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AVALIAÇÃO GEOTÉCNICA DA ERODIBILIDADE DE SOLOS RESIDUAIS – UMA

PROPOSTA METODOLÓGICA

Cezar Augusto Burkert Bastos1, Wai Gehling2 e Jarbas Milititsky2

RESUMO: Na Região Metropolitana de Porto Alegre/RS ocorrem perfis de solos residuais onde são constatados graves
problemas de erosão hídrica acelerada. Núcleos urbanos tem na erosão o principal problema geotécnico, gerando
prejuízos às obras de infra-estrutura como pavimentos, sistemas de drenagem e esgotos e redes de água e de energia e
até mesmo às moradias. Também ao longo de rodovias e estradas vicinais da região, os processos erosivos têm gerado a
degradação e a instabilidade de taludes, levando ao comprometimento da infra-estrutura das vias, pelo avanço dos
processos erosivos ou pelo acúmulo de sedimentos gerados. Problemas como estes têm conscientizado a comunidade
geotécnica da necessidade de avaliar o potencial erosivo dos terrenos, levando em conta as condicionantes envolvidas,
em particular, a propriedade erodibilidade dos solos.
O artigo apresenta uma proposta metodológica para a abordagem geotécnica da erodibilidade dos solos residuais.
Baseada em ensaios de laboratório, esta proposta tem por objetivo orientar o engenheiro na avaliação do potencial
erosivo dos terrenos antes da implantação de qualquer obra de engenharia que exponha solos naturais. Constitui o passo
inicial no direcionamento de medidas preventivas e de soluções que minimizem o impacto ambiental das obras no que
se refere à erosão hídrica por fluxo superficial.

ABSTRACT: Residual soils found in Porto Alegre Metropolitan Region present serious problems of accelerated
hydraulic erosion. Erosion is the principal geotechnical problem in some urban areas, because causes damages in
engineering works (pavements and drainage, sewerage, water and energy systems) as well as in buildings. Otherwise,
the erosive process and the sediments accumulation damage highways and rural roads. The geotechnical community
recognizes the necessity of evaluating the erosive potential of lands considering the involved factors, in particular soils
erodibility.
This paper presents a methodological proposal of geotechnical approach to the study of erodibility of residual
soils. This proposal, based in laboratory tests, aims at guiding engineers in the evaluation of erosive potential of lands,
prior to any engineering works which expose natural soils. This evaluation is the first step towards establishing
preventive measures and also measures directed to minimize the environmental impact of engineering works,
concerning to hydraulic erosion due to surface concentrated flow.

PALAVRAS-CHAVES: erodibilidade, solos residuais, metodologia

INTRODUÇÃO
Embora possa parecer de simples concepção, o fenômeno da erosão hídrica destaca–se pela complexidade dos
mecanismos envolvidos. A principal causa da dificuldade no estudo dos processos erosivos é a multiplicidade e a inter-
relação de fatores intervenientes no fenômeno. Estes fatores podem ser agrupados em quatro classes: fatores climáticos
(chuva, temperatura, radiação solar e vento); fatores topográficos (declividade e o comprimento de rampa); fator
vegetação (cobertura vegetal) e fator solo (erodibilidade do solo).
Um destes fatores, a erodibilidade, pode ser definida como a propriedade do solo que retrata a maior ou menor
facilidade com que suas partículas são destacadas e transportadas pela ação de um agente erosivo. Constitui uma das
propriedades de comportamento dos solos de maior complexidade em função dos grande número de condicionantes
físicos, químicos, biológicos e mecânicos intervenientes.
A ação erosiva acelerada da água sobre os solos urbanos é quase sempre associada à intervenção imprópria do
homem no meio físico, resumida em três aspectos condicionantes: a) aumento na energia do fluxo das águas pluviais
por alterações na topografia original dos terrenos, como no caso da execução de taludes de corte; b) concentração do
fluxo das águas superficiais pela abertura de ruas, por estruturas de drenagem mal projetadas e/ou mal executadas e por
redes de galerias pluviais e de esgotos lançados de forma inadequada nos talvegues receptores; c) exposição de solos
erodíveis à ação direta do fluxo de águas pluviais.
Na Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA) são constatados graves problemas de erosão hídrica
acelerada. Em muitos loteamentos de baixa a média renda, a erosão é considerada o principal problema geotécnico,
gerando grandes prejuízos às obras de infra-estrutura como pavimentos, sistemas de drenagem e esgotos, redes de água
e energia e até mesmo às moradias e outras construções existentes. Ao longo de muitas das rodovias e estradas vicinais
da região, os processos erosivos têm gerado a degradação e a instabilidade de taludes de corte envolvendo perfis de

