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XIV SIMGeo

Simpósio de Geografia da UDESC

2º SEMINÁRIO NACIONAL DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO


ÁREA TEMÁTICA: PLANEJAMENTO TERRITORIAL, PLANEJAMENTO
URBANO.

FAVELAS: os paradoxos na cidade (in)formal.

Maximiliano Engler Lemos 1


Mariana Natali Amaral 2

Resumo

A Favelas são retrato do crescimento urbano desordenado e histórico ‘déficit habitacional’,


que atingem o Brasil. Contudo, os dados relativos às Favelas são controversos, consequência
das dificuldades de cenciamento – produto da complexidade estrutural - e superficialidade do
conceito. Fatores que dificultam o planejamento e intervenções, evidenciando o óbice de
integração entre cidade informal e formal. Assim, propõe-se entender a aplicabilidade das
técnicas de planejamento e arquitetura em territórios em processo de favelização, a partir da
identificação das condicionantes um território, que podem classificá-lo como Favela. O estudo
identificou que, apesar de alguns municípios afirmarem a ausência de Favelas, algumas áreas
apresentam a mesma fragilidade construtiva e precariedade da ocupação humana que
abrangem a classificação das mesmas, distinguindo-se apenas pela regularidade da ocupação.
Logo, a legalidade fundiária é usada como determinante, desconsiderando os demais
indicadores que vulnerabilizam os habitantes..

Palavras-chave: Favelização; Fenômenos Urbanos; Cidade Informal.

Abstract

The slums are the consequence of the disorderly urban growth, as well as ‘the housing deficit’
that reached Brazil. However, the data about the Slums are controversial, as a result of the
difficulties when collecting data – product of structural complexity - and the superficiality of
the concept. These factors make the planning and intervention highlighting the difficult of
integrating informal and formal city. That way, it is proposed to understand the applicability
of planning techniques and intervention architecture in areas where slums are growing,
through the raising and identification of the conditions of an area, which can define them as a
Slum. This research indicated that although some towns do not have Slums, some of their
areas present the same building fragility as well as precariousness in terms of human housing;
being only different in terms of housing legislation. So land legalisation is seen as a
determiner, disregarding the other indicators that make the area residents vulnerable.

Keywords: Objective, Reference, Methodology, Results and Conclusions.

1
Geografo mestre. em Engenharia Urbana, prof. da Universidade de Franca. E-mail: maxengler@gmail.com
2
Graduanda em Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Franca. E-mail: a4marianaamaral@gmail.com
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)
Florianópolis, Santa Catarina
Introdução

“Favela”, “Aglomerado subnormal”, “Morro”, “Mucambo”, “Alagados”,


“Complexos”, e “Comunidades”, são alguns dos termos usados no Brasil, para designar
ocupações e setores informais das cidades, associados a pobreza, precariedade e
marginalidade. A conceituação de Favela, como ocupação urbana, varia entre países, estados,
regiões ou cidades, de acordo com frequência da situação de miséria que pode variar em cada
localidade. O nome Favela – mais utilizado no Brasil, surgiu juntamente ao primeiro
assentamento, no já citado Morro da Providência.
A palavra Favela se origina, ao que tudo parece, ao arbusto comum na região de
Canudos, chamada Favela. Os soldados do exército brasileiro, voltando da luta
conta Antônio Conselheiro e seus adeptos, não tinham lugar para morar no Rio de
Janeiro. Vão ocupar o Morro da Providência, onde se instalaram em barracos como
o arbusto Favela nos morros da região de Canudos. Daí o nome para este tipo de
assentamento (PASTERNAKE, 2006, p.179).

Apesar do nome, bem como os primeiros aglomerados, terem surgido no Rio de


Janeiro, a Prefeitura Municipal, no intuito de serem corretos, utilizou o termo “aglomerados
de baixa renda” para referir-se a Favelas, até a década de 1980, quando passou a aceitar a
designação usada por moradores, lideranças e a população total da cidade, momento em que
este setor da passou a integrar a cartografia oficial da cidade. O nome Favela, ainda que usado
em muitos sentidos pejorativamente, é também uma afirmação de identidade. O
Observatório de Favelas (2009), atesta que a definição de Favela se associa depreciativamente
a ausência, tal como falta de infraestrutura, saneamento, sistema viário e coleta de lixo.
Socialmente os moradores destas áreas sofrem errôneo pré-julgamento vinculado a
homogeneidade dos problemas de violência, baixa escolaridade e poder aquisitivo. A
percepção de que a Favela é um local de desordem e criminalidade faz com que prevaleça
descenso social, intensificado pelas condições físico ambientais e a situação ilegal da
propriedade do imóvel (KOWARICK, 2002).
O conceito de Favela e assentamentos informais, admitido a partir 2000 pelo IBGE e
nomeados de Aglomerados Subnormais, é definido como:
Conjunto constituído de, no mínimo, 51 unidades habitacionais (barracos,
casas…), ocupando ou tendo ocupado até período recente, terreno de propriedade
alheia (pública ou particular) dispostas, em geral, de forma desordenada e densa,
bem como carentes, em sua maioria, de serviços públicos essenciais (IBGE, 2010).
Esta definição, segundo Marques (2007) é vaga e subestima as contagens, pois, exclui
áreas com menos de 51 unidades, mas que apresentem as mesmas características, ou ainda,
dois assentamentos vizinhos com quantidade inferior a estipulada, que no entanto juntos
atinjam somatória, não são considerados “aglomerados subnormais”. Cavallieri (2009),
assegura que o caráter genérico desta definição deve-se ao fato deste conceito ser operacional
e não construído por resultado de pesquisas.
A UN-HABITAT (2003), aborda na definição de Slum – termo usado pela ONU para
Favela; a vulnerabilidade geológica e estrutural destas ocupações.
Assentamentos que carecem de direitos de propriedade, e constituem aglomerações
de moradias de uma qualidade abaixo da média. Sofrem carências de infra-estrutura,
serviços urbanos e equipamentos sociais e/ou estão situadas em áreas
geologicamente inadequadas ou ambientalmente sensíveis.

