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6/10/2020 Eixos de Luta e a Central de Movimentos Populares

Eixos de Luta e a Central de Movimentos Populares


Euclides André mance
CMP - Curitiba, PR

INTRODUÇÃO

O modo de articulação dos diversos movimentos populares e de unificação de lutas deve ser
definido a partir da elaboração de uma estratégia global que possibilite o avanço concreto de
suas lutas específicas e imediatas rumo à transformação das estruturas do capitalismo, a fim de
superá-lo, compondo, portanto, a realização dos objetivos conjunturais com o acúmulo de forças
para a realização dos objetivos históricos. As propostas que afirmam ser necessário organizar os
movimentos populares por local de moradia ou por eixos de luta, advém da compreensão
diferenciada do papel dos movimentos populares no enfrentamento do capitalismo.

Por outro lado, os objetivos que os movimentos perseguem e o modo de organizarem o povo na
luta por tais objetivos estão vinculados, explícita ou implicitamente, a determinadas estratégias e
projetos políticos. Algumas dessas estratégias são constituídas democraticamente pelos
movimentos; outras são elaboradas no interior de partidos, igrejas e tendências, definindo o
papel e o modelo de organização para os movimentos que passam a ter uma função tática na
realização de tais estratégias.

Como toda luta, ou ação dos movimentos populares contribui para a implementação de um
determinado projeto político, para que possamos tratar corretamente de nosso tema -
apresentando a proposta de organização dos movimentos populares a partir de eixos estratégicos
de luta que lhes possibilitem potencializar o seu enfrentamento do capitalismo -, será necessário
compreender o que significa a ação histórica de tais movimentos como um dos momentos de
enfrentamento estrutural do capitalismo. Para tanto será necessário a análise do sistema
capitalista como totalidade estruturada, o que significa, entre outras coisas, analisar o seu modo
de reprodução como um todo, bem como compreender a relação entre a ação dos movimentos
populares e a efetivação de projetos políticos e estratégias partidárias de manutenção ou de
transformação do capitalismo. Com esse intuito, faremos uma análise da reprodução do
capitalismo, tanto na exploração da força de trabalho quanto na exploração da reprodução social
da força de trabalho, como também da dominação cultural e do papel do Estado. Na seqüência
analisaremos a constituição dos eixos de lutas para seu enfrentamento, bem como, duas
estratégias que propõem modelos de organização distintos para o conjunto dos movimentos
populares em função de tal enfrentamento. Em seguida apresentamos uma proposta de estrutura
organizativa para a Central de Movimentos Populares.

1. MOVIMENTO POPULAR, PROJETOS POLÍTICOS E ESTRATÉGIAS


PARTIDÁRIAS

Se por um lado é consenso afirmar que a luta pela conquista de objetivos imediatos desenvolvida
pelos movimentos populares contribui para a implementação de projetos políticos, por outro
lado, nem todos têm a clareza de distinguir os projetos políticos e suas estratégias de realização
dos projetos e estratégias partidárias, sindicais e de movimentos populares.

O objetivo dos projetos políticos é alcançar ou manter uma certa organização da sociedade;
organização essa que significa o modo de produção das riquezas materiais e culturais necessárias
à satisfação das necessidades e desejos humanos, bem como, de circulação e distribuição dessas
riquezas, e ainda da maneira de governar sobre a organização dessa sociedade. A palavra
POLÍTICO, deriva de POLIS, que não significa apenas CIDADE, mas uma forma de
organização da convivência entre as pessoas, isto é, da organização da sociedade, em seus
aspectos econômicos, culturais, de gestão do poder, etc.
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No Brasil das últimas décadas foram sendo delineados três projetos políticos que ganharam
contornos um pouco mais definidos no período eleitoral de 1989.

Um primeiro projeto político propõe a abertura total da economia brasileira aos interesses do
capital internacional, defende o "livre-mercado", a redução do controle estatal sobre a economia,
inclusive em áreas estratégicas. Tal projeto que ganhou expressão no Brasil - em certo sentido -
com o Governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira, com a ampla instalação das multinacionais
no país com inúmeros privilégios ,é retomado vigorosamente com o neoliberalismo do Governo
Collor, tendo como expressão partidária os partidos de direita - ente outros, PDS, PFL, PL, PRN,
PTB e setores do PMDB -, como expressão sindical a Força Sindical, a USI, e como expressão
frustrada a nível de movimento popular o arremedo de constituição da Confederação Brasileira
das Associações de Moradores ( COBRAM ) - hoje praticamente inexistente.

Um segundo projeto político propõe a reforma parcial do capitalismo, defendendo os interesses


do capital nacional, diminuindo um pouco a concentração de renda, diminuindo os graves
conflitos sociais e os riscos de revoltas mais graves, assegurando alguns direitos sociais à
população, mas mantendo a exploração no trabalho e do consumo em um nível que garanta a
classe dominante permanecer com seus privilégios. Uma das vertentes de tal projeto nacionalista
remonta às décadas de 30 e 50 e mais recentemente ao governo de João Goulart. Tal projeto é
retomado atualmente pela Social-Democracia, tendo como Expressão partidária o PDT e o
PSDB, com pouca implantação a nível de movimento sindical, e a nível de movimento popular
dividindo a direção da Confederação Nacional das Associações de Moradores (CONAM).

O terceiro projeto político nasceu das lutas dos movimentos sociais a partir da metade da década
de 70 que partindo das lutas por melhores condições de vida para a população avançou no
enfrentamento da ditadura militar exigindo a democratização real da sociedade brasileira, a
constituição de uma sociedade socialista, formulando o projeto político democrático-popular. Tal
projeto político tem como expressão partidária o P.T., também a ele se aglutinando
progressivamente o PCB, PCdoB, PV e o PSB; tem como expressão sindical a CUT e a nível de
movimento popular a Pró-Central de Movimento Popular.

Na implementação de cada um desses três projetos políticos existem - segundo a correlação que
apresentamos para debate - diversos atores sociais, partidos, movimentos sindicais e populares,
entre muitos outros.

A grande diferença entre os diversos partidos que se aglutinam em torno desses três projetos
reside na estratégia partidária que adotam na implementação do projeto político que defendem,
nas diferenças de análise da estrutura de funcionamento do capitalismo, na compreensão na
correlação de forças na sociedade e dos métodos para alterá-la.

Claro está que toda prática de cooptação, clientelismo e assistencialismo adotada pelos partidos
de direita e lideranças populares contribuem para a implementação do projeto político de
manutenção do sistema como um todo ou de sua reforma superficial. Nestes casos o movimento
popular tem um papel tático na eleição de certos políticos e partidos, na implementação de
certos programas governamentais, etc.

Por outro lado, na implementação das estratégias partidárias que buscam a superação do
capitalismo encontramos a atribuição de diferentes papéis aos movimentos sindicais e
populares.

