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REFERÊNCIA BÁSICA: HÚNGARO, Edson Marcelo; OLIVEIRA FILHO, ATHAYDE Fernando Avalone.
Lazer, trabalho e sociedade. In: SANCHES, Alcir Braga: Educação física à distância: módulo 8. Brasília:
Universidade de Brasília, 2010. 542 p.
1. O trabalho não ocorre de maneira direta sobre a matéria natural – Diferentemente das
atividades naturais, o trabalho exige instrumentos (machado, martelo, serrote, serra elétrica
etc.) que auxiliam o homem a transformar a natureza. Veja que tais instrumentos também vão
sendo desenvolvidos à medida que o homem se desenvolve;
3. O trabalho não está preso a uma lista limitada e invariável de necessidades – Conforme o
homem supre determinadas necessidades, outras vão surgindo. Mesmo algumas necessidades
que devem ser sempre atendidas (alimentação, reprodução biológica, repouso etc.), acabam
variando quanto à forma que são efetivadas.
Conforme apresentado no ponto 3 (acima), o trabalho representa uma transformação
do homem sobre a natureza e também a transformação de sua própria natureza. O homem,
nesse processo, está sempre movido por um fim, por um objetivo – o de apropriar-se da
matéria natural para o atendimento das suas necessidades.
Além disso, o trabalho se caracteriza como uma atividade coletiva. Esse atributo do
trabalho é denominado de social. Assim, observamos que o trabalho transforma a natureza –
numa relação entre sociedade/natureza – e opera uma transformação no interior da própria
sociedade.
O trabalho realizado pelos grupos de primatas fez surgir os primeiros grupos humanos,
ocasionando uma espécie de salto ontológico que resultou num novo tipo de ser, diferente do
ser natural (orgânico ou inorgânico). Esse ser foi denominado ser social, que se diferencia dos
demais por ser capaz de realizar atividades teleologicamente orientadas; objetivar-se material
e idealmente; comunicar-se e expressar-se pela linguagem articulada; tratar suas atividades e
a si mesmo de modo reflexivo, consciente e autoconsciente; escolher entre alternativas
concretas; universalizar-se e socializar-se.
Na concretização do trabalho, realizamos uma transformação na natureza que
pretendida, desde o início. Quando o processo termina, temos aquilo que havia sido
idealizado: o produto – que é a natureza trabalhada e adaptada às necessidades humanas.
Tem-se como resultado do processo todo, meios de trabalho, como meios de produção, e o
trabalho (a atividade), como trabalho produtivo (de valores de uso, até aqui).
O trabalho tem sempre um significado produtivo, e uma de suas implicações é o
próprio sujeito no trabalho. O que essa ideia nos diz? Bem, percebemos que o pensar é
movimentado pelo fazer e a objetivação do sujeito concretiza a consciência, mas, ao mesmo
tempo, a natureza se torna particular no sujeito que trabalha.
Embora o trabalho tenha uma dimensão de liberdade, pois representa a
transformação intencional do homem sobre a natureza, na ordem burguesa não é assim que
ele se apresenta. No capitalismo, o trabalho é muito mais representativo de “desrealização
humana” do que expressão de liberdade, pois ele é tão-somente uma mercadoria: a
mercadoria força de trabalho – elemento fundamental no processo de valorização.
O modo de produção capitalista pode ser caracterizado como a “sociedade das
mercadorias”, pois, por causa de um processo histórico, o trabalho humano é,
fundamentalmente, produtor de mercadorias, assim como o próprio trabalho é uma
mercadoria (força de trabalho). A mercadoria é, antes de tudo, um objeto externo, uma coisa a
qual pelas suas propriedades satisfaz necessidades humanas de qualquer espécie. A natureza
dessas necessidades, se elas se originam do estômago ou da fantasia, não altera nada a coisa
(MARX, 1983, p. 45).
