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J U I Z A D O S ESPEC IAIS FEDERAI S

Cláudio Antônio de Carvalho Xavier

JUIZADOS ESPECIAIS E O NOVO CPC 7

SMALL CLAIMS COURTS AND THE NEW CPC


Cláudio Antônio de Carvalho Xavier

RESUMO ABSTRACT
Aborda as técnicas de efetivação de provimentos judiciais e tu- The author discusses the procedures for the implementation of
telas jurisdicionais no contexto da Lei 9.099/95, em face das both legal provisions and jurisdictional protection in the scope
alterações sobrevindas com as normas subsequentes e com o of Law 9,099/95, considering the changes due to subsequent
advento da Lei 13.105/2015 (novo CPC). standards and to the enactment of Law 13,105/2015 (new CPC).
Trata, ainda, da aplicação subsidiária da legislação processual He also deals with the subsidiary application of the
civil comum no âmbito dos juizados especiais cíveis, visando ordinary civil procedure legislation within civil small claims
ao aperfeiçoamento dos instrumentos já existentes, em prol da courts, aimed at improving current means to promote the
otimização do processo judicial. optimization of lawsuits.

PALAVRAS-CHAVE KEYWORDS
Juizados especiais; novo CPC; Lei 9.099/95; juizados especiais Small claims courts; new CPC; Law 9,099/95; civil small claims
cíveis; aplicação subsidiária. courts; subsidiary application.

Revista CEJ, Brasília, Ano XX, n. 70, p. 7-22, set./dez. 2016


Cláudio Antônio de Carvalho Xavier

1 INTRODUÇÃO a Lei dos Juizados Especiais surgiu no cenário jurídico, com a


A obtenção de uma providência jurisdicional efetiva, me- finalidade de atender a uma demanda reprimida e minorar os
diante um processo justo, acessível e realizado em tempo ra- efeitos gerados pelo que se chamou de litigiosidade contida,
zoável (DINAMARCO, 2003, p. 29), é, na atualidade, o principal facilitando ao cidadão comum o acesso rápido à jurisdição, em
foco de interesse da processualística civil moderna. Daí não ser alguns casos, sem necessidade de advogado. Ou seja, peque-
outra a preocupação expressa pelo legislador na elaboração do nos litígios que sequer tinham acesso nas vias tradicionais de
novo Código de Processo Civil1, cujo arcabouço está pautado na Justiça4, considerando-se o valor econômico da causa, já que o
celeridade processual, simplificação dos procedimentos e o es- ajuizamento de uma ação implicava muitas vezes custos eleva-
tabelecimento de um “procedimento comum”. Nesse sentido, dos (pagamento de custas, taxas judiciais e honorários), ou as
o país vive um momento de transição para um novo paradigma, dificuldades inerentes à tramitação processual, especialmente
e cada vez mais se põe ênfase nos métodos consensuais de dada a insuficiência de órgãos voltados à assistência judiciária,
solução de conflitos e na conciliação2, daí por que se afirma que demora do processo e problemas estruturais.
os meios alternativos são fundamentais para o aprimoramento Posteriormente, foram editadas a Lei 10.259/2001, que
da prestação jurisdicional. instituiu os juizados no âmbito da Justiça Federal (Emenda
É nesse contexto que se insere a Lei 9.099/95, que, nos Constitucional 22/1999), e a Lei 12.153/2009, que cria os juiza-
seus vinte anos de existência, trouxe mais agilidade ao julga- dos especiais da Fazenda Pública, aplicando-se subsidiariamen-
mento das demandas, com um procedimento mais célere à te, em ambos os casos, a Lei 9.099/95.
prestação jurisdicional. A essas duas leis veio somar-se, em 2006, a reforma proces-
sual ocorrida com o advento da Lei 11.419, de 19 de dezembro
[...] a Lei dos Juizados Especiais surgiu no de 2006, que dispõe sobre a informatização do processo judi-
cenário jurídico, com a finalidade de atender a cial, e promoveu a unificação da sistemática do procedimento
eletrônico, provocando substanciais mudanças na tramitação do
uma demanda reprimida e minorar os efeitos processo. Registre-se que a Lei 9.800, de 26 de maio de 1999,
gerados pelo que se chamou de litigiosidade com anterioridade, já permitia a apresentação de petições e re-
contida, facilitando ao cidadão comum o acesso cursos por via eletrônica (fac-símile ou similar), não abrangen-
do, contudo, as citações e intimações.
rápido à jurisdição, em alguns casos, sem Em um primeiro momento, estimava-se que a Lei 9.099/95
8 necessidade de advogado. viria descongestionar os inúmeros processos em tramitação nas
varas cíveis do país e houve quem afirmasse peremptoriamente
Na realidade, a Lei 9.099/95 foi antecedida pela Lei 7.244, que a nova lei desafogaria as unidades cíveis. Todavia, não foi
de 7 de novembro de 1984, que instituiu os juizados especiais esse o objetivo da lei (SILVA, 1999, p. 9). A intenção do legisla-
de pequenas causas3, inspirados na experiência de outros paí- dor, na fase inicial de implementação dos juizados cíveis, como
ses, particularmente nas Small Claims Courts do sistema norte- bem afirmou Figueira Júnior (2007, p. 171), era permitir maior
-americano, adaptada à realidade brasileira. acesso à Justiça aos menos afortunados ou hipossuficientes.
A partir dessa experiência positiva, o constituinte de 1988 Quis o legislador criar uma via alternativa de acesso à juris-
previu, no art. 98, a criação obrigatória, pelos Estados e Distrito dição, sem o rigor formal e os trâmites burocráticos do processo
Federal, de juizados especiais cíveis e criminais com compe- comum, sendo errôneo pensar que a finalidade dos juizados
tência para processar, julgar e executar causas cíveis de menor é simplesmente dar maior agilização aos processos. Como
complexidade e infrações de menor potencial ofensivo (art. 98, explicita Marinoni (2008, p. 80): A agilização da distribuição
I), o que significou o prenúncio de uma nova mentalidade que da justiça não pode constituir a razão de ser dos Juizados. A
se vem implantando aos poucos. (BULOS, 2011, p. 1369). filosofia dos Juizados é tocada pelo tema da demora do pro-
A norma expressamente instituída na Constituição Federal cesso apenas porque o hipossuficiente é aquele que mais sofre
denota o compromisso e a preocupação do legislador constitucio- com o retardo na entrega da prestação jurisdicional. Assim,
nal com a universalização do acesso à tutela jurisdicional, obrigan- é necessário deixar claro, para que não ocorram distorções,
do o legislador infraconstitucional a criar órgãos e procedimentos que a finalidade dos Juizados não é simplesmente propiciar
jurisdicionais diferenciados para permitir o acesso dos economi- uma justiça mais célere, mas sim garantir maior e mais efetivo
camente menos favorecidos à justiça. (MARINONI, 2008, p. 79). acesso à justiça.
O microssistema introduzido pela Lei 9.099/95 significou Embora houvesse a expectativa de que traria maior celerida-
uma ruptura total com o modelo jurídico vigente à época, na de, a lei acabou não surtindo o efeito desejado, que seria ameni-
medida em que se deu maior ênfase à composição amigável zar a sobrecarga de feitos em trâmite nas unidades cíveis devido
dos conflitos intersubjetivos, resgatando a simplicidade, celeri- ao crescimento das ações judiciais nas últimas décadas. Os que
dade, informalidade, economia processual e oralidade, erigidos outrora assim pensavam talvez não considerassem que, com o
como princípios norteadores da atividade jurisdicional, consti- passar dos anos, a lei sucumbiria a um problema ainda maior: a
tuindo assim, um divisor de águas no processo civil. cultura do litígio ou judicialização de demandas, bastante arrai-
Criada pela Constituição com o objetivo precípuo de aten- gada na sociedade brasileira e que provocou diversos entraves.
der a segmento da sociedade desprovido de meios econômicos, A propósito, não se pode deixar de mencionar que a lentidão
consideradas classes menos favorecidas, à margem do direito, na prestação da tutela continua sendo o principal problema da

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Justiça brasileira que vem se tornando juízo cível comum, ainda que possa ter O principal argumento em defesa
impotente para atender às demandas, contribuído, em certo momento, para do acesso facultativo aos juizados, ain-
em vista do elevado e sempre crescente descongestionar as varas cíveis, já tão as- da que não de todo convincente, foi o
número de reclamações protocoladas, soberbadas de processos, situação moti- de que haveria inegável cerceamento
principalmente na esfera do Direito do vada, em grande medida, pelos critérios de defesa ao deixar de garantir ao ci-
Consumidor, como resultado da massifi- adotados para fixação da competência. dadão a amplitude da defesa de seus
cação das relações de consumo. Isso porque o art. 3º da Lei do direitos, considerando o disposto no
Desde o ponto de vista da doutrina Juizado, ao estabelecer a competência art. 5º, inc. LV, da Constituição Federal,
brasileira, a Lei dos Juizados Especiais é para conciliação, processo e julgamen- notadamente nos casos que exigissem
satisfatória e corresponde às exigências e to das causas cíveis de menor comple- a produção de prova técnica mais ela-
aos anseios da sociedade, embora conte- xidade e de valor não excedente a 40 borada, já que o microssistema dos jui-
nha algumas imperfeições que poderão salários mínimos (incs. I e IV), não fixou zados não admite a realização de prova
ser ajustadas e aprimoradas pelas orien- uma competência obrigatória e abso- pericial formal, visto que a produção de
tações doutrinárias e jurisprudenciais luta, como fez a lei instituidora dos jui- provas mais complexas e minuciosas só
(FIGUEIRA JÚNIOR, 2007, p. 70). A lei é zados federais e, posteriormente, a Lei tem lugar na Justiça comum.
eficiente, mas não está sendo eficaz para 12.153/2009. Nery Jr. (2006, p. 466) recorda que
combater a morosidade processual. Segundo o disposto no art. 3º, § 3º, não se pode perder de vista a finalidade
Ademais, poucos acréscimos e modi- da Lei Federal 10.259/2001, esta com- dos juizados, que é a de ofertar ao juris-
ficações foram incorporados ao seu tex- petência em razão do valor mostra-se dicionado mais uma alternativa para que
to. Merece destaque, entre as principais obrigatória, de maneira que, no foro possa ter acesso à ordem jurídica justa,
alterações introduzidas na legislação, a onde houver instalada vara do juizado podendo assim o autor direcionar sua pre-
do art. 8º, § 1º, incs. II, III e IV, que in- especial, a sua competência é absoluta tensão tanto ao juizado especial (procedi-
cluiu, no rol das pessoas legitimadas e, portanto, indeclinável e improrro- mento concentrado), quanto ao juízo co-
ativamente para o exercício da ação, os gável. Idêntica regra poderia ter sido mum (com ampla defesa). Entendimento
microempreendedores individuais, mi- expressamente5 contemplada na Lei diverso contraria a própria finalidade da
croempresas e empresas de pequeno 9.099/95, permitindo-se, em situações norma constitucional por ser ofensivo ao
porte. No projeto original, não estavam excepcionais, a opção do autor pelo juízo princípio constitucional do direito de ação,
contempladas, embora fossem também comum, quando, por exemplo, a parte bem como ao da ampla defesa (CF, art. 9
hipossuficientes e necessitassem igual- demandada estivesse em lugar ignorado 5º, XXXV e LV). Disso decorre que a opção
mente de proteção legal. e houvesse necessidade de se efetuar a pelo procedimento do Juízo comum im-
Essa alteração legislativa facilitou o citação por edital6 ou quando houvesse pede o juízo de declinar da competência,
acesso à Justiça dessas pequenas empre- interesse de incapazes. de ofício, em favor do JEC.
sas, visto que, ao excluí-las da sistemática
dos juizados, a lei não estava atingindo o Quis o legislador criar uma via alternativa de acesso à
ideal de justiça buscado pela sociedade. jurisdição, sem o rigor formal e os trâmites burocráticos do
A Lei 9.841, de 5 de outubro de 1999,
instituiu o Estatuto da Microempresa de processo comum, sendo errôneo pensar que a finalidade dos
Pequeno Porte e, em seu art. 38, passou juizados é simplesmente dar maior agilização aos processos.
a admitir o ingresso das microempresas
nos juizados especiais cíveis no polo ati- Contudo, a solução não é tão sim- A parte pode, inclusive, ingressar com
vo, consolidando-se o entendimento ju- ples assim quanto parece e exige cuida- uma ação autônoma nos juizados e ou-
risprudencial no sentido da equiparação dosa reflexão, devendo-se salientar que a tra no juízo cível comum, com pedidos
do microempresário à pessoa física. Justiça Federal tem peculiaridades distin- diversos, ainda que fundamentados na
tas de outras justiças, pois, como ressalta- mesma causa de pedir. Nestes casos, a
2 ACESSO À JUSTIÇA NAS CAUSAS DE do por Assis (2014, p. 62), o universo dos conexão não determinará a reunião das
MENOR COMPLEXIDADE legitimados passivos é predeterminado. ações na seara dos juizados, embora pos-
Os juizados foram criados para o Esse tema, já pacificado na doutrina sa haver prejudicialidade de uma ação em
julgamento das causas cíveis de menor e jurisprudência, suscitou grandes discus- relação à outra. A propósito, estabelece o
complexidade, com vistas a facilitar ao sões, mas acabou por ser reconhecida a Enunciado 68 do Fonaje: Somente se ad-
cidadão o acesso à jurisdição, visando facultatividade dos juizados especiais cí- mite conexão em Juizado Especial Cível
à obtenção rápida e eficaz da tutela ju- veis, cabendo ao cidadão o direito de ele- quando as ações puderem submeter-se à
risdicional. Entretanto, a técnica adotada ger em qual juízo demandar, ou seja, o sistemática da Lei 9.099/1995.
pela Lei 9.099/95 para se atingir a tutela procedimento previsto na lei é opcional, Seguindo essa linha de raciocínio,
jurisdicional pretendida, de forma mais de maneira que é possível ao autor optar ocorrendo conexão ou continência entre
célere e eficaz, não impediu que deter- livremente por demandar na Justiça co- duas ou mais demandas, quando uma
minadas pretensões, que poderiam tra- mum, em vez de formular reclamação na delas não estiver incluída na competên-
mitar no juizado, fossem processadas no Justiça especializada. cia dos juizados, a competência para o