As estratégias de alguns partidos de esquerda acentuadamente marcados por teses de


centralismo, atribuem ao Partido Político e à sua direção o papel de vanguarda primeira e
direção de todo o processo revolucionário, que tem por ator principal o movimento operário e
que supõem um momento de transição para uma nova sociedade sob a direção de um único
partido. Aos movimentos sindicais e populares cabe a implementação das estratégias de tal
partido, especialmente combatendo ou apoiando respectivamente os inimigos ou aliados do
partido, sejam permanentes ou conjunturais, fazendo manifestações de massa, levando à
população as palavras de ordem do partido, acentuadamente nos períodos eleitorais.

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Para realizar tais tarefas ao âmbito do movimento popular foram organizados, por exemplo, na
Capital de São Paulo em 1945 os Comitês de Defesa Popular, os CDP's, que duraram até 1947,
servindo de inspiração para os posteriores Comitês Distritais e de certas práticas das SABs -
Sociedades Amigos de Bairros.

Por atribuir um papel tático ao movimento popular no enfrentamento do capitalismo e


compreender a revolução a partir de uma direção centralizada rigidamente, tais partidos
propõem como modelo organizativo para o movimento popular uma estrutura extremamente
verticalizada e hierarquizada, devendo as decisões das instâncias superiores - as que estão mais
próximas do topo da estrutura - serem implementadas pelas instâncias inferiores, mais próximas
à base da estrutura. Como o que importa é mobilizar taticamente a massa, implementando
sigilosamente - na maioria das vezes - a estratégia do Partido, difundindo em momentos
oportunos certas palavras de ordem bem como fazendo prevalecer a autoridade do dirigente que
liderará as ações práticas determinadas pelas instâncias superiores, o ideal é organizar a
população pelo local de convivência comunitária, pelo local de moradia, privilegiando as
associações de moradores como a melhor organização da população em movimentos
comunitários, tanto por ter uma rede de comunicação mais pessoal bem como por aproveitar as
estruturas de influência e autoridade pessoal constituídas na convivência cotidiana, na qual se
sobressaem líderes que devem ser cooptados pelo partido.

Contudo, propor a organização de todo o movimento popular a partir do local de moradia , ao


invés de propor a sua organização por eixos de luta, é um erro analítico e político.

É um erro analítico porque resulta de uma análise equivocada da reprodução do capitalismo,


tanto no que se refere à reprodução social da força de trabalho, como da reprodução social da
cultura dominante - tanto de massas quanto popular- em seus aspectos ideológicos, que se
referem à compreensão da realidade, como em seus aspectos mais subjetivos e inconscientes de
reprodução de ações alienadas, em investimentos alienados de desejos nas relações do cotidiano,
tão bem exploradas pela mídia ( a análise da reprodução do capitalismo faremos mais à frente ).

Por não resultar de uma análise das estruturas de reprodução do capitalismo, tal modelo
organizativo não consegue enfrentá-las satisfatoriamente. Dito de outra forma, tal modelo
organizativo é ineficiente para a superação do capitalismo.

As estratégias de outros partidos de esquerda que buscam a implementação de um projeto


político democrático e popular, que refutam a ditadura do proletariado e as teses de um partido
único na transição para uma nova sociedade, afirmam a autonomia e a democracia dos
movimentos sindicais e populares como princípios básicos no encaminhamento das suas lutas.
Tais partidos não têm hoje uma proposta organizativa para o movimento popular, também
tratando-os taticamente em várias conjunturas.

Por outro lado têm a clareza de que o socialismo democrático somente se constrói com o
fortalecimento dos diversos atores sociais, partidos, movimentos, entidades da sociedade civil,
em torno de um projeto político de superação do modo capitalista de organizar a produção de
riquezas, a reprodução social, a gestão do poder político em todos os níveis, e da dominação
cultural.

Assim, todos os atores sociais revolucionários, mais do que propagar uma ideologia, devem
desenvolver práticas de luta e modos organizativos de gestão do poder que afetem as estruturas
do sistema capitalista, não as reproduzindo , construindo já, por outro lado, novas organizações,
modelos e mecanismos de produção, gestão, etc, que seriam plenamente desenvolvidos como
instrumentos de implantação do Socialismo Democrático.

2. MOVIMENTO POPULAR E ENFRENTAMENTO DO CAPITALISMO.

Ora se todos os movimentos sindicais e populares que buscam a superação do capitalismo


devem combatê-lo em suas ações, é necessário definir uma estratégia de tal enfrentamento que
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resulte de uma análise de suas estruturas de funcionamento bem como das correlações de forças
na sua manutenção ou dissolução.

2.1 ANÁLISE DA REPRODUÇÃO DO CAPITALISMO

Ao analisar a reprodução do sistema capitalista é necessário compreender tanto a exploração da


força de trabalho, quanto a exploração capitalista que a população sofre ao desenvolver as
atividades destinadas à reprodução social da sua força de trabalho, bem como a dominação
cultural que modela a subjetividade das massas de modo a produzir, consumir e se comportar
ética e politicamente segundo os interesses das classes dominantes. Cumpre analisar também o
caráter e o papel do Estado, quanto ao processo de manutenção/superação do capitalismo.

2.1.1 Exploração do Trabalho.

Ao restringir preferencialmente a análise do sistema capitalista no Brasil ao aspecto da


exploração da força de trabalho, considerou-se durante as últimas décadas que apenas o
movimento sindical tivesse um potencial estratégico no enfrentamento das estruturas de
manutenção do capitalismo, sendo que os demais movimentos populares - por não terem ainda
desenvolvido seu potencial que agora vai se impondo e terem permanecido no apoio tático ao
movimento sindical e partidário- acabaram ficando relegados a um segundo plano.

2.1.2 Exploração da Reprodução Social da Força De Trabalho

A ampliação do conceito de REPRODUÇÃO na tradição marxista incorporou todos os


processos considerados necessários à continuação da existência de um determinado modo de
produção englobando assim as instâncias ou práticas econômica, política e ideológica, devendo
todas elas serem reproduzidas a fim de que o modo de produção como totalidade estruturada
possa se reproduzir.

Muitos autores enfatizam, ao âmbito da reprodução econômica, que a reprodução social se abre
em dois níveis: a) o da reprodução da força de trabalho através do consumo, b) bem como o da
reprodução biológica da força de trabalho, com a reprodução de seres fornecedores potenciais de
força de trabalho. No primeiro item enfatizou-se o papel do trabalho doméstico na
transformação do salário em força de trabalho, e no segundo, o controle social sobre a mulher
como reprodutora biológica, analisando-se a relação entre a diferença sexual e o conjunto de
diferentes papéis potenciais na reprodução humana.

Merecerá atenção , aqui, a exploração capitalista da reprodução social da força de trabalho no


momento do consumo.

Os trabalhadores, após a jornada de trabalho, devem gastar os salários recebidos pelo período de
produção a fim de substituir sua força de trabalho nela consumida. Portanto, para que continue
existindo o acúmulo de mais valia que resulta da exploração do trabalho é necessário que o
trabalhador esgotado recupere as suas forças, isto é, reproduza a sua própria força de trabalho.

Para reproduzir a sua força de trabalho extremamente esgotada ao final da jornada de trabalho, o
trabalhador necessita deslocar-se para seu local de moradia, ingerir alimentos, medicar-se se for
necessário, repousar, distrair-se, etc. Portanto, para que haja a reprodução satisfatória da força de
trabalho são necessários transportes, postos de saúde, moradias, abastecimento alimentar, rede
de água, esgoto, luz, etc.

