SISTEMA SHADUF
JULIANA MARTINS1
Resumo
Abstract
The present work seeks to understand the contemporary system of irrigation water
of rural populations of Egypt, and their relations with the system of the past, having as a
source data archaeological and ethnographical. The technique addressed is the shaduf,
system widely used for transporting water from the Nile to the fields, gardens and
orchards. Many of the activities appear in mural paintings of the tombs of the new
empire, and can still be found in use today.
1
Graduada em História pelo Centro Universitário Estácio Radial de São Paulo. Pós- graduando
em Arqueologia, história e sociedade, na Universidade de Santo Amaro (UNISA). Email:
julianamartins00007@hotmail.com.
1. Uma visão etnoarqueológica da utilização do sistema Shaduf no Egito
2
MAUSS, M. The Gift: forms and functions of exchange in archaic societies. Londres:
Routledge, 1954.
e pessoas, e isso objetos e conhecimentos ritualísticos. Binfors (1978) em Nunamiut
ethnoarchaeology desenvolveu um trabalho etnográfico de campo no Alasca, a fim de
entender o comportamento dos Nunamiut, e isso inclui uma variedade de condições
deterministas, que por sua vez giram em torno do meio ambiente. A teoria geral dos
sistemas criada por Binford permite que os arqueólogos estudem todo o processo dentro
das estruturas estáticas, porém, as possíveis alterações no sistema social passam a ser
tratadas como fatores externos ou ambientais. Segundo Trigger:
[...] Binford afirmou que itens naturais não interagem com um único
subsistema da cultura, mas refletem todos os três. Os aspectos
técnico- econômicos dos artefatos refletem o modo como eles eram
usados para fazer face ao ambiente; os aspectos sociotécnicos têm no
domínio social o seu contexto básico; e o ideotécnicos correspondem
ao domínio ideológico. [...] (TRIGGER, 2004:294).
Binford sempre defendeu uma idéia mais positivista, que elimina os elementos
subjetivos, e reafirma uma base interpretativa mais objetiva dos dados arqueológicos.
No entanto, Schiffer (1972) não concorda com o determinismo da teoria dos sistemas,
ele acredita que o registro arqueológico é uma visão distorcida do passado, por isso não
devemos tratar as pessoas e a cultura material como fontes estáticas. As leis
comportamentais vêm opondo-se as hipóteses mais importantes desenvolvidas por
muitos arqueólogos, de que o espaço padronizado de resquícios arqueológicos reflete o
padrão espacial das atividades dos antepassados.
Esse questionamento deu margem a novos questionamentos, sobre a proveniência
dos artefatos e o seu uso real dentro de uma sociedade, numa perspectiva
comportamental do sistema cultural. Para Schiffer (1972):
[..] the life cycle or history of any element-the stages of its "life"
within a cultural system -and how these relate to the eventual
transition of elements to the archaeological record. Systemic context
labels the condition of an element which is participating in a
behavioral system. Archaeological context describes materials which
have passed through a cultural system, and which are now the objects
of investigation of archaeologists. […] (SCHIFFER, 1972:157)3
3
SCHIFFER, M. B. Archaeological context and systemic. American Antiquity, Vol. 37, No. 2.
(Apr. 1972), pp. 156-165.
As idéias de Sheffer podem ser observadas claramente no contexto
etnoarqueológico, principalmente quando observamos as atividades humanas. Para
Kramer (2002), os arqueólogos e os etnólogos têm um problema. Por um lado a
arqueologia se manifesta através das atividades humanas de longo tempo, com isso, as
interpretações de determinado dados precisam considerar as ações ao longo do tempo.
Já a etnoarqueologia trabalha no presente, para que se possa evitar que haja uma
assimilação entre passado e presente, identificando os mecanismos socioculturais. Sobre
a etnoarqueologia, Kramer afirma que:
Essas observações correm para que não haja erros interpretativos distorcidos por
parte das observações do presente com o passado, é importante trabalhar aspectos
específicos do uso da disciplina. Ela envolve a análise da produção material, as
tipologias, as distribuições, o consumo e descarte de coisas materiais, respeitando a
variação no contexto sociocultural.
Ter a cultura material como ponto de partida para a análise etnoarqueológica, nós
dá a opção de vários caminhos dentro das pesquisas. O sistema de irrigação praticado
ainda hoje pelos camponeses do Egito é uma espécie mecanismo que ainda pode ter
relação com o comportamento humano do passado. A partir da utilização de alguns
sistemas como Shaduf e Saqya,4 conseguimos entender as necessidades e dificuldades
que os antigos egípcios passaram com relação ao processo de irrigação de água.
Segundo Silva:
4
Sistemas tradicionais de transporte de água do Nilo e dos canais aos campos, sistemas
desenvolvidos durante o período do Novo Império.