1
Departamento de Materiais e Construção / Fundação Universidade Federal do Rio Grande – Av. Itália, km8
CEP:96201-900 Rio Grande/RS – bastos@dmc.furg.br
2
Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil / Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Av. Osvaldo
Aranha, 99/3o andar CEP:90035-190 Porto Alegre/RS
solos residuais, levando ao comprometimento da infra-estrutura das vias, seja pelo avanço dos processos erosivos ou
pelo acúmulo de sedimentos gerados. Associados às erosões, os assoreamentos trazem como resultado imediato a
redução nas seções transversais dos cursos d’água adjacentes às erosões e, em conseqüência, inundações que atingem as
populações ribeirinhas.
Problemas como estes têm conscientizado a comunidade geotécnica da necessidade em avaliar o potencial
erosivo dos terrenos antes da intervenção, levando em conta as condicionantes envolvidas, em particular a propriedade
erodibilidade dos solos. É de consenso no meio geotécnico que ainda são necessários estudos que consolidem métodos
de avaliação da erodibilidade e que permitam sua abordagem segundo propriedades geomecânicas de comportamento
tratadas pela Mecânica dos Solos (ISSMFE [1]; Pastore [2] e Vilar e Prandi [3]). A própria medida experimental da
resistência a erosão esbarra em dificuldades práticas, pois envolve esforços de muito pequena magnitude se comparados
com a resistência do solo a outras solicitações, além de ser necessário representar complexas condições ambientais.
Bastos et al. [4] apresentam uma revisão sobre os principais estudos geotécnicos até então realizados com o objetivo de
caracterizar a erodibilidade dos solos.
Neste artigo é apresentada uma proposta metodológica para a abordagem geotécnica da erodibilidade dos solos.
Esta proposta é fundamentada no estudo experimental realizado por Bastos [5] com perfis de solos residuais não
saturados, brevemente descrito a seguir.

ESTUDO EXPERIMENTAL – AVALIAÇÃO DA ERODIBILIDADE


Com base nos problemas geotécnicos associados a erosão hídrica acelerada na RMPA, foram escolhidos quatro
perfis de solos residuais para estudo:
• perfil ALG – solo residual de granito, localizado no Loteamento Algarve, município de Alvorada/RS. Área
sujeita a intensos processos erosivos por ravinas e boçorocas. Horizontes estudados: horizonte B (solo
ALGB) e horizonte C (solo ALGC);
• perfil RS-239 – solo residual do Arenito Botucatú (pouco intemperizado) localizado em talude às margens
da rodovia RS-239, no município de Campo Bom/RS. Representa o material sujeito a processos erosivos por
ravinamento em cortes na região. Horizontes estudados: horizonte BC (solo RS239BC) e horizonte C (solo
RS239C);
• perfil PT – solo residual do Arenito Botucatú (fortemente intemperizado), encontrado no Loteamento Parque
do Trabalhador, município de Novo Hamburgo/RS. Sujeito a processos erosivos por ravinas e boçorocas.
Horizontes estudados: horizonte B (solo PTB) e horizonte C (solo PTC);
• perfil CD – solo residual de granito localizado na zona sul de Porto Alegre. Representa os processos de
erosão por ravinamento, típicos dos solos dos morros graníticos da capital. Horizontes estudados: horizonte
B (solo CDB) e horizonte C (solo CDC);
A erodibilidade relativa dos solos estudados foi avaliada com base no comportamento frente a erosão no campo.
A avaliação levou em conta a magnitude e freqüência dos processos erosivos nas situações onde os solos são sujeitos à
ação do fluxo hídrico superficial. O Quadro 1 apresenta a erodibilidade relativa dos solos e a característica dos
processos atuantes.