Para a população, moradia, transporte, atendimento médico, educação, etc, tem valor de uso.
Entretanto , para os capitalistas, estas necessidades da população são possiblidade de exploração
e expropriação para acúmulo de mais capital. Para eles, moradia, transporte, atendimento
médico, educação, etc, tem valor de troca, que se materializa no preço do aluguel, da terra, da
passagem de ônibus, na mensalidade escolar, etc.

Como o que importa, em última instância, não é satisfazer os interesses da população, mas
acumular mais capital, é preferível para o capitalista do transporte coletivo, por exemplo, que os
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ônibus trafeguem superlotados, pois isso dá mais lucro; que nos domingos hajam menos ônibus
trafegando para dar menos prejuízo.

É correto afirmar que o acúmulo de capital em tais serviços advém da exploração dos
trabalhadores que os executam, mas é preciso salientar que tal capital é mediatamente
expropriado do usuário que paga pelo serviço um valor exorbitante, acima do seu real valor
material de custo.

A lógica da exploração da reprodução social está presente em toda a organização da cidade. A


cidade é a resultante da permanente produção social e coletiva, pois nela participam inúmeros
agentes: desde grandes empresas imobiliárias, loteadores, construtoras e Governos, até mesmo o
setor lumpen que, ao fazer de uma periferia deserta uma pequena vila, faz com que os vazios
próximos se valorizem, ou ainda o Movimento Popular que, ao conquistar linhas de ônibus,
creches, escolas e anti-pós para os bairros periféricos, faz com que haja uma valorização
financeira daquela área intermediária reservada à especulação imobiliária que passa a ser
atendida pelas linhas de transporte, água, esgoto e energia elétrica que a população conquista.

Contudo, se para a população a cidade tem um valor de uso, o capitalista a explora pelo seu
valor de troca. Embora ela e seu valor sejam produzidos coletivamente, a cidade é apropriada
individualmente, pois é organizada e produzida sob a égide da propriedade privada. Os
interesses da população (uso) e do capitalista (troca), são antagônicos em toda a destinação da
cidade (infra-estrutura, uso do solo, saúde, educação, transporte, etc).

A forma de exploração capitalista quanto ao espaço urbano, especificamente, possui a seguinte


lógica. Uma certa área da cidade possui um valor de troca (vt1) e um determinado valor de uso.
Inúmeros agentes sociais, em especial a população aplicam trabalho sobre aquela área e fazem
daquele espaço vazio um bairro. Este trabalho produz um novo valor de uso e também um novo
valor de troca atual (vt2). A diferença entre o valor de troca atual e o antigo valor daquela área
(vt2-vt1) é um valor produzido coletivamente - inclusive pelos próprios movimentos populares -
mas que é apropriado individualmente por aquele que especula com os vazios urbanos, terrenos
baldios ou de "engorda", ou que cobra aluguéis, por exemplo.

2.1.3 Dominação Cultural

O grande avanço da dominação ideológico- cultural no capitalismo deveu-se ao fato de


desenvolver equipamentos que possibilitam manipular a subjetividade dos indivíduos, composta
de razão e sentimento; consciência, necessidades, desejos, medos, interesses, etc.

Nas sociedades em que os processos de comunicação de massa e informatização vão sendo


sofisticados - como o Brasil - a cada dia as dinâmicas de dominação ideológica vão sendo
aprimoradas e modificadas. Muito mais que universalizar uma certa compreensão do real
produzida pela classe dominante que acoberte as contradições do capitalismo, passa a ocorrer a
produção da subjetividade, mobilização de anseios, desejos e outros "sentimentos" com códigos
que atingem o inconsciente das pessoas, fazendo com que as mesmas tenham comportamentos
segundo os interesses das classes dominantes, e pior que isto, fazendo com que as próprias
pessoas co-elaborem o discurso que justifique a sua ação alienada e alienante. Por outro lado,
muitas pessoas sabem que são exploradas e, até mesmo, compreendem as contradições básicas
do capitalismo mas não se mobilizam na transformação do sistema, porque sua subjetividade, de
certa forma, é induzida a outras aspirações. De fato, a subjetividade consciente e inconsciente
dos indivíduos é produzida em tramas de forças difusas por todas as relações de poder social,
sejam políticas, pedagógicas, eróticas, religiosas, econômicas, etc, que podem passar por
instituições como família, escola, Igrejas, partidos, sindicatos, etc, potencializados ou não pelos
meios massivos de comunicação. Nesta produção da subjetividade o capitalismo realiza uma
sobrecodificação de todas as relações sociais fazendo com que o indivíduo constituído nessas
tramas de forças assuma papéis dentro de regras ou códigos estabelecidos pelo próprio
"sistema".

Assim, o desenvolvimento de tecnologias produtivas atinge a capacidade de produzir o


indivíduo especializado que opera tecnicamente a PRODUÇÃO, bem como produzir o indivíduo
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- recortado na sociedade de massa - que se individualiza na medida em que CONSOME segundo


os padres que lhe são postos ou que assume a identidade que se lhe é apresentada para destacar-
se dos demais, realizando com suas práticas, de fato, os interesses dos que comandam os
processos produtivo e de consumo. Economia, psicologia, sociologia, antropologia e demais
ciências humanas tornam-se instrumentos de produção de saber que possibilitam moldar o
comportamento de produtores e consumidores, de produzi-los como tais, com estas ou aquelas
competências, com estes ou aqueles desejos.

Na esfera do consumo, além de criação de novas necessidades culturais, há também - mesmo em


um país de pobres e miseráveis, como o é em grande parte o Brasil - o agenciamento do desejo
de consumir determinados produtos associados à fama, à vantagem, ao prazer, ao poder, etc,
com apelos mais passionais que racionais, pois apenas visam mover o desejo do consumidor em
adquiri-lo e não argumentar que o produto seja realmente de boa qualidade por tais e tais razões.

No processo de modelização da subjetividade, para se garantir o desempenho de produtor e


consumidor e, em especial, a manutenção do capitalismo, sobrecodifica-se todas as relações de
poder no cotidiano, conferindo-lhes uma dimensão de manutenção de todo o sistema. Assim, a
discriminação sexual, por exemplo, que já existia antes do capitalismo, passa, com este, a
vincular-se diretamente também na manutenção do interesse da classe dominante que legitima
suas práticas de exploração do trabalho da mulher , pagando menores salários a ela que a um
homem pelo mesmo serviço, argumentando teses preconceituosas presentes na cultura popular.

Assim, as mais variadas formas de violência e discriminação contra negros, mulheres,


deficientes, menores de rua, homossexuais, etc, - que são expressão de todo um conjunto de
forças difusas no campo popular que se exercem seguindo determinados padres introjetados nas
pessoas - , são utilizadas pelo capitalismo para manter padres e conceitos que equacionam tais
conjuntos de forças à manutenção do sistema como um todo.

