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FABAVI/DOCTUM – EDUCAÇÃO FÍSICA

Psicologia da Aprendizagem – Texto 02


Prof. Eduardo Miranda mirandapsi@yahoo.com.br

PSICANÁLISE

Sigmund Freud (1856-1939) foi um médico que alterou radicalmente, o


modo de pensar a vida psíquica. Sua contribuição é comparável à de Karl
Marx na compreensão dos processos históricos e sociais. Freud ousou
colocar os "processos misteriosos" do psiquismo, suas "regiões obscuras",
isto é, as fantasias, os sonhos, os esquecimentos a interioridade do homem,
como problemas, mas científicos. A investigação sistemática desses
problemas levou Freud à criação da Psicanálise. O termo psicanálise é usado
para se referir a uma teoria, a um método de investigação e a uma prática
profissional.

Enquanto teoria caracteriza-se por um conjunto de conhecimentos


sistematizados sobre o funcionamento da vida psíquica. Freud publicou uma
extensa obra, durante toda a sua vida, relatando suas descobertas e
formulando leis gerais sobre a estrutura e o funcionamento da psique
humana. A Psicanálise, enquanto método de investigação caracteriza-se
pelo método interpretativo, que busca o significado oculto daquilo que é
manifesto por meio de ações e palavras ou pelas produções imaginárias,
como os sonhos, os delírios, as associações livres, os atos falhos. A prática
profissional refere-se à forma de tratamento – a Análise - que busca o
autoconhecimento ou a cura, que ocorre através desse autoconhecimento.

A GESTAÇÃO DA PSICANÁLISE

Freud formou-se em Medicina na Universidade de Viena, em 1881, e


especializou-se em Psiquiatria. Trabalhou algum tempo em um laboratório
de Fisiologia e deu aulas de Neuropatologia no instituto onde trabalhava.
Por dificuldades financeiras, não pôde dedicar-se integralmente à vida
acadêmica e de pesquisador. Começou, então, a clinicar, atendendo
pessoas acometidas de "problemas nervosos". Obteve, ao final da
residência médica, uma bolsa de estudo para Paris, onde trabalhou com
Jean Charcot, psiquiatra francês que tratava as histerias com hipnose.

Em 1886, retornou à Viena e voltou a clinicar, e seu principal instrumento


de trabalho na eliminação dos sintomas dos distúrbios nervosos passou a
ser a sugestão hipnótica. Em Viena, o contato de Freud com Josef Breuer,
médico e cientista, também foi importante para a continuidade das
investigações. Nesse sentido, o caso de uma paciente de Breuer foi
significativo. Ana O. apresentava um conjunto de sintomas que a fazia
sofrer: paralisia com contratura muscular, inibições e dificuldades de
pensamento. Esses sintomas tiveram origem na época em que ela cuidara
do pai enfermo. No período em que cumprira essa tarefa, ela havia tido
pensamentos e afetos que se referiam a um desejo de que o pai morresse.
Estas idéias e sentimentos foram reprimidos e substituídos pelos sintomas.
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Em seu estado de vigília, Ana O. não era capaz de indicar a origem de seus
sintomas, mas, sob o efeito da hipnose, relatava a origem de cada um
deles, que estavam ligados a vivências anteriores da paciente, relacionadas
com o episódio da doença do pai. Com a rememoração destas cenas e
vivências, os sintomas desapareciam. Este desaparecimento não ocorria de
forma "mágica", mas devido à liberação das reações emotivas associadas ao
evento traumático - a doença do pai, o desejo inconsciente da morte do pai
enfermo.

Breuer denominou método catártico o tratamento que possibilita a liberação


de afetos e emoções ligadas a acontecimentos traumáticos que não
puderam ser expressos na ocasião da vivência desagradável ou dolorosa.
Esta liberação de afetos leva à eliminação dos sintomas. Freud, em sua
Autobiografia, afirma que desde o início de sua prática médica usara a
hipnose, não só com objetivos de sugestão, mas também, para obter a
história da origem dos sintomas. Posteriormente, passou a utilizar o método
catártico e, aos poucos, foi modificando a técnica de Breuer: abandonou a
hipnose, porque nem todos os pacientes se prestavam a ser hipnotizados;
desenvolveu a técnica de 'concentração', na qual a rememoração
sistemática era feita por meio da conversação normal; e por fim, acatando a
sugestão (de uma jovem) anônima, abandonou as perguntas – e com elas a
direção da sessão para se confiar por completo à fala desordenada do
paciente.