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julgamento de todas as ações deve ser deslocada para o juízo também as relativas a acidentes de trabalho, a resíduos e ao es-
comum (FIGUEIRA JÚNIOR, 2007, p. 112), devendo o processo tado e capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial.
ajuizado no JEC ser extinto. Sustenta-se na doutrina (NERY JR., 2006, p. 1220) que essa
Por fim, é importante frisar que a complexidade da causa enumeração é taxativa – e não meramente, exemplificativa –,
é irrelevante na fixação da competência dos juizados especiais. não podendo ser ampliada por analogia ou interpretação ex-
Como se verá adiante, apenas a complexidade da prova afasta a tensiva. Além da competência para processar e julgar as causas
competência do juizado cível (Enunciado 54), motivando a extin- enumeradas na Lei, inclusive ações conexas reunidas no mes-
ção do processo (art. 51, II). mo juízo pela prevenção, o juizado é igualmente competente
Apresentam-se a seguir, resumidamente, algumas das prin- para a execução de suas sentenças (art. 3º, § 1º, I), bem como
cipais características básicas dos juizados especiais tendo como dos títulos executivos extrajudiciais, no valor de até 40 vezes o
enfoque os mecanismos, técnicas e métodos que possibilitam o salário mínimo (art. 3º, § 1º, II).
acesso rápido à justiça: Havendo a opção pelo procedimento previsto na Lei, pre-
a) Isenção de custas (arts. 54 e 55); sume-se que o demandante renunciou ao crédito excedente
b) Instituição de procedimento especial, sumaríssimo, bus- ao limite estabelecido na norma (art. 3º, § 3º), tratando-se de
cando, sempre que possível, a conciliação ou a transação; renúncia ex lege, ou seja, decorre do mero ajuizamento da de-
c) Propositura da ação sem assistência de advogado (até 20 manda e independe de manifestação positiva de vontade para
salários mínimos); produzir efeitos. Havendo conciliação, permite-se, excepcional-
d) Mandato verbal ao advogado, salvo quanto aos poderes es- mente, que as partes possam estipular valor de pagamento aci-
peciais (art. 9º, § 3º); ma do teto legal.
e) Apresentação do pedido oral (art. 14), reduzido a termo Nas hipóteses previstas nos incs. I e IV do art. 3º, a Lei limita
(§ 3º); a 40 salários mínimos o valor da condenação, mensurados na
f) Pedido genérico (art. 14, § 2º); data da propositura da ação, estipulando a ineficácia da senten-
g) Pedido contraposto (não se admite a reconvenção); ça condenatória na parte que exceder a alçada estabelecida na
h) Citação por correspondência (art. 18, I), sendo desneces- Lei (art. 39).
sária a expedição de precatória; Sustenta-se, ainda, que o juizado é competente para julgar
i) Vedação da citação por edital (art. 18, § 2º) e por hora as causas enumeradas no art. 275, inc. II, do CPC/73 (art. 3º,
certa; II), ainda que sejam de valor superior a 40 salários mínimos,
10 j) Audiência concentrada; pois, nesse caso, a Lei teria adotado o critério qualitativo e não
k) Comparecimento pessoal das partes; quantitativo. Segundo esse entendimento, a despeito de que
l) Inadmissibilidade da intervenção de terceiros e da assis- a Lei 9.099/95 tenha utilizado o valor da causa como critério
tência (art. 10); de identificação das causas de menor complexidade no inc. I,
m) Inadmissibilidade de perícia de grande complexidade; naquelas submetidas ao procedimento sumário7, o juiz não
n) Irrecorribilidade das decisões interlocutórias e homolo- está, na sentença, a ele adstrito, podendo fixar a condenação
gatórias (acordos e laudos arbitrais); em montante maior.
o) Sentença proferida na própria audiência e necessaria- Segmento da doutrina afirma que esse entendimento pare-
mente líquida; ce não encontrar respaldo na Lei, a teor do disposto no art. 39
p) Liquidação e execução de seus próprios julgados; (é ineficaz a sentença condenatória na parte que exceder a al-
q) Aplicação supletiva e subsidiária do Código de Processo çada estabelecida nesta Lei), não se podendo interpretar o inc.
Civil. II do art. 3º de maneira isolada e literalmente, uma vez que tal
norma jurídica deve ser interpretada sistematicamente, em con-
3 COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS: COMPETÊNCIA EM RAZÃO DO sonância com os demais dispositivos legais (art. 3º, § 3º, e art.
VALOR VERSUS COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA 39) e à luz dos princípios cardeais que regem o microssistema.
O art. 98, inc. I, da Constituição Federal, previu a compe- Assim, por exemplo, ao comentar a Lei dos Juizados,
tência dos juizados especiais para a conciliação, o julgamento Chimenti (1999, p. 152) sustenta que a interpretação sistemáti-
e a execução de causas cíveis de pequena complexidade (e in- ca da lei e a análise conjunta dos arts. 3º, § 3º, 15 e 39 permitem
frações penais de menor potencial ofensivo). Em seu art. 3º, a concluir que a sentença condenatória, mesmo nas hipóteses do
Lei 9.099/95 apresenta uma enumeração das causas da com- inc. II do art. 275 do CPC, será ineficaz na parte que superar a
petência dos juizados especiais, consideradas como de menor alçada do sistema especial, ressalvados os acréscimos super-
complexidade jurídica. venientes à sentença.
Conforme tem sido apontado pela doutrina especializada O fato é que essa questão, já pacificada na jurisprudência,
(FIGUEIRA JÚNIOR, 2007, p. 86), o legislador adotou um du- gerou inúmeras controvérsias na doutrina e dinâmica forense.
plo critério para delimitar a competência nos juizados especiais: Pensava-se, a princípio, que a competência prevista no art.
o quantitativo e o qualitativo. O primeiro critério diz respeito 3º, inc. I, deveria ser analisada de maneira conjugada com os
à matéria objeto da lide; o segundo, ao valor da controvérsia. demais incisos do mesmo artigo, atendidas as especificidades
Por expressa disposição legal (art. 3º, § 2º), estão excluídas da da lei, pois, dessa forma, haveria perigo de esvaziamento do
competência do juizado especial comum as causas de natureza procedimento sumário e possível sobrecarga de trabalho dos
alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, e juizados, cuja competência ficaria aberta a um universo amplo

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de ações. Aliás, sobre o assunto, o Fonaje Observe-se que, havendo pedidos de competência instaurado entre juízo
aprovou o Enunciado 58: As causas cí- cumulados, o valor da causa9 deve cor- federal e juizado especial federal, ainda
veis enumeradas no art. 275, II, do CPC responder à somatória do conteúdo eco- que da mesma seção judiciária. Partiu-
admitem condenação superior a 40 sa- nômico de cada uma das pretensões for- se do pressuposto de que o juízo de
lários mínimos e sua respectiva execu- muladas. Nesse caso, se o valor da causa juizado especial não está vinculado ju-
ção, no próprio Juizado. vier a superar o limite de alçada fixado risdicionalmente ao tribunal com quem
Em sentido contrário manifestou- em lei, entende-se inaplicável a renúncia tem vínculo administrativo, razão pela
-se Wambier (2006, p. 274), afirmando tácita prevista no art. 3º da Lei, em face qual o conflito entre ele e juízo comum
que o Enunciado 58 do Fórum Nacional da impossibilidade de se determinar a caracteriza-se como conflito entre juízos
de Juizados Especiais (Fonaje) é abso- qual dos pedidos se aplica a renúncia. não vinculados ao mesmo tribunal [...].
lutamente contrário aos princípios que Cabe ainda mencionar que, a despei- (VILLAR, 2015, p. 205-206).
regem a matéria, pois permite que dos to de ter-se eliminado o procedimento Para adequar-se à orientação adota-
Juizados Especiais se valham aqueles sumário no novo CPC, os juizados es- da pelo Excelso Pretório no RE 590.409/
que, por disporem de poder econômico peciais cíveis estaduais continuam com- RJ (26/8/2009), em sentido oposto, e até
mais elevado, poderiam apresentar seus petentes para o processamento e julga- por exigência constitucional (art. 108, I, e,
pleitos perante a Justiça Comum. Ainda mento das causas previstas no art. 275, da CF/88), o STJ cancelou a Súmula 348
segundo Wambier (2006, p. 275), a ado- inc. II, da Lei 5.869, de 11 de janeiro de ao apreciar o CC 107.635/PR, editando
ção dessa orientação implicaria total des- 1973, até que se modifique a lei especial nova súmula.
virtuamento dos Juizados Especiais. Esse por norma específica, em razão da ultra- A Súmula 428 do STJ, portanto,
posicionamento, contudo, não encontra tividade da norma revogada, conforme atribui aos TRFs a competência para de-
eco na doutrina. previsão expressa do art. 1.063. cidir os conflitos entre juizado especial
Nesse aspecto, não nos parece que
exista qualquer óbice ao ajuizamento de O art. 98, inc. I, da Constituição Federal, previu a competência
demandas submetidas ao procedimen- dos juizados especiais para a conciliação, o julgamento e a
to sumário nos juizados, seja qual for
o valor, por força do princípio geral de execução de causas cíveis de pequena complexidade (e
hermenêutica que não permite ao intér- infrações penais de menor potencial ofensivo).
prete distinguir o que a lei não distingue 11
(SILVA, 1999, p. 14). Ademais, a sentença De igual maneira, as ações sujeitas federal e juízo federal da mesma seção
ineficaz a que se reporta a norma é a de a procedimento especial, independen- judiciária: Compete ao Tribunal Regional
natureza condenatória, e a sentença pro- temente do valor atribuído à causa, Federal decidir os conflitos de compe-
ferida em ação de despejo, por exemplo, refogem da competência do JEC. Com tência entre juizado especial federal e
possui natureza executiva lato sensu. efeito, os ritos especiais (procedimento Juízo federal da mesma seção judiciária.
A análise do Recurso em Mandado monitório, ação de busca e apreensão Nesses casos, portanto, não cabe ao STJ
de Segurança n. 30.170/SC, julgado em etc.) não se conformam com o proce- a apreciação do conflito de competência,
5/10/2010, do qual foi relatora a eminen- dimento sumaríssimo estabelecido pela pelo fato de que tanto os juízes que inte-
te Ministra Nancy Andrighi, do Superior norma. Nesse sentido, reza o Enunciado gram os juizados federais, quanto aque-
Tribunal de Justiça, lançou luz sobre essa 8 do Fonaje: As ações cíveis sujeitas aos les que funcionam nas varas comuns da
questão, afirmando que a Lei 9.099/95 procedimentos especiais não são admis- mesma seção judiciária estão atrelados
trouxe novos contornos à definição da síveis nos Juizados Especiais. ao respectivo TRF.
competência dos Juizados Especiais, No caso específico da ação moni- O mesmo raciocínio vem sendo apli-
deslocando o critério valorativo do ca- tória, mantida pelo novo CPC, existem cado nos conflitos envolvendo o juízo de
put para os incisos I e IV do artigo 3º, de posicionamentos jurisprudenciais que direito estadual e o juizado especial cível,
modo a torná-lo independente do crité- admitem o seu ajuizamento no âmbito visto que ambos mantêm a mesma posi-
rio material. Destaca, assim, que, apesar dos juizados, tese que entendemos não ção hierárquica em relação aos respecti-
de a técnica redacional dificultar a com- ser a que melhor se coaduna com o vos tribunais de justiça.
preensão do alcance exato do dispositi- sistema processual da Lei dos Juizados,
vo legal, a sua interpretação teleológica diante da incompatibilidade do rito, que 4 REFLEXOS DO NOVO CPC NA LEI
e sistemática (à luz do art. 98, I, da CF, não admite citação por edital, nos termos 9.099/95 E NORMAS APLICÁVEIS AOS
e das demais garantias constitucionais do § 2º do art. 18. Veja-se que, segundo JUIZADOS ESPECIAIS
em matéria jurisdicional) aponta para a entendimento sumulado do STJ, cabe As diversas modificações e alterações
inexistência de limite valorativo nas ações a citação por edital em ação monitória realizadas no CPC/73 foram insuficientes
previstas nos incs. II e III do art. 3º da Lei (Súmula 282), modalidade de citação ve- para adequar o Código às novas realida-
9.099/95. Portanto, nas hipóteses dos dada pela Lei 9.099/95. des, razão pela qual se optou pela apro-
incs. II e III do art. 3º, permite-se que o Na Súmula 348, a Corte Especial vação de uma nova Lei Adjetiva Civil. O
valor da causa supere o patamar de 40 firmou o entendimento de que com- advento do novo Código de Processo Civil
salários mínimos8. pete ao STJ o julgamento de conflito trouxe uma nova configuração ao proces-

