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ANÁLISE REFLEXIVA SOBRE O ENSINO DA GRAMÁTICA

CONCEIÇÃO, Adriana Silva da


adri.star25@yahoo.com.br
SANTOS, Evanildes da Silva
evaaju-santos@hotmail.com
SANTOS, Givanildo Paes
evaaju-santos@hotmail.com
MEIRELLES, Claudia de Souza Cardoso (Orientadora).
meirelles.claudia@oi.com.br
Mestranda em Ciências Sociais – UFRN
Pós-Graduada em Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa – FACINTER/PR
Graduada em Letras – UCSAL/BA

RESUMO

O objetivo desta pesquisa é fazer uma análise crítica sobre o ensino da Gramática a

partir da proposta dos PCN’s dialogando com vários autores que propõem uma metodologia

intertextual. Sabe-se que ao longo dos anos tem-se deparado, no ensino da Língua Portuguesa

com a dificuldade dos alunos em aprender o ensino da Gramática, devido ao excesso de

normas dissociadas da sua realidade sem nenhum vínculo com a leitura e a produção de

textos. Muitos estudiosos já tentaram responder à questão: como fazer da Gramática um

ensino prazeroso? Pretende-se no presente estudo dar uma abordagem histórica do ensino da

Gramática em três subdivisões: metodologia do ensino da Gramática; a norma padrão e o

preconceito lingüístico e as dificuldades no aprendizado da língua portuguesa. Foi de grande

importância perceber que é possível trabalhar a Gramática de forma contextualizada sem fugir

à meta que é o aprendizado da língua materna .

Palavras-chave: gramática, contextualização, língua materna.


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INTRODUÇÃO

A realização do presente artigo tem como proposta analisar as práticas de ensino

tradicional de gramática relacionando-as com as práticas inovadoras a fim de visualizar qual o

método mais adequado no contexto atual, devido à percepção de deficiências dos alunos em

relação ao conteúdo estudado. Assim esta pesquisa visa perceber a real necessidade e

importância da valorização da gramática como parte de um processo evolutivo para que o

conhecimento possa fluir de forma mais produtiva.

Mesmo fazendo parte da trajetória escolar do aluno, a gramática acaba não sendo

entendida como deveria, por isso é vista de forma polêmica, gira em torno de como o

conteúdo é passado em sala de aula, realidade vivida pelos alunos do ensino fundamental e

médio.

É importante salientar que o método tradicional não é totalmente falho, pois a

transmissão das regras é necessária para o aprendizado, mas apenas seria interessante adequá-

lo a realidade do aluno, inserindo o assunto no cotidiano, de forma que ele desenvolva o

raciocínio, com perspectivas para que os mesmos exponham seus pontos de vista, como

também suas divergências e não condicioná-los simplesmente a memorizar os textos, mas

produzir e difundir idéias. De acordo com essas discussões sobre o ensino de gramática, fica

notória a necessidade de trabalhar de forma mais contextualizada, por isso cabe aos

professores detectarem o nível de aprendizagem dos alunos em decorrência da metodologia

aplicada, para que os mesmos não venham sentir tantas dificuldades ao uso das regras

gramaticais em seu dia-a-dia, sabendo-as usar de forma clara e objetiva de acordo com o

contexto inserido.

Na gramática normativa existem regras de uma língua que posicionam as suas

prescrições como a única “forma correta” de realização, as quais categorizam outras formas
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possíveis como “errada”. Com isso o ensino tradicional da gramática normativa nas escolas

origina um preconceito contra as variedades não-padrão e a gramática descritiva.

A norma padrão virou “termômetro” medidor de status. Porque aqueles que não a

dominam certamente não correspondem a categoria dos cidadãos bem vistos detentor do ter e

do poder, classe distinta que se acha no direito de controlar e manobrar as pessoas falantes do

português que se diz “errado”.

Para tanto as gramáticas escolares e livros didáticos continuam insistindo em

preservar formas lingüísticas, o que só contribui para aumentar o sentimento de baixa estima

na aprendizagem dos alunos que acreditam falar mal o português e que o mesmo é uma das

línguas mais difíceis do mundo.