A DESCOBERTA DO INCONSCIENTE

"Qual poderia ser a causa de os pacientes esquecerem tantos fatos de sua


vida interior e exterior...?", perguntava-se Freud. O esquecido era sempre
algo penoso para o indivíduo, e era exatamente por isso que havia sido
esquecido e o penoso não significava, necessariamente, sempre algo ruim,
mas podia se referir a algo bom que se perdera ou que fora intensamente
desejado. Quando Freud abandonou as perguntas no trabalho terapêutico
com os pacientes e os deixou dar livre curso às suas idéias, observou que,
muitas vezes, eles ficavam embaraçados, envergonhados com algumas
idéias ou imagens que lhes ocorriam. A esta força psíquica que se opunha a
tornar consciente, a revelar um pensamento, Freud denominou resistência.
E chamou de repressão o processo psíquico que visa encobrir, fazer
desaparecer da consciência, uma idéia ou representação insuportável e
dolorosa que está na origem do sintoma. Estes conteúdos psíquicos
"localizam-se" no inconsciente.

A PRIMEIRA TEORIA SOBRE A ESTRUTURA DO APARELHO PSIQUICO

Em 1900, no livro A interpretação dos sonhos, Freud apresenta a primeira


concepção sobre a estrutura e o funcionamento da personalidade. Essa
teoria refere-se à existência de três sistemas ou instâncias psíquicas:
inconsciente, pré-consciente e consciente.

* O inconsciente exprime o "conjunto dos conteúdos não presentes no


campo atual da consciência". É constituído por conteúdos reprimidos, que
não têm acesso aos sistemas pré-consciente/consciente, pela ação de
censuras internas. Estes conteúdos podem ter sido conscientes, em algum
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momento, e ter sido reprimidos, isto é, "foram" para o inconsciente, ou


podem ser genuinamente inconscientes. O inconsciente é um sistema do
aparelho psíquico regido por leis próprias de funcionamento. Por exemplo, é
atemporal, não existem as noções de passado e presente.

* O pré-consciente refere-se ao sistema onde permanecem aqueles


conteúdos acessíveis à consciência. É aquilo que não está na consciência,
neste momento, e no momento seguinte pode estar.

* O consciente é o sistema do aparelho psíquico que recebe ao mesmo


tempo as informações do mundo exterior e as do mundo interior. Na
consciência, destaca-se o fenômeno da percepção, principalmente a
percepção do mundo exterior, a atenção, o raciocínio.

A SEGUNDA TEORIA DO APARELHO PSÍQUICO

Entre 1920 e 1923, Freud remodela a teoria do aparelho psíquico e introduz


os conceitos de id, ego e superego para referir-se aos três sistemas da
personalidade. O id constitui o reservatório da energia psíquica, é onde se
"localizam" os impulsos. As características atribuídas ao sistema
inconsciente, na primeira teoria, são, nesta teoria, atribuídas ao id. É regido
pelo princípio do prazer.
O ego é o sistema que estabelece o equilíbrio entre as exigências do id, as
exigências da realidade e as "ordens" do superego. Procura "dar conta" dos
interesses da pessoa. É regido pelo princípio da realidade, que, com o
princípio do prazer, rege o funcionamento psíquico. É um regulador, na
medida em que altera o princípio do prazer para buscar a satisfação
considerando as condições objetivas da realidade. Neste sentido, a busca do
prazer pode ser substituída pelo evitamento do desprazer. As funções
básicas do ego são: percepção, memória, sentimentos, pensamento.
O superego origina-se com o complexo de Édipo, a partir da internalização
das proibições, dos limites e da autoridade. A moral, os ideais são funções
do superego. O conteúdo do superego refere-se a exigências sociais e
culturais. Para compreender a constituição desta instância – o superego – é
necessário introduzir a idéia de sentimento de culpa. Neste estado, o
indivíduo sente-se culpado por alguma coisa errada que fez – o que parece
óbvio – ou que não fez e desejou ter feito, alguma coisa considerada má
pelo ego mas não, necessariamente, perigosa ou prejudicial; pode, pelo
contrário, ter sido muito desejada. Por que, então, é considerada má?
Porque alguém importante para ele, como o pai, por exemplo, pode puni-lo
por isso. E a principal punição é a perda do amor e do cuidado desta figura
de autoridade. Portanto, por medo dessa perda, deve-se evitar fazer ou
desejar fazer a coisa má; mas, o desejo continua e, por isso, existe a culpa.
Uma mudança importante acontece quando esta autoridade externa é
internalizada pelo indivíduo. Ninguém mais precisa lhe dizer "não. É como
se ele "ouvisse" esta proibição dentro de si. Agora, não importa mais a ação
para sentir-se culpado: o pensamento, o desejo de fazer algo mau se
encarregam disso. E não há como esconder de si mesmo esse desejo pelo
proibido. A função de autoridade sobre o indivíduo será realizada
permanentemente pelo superego.

