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março 2003
A máquina
entrevista
da cultura
Um caco inédito de
Oswald de Andrade
Gianni Ratto
Alexandre Matte
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Nossos endereços
P OR QUE EDITAR UM JORNAL
ÁGORA – CDT CENTRO PARA
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TEATRO DA VERTIGEM
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A profissão de crítico
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É necessária uma
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Leis de Incentivo
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O que eu
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estrutura aqui
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O acesso de todos MAMBERTI –
São Paulo é
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Cláudia Costin
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Diferenças e contraditórias semelhanças entre as produções teatrais
desenvolvidas nas décadas de 60 e de 90 na cidade de São Paulo.
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Cena da peça Sacra Folia, da Fraternal
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Companhia do Latão
A COMPANHIA DO LATÃO
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É necessária a invenção de al-
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Anticapitalismo, pesquisa es-
tética e revolução
O que dá sentido político ao
teatro é a forma como se organi- O que determina o valor da
zam suas relações de produção produção artística é seu valor
de uso
Teatro inédito de
Oswald de Andrade
Esta cena teatral de
Oswald de Andrade
foi recolhida no
arquivo Alexandre
Eulálio, da Unicamp.
Salvo engano, nunca
FRAGMENTO C1 – Sim, o da letra.
foi publicada, sequer GARCIA S. – Pois é. Pois é… aquel desgraçado do Tafá não me apareceu ainda. Vou telefonar.
citada. Difícil Espere um pouco, vou telefonar. (Pausa. Barulho de disco telefônico). Eló! Eló! É do escri-
precisar sua data. S. – Oh, Garcia! Oh Garcia! (Pausa.) Oh tório do Tafá? É? Pois bem: o Tafá está aí?… Como?… Está em Santos?… Fazendo o
Seu assunto, o Garcia! (Pausa.) Este homem!…Garcia! quê?… Se tratando?… De quê?… De resfriado?… Or’essa é muito boa. Então isso é
mesmo de O rei da G. – Pronto. (De longe.) hora de apanhar resfriados? E eu que faço? Estou com o freguês aqui perto de mim
vela (de 1933), é a S. continua chamando - Garcia! Oh Garcia! esperando um negócio que ele me prometeu e esse desgraçado me arranja um jeito de
agiotagem. Depois da Será possível! pegar um resfriado logo agora? Mas que coisa! Qu é que vou fazer? Mas meu Deus! Onde
crise de 1929 e da G.– Pronto seu Sirva. Que coisa. Já vou! (Vai se aproximando. Garcia se aproxima.) é que esse homem está com a cabeça! E…me diga uma coisa: quando é que ele vol-
dissipação da fortuna Pronto, seu Sirva. Que é que há? Que coisa! Não precisa chamar desse jeito! (Resmun- ta?… Amanhã?… Mas que coisa! Só amanhã de tarde?… que foi… Ele podia morrer?…
familiar, o escritor gando.) Que coisa, até parece que a gente é surdo. Ora iessa é muito boa. Bem sei eu que el poderia morrer…. Não, quem poderia morrer
passou muitos dos
S. pega uma lâmpada que está sobre a escrivaninha. Em outro tom - Oh Garcia. sou eu… Isto é, Ele não poderia morrer porque está a cidade cheia de gente pra ele roubar
G. calmo – Que é? e eu não tenho ninguém para roubar… isso mesmo eu bem poderia morrer… Até
seus dias “tocando
S. – Pega essa lâmpida e vá ver se ela está morta ou ainda vive, a desgraçada. logo…Não, telefonarei amanhã. (Barulho de quem desliga o telefone.)
flauta”, gíria da G. – Home essa agora! Isso não é serviço meu, isso é lá com Aristide, pergunte C1. – Que foi?