Quadro 1. Erodibilidade relativa dos solos estudados com base no comportamento em campo.
SOLO ERODIBILIDADE CARACTERÍSTICAS DOS SOLOS E PROCESSOS EROSIVOS ATUANTES
RELATIVA
ALGB baixa Solo laterítico envolvido em sulcamento superficial. Quando preservado, mostra
maior resistência ao ravinamento deflagrador das boçorocas.
ALGC alta Solo friável extremamente fragilizado pela ação da água e envolvido nos
espetaculares processos de erosão hídrica acelerada por boçorocas verificados no
Loteamento Algarve.
RS339BC média a baixa Solo de transição em um perfil de baixo intemperismo do Arenito Botucatú, onde a
perda de cimentação herdada da rocha é em parte compensada pelo
enriquecimento em argila.
RS239C média Solo arenoso fino, onde certa resistência à erosão é determinada pela cimentação
herdada do arenito. Susceptíveis a ravinamento e piping.
PTB baixa Solo laterítico bastante evoluído, quando preservado resiste aos processos de
erosão hídrica acelerada no Loteamento Parque do Trabalhador.
PTC alta Solo arenoso fino friável, de forte intemperismo do Arenito Botucatú, envolvidos
nos ravinamentos e boçorocas no Loteamento Parque do Trabalhador.
CDB média a baixa Solo subsuperficial de perfil pouco evoluído de origem granítica, envolvido em
processos de erosão dos morros de Porto Alegre.
CDC média a alta Solo saprolítico arenoso de origem granítica, sujeito a ravinamentos e alguns
boçorocamentos verificados em morros de Porto Alegre.
O extenso programa experimental a que foram submetidos os solos amostrados é descrito em detalhe em Bastos
[5]. O Quadro 2 resume os ensaios realizados. Pela importância na metodologia proposta, alguns dos ensaios merecem
os comentários que seguem.
O ensaio de Inderbitzen constitui um dos mais simples ensaios em canal hidráulico. Consiste numa rampa
hidráulica onde é estabelecido um fluxo a vazão constante sobre uma amostra indeformada de solo, instalada rente ao
fundo. A vazão, a inclinação da rampa e a umidade prévia da amostra são as variáveis controladas. Um maior
detalhamento do equipamento e resultados obtidos nesta pesquisa é encontrado em Bastos et al. [6]. Uma importante
inovação foi a análise dos resultados dos ensaios por parâmetros hidráulicos, particularmente pela taxa de erodibilidade
K, que representa a taxa de aumento da perda de solo no ensaio com o aumento da tensão cisalhante hidráulica aplicada,
esta última, estimada em função da declividade da rampa e altura da lâmina d’água.
A avaliação da erodibilidade pela Metodologia MCT, estabelecida por Nogami e Villibor [7], baseia-se em dois
ensaios: o ensaio de infiltrabilidade e o ensaio de erodibilidade específica (ou perda por imersão modificado). O
primeiro procura avaliar o potencial de infiltração de água pelo terreno com base na velocidade de ascensão capilar,
quantificada pelo coeficiente de sorção (s). Já o segundo, avalia o potencial de desagregação do solo indeformado sob
imersão através do parâmetro perda por imersão (pi). Os dois parâmetros definem o critério de erodibilidade pela
Metodologia MCT. Detalhes sobre o critério e sua aplicação na pesquisa em questão são apresentados em Bastos et al.
[6].
O ensaio de desagregação constitui um simples ensaio na avaliação qualitativa do potencial a desagregação do
solos quando sob gradual imersão. Embora o caráter qualitativo, pela simplicidade, praticidade e estreita relação com os
fenômenos associados aos processos naturais, é destacado o potencial do ensaio numa prévia avaliação da erodibilidade
dos solos.
Vale também destacar o papel dos ensaios geomecânicos (cisalhamento direto e de colapsibilidade) na busca de
propriedades de comportamento estudadas pela Mecânica dos Solos que se relacionem a erodibilidade. A coesão (em
particular sua variação com o umedecimento e inundação do solo) e o potencial de colapso foram os parâmetros
pesquisados.

