NOÇÕES DE DIREITO
É um conjunto de normas jurídicas que regulamentam as várias situações da vida que desenvolvem
numa determinada sociedade; regras conformadoras do comportamento dos entes sociais, cuja
infracção implica a susceptibilidade de aplicação de uma dada sanção.
Subjectivo e Objectivo
Periodizar a História de Moçambique não é tarefa muito simples. Porém, isso não impede a
colocação de uma proposta.
O nascimento de Jesus Cristo foi um acontecimento muito importante e foi posteriormente adoptado
pelo ocidente como um momento de viragem do calendário. Assim, o período anterior ao
nascimento de Jesus Cristo foi designado “antes da nossa era” e ao período posterior designado
“nossa era”. Porém, para os árabes o nascimento de Jesus Cristo já não se reveste da mesma
importância que é atribuída no ocidente. Para estes países, o acontecimento de extrema importância
foi a fuga do Profeta Maomé de Meca para Medina (Hégira) no ano 622 da N.E., dando origem à
religião Islâmica.
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Como se pode perceber do exemplo acima dado, a periodização em História não é pacífica nem
consensual. Ela baseia-se em factos históricos seleccionados e considerados mais importantes pelo
historiador.
Cronologia: ciência que tem por objectivo o estudo do tempo decorrido desde um determinado
facto ocorrido na História do mundo, tomando como referência qualquer outro acontecimento.
Diversas datas têm sido usadas, como por exemplo, o nascimento de Cristo, a Fuga do Profeta
Maomé de Meca para Medina, a penetração dos Bantu em Moçambique, a tomada de Roma pelos
bárbaros, etc.
Trata-se de um período longo que teve o seu começo no século III da N.E até ao último
quarteto do século XIX.
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Inicia com a publicação do Acto Colonial, em 1930, documento que definia o estatuto das
colónias de Portugal. Nesta fase assiste-se a uma viragem na actuação portuguesa em
relação às suas colónias. Há introdução de culturas forçadas de algodão, arroz, a
intensificação da exploração da população moçambicana, a discriminação social salarial
entre portugueses e moçambicanos. Isso despertou a consciência dos operários,
estudantes, conduzindo-os ao desenvolvimento do associativismo profissional e cultural.
Crescem a contestação e denúncias às injustiças sociais; surgiram, fora de Moçambique,
as primeiras organizações políticas que pretendiam lutar contra o colonialismo: MANU,
UDENAMO, UNAMI, que, em 1962 fundiram-se formando a FRELIMO- Frente de
Libertação de Moçambique.
5º Período: Período da Luta Armada-1964- 1975- é uma fase própria da guerra que,
tendo iniciado na Província de Cabo Delgado, com o ataque ao posto de Chai, nos dias e
meses subsequentes, a acção armada das FPLM também se fez sentir nas Províncias de
Niassa e Tete. A acção militar dos portugueses, conhecida como operação “Nó Górdio”
caracterizou este período. Esta operação foi organizada e dirigida pelo General Kaulza de
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Arriaga que iniciou-a em 1970 com o objectivo de acabar com as zonas que já tinham
sido libertas pela FRELIMO.
Caracterizou-se também pelo golpe militar do Estado em Portugal (25 de Abril de 1974)-
acto que abriu as portas para a independência de Moçambique e outras colónias
portuguesas.
6º Período: Pós – Independência-1975-1992.
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A expansão Bantu iniciou no Noroeste das grandes florestas congolesas e passou para a África
Oriental e Austral. Gradualmente ocuparam o sul de Moçambique ao longo das bacias fluviais
costeiras e planaltos do interior. Este movimento progressivo é conhecido como expansão Bantu
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e deu-se a partir dos anos 1700. Com a chegada dos bantu, a vida das sociedades moçambicanas
altera-se.
BANTU- palavra com conotação linguística. Surgiu entre 1851-1869 com o linguista alemão
Bleek para assinalar o parentesco de cerca de 300 línguas. Não existe uma raça Bantu.
i. A teoria rácica;
ii. A teoria linguística (é a que apresenta os argumentos mais consistentes sobre as razões da
expansão);
iii. A teoria da domesticação das plantas e animais e da expansão da metalurgia de ferro;
Consequências da expansão Bantu em Moçambique
Na sedentarização;
Na expansão demográfica;
No processo de fabrico de ferro; e Na domesticação de animais e plantas.