época para o ato de para ele, home essa agora! S. – Esse desgraçado, cachorro de uma figa. Vai me apanhar um resfriado bem
pedir dinheiro a um S. – Vá, homem, vá! (Exaltando-se.) Ninguém me ajuda! Eu é que tenho que ver agora! Esses homens que têm dinheiro deviam morrer todos. Eles podem fazer isso.
agiota e pagar outro. tudo neste escritório. Ninguém me ajuda! Vá Homem de Deus anda lá com isso! Mas Quando têm uma porcaria de um resfriado, metem-se logo para Santos. Eu é que fico
Conhecia o que coisa! Por Deus do Céu. Qualquer dia eu ainda faço uma besteira! aqui me rebentando todo para servir os senhores. Veja só que calamitosidade.
psiquismo dos G. – Mas que coisa! Isso não é serviço meu, isso é com o zelador, eu não entendo C1. – O senhor está muito nervoso hoje, Seu Silva.
endividados e dos disso. (Pega a lâmpada e sai resmungando.) Que coisa, puxa vida. Português unha de S. – Mas se não é para estar nervoso… Agora é que são elas. (Pausa.) Oh! Garcia!
usurários, e via no fome esse desgraçado. Quando é pra dá trabalho pra gente ele bem que sabe, mas Garcia! Não encontrou o dicumento?
juro a alma do quando é prá entrá com uma gaitinha pro futebó, não espirra nem um níquel. G. – Ainda não.
mundo capitalista. O S. – Oh Garcia! Tu não vens nunca com essa lâmpida! S. – Ah! Mas que coisa horrível… Quando o diabo mete-se no meio dos negócios
fragmento parece um G. de longe – Já vai, puxa vida, estou esperando o Aristides! Já disse que eu não da gente, nem Cristo nos salva. Perdi um dicumento de uma importância enorme e não
entendo dessas coisas! encontro o desgraçado papelzinho. O que é que vou fazer? Ai meu Deus!…Tenho a
rascunho cômico a
S. – Êta mineiro mole esse diabo! Não me ajuda em nada. Tenho eu que fazer tudo impressão que alguém me entra pela minha secretaria a dentro à noite quando não
ser trabalhado
nesse maldito escritório. (Pausa.) Não sei porque é que estou metido aqui dentro desta estou eu aqui e vem mexer nas minhas coisas…Isso é coisa que se faça? Perder um
depois. Não tem a sala. Maldita a hora que inventei essa porcaria! Oh Garcia! Tu não vens mais? dicumento de tão grande importância? E se pelo menos pudesse eu tirar uma segunda
precisão verbal do G. se aproximando – Pronto, Sirva. Pronto tou aqui. Eu já disse que não entendo via mas não posso, Não posso, não posso! Ah! Sim… o seu negócio. Ouviu eu telefo-
poeta, mas vibra de desse negócio de lâmpada. Precisei falar com o Aristides. nar para o homem? Pois é, pois é esse desgraçado está em Santos. Veja só…. Mas
patetismo realista. A S. – Tu não entendes de lâmpidas, pois é, não entendes de lâmpidas. Tu só enten- isso não tem importância. Vamos fazer o negócio do mesmo jeito. O senhor faz a letra
julgar pela tinta azul, des de dinheiro, não é? e eu vou endossar. Isso tudo já está tudo desgraçado mesmo agora não adianta querer
o original é uma G. – Pois é Sirva. Eu entendo de dinheiro mas não tenho um níquel. Você não fazer mais nada. Mas… O senhor precisa do dinheiro já? Pois é muito fácil. O senhor
cópia datilografada, entende e tem. Não é isso? assina um cheque sem fundo mesmo. Não tem importância nenhuma porque depois o
sem começo ou fim, S. – Pois é, Garcia. Só entendes de dinheiro. (Pausa.) E por falar em dinheiro: cade senhor deposita o dinheiro no Banco. É claro que o senho não vai fazer o cheque para
grafada em quatro aquel documento que estava cá em cima da minha mesa? hoje nem para amanhã [e sim] para daqui a oito ou dez dias. Como? O senhor não está
páginas, papéis G. – Eu sei lá de documento, não foi o senhor que guardou? acostumado [a fazer] essas coisas? Ora, meu caro amigo! Eu já assinei tudo o que
