campo protestante. Uma opinião
diz: “Na Santa Comunhão recebo só uma recorda
ção da última ceia, um símbolo apenas do Corpo de
Cristo”. Uma outra afirma: “No momento da re
cepção, e só nesse momento, Cristo está verdadeira
mente presente”. Uma terceira: “Adoração da
hóstia, recepção da comunhão, é pura idolatria”.
Pelo que, vemos bem claro : os dogmas são ne
cessários, porque são a única segurança contra a de
molição, falsificação e destruição de todo o ensina
mento cristão e portanto do Cristianismo.
II — Porque tornam possíveis os atos da
Religião.
Para poder realizar atos religiosos como atos
racionais, devo aceitar determinados ensinamentos.
Um convertido recebia lições de um Sacerdote so
bre a. doutrina católica. Ao acabar uma lição faz esta
pergunta:
Seria mesmo necessário determinar exatamente des
ta forma tôdas as perguntas e respostas? A mim me pa-
rece, que à vida religiosa nâo consiste propriamente em
dogmas; não precisa deles, porque o importante é levan
tar meu coração a Deus, rezar, e amá-lo. Cnsto indicou
o amor como o principal e mais'nobre de todos os nossos
40
deveres para com Deus. Agora já estou saciado de tanto
catecismo, e Vo6sa Reverencia não quer batizar-me, an
tes que eu possa responder a todas as perguntas. Não é
isso “intelectualismo”, isto é, predomínio exagerado da
razão com menosprezo dos sentimentos do coração?
O Sacerdote ouviu atento e respondeu rindo: Bem,
outra vez falaremos disto. Agora já é tempo de ir para
casa. Peço transmita minhas saudações.
A quem?
Não importa a quem.
Não importa?
Não im porta..., o mais importante é que V. expri
ma as minhas saudações.
Mas, como posso fazê-lo, não sabendo, se a meu pai,
à mamãe ou a minha irmã?
Parece, respondeu o Padre sorrindo, que V. é ainda
muito intelectualista.
Como?
Se V. reza, quer certamente saudar a uma pessoa,
quer falar com ela, não é assim? Ora, parece lógico que
deve saber ccm quem fala, a quem saúda, quem é êsse
Deus, quem é Jesus e Maria, se gostam da minha sauda
ção, se a esperam, se podem ouvir-me, etc.... Não é
assim?
Naturalmente, mas que tem isto com ser “intele
ctualista” ?
Oh! muito. Porque são precisamente estas as per
guntas a que responde o dogma ou o Catecismo, dizendo-
nos quem é Deus e Jesus Cristo, e assim as demais ver
dades da doutrina católica, que V. acha supérfluas, cara
cterizando-as de “intelectualismo”. Saber o Catecismo,
não é tôda a religião: ninguém afirmou jamais isto. E’
mistér toriiar contato com Deus, adorá-lo, amá-lo e fazer
a sua vontade. Mas sem dogmas, sem perguntas de ca
tecismo — como será isto possível para um homem do
tado de razão? Pois é preciso saber, qual é a vontade
de Deus, e de que maneira quer Êle ser , venerado. E sa
bemo-lo, graças a Deus, por meio dos dogmas. Forne
cem eles de fato o fundamento indispensável de todos ós
atos de religiãç, de tôdas as elevações do coração, de
todo o amor.
41
III — Porque de fato toda Religião supõe
dogmas.
Sem princípios claros, sem convicções bem de
terminadas, é tão impossível implantar uma religião
como uma ideologia qualquer.
Suponhamos que certo membro de uma Igreja
protestante que rejeita os dogmas, faça sua oração a
Cristo; que o adore, que lhe peça perdão dos peca
dos, ou que enfim lhe peça auxílio em qualquer ne
cessidade. Esta oração pressupõe já a crença em
muitos dogmas. Enumeremos alguns: que Cristo
seja Deus, -porque em caso contrário, não podería
ouvir-lhe a oração; que Cristo tenha ressuscitado
dentre os mortos; porque se dêle restam apenas cin
zas na Palestina, não teria sentido o dirigir-lhe ora
ção; que seja Salvador; que tenha satisfeito pelos
nossos pecados, e que não só seja Deus, mas ainda
verdadeiro homem; porque senão, não teria podido
sofrer e m orrer...