Evidências destas populações têm sido reveladas por diversas estações arqueológicas em Matola,
Xai-Xai, Vilanculos, Save e Niassa.
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Família alargada/ Linhagem – vários descendentes que têm origem num antepassado comum
através de uma filiação paterna ou materna.
A linhagem é conhecida entre os Tsonga por ndangu (ndjango), entre os Ajaua por Liwele;
Macuas por Nloko; e os chonas, por Bvumbo.
Cada linhagem era dirigida por chefe com poder político, social, económico, jurídico e religioso.
Quer dizer, cabia ao chefe a manutenção das relações entre os membros da linhagem, a resolução
de contendas, o controle de impostos, o controlo das alianças matrimoniais, o seu bem-estar, a
saúde dos membros, etc.
No norte, o poder passava do tio materno para o sobrinho, filho da irmã mais velha. Na
linhagem matrilinear, no norte, o tio materno dividia as parcelas pelas suas sobrinhas casadas
onde o casamento era uxorilocalidade (o casal ia residir na povoação da mulher). Nesta
linhagem o poder pertence a família da mulher. A educação dos filhos não é assegurada pelo pai,
mas sim pelo tio materno. Às mulheres dedicam-se à agricultura e os homens à caça, à pesca e à
construção de casas.
No sul, poder político era hereditário/sucessório. O mesmo era exercido pelos homens, passava
do pai para o filho mais velho da família. Na linhagem Patrilinear, no sul, o poder é exercido
pelo marido; pratica-se a virilocalidade (com o casamento a mulher transfere-se para a povoação
do marido), os descendentes de um casal pertencem à família do marido, contrariamente ao que
sucede na linhagem matrilinear em que os filhos fazem parte da família da mulher.
O dote (lobolo) pago pelo noivo aos sogros aparece como um mecanismo de estabilidade dos
casamentos e de subordinação da mulher em relação ao homem. A pastorícia é praticada pelos
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homens. O gado era o principal meio de pagamento do lobolo e simbolizava o poder económico,
o que provava a capacidade de adquirir mais esposas
A “teoria (ou ideologia) que ergue o princípio do governo limitado indispensável à garantia de
direitos em dimensão estruturante da organização político-social de uma comunidade...técnica
específica de limitação do poder com fins garantísticos.”
1. A ANTIGUIDADE CLÁSSICA
Tendo passado pela transição entre o período dos Juízes até a instauração da Monarquia, este
profeta fiscalizou e contestou acções “extrapolantes” por parte do primeiro Monarca (Saul).
Nas Cidades-Estados Gregas (séc. V a.C), deu-se como exemplo de democracia constitucional,
na medida em que a democracia directa, particular a elas consagrava “...o único exemplo
conhecido (discordo) de sistema político com plena identidade entre governantes e governados,
no qual o poder político está igualmente distribuído entre todos os cidadãos ativos.”
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Que razões levaram a uma tão rápida e vertiginosa ocupação do continente africano?
Para além das razões de ordem económica, comuns às potências europeias empenhadas [e de tal
modo comprometidas] no processo de industrialização, e que foram determinantes a partilha da
África, feita de uma forma tão precipitada, foi o resultado da intervenção do rei da Bélgica,
Leopoldo II, e da Alemanha que, anteriormente, não tinham demonstrado interesse pelo
continente africano.
Assim, desconhecido o Centro africano, para a penetração nela, as embocaduras do rio Congo ou
Zaire tornar-se-á o cerne das atenções e das mais puras situações litigiosas entre as grandes
potências europeias. É por meio desta que surge a ideia da criação de uma conferência, realizada
em Berlim, entre Novembro de 1884 a 26 de Fevereiro de 1885, uma reunião que, a pesar de
vários assuntos abordados, teve como umas agendas da resolução a região do Congo.
Teorias diplomáticas Para evitar o conflito generalizado entre europeus era preciso ocupar
África, segundo a Estratégia Global.