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so civil, instituindo novas regras, prazos e técnicas processuais. processual, sob pena de vir a ser descaracterizada, tornando-
Dentre as principais inovações, rompe-se com o sistema -se mais uma previsão utópica do nosso ordenamento, pois é
tradicional, passando-se a valorizar a autocomposição, privile- evidente que, tanto na esfera processual quanto fora dela, o
giando-se o diálogo do juiz com as partes, com vistas ao apri- homem, como acreditava Hobbes, continuará sendo o lobo do
moramento das técnicas processuais. Nesse quadro de ideias, homem, de maneira que não se pode esperar que, em uma
emerge a noção de contraditório diferido, prevista no art. 9º, contenda judicial, as partes litigantes venham a colaborar entre
segundo o qual não se proferirá decisão contra uma das partes si a ponto de contrariarem ou abdicarem seus próprios interes-
sem que ela seja previamente ouvida, evitando-se a extinção ses, embora devam comportar-se de acordo com a boa-fé e
abrupta do processo. lealdade processual.
Desde logo se enfatize que o NCPC não terá grandes reper- Nesse sentido, entendemos que a noção de cooperação
cussões no âmbito dos juizados especiais, visto que, de regra, os interliga-se à noção de boa-fé processual, de modo que o art.
dois sistemas muitas vezes não são convergentes. No entanto, a 6º do NCPC deve ser interpretado em conjunto com o art. 5º
contrario sensu, a influência da Lei 9.099/95 sobre o novo CPC (lealdade e boa-fé processual) e com o art. 77 (ato atentatório à
é notória. Podemos citar, dentre outras, as seguintes: a) reunião dignidade da jurisdição).
de princípios processuais em capítulo específico; b) ênfase na Cumpre salientar que a nova Lei admite, inclusive, que o
audiência de conciliação ou de mediação (art. 334); c) a con- saneamento e a organização do processo se façam de forma
testação deve concentrar toda a matéria de defesa (art. 336), cooperativa, em conjunto com as partes (art. 357, § 3º), quando
inclusive a arguição de incompetência relativa; d) produção de a causa apresentar complexidade em matéria de fato ou de di-
prova técnica simplificada, quando o ponto controvertido for de reito10, com o objetivo de ampliar o debate, o aclaramento e o
menor complexidade (art. 464, § 2º); e) audiência concentrada aprofundamento das questões.
(art. 365); f) gravação da audiência (§§ 5º e 6º do art. 367); Atente-se que tanto a incompetência absoluta quanto a
g) apresentação do pedido reconvencional na contestação; h) relativa devem ser alegadas como preliminar de contestação,
limitação do agravo de instrumento e fim do agravo retido. no entanto, manteve-se a regra de que o juiz não pode reco-
Exceto nos casos em que a Lei 9.099/95 for omissa, even- nhecer de ofício a incompetência relativa (art. 337, § 5º), em
tualmente poderá haver a aplicação subsidiária do novo CPC. E conformidade com a Súmula 33 do STJ. Nesse ponto, o novo
isso porque, como se verá adiante, a sistemática dos juizados CPC distanciou-se da sistemática da Lei 9.099/95 que admite o
especiais afasta, de regra, a aplicação do processo civil comum. reconhecimento de ofício da incompetência relativa em sede de
12 As novas regras permitem reduzir o tempo de duração do juizados especiais.
processo (art. 190), em sintonia com o princípio da “razoável Para os casos em que a parte suscite a incompetência re-
duração do processo”, consubstanciado no art. 5º, LXXVII, da lativa, a consequência processual será diversa, pois, enquanto
Constituição Federal, e, portanto, visando à efetiva e tempestiva no processo civil comum o magistrado, ao acolher a preliminar,
concretização do direito material. determinará a remessa dos autos ao juízo competente (art. 64,
§ 3º); no microssistema dos juizados, a incompetência relativa
As diversas modificações e alterações acarretará a extinção do processo (art. 51, III).
realizadas no CPC/73 foram insuficientes para
4.1 PECULIARIDADES DO PROCEDIMENTO ESPECIAL E PRINCÍPIOS
adequar o Código às novas realidades, razão INFORMATIVOS
pela qual se optou pela aprovação de uma O procedimento especial definido pela Lei 9.099/95 é cha-
nova Lei Adjetiva Civil. mado sumaríssimo e possui princípios, instrumentos e peculia-
ridades próprias.
Por isso, o NCPC reafirmou o princípio da razoável duração O procedimento do JEC é bastante simplificado, concentran-
do processo, ao dispor, no art. 4º, que as partes têm o direito do toda a instrução probatória em uma única audiência de ins-
de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, inclu- trução e julgamento, na qual serão produzidas todas as provas,
ída a atividade satisfativa e, concomitantemente, estende essa ainda que não requeridas previamente e, em seguida, proferida
regra a todos os sujeitos do processo, os quais devem cooperar a sentença, decidindo-se, de plano, os incidentes processuais que
entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de possam interferir no regular prosseguimento da audiência.
mérito justa e efetiva (art. 6º). E, ainda nessa linha, estabelece Consoante o disposto no art. 2º, a Lei dos Juizados Especiais
uma ordem cronológica de conclusão para que sejam proferi- Cíveis Estaduais está calcada, estruturada e fundamentada em
das as sentenças ou acórdãos (art. 12). cinco pilares ou princípios fundamentais: oralidade, simplici-
Partindo de uma interpretação mais apressada, a aplica- dade, informalidade, economia processual e celeridade. Desse
ção dessa regra, que desde logo suscitou a atenção de autores modo, os critérios instituídos pela Lei objetivam a desburocrati-
como Lênio Luiz Streck (NEVES, 2015, p. 16-19), pode parecer zação, racionalização e simplificação dos procedimentos e são
fantasiosa ou exacerbada, mas, na verdade, significa uma mu- de especial valor para estabelecer a tônica do processo, mor-
dança de paradigmas, ainda que possa produzir poucos resul- mente quando não há previsão legal expressa.
tados práticos. Como observou Nery Junior (2006, p. 1.219), a Lei 9.099/95
Deste modo, deve ser compreendida não apenas no con- optou pela positivação dos princípios fundamentais, diferente-
texto meramente ético-filosófico, mas na seara estritamente mente do CPC/73, cujos princípios nem sempre se encontram ex-