Este misto de cultura popular que mantém relações micro-políticas de opressão - como no caso
do machismo e da discriminação racial, entre outras - que é sobrecodificada pelo capitalismo e
de cultura de massas que destrói referências de comportamento inadequadas ao interesses do
estágio de desenvolvimento do capitalismo no Brasil, resulta não apenas em uma certa maneira
de compreender o mundo, mas fundamentalmente em um modo de se comportar face às
inúmeras relações de poder vividas no cotidiano e em relação a estruturas maiores de poder no
âmbito da sociedade civil e Estado, como sindicatos, entidades de movimento popular, partidos,
governos, etc.

De fato, muitos são os fatores que regem os comportamentos individuais e coletivos, isto é, a
práxis social como um todo. Alguns desses fatores são de ordem racional; outros de ordem
passional. Daí o fato de que grupos sejam mobilizados passionalmente a agir contrariamente aos
seus próprios interesses manifestos e contrariamente aos objetivos estratégicos da própria classe
a que pertencem.

Tal modelização da subjetividade, que chega a este ponto, é realizada por uma intervenção sobre
o inconsciente dos indivíduos influenciando diretamente sua dinâmica passional. é nesse espaço
que se entrelaçam, efetivamente, os motores da práxis. Tal espaço é anterior à oposição
realidade-representação, e portanto, anterior ao âmbito das ideologias, anterior à consciência
significadora.

Assim, na efetivação dos processos de dominação, os Equipamentos Coletivos, meios de


comunicação e publicidade são usados intervindo nos níveis mais íntimos da vida subjetiva,
orientando, inconscientemente o indivíduo à busca de determinada capacitação produtiva, a
consumir determinados produtos, a aderir e eleger a determinados políticos - que são
propagandeados pela mídia como qualquer outro produto de comércio -, etc.

A partir deste estágio do desenvolvimento das forças produtivas e, em especial, pelo


desenvolvimento dos equipamentos e saberes necessários para a intervenção sobre a dinâmica
passional das massas e indivíduos pelas classes dominantes agenciando comportamentos em seu
interesse de classe, a luta ideológica é recolocada em um novo nível que não apenas o da
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compreensão e representação do real, mas o da capacidade de reverter essas dinâmicas de


agenciamento de desejos, vontades, etc. Permanecer no âmbito da afirmação do discurso crítico
é permanecer no âmbito da compreensão/representação, que não consegue intervir sobre a
dinâmica de modelização da subjetividade como um todo, que não se restringe apenas à
atividade cognitiva/racional. No atual estágio do capitalismo periférico brasileiro a dinâmica de
superação da alienação das massas exige mais do que por às claras os processos de exploração
do capitalismo, mas agenciar o desejo de construir uma nova sociedade, a utopia-concreta. Sem
a desalienação dos desejos e a reconstrução de uma sensibilidade ética e política, não haverá
como derrotar as classes dominantes.

2.1.4 O Caráter e o Papel do Estado

Não se pode afirmar que o Estado seja invariavelmente instrumento de coerção das
economicamente dominantes em favor de seus interesses. Sendo o Estados uma das mediações
das contradições entre classes e grupos sociais, no seu interior também se manifestam as
contradições das forças sociais que disputam a implementação de seus projetos políticos.

Nas democracias formais, o Estado também se torna espaço e instrumento de disputa pela
hegemonia.

Há, portanto, uma relação entre Sociedade Civil e Estado na qual estão presentes as tensões
relativas à disputa de implementação dos diversos projetos políticos defendidos por diversos
atores sociais.

Assim, o caráter e o papel do Estado variam conforme variam os grupos hegemônicos no


exercício de seu poder, e nas diversas formas de sua relação com as organizações da sociedade
civil.

É justamente atuando nesta relação - quer sobre a perspectiva da pressão externa da "sociedade
civil" através dos movimentos e organizações sociais, quer através de ações na esfera da
"Sociedade Política" através dos partidos, parlamentares, governos, etc - que se afetam o caráter
e o papel do Estado que tanto poderá defender os interesses das classes economicamente
dominantes, como assegurar os avanços conquistados pelas lutas populares.

2.2 ESTRATÉGIA DE ENFRENTAMENTO DA REPRODUÇÃO DO CAPITALISMO.

Para enfrentar a exploração capitalista da reprodução social da força de trabalho e da dominação


cultural, é necessário, por um lado, definir eixos de luta que confiram um caráter estratégico às
diversas lutas fragmentadas - e, muitas vezes, conjunturais - dos movimentos populares e não
apenas organizar os movimentos por local de moradia; por outro lado, é necessário elevar o grau
de mobilização, qualificação e articulação dos movimentos para seu fortalecimento tanto na ação
direta quanto institucional.

2.2.1 A Constituição dos Eixos de Luta.

De fato é necessário estabelecer eixos de luta em torno dos quais os movimentos se articulem
desenvolvendo lutas que avançando nas resoluções das necessidades imediatas acumulem forças
para irem implementando transformações estruturais, ou pelo menos construindo o consenso na
sociedade da necessidade de tais mudanças. Portanto, um eixo de luta deve articular as lutas
imediatas, conjunturais, de maneira tal que passem a ter um peso estratégico, afetando as
estruturas do capitalismo.

Assim, um eixo de luta reúne diversas lutas fragmentadas sobre questões específicas em uma
luta mais ampla assumida pelos vários movimentos específicos que passam a desenvolver ações
articuladas em torno de tal eixo, sem negar suas outras bandeiras particulares. Desta forma,
todas as lutas específicas reunidas em torno daquele eixo são fortalecidas por serem tratadas

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com um caráter estratégico, avançando na luta por mudanças estruturais que resultem na
conquista das diversas lutas específicas.

Normalmente cada movimento possui as suas bandeiras de lutas. Tais bandeiras, quase sempre,
expressam os objetivos que o movimento quer atingir, por exemplo, na questão da saúde,
educação, moradia.

Contudo, o capitalismo paleativamente atende - e pode melhorar consideravelmente - a situação


de saúde, moradia, educação da população, sem entretanto, modificar suas estruturas de
exploração, como no caso dos regimes social-democratas.. é preciso ter clareza de que o
movimento por creches conquistou muitas creches no Brasil, o movimento de luta contra o
desemprego conquistou algumas alternativas para os desempregados em 1984 e 85; inúmeras
favelas e ocupações organizadas são hoje, áreas regulamentadas; inúmeras novas linhas de
ônibus foram abertas sobre pressão dos movimentos; etc, etc,. Entretanto, a exploração
capitalista, estruturalmente, permaneceu do mesmo jeito. Considere-se ainda que inúmeros
vereadores, deputados , prefeitos e políticos em geral, se reelegeram por terem atendido
clientelisticamente algumas reivindicações dos movimentos populares, difundindo a idéia da
colaboração de classes, reforçando estereótipos machistas e discriminações. Isso ocorre porque
os movimentos não articulam suas lutas em torno de eixos que avancem para mudanças
estruturais na sociedade.

