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07/06/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra

Acórdãos TRC Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


Processo: 359/17.0GBFND.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ELISA SALES
Descritores: APRESENTAÇÃO DE PEÇAS PROCESSUAIS
CORREIO ELECTRÓNICO
TELECÓPIA
Data do Acordão: 13-05-2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: CASTELO BRANCO (JUÍZO LOCAL CRIMINAL DO FUNDÃO)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ART. 2.º DA PORTARIA 280/2013, DE 26-08; ART. 150.º, N.º 1, AL. D), E N.º 2, DO CPC,
NA REDACÇÃO DO DL 324/2003, DE 27-12; PORTARIA 642/2004, DE 16-06; DL 28/92,
DE 27-02; ART. 6.º, N.º 1, AL. B), DO DL 329-A/95, DE 12-12
Sumário: I – Na medida em que a Portaria n.º 280/2013, de 26-08, continua a
aplicar-se tão só às acções referidas no seu artigo 2.º, ficando, deste
modo, excluídos do seu âmbito regulamentador os processos de
índole penal, mantém plena actualidade a jurisprudência fixada no
Acórdão do STJ n.º 3/2014, de 6 de Março desse ano.
II – Em conformidade, é admissível, em processo penal, a remessa
a juízo de peças processuais através de correio electrónico, nos
termos do disposto no art. 150.º, n.º 1, al. d), e n.º 2, do CPC de
1961, na redacção do DL 324/2003, de 27-12, e na Portaria
642/2004, de 16-06, aplicáveis por força do disposto no art. 4.º do
CPP.

III – Perante o que dispõe o artigo 10.º da dita Portaria 642/2004, à


apresentação de peças processuais por correio electrónico é
aplicável o estatuído no DL n.º 28/92, de 27-02, o qual disciplina o
regime do uso de telecópia, estabelecendo o artigo 4.º do último dos
diplomas mencionados a obrigatoriedade de serem remetidos, no
prazo de 10 dias (o prazo inicial de 7 dias previsto no n.º 3 do artigo
4.º, perante o disposto no artigo 6.º, n.º 1, al. b), do DL n.º 329-A/95,
de 12-12, passou a ser de 10), ou entregues na secretaria, os
respectivos originais.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na secção criminal do Tribunal da Relação
de Coimbra

I - RELATÓRIO
No processo comum supra identificado, após a realização da audiência
de julgamento, foi proferida sentença que decidiu:
1. Julgar a acusação pública procedente e, em consequência:
- Condenar o arguido A. pela prática, em autoria material e na forma
consumada, de um crime de furto simples p. e p. pelo artigo 203º, n.º 1,
do Código Penal, na pena de 250 dias de multa, à taxa diária de 6,00€ ,
perfazendo o montante global de 1500,00€ .

*
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O arguido não se conformando com a decisão proferida em 1ª instância,


interpôs recurso da mesma, tendo extraído da motivação as seguintes
conclusões:
1ª- O recorrente entende e propugna que a matéria de facto dada como
provada – nomeadamente os pontos 2, 3, 4 e 7 – pela Meritíssima Juíza
“a quo” deve ser considerada matéria não provada, uma vez que
analisando a prova produzida em sede de audiência de julgamento, ou
seja o depoimento do arguido e das testemunhas da acusação, não é
possível concluir que tais factos foram provados.
2ª- Consequentemente, dado que não se fez prova de que tenha sido o
arguido a efectuar a ligação directa, que habitava a casa e que tenha
consumido e usufruído da energia eléctrica, deve o arguido recorrente
ser absolvido da acusação pública.
3ª- Existindo dúvida insanável dos factos pelos quais o arguido vinha
acusado, deverá operar o princípio da presunção da inocência, ao
abrigo do artigo 32º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.
4ª- Entende o recorrente, que a pena concretamente aplicada foi
demasiado severa, tendo em conta as condições pessoais, a sua situação
económica e a conduta anterior. O arguido não tem antecedentes
criminais, tem uma condição económica mediana, sendo que o
consumo de energia durou pouco mais de 10 dias e à data dos factos
tinha 89 anos de idade.
5ª- A pena concretamente determinada deverá situar-se mais próximo
do mínimo da moldura abstracta, ou seja, aplicação de 90 dias de
multa, obedecerá, assim, aos critérios de proporcionalidade,
relativamente às finalidades de punição e da razoabilidade.
6ª- Ao não decidir assim, a douta sentença faz errada interpretação do
disposto no artigo 71º do Código Penal, disposição que deste modo foi
violada.
Nestes termos e com o douto suprimento que expressamente se invoca
deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença
recorrida e substituindo-a por decisão que absolva o arguido quanto à
acusação pública, ou não se entender assim, por decisão que se condene
o arguido na pena acima propugnada ou ainda, a não se entender assim,
na que o Venerando Tribunal ad quem tenha por ajustada à factualidade
provada em audiência.

