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Saldo final de dívida dado pagamento, juros e taxa de

juros

Luciano de Paiva Oliveira (luciano.lpo19@gmail.com)


1 Introdução
Em modelagem financeira tende-se a simplificar métodos complexos em contas mais
básicas muitas vezes envolvendo somente as 4 operações básicas da matemática. O pre-
sente artigo tem o objetivo de aprimorar uma das premissas frequentemente utilizada em
modelagem de dívida: o cálculo do valor pago em juros dado os saldos atual e final e a taxa
de juros acumulada do período. Uma possível aplicação do método aqui ilustrado seria a
criação de uma fórmula em Excel (ou softwares algébricos similares) capaz de replicar os
resultados de uma Tabela Price em uma simples fórmula matemática.

2 Problema
O problema parte de um cenário em que temos poucas informações disponíveis sobre
a dívida: não sabemos quando ela começou nem quanto acaba, tampouco sabemos o
saldo devedor. Todavia sabemos quando foi pago de juros no último ano e quanto foi
amortizado. Sabemos também a taxa de juros % e o número de parcelas (usualmente 12),
e assumimos a hipótese de que os pagamentos foram feitos de forma igual a cada período.
De forma algébrica: seja uma dívida com as seguintes características:

• Número de parcelas pagas: n

• Taxa de juros a cada parcela: r

• Total de juros pagos ao final das n parcelas: b

• Pagamento periódico efetuado: a

Qual é o montante da dívida ao final da parcela n?

3 Solução
Sejam x1, x2, x3, ..., xn os valores de juros pagos a cada período, temos então a nossa
primeira equação:
n
X
xk = b (1)
k=1

Definindo y como o saldo final da dívida, temos para a última parcela (n):

(y + Amortn ) ∗ r = xn (2)
Sabemos também que a amortização de um período k é:

Amortk = a − xk (3)
Logo:

(y + (a − xn )) ∗ r = xn (4)
Para a parcela n-1:

(y + (a − xn ) + (a − xn−1 )) ∗ r = xn−1 (5)

1
(y + 2a − xn − xn−1 )) ∗ r = xn−1 (6)
E para uma parcela k qualquer:
n
X
(y + (n + 1 − k) ∗ a − xj ) ∗ r = xk (7)
j=k

Temos então n + 1 variáveis indepentes e n + 1 equações linearmente independentes1 ,


ou seja, estamos diante de um Sistema Possível e Determinado. Colocando esse sistema
na forma canônica teríamos:
(
(y − nj=k xj ) ∗ r − xk = −a ∗ r ∗ (n + 1 − k), para k indo de 1 a n
P
Pn (8)
k=1 xk = b

Trabalhando um pouco mais a primeira equação:


(P
( nj=k xj − y)r + xk = ar(n + 1 − k), para k indo de 1 a n
Pn (9)
k=1 xk = b
Colocando o sistema em formato matricial:
    
r+1 r r ... r −r x1 arn
 0
 r+1 r ... r −r   x2  ar(n − 1)
   
 0
 0 r + 1 ... r −r   x3  ar(n − 2)
  =  
 ... ... ... ... ... ... ...   ...   ... 
    
 0 0 0 ... r + 1 −r  xn   ar 
1 1 1 ... 1 0 y b
Dividindo as n primeiras linhas da matriz por r+1:

   
1 r/(r + 1) r/(r + 1) ... r/(r + 1) −r/(r + 1) arn/(r + 1)
0
 1 r/(r + 1) ... r/(r + 1) −r/(r + 1) ar(n − 1)/(r + 1)
 
0 0 1 ... r/(r + 1) −r/(r + 1) ar(n − 2)/(r + 1)
 
:
 
... ... ... ... ... ... ... 
   
0 0 0 ... 1 −r/(r + 1)   ar/(r + 1) 
1 1 1 ... 1 0 b

Pelo Método da Eliminação de Gauss, basta que o triângulo inferior esquerdo da


equação contenha apenas zeros para que encontremos o valor de y. Multiplicando a
primeira linha por -1 e somando com a última temos a seguinte matriz:

   
1 r/(r + 1) r/(r + 1) ... r/(r + 1) −r/(r + 1) arn/(r + 1)
0
 1 r/(r + 1) ... r/(r + 1) −r/(r + 1) ar(n − 1)/(r + 1)
 
0 0 1 ... r/(r + 1) −r/(r + 1) ar(n − 2)/(r + 1)
 
:
 
... ... ... ... ... ... ... 
   
