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GESTÃO DE MUSEUS:
OPORTUNIDADES E DESAFIOS MUNDO AFORA
Resumo: O projeto Gestão Cultural Mundo Afora alia a pesquisa acadêmica com a
atividade de extensão para pesquisar, analisar, discutir e difundir modelos gerenciais na
área cultural com o objetivo de democratizar informações e metodologias de gestão
aplicadas em diferentes setores culturais e países. As experiências de gestores culturais
internacionais são organizadas em episódios de uma webserie disponibilizada
gratuitamente na internet. Este artigo apresenta de forma descritiva os resultados da
primeira temporada do projeto que foi dedicada à gestão de museus e realizada entre
2012 e 2014.
Introdução
1
Professora do Centro de Cultura, Linguagens e Tecnologias Aplicadas (Cecult) da Universidade Federal
do Recôncavo do Bahia. E-mail: danielecanedo@ufrb.edu.br
2
Graduada em Produção em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal da Bahia e especialista
em Gestão de Projetos pela UNIFACS. E-mail: carolkirols@gmail.com
3
Professor do Centro de Artes, Humanidades e Letras (CAHL) da Universidade Federal do Recôncavo do
Bahia. E-mail: archieamazonas@gmail.com
A necessidade de promover o compartilhamento de experiências práticas de
instituições e gestores atuantes em diferentes setores culturais e países motivou a
idealização do projeto de extensão "Gestão Cultural Mundo Afora". O objetivo é aliar a
pesquisa acadêmica sobre modelos de gestão com a linguagem audiovisual, enquanto
veículo de transmissão do conteúdo, e a internet, como principal porta de difusão e
distribuição do produto final. A proposta metodológica prevê a realização de
temporadas com diferentes objetos a serem pesquisados; a realização e gravação de
entrevistas; e a produção de episódios temáticos por temporada.
A gestão de museus foi escolhida como temática para a primeira temporada, que
foi financiada pelo Fundo de Cultura da Bahia e executada no período de 2012 a 2014.
A execução do projeto pode ser considerada uma produção audiovisual de guerrilha,
pois contou com poucos recursos e uma equipe pequena (APÊNDICE A). Foram
gravadas mais de 30 horas de entrevistas com 23 gestores culturais (QUADRO 1) de
cinco museus do Brasil, do Reino Unido e da Bélgica. Os museus que gentilmente
aceitaram participar da série foram: Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM-BA), de
Salvador, Brasil; The National Gallery (TNG) e Natural History Museum (NHM), de
Londres, no Reino Unido; Museum aan de Stroom (MAS), de Antuérpia, e Musées
Royaux des Beaux-Arts de Belgique (MRBAB), de Bruxelas, ambos na Bélgica. Os
museus foram escolhidos observando critérios como público, acervos, implantação de
inovações tecnológicas, bem como a disponibilidade para participar do projeto. O
resultado pode ser conferido em cinco episódios documentais, com duração média de 30
minutos cada. Os temas dos episódios são: 1) Conservação e Restauração de Acervos;
2) Gestão Econômica e Financiamento; 3) Produção de Exposições; 4) A Comunicação
e o Público; e 5) Novas Tecnologias: Digitalização e Interatividade.
A primeira temporada foi lançada para o público de Santo Amaro e do Centro de
Cultura, Linguagens e Tecnologias Aplicadas da Universidade Federal do Recôncavo da
Bahia (UFRB) no dia 23 de setembro de 2014, no Teatro Dona Canô; e para o público
de Salvador e da Universidade Federal da Bahia, no dia 06 de outubro de 2014, no
Cinema do Museu, no Museu Geológico da Bahia. Os cinco episódios estão registrados
sob licença Creative Commons e estão disponíveis no site Cultura Mundo Afora
(culturamundoafora.com), em plataformas de compartilhamento de vídeos (Youtube e
Vimeo) e na rede social Facebook. Neste artigo, apresentamos alguns aspectos da gestão
de museus na contemporaneidade que foram discutidos pelos gestores entrevistados.