B., queixosa, lesada e demandante nos autos, veio interpor recurso do


despacho proferido em sede de audiência de julgamento (sessão de 30-
5-2019), que indeferiu o pedido de indemnização civil apresentado por
correio electrónico, não admitindo, por isso, a intervenção da parte
civil e consequentemente a inquirição de uma testemunha que possuía
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informações essenciais e indispensáveis para a descoberta da verdade


material e boa decisão da causa, condenando a B. em 2 unidades de
conta pelo incidente criado.
E, da respectiva motivação, extraiu as seguintes conclusões:
1. O Tribunal a quo ao decidir, como decidiu, pela invalidade do pedido
de indemnização civil apresentado por correio eletrónico do mandatário
com assinatura eletrónica avançada, não o considerando em sede de
julgamento, incorreu numa errónea interpretação jurídica da Portaria n.º
642/2004 de 16 de junho e do Decreto-Lei n.º 28/92 de 27 de fevereiro.
2. Conforme dispõe o Código de Processo Penal, no artigo 71.º “O
pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é
deduzido no processo penal respetivo, só o podendo ser em separado,
perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei.”
3. Tendo a recorrente, manifestado o propósito de deduzir o pedido de
indemnização civil no momento da participação criminal, foi notificada
do despacho de acusação deduzido pelo Ministério Público contra o
Arguido, nos termos artigo 77.º n.º 2 do CPP, no dia 12.02.2019,
devendo deduzir no prazo de 20 dias contados da receção dessa
notificação, o pedido em requerimento articulado.
4. Foi, no mesmo dia da receção dessa notificação, pelas 19 horas e 28
minutos, comprovados pela data e hora assinaladas na mensagem de
correio eletrónico e na data e hora assinaladas pelo certificado digital
da Ordem dos Advogados, fornecido pela entidade certificadora (…),
que a Recorrente remeteu o pedido de indemnização civil para os
serviços do Ministério Público do Fundão.
5. De acordo com o Acórdão de Fixação de Jurisprudência 3/2014, “Em
processo penal, é admissível a remessa a juízo de peças processuais
através de correio eletrónico, nos termos do disposto no artigo 150.º,
n.º 1 alínea d), e n.º 2, do Código de Processo Civil de 1961, na
redação do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27.12, e na portaria n.º
642/2004, de 16.06, aplicáveis conforme o disposto no artigo 4.º do
Código de Processo Penal.”
6. Com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 170/2017 de 25 de
maio, a tramitação electrónica dos processos penais nos tribunais
judiciais de 1.ªinstância, passou a ser regulada pela Portaria n.º
280/2013 de 26 de agosto, aplicando-se apenas a partir da receção dos
autos em tribunal a que se referem o n.º 1 do artigo 311.º e os artigos
386.º, 391.º-C e 396.º do Código de Processo Penal.
7. Nesse sentido, a apresentação do pedido de indemnização civil, é
anterior à receção dos autos pelo tribunal, devendo por isso, aplicar-se
ainda hoje a Portaria n.º 642/2004 de 16 de junho.
8. Em conformidade com o artigo 150.º n.º 1 al. d) Código de Processo
Civil de 1961, na redação do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27.12, “Os
atos processuais que devam ser praticados por escrito pelas partes são
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apresentados a juízo por… envio através de correio eletrónico, com a


aposição de assinatura eletrónica avançada, valendo como data da
prática do ato processual a da expedição, devidamente certificada.”
9. O n.º 2 deste artigo referia que, “Os termos a que deve obedecer o
envio através dos meios previstos nas alíneas d) e e) do número
anterior são definidos por portaria do Ministro da Justiça”, ou seja, a
Portaria 642/2004 de 16 de junho.
10. No artigo 3.º n.º 1 desta portaria, “o envio das peças por correio
electrónico equivale à remessa por via postal registada nos termos do
n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de agosto, com a
redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 62/2003 de 3 de abril,
bastando para tal a aposição de assinatura electrónica avançada.”
11. Acrescenta o n.º 3 deste artigo que “a expedição da mensagem de
correio electrónico deve ser cronologicamente validada, nos termos da
alínea u) do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de agosto,
com a redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 62/2003, de 3 de
abril, mediante a aposição do selo temporal por uma terceira entidade
idónea.”
12. Nestes termos, deve entender-se que é necessário a declaração de
uma entidade certificadora, como é o caso da (…), que atesta a data e a
hora da expedição de um documento eletrónico, conforme refere alínea
u) do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de agosto, com a
redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 62/2003, de 3 de abril.
13. Assim, à semelhança do que acontece nas peças processuais
enviadas via citius, no momento do envio da mensagem de correio
eletrónico é aplicado um selo, onde constam as informações relativas
ao remente signatário da mensagem de correio eletrónico remetida, a
validade da assinatura digital e ainda a data e hora em que a mesma foi
assinada.
14. Considerando que, esta assinatura é gerada por um certificado da
Ordem dos Advogados, fornecido pela entidade certificadora (…),
preenche o requisito da assinatura eletrónica avançada.
15. Da mesma forma, se esse certificado regista a data e a hora (GMT
+1) em que a mensagem de correio eletrónico foi assinada, momento
que é simultâneo à expedição da mensagem de correio eletrónico,
considera-se que se encontra também cumprido o requisito da
validação cronológica.
16. Estas informações digitais, ficam guardadas e acessíveis quer ao
remetente como ao destinatário daquela mensagem de correio
eletrónico, mediante um clique sobre o selo que segue naquela
mensagem.
17. Por tudo isto, a mensagem de correio eletrónico enviada a 12 de
Fevereiro de 2019, pelas 19 horas e 28 minutos, cumpre os requisitos