Em contrapartida, para Freire (2006, p.18), a caracterização de Favelas pela


precariedade da ocupação humana não é suficiente, pois a mesma fragilidade construtiva pode
ser encontrada em loteamentos populares irregulares, clandestinos ou não. Esta associação se
tornou ainda mais falha pela substituição dos barracos de madeira por construções de
alvenaria, que ocorreu nos últimos anos. Ainda de acordo com o mesmo autor, a desordem
estrutural também não pode ser ponto de partida para a classificação, pois há inúmeras
Favelas disposta ordenadamente no terreno, decorrência da organização previa no momento
da ocupação, o que as assemelham a loteamentos clandestinos. Logo, a ausência de relação
entre o proprietário da terra com os moradores que ocupam a área é o que diferencia a Favela
de outras O.I que apresentam a mesma fragilidade estrutural e de infraestrutura das Favelas. O
caráter ilegal é ponto central na definição de Bueno (2000, p.63):
Tecnicamente, as Favelas são assentamentos humanos urbanos, em áreas privadas
ou públicas, ocupadas por não proprietários dessas áreas, que edificam suas
moradias à margem das leis urbanísticas e construtivas. As Favelas se caracterizam,
portanto, pela dupla ilegalidade de sua situação, tanto fundiária (no que diz respeito
à ilegalidade da posse da terra), quanto urbanística (no que diz respeito a
ilegalidade das construções).

Definição que se assemelha a desenvolvida pela Cittie Alliance – ONG vinculada ao


Banco Mundial, que visa a coalização global de cidades comprometidas com o
desenvolvimento e melhoria das condições de vida urbana da população de baixa renda – que
coloca Favelas, como:
Núcleos habitacionais precários, localizados em áreas publicas ou privadas. Em
ambos os casos as Favelas são originadas de processos de ocupação espontâneo ou
organizados, à revelia dos proprietários, ou seja, sem nenhuma relação legal
instituída entre o proprietário e os habitantes da Favela (CITTTIE ALLIANCE,
2004, apud Freire, 2006, p.19)
O Sistema de Assentamento de Baixa Renda do Instituto Pereira Passos (IPP), órgão
vinculado a prefeitura carioca, associa a Favela áreas que apresentem o conjunto das seguintes
características:
precariedade da organização espacial; dificuldade de acesso a partir do entorno
urbanizado e circulação interna precária; precariedade de infraestrutura;
precariedade e/ou dificuldade de acesso a equipamentos coletivos; precariedade das
construções residenciais e comerciais; falta de regularização fundiária (títulos
formais de propriedade); ausência de regularização urbanística; irregularidade fiscal
(imóveis não constam dos cadastros imobiliários, não são tributados, não pagam
tarifas pela prestação de serviços públicos); imóveis habitados, predominantemente,
por população de baixa renda.

O Plano Diretor Municipal do Rio de Janeiro, formulou sua definição de Favela,


apenas no ano de 1992, após quase um século do surgimento destas na capital do estado.
Desde então para a prefeitura fluminense tem-se Favela por:
Art. 147 - Para fins de aplicação do Plano Diretor (1992), Favela é a área
predominantemente habitacional, caracterizada por ocupação da terra por população
de baixa renda, precariedade da infraestrutura urbana e de serviços públicos, vias
estreitas e de alinhamento irregular, lotes de forma e tamanho irregular e construções
não licenciadas, em desconformidade com os padrões legais.

Já a Prefeitura de São Paulo (2010, apud CASTILHO, 2013, p.58) define Favelas por
“espaços habitados precários, com moradias autoconstruídas, formadas a partir de ocupações
de terrenos públicos ou particulares. Caracterizam-se pelos baixos índices de infraestrutura,
ausência de serviços públicos e população de baixa renda”. Ou ainda, segundo seu Plano
Municipal de Habitação (PMH 2009-2014, 2011, p.21):

A ocupação deita à margem da legislação urbanística e edílica, de áreas publicas ou


particulares de terceiros, predominantemente desordenada e com precariedade de
infraestrutura, com construções predominantemente auto-construídas e precárias, por
famílias de baixa renda e vulneráveis socialmente.

A Fundação Sistema de Estadual de Análise de Dados (SEADE)(S/D), de São Paulo,


classifica Favela em seus levantamentos como:

Aglomerado de domicílios instalados em Área pública ou privada, que não era


propriedade dos moradores desses domicílios no momento de sua ocupação,
podendo apresentar uma ou mais das seguintes características: a área foi ocupada de
forma desordenada, sendo que os lotes não obedecem a um desenho regular e os
acessos ao domicilio são muitas vezes tortuosos, não permitindo em alguns casos a
circulação de veículos em seu interior, os domicílios são construídos com os mais
diversos materiais tais como alvenaria, madeira aproveitada, placas de compensado,
plástico, papelão, zinco, etc.
Conceitos que demonstram a imprecisão, tendência a homogeneização, e por vezes
preconceito – haja vista o termo “subnormal” utilizado pelo IBGE. A análise das definições
citadas evidencia que as características atribuídas às Favelas tratam principalmente nas
questões relativas a irregularidade fundiária e morfológica dos aglomerados, assim os
aspectos econômicos, sociais e a vulnerabilidade social, que condicionam este tipo de
ocupação são deixados em segundo plano. Isto posto, a maior parte das classificações –
sobretudo dos órgãos governamentais, desconsideram atributos fundamentais a dinâmica
espacial, o meio urbano não pode ser considerado senão como a sincronia entre as relações
sociais e o espaço onde elas ocorrem, logo, a distinção entre “cidade de concreto” e “cidade
de carne” fragiliza o conceito e consequentemente a classificação de Favela.