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pressos no texto legal, situação modificada quase sempre obrigatória. Nos juizados, convençam do contrário.
com o atual CPC, o qual passou a agrupar, a assistência por advogado, em regra, é Em caso de litisconsórcio (art. 10),
em capítulo específico, os princípios que facultativa, apenas sendo obrigatória nas prevalece a regra do art. 345, I, do novo
orientarão a prática dos atos processuais. causas cujo valor ultrapassa 20 salários CPC (aplicação subsidiária), de maneira
Conforme esclarece o autor, a doutrina mínimos, assim, de maneira geral, não que não incidem os efeitos da revelia
identifica alguns princípios fundamentais há impedimento legal a que a parte reali- se, havendo pluralidade de réus, algum
que, embora tenham aplicação ao processo ze diretamente os atos processuais. deles contestar a ação. Havendo dois
civil, nem sempre se encontram expressos A representação por advogado só é ou mais autores (litisconsórcio ativo),
no texto do Código. A Lei 9.099/95, em obrigatória na fase recursal (art. 41, § 2º), a ausência de um dos promoventes
contrapartida, adotando orientação diver- independentemente do valor atribuído à produzirá a extinção do processo uni-
sa, preferiu positivar, de maneira expressa, causa e ainda que as partes tenham liti- camente em relação ao que deu causa
os critérios ou princípios informativos dos gado, em primeiro grau, desacompanha- à contumácia, sendo irrelevante o fato
juizados especiais para não deixar dúvida das de advogado, entendendo-se des- de estarem assistidos pelo mesmo ad-
quanto a sua aplicação irrestrita. necessária a juntada de procuração se a vogado. Destaque-se, ao lado disso,
A adoção de critérios informativos parte já se encontrava representada pelo que o oferecimento de resposta, oral
assume maior relevância no sistema dos mesmo advogado subscritor do recurso ou escrita, não dispensa o compare-
juizados especiais, na medida em que na forma do art. 9º, § 3º. cimento pessoal da parte, ensejando,
servem de “fontes norteadoras” da ati-
vidade das partes, do juiz, do Ministério O novo CPC, apostando nos métodos alternativos de
Público, dos auxiliares da justiça, do pro-
resolução de conflitos, erigiu a conciliação como mecanismo
cesso e do procedimento, ao tempo em
que impõe ao juiz a necessária aplicação eficaz de composição de litígios, prevendo a realização de
das regras e a busca por uma melhor so- audiência obrigatória de conciliação e mediação antes da
lução para o litígio, bem como a decisão
que melhor se amolde ao caso concreto. apresentação de contestação pelo réu.
O princípio da imediação ou da orali-
dade11 permeia toda a sistemática proce- Evidentemente que a ausência do pois, os efeitos da revelia, nos termos
dimental dos juizados, desde a postulação autor e do réu produzirá consequên- do Enunciado 78 do Fonaje. 13
até apreciação final do pedido, conferindo- cias distintas. O não comparecimento
-lhe mais simplicidade e maior celeridade, do autor, se devidamente intimado a 4.2 CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO NO NOVO CPC
na medida em que se prioriza a colheita qualquer das audiências do processo, Estimular a tentativa de conciliação
de prova em uma única audiência, sem a revela o seu desinteresse tácito no é a principal tônica da Lei dos Juizados
necessidade de reduzir-se a termo a pro- prosseguimento do feito e importará Especiais, almejando alcançar a solução
va oral, devendo a sentença, por sua vez, na extinção do processo sem resolu- amigável do litígio. O novo CPC, apostan-
referir, no essencial, os informes trazidos ção de mérito (art. 51, I), com a pos- do nos métodos alternativos de resolução
nos depoimentos (art. 36). sibilidade de condenação em custas de conflitos, erigiu a conciliação como
Daí a importância que é dada à me- processuais, salvo comprovada força mecanismo eficaz de composição de lití-
diação, seja pela conciliação ou pela tran- maior (art. 51, § 2º). Por outro lado, gios, prevendo a realização de audiência
sação. Para obtenção desse desiderato, a a ausência do demandado à sessão de obrigatória de conciliação e mediação an-
Lei exige o comparecimento pessoal das conciliação ou à audiência de instrução tes da apresentação de contestação pelo
partes, tanto à audiência de conciliação e julgamento produzirá a presunção réu. Desse modo, a audiência não será
como à de instrução, com o principal de veracidade dos fatos alegados no realizada somente se ambas as partes ma-
escopo de facilitar a mediação das par- pedido inicial (efeito principal da re- nifestarem, expressamente, desinteresse
tes envolvidas no conflito e possibilitar a velia), salvo se o contrário resultar da na composição consensual ou se não for
concretização de um acordo. Observe-se convicção do juiz (art. 20) e, por con- admitida autocomposição (art. 334, § 4º).
que a Lei não exige a representação das sequência, o julgamento antecipado Como adverte Montenegro Filho
partes por advogado, mas tão somente a do mérito (art. 355, II, do novo CPC), (2015, p. 34), o não comparecimento do
assistência de advogado nas audiências. autorizando a prolatação de sentença autor à audiência de tentativa de conci-
Um aspecto importante nesse con- (art. 23). Deve-se ter presente, ainda, liação ou de mediação não acarreta a
texto é a distinção entre “representação” que a revelia induz presunção relativa extinção do processo sem a resolução
e “assistência”. Portanto, não é suficiente de veracidade da matéria fática, mas do seu mérito, como ocorre no âmbito
o comparecimento de advogado com não acarreta, necessariamente, a pro- dos Juizados Especiais Cíveis, mas a apli-
poderes especiais de confessar e transigir cedência da demanda, podendo o ma- cação de multa, na forma do disposto no
à audiência, visto que a Lei exige o com- gistrado, em virtude do livre convenci- § 8º do art. 334 do NCPC.
parecimento pessoal das partes. mento, afastar a veracidade dos fatos Cabe esclarecer, no entanto, que
No processo civil, a representação narrados na inicial se houver nos autos a conciliação, como já vem sendo des-
das partes em juízo por advogado é outros elementos de convicção que lhe tacado por alguns autores, é princípio

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norteador dos juizados especiais e não um procedimento ou inicial até o momento da audiência de instrução e julgamento.
momento processual, uma vez que integra o próprio processo. Com o fim precípuo de conferir maior celeridade proces-
Desse modo, o procedimento sumaríssimo dos juizados sual, a Lei 9.099/95 proíbe qualquer forma de intervenção de
especiais não comporta a opção do autor pela realização ou terceiro (chamamento ao processo, denunciação da lide etc.),
não de audiência de conciliação ou de mediação, nos moldes inclusive a assistência, admitindo apenas o litisconsórcio, no
preconizados pelo art. 319, inc. VII, do novo CPC, por ser um di- polo ativo ou passivo da demanda. Nesse particular, cumpre ob-
reito irrenunciável. Assim, não poderá o autor, na petição inicial, servar que a nomeação à autoria não é mais prevista no CPC/15,
ou o réu, por petição, manifestar desinteresse na composição como modalidade de intervenção de terceiro, submetendo-se à
amigável do litígio. Ademais, o comparecimento das partes à sistemática estabelecida pelos arts. 338 e 339.
audiência é obrigatório. Argumenta-se, nesse sentido, que a sistemática implantada
pela norma em comento se aplica até mesmo aos procedimen-
4.3 PRETENSÃO AUTORAL tos especiais e inclusive nos juizados especiais, justamente por
A Lei 9.099/95 admite o jus postulandi nos juizados espe- tratar-se de técnica saneadora que visa corrigir vícios para tutelar
ciais, permitindo que a parte apresente sua reclamação e realize de forma efetiva o direito material. (AURELLI, 2016, p. 494).
pessoalmente os atos processuais, podendo postular nos autos, Cumpre registrar, ainda, que a condenação nas verbas de
eletrônicos12 ou não, sem a assistência de um profissional es- sucumbência em sede de embargos à execução (quando for
pecializado e legalmente habilitado. Essa foi uma das formas cabível), constitui pedido implícito, cabendo ao juiz condenar,
encontradas pelo legislador para facilitar o pleno acesso da de ofício, a parte vencida, independentemente de requerimento
camada social menos favorecida à jurisdição, sem os entraves expresso do autor.
burocráticos do processo. É importante ressalvar que embora a
assistência de advogado seja indispensável nas causas de valor 4.4 DA RESPOSTA DO RÉU
superior a 20 salários mínimos, entende-se que a assistência Consoante o disposto no art. 30, a contestação poderá ser
obrigatória prevista no art. 9º da Lei tem lugar a partir da fase oral ou escrita e, excetuando-se a arguição de suspeição ou im-
instrutória, não se aplicando para a formulação do pedido e a pedimento do juiz, que se processará na forma da legislação
audiência inaugural (Fonaje 36). em vigor, deve conter toda a matéria de defesa, sob pena de
O pedido, quanto aos requisitos, não precisa seguir rigo- preclusão. Assim, cabe ao réu, em virtude do princípio da even-
rosamente a estrutura formal da petição inicial. Consoante a tualidade (ou da concentração) e da impugnação específica,
14 dicção normativa do art. 14, a apresentação do pedido, que alegar toda a matéria de defesa.
poderá ser feito de forma escrita ou oral (reduzido a termo), Nas hipóteses em que as audiências de conciliação, ins-
na secretaria do juizado, e redigido de maneira simples e em trução e julgamento forem realizadas em momentos distintos
linguagem acessível, além da qualificação das partes, conterá, e, apesar de a audiência inaugural ser precedida da citação da
sucintamente, os fatos e os fundamentos, o objeto e seu valor. parte demandada, a contestação poderá ser apresentada até a
Admite-se a formulação de pedido genérico quando não for audiência de instrução e julgamento, em conformidade com o
possível determinar, desde logo, a extensão da obrigação (art. Enunciado 10 do Fonaje.
14, § 2º), cabendo à parte interessada, no curso do processo, Por outro lado, não se admite, no regime dos juizados es-
chegar à determinação do valor ou à individuação do objeto, peciais cíveis, a reconvenção, nos moldes tradicionais, sendo
por ser vedado ao juiz, mesmo nessa hipótese, proferir senten- lícito ao réu, na contestação, formular pedido em seu favor, nos
ça ilíquida (art. 38, parágrafo único). Procura-se, assim, evitar a limites do art. 3º, desde que fundado nos mesmos fatos que
procrastinação desnecessária da fase executiva, com a apuração constituem objeto da controvérsia, consoante estatui o art. 31.
do valor (quantum debeatur) pela liquidação da sentença. A pretensão do réu em face do autor, que recebe o nome de
Atento às mudanças do novo CPC, convém ressaltar que a “pedido contraposto”, será formulada na própria contestação, e
reclamação do autor deverá acompanhar toda a documenta- não em peça autônoma, e deve estar fundamentada nos mes-
ção pertinente. Embora redigido de “forma simples”, o pedido mos fatos que embasam o pedido originário.
não dispensa a apresentação dos documentos fundamentais à A despeito de haver posicionamento doutrinário
propositura da ação (art. 320) e necessários à comprovação do (CHIMENTI, 1999, p. 127-128) no sentido de que a desistência
direito pleiteado pelo autor (art. 373, I). Como exemplo de do- do pedido originário, não obsta o prosseguimento do pedido
cumento indispensável à formação válida da relação processual, contraposto, a exemplo do que estabelece o art. 317 do CPC/73
pode-se citar o título executivo extrajudicial, o qual deve acom- para a reconvenção, entendemos que, havendo desistência do
panhar a petição inicial da execução, sob pena de indeferimento. autor em dar prosseguimento à ação, ou na hipótese de extin-
Deve-se recordar que o instrumento de mandato não ção do feito, com ou sem exame de mérito, deva-se extinguir
constitui documento indispensável à propositura da ação, por também eventual pedido contraposto, por não se tratar de uma
ser possível a apresentação de mandato verbal, exceto quanto ação autônoma, como é a reconvenção, existindo uma relação
aos poderes especiais (art. 105), regra que, salvo melhor juízo, de dependência e acessoriedade deste em relação ao pedido
deve-se aplicar às hipóteses de transação extrajudicial e de re- originário.
núncia ao direito sobre o qual se funda a ação. Embora o tema não tenha perdido sua importância, cumpre
O Enunciado 157 do Fonaje, por sua vez, flexibiliza a exege- salientar que o novo CPC, seguindo os passos do art. 278, § 1º,
se do art. 329 do CPC/15, permitindo o aditamento do pedido do CPC/73, e da Lei 9.099/95, prevê agora que a reconvenção