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exigidos pela Portaria n.º 642/2004 de 16 de junho, não devendo por


isso ser aplicável o artigo 10.º.
Sem prescindir,
18. Ainda que não se encontrassem cumpridos os pressupostos exigidos
pela Portaria n.º 642/2004 de 16 de junho e por causa disso, se
aplicasse por remissão do artigo 10.º o Decreto-Lei n.º 28/92 de 27 de
fevereiro, o não envio dos originais não implicava pura e simplesmente
a invalidade do ato processual.
19. Conforme demonstrou o Mandatário em sede de audiência de
julgamento e foi comprovado pelos serviços do Ministério Público, a
Recorrente enviou no dia 12 de Fevereiro de 2019, pelas 19 horas e 28
minutos, o pedido de indemnização civil, os documentos probatórios e
o substabelecimento com reserva, considerando-se por isso, que aquele
ato processual foi praticado tempestivamente pela recorrente.
20. O n.º 3 do artigo 4.º do DL 28/92 de 27 de fevereiro refere que, “os
originais… devem ser remetidos ou entregues na secretaria judicial no
prazo de sete dias… incorporando-se nos próprios autos.”
21. Mas o ato praticado só não aproveita à parte, se “… apesar de
notificada para exibir os originais, o não fizer, inviabilizando
culposamente a incorporação nos autos ou o confronto a que alude o
artigo 385.º do Código Civil.”
22. Salvo melhor opinião, entende-se que aquele dever previsto no n.º 3
do artigo 4.º, só poderá afetar a validade do ato processual em causa, se
e só se, a parte tiver sido notificada para apresentar os originais e não
fizer, o que no caso em apreço não aconteceu.
23. Da mesma forma e em conformidade com a jurisprudência
dominante, o Tribunal da Relação de Coimbra, no acórdão datado de
09.05.2006 relativamente ao processo 1219/06, explicita que, “a falta
de apresentação na secretaria judicial do original da contestação no
prazo de 10 dias contado do envio da telecópia não acarreta, sem
mais, a invalidade do ato processual; A contestação apresentada por
telecópia só não aproveita a parte, se apesar de notificada para
apresentar o original, o não fizer.”
24. Por tudo que antecede, considera-se que a Meritíssima Juíza do
tribunal a quo, não interpretou corretamente a legislação aplicável ao
caso concreto invalidando sem mais o pedido de indemnização civil
tempestivamente apresentado pela Recorrente.
25. Esta surpreendente decisão do tribunal a quo, não se coaduna com a
jurisprudência dominante, nem com o espirito de um legislador que
pretende desmaterializar e simplificar os atos processuais com o
objetivo de facilitar o acesso à justiça e simplificar os processos de
trabalho nos tribunais através da utilização intensiva das novas
tecnologias.

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26. De igual forma, a posição aqui evidenciada colide de frente com o


princípio de adesão, positivado no artigo 71.º e 72.º do Código de
Processo Penal.
27. Estamos assim, perante uma irregularidade processual prevista no
artigo 123.º do Código de Processo Penal, que apesar de ter sido
arguida pela interessada, aqui recorrente, não foi devidamente reparada
pelo tribunal a quo, afetando não só, a admissão do pedido de
indemnização civil, como, todos os termos subsequentes.
28. Como resultado desta irregularidade e consequente tentativa de
resolução da mesma pela interessada, a Meritíssima Juíza do Tribunal a
quo, considerou indiscriminadamente e de forma pouco fundamentada
que teria sido criado um incidente, o qual deveria ser tributado
autonomamente à ofendida no valor de 2 unidades de conta.
29. O regime de custas em processo penal encontra-se expressamente
previsto no disposto nos artigos 513.º a 524.º do Código de Processo
Penal e no artigo 8.º, conjugado com a tabela III, do Regulamento das
Custas Processuais.
30. Este “incidente” inominado, foi criado única e exclusivamente por
um erro nítido dos serviços do Ministério Público, que apesar de terem
rececionado o pedido de indemnização civil deduzido pela ofendida,
não o juntaram aos autos, nem notificaram a demandante, para remeter
ou entregar os referidos originais.
31. Um erro que, obliterou a possibilidade de a Recorrente ser
ressarcida dos prejuízos causados provocados diretamente por aquele
ilícito criminal nos termos artigo 71.º e seguintes do Código de
Processo Penal.
32. Nestes termos, a existir um incidente, este originou-se num erro dos
serviços judiciais.
33. Não se considerando por isso, que a ofendida tenha dado causa a
algum incidente.
34. Por outro lado, a ofendida ao invocar aquela irregularidade
processual e ao requerer que mesma fosse reparada, não entorpeceu o
andamento de processo, nem implicou a disposição de tempo e meios
que permitisse legitimar a aplicação de tal taxa de justiça nos termos do
artigo 521.º do Código de Processo Penal.
35. O mandatário da Recorrente, apenas exerceu a defesa da sua
constituinte no estrito cumprimento do Estatuto da Ordem dos
Advogados, arguindo uma irregularidade processual no momento em
que da mesma tomou conhecimento, uma vez que afetava o valor do
ato praticado e dos atos subsequentes.
36. Nesse sentido, refere o sumário do acórdão do Tribunal da Relação
de Coimbra, datado de 20-03-2019 que “O requerimento de arguição
de nulidade, apresentado no momento processual apropriado, sem que
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seja descabido ou dilatório, não dando causa a um acréscimo anormal


da atividade processual, tão pouco a uma excessiva demora na
tramitação do processo, não constitui uma ocorrência estranha ao
desenvolvimento da lide, não sendo, em razão disso, tributável como
incidente anómalo.”
37. Face ao exposto, ao decidir, como decidiu, invalidando sem mais o
pedido de indemnização civil apresentado, e por consequência,
condenando a ofendida numa taxa de justiça por um incidente
indeterminado, o tribunal a quo, errou na interpretação da Portaria n.º
642/2004 de 16 de junho e do Decreto-Lei n.º 28/92 de 27 de fevereiro,
violando o principio de adesão positivado no artigo 71.º e 72.º do
Código de Processo Penal, assim como, errou na interpretação dos
artigos 513.º a 524.º do Código de Processo Penal e o artigo 8.º,
conjugado com a tabela III, do Regulamento das Custas Processuais.
Nestes termos e nos melhores de Direito, conforme douto
suprimento de V/Exas., deverão revogar-se as decisões recorridas e,
em consequência, deverá ser proferido acórdão determinando o
suprimento da irregularidade processual e a invalidade dos termos
subsequentes.