1. Variáveis e Condicionantes do processo de favelização

A favelização é produto de condicionantes sociais, econômicos, biológicos, jurídicos,


históricos, geográficos, entre outros, que ocorrem de maneiras distintas em cada território, e
que consequentemente, resulta em diferentes estruturas morfológicas e dinâmicas urbanas.
Neste sentido, é errôneo basear a classificação de Favela em parâmetros rígidos,
desconsiderando as especificidades locais, perpetuando a máxima “tratar igualmente os
desiguais”, que resultam em políticas públicas inadequadas e planejamentos que não
correspondem à realidade local, e logo não atingem seus objetivos, evidenciando cada vez
mais a segregação socioespacial entre ocupações irregulares e a cidade. Fatores que
evidenciam a necessidade de identificar as condicionantes que subordinam este fenômeno, e
como estas influem no macro e micro espaço.
A topografia está entre os aspectos que influem neste processo, pois pode constituir
um obstáculo à expansão dos assentamentos, como os localizados em morros e fundos de
vale. Os limites de crescimento horizontal, influem no processo de verticalização destes
núcleos, fenômeno que contribui para o adensamento populacional e habitacional destes
aglomerados, e consequentemente os problemas relacionados a precariedade destas moradias.
A favelização de encostas ou taludes naturais – denominação utilizada na geotecnia;
vulnerabiliza fisicamente populações que já que são socialmente frágeis, deixando-as
suscetíveis deslizamentos ou escorregamentos, entre outras palavras, expondo-as a situações
de risco (FREIRE, 2006; GROSBAUM, 2012; LEITÃO, 2009).
A topografia influi também, na mobilidade dentro do núcleo, Favelas em terreno
acidentado tem sua circulação, em grande parte, por meio de escadarias, diferente de
ocupações planícies ou menores declividades. Logo, a estrutura física interna das Favelas -
bem como de outros núcleos urbanos, é influenciada pelas características topográficas de seu
território, fator que ganha maiores dimensões quando considerados os poucos recursos de seus
moradores para a fixação nestas localidades. A localização geográfica é outro fator que influi
na morfologia das Favelas. Alguns assentamentos em áreas periféricas e distantes dos centros,
apresentam hortas e pequenas criações de animais domésticos, para a subsistência ou mesmo
comercio, que modifica o panorama econômico.
A distribuição de mercado de trabalho dentro de uma cidade, segundo Leitão (2009),
contribui para a distinção estrutural entre Favelas. A variabilidade na oferta de empregos faz
com que alguns núcleos tenham mercado estável, com níveis de renda diversificados e
diferenciação ocupacional, desenvolvendo-se mais do que outras Favelas. Assim, apesar de
cada território cristalizar a trama de sua vida urbana – o que torna-o único, alguns aspectos
ocorrem de maneira semelhante apresentando mesmo ritmo ou tendência em diferentes
localidades aproximando suas estruturas. Desta forma, a análise de índices sociais,
econômicos, demográficos e morfológicos entre cidades que tenham ou não em sua
composição as Favelas, evidencia algumas condicionantes que, em macro escala levam a
favelização. Esta avaliação permite compreender e mensurar a dimensão do problema e de
seus impactos.
O presente estudo se baseou em dados primários levantados pelo censo do IBGE
(2010), considerou-se também a presença de Favelas de acordo com a definição e
metodologia de contagem dos “Aglomerados Subnormais” – conceito adotado pelo IBGE
para núcleos urbanos precários e irregulares com mais de 51 unidades habitacionais; e a
incidência do fenômeno nos municípios paulistas [Mapa 01]. Afim de identificar as
condicionantes deste processo foram estudadas cidades com diferentes portes, características
demográficas, localização geográfica, ocupação do solo, economia, história, rendimentos per
capita, índice de desenvolvimento humano municipal (IDHM), políticas públicas e urbanas,
das diferentes mesorregiões administrativas do estado de São Paulo, totalizando 34
municípios, que foram divididos em dois grupos: os que são ou não compostos por Favelas
segundo a classificação do IBGE (2010). As médias estaduais serviram como parâmetro
mediador para a comparação entre os dois grupos de cidades.
Mapa 1 - Cidades paulistas com "Aglomerados Subnormais"

Fonte: Organização própria, 2014.

O mapa 1 indica que a maior parte das cidades, compostas por “Aglomerados
Subnormais” estão polarizadas principalmente na região metropolitana de São Paulo. Do total
de domicílios da região 9,8% estão em “Aglomerados Subnormais” que abrigam 11% desta
população. Das cidades compostas por Favelas 66% estão concentradas em cinco regiões, e as
44% restantes estão difusas em outras sete regiões do estado paulista. Para o IBGE (2010),
cerca de 9% das cidades de São Paulo possuem em sua composição Favelas que abrigam mais
de 40 mil pessoas - 6,12% da população, e 5,83% dos domicílios ocupados no estado. No
total, São Paulo abriga 2.087 núcleos que correspondem a 32% dos “Aglomerados
Subnormais” brasileiros. Das quatorze mesorregiões do estado apenas duas não tem
“Aglomerados” – Litoral Sul e Araçatuba.
A escolha das cidades de estudo, além dos indicadores citados baseou-se também em
informações – muitas vezes controversas, acerca da incidência de Favelas nestes territórios,
através de notícias publicadas em jornais e portais regionais, dados das prefeituras e outras
instituições locais, bem como a presença de bairros precários, além de políticas de
desfavelamento já ocorridas. Fatores que interferem na contagem das cidades compostas por
Favelas, ou mesmo a real dimensão dos “Aglomerados” levantados pelo IBGE (2010). Os
critérios de analise foram pautados sobre três aspectos: densidade urbana; déficit
habitacional/estoque de domicílios; e economia - rendimento per capita e mercado informal;
características que influenciam direta ou indiretamente a organização, dinâmica e morfologia
urbana, pois estão relacionadas as conexões intraurbana e acesso ao mercado imobiliário, e
ainda dão base à maior parte das conceituações teóricas de Favela apresentadas anteriormente.
Indicadores obtidos através do levantamento bibliográfico apresentado anteriormente, e a
síntese das características geográficas, urbanas, econômicas, demográficas e históricas das
cidades estudadas, amostragem que representa 5% dos municípios paulistas.