A breve citação observa que devemos entender a relação dos homens com o mundo
material no tempo, para que possamos debater a relação do homem com os objetos.
Seguindo essa linha de pensamento, a abordagem das pesquisas deixa de ser voltadas
para a arqueologia e a compreensão do passado. Isso sugere uma possibilidade de
entender as sociedades do presente e a sua relação naquele ambiente. Alguns como
Politis (2002) descreve que a etnoarqueologia é como uma especialidade da
arqueologia, e da antropologia social. Ambas trabalham a cultura material em função
dimensional do comportamento humano. A etnoarqueologia se apóia em três áreas
cabíveis para interpretações arqueológicas. Buscar relações coerentes sobre o
comportamento humano e a cultura material, é o método mais contemporâneo utilizado
no âmbito da disciplina, e, segundo Politis (2000), o objetivo dessa construção é
trabalhar para que não haja interpretações de múltiplos sentidos, ou mesmo contrárias
sobre os derivados casuais dinâmicos estáticos. Essa forma de pesquisa é desenvolvida
com muita freqüência, Politis (2000) fala que:
5
Traducción castellana de Mònica Tusell (1992): El Antiguo Egipto: anatomía de uma
civilización. Título original: Ancient Egypt: Anatomy of a Civilization, Barry j.Kemp (1989).
As condições as margens do Nilo foram favoráveis, sabendo que o rio atravessa do
sul até o norte, levando a água do lago vitória até o mediterrâneo há mais de 5.500 km
de distância. Na antiguidade, o Nilo correspondia aos últimos 1.300km que iniciava na
atual aswan, e terminava no vale do Nilo, nas proximidades do Cairo, que hoje é a atual
capital do Egito. O calendário egípcio era dividido em três estações: Ajed (inundação),
Peret (colheita) e Shemu (seca).
6
História geral da África, II: África antiga / editado por Gamal Mokhtar. – 2. ed. rev. –Brasília
: UNESCO, 2010.
Evidências arqueológicas datadas do novo Império,7demonstram que houve um
extraordinário progresso no sistema de irrigação agrícola após a invenção do sistema
Shaduf (principal dispositivo de irrigação). J. Yoyotte (2010:130) afirma que “a
invenção do shaduf durante o Novo Império tenha possibilitado duas colheitas de cereais por
ano em alguns lugares”. Anterior a essa dinastia, não temos evidências arqueológicas da
utilização desse sistema. Segundo Tusell:
7
Cidade de Tebas, cerca de 1550-10476 A.P, nas XVII-XX dinastias.
8
Apy’s house and garden, detail from plate XXVIII. Painted by N. de Garis Davies.
Fig.2 Representação do Shaduf em Amarna, segunda metade da XVIII dinastia.
Butzer(19476:43).
9
Smith, Dan. O atlas do oriente médio: conflitos e soluções.Publifolha, 2008.
Fig.4. Utilização do Shaduf pelas sociedades contemporâneas do Egito, Siliotti
(2006:25).
Fig.5. Shaduf abandonado numa vala de irrigação, as margens do Nilo branco. Butzer
(19476:43) 10.
10
K.W.Butzer, Early hydraulic civilization in Egypt, Chicago, 1976. O sistema não se concentra
apenas no Egito, a imagem foi encontrada no Sudão, as margens do Nilo branco. Houve
período em que o Egito ficou sobre domínio dos núbios, por volta de 770 A.P.
A visão etnoarqueológica sobre o estudo do modo de vida atual das sociedades
acaba trazendo uma compreensão maior sobre o processo das evidências arqueológicas.
Segundo Renfrew (2008:194) “Los problemas se derivamn de La natureza de las
comparaciones”. No Egito, percebe-se uma distância temporal muito ampla entre as
abordagens, porém, a arqueologia Egípcia não tem muito problema com as
interpretações, pois como já foi citado no texto, há um número muito grande de
evidência material e textual. O uso do Shaduf pelas sociedades contemporâneas
apresenta forte relação com o passado, pois o sistema foi criado para suprir as
populações que vivem as margens do Nilo, e atualmente a cultura material ainda está
em uso pelas mesmas necessidades.
Considerações Finais
Através das práticas cotidianas apresentadas nas imagens acima, podemos afirmar
que o registro arqueológico, está sobre uma perspectiva facilitadora da compreensão
sobre a relação das sociedades com a cultura material. Dentro do que foi analisado,
podemos considerar as similaridades, com relação às necessidades da utilização do
objeto.
Bibliografia
GALÁN, José. Cuatro Viajes em La Literatura Del Antiguo Egipto. Consejo superior de
investigaciones científicas Madrid, 2000.
MAUSS, M. The Gift: forms and functions of exchange in archaic societies. Londres:
Routledge, 1954.
POLITIS. Acerca dela etnoarqueología em América Del sur. Porto Alegre, ano 8, n. 18,
p. 61-91, dezembro de 2002.