*
Ao recurso do arguido, respondeu a Magistrada do Ministério Público
junto do tribunal recorrido, defendendo a sua improcedência.
Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer nos
seguintes termos:
«Independentemente da decisão que esta Relação venha a tomar em
relação ao recurso interposto pela lesada/demandante civil, parece-me
que a sentença incorreu em contradição insanável entre a
fundamentação e a decisão, já que na matéria de facto não deu como
provado o valor do prejuízo que foi causado à lesada e na
fundamentação condena o arguido em multa, determinando a pena de
multa, entre outras coisas, o valor do prejuízo causado.
(…) Nesta conformidade sou de parecer que deve ser declarada a
nulidade da sentença e reenviado o processo para que a mesma seja
reparada, mas, caso assim não seja entendido, deverá ser dado parcial
provimento ao recurso quanto à medida concreta da pena aplicada, a
qual deve ser diminuída.»
Cumprido o disposto no n.º 2 do artigo 417º do CPP, não foi obtida
resposta.
Os autos tiveram os vistos legais.

***

II- FUNDAMENTAÇÃO
Da sentença recorrida consta o seguinte:
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“ Factos provados
Da acusação pública
1. A ofendida B. é uma sociedade comercial que exerce a actividade de
Operador de Redes de Distribuição, no território continental de
Portugal, em regime de serviço público, sendo titular da concessão
para a exploração da Rede Nacional de Distribuição (RND) de
Energia Eléctrica em Média Tensão (MT) e Alta Tensão (AT), por
concessão do Estado, e da exploração das concessões de distribuição
de energia eléctrica em Baixa Tensão (BT), por concessão dos
municípios.
2. Em data não concretamente apurada, mas situada entre o dia 19 de
Junho de 2017 e o dia 31 de Julho de 2017, o arguido A. concebeu o
plano de estabelecer o fornecimento de energia eléctrica à casa
unicamente, por si habitada, sita na (…).
3. Para a concretização do aludido plano, o arguido, em data não
concretamente apurada, mas situada entre o dia 19 de Junho de 2017 e
o dia 31 de Julho de 2017, de forma, não concretamente apurada,
efectuou uma ligação directa da rede pública de fornecimento de
energia eléctrica à sua casa de habitação, sem que tivesse contrato
activo com qualquer comercializador de energia.
4. A energia eléctrica, assim obtida, foi consumida pelo arguido.
5. No dia 01 de Agosto de 2017, pelas 15 horas e 20 minutos, através
de acção de fiscalização efectuada por funcionários da ofendida, foi
detectada a referida ligação directa, tendo sido elaborado um auto de
inspecção.
6. Nessa sequência, aqueles funcionários desligaram e retiraram todos
os cabos ligados pelo arguido à rede pública de fornecimento de
energia eléctrica.
7. O arguido com a conduta que levou a cabo apropriou-se de um
número não concretamente apurado de quilowatts de energia eléctrica
pertencente à ofendida.
8. O arguido A. actuou de forma livre, voluntária e consciente, com o
propósito de integrar no seu património a referida energia eléctrica
apesar de saber que a mesma não lhe pertencia e que actuava contra a
vontade e sem o consentimento da ofendida, legítima proprietária
daquela.
9. O arguido actuou sempre de forma deliberada, livre e consciente,
bem sabendo que a sua descrita conduta era censurada, proibida e
punida por lei penal.
Das condições pessoais e económicas do arguido:
10. O arguido não tem antecedentes criminais.

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11. O arguido é viúvo e não tem filhos. Encontra-se reformado e aufere


uma pensão de reforma no montante de cerca de 1000,00 euros
mensais. Reside, esporadicamente, em casa própria no Fundão, e,
habitualmente, em casa arrendada em Lisboa, pagando a quantia
mensal de 120,00 euros, a título de renda.
Factos não provados:
Da acusação pública:
A. Que o valor dos prejuízos sofridos pela B. ascenda a um valor
superior a €75,00 (setenta e cinco) euros.”

***

APRECIANDO
O âmbito do recurso define-se pelas conclusões que os recorrentes
extraem da respectiva motivação, de acordo com o estabelecido no
artigo 412º, n.º 1 do CPP, sem prejuízo, contudo, das questões de
conhecimento oficioso.
Nos recursos interpostos, as questões suscitadas são:
a) pela B:
- a validade do pedido de indemnização civil apresentado por correio
electrónico;
b) pelo arguido:
- a errada apreciação da prova, com violação dos princípios da
presunção de inocência e in dubio pro reo;
- subsidiariamente, a redução da pena de multa aplicada.

A- Recurso da lesada/demandante B.:


Consta da Acta de Audiência de Discussão e Julgamento:
«NOTA:
Quando da realização da chamada, foi o oficial de justiça, alertado,
pelo Dr. (…), que não havia chamado a testemunha (…).
Pelo oficial de justiça, foi informado o Dr. (…) que não se encontrava
arrolada tal testemunha.
O Dr. (…) esclareceu o oficial de justiça que a referida testemunha está
arrolada no Pedido de indemnização Cível.
Compulsados os autos, em papel e eletrónicos, o oficial de justiça
certificou-se de que nos autos não há pedido de indemnização cível, o
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que comunicou ao Dr. (…).


