O documento discute o fenômeno crescente dos condomínios fechados nas cidades brasileiras e seus impactos na paisagem e tecido urbano. Os condomínios promovem um processo de "medievalização" com muros altos, isolamento dos residentes e fragmentação do espaço público. Isso gera debates sobre os efeitos na segurança, convivência social e desenvolvimento urbano.
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Título original
Medievalização do mundo urbano e o problema da violência.docx
O documento discute o fenômeno crescente dos condomínios fechados nas cidades brasileiras e seus impactos na paisagem e tecido urbano. Os condomínios promovem um processo de "medievalização" com muros altos, isolamento dos residentes e fragmentação do espaço público. Isso gera debates sobre os efeitos na segurança, convivência social e desenvolvimento urbano.
O documento discute o fenômeno crescente dos condomínios fechados nas cidades brasileiras e seus impactos na paisagem e tecido urbano. Os condomínios promovem um processo de "medievalização" com muros altos, isolamento dos residentes e fragmentação do espaço público. Isso gera debates sobre os efeitos na segurança, convivência social e desenvolvimento urbano.
violência Os condomínios-clube e o processo de medievalização das cidades brasileiras
À medida que cresce nas cidades a sensação de insegurança, o
fenômeno dos condomínios exclusivíssimos ganha mais força no mercado imobiliário brasileiro. O modelo foi implantado, de início, nas principais capitais do sul e sudeste do país, e, gradativamente, vem se espalhando por todas as demais regiões.
Aos poucos, a paisagem urbana vai se re-configurando: as quadras
dão espaço aos muros altos com cercas elétricas, as calçadas passam a ter pouco ou nenhum movimento de pedestres no entorno, o comércio se distancia e se concentra em shoppings centers, ao mesmo tempo em que o volume de carros cresce, intensificando o trânsito ao redor dessas estruturas.
Pesquisas sobre esse fenômeno já vêm sendo feitas há mais de
duas décadas, uma vez que a questão dos condomínios-clube tem motivado posicionamentos bastante antagônicos. Por um lado, o mercado imobiliário identifica o condomínio-clube como uma tendência, um produto diferenciado de forte demanda, uma vez que se apresenta como solução para o estilo de vida vigente nas grandes cidades; por outro, especialistas acreditam que a solução impõe um processo de medievalização da arquitetura e das cidades, que dissolve o tecido urbano e compromete de forma significativa as relações interpessoais.
Loteamento x condomínio
Conceitualmente, loteamento e condomínio diferem. Ambos
resultam do fracionamento de uma área maior. Em linhas gerais, temos que, no primeiro, os lotes são vendidos separadamente e a área comum composta por ruas, calçadas, praças, etc. é pública. O loteamento se insere no traçado urbano e é parte integrante da rede urbana como uma zona de transição, que interliga o público ao privado e vice-versa. Um espaço antes de tudo, democrático.
Nos condomínios, a área normalmente resulta de um processo de
reunificação de lotes, gerando uma grande área a qual é murada, cada unidade habitacional tem sua área privativa e uma fração da área comum, de forma que tudo o que está dentro do perímetro do muro pertence exclusivamente ao condomínio. O conjunto se insere no traçado urbano como um monobloco e o trânsito de pedestres e de veículos apenas margeia o muro que o envolve.
A linguagem medieval na cidade pós-contemporânea
Os termos medievalização arquitetônica e medievalização urbana
foram forjados ao final dos anos noventa e traduzem a dimensão exata da sensação de pânico que se instalou em nossas cidades.
A linguagem medieval remete ao sentido de proteção e desenha um
novo padrão funcional e formal de arquitetura. Ela define um modelo defensivo, densificado e hiperinfra-estruturado, inserido na malha urbana horizontal ou verticalmente.
De início, havia os condomínios residenciais compostos por
unidades habitacionais dispostas no interior de grandes áreas muradas, com padrão construtivo que variava de médio a alto luxo, distribuídos em diferentes bairros das cidades.
Recentemente o produto foi incrementado, o que levou alguns
estudiosos a estabelecerem ligação entre o modelo acastelado medieval e as estruturas em condomínio-clube. São semelhanças de ordem física e comportamental.