1.1. Densidade Urbana


A densidade urbana influi na qualidade do desenho urbano e na/pela forma como as
edificações são projetadas e conectadas, e pelo modo com que os moradores e usuários se
comportam entre si e em relação ao próprio ambiente urbano construído (ALCIOLY e
DAVIDSON, 1998, p.15). Os impactos causados pela densidade afetam direta e indiretamente
o desenvolvimento urbano e qualidade de vida nas cidades, como a falta de espaços de lazer,
sobrecarga das redes de infraestrutura, aumento das distancias intra municipais, desperdícios
de solo urbano, vazios urbanos, superpopulação, entre outros. As questões relativas as
densidades urbanas são controversas, pois estas também são impactadas por imperfeições de
planejamento, políticas habitacionais, gestões públicas e parâmetros de desenho urbano que
limitam a oferta e a disponibilidade de solo urbanizado.
A densidade urbana está atrelada a diversos fatores mas sobretudo aos que dizem
respeito a vantagem locacional, variável do processo de urbanização conforme demonstrado
anteriormente. Desta forma a posição relativa - distância entre os elementos componentes do
sistema urbano, privilegia o espaço urbano em termo de localização, assim quanto maior o
grau de conexão entre um ponto e os demais mais valioso ele é. Esta propriedade de estar
posicionado no caminho mais curto entre demais elementos da rede urbana, provoca a
centralização nestes espaços, características que influenciam diretamente nas atividades
desenvolvidas no local, bem como a densidade populacional e construtiva da área. O aumento
da acessibilidade tende a ter efeitos sobre a presença de atividades e adensamento, bem como
um aumento de acessibilidade tende a impactar as densidades e atividades, tendo a produção
das centralidades como síntese (NETTO e SABOYA, 2006, p.3).
Neste sentido a densidade urbana é condicionada pela acessibilidade, que pode ser
compreendida como a facilidade de acessos e proximidades de dois ou mais pontos, assim a
hierarquia viária e variabilidade do desenho urbano torna esta propriedade não homogênea.
As relações de interdependência entre agentes e atividades acontecem em função da distancia
e proximidade configurada pela malha urbana (NETTO e SABOYA, 2006, p.3). A notória
influência dos índices densidade urbana na forma urbana evidencia a necessidade de se
verificar o grau de correlação destes no processo de favelização. A exposição teórica acerca
do conceito de Favela demonstra que este tipo de ocupação é pontualmente associado à alta
densidade, contudo a relação entre este índice e a densidade urbana da cidade em macro
escala é desconsiderado. Embora a presença de Favelas no meio urbano altere a densidade em
microespaço, está no macroespaço também é condicionante a formação destes núcleos em
uma relação de mutualismo, desta forma a alta densidade urbana é causa e consequência da
formação de Favelas. Este pressuposto foi confirmado pela comparação entre as densidades
urbanas ondes há ou não a presença destas ocupações, conforme o quadro 1.

Quadro 1 - Densidades urbanas em cidades que tem ou não Favela em sua composição
Cidades não compostas por Favelas Cidades compostas por Favelas
Cidade Densidade Urbana Cidade Densidade Urbana
(hab/Km²) (hab/Km²)
Sorocaba 2.499 Campinas 4.713
S. J. do Rio Preto 3.411 Ribeirão Preto 5.089
Mogi das Cruzes 6.930 Santos 10.240
Franca 3.912 Mauá 9.101
Taubaté 3.187 Piracicaba 11.944
Limeira 4.867 Bauru 5.162
São Carlos 3.374 Sumaré 3.305
Americana 4.404 Marília 9.496
Araraquara 5.551 Santa Bárbara d' Oeste 4.028
Presidente Prudente 1.891 Itapevi 10.575
Rio Claro 6.775 Cubatão 695.433
Araçatuba 3.130 Votorantim 3.853
Itapetininga 2.536 Votuporanga 9.144
Itararé 6.787 Porto Ferreira 11.234
São Joaquim da Barra 7.285 Presidente Epitácio 6.768
Miguelópolis 6.742 Severínia 5.968
Ilha Comprida 5.215 Tabatinga 5.713
Fonte: IBGE (2010), organização própria (2014).

A análise dos dados revelara que 60% das cidades que tem Favelas em sua
composição tem densidade urbana superior à média estadual de 5.900 hab/Km², já nas cidades
sem Favelas esta porcentagem cai para 30%. Partindo deste princípio pode-se afirmar que o
adensamento urbano é uma condicionante ao processo de favelização, fato que pode ser
atribuído a sobrecarga ou mesmo saturação das redes de infraestrutura e serviços urbanos que
colocam maior pressão da demanda sobre o solo urbano, terrenos e espaços habitacionais, o
que consequentemente produz um ambiente altamente populoso e inadequado ao
desenvolvimento urbano (ALCIOLY e DAVIDSON, 1998, p.16). Pode-se relacionar este
critério de analise às ocupações irregulares no que diz respeito as vantagens locacionais
oferecidas pelos vazios urbanos e áreas subutilizadas nos centros, associadas as dificuldades
de mobilidades à qual é submetida a população de menor renda.
A posição relativa está ligada a densificação destes aglomerados, a distância entres
estes e o centro, locais de serviço, comércio, além do valor da terra tende a estimular o
aumento das taxas de ocupação. A forma física da cidade - que é resultado da disponibilidade,
tamanho e dimensão do solo urbano; equilíbrio entre áreas urbanas; tamanho e forma das
edificações; legislação de planejamento; hierarquia viária; tamanho das famílias; entre outros
aspectos, caracteriza a estrutura de ocupação urbana. Cidades compactas e com alta densidade
tendem a apresentar menores centralidades, oposto das cidades difusas, ou espraiadas, que são
menos densas e por sua forma geram novas centralidades, apesar dos problemas relacionados
a este tipo de urbanização que resulta em maiores distancias, encarecimento na implantação
de infraestrutura e não aproveitamento de terra urbana.
A estruturação do espaço urbano em muitas cidades - sobretudo as de médio porte, é
condicionada pela distorção social e desigualdade econômica, ocupações de baixas densidades
são comumente associadas à alta renda dos habitantes, enquanto locais altamente densificados
normalmente se relacionam à população de baixa renda. Este sistema está diretamente
atrelado ao mercado imobiliário e consequentemente ao estoque de moradia, estes fatores
devem ser analisados também baseado no “déficit” habitacional” brasileiro, que muitas vezes
se confunde com a falta de moradias, entretanto em números reais não é moradia que falta e
sim distribuição, conforme pode ser visto no próximo critério analisado na pesquisa.