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Uma invasão consiste numa acção militar em que as forças armadas de uma entidade geopolítica1
entram em território controlado por outra entidade, geralmente com objectivos de conquista
territorial ou de alterar o governo. Uma invasão pode ser a causa de uma guerra.
O processo de roedura da África teve um começo anterior a conferência de Berlim, com a estada
dos portugueses por volta de 1430. No século XV, as nações cristãs da Europa iniciaram a Era
Moderna do colonialismo com a “Era dos descobrimentos” (ou Era das Navegações) é a
designação dada ao período da História que decorreu entre os séculos XV e início do século
XVII, durante o qual os europeus exploraram intensivamente o globo terrestre em busca de
novas rotas de comércio, visto que, os turcos otomanos haviam bloqueado o acesso às Índias via
terra de Tânger até a região de Safim, o rei de Portugal enviou viajantes exploradores à procura
de rotas marítimas.
A exploração europeia perdurou até realizar o mapeamento global do mundo, resultando numa
nova divisão e no contacto entre civilizações distintas, alcançando as fronteiras mais remotas
muito mais tarde, já no século XIX.
O colonialismo em África surgiu no contexto das guerras que ocorriam na Europa durante os
séculos XV a XVII pela escassez de terras e ausência de determinados produtos. Neste caso,
os europeus foram aos poucos aproximando-se para África, tendo pela primeira vez alcançado
Ceuta, em 1415. Mais tarde, eles vão se expandindo para a Costa. No mesmo contexto, surgem
em África exploradores como: David Livingstone, Mungo Park, Morton Stanley, Sarvognan de
Brazza, Serpa Pinto, Capelo Ivens, António Maria Cardoso, entre outros.
O objectivo fundamental destas viagens de reconhecimento era descobrir o que é que existe em
África e, que seja especial para os europeus. Fora dos jornalistas e exploradores, os comerciantes
e os prisioneiros, também fizeram parte das viagens exploratórias.
Portanto, a saída dos europeus para África, deveu-se, também, aos conflitos entre religiosos
católicos e protestantes; havia perseguições no seio da Europa; outro factor é que depois da
estabilização da Europa, com poucas terras expandem-se para alargar suas esferas de influência.
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A certeza da existência de riquezas africanas fez nascer neste período uma série de Associações
de patrocínio a estas viagens. Teoricamente definidas como Associações Científicas e
filantrópicas organizadas com o objectivo de promover a exploração e a “civilização africana”,
elas tiveram essencialmente fins políticos e não surgiram desligadas das rivalidades entre
potências europeias. Destacou-se aqui a “Associação Internacional Africana”, criada depois da
Conferência Geográfica de 18762. Essa Conferência decorreu sob direcção do rei Leopold II da
Bélgica.
O período mais activo da Partilha ocorreu depois de a Alemanha ter se apoderado, no período de
1882/ 1884 de algumas zonas estratégicas na Costa de África, tais como Luderitz (hoje Namíbia)
e Tanganyica. As tensões avolumaram-se e foi nesse contexto que surgiu a Conferência de
Berlim, como se ilustra a seguir:
O trecho acima apresentado atesta claramente que a Partilha de África não foi algo iniciado com
a convocação da Conferência por Otto Von Bismarck. Foi antes de mais, um processo que teve
seu início muito antes da Conferência. Esta serviu apenas para a legitimação da partilha.
O termo autoridade tradicional tem sido considerado como uma instituição oposta às formas de
chefia do Estado moderno, portanto, o termo é tomado como antítese do moderno. Autoridade
tradicional é um sistema de chefias produzidas pela administração colonial. A autoridade
tradicional assim como o régulo são pessoas locais que assumem um poder tradicional dentro das
comunidades. A diferença que existe encontra-se na legitimidade e legalidade do poder de um
e do outro. A legitimidade do chefe tradicional é conferida pela comunidade, enquanto o régulo
era legitimado pela administração colonial.
A autoridade tradicional é um indivíduo que devido aos laços com a terra exerce um poder
simbólico de pai da comunidade. Todo o exercício do poder está descentralizado em linhagens
com diferentes tipos de ligação com a linhagem dominante. Estas ligações, são estabelecidas,
ou através de conquistas ou ainda através da escolha pessoal, onde os grupos escolhem estar
ao lado de alguém justo ou poderoso (Lundin, 1995). Autoridade tradicional não pode ser
destituída conforme o prazer ou por decisão dos membros comunitários.