As semelhanças físicas referem-se basicamente aos elementos de
composição, como as guaritas fazendo as vezes de torres de vigilância; o monitoramento eletrônico ostensivo, como uma versão contemporânea das seteiras dos castelos; os altos muros de tijolos, correspondendo às estruturas colossais em pedra; os portões duplos e até mesmo a presença de lagos artificiais e cascatas que nos remetem aos fossos com suas pontes de acesso. Do ponto de vista comportamental, alguns estudiosos chamam a atenção para a impessoalidade e para o isolamento do grupo em relação ao universo citadino exterior. Comparados às vilas das décadas de 40 e 50 ruas de pedestres com entorno de habitações unifamiliares, onde a interação com a vizinhança tinha papel significativo nas rotinas familiares , os condomínios-clube primam pelo exclusivismo de cada unidade e pela utilização rotativa das áreas comuns. Raramente existe interação entre os vizinhos, exceção feita às reuniões de interesse comum, normalmente conflituosas. O que antes era entendido como socialização, hoje seria interpretado como invasão de espaço pessoal.
Gradativamente essas estruturas comprometem o tecido urbano,
isolam ruas e até mesmo regiões inteiras, ao mesmo tempo em que cresce o processo de abandono e de guetificação das áreas de entorno remanescentes.
Segurança que consome bilhões ao ano
Um estudo apresentado em 2002, pela professora Sônia Ferraz da
UFF, intitulado Arquitetura da Violência ou do Medo , alertava para o fato de que a insegurança e o medo já movimentavam mais de R$100 bilhões anualmente em nosso país. Segundo ela, uma boa fatia do mercado imobiliário, da indústria de equipamentos e de materiais de segurança cresceu na mesma medida em que a violência e a sensação de insegurança foi se intensificando nos bairros.
Em janeiro deste ano, foi realizado, no auditório do SIAMFESP, um
evento patrocinado pelo Fórum da Construção que abordou o tema Condomínio-Clube: Modismo ou Tendência. O encontro serviu para promover a troca de experiências entre a indústria e os profissionais da construção civil.
Dentre os assuntos discutidos, os motivos que levaram ao atual
modelo de condomínios-clube. Concluiu-se que os fatores determinantes para a implantação do citado modelo estão relacionados ao aumento dos percentuais dos índices de violência urbana, à especulação imobiliária e à necessidade de lazer adequado para cada morador. O público-alvo deste tipo de empreendimento é diferenciado, normalmente famílias com renda acima de 25 salários mínimos, com 2 ou 3 filhos, ou ainda, casais cujos filhos já se casaram, passando por solteiros e descasados.
Por essa razão, cada empreendimento chega a oferecer, num
mesmo condomínio, pelo menos 5 modelos diferentes de residência e mais de 10 opções de serviços, comércio, lazer e entretenimento a um custo médio de R$4.500 o metro quadrado.
Medievalização como sinônimo de concentração de propriedade
Delfim Sardo, importante filósofo português, acredita que o futuro
das cidades depende das circunstâncias locais de desenvolvimento. Defensor da popularização das artes, ele é um dos que também acreditam que vivemos um processo de medievalização das cidades, que decorre da concentração de propriedades. O fenômeno é perceptível nas mais diversas áreas, inclusive nas artes, numa referência à crescente concentração de obras de arte nas coleções privadas.
Na visão de Sardo, o fenômeno da medievalização se estende à
cultura e, para tanto, o autor cita o exemplo da dominação da língua inglesa sobre as demais, comparando-a inclusive à supremacia do latim na Idade Média. Ele afirma que de um ponto de vista cultural, verifica-se uma pulverização das heterodoxias, que tem como conseqüência a afirmação do exclusivismo e do individualismo; um paradigma de efeito paradoxal que aos poucos se consolida, seguindo a lógica da globalização da globalização.
As cidades são instâncias sociais e sofrem prejuízos em função da
diminuição do convívio humano, na medida em que as pessoas se fecham em cidadelas muradas, defendendo-se de um mundo bárbaro e hostil, como já acontecia na Idade Média.
Alguns projetos chegam a minimizar os efeitos do isolamento
implantando o espaço para comércio (lojas) nos arredores dos condomínios, não só para facilitar a vida diária dos condôminos, mas também, para garantir que haja fluxo de moradores- consumidores. Nada são, senão soluções paliativas dentro de soluções paliativas.
Por ora, proponho trazermos para a ótica urbana, um depoimento
de Sardo no qual faz referência à condição das instituições culturais contemporâneas: … A questão que se coloca hoje é como é que se podem encontrar formas de agregação, de consenso. As formas societárias de agregação assentam, sobretudo, no lazer e funcionam em monocultura. É preciso construir formas societárias de agregação que não assentem exclusivamente no lazer. São as instituições culturais que podem produzir comunicação interpessoal.