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deve ser apresentada na própria contes- dobro para recorrer ou falar nos autos. o princípio da verdade real vem se afir-
tação, passando a admitir expressamente De fato, a adoção dessa regra não é mando cada vez mais, a Lei 9.099/95 não
que o réu formule, em sua contestação, compatível com a sistemática dos juiza- se satisfaz com a mera verdade formal,
“pedido contraposto” para manifestar dos. Tanto é assim que a Lei 10.259/2001 enfatizando com mais destaque, no art.
pretensão própria, conexa com a ação (art. 9º) e a Lei 12.153/2009 (art. 7º) não 5º, o papel do magistrado participar ati-
principal ou com o fundamento da de- estabeleceram prazo diferenciado para vamente da produção da prova, em con-
fesa (art. 343). as partes. De qualquer modo, a regra sonância com o disposto no art. 130 do
A nova regra vai permitir a tutela do não se aplica ao processo eletrônico (art. CPC/73 e art. 370 do CPC/2015.
direito de forma mais célere, pois, no 229, § 2º). Desse modo, resta superada a Cabe destacar ainda, como uma das
regime anterior, a reconvenção possuía celeuma a respeito da aplicação do prazo principais novidades do novo CPC, que
natureza jurídica de “ação”, a qual exigia dobrado ao sistema dos juizados. poderá ter aplicação à sistemática dos
a intimação (citação) do autor-reconvin- juizados especiais a impossibilidade de
do, imputando-lhe os efeitos da revelia 4.6 INSTRUÇÃO PROBATÓRIA a inversão do ônus probatório ser deter-
se deixasse transcorrer in albis o prazo A instrução probatória é o momen- minada na própria sentença. Esse tema
para defesa. to adequado à demonstração da verda- tem sido objeto de intensos debates no
O § 2º do art. 343 do novo CPC, de dos fatos afirmados pelas partes. Na campo doutrinário e jurisprudencial.
no entanto, prevê expressamente que a sistemática dos juizados especiais, deve No âmbito do Código de Defesa do
desistência da ação ou a ocorrência de orientar-se a partir dos princípios elenca- Consumidor, importante parcela da dou-
causa extintiva não obsta ao prossegui- dos no art. 2º da Lei de Regência, con- trina (RODRIGUES, 2003, p. 326) sustenta
mento do processo quanto ao pedido centrando-se, em uma única audiência, que a inversão do ônus da prova prevista
contraposto. A aplicação dessa regra, no a instrução e o julgamento da causa, na no art. 6º, VIII, da referida lei, constitui re-
âmbito dos juizados, pode trazer compli- qual serão ouvidas as partes envolvidas gra de julgamento e, como tal, se reveste
cações de ordem prática na hipótese de no litígio e, depois de realizada a prova, de relevância apenas no momento da
extinção do processo com fundamento proferida a sentença, decidindo-se, nessa sentença, quando não houver prova do
no art. 51, I, gerando uma situação anô- mesma audiência, as questões inciden- fato ou for ela insuficiente, o que permi-
mala, na medida em que impossibilitaria tais que necessitam ser enfrentadas antes te ao consumidor ser beneficiado com a
o autor da ação de responder ao pedido da análise do mérito. inversão do ônus no momento do julga-
do réu, na forma estabelecida no pará- Havendo indeferimento da produção mento. Também se tem defendido que o 15
grafo único do art. 31. da prova, não cabe recurso de agravo ou saneador é o momento adequado para
Parece-nos, igualmente, significativo qualquer outro tipo de “protesto”, trasla- o juiz sinalizar a possibilidade de inver-
sublinhar que a desistência da ação inde- dando-se para a fase recursal a análise de são do ônus da prova, evitando-se desse
pende da anuência do réu (aquiescência todas as questões incidentais decididas modo a surpresa processual.
do advogado), em vista do disposto no em audiência. Observe-se que o novo CPC mantém
art. 51, I, que prevê a extinção do proces- De acordo com a Lei, a instrução a regra da distribuição estática do ônus
so quando o autor deixar de comparecer poderá ser dirigida por juiz leigo, sob a da prova (art. 373, incs. I e II), mas admi-
a qualquer das audiências do processo, supervisão de juiz togado (art. 37), não te a possibilidade de distribuição dinâmi-
sendo irrelevante a concordância da par- sendo necessária a presença do juiz toga- ca, desde que observados os requisitos
te adversa. do ou leigo na sessão de conciliação, nem estabelecidos no art. 373, § 1º.
a do juiz togado na audiência de instrução
4.5 INAPLICABILIDADE DO PRAZO EM conduzida por juiz leigo, de acordo com a 4.7 SENTENÇA
DOBRO nova redação conferida ao Enunciado 6, De acordo com o art. 38 da Lei
O novo CPC manteve a regra do no XXXVII Encontro do Fonaje. 9.099/95, a sentença mencionará os
prazo processual em dobro (art. 229) se É permitido ao juiz, quando a prova elementos de convicção do juiz, com
os litisconsortes tiverem diferentes pro- do fato exigir, inquirir técnicos de sua breve resumo dos fatos relevantes ocor-
curadores, de escritórios de advocacia confiança, facultando-se às partes a apre- ridos em audiência. Ademais, o relató-
distintos, exceto quando o processo for sentação de parecer técnico. No curso da rio não constitui elemento essencial da
eletrônico. audiência, poderá ainda o juiz, de ofício sentença, sendo, portanto, dispensado.
Sob a égide do CPC/73, indagava-se ou a requerimento das partes, realizar Desse modo, a ausência de relatório na
se teria aplicação no rito dos juizados inspeção em pessoas ou coisas, ou de- sentença não acarreta a sua nulidade. A
a regra contida no art. 191 do referido terminar que o faça pessoa de sua con- decisão deverá compreender apenas a
Código. Segundo ela, haveria prazo em fiança, que lhe relatará informalmente o fundamentação (limitada à síntese dos
dobro para recorrer e, de modo geral, verificado. E, embora não haja previsão fatos relevantes ocorridos em audiência e
para falar nos autos se os litisconsor- legal expressa, pode ele, a qualquer mo- elementos de convicção do juiz) e o dis-
tes tiverem diferentes procuradores. mento, conceder prazo adicional para a positivo e será necessariamente líquida,
Argumenta-se que a sua aplicação afron- produção de provas. possibilitando sua execução imediata. No
ta o princípio da celeridade e, por isso, Na esteira da linha adotada pelo novo CPC, o relatório só é dispensado na
não se justifica a concessão de prazo em processo civil contemporâneo, na qual hipótese do art. 770.

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Uma particularidade da Lei 9.099/95 é que a sentença po- corre-se o risco de desvirtuar a mens legis, gerando dúvidas ou
derá ser proferida pelo juiz leigo que tiver dirigido a instrução, interpretações equívocas.
decisão esta que será imediatamente submetida ao juiz togado, Merece destaque a opinião de Figueira Júnior (2007, p. 70-71)
o qual poderá homologá-la ou reformá-la parcial ou totalmente para quem os conceitos, as definições e os institutos do processo
ou, se necessário, determinar a realização de atos probatórios tradicional não se adaptam em grande parte ao novo sistema.
indispensáveis ao julgamento da causa. De acordo com esse entendimento, a aplicação supletiva do CPC
tem lugar apenas quando verificar-se lacuna ou obscuridade na
Um aspecto de suma importância e que ainda Lei dos Juizados e ainda assim deve-se buscar primeiramente no
processo tradicional a solução ao problema e somente se persistir
não está totalmente pacificado na jurisprudência
a lacuna normativa deve o juiz se pautar na analogia, nos costu-
e, principalmente, na doutrina, diz respeito à mes e nos princípios gerais de direito (art. 4º LICC).
aplicação subsidiária das normas processuais No escorreito posicionamento de Montenegro Filho (2007, p.
442), com o qual concordamos, cabe examinar a possibilidade de
estatuídas no Código de Processo Civil. aplicação subsidiária das disposições do CPC às ações que tramitam
pelo procedimento sumaríssimo, não em face de omissão legislati-
Outro dispositivo do NCPC bastante controvertido diz res- va, mas em vista da aplicação dos princípios que habitam o art. 2º
peito à obrigatoriedade de o juiz ter que enfrentar todos os ar- da Lei 9.099/95, bem assim o que consta do inc. LXXVIII do art. 5º
gumentos deduzidos no processo13, diante da regra prevista no da CF (princípio da razoável duração do processo).
art. 489, § 1º, o que pode ensejar a revisão do Enunciado 159 Dentro desse raciocínio, conclui-se que a Lei 9.099/95 per-
do Fonaje (Não existe omissão a sanar por meio de embar- mite a incidência das novas regras processuais na dinâmica dos
gos de declaração quando o acórdão não enfrenta todas as juizados especiais cíveis. Mesmo assim, ainda que haja lacuna ou
questões arguidas pelas partes, desde que uma delas tenha omissão na lei especializada, deve-se interpretar a norma à luz
sido suficiente para o julgamento do recurso). A Lei 9.099/95, dos princípios reitores do Sistema dos Juizados Especiais Cíveis,
contudo, tem características peculiares que não se coadunam sem desvirtuar seu conteúdo, não tendo incidência as normas ge-
com as novas regras e, nesse sentido, entende Perez Oliveira rais do CPC, quando atentar contra os seus princípios axiológicos.
(2015, p. 103) que a regra do art. 489, § 1º, do NCPC não se Parece-nos, todavia, que a transposição ou aplicação da nor-
aplica aos juizados especiais. mativa processual civil deve ser realizada com extrema cautela e
16 Nesse sentido, no XXXVIII Encontro do Fonaje, aprovou-se o somente quando guardar coerência e forem compatíveis com os
Enunciado 162, com o seguinte teor: Não se aplica ao Sistema princípios vetores dos juizados especiais, pois, do contrário, em
dos Juizados Especiais a regra do art. 489 do CPC/2015 diante vez de imprimir-se celeridade ao processo, corre-se o risco de
da expressa previsão contida no art. 38, caput, da Lei 9.099/95. criarem-se maiores entraves ao regular andamento processual.
Finalmente, cumpre salientar que a nova versão do CPC man- Daí já se ter afirmado, à vista do novo paradigma trazido
teve a classificação tríplice dos provimentos judiciais (art. 203). pelo CPC/15, que não há espaço para a aplicação subsidiária
do Código de Processo Civil aos Juizados Especiais, porque os
5 APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Juizados Especiais, por determinação idealizada do Legislador,
Um aspecto de suma importância e que ainda não está instituiu soluções próprias para as hipóteses não abarcadas
totalmente pacificado na jurisprudência e, principalmente, na expressamente pela Lei 9.099/95 (ANDRIGHI, 2015, p. 15).
doutrina, diz respeito à aplicação subsidiária das normas pro- Em que pesem tais considerações, vários institutos da Lei
cessuais estatuídas no Código de Processo Civil. Adjetiva Processual Civil, criados com as diversas e sucessivas
De maneira geral, a doutrina vem admitindo a aplicação alterações e modificações ao CPC revogado, foram transpostos
supletiva do macrossistema do CPC fora das hipóteses e situ- para o microssistema dos juizados, objetivando precipuamente
ações elencadas na própria Lei (arts. 30, 51, caput, 52 e 53)14 o aprimoramento dos instrumentos já existentes, em prol da
sempre que houver omissão legislativa. A respeito deste tema, otimização do processo judicial. Nesse sentido, cumpre ressaltar
a melhor orientação doutrinária posiciona-se no sentido de que que a Lei 9.099/95 não dispõe de um sistema próprio de tutelas
a subsidiariedade do CPC só pode ser aplicada naquilo que for de urgência, justificando assim sua aplicação nos procedimen-
compatível com a sistemática e os princípios informadores dos tos de competência dos juizados especiais.
juizados especiais cíveis15. Não obstante, deve-se lembrar, como bem recorda Marinoni
Ressalvando-se as hipóteses excepcionais previstas na pró- (2008, p. 80-81), que a imposição de multa já era prevista, pio-
pria Lei, o Código de Processo Civil, em regra, é inaplicável ao neiramente, na Lei dos Juizados Especiais Estaduais desde 1995,
procedimento especial dos juizados, porquanto a Lei 9.099/95 para dar efetividade às sentenças que impõem um fazer, um
contém regras próprias, admitindo-se, porém, a aplicação su- não-fazer ou a entrega de coisa (inc. V do art. 52).
pletiva nos casos omissos. Isto porque nem todas as situações O mesmo raciocínio deve-se aplicar aos procedimentos
estão previstas na lei, em função da dinâmica própria do proces- cautelares. E, aqui, deparamo-nos com outra questão: é possível
so. Não significa que se deva aplicar, indistintamente, a todos os o ajuizamento de ações cautelares nos juizados? A Lei 9.099/95
casos o regime do CPC, sobretudo quando houver disposições não cuidou dessa questão, deixando para o intérprete a solu-
específicas na Lei 9.099/95. Aplicando-se indiscriminadamente ção quanto à admissibilidade da ação cautelar (substituída pela
o CPC, sem observar os critérios estabelecidos na Lei 9.099/95, tutela de urgência) no âmbito dos juizados especiais cíveis. Na