Devido a essa necessidade de mudança buscam-se formas de elaboração do conteúdo

programático de tal disciplina nas escolas. A mudança de conduta ao ensino de língua

portuguesa, que propõe uma discussão sobre o ensino da gramática, depende também da

consciência de professores decisivos no processo de elaboração de novas práticas.

Sendo assim pretende-se contribuir para a reflexão sobre o estudo da gramática a

partir da contribuição trazida pelos PCNs, avaliando a metodologia do ensino da língua

portuguesa, que nem sempre é adequada. Trata-se também da norma padrão e o preconceito à

variedade lingüística no Brasil, ressaltando as dificuldades que são mais comuns no

aprendizado da língua materna.

METODOLOGIA DO ENSINO DA GRAMÁTICA

A gramática tem sido ao longo dos séculos, aprofundada na sua metodologia de

ensino, levando em conta o ensino-aprendizagem da mesma e a história da inserção de novos

conteúdos relacionados à gramática e provocadores de mudança.


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A principal dificuldade em relação ao método de ensino de gramática refere-se à

descontextualização, pois não se buscou estudar a língua materna, principalmente no período

que vai do século XVI ao século XIX, numa relação de interdisciplinaridade, mas

isoladamente. Fator decisivo para a compreensão da Língua no século XX, a

interdisciplinaridade traz à tona conceitos de relação ou interrelação entre os conceitos

básicos da Língua e o contexto a que estão inseridos no processo ensino-aprendizagem.

A partir da compreensão da Lingüística como ciência, percebemos a sua forte

influência em outras ciências como a Psicologia, a Sociologia e a Ciência Política. Por isso é

importante também ressaltar que o método interdisciplinar requer do pesquisador um amplo

conhecimento dos diversos campos científicos para “favorecer o restabelecimento dos fatos

mais importantes do nosso passado lingüístico (...)” (KOERNER, 1996, p.47)

O ensino da gramática normativa no século XVIII, esteve sempre associado à

manutenção do poder político e dominador. Sendo assim, desde os inícios da nossa

colonização era Portugal quem ditava as normas do saber. Por isso o “o discurso gramatical é

tratado sob o prisma político, à medida que o gramático, enunciador social, aparece como

porta-voz do governo, como parte do aparelho ideológico do estado” (ALTHUSSER, 1985).

O ensino da gramática, neste período, assume também um discurso científico, à proporção

que o gramático assume a emissão de conceitos, narrativa da verdade, para a construção do

saber que é a língua portuguesa; ou como um discurso pedagógico, à medida que o gramático

é controlador da ação do educando, modalizado pelo saber fazer; ou como um discurso

jurídico, à proporção que ele como legislador, estabelece normas e regras a serem seguidas

pelos leitores, criando permissões e proibições. (NEUSA BARBOSA, 2004, p.58)

Em contraposição ao ensino da gramática como transmissão de normas temos

também uma metodologia inovadora a partir dos Parâmetros Curriculares Nacionais que nos

conscientiza de que contextualizar a língua é o grande desafio do mundo atual, pois a


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normatização pura e simplesmente não responde mais aos anseios de estudantes e educadores

no mundo globalizado. Sendo assim, o método da proposta para o ensino da gramática que

surge a partir dos PCNs, acredita-se ser ideal e só faz sentido a partir do momento em que

nossas escolas assumam e propiciem atividades de ensino/aprendizagem, levando os alunos a

se prepararem para uma vida em sociedade.

A gramática não poder ser estudada isoladamente, mas como o conjunto de

conhecimentos lingüísticos que um usuário da língua tem internalizados para uso efetivo em

situações concretas de interação comunicativa. Assim, quanto mais recursos, mecanismos,

estratégias da língua o usuário dominar, melhor desempenho lingüístico terá. (TRAVAGLIA,

2007, p.15)

Os Parâmetros Curriculares Nacionais são importantes documentos, que tem como

objetivo apoiar discussões e desenvolver um projeto educativo nas escolas sobre uma reflexão

e prática pedagógica. Nele fica evidente que a questão do ensino da língua portuguesa em

nosso país está em foco a bastante tempo, porém, entre interpretações adversas, encontram-se

as demasiadas repetições, num repasse de conteúdo, bem como os conceitos vistos sob a ótica

dos lingüísticas. Por isso ele já está confirmado e reconhecido como integrante de uma

cultura, articulando a vida social dos alunos ao sistema da língua com sua necessidade de

aprendizagem.