1.2. Economia: renda per capta e mercado informal


As cidades são fundamentalmente fruto da produção econômica de um território. Os
aglomerados urbanos são produzidos para reduzir as distancias entre os atores econômicos, e
sua localização determinam o sentido dos fluxos e provocam a valorização/desvalorização da
área (VILLAÇA, 1998 E LAMARCHE, 1977). Logo, a economia é uma condicionante a
urbanização, que influencia o grau de desenvolvimento local, dinâmicas urbanas e a forma de
ocupação espacial que, na maioria das vezes, é condicionada pelo grau de rendimento das
diversas camadas sociais. Nesta perspectiva, o presente estudo por meio de comparação
verificou a relação entre o percentual de população ocupada em relação a população total,
economicamente ativa (PEA) – de 15 a 64 anos, e a empregada no mercado formal, conforme
o quadro 2.
Quadro 2 - Relação entre população ocupada, ativa e mercado formal
Cidades não compostas por Favelas Cidades compostas por Favelas

População Ocupada no Mercado


População Ocupada no Mercado
População Economicamente Ativa

População Economicamente Ativa


População Total Ocupada %

População Total Ocupada %


Cidade
Cidade

Ocupada %

Ocupada %

Formal%
Formal%
Sorocaba 47,9 34,2 81,94 Campinas 49,29 41,1 82,08
9 4 6
S. J. do Rio Preto 51,0 37,1 76,34 Ribeirão Preto 53,93 38,6 79,93
4 9 0
Mogi das Cruzes 52,4 26,3 82,89 Santos 122,72 38,6 79,94
4 1 0
Franca 43,8 30,5 78,46 Mauá 28,68 20,4 75,21
2 9 8
Taubaté 45,2 32,0 84,19 Piracicaba 54,93 38,8 78,62
7 8 1
Limeira 47,4 32,7 82,56 Bauru 51,90 38,6 83,00
8 6 2
São Carlos 52,4 37,4 78,63 Sumaré 29,35 22,3 82,12
9 0 0
Americana 59,7 43,3 83,66 Marília 37,87 79,7 83,97
9 0 8
Santa Bárbara d'
Araraquara 55,9 37,8 79,97 Oeste 36,13 76,6 82,50
8 8 4
Presidente Prudente 48,4 34,2 83,26 Itapevi 25,96 16,5 77,17
1 0 0
Rio Claro 55,5 36,5 83,58 Cubatão 55,85 39,3 87,98
5 3 5
Araçatuba 68,1 30,6 79,47 Votorantim 25,94 18,2 72,15
8 5 7
Itapetininga 83,9 57,6 37,19 Votuporanga 40,82 29,4 81,29
2 2 7
Itararé 31,2 19,6 75,93 Porto Ferreira 50,37 33,3 83,16
3 9 3
São Joaquim da Presidente
39,3 27,8 82,31 25,93 17,8 91,64
Barra Epitácio
3 9 7
Miguelópolis 22,7 15,8 126,44 Severínia 24,36 17,0 73,16
0 5 4
Ilha Comprida 28,6 17,3 70,22 Tabatinga 33,85 22,2 73,07
1 2 7
Fonte: IBGE (2010) e SEADE (2013), organização própria (2014).

A verificação entre os dois grupos mostra que 70% das cidades não composta por
Favelas tem mais de 44% (média paulista) de sua população ativa ocupada, em contrapartida
das cidades com Favelas essa estimativa cai para 35%. Quando analisada a dimensão do
mercado formal os índices dos dois grupos são semelhantes, cerca de 84% da população
ocupada está neste mercado. Desta forma, a economia informal pode ser considerada um
fenômeno global, e independente da Favela. O surgimento deste sistema está relacionado a
duas hipóteses. A primeira relacionada a reorganização econômica e a regulação do trabalho,
resultante tanto das:

restrições impostas pelo baixo crescimento econômico ao longo de extensos


períodos, com a geração de um número de postos de trabalho insuficientes para
absorver o aumento da PEA, quanto de uma redefinição das formas de contratação
por parte das empresas, inclusive em segmentos econômicos mais estruturados e
articulados com a dinâmica da econômica capitalista contemporânea (OIT, 2010,
p.8).