Portanto, definir um eixo de luta não é apenas encontrar uma luta prioritária que, em um dado
momento mobilize muitas pessoas e movimentos em ações conjuntas. Mais do que isso, um eixo
de luta deve sempre ligar à realidade imediata, conjuntural, os objetivos estratégicos de
construção da nova sociedade, o que supõe a superação do capitalismo. Para tanto, é necessário
afetar as suas estruturas econômicas, políticas e ideológicas. Isso somente ocorrerá quando os
movimentos estiverem articulados em torno de eixos de luta, mobilizando, avançando as
organizações populares e fazendo formação política de massa nas lutas do cotidiano, nas lutas do
dia-a-dia de cada movimento.

2.2.1.1 Eixos de Luta no Enfrentamento da Exploração da Reprodução Social da Força de


Trabalho.

Efetivamente os movimentos populares travam lutas que podem afetar as estruturas de


exploração da reprodução social da força de trabalho quando as diversas lutas por moradia,
saúde, transporte, saneamento e demais elementos ligados à reprodução da força de trabalho se
articulem em torno ao eixo de luta pela REFORMA URBANA, que avança não apenas para a
democratização do uso do solo - coibindo a especulação imobiliária, enfatizando a função social
da terra em detrimento ao direito de propriedade -, como também em direção da participação
popular no planejamento permanente da cidade - definido novas linhas de ônibus, tarifas,
localização de equipamentos públicos tais como creches, escolas, seus horários de
funcionamento, etc - bem como a gestão popular dos bens e serviços públicos em detrimento dos
interesses das empresas privadas que sempre deles se beneficiam.

Assim, ao invés de exigir que todo movimento de saúde, de transporte, saneamento,, etc tenha
que se organizar pelo local de moradia, o correto é desenvolver uma estrutura organizativa que
articule os variados movimentos que atuam na área de reprodução social da força de trabalho em
torno da REFORMA URBANA.

2.2.1.2 Eixos de Luta no Enfrentamento da Dominação Cultural .

O erro analítico da proposta de organizar todo o movimento popular por local de moradia,
reduzindo-o a apoiador de lutas comunitárias é ainda mais acentuado pelo fato de desconsiderar
a organização real dos movimentos culturais e seu papel estratégico no enfrentamento da cultura
de massas e dos elementos reacionários da cultura popular, ambos utilizados para a manutenção
do capitalismo.

Por outro lado, o conjunto dos movimentos populares que atuam no plano cultural sobre
questões como o machismo, a discriminação racial, discriminação de deficientes, entre outros,
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contribuem significativamente na reformulação de padres éticos incompatíveis com a utopia que


queremos realizar. Ao afirmarem a necessidade da mudança do exercício de poder nas práticas
cotidianas resgatando a sensibilidade mutilada pela cultura de massas, criticando os elementos
reacionários da cultura popular e padres de comportamento alienados agenciados pelos meios de
comunicação de massa, tais movimentos contribuem no enfrentamento da dominação
ideológico-cultural das elites sobre a massa e contribuem para a elaboração de uma cultura
popular revolucionária do capitalismo, do machismo, do racismo e de outras formas de exercício
autoritário do poder nas relações micro-políticas do cotidiano.

Tomemos como exemplo da importância desse enfrentamento as lutas desenvolvidas pelos


movimentos de mulheres, em seu aspecto feminista. Embora hajam variações de forma de
exercício de machismo, em razão da diversidade de padres culturais e morais do modo de
organização das relações cotidianas no campo e na cidade, as relações machistas têm a mesma
identidade de violência e alienação da mulher nas práticas do cotidiano - seja no campo, seja na
cidade - e sofrem a mesma sobrecodificação ideológica do capitalismo podendo justificar, por
exemplo, atitudes autoritárias de exercício de poder político que são aprovadas pelo povo graças
à sua vinculação ao que, no imaginário popular, são consideradas atitudes eticamente corretas.

Tenha-se como exemplo da significação política do machismo na totalidade do sistema a sua


sobrecodificação como uma das ideologias de suporte da campanha política e do Governo Collor
que justificou e justifica - no imaginário popular de parcelas machistas da população (tanto
homens quanto mulheres) - o exercício autoritário do poder.

Na campanha e no Governo Collor estiveram e estão presentes os códigos e as práticas


machistas. O estereótipo do homem forte, que não leva desaforo para casa, que fazia o
tradicional gesto da banana para os adversários e que vinculou sua postura política frente ao
governo com o fato de já ter nascido "com aquilo roxo", trazem um significado político ao
machismo no imaginário popular que, indiretamente, serve de ideologia de suporte às suas
atitudes autoritárias. não é sem razão que, quando o Plano Collor bloqueou os cruzados novos,
escutou-se dizer nos ônibus e praças que o presidente havia mostrado que realmente era um
"homem macho mesmo".

Contudo, os eixos de luta que vêm se constituindo na prática, mas que se revelam incapazes de
compor unificadamente as lutas de todos os movimentos ideológico-culturais, tem sido
"cidadania" e "contra a discriminação", este último mais ligado a negros, mulheres e deficientes,
ainda, entretanto, com um caráter incipiente de enfrentamento das estruturas ideológico-culturais
do capitalismo, uma vez que poderia existir capitalismo sem racismo e discriminação sexual, ou
de deficientes físicos. Por outro lado é mister reafirmar o caráter estratégico de tais movimentos
na mudança do exercício de poder nas relações cotidianas.

O caráter estratégico de um eixo de lutas neste âmbito não pode ser apenas o de eliminar do
cotidiano a discriminação e o pré-conceito, mas fundamentalmente o de construir novas relações
interpessoais liberadas de todos os códigos culturais opressivos, possibilitando a vazão do desejo
em práticas singularizantes que, sendo incompatíveis com as dinâmicas e códigos de reprodução
do capitalismo, avancem como revolução cultural, afirmando uma nova sensibilidade ética e
estética - horizonte necessário a um novo projeto político.

2.2.2.3 Eixos de Luta na Relação dos Movimentos Populares com o Estado.

O enfrentamento do movimento popular em relação ao Estado, não é menos importante que o


seu enfrentamento direto do capitalismo na esfera da reprodução social da força de trabalho. Se
por vezes o enfrentamento do capital se dá na ação direta, outras vezes ele se dá mediatizado
pelo Estado. Dependendo da maneira como esse embate é realizado, desmascara-se o papel
ideológico e de classe do Estado burguês, ou pode-se avançar para a implantação de uma gestão
democrático-popular, como ocorre ainda incipientemente em algumas prefeituras no país. De
fato, o Estado é o responsável em grande parte, pelos equipamentos e serviços como transporte,
escolas, praças, pelo abastecimento de mercadorias para o consumo da população, bem como,

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por definir também certos parâmetros do uso do solo, etc. Por tudo isto, o Estado é também um
alvo importante da ação dos movimentos populares.

A definição de eixos de luta possibilita aos movimentos terem uma ação mais articulada na sua
relação com o Estado. Tal relação hoje, ainda - em sua maioria - desarticulada e desunida
realiza-se de três formas: parte dos movimentos populares permanece atrelada aos governos,
outra parcela significativa desenvolve ações de enfrentamento com gestões populistas ou
autoritárias, sendo que outra parcela vem realizando a "participação popular" nas gestões
democrático-populares.