Quadro 2. Síntese dos ensaios realizados, tipos de amostras e objetivos no estudo


ENSAIOS AMOSTRAS OBJETIVO
Caracterização geotécnica Deformadas Obter as características texturais, de plasticidade e
(granulometria e plasticidade) e mineralógica dos solos
mineralógica (difratograma e
fluorescência de raios X)
Ensaios de Inderbitzen Indeformadas – anéis Avaliar em laboratório a resistência a erosão por fluxo
(φ = 10cm e h = 5cm) superficial. Análise pela taxa de erodibilidade K (taxa de
aumento da perda de solo com o aumento da tensão
cisalhante hidráulica)
Ensaios para classificação MCT Deformadas (fração Classificação MCT dos solos
dos solos (mini-MCV e perda < 2mm)
por imersão)
Ensaios de infiltrabilidade e Indeformadas Obtenção dos parâmetros coeficiente de sorção e
perda por imersão modificado (φ = 5cm e h = 5cm) e erodibilidade específica, respectivamente, empregados na
(Metodologia MCT) (φ = 5cm e h = 2,5cm), avaliação da erodibilidade segundo a Metodologia MCT
respectivamente
Ensaios de desagregação Indeformadas – anéis Avaliar qualitativamente a resistência a desagregação do
(φ = 10cm e h = 5cm) solo frente a imersão em água
Ensaios para avaliação da Deformadas Avaliar o potencial de dispersibilidade dos solos estudados
dispersibilidade – ensaio
sedimentométrico SCS, ensaios
químicos com a água intersticial
Ensaio de cone de laboratório Indeformadas - anéis Avaliar a coesão superficial dos solos pela resistência a
(φ = 6cm e h = 2cm) penetração de um cone padrão
Ensaios de estabilidade de Deformadas – Avaliar a estabilidade dos agregados naturais dos solos
agregados (método de agregados > 2mm frente a ciclos de imersão e emersão
peneiramento múltiplo)
Ensaios de cisalhamento direto Indeformadas - anéis Avaliar a resistência ao cisalhamento dos solos em
(φ = 6cm e h = 2cm) diferentes condições de umedecimento
Ensaios de colapsibilidade em Indeformadas - anéis Avaliar o potencial de colapso estrutural dos solos frente a
oedômetros (φ = 5cm e h = 2cm) súbita inundação
AVALIAÇÃO DA ERODIBILIDADE - A FUNDAMENTAÇÃO DA PROPOSTA
A erodibilidade dos solos estudados foi avaliada através da observação do comportamento em campo (Quadro
1), indiretamente através de diferentes critérios de erodibilidade estabelecidos na literatura técnica e diretamente por
meio dos ensaios de Inderbitzen.
Na avaliação indireta da erodibilidade foram aplicados os seguintes métodos e critérios:
• Estimativa do fator erodibilidade KUSLE da Equação Universal de Perda de Solo (USLE) – baseado na
textura, teor de matéria orgânica, tipo de estrutura e classe de permeabilidade do solo (nomograma de
Wischmeier et al. [8]);
• Critérios na prática de projetos de obras hidráulicas – prática francesa (Hénensal [9]) e do SCS/USDA
(Hanson [10]);
• Avaliação da dispersibilidade dos solos – com base no teor de sais dissolvidos no extrato de saturação e no
resultado de ensaios de dispersão SCS – parâmetros: % dispersão e Razão de Dispersão de Middleton (RD);
• Avaliação do potencial de desagregação dos solos – pelos ensaios de desagregação;
• Critérios de erodibilidade estabelecidos pelo LNEC – Santos e Castro [11] baseado na expansibilidade e na
textura, Meireles [12] baseado na textura e na plasticidade e Nascimento e Castro [13] baseado na
expansibilidade, na textura, na plasticidade e no limite de absorção;
• Critérios baseados na Metodologia MCT – classificação MCT dos solos, critério de erodibilidade MCT
(Nogami e Villibor [7]) e critério de Vertamatti e Araújo [14] com base na classificação MCT modificado;
• Critérios propostos por Alcântara [15] - com base no ensaio de cone de laboratório e estabilidade de
agregados.