Museu Entrevistado Setor
Frederik Leen Curadoria e Direção
Musées Royaux des Beaux-Arts de Isabelle Vanhoonacker Departamento de Educação
Belgique (MRBAB) - Michel Draguet Direção
Bruxelas, Bélgica Pierre-Yves Museu Digital
Sophie Van Vliet Produção
Adriana Araújo Arte e Educação
Carolina Câmara Produção
Eliane Moniz Galpão de Oficinas
Museu de Arte Moderna da Bahia
Janaína Chavier Arte e Educação
(MAM-BA)
Luciana Moniz Direção Executiva
Salvador, Brasil
Maria Lúcia Lyrio Conservação
Sandra Regina Jesus Museologia
Stella Carrozzo Direção
Thiago Falcão Comunicação
Museum aan de Stroom (MAS) Carl Depauw Direção
- Antuérpia, Bélgica
Clare Valentine Acervos
Natural History Museum (NHM) -
Emily Smith Comunicação
Londres, Reino Unido
Louise Fitton Exposições Permanentes
Peronel Craddock Exposições Temporárias
Charlote Sexton Mídias Digitais
The National Gallery (TNG)
Jane Ellis Financeiro
Londres, Reino Unido)
Jill Preston Comunicação
Larry Keith Conservação
QUADRO 1: Gestores entrevistados. Série Gestão Cultural Mundo Afora - temporada Museus
Elaboração própria
5
ELLIS, Jane. Episódio 2: Gestão Econômica e Financiamento. Série Gestão Cultural Mundo Afora -
temporada Museus. Salvador: Volta do Mundo Produções, 2014.
instituição negociou parcerias em serviços com grande empresas da Bélgica para a
realização da obra.
O NHM criou uma marca de produtos varejistas que inclui brinquedos,
vestuários, alimentos, eletrodomésticos e utilidades domésticas. Os produtos com a
marca NHM são comercializados em diversas lojas de departamento e supermercados
de Londres. A estratégia comercial da instituição parece atingir dois objetivos - por um
lado, mantém uma fonte de renda extra e, por outro, faz divulgação permanente do
museu por toda a cidade.
O MAS, inaugurado em 2011, é um exemplo de gestão que agrega fontes de
recursos das esferas públicas federal, comunitária (estadual) e municipal, bem como de
apoio privado. Vale ressaltar que na Bélgica não existe uma tradição de apoio privado a
museus. Todavia, quando o museu estava sendo planejado, foi feita uma campanha de
convencimento da população sobre a importância de um museu municipal que
preservasse a memória local. "O que nós tentamos fazer foi seduzir empresas privadas,
mas também seduzir indivíduos, a se tornarem parceiros desta nova ideia, criando um
novo museu e criando um novo prédio", explica Carl Depauw, diretor do MAS
(informação verbal, tradução nossa)6.
Foram criadas duas estratégias principais. A primeira estava destinada a quatro
empresas que se tornariam fundadoras do museu. Além das grandes empresas, o MAS
promoveu um esquema de financiamento coletivo para pessoas físicas com o objetivo
de arrecadar 300 mil euros. O projeto do MAS previa a instalação de 300 "mãos de
metal", símbolo da cidade de Antuérpia, na fachada do prédio. Cada doador que
contribuísse com mil euros teria a sua "mão" na fachada. A estratégia foi bem sucedida.
Para Stella Carrozzo, diretora do MAM-BA, é preciso que haja mais
conscientização do cidadão e das empresas privadas sobre o papel que devem assumir
no apoio à cultura. Todos os gestores entrevistados concordam que é preciso
desenvolver estratégias de financiamento a longo prazo e, cada vez mais, envolver
pessoas físicas e jurídicas no financiamento à cultura.
Nas entrevistas, os gestores citavam alguns tipos de públicos: a pessoa que visita
apenas uma vez para conhecer o museu; o visitante regular, que volta ao museu sempre
que tem uma nova exposição; o turista que está de passagem na cidade e vai ao museu
como um ponto turístico; artistas e profissionais do setor cultural; os associados e
voluntários; os pesquisadores acadêmicos; os visitantes virtuais; e o não-público, ou
seja a pessoa que ainda não conhece o museu, mas é um visitante potencial, e precisa ser
alcançado de alguma forma. Em relação aos perfis socioeconômicos, parece haver um
consenso de que os museus devem ser acessíveis para todos os públicos. Como explica
o diretor do MAS, Carl Depauw, "Nós tentamos desenvolver um produto cultural
diverso que seja interessante não apenas para pessoas de diferentes antecedentes étnicos,
mas também para diferentes idades e outros aspectos"(informação verbal, tradução
nossa)8. Entre os desafios do relacionamento com o público está a necessidade do
museu se comunicar tanto com públicos que o entendem como uma instituição de
pesquisa científica e salvaguarda do patrimônio quanto com públicos que buscam
entretenimento e vão se relacionar com os museus que oferecerem alternativas de
diversão.
Com esta finalidade, os cinco museus que participam da série desenvolvem
ações que buscam oferecer programações alternativas à simples visitação. Tais
iniciativas tem como princípio que o público da contemporaneidade não se contenta
com uma posição passiva diante das exposições. Este novo público espera participar das
atividades e as ações buscam oferecer mecanismos de interatividade para criar uma
relação de proximidade com o visitante. Entre as ações de relacionamento com o
público citadas no episódio estão atividades de mediação cultural, cursos
profissionalizantes, oficinas, palestras, jogos, eventos culturais, entre outros. As ações
são pensadas para o público individual e para grupos de pessoas como famílias, amigos,
estudantes, colegas de trabalho, vizinhos, etc.