Os eixos de luta, articulando as lutas por conquistas conjunturais com os acúmulos de força e
politização da população para a conquista de objetivos mais estratégicos que afetem o modo de
reprodução do capitalismo, são referências tanto para a ação direta quanto para a ação
institucional.

Tomemos como exemplo a Reforma Urbana. As ocupações dos sem-teto tanto podem avançar
para a exigência de uma Reforma Urbana - na definição do planejamento permanente da cidade,
em especial quanto à ocupação do espaço urbano, na definição das políticas de habitação e
gestão popular das verbas, equipamentos e serviços públicos - como pode ser apenas uma forma
de resolver um problema imediato.

Por outro lado, o movimento de saúde tanto pode avançar na conquista da Reforma Urbana -
com a população gerindo as verbas da saúde, definindo a localização de postos, etc - como
permanecer na reivindicação, que poderá ser atendida sem alterar o repasse das verbas públicas
da saúde para a iniciativa privada.

Ao articular-se - efetivamente e não apenas em palavras de ordem - em torno de um eixo de


lutas, os movimentos saem do patamar reivindicatório e atingem um patamar propositivo, pois
passam a ter clareza dos objetivos estratégicos que pretendem atingir.

Os movimentos, portanto, na sua relação com o Estado, não podem apenas reivindicar, pois suas
reivindicações podem ser atendidas parcialmente - ou até totalmente - pelo próprio Estado sem
com isso afetar as estruturas de exploração capitalista da reprodução social, sendo condição
inclusive de servir aos interesses do capital privado. é o que ocorre quando, por exemplo, a
reivindicação por extensão de uma linha de ônibus é atendida pela prefeitura com um percurso
que é definido com o interesse de valorizar vazios urbanos há muitas quadras distantes das áreas
a serem atendidas pela reivindicação da população. Assim, o nível da reivindicação deve ser
superado pelas práticas de proposição de políticas públicas.

A relação do Movimentos Populares com o Estado passa a ter um caráter estratégico na medida
em que propõem e influenciam - à base da pressão - a definição das políticas de construção,
desenvolvimento e gerenciamento da cidade, isto é, afirmando e exigindo a gestão popular dos
serviços e equipamentos públicos. A definição de tais políticas e gestão popular do complexo
urbano podem afetar a estrutura da cidade organizada aos moldes capitalistas - que coloca a
coisa pública ao serviço da acumulação privada dos grupos econômicos - e apontar para uma
socialização na apropriação coletiva da cidade.

Contudo, as experiências reais desse tipo de intervenção são mínimas e tem encontrado
dificuldades de implementação. Os Conselhos Populares são espaços propícios para este tipo de
intervenção, havendo também os mecanismos de iniciativa popular de lei, plebiscito, tribunas
livres - em alguns municípios, etc.

Deve ficar explícito, no entanto, para os integrantes do movimento, que tipo de projeto político
norteia ou vai sendo implementado pela ação conjunta da população nas suas mais diferenciadas
frentes de luta, e também, por outro lado, que tipo de projeto político vai sendo implementado
pela administração , pelo Governo, em suas políticas públicas, independentemente das siglas
partidárias que o compõem.

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Para que tenha uma ação estratégica, o movimento popular não pode ficar atrelado a nenhum
partido, por mais revolucionário que pretenda ser o partido. O caráter suprapartidário do
Movimento Popular possibilita a aglutinação da população explorada em movimentos
democráticos, o que significa respeitar a decisão da maioria independentemente de suas filiações
ou não a partidos.

Evidentemente, os eixos de luta articulam os movimentos para mudanças estruturais do modo de


reprodução do capitalismo e portanto, na prática, são a negação de determinado projeto político
de manutenção do capitalismo e implementação de um outro projeto político que o subverte.
Contudo, não se pode confundir projeto político com estratégias partidárias.

Assim, os projetos políticos que se formulam no interior dos partidos devem orientar seus
militantes que atuam nas diversas frentes de luta a propor estratégias e táticas ao conjunto dos
movimentos. O debate e a discussão política no interior dos movimentos deve ser fomentado,
amplo, aberto à pluralidade. Entretanto, tal debate deve ter como contra-partida a unidade de
ação, independentemente dos projetos particulares de tal ou qual partido, desta ou daquela
tendência, que não tenha conquistado no debate a adesão majoritária às suas teses. Os
movimentos populares não podem se constituir em braços de partidos ou de governos.

2.3 A CENTRAL COMO ORGANIZAÇÃO ESTRATÉGICA DO MOVIMENTO


POPULAR NO ENFRENTAMENTO DO CAPITALISMO.

2.3.1 ARTICULAÇÃO DOS MOVIMENTOS POPULARES E UNIFICAÇÃO DE LUTAS


COMO NECESSIDADE HISTÓRICA.

A construção da Central do Movimento Popular vem se concretizando como resultado das


experiências práticas de articulação de movimentos e unificação de lutas na última década,
buscando a superação do imediatismo, da atomização das lutas, propondo a articulação dos
movimentos populares em torno de eixos de lutas estratégicos no enfrentamento do capitalismo -
como a Reforma Urbana, por exemplo. Esse processo de articulação de movimentos e unificação
de lutas foi ocorrendo historicamente ao longo dos anos 80.

Por volta do ano de 1985, após terem adquirido o papel de interlocutores junto ao Estado, as
parcelas mais combativas dos movimentos populares enfrentavam dois leques de dificuldades.

Por um lado os movimentos não tinham CAPACITAÇÃO TÉCNICA E POLÍTICA para


desempenhar seu papel de interlocutores junto ao Estado. Assim, a reivindicação pelo não
aumento do preço da passagem de ônibus, por exemplo, era respondido pelo Estado com base
em planilhas complexas de cálculos de desgaste de equipamentos, índices de custos de insumos,
etc, que por trás de todo um conjunto complicado de equações escondiam a exploração
capitalista realizada por empresas privadas na área do transporte coletivo. Por outro lado, as
reivindicações do movimentos - por falta de uma definição mais precisa de objetivos históricos e
estratégicos - ficavam apenas no caráter conjuntural, imediato, não avançando para intervenções
sobre elementos mais estruturais da organização da cidade e da sociedade.

A outra dificuldade dos movimentos era a FRAGMENTAÇÃO E DISPERSÃO DAS LUTAS. A


multiplicação de movimentos atuando com os mais diversos objetivos, com diversificadas
formas de organização, levou a uma grande dispersão de forças em várias áreas. Por outro lado,
inúmeros militantes de movimentos populares acabavam participando de vários movimentos
simultaneamente, tendo, em seu cotidiano, um grande desgaste físico e psicológico, bem como
em suas relações familiares - pois a convivência afetiva reduzia-se a um tempo mínimo-, etc. Era
comum o comentário que em reuniões de diversos movimentos acabam aparecendo, várias
vezes, as "mesmas caras".

Com esses dois grandes problemas o movimento popular reflui e entra em crise, percebendo a
necessidade de melhorar a sua capacitação técnica e política, e de formular uma estratégia que

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lhe possibilitasse intervir em tantas áreas diferenciadas sem reduzir o poder de fogo em cada
uma delas, superando a fragmentação e dispersão.