Ao fugir da realidade do aluno, a escola passa a se utilizar com avidez em um

enfoque gramatical e descarta o enfoque interativo-textual, o segundo proposto pelos que

almejam restaurar no espaço da sala de aula o processo de interlocução ativa para que haja

uma nova percepção das formas de ensino. Por isso que é preciso formar estudantes visando

prepará-los para as diversidades, numa concepção clara do valor social e interativo da

linguagem, em oposição ao ensino tradicional, vem sendo o grande desafio. O estudo

gramatical vira estratégia para se compreender, interpretar e produzir textos. É preciso


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entender que a aula de Língua Portuguesa não constitui um universo somente: ela deve ser

observada, em sua amplitude que é a Gramática, a Literatura, a Leitura, o texto.

O que se observa é a presença esmagante da gramática que, embora importantíssima,

diminui em grau de prestígio as demais unidades básicas. Assim, os programas dedicados à

área de Língua Portuguesa continuam reproduzindo as regras gramaticais e atrasando a

questão discutida, como afirma Neves:

O ensino de gramática em nossas escolas tem sido primordialmente prescrito, apegando-se


as regras de gramática normativa que, como vemos, são estabelecidos de acordo com a
tradição literária clássica, da qual é tirada a maioria dos exemplos. Tais regras e exemplos
são repetidos anos a fio como formas corretas e boas a serem imitadas na expressão do
pensamento. (NEVES, 1995, p.11)

O uso da gramática no ensino de Língua Portuguesa nas escolas em geral, vem

gerando acirradas polêmicas ao longo dos anos.

Refletindo sobre o ensino posto em prática pelas escolas, seja pública ou particular,

verifica-se uma prática lastimável que é preencher o espaço do aluno com algo inútil, confuso

e incompleto. Isso é o resultado de um ensino centrado na gramática tradicional-metódica,

arcaica, cheia de regras que muitas vezes se contradizem com a prática empregada no seu uso

diário e sem nenhum significado ou aplicabilidade no cotidiano dos alunos que, por sua vez,

quase sempre não conseguem aplicar a teoria gramatical à prática textual.

Com o passar dos séculos, a gramática tradicional mudou de roupagem, mas o

conteúdo continuou o mesmo. Percebe-se que a mesma tem sido privilegiada e enfocada

sempre como uma obra acabada, sem considerações para que possíveis pontos de vista sejam

abordados. Entretanto, há obrigatoriedade da disciplina e o programa preestabelecido a ser

cumprido, cuja proposta está desconectada com a aplicação, ou seja, livros didáticos

preparados para serem consumidos sem que se tenha uma visão clara e crítica do que se

aplica.
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Contudo, ao observarmos as dificuldades das crianças em aprender gramática desde

o ensino fundamental é comprovado que chegam ao ensino médio sem o domínio da norma

culta da Língua Portuguesa.

Assim afirma Possenti:

Em resumo poderíamos enunciar uma espécie de lei, que seria: não se aprende por
exercícios, mas por práticas significativas. Observamos como esta afirmação fica quase
óbvia se pensarmos em como uma criança aprende a falar com os adultos com quem
convive e com seus colegas de brinquedo e de interação em geral. O domínio de uma
língua, repito, é o resultado de práticas efetivas, significativas, contextualizadas.
(POSSENTI, 1998, p.47)

Devido à falta de domínio, da expressão oral em momentos formais, as dificuldades

de leitura, escrita e interpretação de textos é notório, no entanto ressaltamos que o domínio da

norma culta da língua portuguesa se faz necessário, pois trata-se de uma ferramenta a ser

utilizada nos contextos de produção de textos formais, já que é do nosso conhecimento que

grande parte dos alunos sentem dificuldades em aplicar a norma padrão nos textos que

produzem.