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vigência do CPC/73, pacificou-se o en- ao magistrado mais discricionariedade e liberdade de interpretação para identificar
tendimento de que o microssistema dos ampla liberdade na atividade probatória, o sentido e o alcance da norma jurídica,
juizados não comporta o ajuizamento de possibilitando a perquirição da verdade devendo valer-se das técnicas de herme-
ações cautelares autônomas, entretanto, material por todos os meios de prova nêutica jurídica para chegar a um resulta-
o magistrado pode deferir medidas cau- moralmente legítimos, ainda que não do comum, quando a resposta não puder
telares no curso do processo, para evitar especificados em lei (art. 32). Pode o juiz ser encontrada na própria norma.
dano de difícil reparação. determinar a realização das provas que Atribui-se ao juiz a possibilidade de,
Ao contrário da Lei 9.099/95, a Lei serão produzidas oralmente, buscando fundamentadamente, adotar a decisão
10.259/01 prevê expressamente o ca- o esclarecimento dos fatos probandos que reputar mais justa e equânime, aten-
bimento de medidas cautelares no seu durante a instrução probatória e sem a dendo aos fins sociais da lei e as exigências
texto (art. 4º). Não se pode perder de necessidade de maiores formalidades, do bem comum. O novo CPC incorpora
vista as técnicas jurídicas introduzidas podendo limitar ou excluir as que consi- esse princípio, ainda que timidamente, no
nos últimos anos, gerando reflexos e im- derar excessivas, impertinentes ou prote- seu art. 8º: Ao aplicar o ordenamento ju-
pactos diretos no sistema processual da latórias (art. 33). rídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às
Lei 9.099/95. É importante referir-nos a Apesar do permissivo legal, a Lei exigências do bem comum, resguardan-
alguns desses institutos aplicados aos jui- 9.099/95 delimita os meios probatórios, vis- do e promovendo a dignidade da pessoa
zados que auxiliam na concretude desse to que não admite a prova de maior com- humana e observando a proporciona-
direito: a) a antecipação dos efeitos da plexidade. A parte, nesse caso, deve arcar lidade, a razoabilidade, a legalidade, a
tutela, podendo incluir-se nesta categoria com o ônus de, não havendo demonstra- publicidade e a eficiência.
a antecipação da tutela recursal (efeito ção do prejuízo experimentado pela vítima, O microssistema dos juizados admite
ativo do recurso); b) a aplicação da multa ter a pretensão meritória indeferida. ainda o julgamento por critérios de justi-
prevista no art. 475-J do CPC/73; c) jul- Aqui nos encontramos com um novo ça e equanimidade, consoante preconiza
gamento imediato de causas repetitivas paradigma jurídico, cuja ênfase é posta o art. 6º, podendo o juiz adotar, em cada
(improcedência liminar ou prima facie); no papel proativo do juiz na condução caso, a decisão que reputar mais justa e
d) penhora on-line; e) antecipação da tu- do processo, conferindo-lhe ampla liber- equânime, atendendo aos fins sociais da
tela específica, nos moldes do § 3º do art. dade na verificação dos fatos relevantes lei e às exigências do bem comum. Isso
461 do CPC/73. para a solução do litígio. Nesse sentido, significa que o juiz poderá buscar a solu-
Nas obrigações de fazer ou não dispõe o art. 5º da Lei que o juiz dirigirá ção mais justa e adequada às peculiari- 17
fazer ou de entregar coisa, fungível ou o processo com liberdade para determi- dades do caso concreto. Nesse particular,
infungível, poderá o juiz determinar nar as provas a serem produzidas, para a Lei 9.099/95 afasta-se dos parâmetros
a imposição de multa por tempo de apreciá-las e para dar especial valor às do processo civil, permitindo que o juiz
atraso, nos termos do art. 536, § 1º, regras de experiência comum ou téc- do processo possa adotar a decisão que
do CPC/15. Embora haja controvérsia, nica, buscando sempre a efetivação do reputar mais justa e equânime, realizan-
a intimação pessoal do executado para direito material. do a interpretação teleológica com mais
cumprir a obrigação imposta, no prazo Poderá ainda o juiz, ao tomar de- liberdade, sem estar preso a critérios
assinalado, afigura-se indispensável, por cisões, aplicar as regras de experiência de legalidade estrita, a exemplo do que
se tratar de ato personalíssimo da parte. comum ou técnica, a fim de buscar a so- ocorre nos procedimentos de jurisdição
Esta é uma condição prévia necessária à lução do litígio de uma forma mais justa voluntária, conforme o disposto no art.
exigibilidade da multa16, nos termos da e efetiva, orientado exclusivamente pelos 723, parágrafo único, do novo CPC.
Súmula 410 do STJ: A prévia intimação critérios definidos na lei.
pessoal do devedor constitui condição As regras de experiência comum, 7 CABIMENTO DAS MEDIDAS
necessária para a cobrança de multa segundo Rodrigues (2003, p. 329), são DE URGÊNCIA
pelo descumprimento de obrigação de aquelas que se desenvolvem e se adqui- No âmbito da Lei 12.153/2009, que
fazer ou não fazer. rem pela aglutinação do senso comum, dispõe sobre os juizados especiais da
da observação daquilo que ordinaria- Fazenda Pública, o art. 3º previu a pos-
6 ATIVIDADE PROBATÓRIA E PODERES mente acontece. [...] não são objeto de sibilidade de o juiz deferir, de ofício ou a
INSTRUTÓRIOS DO JUIZ prova, mas fazem parte da persuasão requerimento das partes, quaisquer pro-
É sabido que o juiz deve atuar de racional do juiz na formação do seu livre vidências cautelares e antecipatórias no
maneira imparcial e com neutralidade, convencimento motivado. curso do processo, para evitar dano de
pautando-se pela busca da verdade real, Embora os artigos já citados possam difícil ou de incerta reparação.
o que não significa dizer que não possa sugerir o contrário, é preciso lembrar que No juizado cível comum, não há pre-
determinar de ofício a realização de pro- a decisão judicial não parte de uma convic- visão expressa na Lei 9.099/95 acerca da
vas indispensáveis ao deslinde da causa. ção interna do magistrado e, portanto, deve possibilidade de as partes requererem a
Muitos doutrinadores partilham da estar lastreada em dados objetivos (docu- tutela acautelatória e a antecipatória e,
ideia de que a Lei 9.099/95, no que con- mentos, testemunhos, exame técnico etc.). dessa forma, o cabimento de pedido de
cerne à produção probatória, apresenta Sob outro prisma, o juiz, na condição liminar ou antecipação de tutela acabou
um sistema mais aberto, pois confere de destinatário das provas, detém maior sendo objeto de amplo debate na dou-

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trina especializada e jurisprudência, vindo o Enunciado 26 do pela parte. A multa, no entanto, independe de requerimento da
Fonaje a suprir essa lacuna: São cabíveis a tutela acautelatória parte, podendo ser cominada na fase de execução ainda que a
e a antecipatória nos Juizados Especiais Cíveis. sentença tenha sido omissa.
Desde então, os juizados passaram a admitir a tutela ante-
cipatória, uma das inovações processuais incluídas pela minir- 8 COMPLEXIDADE DA PROVA E NECESSIDADE DE PERÍCIA
reforma processual realizada em 1994, com a modificação ope- Conforme já explanado, o rito dos juizados especiais não
rada pela Lei 10.444/2002, que passou a admitir fungibilidade comporta a formulação de pedido que demande prova com-
das medidas cautelares e da tutela antecipada, eliminando-se a plexa e minuciosa ou que exija a nomeação de perito com
necessidade de ação cautelar para a obtenção de tutela anteci- conhecimento especializado e, desse modo, o processo não
pada. Nessa ordem de ideias, parece incoerente não conceder à poderá prosseguir quando se tratar de matéria eminentemente
parte interessada a possibilidade de interpor o recurso de agra- técnica e não houver necessidade ou for irrelevante a produção
vo, razão pela qual alguns autores entendem que a decisão que de prova testemunhal. Nesse caso, não se examinará o pedido,
defere pedido liminar ou tutela antecipada poderá ser atacada extinguindo-se o feito sem pronunciamento de mérito.
pela via do mandado de segurança. Essa sistemática adotada pela Lei, conforme aponta a dou-
trina especializada, objetiva fundamentalmente a agilização pro-
É sabido que o juiz deve atuar de maneira cessual, em linha com o princípio da celeridade inserto no art. 2º.
Há, ainda, outra interpretação possível: o acesso ao juizado
imparcial e com neutralidade, pautando-se pela
especial independe, em primeiro grau de jurisdição, do paga-
busca da verdade real, o que não significa dizer mento de custas, taxas ou despesas, e a designação de perícia
que não possa determinar de ofício a realização implica a antecipação de numerários para custeio de despesas
e honorários de perito e o adiantamento destas pela parte que
de provas indispensáveis ao deslinde da causa. houver requerido a perícia (CPC/2015, art. 95).
Assim, dadas as dificuldades de ordem prática que podem ser
Segundo Montenegro Filho (2007, p. 442-443), a resistên- geradas, sabendo-se que, apesar de ser ônus do Estado arcar com
cia ao deferimento da tutela antecipada no ambiente dos juiza- os honorários periciais, na condição de beneficiário de gratuidade
dos está fundamentada em duas alegações: a) que o instituto de justiça, a postulação de perícia encontra-se repleta de dificul-
não se encontra expressamente previsto na Lei 9.099/95; b) que dades, o legislador andou bem ao considerar que a complexidade
18 o eventual deferimento da tutela antecipada deveria ser acom- da causa afasta a competência dos juizados especiais.
panhado da possibilidade de o interessado interpor o recurso Cumpre ressaltar que a Lei 9.099/95 faculta ao juiz, quando
de agravo para combater a decisão interlocutória. a prova do fato exigir, a inquirição de técnicos de sua confiança,
O novo CPC alterou significativamente a sistemática de pro- permitida às partes a apresentação de parecer técnico (art. 35,
cessamento da agora chamada “tutela provisória”, que pode ser caput), o que significa dizer que não há propriamente uma proi-
concedida com fundamento na urgência (art. 300) ou na evidên- bição de que o juiz admita a prova pericial.
cia (art. 311). Como adverte Didier Jr. (2007, p. 187): Não é correto afir-
No novo CPC, a medida cautelar e a antecipação de tutela mar que não se admite prova pericial no âmbito dos Juizados
passam a integrar o gênero “medidas de urgência”. A “tutela Especiais Cíveis. O art. 35 da Lei Federal n. 9.099/1995 prescre-
da evidência”, que substitui a antecipação de tutela, concebida ve que “quando a prova do fato exigir, o Juiz poderá inquirir
para antecipar os efeitos da decisão de mérito, constitui um im- técnicos de sua confiança, permitida às partes a apresentação
portante instrumento de técnica processual, sendo cabível no de parecer técnico”. O procedimento da perícia é, sem dúvida,
âmbito dos juizados, desde que sua concessão fique subordina- mais simples, consistindo na inquirição direta do profissional,
da aos requisitos legais do art. 311 do novo CPC. mas isso não significa que não se admite a perícia.
Gize-se, ademais, que a atual regra disposta no parágrafo Quando a demanda não envolver prova de maior comple-
único do art. 494, segundo a qual o magistrado não poderá xidade, é perfeitamente possível a inquirição de técnicos, objeti-
decidir qualquer matéria sem antes submetê-la ao contraditó- vando maiores esclarecimentos acerca dos fatos, inclusive, com
rio das partes, não se aplica aos casos de tutelas provisórias de a apresentação de pareceres técnicos, na forma do art. 35 da Lei
urgência (art. 300, § 2º). 9.099/95. Na realidade, o que a Lei não contempla é a produ-
Embora possa parecer óbvio, o modelo de processo deli­ ção de prova técnica de maior complexidade, pelos motivos e
neado pela Lei 9.099/95 não permite a concessão de tutela pro- razões já expostos. A perícia informal é admissível, como, aliás,
visória de urgência, em caráter antecedente, considerada como reconhece o Enunciado 12. Deve-se ressaltar ainda que a me-
uma das principais inovações do CPC/15, por ter regramento in- nor complexidade da causa para a fixação da competência é
compatível com a sistemática concentrada e célere dos juizados aferida pelo objeto da prova e não em face do direito material
especiais. Nesse sentido, dispõe o Enunciado 163 do Fonaje: Os (Enunciado 54 do Fonaje). Portanto, não é a causa em si que é
procedimentos de tutela de urgência requeridos em caráter an- complexa, mas a prova a ser produzida.
tecedente, na forma prevista nos arts. 303 a 310 do CPC/2015, Apesar de não ser possível a realização de prova pericial
são incompatíveis com o Sistema dos Juizados Especiais. complexa, não haverá incompetência dos juizados por neces-
Vale lembrar ainda que a tutela provisória não pode ser sidade de perícia quando os documentos juntados aos autos
concedida de ofício pelo magistrado, devendo ser requerida forem suficientes ao deslinde da causa ou quando, por exem-