A tentativa de superação dessas dificuldades estratégicas levou, por um lado, à organização de


articulações nacionais de movimentos ou de militantes em torno de questões específicas como a
Articulação Nacional do Solo Urbano ( ANSUR ), a Articulação Nacional da Luta pelo
Transporte (ANLUT) - possibilitando um melhor nível de capacitação às lutas -, e movimentos
nacionais como o Movimento de Defesa do Favelados, o Movimento Nacional de Meninos e
Meninas de Rua, entre outros - que se fortaleceram com a organização a nível nacional -,
algumas Federações de Associações de Moradores que foram construídas efetivamente a partir
das lutas populares, a Confederação Nacional das Associações de Moradores - em certo sentido
-, as articulações de militantes e assessores de diversos movimentos como a Articulação
Nacional do Movimento Popular e Sindical ( ANAMPOS ).

Contudo, as articulações e federações que aglutinavam um determinado movimento específico


pouco contribuíram na superação da fragmentação entre os diversos movimentos constituídos
em torno de questões próximas, mas que permaneciam organizativamente isolados, como por
exemplo, saúde, habitação e infra-estrutura em geral.

A partir de todas essas experiências foram se materializando duas propostas de organização dos
movimentos tendo em vista a superação dos desafios já mencionados. Numa delas se idealizou
uma estratégia que unificava diversos movimentos sob uma mesma entidade legal que era a
associação de moradores.

A outra estratégia partia de uma profunda reflexão sobre a prática de lutas dos diversos
movimentos populares e não apenas dos movimentos comunitários e de sua complementariedade
para a construção de um nova sociedade justa e fraterna. Ao invés de idealizar uma estratégia e
propor a união dos movimentos sob a Associação de Moradores, propunha a ARTICULAÇÃO
DOS DIVERSOS MOVIMENTOS e a UNIFICAÇÃO DE LUTAS, respeitando a total
autonomia organizativa dos diversos movimentos, que se articulariam para desenvolver lutas
conjuntas e prioritárias numa perspectiva que afetasse o capitalismo na área da reprodução
social, pressionasse o Estado e combatesse as ideologias de exploração e dominação. Tais lutas
deveriam ser definidas democraticamente pelos próprios movimentos em plenárias e fóruns
conjuntos. Para tanto seria necessário construir uma Entidade Nacional de Movimentos
Populares, que mais tarde veio a ser denominada CENTRAL DE MOVIMENTOS
POPULARES.

Esta segunda estratégia de articulação dos movimentos e unificação de lutas vai ganhando
consistência, especialmente a partir de 1986. A implantação do Congresso Nacional Constituinte
e as brechas conquistadas para a participação do M.P. no processo de elaboração da nova
constituição, obrigaram os movimentos a atuarem com firmeza no embate institucional e
substituir a simples reivindicação de soluções localizadas e conjunturais para seus problemas
pela elaboração - com assessoria técnica - de emendas populares de lei que buscavam a
resolução desses problemas com transformações estruturais a nível nacional. Assim, naquela
conjuntura, a luta reivindicatória que durante vários anos havia acumulado experiência em
diversas áreas específicas, como infra-estrutura, saúde, educação, transporte, moradia, etc, era
sistematizada para o novo embate, que agora se dava no espaço da ação institucional. As
emendas populares eram, de certa forma, expressão dos conhecimentos acumulados nos diversos
campos da luta direta, reorganizados numa perspectiva política mais estratégica e numa
formulação técnica apropriada.

O que ocorre de mais interessante, porém, é que, em vários casos, reivindicações de diversos
movimentos eram articuladas em uma única emenda. A emenda da Reforma Urbana tratava
tanto da ocupação de terras urbanas quanto da disposição de equipamentos públicos - como
postos de saúde, escolas, etc -, como do planejamento permanente das cidades que envolvem,
entre outras coisas, a definição de novas linhas de transporte, novas creches, etc.

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Se na prática, por um lado, o que estava acontecendo era a UNIFICAÇÃO DE VÁRIAS LUTAS
EM TORNO DE ALGUNS EIXOS, por outro lado havia a ARTICULAÇÃO DE INÚMEROS
MOVIMENTOS se entre-apoiando na conquista de assinaturas para apresentarem as emendas ao
Congresso Constituinte.

De fato, somente o conjunto das lideranças mais de frente conseguiu refletir profundamente todo
aquele processo e aprender com a prática. A cada dia estava mais claro a importância estratégica
da Central do Movimento Popular. Era preciso articular os movimentos, unificar lutas, continuar
mobilizando nas ações diretas e não mais reivindicar , mas propor politicamente projetos viáveis
e na luta articular o enfrentamento do capital, do Estado e das ideologias de exploração e
dominação.

Portanto, claro está que a estratégia que pretende organizar todo o movimento popular sob as
associações de moradores advém de um erro analítico de compreensão do papel que o
movimento popular pode desempenhar no enfrentamento do capitalismo, bem como de um erro
político que é desconsiderar a organização real que os movimentos não-comunitários
desenvolveram para o acúmulo de forças no avanço de suas lutas específicas.

Por outro lado, somente uma Central de Movimentos Populares articulando os mais variados
movimentos populares em torno de eixos de lutas estratégicos possibilitará o avanço das lutas
dos movimentos populares na superação do capitalismo.

De outra parte, qualquer organização de movimento popular, para desenvolver uma ação
estratégica de enfrentamento do capitalismo, deverá ter amplo poder de mobilização e a
capacidade de formar suas bases e militantes para uma intervenção politicamente mais
qualificada e não apenas por solidariedade às lideranças e dirigentes que são respeitados por
deterem certos conhecimentos e capacidades que não socializam com os demais justamente para
se manter no poder. Triste exemplo deste tipo de prática de manipulação da população por
dirigentes que se perpetuam no topo de estruturas verticalistas de poder podem ser encontrados
na maioria das Federações de Associações de Moradores, cuja estrutura organizativa possibilita
e foi construída para decisões e direção centralizadas.

2.3.2 A ORGANIZAÇÃO ESTRATÉGICA DOS MOVIMENTOS POPULARES

O modo de organizar o movimento popular é, ele próprio, um elemento que deve ser definido a
partir de uma estratégia de enfrentamento do modo de reprodução do capitalismo.

Alguns, baseados em uma análise equivocada do capitalismo, advogam a tese de que as lutas dos
movimentos populares não têm como afetar as estruturas básicas do capitalismo, uma vez que
não incidiriam sobre a contradição CAPITAL X TRABALHO. Daí resultaria o fato de que o
movimento popular deva ter um papel tático em tal enfrentamento, apoiando o movimento
sindical e executando as tarefas determinadas pelo partido.

A posição defendida neste texto, pelo contrário, explicitou que as lutas dos movimentos
populares podem ter um caráter de enfrentamento do modo de reprodução do capitalismo - nos
aspectos da reprodução social da força de trabalho, na dominação cultural e no enfrentamento do
Estado - quando articulam os diversos movimentos e suas lutas fragmentadas em torno de eixos
de luta.