O estudo de gramática deve estar ligado ao funcionamento da língua para que o

aluno venha desenvolver suas habilidades lingüísticas, possibilitando ao mesmo refletir

conscientemente sobre o uso da língua que este já domina, mesmo sem fazer o uso das regras

gramaticais existentes.

Diante dos fatos abordados, qual seria o método de ensino mais adequado a ser

trabalhado nas escolas?

Trabalhar de forma contextualizada, ou seja, trazer o assunto para o cotidiano dos

alunos, colocando o objeto de estudo dentro de um universo em que ele faça sentido. Envolver

o aluno no ensino da gramática, e associá-lo em situações concretas. Nessa perspectiva, torna-

se imprescindível a leitura, discussão e crítica de textos que se referem aos conteúdos

específicos de português, bem como textos sobre teoria do conhecimento.


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Contudo a escola, por ser um regulador social e uma fonte obrigatória de meios e

recursos para ascensão social de seus alunos, tem a obrigação de manter o cuidado com a

adequação social do produto lingüístico dos mesmos, pois ela tem como objetivo garantir uma

nova metodologia, começando a incentivar aos professores de Língua Portuguesa para que

eles possam ensinar de modo contextualizado, fazendo com que os alunos sintam-se

entusiasmados pelo ensino da Gramática.

Por fim, a solução não seria abolir a gramática da sala de aula, ela é fundamental,

pois muitos professores acreditam que ela possui suas correlações na vida cotidiana do aluno,

uma vez que estando seguro de seu funcionamento, bem como o uso das regras e exceções

regidas pela gramática, eles poderão aplicá-las a sua prática textual.

Conforme acreditam esses professores o “saber escrever” está diretamente ligado à

prática da leitura e de escrita que devem ser fundamentada pelos conceitos gramaticais,

portanto, cabe ao professor encontrar métodos mais dinâmicos criativos e eficiente de passar o

conteúdo, para que assim o aluno venha obter um aprendizado de forma satisfatória.

NORMA PADRÃO E O PRECONCEITO LINGÜÍSTICO

No ensino do português brasileiro existe um mito que há muito tempo vem causando

um sério estrago na nossa educação, é o mito da unidade lingüística, pois não se fala uma

língua, já que existem mais de duzentas línguas ainda faladas em diversos pontos do Brasil

pelos sobreviventes das antigas nações indígenas. Além disso, muitas comunidades de

imigrantes mantêm viva a língua de seus ancestrais. Nesse sentido, “não existe nenhuma

língua que seja uma só, isso quer dizer que aquilo que a gente chama por comodidade, de

português não é um bloco homogêneo, mas sim um conjunto de “linguagens” aparentadas


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entre si, mas com algumas diferenças que são chamadas variedades” (BAGNO, 2005, p.18-

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Essas e outras diferenças existem entre o português falado, por exemplo as pessoas

que moram no Centro-Sul, o modo de falar é diferente do carioca e o falar do paulistano.

Além das variedades geográficas, temos outros tipos de variedades como de gênero, sócio-

econômicas, etárias, de nível de instrução, urbanos, rurais e outras. A língua modifica quando

é falada por tipo de pessoas diferentes, cada uma tem a sua língua própria e exclusiva, por isso

não pode deixar que ela se separe da comunidade a qual está inserida.

Essas variedades do português falado serviram de base para a elaboração de uma

norma-padrão, ou seja, uma norma para que o modo ideal da língua seja usado pelas

autoridades, pessoas cultas, escritores, jornalistas e aqueles que aderem ao ensino do

português na escola. Sendo assim a norma padrão teve seu itinerário, conforme afirma Marcos

Bagno:

Tudo isso fez com que o português formal empregado pelas classes sociais privilegiadas de algumas
cidades da região Sudeste, começasse a ser considerado o modelo a ser imediato, a norma a ser
seguida, o português-padrão do Brasil. E é por isso que as variedades de outras regiões, como a
nordestina, por exemplo, são consideradas “engraçadas”, pois o modo de falar do caipira é diferente,
para as pessoas do Sul, os quais consideram o falar nordestino errado que é um preconceito. (2005,
p.21)

O ensino da língua portuguesa no Brasil enfrenta alguns obstáculos que são frutos do

preconceito em relação a fala, características das várias regiões. Existe uma riqueza intrínseca

no falar do brasileiro, ou seja, de norte a sul do país temos falares ricos e cheio de variedades

que enriquecem o português brasileiro.