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plo, for inequívoco o fato de o produto (Enunciado 97) 19. Porém, com relação § 1º); b) intimação do réu-devedor para
ter apresentado defeito, hipótese em que à incidência da multa, deve-se destacar pagar o valor ao qual foi condenado no
o juiz, aplicando as regras de experiên- que o trânsito em julgado da sentença, prazo de 15 dias; c) o réu é condenado
cia comum ou técnica, terá competência quando prolatada em audiência pelo juiz à revelia e, nesse caso, o prazo para o
para apreciar a demanda, devendo afas- togado, fluirá de imediato, sem necessi- réu revel independe de intimação; d) in-
tar eventual preliminar de incompetência dade de nova intimação (art. 52, III). timação da parte executada para pagar o
do juizado especial cível pela complexi- Apesar das polêmicas em torno do valor remanescente no prazo de 15 dias.
dade da causa. assunto, o novo CPC põe fim à celeuma, Conforme esclareceu o Enunciado
considerando suficiente a intimação do 97 do Fonaje, nada impede que o valor
9 CUMPRIMENTO DO COMANDO JUDICIAL devedor pelo seu advogado (art. 513, da cominação imposta venha a exceder o
Como já dito alhures, o juizado é § 2º, I), salvo quando representado pela da ação principal, tendo em vista a natu-
igualmente competente para a execução Defensoria Pública ou quando não tiver reza da tutela de urgência, cujo principal
de suas sentenças (art. 3º, § 1º, I), bem procurador constituído nos autos, valori- objeto é forçar o cumprimento da obri-
como dos títulos executivos extrajudiciais, zando, assim, os princípios da celeridade gação de fazer, ou não fazer, imposta ao
no valor de até 40 vezes o salário mínimo e da razoável duração do processo. Por demandado, quando houver resistência
(art. 3º, § 1º, II). Contudo, a instauração razão óbvia, a disposição do art. 513, ou mora de sua parte.
da execução depende de requerimento § 2º, IV (intimação por edital) não terá Portanto, havendo o descumprimen-
do credor (art. 52, IV), não se distan- aplicação ao microssistema dos juizados, to da decisão, e, mesmo tendo ciência
ciando, nesse ponto, da sistemática do ante a impossibilidade de citação editalí- inequívoca da penalidade imposta e das
CPC/73, expressa no art. 475-J e repetida cia na fase de conhecimento. consequências advindas, a parte obriga-
pelo art. 523 do CPC/2015. A nova regra prevista no art. 523, da não cumprir a obrigação, o credor
Conforme dispõe o art. 52, a execu- § 1º, do CPC/2015, ampliou a regra ante- poderá requerer a elevação da multa ou
ção da sentença processar-se-á no pró- rior, prevendo que, não ocorrendo paga- a transformação da condenação em per-
prio juizado, aplicando-se, “no que cou- mento voluntário no prazo de 15 dias, o das e danos, na forma disposta no art.
ber”, o disposto no Código de Processo débito será acrescido de multa de 10% e, 52, V, da Lei 9.099/95.
Civil, com as alterações contidas na pró- também, de honorários de advogado de Sem embargo, pode o juiz, em uma
pria lei. Segundo o disposto nesse artigo, 10%. Há quem sustente que, apesar de situação concreta, majorar ou reduzir o
pode-se chegar a duas conclusões: a) o não ser prevista a condenação em hono- valor da multa arbitrada, de ofício ou a 19
juizado especial cível é competente para rários na sentença de primeiro grau, por requerimento da parte prejudicada, caso
a execução de seus julgados (art. 3º, disposição expressa do art. 55, é possível venha a verificar que o valor da multa se
§ 1º); b) a lei dispõe de um procedimen- trasladar-se essa técnica para o âmbito tornou insuficiente ou excessivo.
to executivo próprio que é subsidiado, no da Lei 9.099/95, como forma de coagir Por último, deve-se mencionar que,
que couber, pelo CPC. o devedor ao pagamento do débito, sen- havendo a composição cível dos danos,
A execução do julgado também deve do em sentido contrário o entendimento no ambiente dos juizados criminais, a
orientar-se pelos princípios gerais men- defendido no Enunciado 97 do Fonaje. execução da sentença também se pro-
cionados no art. 2º da Lei 9.099/95, que, Portanto, no âmbito dos juizados es- cessará nos juizados cíveis, nos termos
muito antes da reforma introduzida pela peciais, depois de realizada a intimação, do art. 74 da Lei 9.099/95. Portanto, a
Lei 11.232/2005, já se qualificava como o devedor poderá adotar alguma das homologação do acordo civil pelo juiz
uma complementação do processo de seguintes condutas: a) pagar o valor ao configura sentença à qual a lei confe-
conhecimento17, dispensando nova cita- qual foi condenado, no prazo de 15 dias re eficácia de título executivo judicial.
ção da parte obrigada para cumprimen- após o trânsito em julgado da decisão; (GRINOVER et al., 1999, p. 130).
to da sentença no prazo de quinze dias b) provar que pagou, juntando aos autos
(FERREIRA, 2011, p. 57). o comprovante de depósito; c) deposi- 10 SISTEMA RECURSAL
Nesse contexto, deve-se recordar tar apenas parte do valor devido, sendo, Como já mencionado, na fase re-
que o STF firmou entendimento no sen- nesse caso, devida a multa do art. 523, cursal é indispensável a representação
tido de considerar desnecessária a inti- § 1º, sobre a diferença a ser paga; d) por advogado, qualquer que seja o valor
mação pessoal do devedor para início não depositar o valor devido no prazo atribuído à causa. Entendeu o legislador
do prazo previsto no art. 475-J do CPC assinalado. que, nessa fase processual, a parte não
revogado, bastando sua intimação na Dito isto, teremos, basicamente, dispõe de conhecimento técnico sufi-
pessoa de seu advogado constituído nos quatro situações possíveis: a) decurso ciente e, por isso, deve comparecer ao
autos. Por outro lado, depois da reforma automático do prazo para cumprimento processo acompanhado de profissional
empreendida pela Lei 11.232/2005, su- voluntário quando fica o réu-devedor, já habilitado a oferecer-lhe defesa técnica
fragou-se, no âmbito do Fonaje, a tese de na sentença, ciente de que deverá pagar de qualidade (advogado inscrito nos
que o artigo 475-J do CPC/7318 teria apli- o valor ao qual foi condenado no prazo quadros da OAB ou defensor público).
cação aos juizados especiais, ainda que o de 15 dias após o trânsito em julgado, A representação processual, por-
valor da multa somado ao da execução sob pena de incidência de multa de 10% tanto, constitui requisito indispensável à
ultrapasse o valor de 40 salários mínimos sobre o valor da condenação (art. 523, admissibilidade do recurso, a ensejar a

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deserção automática do referido recurso em caso de descum- introduzida pelo CPC/15, no tocante ao juízo de admissibilidade
primento da norma. da apelação, o qual passa a ser realizado no juízo ad quem (art.
A interposição do recurso está sujeita ao pagamento de cus- 1.010, § 3º), o juízo prévio de admissibilidade do recurso, nos
tas, podendo, no entanto, ser dispensada quando o recorrente juizados especiais cíveis, será feito em primeiro grau (Enunciado
for pobre na forma da lei. Com efeito, concede-se ao recorrente 166 do Fonaje).
hipossuficiente, beneficiário da assistência judiciária gratuita, a
isenção do pagamento das custas processuais, com fulcro no 11 PRINCIPAIS ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS NO ÂMBITO
art. 54, parágrafo único. DOS JUIZADOS
A Lei 9.099/95 procurou simplificar o sistema recursal ado- O CPC/15 promoveu alterações pontuais na Lei 9.099/95,
tado pelo Código de 1973 prevendo basicamente dois recursos: cabendo destacar, dentre elas, as seguintes: a) aplicação do in-
a) recurso inominado; b) embargos de declaração. Assim, em cidente de resolução de demandas repetitivas aos processos em
harmonia com o princípio da unirrecorribilidade ou unicidade tramitação nos juizados especiais e respectivas turmas recursais
do recurso, a sentença de mérito proferida em primeiro grau (art. 985, I); b) modificação redacional de artigos que tratam dos
pode ser impugnada por meio de embargos de declaração e embargos declaratórios; c) preservação da competência dos jui-
subsequente recurso inominado endereçado à turma recursal zados especiais cíveis para as causas referidas no art. 275, II, do
nos prazos previstos para interposição dos respectivos recursos: CPC/73; d) previsão expressa acerca da possibilidade de aplicação
embargos de declaração, no prazo de 5 dias, e recurso inomina- do incidente de desconsideração da personalidade jurídica.
do, no prazo de 10 dias. A modificação introduzida pela Lei 8.950, de 1994, dispon-
O recurso inominado serve para impugnar os fundamentos do que os embargos declaratórios interrompem o prazo para
da sentença e será recebido, em regra, somente no efeito de- a interposição de outros recursos, por qualquer das partes,
volutivo (art. 43), não se prestando para atacar as decisões in- acabou produzindo dúvidas, gerando-se assim uma grande in-
terlocutórias, embora estas possam ser impugnadas nas razões coerência, pois, até a alteração promovida pela Lei 13.105/15,
recursais. O art. 41, por sua vez, estabelece a irrecorribilidade manteve-se a redação original da Lei 9.099/95, admitindo-se a
das decisões interlocutórias, não se admitindo sequer a impetra- interposição de embargos quando houvesse “dúvida” (hipóte-
ção de mandado de segurança contra decisões interlocutórias se suprida pela Lei 8.950, de 1994), bem como a suspensão
proferidas no âmbito dos juizados especiais (Luiz Fux, Acordão do prazo. Em boa hora, o novo CPC atualiza a Lei 9.099/95,
eletrônico DJE 247, public. 18/12/2012). ajustando-a aos casos previstos no Código de Processo Civil,
20 Nesse sentido, confira-se o seguinte precedente firmado uniformizando a sistemática do referido recurso.
em repercussão geral: EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. O capítulo das “Disposições finais e transitórias” modifica,
PROCESSO CIVIL. REPERCUSSÃO RECONHECIDA. MANDADO DE portanto, os arts. 48 e 50 da Lei 9.099/95. Com essas alterações,
SEGURANÇA. CABIMENTO. DECISÃO LIMINAR NOS JUIZADOS os embargos de declaração serão cabíveis contra sentença ou
ESPECIAIS. LEI N. 9.099/95. ART. 5º, LV, DA CONSTITUIÇÃO acórdão das turmas recursais, nas hipóteses previstas no Código
DO BRASIL. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA. de Processo Civil (art. 1.022), não possuem efeito suspensivo
AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO. 1. Não cabe mandado de seguran- e interrompem o prazo para a interposição de recurso (art. 50
ça das decisões interlocutórias exaradas em processos submeti- com redação dada pela Lei 13.105/15).
dos ao rito da Lei n. 9.099/95. 2. A Lei n. 9.099/95 está voltada As mudanças em relação ao texto da Lei 9.099/95, consigna-
à promoção de celeridade no processamento e julgamento de das expressamente no texto, foram poucas. Além das alterações
causas cíveis de complexidade menor. Daí ter consagrado a re- referentes aos embargos declaratórios, prevê o art. 1.063 das
gra da irrecorribilidade das decisões interlocutórias, inarredável. “Disposições finais e transitórias” que, até a edição de lei especí-
3. Não cabe, nos casos por ela abrangidos, aplicação subsidiá- fica, os juizados especiais cíveis previstos na Lei n. 9.099, de 26
ria do Código de Processo Civil, sob a forma do agravo de instru- de setembro de 1995, continuam competentes para o processa-
mento, ou o uso do instituto do mandado de segurança. 4. Não mento e julgamento das causas previstas no art. 275, inciso II,
há afronta ao princípio constitucional da ampla defesa (art. 5º, da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973, o que provocará uma
LV, da CF), vez que decisões interlocutórias podem ser impug- adaptação da Lei dos Juizados à nova lei processual civil.
nadas quando da interposição de recurso inominado. Recurso No art. 1.062, o novo CPC expressamente prevê a possibili-
extraordinário a que se nega provimento. (RE 576.847, Rel. Min. dade de o juiz, nos autos da própria ação, determinar a instaura-
Eros Grau). ção do incidente de desconsideração da personalidade jurídica,
Conforme destaca o relator, o uso do mandado de seguran- na forma dos arts. 133 a 137 do NCPC, a pedido da parte ou
ça nessa hipótese importaria a ampliação da competência dos do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.
juizados especiais. Destaquem-se, ainda, a Súmula 376 do STJ e A regra atual encontra-se em consonância com o entendimento
os Enunciados 62 e 124 do Fonaje. assente nos juizados, verbalizada no Enunciado 60: É cabível a
Nessa linha, o atual CPC, ao restringir o cabimento do agra- aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, inclusi-
vo de instrumento, dispõe que as questões resolvidas na fase ve na fase de execução.
de conhecimento que não comportarem agravo de instrumento
não são cobertas pela preclusão e devem ser suscitadas em pre- 12 A TÍTULO DE CONCLUSÃO
liminar de apelação (art. 1.009, § 1º). O século XXI é marcado por profundas e significativas mu-
Por fim, deve-se mencionar que, a despeito da modificação danças sociais, tecnológicas e científicas, nos mais diversos âm-