Pelo Dr. (…) foi exibido o documento comprovativo da remessa via e-
mail do pedido de indemnização cível, que se veio a comprovar que
não havia sido junta aos autos nos serviços do Ministério Público.
Por outro lado constatou-se que o original desse e-mail não foi junto
aos autos, pois relativamente à prática dos atos por correio eletrónico,
em processo penal, aplica-se a Portaria n.º 642/2004, de 16/06. Nos
termos do artigo 10º, as peças podem ainda ser enviadas por correio
electrónico simples ou sem validação electrónica, aplicando-se nestes
casos o regime do envio por telecópia do DL n.º 28/92, de 27/02. O
regime da telecópia, o DL n.º 28/92, de 27/02, refere a obrigatoriedade
de serem remetidos no prazo de dez dias, ou entregues na secretaria os
originais dos articulados, bem como quaisquer documentos autênticos
ou autenticados - n.º 3 do artigo 4.º.
Assim tal P.I.C. é destituído de validade, pelo que não pode ser
considerado.

(…) pela M.ma Juiz foi declarada aberta a audiência de discussão e


julgamento.

Pelo Dr. (…), foi pedida a palavra e, no seu uso, apresentou um


substabelecimento, que a M.ma Juiz, depois de analisar e rubricar,
ordenou que fosse junto aos autos.
Mais requereu a junção aos autos do pedido de indemnização cível.

Na sequência do requerido, pela M.ma Juiz foi proferido o seguinte:

DESPACHO

Indefere-se liminarmente o P.I.C. ora apresentado, atenta a sua


extemporaneidade - artigo 77 do C.P.P.
Custas do Incidente a cargo da ofendida, fixando-se a taxa de justiça
em 2 Ucs.
Notifique.
Do despacho que antecede foram todos os presentes notificados, do
qual disseram ficar cientes, e ao ilustre mandatário da B. foi-lhe
entregue o P.I.C. ora rejeitado.

*
www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/2baa6bed38dc7ad58025857b0047f3ed?OpenDocument 10/19
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(…)
Pelo ilustre mandatário da B. foi pedida a palavra e, no seu uso, disse:
A B., na qualidade de ofendida neste processo, tendo deduzido pedido
de indemnização cível a 12 de fevereiro de 2019 por e-mail da ordem
dos advogados do mandatário (…), devidamente assinado e validado
pela mesma ordem dos advogados, requer, face ao despacho proferido
pela M.ma Juiz, que seja dada entrada neste momento, que se pretende
apresentar desde já.
Caso assim não se entenda, deverá ser admitido posteriormente, a título
de reparação da vítima em casos especiais, no artigo 83-A do C.P.P., e
para além disso relativamente ao despacho da M.ma Juiz, caso invalide
a admissão do pedido de indemnização cível, essa invalidade, serve
como se não tivéssemos apresentado o pedido de indemnização cível,
ou seja: não deverá ser a B. condenada em taxa de justiça.
Este requerimento encontra-se gravado através do sistema integrado de
gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste
Tribunal, com início às 11:31:05 horas e fim às 11:32:24 horas.

Na sequência do requerido pela M.ma Juiz foi proferida o seguinte:

DESPACHO

Conforme já despacho anteriormente proferido, sendo certo que a


ignorância da lei a ninguém aproveita, muito menos aos intervenientes
do foro processual, e na esteira das portarias já fixadas, o douto
requerimento apresentado via electrónica, sem o posterior envio em
suporte de papel, carece de validade.
Quanto ao demais requerido, sendo certo que o ilustre advogado já
tinha requerido a apresentação do documento neste momento e o
Tribunal tinha indeferido atenta a extemporaneidade do mesmo, nada
mais há a considerar.
Notifique.”
Alega a recorrente:
“A 4 de agosto 2017, a recorrente, por intermédio do seu legal
representante, participou criminalmente contra A., por furto de energia,
dano em instalações e perturbação de serviços.
No decorrer das investigações em sede de inquérito, o Ministério
Público notificou a ofendida para ir aos autos, juntar o mapa
discriminativo da energia furtada e bem assim, o valor dos prejuízos
sofridos, conforme Doc. 2 que aqui se junta e se dá por integralmente
reproduzido para os devidos efeitos legais.

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Nesse sentido a ofendida, através do correio eletrónico do seu


mandatário, dirigiu-se ao processo remetendo todas as informações
solicitadas pelo Ministério Público, conforme Doc. 3 que aqui se junta
e se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
Em conformidade com o artigo 77.º n.º 2 do Código de Processo Penal,
no dia 12.02.2019 através de carta registada, a B. foi notificada da
acusação deduzida pelo Ministério Público, dando-se a oportunidade à
lesada, para, querendo, deduzir pedido de indemnização civil, conforme
Doc. 5 que aqui se junta e se dá por integralmente reproduzido para os
devidos efeitos legais.
Nesse mesmo dia, às 19 horas e 28 minutos, o Mandatário da
Recorrente, remeteu o pedido de indemnização civil para endereço de
correio eletrónico da Procuradoria do Juízo Local do Fundão, que se
encontra devidamente evidenciado naquela notificação da acusação
(fundao.ministeriopublico@tribunais.org.pt), ou seja, da mesma forma
que enviou o pedido de informações supra referido.
Nesta mensagem, enviada do endereço de correio eletrónico registado
na Ordem dos Advogados (menesescardoso-57742p@adv.oa.pt) e
assinada digitalmente pelo mandatário subscritor, foi identificado o
assunto, o número do processo, a referência da acusação e a data em
que ela foi emitida, a referência interna do processo e a data em que foi
remetida a mensagem, conforme Doc. 6 que aqui se junta e se dá por
integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
Requeria então o Mandatário, que fosse dada entrada do Pedido de
Indemnização Civil, dos documentos probatórios e do
substabelecimento com reserva, que seguiam em ficheiro anexo àquela
mensagem, no formado .pdf, identificado como “PIC 359-
17.0GBFND.pdf” que aqui se junta sob a designação de Doc. 7 dando-
se por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
Este modus operandi, realizado neste e noutros processos que correram
no mesmo Juízo Local Criminal, sempre foi aceite e nunca foi
levantada qualquer objeção à apresentação de tais peças processuais
por este meio.
In casu, a excelentíssima Juíza de Direito do tribunal a quo, entendeu
que, o requerimento apresentado por via eletrónica, sem o posterior
envio em suporte de papel, carecia de validade.
Segundo a douta decisão do tribunal a quo, aos atos praticados por
correio eletrónico em processo penal, aplica-se a Portaria n.º 642/2004,
de 16 de junho, que por remissão do artigo 10.º dessa Portaria, aplica o
regime de envio por telecópia (Decreto-Lei n.º 28/92 de 27 de
fevereiro) às peças enviadas por correio eletrónico simples ou sem
validação eletrónica.
Assim sendo e de acordo com o artigo 4.º n.º 3 do DL 28/92 de 27.02, a
ofendida deveria ter apresentado os originais por correio registado