Como fundamento dessa ideia, Ivala et al (1999) afirmam que quem admite a entronização de
um novo chefe são os espíritos dos antepassados com os quais ele estará em constante
comunicação ao logo de todo o período de exercício das suas funções.
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A palavra régulo passou a designar todas as figuras políticas que estivessem a frente de
determinadas unidades políticas independentemente da legitimidade comunitária. Foi então que,
a figura do régulo foi sendo confundida muitas vezes com a do chefe tradicional.
Com a independência de Moçambique de 1975, tanto os chefes tradicionais como os régulos
foram conotados como servidores do governo colonial português. Este facto fez com que na
criação do novo aparelho do Estado, os chefes tradicionais passassem a uma situação marginal
e sem nenhuma função sobretudo quando se tratasse da articulação com os Órgãos do Estado.
No seu lugar, foram institucionalizados os Grupos Dinamizadores e as Assembleias populares
com intuito de assegurar as tarefas sociais, económicas e culturais de cada região tendo em conta
as suas especificidades.
Foi a partir dos anos de 1992 que apesar de ausência de uma lei que reconhece-se a autoridade
tradicional, começa-se a sentir a existência duma certa colaboração entre esta entidade e as
instituições do Governo de Moçambique.
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todas as decisões importantes sobre a vida da comunidade só poderão surtir efeitos desejados se
tais decisões forem implementadas em coordenação entre a autoridade tradicional e os Órgãos
interessados.
A autoridade tradicional assenta na crença a tradição e a sua legitimidade é garantida por aqueles
que governam segundo essas tradições. Segundo Durkheim (1983), A autoridade tradicional,
assenta-se na coesão social baseada principalmente nos valores a que todos os membros do
grupo prestam obediência.
Do ponto de vista da sua natureza, a autoridade tradicional, de forma geral, é moldada por uma
organização social linhageira assente no parentesco, tendo no culto dos antepassados uma das
características marcantes da sua religiosidade. Nestas circunstâncias, a linhagem constitui o
principal critério para legitimar o poder da autoridade tradicional.
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O poder tradicional é sagrado na medida em que busca a sua legitimidade nas raízes profundas
das comunidades, dada a sua ligação com os ancestrais [os nossos avos já falecidos]. São os
chefes tradicionais, que por simbolismo presidem ou solicitam as cerimonias que reforçam e
tornam mais legítima a sua autoridade.
A importância da autoridade tradicional neste processo, deve-se a sua ligação histórica com a
comunidade onde ela é confiada a direcção dos destinos dos demais concidadãos. Para Katiavala
(2004), as promessas positivas do poder tradicional pode ser vista:
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Autoridade tradicional encontra-se numa posição privilegiada quando se trata de questões ligadas
a tomada de decisão sobre assuntos ligados a vida da comunidade. O conhecimento pelos
indivíduos de regras e normas que norteiam o funcionamento do grupo a que fazem parte, torna
possível o consenso na tomada de decisão no processo de resolução de conflitos uma vez que os
sujeitos actores são tidos como conhecedores dessas mesmas regras e normas.
A autoridade tradicional organiza a participação dos indivíduos na solução dos seus problemas,
promover o desenvolvimento local, aprofundamento e a consolidação da unidade dos indivíduos
com vista a objectivos comuns.
A autoridade do ponto de vista de Weber (2000), é a forma mais importante e assumida pelo
poder na vida social porque este poder é gerado e controlado pela comunidade, ou seja,
pelas normas do sistema social, aceite como legítima pelos que dela participam. A
legitimidade social da autoridade, depende de a mesma ser usada de acordo com as normas que
lhe definem a esfera de acção e os mecanismos sociais através dos quais é aplicada.
O poder da autoridade tradicional é visto como aquele que procura garantir a resolução dos
problemas que os afectam, porque ele percebe como as coisas funcionam. Neste caso, a
preferência dos membros da comunidade em relação as formas tradicionais de resolução de
conflitos é movida pelo sentimento de honra, porque no seio do grupo as coisas, regra geral, são
feitas dessa maneira, e dentro dos princípios definidos pelo grupo.