Avaliação qualitativa da erodibilidade dos solos estudados - conclusões


A avaliação qualitativa da erodibilidade dos solos estudados com base nos critérios citados, comparada com o
comportamento de campo, permite concluir:
• A erodibilidade destes solos residuais estudados não está associada a dispersibilidade, tudo indicando que
esta característica pode ser estendida a todos os solos tropicais e subtropicais com baixo teor de sais
dissolvidos;
• O potencial de desagregação dos solos em água está intimamente relacionado com a susceptibilidade à
erosão dos solos não saturados;
• Destacada adequação do critério de erodibilidade MCT aos solos estudados.

Análise quantitativa - parâmetros físicos e geomecânicos frente à erodibilidade relativa observada em campo e à
taxa de erodibilidade medida em laboratório - conclusões
Nesta etapa, foram reunidos e analisados em conjunto os valores do fator KUSLE, os parâmetros físicos
envolvidos nos critérios citados, os parâmetros geomecânicos e os valores da taxa de erodibilidade K dos ensaios de
Inderbitzen.
Dentre os parâmetros físicos investigados: Razão de Dispersão de Middleton (RD); parâmetros pelos critérios do
LNEC: expansibilidade LNEC (ε), % passante nas peneiras #40 e #200, limite de liquidez (wl) e índice de plasticidade
(IP); razão entre a perda por imersão modificado e o coeficiente de sorção (pi/s) pela Metodologia MCT; variação de
resistência à penetração do cone de laboratório com o umedecimento; valores do diâmetro médio ponderado dos
agregados estáveis em água (DMP). Dentre os parâmetros geomecânicos: a coesão na condição não saturada (cnat) , a
coesão na condição inundada (cinu) , a variação de coesão (∆c = (cnat - cinu) / cinu) e o coeficiente de colapso para mínimo
carregamento normal (ic).
Cada um dos parâmetros acima foram relacionados à erodibilidade relativa observada em campo e àquela
medida em laboratório pelo ensaio de Inderbitzen. Uma análise estatística por modelos de regressão linear foi realizada,
tendo como variável dependente o logaritmo da taxa de erodibilidade K e como variáveis independentes os parâmetros
destacados. Testes de significância foram executados, usando para tal a distribuição de Student (teste t).
O teor de finos (% passante na peneira #200) foi a propriedade física que melhor se relacionou estatisticamente à
taxa de erodibilidade K e que melhor identificou a erodibilidade relativa de campo. Solos de baixa erodibilidade
apresentaram teor de finos > 55%, enquanto os solos com erodibilidade média até alta apresentaram % passante na
peneira #200 < 35%. Quanto a plasticidade, foi possível inferir que solos de baixa erodibilidade apresentaram IP > 10%,
enquanto solos de alta erodibilidade IP < 5%.
Quanto ao fator KUSLE, o valor limite para KUSLE = 0,20 permitiu separar os solos de média a baixa e baixa
erodibilidade dos solos de média até alta erodibilidade.
A Razão de Dispersão também apresentou relação direta com a taxa K. O limite RD = 50% permitiu separar os
solos mais erodíveis daqueles mais resistentes à erosão;
A razão pi/s do critério de erodibilidade MCT também apresentou relação significativa com o parâmetro K. O
limite proposto por Nogami e Villibor [7]: pi/s= 52 foi validado. O termo “não erodível” (pi/s < 52) é associado aos
solos de média a baixa e baixa erodibilidade.
Quanto às propriedades propostas por Alcântara [15] para avaliação da erodibilidade, a variação de resistência à
penetração do cone de laboratório (DP) e a estabilidade de agregados (pelo DMP) não apresentaram relação
significativa com a taxa K. A variada textura dos solos prejudicou a análise pelo diâmetro dos agregados estáveis em
água.
A relação entre parâmetros de resistência ao cisalhamento e erodibilidade permitiu concluir que a variação de
coesão (∆c) apresenta relação estatística significativa com o parâmetro K. Os solos com média a alta e alta erodibilidade
apresentaram ∆c > 85%.
O coeficiente de colapso não apresentou relação com o parâmetro K. Embora supunha–se que o processo de
desagregação do solo em água estivesse relacionado com os fenômenos de colapso e erosão, a diferença dos esforços
envolvidos, compressão e cisalhamento hidráulico respectivamente, pode explicar os resultados obtidos.
A análise das propriedades geomecânicas dos solos estudados frente à erodibilidade vem a confirmar uma das
principais hipóteses previamente formuladas no início desta pesquisa: a importância da coesão na interpretação da
susceptibilidade dos solos à erosão hídrica. A significativa relação entre os parâmetros K e ∆c indica que os solos mais
erodíveis apresentam maior redução da coesão com a saturação na condição de fluxo d’água superficial.