Todos estes ensinamentos ou “dogmas”,' certa
mente o referido protestante os aceitou completa
mente, porque senão, seria uma incoerência.
Todas as religiões e crenças do mundo, mesmo
as que fazem alarde de serem religiões puramente
dinâmicas, “anti-dogmáticas” ou “anti-intelectuais”,
são orientadas por idéias bem delimitadas e conhe
cimentos religiosos.
E mesmo aqueles grupos ou seitas religiosas,
que condenam a Igreja em vista de seus dogmas e se
vangloriam da sua livre interpretação, possuem do-
gmas implícitos e disfarçados, ao menos o seguinte:
a “livre interpretação” da Sagrada Escritura não
deve conduzir à aceitação da fé católica.
Nos últimos tempos, se contrapõe ao cristianis
mo “dogmático” o cristianismo “prático”.
Várias seitas protestantes, bem como certas
crenças modernas, fazem consistir a essência da Re
ligião unicamente na atividade social da caridade.
Alimentar os famintos, consolar os doentes, cons
truir para os pobres moradias decentes, e assim por
diánte, isto denominam êles de “cristianismo práti
co, de ação”, em contraposição ao Cristianismo
“acorrentado aos dogmas” ou Cristianismo “acervo
de fórmulas”. “Basta, dizia um representante dês-
se “Cristianismo prático”, basta crer num Ser su
perior, que habita além das estréias, e que dá a todos
os acontecimentos o último e o mais profundo sen
tido. Não necessitamos hoje de lutas dogmáticas,
niàs'de cristianismo prático de ação”.
Em primeiro lugar, é claro que o “ Ser além das
estréias” representa já uma espécie de dogma. Ou é
o verdadeiro Deus, a quem nós, os cristãos, adora
mos, e temos então o dogma católico como funda
mento dêste cristianismo “prático”, ou a palavra
“ Ser” toma-se como o Deus da “ religião natural”,
no sentido de Locke, Voltaire o u vLessing, o Deus
contraposto ao Deus da revelação do cristianismo, e
assim temos diante de nós o dogma do “livré-pensa-
43
mento" religioso. Certamente é oposto ao dogma
do cristianismo, mas nem por isso, deixa de ser
dogma.
A
Que significa logo, querer realizar o cristianis
mo “prático" sem o cristianismo “dogmático"?
Simplesmente: querer flores e frutos sem tronco e
raízes; querer edifício sem fundamento. Como já
demonstramos, qualquer religião ativa só pode ter
origem em conhecimentos e convicções, isto é, em
dogmas.
Aliás, a religião “adogmática”, a “religião da
natureza" apregoada por Voltaire, já deu seus fru
tos, como vimos no aterrador exemplo da Revolução
francesa.
Um Deus que só domine “além das estrelas”,
deixando todo o espaço sublunar à disposição dos
homens, que se embevecem em fazer-se deuses, —
é de fato um Deus muito cômodo, mas é também um
Deus supérfluo.
Capítulo IV.
Limites dos dogmas
O convertido, mencionado acima, aduz ainda
mais umá dificuldade.
“N3o é afinal impossível, diz êle, exprimir em pala
vras, as realidades sobrenaturais? Como isto não nos
ensina a Igreja a faltar à reverência? Não suscita nos
fiéis a impressão de que os conceitos e as descrições hu
manas podem retratar a Deus e as coisas divinas — o
que conduziría logicamente a uma irreverente familia
ridade?”
Que dizer a esta objeção?
Não lhe podemos denegár um grãozinho de ver
dade. Pois:
I — Os dogmas designam mistérios em fórmulas
analógicas.
fl) — Os dogmas têm o seu valor, mas valor
simplesmente analógico
Os vocabulários de todos os povos não çontêem
uma única palavra, que tenha o mesmó sénti-
dó, quando se refere a Deus e quando se: refere a
qualquer outro ser.