OS MECANISMOS DE DEFESA, OU A REALIDADE COMO ELA NAO É


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A percepção de um acontecimento, do mundo externo ou do mundo interno,


pode ser algo muito constrangedor, doloroso, desorganizador. Para evitar
este desprazer, a pessoa "deforma" ou suprime a realidade – deixa de
registrar percepções externas, afasta determinados conteúdos psíquicos,
interfere no pensamento. São vários os mecanismos que o indivíduo pode
usar para realizar esta deformação da realidade, chamados de mecanismos
de defesa. São processos realizados pelo ego e são inconscientes, isto é,
ocorrem independentemente da vontade do indivíduo. Para Freud, defesa é
a operação pela qual o ego exclui da consciência os conteúdos indesejáveis,
protegendo, desta forma, o aparelho psíquico. O ego – uma instância a
serviço da realidade externa e sede dos processos defensivos –mobiliza
estes mecanismos, que suprimem ou dissimulam a percepção do perigo
interno, em função de perigos reais ou imaginários localizados no mundo
exterior. Estes mecanismos são:

* Recalque: o indivíduo "não vê", "não ouve" o que ocorre. Existe a


supressão de uma parte da realidade. Este aspecto que não é percebido
pelo indivíduo faz parte de um todo e, ao ficar invisível, altera, deforma o
sentido do todo. É como se, ao ler esta página, uma palavra ou uma das
linhas não estivesse impressa, e isto impedisse a compreensão da frase ou
desse outro sentido ao que o mais radical está escrito. Um exemplo é
quando entendemos uma proibição como permissão porque não "ouvimos o
não”. O recalque, ao suprimir a percepção do que está acontecendo, é o
mais radical dos mecanismos de defesa. Os demais se referem a
deformações da realidade.

* Formação reativa: o ego procura afastar o desejo que vai em determinada


direção, e, para isto, o indivíduo adota uma atitude oposta a este desejo.
Um bom exemplo são as atitudes exageradas – ternura excessiva,
superproteção – que escondem o seu oposto, no caso, um desejo agressivo
intenso. Aquilo que aparece (a atitude) visa esconder do próprio indivíduo
suas verdadeiras motivações (o desejo), para preservá-lo de uma
descoberta acerca de si mesmo que poderia ser bastante dolorosa. E o caso
da mãe que superprotege o filho, do qual tem muita raiva porque atribui a
ele muitas de suas dificuldades pessoais. Para muitas destas mães, pode
ser aterrador admitir essa agressividade em relação ao filho.

* Regressão: o indivíduo retorna a etapas anteriores de seu


desenvolvimento; é uma passagem para modos de expressão mais
primitivos. Um exemplo é o da pessoa que enfrenta situações difíceis com
bastante ponderação e, ao ver uma barata, sobe na mesa, aos berros.

* Projeção: é uma confluência de distorções do mundo externo e interno. O


indivíduo localiza (projeta) algo de si no mundo externo e não percebe
aquilo que foi projetado como algo seu que considera indesejável. É um
mecanismo de uso freqüente e observável na vida cotidiana. Um exemplo é
o jovem que critica os colegas por serem extremamente competitivos e não
se dá conta de que também o é, às vezes até mais que os colegas.

* Racionalização: o indivíduo constrói uma argumentação intelectualmente


convincente e aceitável, que justifica os estados "deformados" da
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consciência. Isto é, uma defesa que justifica as outras. Portanto, na


racionalização, o ego coloca a razão a serviço do irracional e utiliza para isto
o material fornecido pela cultura, ou mesmo pelo saber científico. Dois
exemplos: o pudor excessivo (formação reativa), justificado com
argumentos morais; e as justificativas ideológicas para os impulsos
destrutivos que eclodem na guerra, no preconceito e na defesa da pena de
morte.

Além destes mecanismos de defesa do ego, existem outros. . Todos nós os


utilizamos em nossa vida cotidiana, isto é, deformamos a realidade para nos
defender de perigos internos ou externos, reais ou imaginários. O uso
destes mecanismos não é, em si, patológico, contudo distorce a realidade, e
só o seu desvendamento pode nos fazer superar essa falsa consciência, ou
melhor, ver a realidade como ela é.