PROPOSTA DE ABORDAGEM GEOTÉCNICA PARA PREVISÃO DA ERODIBILIDADE DE SOLOS


RESIDUAIS
A análise da erodibilidade dos solos estudados alicerçou uma proposta de abordagem geotécnica ao problema de
erosão para solos residuais tropicais e subtropicais não saturados, no que tange a caracterização da susceptibilidade
destes solos à erosão hídrica acelerada. Esta proposta tem seus principais etapas resumidas a seguir:

1a) Levantamento de dados preliminares - são reunidas informações sobre: características geométricas do
problema; caracterização geológica e pedológica dos perfis de solos envolvidos; posição do perfil na geomorfologia
local e descrição in situ dos perfis de solos. Estes dados auxiliam na interpretação do comportamento em campo frente à
erosão e orientam a avaliação da erodibilidade dos solos envolvidos.

2a) Investigação in situ do comportamento dos solos frente à erosão - são descritos processos erosivos e
analisada a susceptibilidade à erosão por fluxo superficial de cada um dos principais horizontes, definindo–se classes de
erodibilidade relativa aos materiais. Esta caracterização expedita da erodibilidade relativa dos solos serve de parâmetro
inicial de análise. Nesta etapa são definidos os solos a serem investigados experimentalmente.

3a) Avaliação da erodibilidade - avaliação direta por ensaios de Inderbitzen ou avaliação indireta por
propriedades relacionadas ao comportamento frente à erosão.
Para a avaliação direta da erodibilidade é proposta a obtenção da taxa de erodibilidade K a partir de ensaios
em canais. O ensaio de Inderbitzen é sugerido pela simplicidade e eficiência. O critério proposto, baseado em ensaios na
umidade natural, é o seguinte:
 K < 0,001 g/cm2/min/Pa – solos de baixa erodibilidade
 0,001 < K < 0,1 g/cm2/min/Pa – solos de mediana erodibilidade
 K > 0,1 g/cm2/min/Pa – solos de alta erodibilidade
A avaliação indireta da erodibilidade permite identificar os solos potencialmente erodíveis, isto é, solos que
em condições normais são susceptíveis a processos erosivos. Como critério preliminar é proposta a avaliação do
potencial à desagregação em água. Solos que desagregam em água são considerados potencialmente erodíveis. Os
demais critérios são aplicados a partir de três níveis de informações obtidas de ensaios geotécnicos.
No 1o nível, a erodibilidade é avaliada com base na % passante na peneira #200, no índice de plasticidade, no
fator KUSLE e na Razão de Dispersão de Middleton.
São considerados potencialmente erodíveis solos com:
 % passante na peneira #200 < 55%
 IP < 10%
 KUSLE > 0,20
 RD > 50%
No 2o nível, são empregados dados da classificação MCT e da aplicação do critério de erodibilidade MCT. São
considerados potencialmente erodíveis solos que apresentam razão pi/s > 52.
No 3o nível, a erodibilidade é avaliada pela a variação de coesão ∆c, obtida de ensaios de cisalhamento direto na
umidade de campo e inundados. São considerados potencialmente erodíveis solos com ∆c > 85%.
As informações complementam–se, permitindo a melhor avaliação da erodibilidade dos solos. A importância
relativa dos dados na avaliação da erodibilidade é crescente com o nível da informação. Os conflitos quanto aos
resultados da aplicação dos critérios de avaliação indireta devem ser julgados com base na importância relativa das
informações existentes.
O diagrama apresentado na Figura 1 procura sintetizar a proposta metodológica em questão.
LEVANTAMENTO DE DADOS PRELIMINARES

Descrição das Caracterização Posição dos perfis no Descrição in situ de


características geológica e pedológica contexto da encosta características
geométricas do dos perfis morfológicas dos
problema perfis