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no prazo de dez dias ou entregar nesse mesmo prazo os originais na


secretaria judicial.
Efetivamente, o pedido de indemnização civil foi enviado por correio
eletrónico e foi recebido naqueles serviços (do Ministério Público), mas
por algum motivo, não imputável à demandante, o mesmo não foi junto
aos autos.
A mensagem de correio eletrónico, enviada para o Ministério Público
do Fundão, foi assinada digitalmente por um certificado da Ordem dos
Advogados, fornecido pela entidade certificadora (…).
Este certificado, garante não só a autenticidade, a integridade e o não
repudio do documento elaborado pelo mandatário subscritor, como
também garante, o momento em que o mandatário assina e envia a
referida mensagem por correio eletrónico.
O envio desta mensagem por correio eletrónico com o certificado da
Ordem dos Advogados, fornecido pela entidade certificadora (…),
preenche o requisito da assinatura eletrónica avançada e
simultaneamente da validação cronológica, cumprindo-se assim os
pressupostos elencados no artigo 3.º da portaria 642/2004 de 16 de
junho.
Por conseguinte, o pedido de indemnização civil enviado em anexo à
mensagem de correio eletrónico tem o mesmo valor jurídico da remessa
por via postal registada, não sendo necessário, o envio de qualquer
original.”
Vejamos,
Regulam os artigos 111º a 117º do CPP sobre a comunicação dos actos
processuais e sobre a convocação para os mesmos; no entanto, este
Código não contém norma que discipline o modo como as peças
processuais podem ser remetidas a juízo.
Perante esta lacuna, acabaram por surgir divergências jurisprudenciais,
tendo o STJ através do Assento n.º 2/2000, de 9-12-1999 (publicado no
DR, 1ª Série-A, de 7-2-2000), fixado jurisprudência no sentido de que
«O n.º 1 do artigo 150º do Código de Processo Civil é aplicável em
processo penal, por força do artigo 4º do Código de Processo Penal». -
--------- Posteriormente, o Assento n.º 1/2001, de 8-3-2001 (publicado
no DR, 1ª Série-A, de 20-4-2001), veio aplicar o Assento n.º 2/2000 ao
processo contra-ordenacional.
Então, dispunha o n.º 1 do artigo 150º do CPC, sob a epígrafe “Entrega
ou remessa a juízo das peças processuais” (na redacção do DL n.º 329-
A/95, de 12.12) que «Os articulados, requerimentos, respostas e as
peças referentes a quaisquer actos que devam ser praticados por
escrito pelas partes no processo podem ser entregues na secretaria
judicial ou a esta remetidos pelo correio, sob registo, acompanhados
dos documentos e duplicados necessários, valendo, neste caso, como
data do acto processual a da efectivação do respectivo registo postal.»
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Estipulando o n.º 3 que «Podem ainda as partes praticar actos


processuais através de telecópia, nos termos previstos no respectivo
diploma regulamentar.»
Como vem sublinhado no Ac. do STJ n.º 3/2014 “O primeiro passo no
sentido da desburocratização dos serviços judiciais através do uso das
novas tecnologias foi dado pelo Decreto-Lei n.º 28/92, de 27 de
Fevereiro. Nesse diploma avulso, introduziu-se a possibilidade do uso
da telecópia para a transmissão de mensagens entre os serviços
judiciais e entre estes e os serviços públicos e facultou-se «às partes e
aos intervenientes em processos judiciais de qualquer natureza o uso de
telecópia para a prática de actos judiciais, evitando os custos e a
demoras resultantes de deslocações às secretarias judiciais», conforme
se fez constar do preâmbulo do diploma. O uso de telecópia em
processo penal era possível sempre que se harmonizasse com os
princípios do processo penal e compatível com o segredo de justiça.
Até então a entrega das peças processuais na secretaria judicial era a
única forma prevista no Código de Processo Civil para a prática de
actos processuais escritos, exigindo-se dos interessados que
subscrevessem requerimentos e não fossem conhecidos no tribunal a
exibição do bilhete de identidade ou o reconhecimento da assinatura
por notário”.
Mais tarde, o artigo 150º do CPC foi alterado pelo DL n.º 183/2000, de
10.08; diploma que entrou em vigor em 1-1-2001 (art. 8º), data em que
também entrou em vigor a alteração ao CPP introduzida pelo DL n.º
320-C/2000, de 15.12 (art. 4º).
Procurando combater a morosidade processual, consta do preâmbulo do
DL n.º 183/2000 “Relativamente à prática dos actos processuais pelas
partes, prevê-se a apresentação dos articulados e alegações ou contra-
alegações escritas em suporte digital, acompanhados de um exemplar
em suporte de papel, que valerá como cópia de segurança e certificação
conta adulterações introduzidas no texto digitalizado e dos documentos
que não esteja digitalizados.
As partes poderão ainda praticar os referidos actos através de telecópia
ou por correio electrónico, valendo como data da prática do mesmo a
da sua expedição, que será possível mesmo fora do horário de
funcionamento dos tribunais, prevendo-se no entanto a obrigatoriedade
de envio, no prazo de cinco dias, do suporte digital ou da cópia de
segurança, respectivamente, acompanhados dos documentos que não
tenham sido enviados.”
Mas, uma nova redacção veio a ser dada ao artigo 150º do CPC, agora
pelo DL n.º 324/2003, de 27.12, com entrada em vigor em 1-1-2004
(arts. 5º e 16º).
Consta do preâmbulo deste diploma: “simultaneamente, e à margem da
revisão do Código das Custas Judiciais, clarifica-se o regime do envio e
do suporte das peças processuais, previsto no artigo 150º do Código de
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Processo Civil, cuja aplicação e utilidade práticas têm vindo a suscitar