S. – Pois foi, homem de Deus pois foi eu quem guardei o ducumento. Mas o que eu podia ser assinado na minha vida e aqui estou eu. Firme como nunca. É verdade que
diferentes. Nos
quero saber é onde é que está esse desgraçado de ducumento. Pois não vês que o raio não tenho um níquel mas estou firme. Se bem que qualquer dia eu vá por água abaixo,
versos , esboços a
do homem já marcou para vir aqui acertar as últimas clausas da escritur, e eu não acho talvez até com o senhor mesmo, tanto que já estou tratando de vender a minha chácara
lápis de figura o dicumento! Ai, minha Santa Maria! Ainda qualquer dia vendo tudo que tenho e largo ou passar ela para o nome de outro de[s]graçado qualquer porque do jeito que isso
feminina: pernas essa porcaria toda por aí. Não é possível continuar nesta vida! (Pausa.) Ainda hoje de tudo vai, eu rodo qualquer desses dias…Mas se o senhor quiser, o dinheiro está arran-
numa folha, cabeça tarde, atirou-se pela janela do quarto andar daquela prédio da Sul América, uma moça. jado. Se o senhor tiver medo de assinar um cheque sem fundo, espere até que est[e]
noutra, tronco com Garanto que foi por muito menos do que eu passo. (Pausa). desgraçado cure o resfriado e volte de Santos… É claro que pode. Claríssimo!… Então
seios nus na terceira. (Gritando.) Garcia! Oh Garcia! Onde foi que eu meti essa maldito dicumento! faça assim… Como é que o senhor disse?… Quanto de juros? Ora! Antão o senhor
O agiota da cena é G. – Ah essa é boa. Eu é que vou sabe onde é que está o diabo do documento? ainda não sabe o sistema de Taufá? É por acaso a primeira vez que o senhor faz essas
um português de S. – Me ajuda, Garcia, me ajuda porque o homem vem aí pra ir ao tabelião e como transações?… Pois é claro que é assim… É claro que o senhor vai pagar os juros.
piada, dado a é que eu vou fazer? Antão sou eu que vou pagá-los (Rindo). Ora essa é muito boa. Não faltava mais nada.
sentimentalismos, o G. – Ah. Isso é que eu não sei. Eu aqui me sacrificando pelo senhor, porque o senhor sabe que eu adiei uma viagem
Silva. Seu bordão é S. – Ah! Valha-me Deus. Que vida esta que eu levo. Também…Eu vou é dar um que devia fazer hoja para o Rio de Janeiro por causa deste negócio e ainda estou aqui?…
jeito de vender tudo o que tenho e não trabalhar mais. Oh! Garcia me ajuda homem! Por sua causa e por causa deste maldito dicumento que perdi e não encontro. Oh
clamar pelo
G. – Mas que coisa, eu é que tenho de saber onde é que está o documento desse Garcia! Garcia! Você ainda não encontrou o dicumento? Mas que cois[a]! Antão o se-
empregado, Garcia.
camarada! nhor pensa que eu é que tenho que pagar os juros para o senhor? Pois nem para meu
Dos erros de C1 entrando – Comendador… filho eu não faria isso. Antendeu? Nem para o meu filho se o tivesse. Aliás eu nem sei
linguagem, mantive S. – Dr. Fortunato, como vai o Senhor? bem porque é que trabalho tanto! Não tenho nem para quem deixar o pouco dinheiro
todos que me C1 – Que olhar mais esquisito! Está olhando por baixo? que tenho, e o senhor sabe que o meu coração já não anda lá muito bom e que o
pareceram S. – É que um dos olhares é por baixo dos áculos e o outro é por cima. médico me disse que eu não devia me exaltar…mas como não me exaltar. O senhor
intencionais. Gosto C1 – E o de baixo, o que quer dizer? não acha que isso até é um absurdo? Como é que eu não hei de me exaltar se tudo me
de me referir à cena S. – Nada Doutor Fortunato. Nada… Vamos ao que serve. acontece nesta vida?…Se fui sempre um homem feliz? Ora tem graça, isso. Desde a
pelo nome do C1. – Pois é, seu Garcia. Como é que vai o meu negócio? minha infância eu trabalho e se ganhei o pouco que tenho foi a custa de esforço próprio
empregado: S. – O da letra? porque nunca tive ninguém.
Fragmento Garcia.
O SARRAFO Número 1 ◆ Março 2003