INVESTIGAÇÃO IN SITU DO COMPORTAMENTO DOS SOLOS FRENTE À EROSÃO

AVALIAÇÃO AVALIAÇÃO AVALIAÇÃO


INDIRETA DA DIRETA OU INDIRETA DIRETA DA
ERODIBILIDADE DA ERODIBILIDADE ERODIBILIDADE

Ensaios de
desagregação
Ensaios de Ensaios pela Ensaios de Ensaios de
caracterização Metodologia MCT cisalhamento Inderbitzen
direto
solos
potencialmente solos potencialmente Valores de K
erodíveis: erodíveis: Classificação MCT e ∆c > 85% - (g/cm2/min/Pa):
desagregam em % pass.#200 < 55% Critério de solos < 0,001
água IP < 10% Erodibilidade MCT: potencialmte - baixa erodibilidade
KUSLE > 0,20 pi/s > 52 – solos erodíveis 0,001 a 0,1
RD > 50% potencialmente - média erodibilidade
erodíveis > 0,1
- alta erodibilidade

Figura 1. Diagrama ilustrando a proposta de abordagem geotécnica para a previsão da erodibilidade de solos residuais

CONCLUSÕES
Os estudos realizados destacam o emprego da Metodologia MCT e do ensaio de desagregação na avaliação
indireta da erodibilidade. Ambas técnicas fundamentam-se na relação entre a susceptibilidade a erosão e a desagregação
do solo quando imerso em água.
Na avaliação direta da erodibilidade em laboratório, os ensaios em canais hidráulicos com amostras
indeformadas constituem importante ferramenta. O ensaio de Inderbitzen, pela sua simplicidade em equipamento e
operação é indicado para fins geotécnicos.
Quanto a proposta apresentada, destaca-se que os critérios quantitativos foram estabelecidos com base nos solos
estudados. Logo, são indicados apenas como uma primeira aproximação para a previsão da erodibilidade de solos
residuais. A validação destes critérios está sendo submetida ao aumento no universo de solos pesquisados, abrangendo
inclusive perfis de solos de natureza sedimentar.
A proposta de abordagem geotécnica sobre a erodibilidade de solos residuais tropicais e subtropicais apresentada
permite orientar o engenheiro geotécnico na avaliação do potencial erosivo dos terrenos antes de uma iniciativa de
ocupação urbana ou implantação de qualquer obra de engenharia que exponha estes solos naturais.
A avaliação da erodibilidade também permite orientar medidas preventivas à erosão hídrica por fluxo superficial.
Solos de alta erodibilidade pela avaliação direta e solos considerados potencialmente erodíveis pela avaliação indireta
requerem medidas preventivas especiais, com maior investimento em obras de drenagem e emprego de técnicas
especiais de proteção superficial. Solos de mediana erodibilidade em ensaios de erosão e solos que não tenham sido
classificados como potencialmente erodíveis pelos critérios indiretos têm recomendadas soluções convencionais em
drenagem e proteção superficial. Os solos com baixa erodibilidade, comprovada na avaliação direta, dispensam medidas
especiais de proteção e podem ser empregados como proteção natural a solos mais erodíveis, salvo em situações
especiais de fluxo superficial concentrado.
Como mensagem final, vale dizer que a aplicação desta metodologia constitui importante passo inicial no
direcionamento de medidas preventivas e de soluções que minimizem o impacto da obra de engenharia no meio físico
natural no que se refere à erosão hídrica por fluxo superficial.

AGRADECIMENTOS

Aos bolsistas e técnicos do Laboratório de Mecânica dos Solos da UFRGS. Aos professores Adriano Bica e Luís
Antônio Bressani do PPGEC/UFRGS. Ao PICD/CAPES e à FURG pelo apoio.

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[13] Nascimento, U.; Castro, E. Defesa de taludes contra a erosão. Critérios de selecção de solos. Geotecnia, Lisboa,
n.20, p.17-33, 1976.
[14] Vertamatti, E.; Araújo, F.A.R. Critério para previsão do potencial erosivo de solos tropicais. In: Reunião Anual
de Pavimentação, 24., 1990, Belém/PA. Anais... Rio de Janeiro/RJ: ABPv, 1990. v.1, p.328-348.
[15] Alcântara, M.A.T. Aspectos geotécnicos da erodibilidade de solos. São Carlos/SP, 1997, 128p. Dissert. Mestrado
em Geotecnia, EESC/USP.

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