A segunda hipótese resulta da combinação entre a velha informalidade formada por


pessoas inseridas em atividades de sobrevivência de baixa produtividade, desprotegidas
socialmente e sem direitos fundamentais do trabalho, com o novo processo relacionado a
primeira hipótese. Este sistema engloba atividades legais e ilegais. As primeiras, são aquelas
“socialmente aceitas”, como omissão de renda, propriedades, salários, juros, lucros, permuta
de bens, entre outras atividades econômicas que oferecem seguridade social, mas que o agente
não tem este direito. As ilegais, ainda segundo o mesmo autor, são oriundas de atividades
ilícitas, como venda de produtos roubados, contrabando, fraude, tráfico de drogas, entre
outras. Neste contexto os principais fatores que levam ao crescimento da economia informal
podem ser analisados sobre dois critérios: econômicos e sociológicos. Os aspectos
econômicos dizem respeito ao aumento da carga tributária – impostos, juros e contribuições
sociais, desemprego, inflação e intensidade da regulação. Já os aspectos sociológicos
englobam o declínio da percepção de justiça e lealdade com as instituições públicas, redução
dos índices de moralidade e percepção de corrupção, influenciados pela flexibilidade
oferecida pelo mercado informal (RIBEIRO, 2010, p. 7). Esta análise mostra quanto a
economia informal está associada à cidade como um todo, não apenas às ocupações
irregulares.
Os indicadores econômicos oficiais como consumo, renda e desemprego, tornam-se
inconfiáveis na presença da economia informal pois esta causa distorção entre as medidas
adotadas e medidas necessárias a adequação à realidade. Pressuposto que pode justificar a
incoerência de alguns dados levantados neste capitulo, como o descompasso entre o
percentual de PEA, oferta de empregos e distribuição de renda. De acordo com os números do
IBGE (2010) e Ministério do Trabalho (2011), o alto percentual de população desocupada nas
cidades compostas por Favelas, tem baixa relacionado ao saldo de empregos (diferença entre
empregos gerados e desempregos). O crescimento do emprego formal nos dois grupos 47%
das cidades tem crescimento superior a média paulista (0,52). Nas cidades compostas por
Favelas 23% tem crescimento negativo, com o número de demissões superior ao de
admissões. Assim, a informalidade não é sinônimo de pobreza, uma vez que 65% da
população favelizada brasileira se enquadram na classe média, que corresponde a 54% da
população do país. A pesquisa destacou ainda que 20% possui carros, e 13% motos. Os dados
obtidos geram questionamento, como é classificada a parcela da população que é informal
quanto a habitação e formal em relação ao trabalho? São as questões econômicas que levam
esta população a habitar Favelas? A questão da falta de moradia?
1.3. Déficit habitacional e estoque de domicílios
O adensamento urbano e a intensificação no crescimento de Favelas no século XX e
XXI é em grande parte associada ao déficit habitacional. Este conceito para Braga e
Nascimento (2009, p.9), baseia-se em dois aspectos: o quantitativo - dimensionamento
numérico do estoque habitacional; e qualitativo – especificidade internas do conceito,
principalmente quanto a inadequação das moradias. Contudo, a relação de déficit habitacional
com a falta de unidades habitacionais, se torna questionável quando considerado o estoque de
6 milhões de domicílios vagos no país (IBGE, 2010), que excede o déficit habitacional
estimado de 5,24 milhões de moradias (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2012).
Essa estatística revela não só a má distribuição das moradias em razão do mercado privado,
mas também o baixo poder aquisitivo dos pobres ao estoque habitacional adequado (BRAGA
e NASCIMENTO, 2005, p.98). O déficit habitacional é contabilizado pela somatória de
quatro componentes: domicílios precários, coabitação familiar, ônus excessivo com aluguel
urbano e adensamento excessivo de domicílios alugados (MINISTÉRIO DA CIDADES,
2010, p.14).
Os domicílios precários, segundo a Fundação João Pinheiro (FJP - 2013),
correspondem a somatória entre domicílios rústicos e improvisados; os primeiros são
residências construídas sem parede de alvenaria ou madeira aparelhada, insalubres e que
ofereçam riscos a seus ocupantes. Domicílios improvisados são todos os locais e imóveis sem
fins habitacionais mas que servem de moradia, como: barracas, imóveis comerciais
abandonados, carcaças de carros, viadutos, entre outros. Já o componente da coabitação
familiar é calculado pela contagem das famílias que habitam cômodos em cortiços e outros
semelhantes; além das famílias conviventes secundárias que residem no mesmo domicilio de
famílias principais mas que tem interesse de constituir moradia própria. Ônus excessivo com
aluguel expressa a situação de famílias com renda de até três salários mínimos e que
comprometam acima de 30% desta para fins de aluguel. O quarto componente do déficit
habitacional é o adensamento excessivo de domicílios alugados, caracterizado pelo número
médio de moradores por dormitório acima de três pessoas. O número de dormitórios
corresponde ao total de cômodos que servem de dormitório em caráter permanente e apenas
para os moradores do domicílio. De acordo com a PNAD (2012), as estimativas sobre o
déficit habitacional são desenvolvidas sobre dois critérios: déficit relativo – comparação entre
o déficit habitacional ao total de domicílios da unidade de análise; e o total – levantamento
das unidades.
A contagem de moradias é calculada pelo IBGE, que identifica todos os tipos de
habitação urbana e os classifica de acordo com a situação no momento do censo, a partir deste
levantamento são estriadas as estimativas do déficit habitacional e o estoque de moradias. A
separação das habitações urbanas sobre quatro categorias - domicílios ocupados, vagos, de
uso ocasional ou fechados, que são definidos pelo IBGE,2010, como:

(I) domicílios ocupados: domicílios particulares permanentes moradia de uma ou


mais pessoas, na qual o relacionamento é ditado por laços de parentesco,
dependência doméstica ou normas de convivência; (II) domicílios fechados:
domicílios particulares permanentes cujos moradores estavam ausentes no período
de coleta do censo; (III) domicílios de uso ocasional: domicílios particulares que
servem ocasionalmente de moradia (casas de campo, de final de semana, férias entre
outros); (IV) domicílios vagos: unidades que se encontravam efetivamente
desocupadas na data de referência do censo.

O estoque de domicílios corresponde a quantidade de domicílios vagos, contudo o


IBGE não tem dados sobre as condições de habitabilidade e estado real destes imóveis. De
acordo com o censo do IBGE (2010), o Brasil dispõe de 6 milhões de imóveis vagos, 77%
deste na área urbana. O estado de São Paulo concentra 18% dos imóveis vagos brasileiros,
cerca de 1.100.277 domicílios; a média do estoque habitacional nas cidades paulista é de
aproximadamente 7,5% dos imóveis urbanos. Neste contexto faz-se justificável verificar o
grau de influência do estoque e déficit habitacional no processo de favelização, analisando a
relação entre imóveis vagos e o total de unidades [quadro 3], nas cidades compostas ou não
por Favelas.