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O acto colonial constitui o documento oficial instaurado que introduz a expressão legal máxima
de a Nação Portuguesa desempenhar a função histórica de colonizar as terras dos
Descobrimentos sob a sua soberania e de comunicar e difundir entre as populações ali existentes
os benefícios da sua civilização, exercendo também a influência moral aos povos colonizados.
O governo directo pressupõe a existência de uma única ordem jurídica, assente nas leis da
Europa, não reconhecendo qualquer instituição ou direitos africanos. O domínio concretizava-se
num sistema colonial centralizado e hierárquico e na sujeição da maioria da população ao regime
do indigenato (indigénat), que definia as regras para os não cidadãos. Este regime previa que os
indígenas pudesse obter o estatuto de assimilados, adquirindo, desse modo, direitos de cidadania,
mas o número dos que adquiriam esse estatuto permaneceu sempre muito reduzido. O governo
indirecto parte de uma concepção oposta à universalista, assentando na diferenciação.
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Na base desta forma de governo esteve sempre a distinção entre não nativos e nativos,
cuidadosamente separados pelas ordens normativas e pelas instituições a que estavam sujeitos:
os primeiros ao direito civil da metrópole e às instituições da mesma; os segundos aos direitos
costumeiros e às autoridades tradicionais, ambos selectivamente reconstituídos ou criados à
medida das necessidades do poder colonial.
A palavra indígena podia designar o nativo de qualquer parte de qualquer território colonizado
por europeus e, da mesma maneira, podia designar tanto o soba africano ou o príncipe indiano,
como os respectivos súbditos.
Para o sistema colonial, as populações locais foram tratadas, tal como nas demais experiências
colonizadores levadas a cabo pelos povos europeus, como bárbaras, indígenas, primitivas,
atrasadas ou aborígenes. Os povos colonizados eram, em todos os aspectos (económicos, sociais,
culturais, religiosos, políticos) considerados inferiores em relação aos europeus, e, portanto,
desprovidos das mais elementares bases civilizacionais, regidos por usos e costumes
considerados rudimentares, tornando-se necessário, para o efeito, um aturado e profundo
processo de elevação gradual da sua condição através de modelos de assimilação ou integração
na ordem considerada civilizada.
Ainda que Portugal tenha estado presente em Moçambique desde o século XVI, só nos últimos
anos do século XIX veio a ocupar e administrar efectivamente o território. Como afirma Ana
Maria Gentili, o exemplo britânico fez escola, principalmente perante os sucessos produtivos da
Nigéria e da Costa do Ouro atribuídos à capacidade de visão política de governo indirecto. O
regime do indigenato, introduzido formalmente nos anos 1920, apesar da designação,
aproximava-se mais do sistema de governo indirecto, ainda que apresentasse alguns traços
assimilacionistas. Caracterizava-se pela divisão entre cidadãos e indígenas e assentava em dois
modelos administrativos e duas formas de direito.
A estrutura colonial básica que caracterizou Moçambique como colónia portuguesa foi fixada
durante o período de Freire de Andrade como Governador-Geral (1906 - 1910), através da Carta
Orgânica da Província de Moçambique, promulgada pelo Decreto de 23 de Maio de 1907, do
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então Ministro da Marinha e do Ultramar, Aires de Ornelas, poucos anos antes da queda da
Monarquia.
No espaço rural o Estado Colonial utilizou a figura da “regedoria”, que por seu turno, poderiam
ser divididas em grupos de povoações ou povoações, nas quais deveriam ser agrupada a
população indígena que habitava o respectivo território a título permanente.
Por outro lado, “quando se conhecer que o individuo designado para regedor, chefe de grupo de
povoações ou chefe de povoação, pelos costumes ou pela população, não é idóneo para o
exercício do cargo, será escolhido outro por meio de eleição, mas o que for eleito só será
investido na sua autoridade depois de nomeado pelo administrador”
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O código do Indigenato foi formalmente imposto em 1928, mas, de acordo com O’Laughlin,
sistematizava um conjunto de normas anteriores que definiam a cidadania em relação ao trabalho
forçado. A Lei do Trabalho de 1899 articulou, pela primeira vez, a distinção entre cidadão e
súbdito, não nativo e nativo.