Por outro lado o ensino da Língua se deparou sempre com uma questão dialética

quanto ao seu ensino: a norma culta ou padrão que se estabelece nas escolas como modelo e a

linguagem coloquial que é fruto da experiência dos falantes.


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A norma padrão intensificou, ao longo dos anos, um aprendizado desvinculado do

seu contexto, no qual a gramática normativa tornou-se o grande referencial teórico. Portanto o

conhecimento da língua esteve sempre estritamente ligado ao domínio da norma gramatical.

No entanto, o ensino da gramática deverá questionar sempre “O que se tem como meta e

objetivos de ensino da língua materna? O que fazer em sala de aula face às variedades

lingüísticas? O ensino da gramática pode ser feito sempre como algo desvinculado do ensino

de produção e compreensão do texto?” (TRAVAGLIA, 2007, p.43)

Ao se estabelecer a norma padrão como inquestionável e única, depara-se com um

grande equívoco: utilizar a língua para o seu bom uso no sentido do domínio escrito e falado.

Conforme nos lembra Travaglia “Os critérios de bom uso no sentido da adequação à situação

de interação comunicativa não são muito levados em conta. Tais normas são baseadas no uso

consagrado pelos bons escritores, e portanto ignoram as características próprias da língua

oral”. (TRAVAGLIA, 2003, p.226)

Vale ressaltar também que a norma padrão da língua estabelece princípios a partir do

português falado em Portugal e segue as regras lingüísticas vindas de lá. Daí ter-se um grande

preconceito arraigado na mentalidade do brasileiro de que só em Portugal se fala

verdadeiramente português. Continua-se prisioneiros do imperialismo lingüístico como se

fôra no passado na relação colônia-metrópole e quem dita as normas é a metrópole

considerada dona da língua. Sendo assim constata-se que: “As regras gramaticais

consideradas ‘certas’ são aquelas usadas por lá que servem para a língua falada lá, que

retratam bem o funcionamento da língua que os portugueses falam”. (BAGNO, 1999, p.26-

27)

Ao se estabelecer a obrigatoriedade do ensino da gramática normativa, detecta-se um

preconceito não só lingüístico, mas também social. Ele é fruto da não valorização do falar não

padrão que está presente principalmente nas camadas mais pobres da população. São pessoas
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que não tiveram acesso à escolarização e naturalmente, expressam-se e comunicam-se mesmo

sendo tratadas com desdém, tornando-se símbolo de linguagem feia ou errada.

Ocorre na verdade uma separação de classes denominada quanto ao uso de sua

língua, como português culto, falado por grupos sociais em melhor posição sócio-econômica e

o português popular usado pelos grupos sociais em situação oposta. Estas qualificações

carregam consigo uma bagagem preconceituosa, tendo em vista que não existe grupo humano

sem cultura. Encadeia-se, pois, uma imensa escola separatista que enquadra os falantes cultos

como “superiores”, “melhores” e “certos” e os populares como “inferiores”, “ignorantes” e

“incultos”. Vale ressaltar que tudo gera em torno do preconceito lingüístico. Não se pode

afirmar que um falante do português popular não sabe português, fala sem gramática, fala

errado ou mesmo não sabe falar, pois falar é da natureza humana e a variante popular é tão

gramática quanto qualquer outra variedade lingüística.

O estudo da língua portuguesa sempre esteve baseada no ensino das regras

gramaticais, pois a mesma é vista como instrumento fundamental para o domínio padrão culto

da língua. Com isso fica pressuposto que um indivíduo que fale e escreva bem sabe gramática

podendo assim ascender-se socialmente. Já aquele que não domina as regras gramaticais

certamente não será visto como um cidadão detentor do conhecimento. “É preciso saber

gramática para falar e escrever bem” (BAGNO, 1999, p.62)

A língua portuguesa apresenta muitas variações, porém essas variações foram

padronizadas e orientadas por uma gramática que nos ajuda quanto ao uso correto das

mesmas, é tanto que é considerada como uma unidade. Mas nem sempre o uso da gramática

normativa condiz com a realidade do aluno, pois não é necessário saber todas as regras da

gramática para se comunicar com as outras pessoas.