Quadro 3 - Relação entre imóveis vagos e total de unidades


Cidades não compostas por Favelas Cidades compostas por Favelas
Cidade % Domicílios vagos Cidade % Domicílios vagos
Sorocaba 8,83 Campinas 7,29
S. J. do Rio Preto 10,29 Ribeirão Preto 7,07
Mogi das Cruzes 11,67 Santos 7,72
Franca 10,05 Mauá 5,52
Taubaté 9,76 Piracicaba 9,25
Limeira 7,04 Bauru 6,90
São Carlos 9,68 Sumaré 6,41
Americana 7,45 Marília 7,78
Araraquara 8,53 Santa Bárbara d' Oeste 5,59
Presidente Prudente 6,72 Itapevi 6,78
Rio Claro 7,74 Cubatão 5,59
Araçatuba 5,63 Votorantim 5,37
Itapetininga 9,86 Votuporanga 6,39
Itararé 8,48 Porto Ferreira 7,05
São Joaquim da Barra 7,24 Presidente Epitácio 6,59
Miguelópolis 6,70 Severínia 6,41
Ilha Comprida 18,36 Tabatinga 10,07
Fonte: IBGE (2010), organização própria (2014).

Ao se analisar os valores nota-se que as cidades que tem em sua composição Favela
possuem menor estoque moradias, 23% destes municípios tem mais de 7,5% (média paulista)
de seus imóveis vagos; em contrapartida das cidades que não tem Favela os números saltam
para 64%. Se comparado também o déficit habitacional relativo – proporção entre déficit
habitacional e total de moradias, é notório que na maior parte (88%) das compostas por
Favelas esta relação é maior que a média3 (9%), em contraste com as cidades sem Favelas em
que a mesma comparação resulta em 41%. A comparação destes indicies com o déficit
habitacional municipal calculado pela FJP (2013) em parceria com o Ministério das Cidades
(2013), conforme o quadro 4, apontam que em 94% das cidades compostas por Favelas o
estoque de moradias é menor que o déficit habitacional por unidades, já nas cidades sem
Favelas esta porcentagem equivale a 35%, isto é, na maior parte das cidades favelizadas o
estoque de moradias – mesmo se todas apresentassem condições mínimas de habitabilidades,
não seria suficiente para atender a demanda.
Quadro 4 - Relação entre déficit habitacional e estoque de moradias
Cidades não compostas por Favelas Cidades compostas por Favelas
Déficit Habitacional
Déficit Habitacional

Déficit Habitacional
Domicílios Vagos

Déficit Habitacional
Domicílios Vagos

Relativo (%)

Relativo (%)
Cidade
Cidade

Sorocaba 17.334 19.083 9,64 Campinas 27.416 34.638 9,04


S. J. do Rio Preto 15.744 13.589 9,01 Ribeirão Preto 15.922 21.679 9,39
Mogi das Cruzes 15.389 11.489 8,98 Santos 12.111 19.888 12,08
Franca 10.934 9.075 8,49 Mauá 7.321 14.027 10,06
Taubaté 9.068 8.825 9,52 Piracicaba 11.493 12.309 9,84
Limeira 6.402 8.953 9,58 Bauru 8.135 11.191 9,25
São Carlos 7.675 6.695 8,55 Sumaré 5.038 8.081 9,90
Americana 5.443 6.965 9,33 Marília 5.804 6.302 8,40
Santa Bárbara d'
Araraquara 6.410 5.374 7,25 3.255 6.583 10,70
Oeste
Presidente Prudente 4.888 5.697 7,74 Itapevi 4.193 6.746 10,48
Rio Claro 5.010 5.693 8,70 Cubatão 2.162 5.901 13,92
Araçatuba 3.624 5.149 7,82 Votorantim 1.817 3.660 10,27
Itapetininga 4.635 4.156 8,94 Votuporanga 1.990 3.326 10,24
Itararé 1.405 1.441 8,68 Porto Ferreira 1.205 1.772 10,04
Presidente
São Joaquim da Barra 1.128 1.684 10,44 928 1.303 9,01
Epitácio
Miguelópolis 465 683 9,54 Severínia 319 495 9,61
Ilha Comprida 703 299 8,73 Tabatinga 516 387 7,75
Fonte: IBGE (2010), FJP e Ministério da Cidades (2013), organização própria (2014).
3
Porcentagem correspondente a média das cidades estudadas uma vez que 100% destas estão abaixo da média
estadual de 13%.
Contudo, quando comparado o estoque de moradias com a quantidade de domicílios
em “Aglomerados Subnormais” [quadro 5], em 83% das cidades compostas por Favelas os
imóveis vagos excedem a demanda gerada pela favelização. Como já citado, a dificuldade de
classificação, uso de conceitos operacionais, dificuldade de censiamento e restrição numérica,
tornam os números levantados pelo IBGE, a respeito de Favelas subestimado, haja vista o
descarte de aglomerados com menos de 51 unidades. O caso da Rocinha, maior Favela
brasileira - localizada na capital carioca, é exemplo desta imprecisão, esta teve sua população
estimada em 69.356 habitantes (IBGE,2010), números bem distintos dos 101.000
contabilizados pela Secretaria Estadual de Obras (2009) e dos 165.000 mostrados pelas
lideranças comunitárias - esta última realizada com base no número de medidores de
eletricidade da concessionária de energia.
Quadro 5 - Relação entre domicílios vagos e em "Aglomerados Subnormais"
Cidades compostas por Favelas