A lei estabelecia que «todos os nativos das províncias ultramarinas portuguesas estão sujeitos à
obrigação, moral e legal, de tentar obter através de trabalho os meios de que necessitam para
subsistir e melhorar as suas condições sociais». Previa, ainda, que se tal não acontecesse, o
governo tinha o direito de forçar os nativos a prestar serviços quer ao governo, quer a privados.
Havia poucos empregos disponíveis com salários que atraíssem os africanos por sua livre
vontade e só os que possuíam terrenos grandes e férteis seriam considerados agricultores. Assim,
a lei afectava a maioria da população. Às autoridades tradicionais cabia o controlo da população
e o recrutamento para trabalho forçado daqueles que não tivessem a iniciativa de trabalhar ou
que não cumprissem a lei.
Estava estabelecida a divisão entre indígenas, sujeitos ao trabalho forçado, e não indígenas,
isentos daquele. O Estado Novo de Salazar intensificou e aperfeiçoou esta politica,
nomeadamente com a Constituição de 1933, que incorporava o Acto Colonial. Este é, muitas
vezes, considerado o ponto de viragem, que marca o início de um Estado colonial.
Como afirma André C. José a tardia e cosmética transformação dos indígenas em cidadãos e a
apropriação ideológica das teses do lusotropicalismo não foram suficientes para disfarçar o
regime de forte segregação que vigorava. E, como conclui, a metamorfose, simplesmente, tornou
os indígenas em cidadãos sem cidadania.
Naturalmente que a Administração colonial exercia, sempre que necessário, uma interferência
nas regras sucessórias para designar uma autoridade considerada subserviente ou afastar outra
que fosse considerada insubordinada ou, de certo modo, contrária aos objectivos coloniais.
Em certa medida, uma parte das autoridades tradicionais, representadas no sistema de regedorias,
acabou constituindo criação da administração colonial, escolhidos entre soldados negros que
tinham participado nas guerras de ocupação ou por criados dos oficiais portugueses, desde que
assegurassem a materialização dos desígnios do Estado colo
Relação Direito Estadual do Direito Costumeiro tendo como enfoque a Constituição de 1975; A
organização judiciária a partir da 8ª Secção do Comité Central da Frelimo; a hegemonia do
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As rupturas que acontecem em qualquer sistema jurídico deriva dos processos políticos e das
lutas desencadeadas pelas antigas colónias na tentativa de alcançar as suas independências. A
constituição jurídica de qualquer país é determinada pela manutenção dos elementos estruturais
baseadas na antiga metrópole ou através da ruptura completa dos vínculos do passado.
No caso concreto do nosso país, houve uma tentativa de ruptura completa dos processos do
imperialismo nos processos políticos e ideológicos e ao nível jurídico a mudança foi apenas do
nível formal e não institucional.
Neste contexto, para fazer a análise da evolução dos sistemas políticos e judiciais de
Moçambique, far-se-á respeitando os seguintes períodos históricos: 1974/75 – marca o Governo
de Transição até a proclamação da independência; 1975/78 – reformas na organização judiciária;
1978/1992 – apogeu e declínio do regime socialista; e, 1992/2000 – Acordos de Paz e as 1as
eleições multipartidárias.
Apesar da reforma de 1960, o indígena continuou a ser considerado povo sem cidadania, com
desigualdades de oportunidades entre os moçambicanos, com a falta de sindicatos e integração
no sistema de pensões. A justiça continuou embora se tenha tentado com a reorganização dos
julgados municipais e de paz a confundir-se com os actos administrativos, isto porque a Lei
determinava que competências deviam ao Juiz Municipal de 2ª classe em regime de inerência
pelos Conservadores do Registo Civil do respectivo Concelho ou Circunscrição, porém, várias
Circunscrições não dispunham de Conservadores e acabaram sendo os Administradores a exercer
as tais competências.