Os alunos quando chegam à escola, já chegam falando, mesmo porque a escola não

ensina a língua materna a ninguém. A escola recebe alunos que já falam, então cabe a mesma
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respeitar o modo de falar das pessoas e não discriminar, porque nenhuma língua é falada do

mesmo jeito em todos os lugares, assim como, nem todas as pessoas falam a própria língua de

maneira idêntica e os alunos que falam dialetos desvalorizados são tão capazes quanto os que

falam dialetos valorizados.

É claro que quando utiliza-se a escrita, deve-se escrever de acordo com a ortografia

oficial, ou seja, usando as regras da gramática normativa. Não se pode justificar o ensino da

gramática como a única fonte de conhecimento para que os alunos venham a escrever ler ou

falar melhor, porque isso não condiz com a realidade dos mesmos nem sempre quem sabe

escrever bem tem o domínio das regras gramaticais. Sendo uma das medidas para que esse

objetivo seja atingido é escrever e ler constantemente para que seus conhecimentos venham

ser aplicados e desenvolvidos de uma forma clara e objetiva.

Então para estarem presentes sistematicamente nas atividades de língua portuguesa,

as escolas têm o papel fundamental em apresentar estudos de formação lingüística que

desenvolvam nos alunos a competência discursiva, dessa variação que é própria da história e

da cultura humana. Contudo, muitos lingüístas defendem uma reformulação da norma-padrão

tradicional, para que já comece a acolher como igualmente válidas e corretas as formas

inovadoras, surgidas no português brasileiro, como resultado dos inevitáveis processos de

mudança que ocorrem em toda e qualquer língua viva do mundo. Trata-se portanto de

reconhecer que a norma-padrão, como todas as demais instituições jurídicas e culturais de um

povo, envelhece e precisa ser renovada e reconstituída, com base em critérios científicos e

democráticos e, portanto, menos autoritários que os tradicionais. Sendo assim o preconceito

lingüístico irá diminuir cada vez mais, fazendo com que as variedades das pessoas populares

sejam valorizadas.
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AS DIFICULDADES NO APRENDIZADO DA LÍNGUA PORTUGUESA

Ao analisar as dificuldades no aprendizado da língua portuguesa, deve-se considerar

a intrínseca relação existente entre a língua materna, enquanto patrimônio do povo português,

que por sua vez, é fruto da adequação do latim vulgar às línguas pré-existentes dos povos

dominados pelo Império Romano e, por outro lado o português brasileiro que é cheio de

regionalismos fruto das influências da colonização e da imigração estrangeira.

Quando os europeus analisaram as línguas indígenas, descobriram que línguas

consideradas primitivas podem ser classificadas ao lado de línguas ditas civilizadas. Todas as

línguas são estruturas de igual complexidade, isto é, não há línguas simples e línguas

complexas, primitivas e derivadas, o que há são línguas diferentes. Por isso todo o indivíduo

que convive em um determinado meio social falante de uma língua, sabe falar essa língua, ou

seja, tem a capacidade de se comunicar com os outros indivíduos de forma clara e objetiva,

temos como exemplo, as crianças com idade de três anos sabe empregar com naturalidade as

regras básicas de sua língua sem nunca ter ido à escola.

Para que haja comunicação e compreensão do que as pessoas dizem não basta falar a

mesma língua, precisam ter em comum um grande número de informações, pertencerem ao

mesmo meio cultural e possuírem crenças em comum. Sem isso a língua deixa de funcionar

enquanto instrumento de comunicação. A escola não ensina língua materna a nenhum aluno,

ela ensina alunos que já sabem falar, a aprender a escrita.