Deus é, por essência, o “inconfundível". Sim,
sabemos o que seja personalidade, poder, majestade,
sabedoria, e as admiramos nas criaturas. Contudo
45
todos êstes conceitos são imensamente mais ricos de
sentido quando aplicados ao Ser que “habita a luz
inacessível . Tôdas as nossas expressões sôbre
Deus e as coisas divinas só têm valor analógico, isto
é, conteem sempre uma dose de insuficiência e re
dução da realidade total.
<
JUÍZO
COM EÇO
do DRAMA
n\u
/
78
Terceiro ato — a Redenção se aplica a cada ho
mem na Igreja.
Quarto ato: os resgatados entram no júbilo
eterno.
A quem poderia escapar essa estrutura dramá
tica! Que dinamismo lateja na base dos nossos
dogmas na sua plena significação! Estudemos um
pouco o nosso quadro. esquemático!
Êste drama constituirá a matéria de todos os
nossos livros de formação. Em cada um deles acom
panharemos o grandioso desenrolar desse enrêdo.
II — Trata-se do drama de tôda a história da
humanidade.
Não é a todos nós que interessa esse drama?
Êle se desenvolve como o fadário mesmo do
inundo e como a sorte de cada um dos bomens.
O primeiro ato se representou outrora, quando
Deus enviou profetas aos homens, e a imagem do
Redentor emergiu cada vez mais nítida pos horizon
tes do futuro.
Também o segundo ato já passou, a saber, quan- ■
do o Filho de Deus envergou a libré de escravo e,
crucificado pelos homens, ofereceu ao seu Pai a
grande reparação.
E quando se levou à cena o terceiro ato? Nóss
todos o representamos. Olhemos ao derredor: o
mundo pela morte de Cristo foi reconciliado com
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Deus. Suas graças de salvação são oferecidas a
todos e a cada um dos homens. A Igreja convida
os povos ao manancial das graças. E que acontece?
Sao milhares os que se recusam, mas são também
milhares os que acedem a seu brado e se precipitam
para ela com ânsia. As graças salvadoras inundam
a humanidade através da Igreja.
Também o quarto ato será representado. E’ o
desenlace forçoso dêste drama. A creação inteira
suspira e anela por essa hora’ na esperança de che
gar também ela á liberdade e soberania dos filhos de
Deus. •
III — Quem podería subtrair-se a êsse drama
decisivo?
Sua extensão é universal, é cósmica. Nele
actuam juntamente os maiores contrastes do univer
so : Deus e o mundo, bons e maus espíritos, tudo
entra em cena.
Tudo o que existe, é introduzido nesse drama.
Toda a humanidade está pendente dêle. Nin
guém é espectador. Todos sao atores. Nao ha en-
treatos: a cada momento recomeça a ação. Cada
minuto tem seu valor, pode decidir de um destino
perpétuo.
Êsse drama fornece-nos a concepção mais exata
e penetrante do mundo, de cada homem e de nosso
tempo. Por isso encerra o problema do destino de
nossa época.
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Visitemos num domingo algum dos nossos está
dios. Milhares de pessoas se'aglomeram para as
competições esportivas. São espetadores de um jôgo
dramático. Quem vencerá? Entretanto, no fundo,
como são secundárias as consequências! E ha outro
torneio, de cujo êxito depende tudo, também a tua
eternidade. Pois, “todos os homens correm no es
tádio”, brada S. Paulo, “ faz com que tua corrida
seja perfeita, para que ganhes a coroa da vitória!”
Trata-se de um prêmio mais excelente, de uma coroa
eterna.
IV — Êste drama encerra o problema de meu
destino.
Seu enrêdo é empolgante. Pois:
A) — Q U E D E C IS Õ E S IM P O R T A ?
CO LÉG O *• :CHIETA
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