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o único e melhor meio de pacificação de Fórum Nacional dos Juizados Especiais


bitos de nossa sociedade. conflitos dentro de uma sociedade torna-se Federais (Fonaje): No caso de litisconsórcio
Em plena era digital, as atividades cada vez mais arcaico, moroso e irracional pelo ativo, o valor da causa, para fins de fixação de
transcorrem em ritmo acelerado, e as in- motivo de que, atualmente, a conciliação tem- competência, deve ser calculado por autor.
se tornado palavra cada vez mais frequente 10 O Enunciado 298 do Fórum Permanente de
formações movimentam-se velozmente.
no vocabulário jurídico. (FERREIRA MACEDO, Processualistas Civis (FPPC) estabelece que
Paradoxalmente, percebe-se um aumen- 2011, p. 83). a audiência de saneamento e organização
to exponencial das demandas judiciais, 3 Cumpre aqui fazer uma distinção entre do processo em cooperação com as partes
situação que pressupõe novos desafios a os juizados especiais (CF, art. 91, I) e os poderá ocorrer independentemente de a
juizados de pequenas causas (CF, art. causa ser complexa.
serem suplantados pelo Poder Judiciário 24, X). Conforme interpretação do STF 11 Como destaca a doutrina (SILVA; GOMES, 2009,
que, lamentavelmente, ainda não possui (ADIn 1.127/DF, Rel. Min. Paulo Brossard, p. 48), o princípio da oralidade guarda estreita
aparato suficiente para atender a toda 28.09.1994), os juizados de pequenas relação com outros princípios da imediação
causas compreendem os órgãos judiciários (ou da imediatidade), da identidade física do
essa demanda reprimida. instituídos antes da Carta de 1988, pela juiz, da concentração e da irrecorribilidade das
Criados para o julgamento das cau- Lei 7.244/84, com alçada jurisdicional interlocutórias.
sas cíveis de menor complexidade, o determinada pelo valor patrimonial da lide 12 Sobre essa matéria, o CNJ determinou,
e desprovidos de competência na esfera no Pedido de Providências n. 0007318-
microssistema dos juizados veio ampliar
criminal. Os juizados especiais, por sua vez, 15.2010.2.00.0000, ao Tribunal Regional
o acesso do cidadão à Justiça, visando são juízos competentes para a conciliação, Federal da 2ª Região que procedesse ao
à obtenção rápida e eficaz da tutela julgamento e execução de causas cíveis de cadastramento das partes não assistidas
jurisdicional. A despeito das celeumas menor complexidade e infrações penais de por advogado nos processos dos juizados
menor potencial ofensivo. No ordenamento especiais, para fins de acesso ao sistema de
geradas em torno dos principais aspec- anterior, os Estados federados estavam peticionamento eletrônico. Na ADI 3.168 (STF),
tos e, mesmo, das posições doutrinárias autorizados a criar juizados de pequenas que precedeu a discussão desse tema, o STF
que deram origem a interpretações con- causas segundo seus próprios critérios firmou o entendimento de que perante os
de conveniência e no âmbito de sua juizados especiais federais, em processos de
trovertidas e em desacordo com a real competência concorrente, ainda que não natureza cível, as partes podem comparecer
vontade do legislador (mens legislato- houvesse lei federal sobre a matéria. Com pessoalmente em juízo ou designar
ris), o certo é que a Lei 9.099/95 sofreu a edição da Lei 9.099/95, que unificou os representante, advogado ou não, desde que
juizados de pequenas causas e os juizados a causa não ultrapasse o valor de 60 salários
poucas alterações desde que foi san- especiais cíveis (CF, art. 91, I), a Lei 7.244/84 mínimos (art. 3º da Lei 10.259/2001) e sem
cionada e vem cumprindo o papel que ficou revogada expressamente. Com o prejuízo da aplicação subsidiária integral dos
ensejou sua criação no Brasil. A Lei foi advento da Lei federal 7.244, de 7/11/1984, parágrafos do art. 9º da Lei 9.099/1995 (ADI
aclamada em todo o País por introduzir introduzia-se no Brasil uma forma de justiça 3.168, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento
alternativa, despida de formalismo próprio em 8/6/2006, Plenário, DJ de 3/8/2007).
no cenário jurídico mecanismos mais 21
das cortes de justiça ordinária e [...] com o 13 O dispositivo, entretanto, divide opiniões
eficientes e eficazes que possibilitam o nítido sentido de justiça conciliativa, menos quanto a sua constitucionalidade, havendo
acesso rápido à Justiça. técnica e mais democrática. (SILVA; GOMES, (na sistemática atual) inúmeras decisões que
2009, p. 78-79). entendem que a motivação concisa, porém
O NCPC vem ao encontro das no- 4 Como ressalta Assis (2014, p. 30): Os juizados suficiente para demonstrar a convicção do
vas tendências do moderno processo especiais se destinavam, originariamente, a julgador, não gera a nulidade da sentença.
civil, de modo a torná-lo mais ágil. aumentar a oferta jurisdicional, gerando um 14 A Lei 12.153/2009, que dispõe sobre os
grau maior de pacificação social e solucionando, juizados especiais da Fazenda Pública, em seu
Não podemos esquecer, em razão do com brevidade e custos mínimos, econômicos art. 27, dispõe expressamente que se aplica
advento da Lei 13.105/15, que o rito e sociais, conflitos que, em geral, não obtinham subsidiariamente o disposto nas Leis 5.869, de
procedimental dos juizados especiais sequer solução pelos órgãos tradicionais. Visam 11 de janeiro de 1973 – CPC, 9.099/95 e Lei
cíveis possui um sistema próprio e os juizados especiais a abrandar o fenômeno 10.259/2001.
da litigiosidade contida. 15 Corroborando esse entendimento, dispõe
uma dinâmica bastante peculiar, in- 5 Para suprir a omissão do legislador, o primeiro o Enunciado 161 do Fonaje: Considerado
conciliável com o formalismo exacer- encontro do Fórum Nacional de juizados o princípio da especialidade, o CPC/2015
bado ou com atos e procedimentos especiais (Fonaje), em 1997, aprovou o somente terá aplicação ao Sistema dos
seguinte enunciado: O exercício do direito de Juizados Especiais nos casos de expressa
incompatíveis com o espírito da Lei ação no juizado especial cível é facultativo para e específica remissão ou na hipótese de
9.099/95, que visa, acima de tudo, ao o autor (Enunciado 1). compatibilidade com os critérios previstos no
melhoramento e à entrega da presta- 6 Como bem destaca Figueira Júnior (2007, art. 2º da Lei 9.099/95.
p. 89), a própria lei elenca várias hipóteses em 16 Assim, caso não tenha havido a prévia
ção jurisdicional em tempo razoável e que o processo poderá ser extinto e remetido à intimação pessoal do devedor, não será cabível
de modo eficaz. Justiça não especializada. a cobrança das astreintes [...] a inobservância
7 A Lei 9.245, de 26 de dezembro de 1995, da forma da intimação prescrita – que, no caso
reformou o procedimento sumaríssimo, que em análise, é a pessoal –, provoca a nulidade
passou a se chamar “procedimento sumário”. do ato e de todos aqueles que lhe forem
NOTAS 8 Deve-se lembrar que o valor da causa subsequentes (VILLAR, 2015, p. 280).
1 O novo CPC (Lei 13.105/2015) entrou em vigor corresponde ao proveito econômico 17 A partir da Lei 11.232 de 2005, o processo
em 16 de março de 2016 e substituiu o anterior, perseguido no processo, conforme Enunciado tornou-se sincrético, acabando-se com
de 1973. A aprovação do novo texto sucedeu ao 39 do Fonaje. Pode-se mencionar, a título de a distinção clássica entre processo de
mesmo tempo em que a Lei 9.099/95 completava exemplo, a ação de restituição dos valores conhecimento e processo de execução.
vinte anos de vigência. De acordo com o art. pagos a título de comissão de corretagem, Escrevemos sobre esse tema na Revista CEJ,
1.046, § 1º, as disposições do CPC/73, relativas hipótese em que o valor da causa não Brasília, Ano XIII, n. 47, p. 32-36, out./dez. 2009.
ao procedimento sumário e aos procedimentos corresponde ao valor do contrato, mas ao valor 18 Como lembra Perez Oliveira (2015, p. 100),
especiais que forem revogadas, aplicar-se-ão às efetivamente pago, podendo a ação seguir o exemplo profícuo do debate sobre a aplicação
ações propostas e não sentenciadas até o início rito da Lei 9.099/95 se o valor não ultrapassa subsidiária do CPC aos juizados especiais
da vigência deste Código. o limite de alçada dos juizados especiais. cíveis se deu quando da alteração das normas
2 A construção do preceito do processo ser 9 Conforme consta do Enunciado 18 do 2º processuais geradas pela Lei n. 11.232/2005, que

Revista CEJ, Brasília, Ano XX, n. 70, p. 7-22, set./dez. 2016


Cláudio Antônio de Carvalho Xavier

acrescentou o art. 475-J ao diploma processual NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código
[...]. Sustentando a tese de que os preceitos de processo civil : Lei 13.105/2015. Rio de Janeiro:
incorporados ao texto do CPC/73 aplicavam-se Forense; São Paulo: Método, 2015.
aos juizados, Montenegro Filho (2007, p. 77) PEREZ OLIVEIRA, Eduardo. O dever de motivação
argumenta que a aplicação subsidiária do CPC das sentenças no novo CPC – impacto no micros-
tem por escopo a preservação dos interesses dos sistema dos juizados especiais (cíveis, federais e da
credores. Fazenda Pública). In: DIDIER JR., Fredie (Coord.).
19 O mesmo entendimento se aplica à multa Coleção Repercussões do Novo CPC, v. 1. Salvador:
cominatória, nos termos do Enunciado 144 Juspodivm, 2015. p. 97-103.
do Fonaje: A multa cominatória não fica RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de direito
limitada ao valor de 40 salários mínimos, processual civil. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribu-
embora deva ser razoavelmente fixada pelo nais, 2003. v. 1.
Juiz, obedecendo ao valor da obrigação SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho. Lei dos
principal, mais perdas e danos, atendidas as Juizados especiais cíveis anotada: doutrina e juris-
condições econômicas do devedor. O Fonajef prudência de 21 estados da Federação. São Paulo:
também editou o Enunciado 65, do seguinte Saraiva, 1999.
teor: Não cabe a prévia limitação do valor da SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, GOMES; Fábio
multa coercitiva (astreintes), que também não Luiz. 5. ed. Teoria geral do processo civil. São Pau-
se sujeita ao limite de alçada dos Juizados lo: Revista dos Tribunais, 2009.
Especiais Federais, ficando sempre assegurada TOURINHO NETO, Fernando da Costa. Juizados
a possibilidade de reavaliação do montante especiais estaduais cíveis e criminais: comentários
final a ser exigido na forma do parágrafo 6º à Lei 9.099/1995. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tri-
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Revista CEJ, Brasília, Ano XX, n. 70, p. 7-22, set./dez. 2016

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