O aprendizado da língua portuguesa depara-se diante de um grande paradoxo. É

possível libertar-se da rigidez da gramática enquanto herança do povo português? Como

trazer para os nossos alunos as várias experiências da inculturação da Língua?

O grande desafio emergente para os letrados e educadores é traduzir para o ensino as

possibilidades de conhecimento da língua num mundo em mudança. Pensar na Gramática


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Normativa a partir tão somente da conservação da língua é não perceber as dificuldades

inerentes à própria origem do aluno que tem um falar diferente daquele pré-estabelecido.

Somente com o olhar crítico é possível perceber que nosso povo tem uma língua própria.

Diante da realidade pluridimensional do nosso território as opiniões se divergem

quanto ao método de ensino da língua, prevalecendo, porém o modelo conservador e

tradicional. As dificuldades, em geral, dizem respeito a uma incapacidade de avaliar a língua

em uso nas suas diversas dimensões.

A falta de percepção da organização funcional da língua se reflete, por assuntos

expostos na gramática, assim como as infindas regras, as tantas classificações, as inumeráveis

exceções. Com isso inúmeros estudantes estudam entre críticas a pertinência de se manter

regras obsoletas. Conforme Neves:

Merece registro o fato de os professores em geral, não considerarem problemática o estudo


das classes de palavras. O que se notou foi que eles ‘resolveram’ a questão do
reconhecimento de classes de palavras simplesmente não oferecendo muitas ocasiões de
erros ou dúvidas os alunos na revolução dos exercícios propostos, os exercícios de
descoberta de pertencimento a classes são tão dirigidos e de tal obviedade que dificilmente
os alunos (e os próprios professores) se sentem com problemas de resolução. (NEVES,
2002, p.44)

Considera-se em geral o português como uma língua difícil o que causa certo pavor

nos alunos de todas as idades. Percebe-se que desde cedo, o que se aprende em relação a

língua materna são normas gramaticais e conceitos teóricos que não têm aplicabilidade na

vida prática dos alunos falantes das mais variadas regiões brasileiras.

A grande dificuldade que se apresenta constantemente a partir do ensino médio é que

os alunos e professores preocupam-se de forma exacerbada pelo exame do vestibular e a

gramática torna-se dessa maneira um conjunto de regras que servem como dicas para que o

aluno não venha “tropeçar” na hora da prova de redação. Assim a gramática transforma-se

num tabu insuperável, como vê-se:


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Se tantas pessoas inteligentes e cultas continuam achando que ‘não sabem’ português ou
que ‘português é muito difícil’ é porque esta disciplina fascinante foi transformada numa
‘ciência esotérica’, numa doutrina cabalística que somente alguns ‘iluminados’ conseguem
dominar completamente. (BAGNO, 1999, p.38)

O modelo padrão do ensino da gramática é uma herança arraigada em nossas escolas

que levam bons professores a aplicação rígida da regra gramatical como um pré-requisito para

o aluno escrever bem e se expressar cada vez melhor. Porém sabe-se que esta falta de

criatividade na proposta metodológica da língua materna tem proporcionado uma ojeriza ao

conceito de gramática e criado em âmbito nacional uma mentalidade acrítica do uso da

mesma. Sente-se a necessidade de uma nova reflexão sobre a gramática conforme Travaglia:

“É preciso entender que dominar uma língua não significa apenas incorporar um conjunto de

regras de estruturação de enunciados e aprender um conjunto de máximas de princípios de

como construir um texto oral”. (TRAVAGLIA, 2003, p.107)

A linguagem gramatical apreendida na academia não encontra consonância no

português falado nos vários setores da vida cotidiana. Depara-se, assim, com uma grande

dicotomia: o discurso do saber que só os intelectuais compreendem e o discurso do fazer ou

do ser, falado pela maioria do povo brasileiro.

Como percebe-se o ensino da língua portuguesa trilha dois caminhos: um oficial

ditado pelas normas gramaticais e um outro chamado “não padrão” como está definido no

livro “A língua de Eulália” de Bagno. O grande desafio consiste em trazer para o dia-a-dia do

aluno a interação ou a valorização do seu regionalismo ou brasileirismo presentes na fala do

povo brasileiro.