FASES DE DESENVOLVIMENTO SEGUNDO A PSICANÁLISE

O comportamento humano é orientado pela libido, a energia sexual. Ao


nascer, o bebê perde a relação simbiótica pré-natal que possuía com a mãe,
e a satisfação plena da vida uterina. Com o corte do cordão umbilical a
separação é irreversível, e a criança deve iniciar sua adaptação ao meio. A
noção de desejo se instaura, pois deixamos de ser 100% do tempo
satisfeitos para passarmos a sentir a angústia da falta. Uma das primeiras
sensações que sofremos no nascimento é a fome. A carência é sentida e o
organismo já luta para sobreviver. A luta entre os instintos já é uma
realidade nesse momento e é preciso reagir, pois do contrário o organismo
não sobreviverá. As primeiras trocas biológicas da criança com o mundo se
dão pela incorporação daquilo que é necessário (ou desejado) e pela
excreção dos resíduos indesejáveis. Desses fundamentos biológicos
surgirão os contextos psicológicos de introjeção (equivalente a
incorporação) e projeção (equivalente a excreção).

Fase Oral
Ao nascimento a estrutura sensorial mais desenvolvida é a boca. Pela boca
se dará a luta pela preservação do equilíbrio homeostático e também o
conhecimento do mundo, traduzido pelos movimentos do bebê de levar
objetos à boca. Sua primeira descoberta afetiva será o seio materno que
será reconhecido antes da mãe como um todo. A criança passa a entender o
seio não apenas como fonte de alimento, mas também como via de
obtenção de afeto e prazer. Esta fase dura de 0 a 18 meses e uma
equilibrada relação entre desejo e limitação é necessária para evitar o que
se denomina fixação, quando um indivíduo não se desenvolve
adequadamente em termos egóicos por não haver passado de forma
satisfatória por esse período.

Fase anal
Durando cerca de 18 meses aos 3 anos de idade, esta fase é marcada pela
associação da energia com a produção das fezes (projeção) e retenção,
pelos esfíncteres (controle). As ações que envolvem esses fatores ligam-se
a libido e daí surgem manifestações tradicionais, como o brincar com fezes.
Mais uma vez é preciso notar que exageros na lida com os processos
libidinais anais podem gerar conflitos no adulto. Como exemplo cita-se a
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preocupação exagerada com limpeza por parte dos pais, que pode causar
comportamentos obsessivos no futuro.

Fase fálica
Nesta fase, que dura dos 3 aos 7 anos, a energia sexual se dirige para os
genitais. Surgem os interesses pelos órgãos sexuais, pelas diferenças
anatômicas e as perguntas sobre as origens dos bebês. Exibicionismo,
masturbação e desejo de ver os genitais de outras crianças também são
comuns. Um aspecto comum desta fase é o chamado Complexo de Édipo
que leva esse nome em referência à tragédia grega escrita por Sófocles:
Édipo Rei. O menino passa a ter como objeto de desejo e de investimento
libidinal a mãe. Em uma situação ideal o pai realizará um corte, uma
limitação nessa relação, reprimindo os sentimentos do menino pela mãe e
ajudando a criança a estabelecer um modelo de busca de amor
heterossexual. De forma inversa o mesmo padrão seria encontrado nas
meninas (Complexo de Electra). Com a finalização desses processos surge o
período de latência. A sexualidade será reprimida até o surgimento da
puberdade e a libido será direcionada para o desenvolvimento intelectual e
social. Em média o período de latência dura de 7 a 12 anos.

Fase Genital
Nessa última fase o objeto de desejo não se relaciona com os pais e nem
está sublimado (“limitado”) a questões cognitivas e sociais. O ser humano
já se desenvolveu o suficiente para estabelecer relações com o sexo oposto
e integrar tais aspectos com os outros fatores da vida humana, como
trabalho, lazer, etc... Complicações nessa fase irão gerar as chamadas
neuroses, estudadas diretamente pela psicopatologia psicanalítica.

REFERÊNCIAS

BARROS, C.S.G. Pontos de Psicologia do Desenvolvimento. São Paulo:


Ática, 2002. P. 80-87

BOCK, A.M.B., FURTADO, O. e TEIXEIRA, M.L..T. Psicologias: uma


Introdução ao Estudo de Psicologia. São Paulo: Saraiva, 2002. P. 70-84.

RAPPAPORT, C.R., FIORI, W.R. e DAVIS, C. Psicologia do


Desenvolvimento. Vol. 1. São Paulo: EPU, 2001. P. 11-50

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