0 0 0 ... 1 −r/(r + 1)   ar/(r + 1) 
0 1/(r + 1) 1/(r + 1) ... 1/(r + 1) r/(r + 1) b − arn/(r + 1)

Multiplicando a última linha por (r+1)


1
Prove você mesmo

2
   
1 r/(r + 1) r/(r + 1) ... r/(r + 1) −r/(r + 1) arn/(r + 1)
0
 1 r/(r + 1) ... r/(r + 1) −r/(r + 1) 
  ar(n − 1)/(r + 1) 

0
 0 1 ... r/(r + 1) −r/(r + 1) 
: ar(n − 2)/(r + 1) 

... ... ... ... ... ...   ... 
   
0 0 0 ... 1 −r/(r + 1)  ar/(r + 1) 
0 1 1 ... 1 r (b − arn/(r + 1)) ∗ (r + 1)
Percebe-se que ao repetir esse processo para as linhas de 2 a n ter-se-há uma matriz com
triangulo inferior esquerdo zerado. Os únicos elementos necessários para se determinar
y são os elementos [n+1][n+1] da matriz de coefientes e o elemento [n+1] da matriz de
termos independentes.
Denotando c[k] como o termo geral da série de iterações para o elemento [n+1][n+1]
da matriz de coeficientes e d[k] o termo geral para o elemento [n+1] da matriz de termos
independentes, sabemos que:
(
c[0] = 0
c[k] = (c[k − 1] + r/(r + 1)) ∗ (r + 1)
(
d[0] = b
d[k] = (d[k − 1] − ar(n + 1 − k)/(r + 1)) ∗ (r + 1)
E sabemos que:

y = d[n]/c[n]
c[n] é uma soma de PG com razão (r + 1). Esse comportamento fica mais visível
quando calculamos c[1], c[2], c[3] e c[4]:


 c[1] = r

c[2] = r(r + 1) + r


 c[3] = r(r + 1)2 + r ∗ (r + 1) + r
c[4] = r(r + 1)3 + r(r + 1)2 + r ∗ (r + 1) + r

Dada a fórmula da soma da PG:

Sn = a1 ∗ (q n − 1)/(q − 1)
Temos que:

c[n] = r ∗ ((r + 1)n − 1)/r


c[n] = ((r + 1)n − 1)
Que é também a fórmula para o juros composto no período.
Já d[n] é o último termo de uma PG adicionado a uma soma de PAG (Progressão
Aritimético-Geométrica).


d[1] = b(r + 1) − arn

2
d[2] = b(r + 1) − arn(r + 1) − ar(n − 1)



d[3] = b(r + 1)3 − arn(r + 1)2 − ar(n − 1)(r + 1) − ar(n − 2)

...





d[n] = b(r + 1)n − (ar/(r + 1)) ∗ (n ∗ (r + 1)n + (n − 1) ∗ (r + 1)n−1 + ... + (r + 1))

3
Sabemos que a soma de uma PAG é dada por:

Sn = a[0] ∗ (q n − 1)/(q − 1) + (kq ∗ (1 − nq n−1 + (n − 1)q n )/(1 − q)2


Substituindo os termos, temos que:

(r + 1)(1 − (n + 1) ∗ (r + 1)n + n(r + 1)n+1 )


Sn =
r2
r+1
Sn = 2 ∗ (1 − (n + 1) ∗ (r + 1)n + n(r + 1)n+1 )
r
Desta forma:
ar r+1
d[n] = b(r + 1)n − ∗ 2 ∗ (1 − (n + 1) ∗ (r + 1)n + n(r + 1)n+1 )
r+1 r
a
d[n] = b(r + 1)n − ∗ (1 − (n + 1) ∗ (r + 1)n + n(r + 1)n+1 )
r

y = d[n]/c[n]
Então, finalmente:

a(r + 1)n − anr(r + 1)n − a + br(r + 1)n


y=
r((r + 1)n − 1)
Esta fórmula pode ser usada para se obter quaisquer uma das 5 variáveis sabendo-se
as outras 4.

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