Ser professor é contextualizar a língua e saber levar um novo olhar sobre o ensino da

Gramática que não é nada mais que uma das mais belas artes desde a era medieval, porém, é

preciso ser bem trabalhada para não transformá-la num instrumento repressor, mas ao

contrário, que seja um meio eficaz de valorização e aperfeiçoamento da língua materna. Cabe
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ao educador, criar situações nas quais os alunos sejam capazes de construir sua própria

linguagem e não suprimir a criatividade dos alunos com a rigidez dos conceitos gramaticais.

Há que se considerar também que existe uma gramática internalizada em cada falante

da língua, onde independentemente das regras estabelecidas ela se manifesta de modo

espontâneo e natural, pois a criança quando chega à escola já é capaz de comunicar-se

perfeitamente. Por isso:

Deverá o professor levar os alunos à real compreensão da natureza da linguagem, de seu


emprego simbólico na função comunicativa, para que encarem com o devido realismo as
manifestações lingüísticas e reconheçam o significante apenas como veículo da mensagem
e a mensagem como conteúdo do significante. (BACK, 1987, p.87)

Só assim ter-se-á compreendido o universo de linguagens presentes na transmissão

dos conteúdos de Língua Portuguesa. Permitindo ao aprendizado reler conceitos, vencer tabus

e preparar o aluno para ampliar o seu conceito de linguagem valorizando principalmente o

universo simbólico que ultrapassa os parâmetros estabelecidos pela norma padrão tradicional

e abrindo perspectivas para uma reflexão permanente do ensino gramatical.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A problemática em torno do estudo da gramática nunca se esgota e requer uma

constante reflexão para não se estacionar numa postura unilateral desconsiderando assim, o

projeto inovador que emerge da nova consciência frente ao ensino da língua materna.

A Gramática Normativa tornou-se ao longo dos anos um parâmetro para se aprender

a língua materna no Brasil. Por outro lado, ela não corresponde mais aos anseios de estudantes

e professores que buscam uma resposta consciente e responsável para que a mesma contemple

a diversidade lingüística e considere principalmente os regionalismos presentes no contexto

da realidade brasileira.
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Sendo assim, urge avaliar o discurso em torno da “Unidade da Língua” no Brasil

como também, vale ressaltar a importância do rompimento com a Língua da Metrópole

Portuguesa. Fica claro, porém que não se pretende criar uma nova língua, pois a origem de

tudo é o Latim Vulgar que se expandiu através da romanização da língua nos países

dominados pelo Império Romano.

É importante salientar que não se entende o estudo da língua materna sem

compreender a grande variação, porque passou a língua portuguesa no seu processo histórico,

desde a Colonização até os dias atuais e a gramática deve manter o essencial quanto à

estrutura sintática, porém constantemente sujeita à incorporação de novos elementos que são

frutos da influência de línguas emergentes ou estrangeirismos que sempre acompanharam a

história Lingüística Nacional.

Esta pesquisa possibilitou um olhar crítico a cerca do ensino da gramática, que desde

a sua origem esteve ligada a uma elite, que por sua vez, tinha um forte preconceito em relação

ao falar da maioria do povo, pois a escola dificultou com uma série de normas gramaticais, a

permanência de alunos de comunidades distintas.

Ao refletir sobre o ensino da gramática, os autores desta pesquisa perceberam que é

urgente a contextualização do ensino do Português, que significa também estar atento à

multiplicidade de linguagens presentes na fala dos habitantes deste imenso país tão diverso

culturalmente e, ao mesmo tempo, rico de significados lingüísticos. A reflexão sobre a

Gramática possibilitou a redescoberta da questão central da língua e abriu horizontes para

“sonhar” com um ensino aberto e dinâmico de forma que este se torne sempre prazeroso aos

alunos.
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REFERÊNCIAS

BAGNO, Marcos. A língua de Eulália: Novela Sociolingüística. 11 ed. São Paulo: Contexto,
1999.
__________. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 2005.
BACK, Eurico. Fracasso Ensino de Português: Proposta de Solução. 2 ed. Petrópoles: Vozes,
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