É a partir da constituição dos eixos de luta que os movimentos podem se articular com um peso
estratégico no enfrentamento do capitalismo. Para tanto será necessário a organização de fóruns
para debates e deliberações acerca dos encaminhamentos das lutas articuladas dos movimentos
em torno de eixos.

Afirmamos anteriormente que pretender organizar todo o movimento popular por local de
moradia resulta de um erro analítico de compreensão do funcionamento do capitalismo, e

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também político, de conceber uma estratégia que desconsidera o modo real de organização que
os movimentos populares não comunitários desenvolveram as partir dos anos 80.

De fato, a estratégia que prioriza o local de moradia como espaço de organização do movimento
popular como um todo é insatisfatória, sendo talvez muito mais o desdobramento prático de
estratégias partidárias do que resultado de uma ampla REFLEXÃO e análise de funcionamento
do capitalismo e das práticas dos movimentos populares nas últimas décadas na implementação
de determinados projetos políticos.

Se por um lado as associação de moradores são organizações legítimas da população e devem


ser fortalecidas como espaço de encaminhamento de lutas populares e de disputa hegemônica de
projetos políticos, por outro lado, elas são apenas uma das formas de organização popular, sendo
também, apenas, uma das parcelas do movimento popular.

Sob a estrutura dos Associações de Moradores poder-se-ia organizar vários movimentos de base
comunitária. Entretanto, como articular os demais movimentos específicos que não se
restringem a lutas de uma região geográfica ou não se articulam por local de moradia como o
movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, como os Movimentos de Negros, os
Movimentos Ecológicos, os Movimentos de Mulheres e tantos outros ?

Propor que tais movimentos reformulem suas estruturas organizativas construídas a partir do
acúmulo de suas lutas que são hoje as formas ainda mais apropriadas de avançar na conquista de
seus objetivos, para se submeterem a tornarem-se departamentos de associações de moradores,
ou organizarem-se semelhantemente a tais associações, é uma proposta injustificável sob o
ponto de vista do acúmulo do forças para a conquista de tais objetivos específicos pelos quais os
movimentos se organizaram, sendo, em muitos casos, algo inclusive impossível de ser realizado,
como no caso do movimento de mulheres marginalizadas, dos movimentos de indígenas
desaldeados e tantos outros movimentos populares.

2.3.3 UMA ESTRUTURA NECESSÁRIA

As estruturas rígidas, verticalistas e hierarquizadas das Confederações da Associações de


Moradores, se prestam tanto ao manobrismo cupulista por parte de dirigentes de direita, quanto
podem ser uma expressão de uma certa concepção de revolução cuja direção é fortemente
centralizada, cabendo somente a uma vanguarda esclarecida o papel de direção e às bases o
papel de implementação das ações táticas definidas pelo grupo dirigente. não é por acaso que,
durante longo tempo, havia uma composição entre PFL, PCB, PC do B e outros partidos na
direção da CONAM.

Tal estrutura sob o ponto de vista da superação do capitalismo, somente é adequada ao


movimento popular como um todo se lhe atribuirmos exclusivamente e equivocadamente apenas
um papel tático em relação aos projetos estratégicos do movimento sindical e partidário.

Pelo contrário, a estrutura que os movimentos populares necessitam para implementarem suas
lutas articuladas em torno de eixos estratégicos e promoverem um amplo processo de formação
política de massa, base, lideranças e dirigentes deve ser a mais horizontal possível, e ter a
mínima dimensão possível, sendo organizada na exata proporção das necessidades do avanço
das lutas dos movimentos populares no afetamento das estruturas de reprodução do sistema
capitalista.

Para avançar as lutas dos movimentos populares como um todo numa perspectiva estratégica,
será necessário organizar uma Central com uma estrutura de funcionamento adequada às
exigências reais do fortalecimento dos movimentos e suas lutas na conquista de seus objetivos,
imediatos e históricos.

Os fóruns municipais/regionais, estaduais e nacionais, promovidos pela Central, poderão ser


instâncias privilegiadas de debates , articulação e definição de encaminhamentos de lutas. Tais
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fóruns seriam abertos a todos os movimentos populares, filiados ou não à Central, e à população
em geral, organizada ou não, em pastorais, movimentos sindicais, etc.

Contudo, os fóruns nada deliberariam em relação à Central. Por isso, além dos fóruns abertos à
participação de toda a população, as plenárias dos movimentos filiados à Central - também
realizadas a nível municipal/regional, estadual e nacional - são indispensáveis na definição das
estratégias da própria Central, tendo em vista seus processos de organização, formação e
mobilização.

Como órgãos auxiliares poderão ser organizados departamentos ou comissões temáticas que
teriam por finalidade elaborar propostas de políticas para essas áreas e táticas de ação conjunta a
serem levadas aos fóruns de debates, explicadas, reformuladas e aprovadas pelos participantes
dos movimentos como propostas a serem implementadas na ação direta e institucional.

Além destas instâncias, a nossa prática tem exigido a organização de coordenações e executivas
a nível municipal/regional, estadual e nacional. Tais coordenações devem priorizar mais o papel
de coordenação, propriamente dito, que o de direção - para o qual também possuem a autoridade
conferida pela escolha democrática nas plenárias -, evitando-se , assim, o distanciamento das
instâncias que representam na direção política, mas que têm por tarefa principal coordenar e
articular. é triste constatar que em muitas organizações de movimentos sociais e partidários,
aqueles que pertencem a coordenações e diretórios dificilmente estão próximos à base,
absorvidos que estão em disputas entre tendências na definição de posicionamentos frente às
conjunturas a fim de dar direção política a essas mesmas bases.

Tal preocupação advém da necessidade de tolher da proposta de estrutura organizativa da


Central quaisquer elementos que apontem para consideráveis possibilidades de sua
burocratização. é preciso também criar mecanismos de elaboração coletiva que impeçam que as
comissões ou departamentos tornem-se espaço de disputa política entre grupos, tendências e
movimentos, ficando aberta a possibilidade de serem elaboradas, inclusive, várias propostas
diferenciadas que seriam debatidas nos fóruns.

Assim, é salutar evitar todo e qualquer dispositivo organizativo que tenha normalmente se
burocratizado nas demais entidades.

A estrutura da Central, como a concebemos, possibilita articular os diversos movimentos e a


população ainda não organizada em torno de eixos de luta estratégicos - como os fóruns -,
avançando na capacitação técnica e proposição de políticas públicas - elaboradas nas comissões
ou departamentos setoriais e debatidas e aprovadas nos fóruns -; busca evitar a burocratização,
valoriza a dimensão horizontal da estrutura, com a ampla participação democrática - plenárias- ,
garante a total autonomia organizativa para os movimentos, e tenta impedir o distanciamento
entre direção e base, pois cabe primordialmente à direção o papel de coordenar, o que só é
possível acompanhando presentemente o desenvolvimento das lutas.

_____________________________

* Euclides André Mance foi membro da Coordenação Nacional da Pró-Central de Movimentos


Populares no período de agosto/90 a outubro/91.

Eixos de Luta e a Central de Movimentos Populares


Revista de Cultura Vozes. N. 6, Ano 85 - volume 85 - novembro/dezembro de 1991, p. 645-671

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