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Como forma de dar mais célebre e garantir a justiça entre cidadãos, o governo de transição
passou a confiar os magistrados estrangeiros privilégios de assumir e dirigir os processos
judiciais, todavia, devido ao momento turbulento derivado da transição, estes, começaram a
rarear e os processos tornaram-se cada vez mais morosos e podia-se dizer que devia-se encarar o
processo judicial partindo da base.
Era preciso estabelecer prioridades tendo em conta a escassez dos recursos, e isso só seria
possível através dos seguintes objectivos: o período de transição devia ser feito de forma
ordeira e pacífica e no respeito aos acordos estabelecidos; alcançar a médio e longo prazo a
criação de instrumentos adequados a adoptar de forma gradual para que o país tenha recursos
humanos indispensáveis ao seu desenvolvimento; as reformas deviam ser graduais para
garantir o funcionamento pleno das instituições herdadas.
Para garantir uma transição ordeira, foram adoptadas providências legislativas, destinadas a
reprimir todo e qualquer acto que pusesse em causa a paz social e o progresso económico de
Moçambique, como atestam os seguintes decretos:
decreto-lei 11/74 que considera crimes contra a descolonização todos previstos no Código Penal
e na legislação subsidiária;
decreto-lei 16/75 que permite a intervenção do Estado nas empresas singulares ou colectivas
quando deixassem de funcionar em termos de contribuir para o desenvolvimento económico e na
satisfação dos interesses colectivos;
decreto-lei 2/75 que visava a formação de especialistas diplomados nos vários ramos de direito
em ordem a colmatar o progressivo envasamento do corpo dos magistrados e juristas.
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o decreto-lei 14/74 determinava o provimento interino por conveniência de serviço dos lugares
do quadro do pessoal;
e o decreto-lei 27/75 que autoriza a nomeação de indivíduos com mais de 21 anos como
inspectores e subinspectores da Policia Judicial.
Este, tinha como objectivos bases a revolução do aparelho de Estado como forma de garantir o
desenvolvimento das zonas rurais em todos os sectores da actividade do Estado; destruir as
estruturas do passado como condição do triunfo da revolução;
O primeiro objectivo foi possível através da criação das aldeias comunais visto que era olhado
como solução para as forças colectivas de produção e iriam melhorar as condições de vida do
próprio cidadão. Dizia-se ser a forma de garantir o fornecimento dos meios materiais, técnicos e
científicos que o partido e o governo se esforçariam por disponibilizar.
Na área de justiça viu-se que perante o tempo colonial os tribunais eram apenas o privilégio da
minoria e a linguagem judiciária não era acessível, só seria compreensível pelos profissionais
especializados e os processos primitivos adoptados no período colonial não seriam não seriam
para a reeducação dos delinquentes e da sua integração a sociedade, assim, foi decidido que
devia se elaborar novas leis que servissem de instrumentos de unidade nacional e de defesa da
revolução, simplificando a linguagem das Leis e lançar campanhas de explicação sobre
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decreto-lei 5/75 onde o Estado é considerado como o único ente responsável por todas as
actividades de prevenção e tratamento de pandemias;
decreto-lei 21/75 que cria o Serviço Nacional de Segurança Popular (SNASP) que ordena e
realiza ou manda realizar as diligências, buscas e apreensões que entender convenientes;
decreto-lei 25/75 substitui a Polícia Judiciária pela PIC como forma de evitar a dispersão da
autoridade e garantir a coordenação e eficácia de serviços públicos.
Em 1976, o Comité Central da Frelimo na sua 8ª secção faz o balanço dos primeiros meses de
governação e aprova as seguintes resoluções:
Como resposta do acesso da justiça para todos, em 1977, o Ministério da justiça concluiu a
elaboração do anti-projecto Lei, da organização judiciária disponível a debate público, momento
este, que é marcado pela conclusão dos primeiros bacharéis da Faculdade de Direito da UEM
nos finais de 1979, decorreu as 1ªs eleições para as Assembleias de Povo.
Em 1978, os 1ºs bacharéis são organizados em brigadas e dispersos por todo o país onde, durante
4 meses recolheram as contribuições para o enriquecimento do anti-projecto Lei.