7
, VANHOONACKER, Isabelle. Episódio 4: A comunicação e o público. Série Gestão Cultural Mundo
Afora - temporada Museus. Salvador: Volta do Mundo Produções, 2014.
8
, DEPAUW, Carle. Episódio 4: A comunicação e o público. Série Gestão Cultural Mundo Afora -
temporada Museus. Salvador: Volta do Mundo Produções, 2014.
Vale ressaltar, por exemplo, a ação do TNG para atrair visitantes adultos no
horário pós-trabalho. Todas as sextas-feiras, o museu londrino fica aberto até mais tarde
e oferece uma ambiência de happy-hour que inclui música ao vivo e bebidas alcoólicas.
O evento se tornou uma referência na cidade e atrai grupos de amigos que passam
algumas horas na galeria antes de sair para jantar ou para dançar, por exemplo. Outra
iniciativa interessante é a do NHM, que desenvolve uma ação chamada "Uma noite no
museu", no qual são oferecidas diversas atividades e brincadeiras para grupos de
pessoas de diferentes idades - crianças e adultos - que querem ter a experiência de
dormir uma noite no meio de esqueletos de dinossauros. Já o MAM-BA apoia a
realização de eventos que agregam outras linguagens artísticas, como o concerto
musical "JAM no MAM" que atrai públicos diversos.
Existem também os ações que visam promover o contato com o público que
nunca visitou o museu. Tais ações também incluem iniciativas que buscam aproximação
com públicos socialmente ou economicamente excluídos das atividades culturais. O
MRBAB executa projetos com imigrantes e moradores de rua da Bélgica. O MAM-BA
desenvolve programas com as comunidades carentes que estão no entorno da
instituição. Nas ações, tanto a equipe dos museus vai às ruas e comunidades quanto as
pessoas e comunidades vão para o museu.
Para atingir todos os públicos, os gestores realizam pesquisas buscando obter o
máximo de informações sobre as demandas e expectativas dos grupos sociais. Eles
apostam na segmentação dos públicos, criando estratégias diferenciadas para se
comunicar com diferentes públicos. Além dos tradicionais métodos de divulgação como
assessoria de imprensa, propaganda e anúncios em guias turísticos e culturais, os
museus estão investindo muito na comunicação direcionada para endereços eletrônicos
e nas redes sociais. Todavia, a estratégia mais importante parece ser a constância e a
regularidade - os gestores advertem que é preciso manter os espaços de comunicação
sempre ativos e atualizados. Ademais, é preciso responder às mensagens do público
com brevidade.
Nós podemos ter uma boa ideia da extensão dos danos que talvez existam na
pintura. Podemos saber sobre a estrutura dos níveis da pintura, se for
necessário, nós podemos, saber com certeza sobre a composição do verniz
que talvez esteja no topo da pintura. Todas essas coisas são resultados de um
trabalho analítico antes mesmo de começarmos o trabalho de restauro que
pode realmente informar sobre o tratamento necessário (informação verbal,
tradução nossa)9.
9
, KEITH, Larry. Episódio 5: Novas tecnologias: digitalização e interatividade. Série Gestão Cultural
Mundo Afora - temporada Museus. Salvador: Volta do Mundo Produções, 2014.
Além dos benefícios para os setores de conservação e restauro, as novas
tecnologias transformaram o modo como as exposições são planejadas e montadas. A
visita a um museu passou a ser uma experiência mediada pela cenografia e por
aparelhos multimídia e audiovisuais. Charlote Sexton, responsável pelas mídias digitais
do TNG, explica que eles estão sempre pensando em como contar a história das
pinturas de uma forma interessante que possa engajar o público. Na contemporaneidade,
isso inclui o uso de aplicativos e aparelhos celulares e tablets. Todavia, no que concerne
à interatividade, não existe concenso. Pierre Yves, do MRBAB explica que muitos
curadores ainda são contrários ao uso de celulares nos espaços expositivos.
Os principais desafios destacados no episódio estão relacionados à necessidade
de manter os sistemas e equipamentos atualizados, já que as tecnologias mudam
permanentemente. Ademais, é preciso prover oportunidades constantes de capacitação
para o corpo funcional. Tais desafios são agravados tendo em vista as questões
financeiras que já foram discutidas anteriormente. Nesse sentido, os gestores ressaltam a
necessidade de planejar cuidadosamente a compra de equipamentos, priorizando
investimentos em tecnologia que serão estratégicas para o futuro da instituição.
Conclusões
REFERÊNCIAS
APÊNDICE A - Equipe