inúmeras dúvidas, designadamente no que respeita à utilização do
suporte digital e do correio electrónico, instituindo-se um normativo
susceptível de acarretar vantagens e benefícios para todos os
operadores judiciários. Assim, numa clara e efectiva aposta nas novas
tecnologias, fomenta-se, mediante a consagração de uma redução da
taxa de justiça devida e sem que sejam criados quaisquer factores de
exclusão, a utilização do correio electrónico. Ao mesmo tempo,
confere-se ao suporte digital uma relevância prática adequada à
utilidade que o mesmo efectivamente comporta, eliminando-se factores
geradores de desperdício de meios materiais e humanos.”
Assim,
O artigo 150º, com a epígrafe “Apresentação a juízo dos actos
processuais” passou a ter a seguinte redacção:
«1– Os actos processuais que devam ser praticados por escrito pelas
partes são apresentados a juízo por uma das seguintes formas:
a) Entrega na secretaria judicial, valendo como data da prática do
acto processual a da respectiva entrega;
b) Remessa pelo correio, sob registo, valendo como data da prática do
acto processual a da efectivação do respectivo registo postal;
c) Envio através de telecópia, valendo como data da prática do acto
processual a da expedição;
d) Envio através de correio electrónico, com aposição da assinatura
electrónica avançada, valendo como data da prática do acto
processual a da expedição, devidamente certificada;
e) Envio através de outro meio de transmissão electrónica de dados.
2 – Os termos a que deve obedecer o envio através dos meios previstos
nas alíneas d) e e) do número anterior são definidos por portaria do
Ministro da Justiça.
3 – A parte que proceda à apresentação de acto processual através dos
meios previstos nas alíneas d) e e) do n.º 1 remete a tribunal, no prazo
de cinco dias, todos os documentos que devam acompanhar a peça
processual.
4 – Tratando-se da apresentação de petição inicial, o prazo referido no
número anterior conta-se a partir da data da respectiva distribuição.
5 – (Revogado.)
6 – (Revogado.)»
Na sequência do estabelecido no n.º 2 do artigo 150º foi publicada a
Portaria n.º 337-A/2004, de 31.03, regulando a forma de apresentação a
juízo dos actos processuais enviados através de correio electrónico, nos
termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 150.º do CPC, assim como as
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notificações efectuadas pela secretaria aos mandatários das partes, ao


abrigo do n.º 2 do artigo 254º e a forma de apresentação a juízo do
ficheiro informático a que alude o n.º 6 do artigo 152º, ambos do CPC.
Esta Portaria foi revogada pelo artigo 11.º da Portaria n.º 642/2004, de
16.06.
A Portaria n.º 642/2004, de 16 de Junho, dando execução ao disposto
no n.º 2 do artigo 150.º do CPC, clarificou alguns dos aspectos técnicos
a que deve obedecer o envio por correio electrónico, por forma a
assegurar a máxima segurança, definido um conjunto de regras
uniformes que garantam a eficácia das comunicações.
Esta Portaria veio a ser revogada pelo artigo 27º, al. a), da Portaria n.º
114/2008, de 6.02., relativamente às acções indicadas no artigo 2º (da
Portaria n.º 642/2004).
Portanto,
A Portaria n.º 114/2008, que foi aprovada no âmbito do projecto
«Desmaterialização, eliminação e simplificação de actos e processos na
justiça», regula a forma de apresentar a juízo, por tramitação
electrónica de dados, os actos processuais e documentos pelas partes,
através do sistema informático CITIUS, cabendo no âmbito da
tramitação electrónica, nos termos do artigo 2º, as acções declarativas
cíveis, providências cautelares e notificações judiciais avulsas, com
excepção dos pedidos de indemnização cível ou dos processos de
execução de natureza cível deduzidos no âmbito de um processo penal,
e as acções executivas cíveis, com excepção da apresentação do
requerimento executivo, a efectuar nos termos previstos no CPC e,
também, os processos da competência dos tribunais ou juízos de
execução das penas.
Ou seja, para o processo penal, nada tendo sido determinado,
continuaria em vigor a Portaria n.º 642/2004 e o artigo 150º do CPC, na
redacção do DL n.º 324/2003.
Entretanto, o Novo Código de Processo Civil, que entrou em vigor em
1-9-2013, foi aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26.06, tendo sido
revogados (pelo art. 4º) o DL n.º 44129, de 28-12-1961, que procedeu à
aprovação do CPC e diplomas conexos.
E, nomeadamente, quanto à tramitação electrónica de processos, que
até então tinha sido regulamentada pela Portaria n.º 114/2008, foi esta
Portaria revogada (art. 37º) pela Portaria n.º 280/2013, de 26.08.
Como refere o Ac. do STJ, de 24-1-2018, proc. n.º
5007/14.8TDLSB.L1.S1, relatado pelo Cons. Raúl Borges e disponível
in www.dgsi.pt, que temos vindo a seguir de perto, quanto à descrita
evolução legislativa, surgiu então uma divergência jurisprudencial
quanto ao âmbito da revogação da Portaria n.º 642/2004, de 16 de
Junho, operada pela mencionada Portaria n.º 114/2008, de 6 de
Fevereiro.
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Divergência jurisprudencial, que o Pleno das Secções Criminais do