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Em Agosto do mesmo ano realizou-se o seminário nacional onde se fez a apreciação e o balanço
do anti-projecto e faz-se o aprofundamento das ideias da ruptura do sistema colonial e adequar a
administração da justiça as novas condições políticas e sociais do país.
E na base deste colóquio que se aprova a lei 12/78 de 2 de Dezembro (lei de organização
judiciaria) que edifica a justiça popular.
Após o III Congresso (1977) da Frelimo que deliberou sobre a Socialização do campo; definição
da agricultura como base de desenvolvimento e a indústria como factor dinamizador, onde
através do Plano Prospectivo Indicativo, com o objectivo de promover a radical transformação da
estrutura económica e social com a criação de um sector socialista dominante; promover o
aumento do nível de vida da população em geral, com vista à satisfação das suas necessidades
básicas; consolidar o poder político, fortalecendo a base social operária e baseada num
campesinato forte; conquistar o que de essencial constitui o património científico e técnico de
toda a humanidade, foram operadas profundas mudanças que ditaram a consolidação do modelo
socialista no país.
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Docente: Horácio Deusdado Gervásio Linaula
Lei 5/83 – que estatui a pena de chicotada para punir os autores, cúmplices ou encobridores de
certos crimes graves, tivessem sido consumados, etc.
Neste âmbito, em 1984, assina-se um acordo de boa vizinhança e de não agressão, este
conhecido como Acordo de Inkomati com o então regime de Apartheid.
No mesmo ano, o país decide aderir aos Acordos estabelecidos na Conferência Monetária e
Financeira das Nações Unidas realizada em Bretton Woods em 22 de Julho de 1944, e
consequentemente o cumprimento do Programa de Reabilitação Económica (PRE), lançada
em 1987, como contrapartida dos créditos necessário à recuperação de uma economia devastada
pela guerra e outros factores relevantes. O PRE representou a adesão a uma ideologia que se
tornaria dominante em todo o mundo (o neoliberalismo). O novo modelo implica um modelo
económico democrático assente numa super estrutura representativa ou multipartidária e na
tripartição de poderes do Estado. É neste espírito que se aprova vários decretos-lei com a
finalidade de facilitar a prossecução dos objectivos e ganhar-se a confiança dos países centrais e
das organizações humanitárias internacionais.
A revisão constitucional que começa nos fins dos anos 80, começou por ser uma medida de
propósitos limitados com o simples objectivos de adoptar a Lei Fundamental à realidade da
economia de mercado.
No que se refere ao sistema de administração da justiça, foi criada a Lei 10/91 que aprova o
estatuto dos magistrados judiciários e as Leis 4, 5 e 10/92 relativas ao funcionamento dos
tribunais comunitários, ao estatuto orgânico do Tribunal Administrativo e ao estatuto orgânico
dos tribunais judiciais. Estas reformas vieram trazer à organização do poder judiciárias mudanças
significativas com o destaque das seguintes: a autonomização dos tribunais e das procuradorias
relativamente ao poder executivo e a integração dos tribunais comunitários do sistema
judiciário formal. Os tribunais comunitários tinham a missão de educar os cidadãos no
cumprimento voluntário e consciente das leis, estabelecendo uma justa e harmoniosa
justiça social; penalizar as violações da legalidade e decidir os pleitos de acordo com o
estabelecido na lei; e garantir e reforçar a legalidade como instrumento da estabilidade
jurídica, garantir o respeito das leis e assegurar os direitos e liberdades dos cidadãos.
Síntese
Os vinte e sete anos já transcorridos desde que Moçambique se tornou um país independente,
foram atravessados por dois processos de transformação política, económica e social de sentido
oposto:
Um tipicamente revolucionário, ocorrido no período de guerra fria, por isso, num contexto
internacional de confrontação entre dois sistemas antagónicos, determinando a ruptura com as
estruturas de opressão e exploração coloniais tradicionais e da mentalidade que lhe está
subjacente e adoptando a planificação centralizada e administrativa da economia como estratégia
de desenvolvimento;
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Docente: Horácio Deusdado Gervásio Linaula
Manteve-se a colegialidade de todos os tribunais e a participação dos juízes leigos (eleitos) que
tinham sido violados na Lei 12/78;
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