Para o trabalhador, a mercadoria vale pelo valor de troca; para o capitalista, pelo valor
de uso para o processo de valorização do seu próprio capital, como veremos mais à frente. O
capitalista fornece a matéria-prima e os instrumentos de produção ao trabalhador, compra sua
força de trabalho, e o resultado final, o produto, pertence ao capitalista. O trabalhador, ao
vender sua força de trabalho ao capitalista, subordina-se ao capital. Ele já não é mais sujeito
no processo: aquilo que realizou, concretizado em forma de objeto, já não mais terá o destino
que ele quiser na troca, ou seja, ele já não é mais sujeito no processo de produção.
O destino do produto será decidido pelo capitalista que, por possuir os meios de
produção e o objeto produzido, faz o trabalhador submeter-se a ele. Todo esse processo
efetuado pelo capitalista tem um objetivo, uma finalidade: fazer que o capital aplicado
aumente, ou seja, objetiva a valorização de seu capital.
É importante saber que a distinção entre “tempo livre” e tempo de trabalho também
não ocorreu de forma homogênea e no mesmo momento para todos os habitantes da cidade.
Desde o século XIX, a visão conservadora do poder público manifestava suas preocupações
com o ócio e com o “tempo livre”, argumentando sobre os perigos do ócio, entendido como
vício, imoralidade e indolência.
E por que havia esse entendimento? Bem, o raciocínio é simples. Veja: para os
trabalhadores, o uso do tempo livre se tornou um instrumento de resistência e luta, não é
mesmo? Então, é compreensível que os discursos moralistas e as conotações punitivas
entendessem o ócio como vício, imoralidade, vadiagem, vagabundagem, indolência e perdição.
Assim, em nome da modernização e da racionalidade produtiva, havia um esforço
generalizado para desenvolver estratégias higiênicas ligadas ao controle corporal da população
brasileira, pois vadiagem, preguiça, inutilidade e improdutividade significavam doenças sociais
que precisavam ser banidas.
Mas no início do século XX, houve a expansão do “tempo livre” e os trabalhadores
realizavam atividades, dentro desse espaço. Daí, podemos perceber uma diferente tentativa
do Estado Liberal brasileiro de controlar os usos do tempo livre e de manipular a classe
trabalhadora, estimulando um conjunto de novas atividades recreativas e educativas, bem
como a criação de espaços e equipamentos específicos para sua prática. Começava a se
constituir o lazer!
Com efeito, o tempo livre começa a fazer parte
das preocupações dos governantes e industriais
a partir do momento que as atividades nele
desenvolvidas, e entre elas o ócio como prática
subversiva aos novos padrões de
comportamento, opõem-se aos objetivos do
capital. Se por um lado a ordem, a moral e o
descanso eram vistos como elementos
fundamentais para que o trabalhador
apresentasse mais disposição para o trabalho,
as práticas culturais do tempo livre, ao
contrário, configuravam-se como ameaça às
normas e aos valores da sociedade vigente. Mais
do que depressa, o divertimento passa a ser
direcionado, disciplinado e conduzido por uma
série de novas atividades lúdicas. Tratava- se de
substituir o ócio por uma outra atividade
moderna, mais “sadia”, mais “organizada”, mais
“educativa”: o lazer (MARCASSA, 2002, p. 4).
Em síntese: se por um lado, a classe trabalhadora conquistou o “tempo livre”, por
outro, os setores dirigentes e conservadores atribuem a ele um caráter utilitário, funcionalista
e conservador, capaz de colocá-lo a serviço dos interesses da produção e reprodução do
capital, bem como do projeto de modernização e desenvolvimento em vigor naquele período.
Assim, o lazer surge como solução para o reequilíbrio social e vai ganhando
importância para orientar a apropriação do tempo livre, a fim de afastar os indivíduos dos
espaços e das atividades que possibilitem a degeneração e a imoralidade das horas de ócio
indiscriminado.
FERREIRA, Camila Lopes. TRABALHO, TEMPO LIVRE E LAZER: uma reflexão sobre o uso do
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