Supremo Tribunal de Justiça, pelo Acórdão n.º 3/2014, de 6-3-2014
(DR, 1ª Série, de 15-4-2014) uniformizou, no sentido de que: «Em
processo penal, é admissível a remessa a juízo de peças processuais
através de correio electrónico, nos termos do disposto no artigo 150.º,
n.º 1, alínea d), e n.º 2, do Código de Processo Civil de 1961, na
redacção do Decreto-Lei nº 324/2003, de 27.12, e na Portaria n.º
642/2004, de 16.06, aplicáveis conforme o disposto no artigo 4.º do
Código de Processo Penal.».
Sublinha, ainda, o citado Acórdão do STJ, de 24-1-2018, “Entendemos
que a jurisprudência fixada no Acórdão n.º 3/2014, de 6-03-2014,
mantém plena actualidade, na medida em que a Portaria n.º 280/2013,
de 26 de Agosto, continua a ter um âmbito de aplicação restrito às
acções referidas no seu artigo 2.º, ficando desta forma excluídos de tal
regulamentação, uma vez mais, os processos de natureza penal,
mantendo-se assim plenamente válidos os fundamentos invocados para
fundamentar o referido acórdão de fixação de jurisprudência.”
Retornando ao caso vertente,
Ficou exarado na Acta de Audiência de Discussão e Julgamento a
Informação de que, tendo o Ilustre Advogado da lesada alertado o Sr.
Oficial de Justiça de que não havia chamado uma testemunha que
arrolara no pedido de indemnização civil foi informado de que o PIC
não existia nos autos.
Após o que, o Sr. Advogado exibiu o documento comprovativo da
remessa via e-mail do PIC, tendo requerido a junção aos autos do
pedido de indemnização civil.
Foi então proferido o despacho recorrido que “Indeferiu liminarmente o
PIC ora apresentado, a tenta a sua extemporaneidade – art. 77º do
CPP e, condenou a lesada nas custas do Incidente”.
Portanto, ficou a demandante, ora recorrente, impossibilitada de
inquirir, em audiência de julgamento, uma testemunha que arrolara no
pedido de indemnização civil que enviou por correio electrónico, o qual
não foi junto aos autos; sendo certo que, de acordo com os documentos
5 e 6 juntos com o recurso interposto, a fls. 154v a 157v, pode verificar-
se que efectivamente o pedido de indemnização civil foi enviado por
correio electrónico para os Serviços do Ministério Público (Fundão).
Ora, nos termos do artigo 10º da Portaria n.º 642/2004, de 16 de Junho,
à apresentação de peças processuais por correio electrónico é aplicável
o regime estabelecido para o envio através de telecópia. Regime que se
encontra regulado no DL n.º 28/92, de 27 de Fev., o qual estabelece no
seu artigo 4º, a obrigatoriedade de serem remetidas, no prazo de 10 dias
([1]), ou entregues na secretaria, os originais das peças processuais.
Não está demonstrado nos autos, nem o recorrente o invoca, que
cumpriu o disposto no citado art. 4º, juntando aos autos os originais do

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PIC.
Porém, não constando o PIC nos autos de acordo com a informação do
Sr. Oficial de Justiça, desconhece-se se o respectivo e-mail foi
efectivamente recebido.
Mas sabe-se que, tendo o PIC sido enviado, tempestivamente, por
correio electrónico para os Serviços do MP do Fundão, o facto de não
se encontrar junto aos autos não pode ser imputável à
lesada/demandante.
Deste modo, a fim de ficar comprovado nos autos o efectivo
recebimento do PIC, deve a lesada/demandante B. ser notificada para,
em prazo a designar, vir juntar aos autos os originais (em suporte de
papel) do PIC que formulou.
Após o que, deverá ser reaberta a audiência de julgamento para
inquirição das testemunhas arroladas, proferindo-se nova sentença em
conformidade.
Fica, assim, prejudicado o recurso interposto pelo arguido.

*****

III- DECISÃO
Face ao exposto, acordam os juízes da secção criminal deste Tribunal
da Relação em:
- Revogar o despacho proferido em sede de audiência de julgamento
(sessão de 30-5-2019 – fls. 105v), que indeferiu liminarmente o PIC
apresentado e, condenou a lesada nas custas do incidente, devendo a
lesada/demandante B. ser notificada para, em prazo a designar, vir
juntar aos autos os originais (em suporte de papel) do PIC que
formulou.
Após o que, deverá ser reaberta a audiência de julgamento para
inquirição das testemunhas arroladas, proferindo-se nova sentença em
conformidade.
Sem tributação.

*****

Coimbra, 13 de Maio de 2020


Texto processado em computador e integralmente revisto pela relatora
e assinado electronicamente - artigo 94º, n.º 2 do CPP
Elisa Sales (relatora)
Jorge Jacob (adjunto)

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[1] - O prazo de 7 dias previsto no n.º 3 do art. 4º, passou para 10 dias,
nos termos do disposto no art. 6º n.º 1, al. b), do DL n.º 329-A/95, de
12 Dez..

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