Domicílios em
“Aglomerados

% Domicílios em
% Domicílios Vagos

Subnormais”
Domicílios Vagos

“Aglomerados
Subnormais”
Cidade

Campinas 27.41 7,29 40.099 11,51


6
Ribeirão Preto 15.92 7,07 3.977 1,90
2
Santos 12.11 7,72 10.767 7,44
1
Mauá 7.321 5,52 22.894 18,25
Piracicaba 11.49 9,25 3.788 3,36
3
Bauru 8.135 6,90 1.338 1,22
Sumaré 5.038 6,41 2.198 2,99
Marília 5.804 7,78 1.078 1,57
Santa Bárbara d' Oeste 3.255 5,59 15 0,28
5
Itapevi 4.193 6,78 85 1,48
1
Cubatão 2.162 5,59 14.841 40,67
Votorantim 1.817 5,37 80 2,51
3
Votuporanga 1.990 6,39 58 0,20
Porto Ferreira 1.205 7,05 40 2,54
4
Presidente Epitácio 928 6,59 10 0,79
4
Severínia 319 6,41 71 1,52
Tabatinga 516 10,0 67 1,45
7
Fonte: IBGE (2010), organização própria (2014).
A partir das definições de Favela apresentadas anteriormente, pode-se afirmar que as
habitações precárias – moradias rústicas e improvisadas, são o componente do déficit
habitacional mais relacionado às Favelas. A análise dos números relativos a parcela do déficit
habitacional composta por estes domicílios evidenciou que em 41% das cidades compostas
por Favelas este critério é superior a 8,5% do déficit total; no grupo de cidades não compostos
por Favelas esta relação equivale a 18%. Neste contexto, nos dois grupos a maior parte do
déficit habitacional está atrelado aos imóveis alugados – ônus excessivo, família coniventes e
adensamento; na Favela ou não. Partindo deste princípio, seria esperado que a maior
porcentagem de domicílios precários estivesse na Favela, no entanto não é o que evidencia a
comparação entre este índice e a quantidade de domicílios em Favelas, como exposto no
quadro 6.
Quadro 6 - Relação entre domicílios em Favelas e habitações precárias
Cidades compostas por Favelas

Domicílios em
“Aglomerados

% Domicílios precários em
Subnormais”

Domicílios precários e
improvisados

“Aglomerados
Subnormais”
Cidade

Campinas 40.099 1.939 4,84


Ribeirão Preto 3.977 1.620 40,73
Santos 10.767 3.160 29,35
Mauá 22.894 1.189 5,19
Piracicaba 3.788 546 14,41
Bauru 1.338 1.104 82,51
Sumaré 2.198 576 26,21
Marília 1.078 422 39,15
Santa Bárbara d' Oeste 155 314 202,58
Itapevi 851 756 88,84
Cubatão 14.841 1.922 12,95
Votorantim 803 775 96,51
Votuporanga 58 929 1601,72
Porto Ferreira 404 28 6,93
Presidente Epitácio 104 224 215,38
Severínia 71 0 0,00
Tabatinga 67 16 23,88
Fonte: IBGE (2010), organização própria (2014).
Os números apontados pelo quadro 6, assinalam que pela contagem do IBGE (2010)
não há relação entre incidência de Favela e habitações precárias, e que 89% dos domicílios
precários estão fora destes núcleos. O município de Severínia, por exemplo, tem em sua
composição um “Aglomerado subnormal”, apesar disto não há moradias precárias. Fatos que
levam a questionar quais os critérios para a classificação da Favela Vila São João em
Severínia? Apenas irregularidade fundiária? Os 871 domicílios precários de Votuporanga que
não compõe Favelas não foram considerados como Favela? Ou então, a maior parte das casas
em Favelas são ligadas ao mercado imobiliário informal através de aluguel?
Conclusões
O processo de favelização origina diferentes formas urbanas, não somente em relação
à cidade oficial, mas também entre as diferentes Favelas. Na verdade, o termo “Favela” é uma
grande generalização: a muita heterogeneidade “inter e intra” Favela (CAVALLIERI, 2009, p.
25). Todavia, é inegável que algumas características estruturais, sociais, ambientais e
econômicas, são comuns a estes aglomerados, o que influencia na consolidação do estereótipo
de Favelas – associado principalmente aos núcleos cariocas, que “habita” não somente o
imaginário da população em geral, mas também de órgãos públicos responsáveis pela
classificação destes núcleos. Soma-se a este fato, a imprecisão e variabilidade de critérios e
conceitos que dão margem classificações inadequadas, que levam ao questionamento sobre o
que realmente é Favela, uma vez que há inúmeros núcleos urbanos que apresentam aspectos
comuns e diferentes classificações.
A dimensão da tragédia urbana brasileira está a exigir o desenvolvimento de respostas,
que devem partir do conhecimento da realidade empírica respaldado pelas informações
cientificas das “ideias fora do lugar” tão características do planejamento urbano no Brasil
(MARICATO, 2013, p.15). Parte deste problema está na ausência de discussões conceituais e
metodológica rigorosas, que auxiliem na classificação e quantificação adequada dos
fenômenos urbanos, sobretudo as Favelas, para a delimitação na definição conceitual, que
mesmo abrangente deve esclarecer as particularidades da formação estudada. Os paradoxos
do conceito de Favela, torna passível desta compreensão todos os tipos de habitação dos
pobres urbanos, e ao mesmo tempo permite a desclassificação dos núcleos pela
superficialidade da formulação. Os critérios adotados, em geral, desconsideram as
particularidades locais e a polissemia que o termo Favela adquiriu em um século, o
diagnóstico correto é necessário para nortear as ações governamentais para as intervenções
nestas áreas, afim de promover condições mínimas de habitabilidade a seus moradores.
Partindo deste principio, a classificação e terminologia deve ser pautada em variáveis
que denunciem o real patamar de cada aglomerado, evitando as lacunas entre a noção teórica
de Favela e as características empíricas dos núcleos urbanos, reconhecendo a
multidisciplinaridade das condicionantes deste fenômeno. Neste sentido, a viabilidade das
políticas públicas está na elaboração de propostas consolidadas sobre aspectos técnicos que
tenham seu cerne em ações claras, objetivas e adequadas ao território, que abandonem a
abordagem genérica e estereotipada na qual estão subordinadas a cidade informal. Faz-se
necessário entender e aceitar que os problemas das Favelas não podem ser resolvidos de
forma fragmentada, pois não são marcados somente pela irregularidade fundiária, mas por
uma exclusão total, econômica, jurídica, cultural, educacional, de serviços e equipamentos
urbanos, enfim, estão à margem do “direito à cidade”.

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