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OS CENTAUROS E OS VIGILANTES

“O homem é feito visivelmente para pensar; é toda a sua dignidade e todo o seu mérito;
e todo o seu dever é pensar bem.” (Blaise Pascal)

O que difere, nós, seres humanos, do restante dos animais é a capacidade de


pensar racionalmente. De produzir linguagem, comunicação, de codifica-la, de produzir
cultura. Essa é a reflexão do grande pensador francês Blaise Pascal: “o que é o ser
humano?” O ser humano é uma obra pensante; um ente com a capacidade de refletir, de
filosofar, de fazer ciência, de fazer cultura. Diferentemente dos animais que, esboçam
de forma prematura certa “inteligência”, pois, os animais sabem, porém, não sabem que
sabem. Eles agem instintivamente. Não são capazes de produzir concepções
intelectuais. A vida de um animal é apenas uma repetição básica dos instintos de sua
espécie. Mas o que isso tem a ver com o título desse texto? E, principalmente com o
profissional de segurança privada? Vejamos.

Há na mitologia grega um ser fantástico conhecido como centauro. Este ser é


um híbrido, metade humana e metade cavalo. Havia basicamente duas famílias: Os
filhos de Cronos e Filira e os filhos de Íxon e Nefele. O interessante que, no âmbito da
segurança patrimonial, existem basicamente dois tipos de vigilantes que, possuem
exatamente as mesmas características dessas duas famílias de centauros. Demonstrarei.

A família de Íxon e Nefele possuíam os centauros com uma personalidade


grosseira, insensata, de pensamento “estamentalizado” (quase instintivo). É tristíssimo,
mas, essa é a realidade da grande maioria dos vigilantes. Colocam-se tão-somente como
máquinas de serviço que cumprem seu período laboral. São limitados exclusivamente
em estar na postura e cumprir horários. Não possuem uma capacidade de alto padrão em
um relacionamento interpessoal; não possuem uma capacidade de antecipação de risco,
de analise dos casos da sua função e muito menos de uma pronta resposta para
solucionar qualquer QRU (problema) que venha surgir, sem que lhe seja ordenado
quando, onde e como fazer; muitas vezes são dispersivos e sem controle emocional.
Profissionais que se limitaram em realizar apenas o curso de formação, onde é exigido
apenas a 4ª série do ensino fundamental. Não buscaram, e nem pretendem buscar um
conhecimento a parte, para com isso agregar funcionalidade e valorizar-se como um
profissional destacado. Quando buscam esse conhecimento é apenas uma extensão na
área, e sem mais.

A família de Cronos e Filira era justamente ao contrário da primeira. Possuíam


centauros com personalidades benevolentes. Eram justos, fortes, sensatos, sábios,
dispostos a aprender, a ensinar, a valorizar-se. Essa família surgiu devido a repulsa que
Filira teve de seu filho com Cronos, a saber, Quíron. Cronos encantou-se pela ninfa, e
para possuí-la, transformou-se em um cavalo. A criança nasceu híbrida. Sua mãe a
abandonou, porém, o deus Apolo o tomou como pupilo, ensinando-lhe todos os seus
conhecimentos: filosofia, ciências, artes, música, poesia, medicina, terapias curativas
etc., ensinou-lhe as técnicas de luta, estratégia e guerra e de manusear o arco e flecha.
Quíron se diferenciou dos demais centauros ao ponto de ser tutor de grandes heróis
como Héracles (nome grego de Hércules), Aquiles, Teseu, Ajax e outros. Assim deve
ser o vigilante patrimonial em sua carreira.

A óptica da segurança privada irá cada vez mais buscar profissionais com as
seguintes características: qualificação profissional (não apenas o curso de formação e
extensões); apresentação individual (não apenas a postura pessoal, mas o
comportamento, a concentração, a formalidade etc.); comunicação de alto padrão
(apresentar uma forma adequada de expressar-se mesmo que seja para proibir algo ou
esclarecer que não possui a informação desejada) na portaria 3.233/12 é descrita como
urbanidade; capacidade de antecipação (detalhista, não dispersivo, concentrado, sabedor
do que fazer); e, controlado emocionalmente (saber lidar com crises e não se tornar a
crise – ter o controle em situações de estresse).

Agora analisem... Quantos profissionais na área de segurança privada


(especificamente vigilantes) dão devida atenção ao conhecimento? Quantos
profissionais procuram as qualidades e qualificações acima descritas, para com isso
agregarem valores aos seus currículos e em seu serviço? Pouquíssimos. Por isso é de
igual modo triste saber desta condição.

O efetivo de vigilantes no Brasil era de 989 mil vigilantes em 2013. Só no


estado do Rio de Janeiro o número subiu para 91 mil, neste mesmo ano, segundo
matéria do Bom Dia Brasil – disposta no G1, link: http://g1.globo.com/…/numero-de-
vigilantes-privados-e-quase…

O que vemos com isso é a concorrência na área em grande demasia. As escolas


de vigilantes, todos os meses, enxertam no mercado uma quantidade elevada de
profissionais que, na grande maioria, ficarão desempregados (sinto muito informar, mas
esta é a realidade). E, cabe a este profissional um choque de consciência que o ilumine,
fazendo-o perceber que o curso de vigilante é apenas UMA das capacitações que um
bom profissional da área deve possuir. O conhecimento vai bem mais além. O
investimento em sua profissão também. Profissionais que se limitam a aprender ficarão
de fora do mercado de trabalho e sua real tendência é DESAPARECER!

Não abordei aspectos econômicos nesse texto, pois o tornaria mais uma
resenha técnica e fugiria do meu verdadeiro intento: Alertar ao profissional da vantagem
que um conhecimento holístico pode oferecer-lhes dentro do mercado de trabalho dessa
área em particular. E aqui vai meu apelo: Sejam como Quíron: abrace a oportunidade;
busquem saber; busquem aperfeiçoar-se; busquem crescer intelectualmente! Não sejam
como animais instintivos que apenas repetem reflexos e impulsos de suas espécies. Mas,
aludindo ao arqueólogo Gordon Childe (A Evolução Cultural do Homem), sejam os
modificadores do ambiente. Adaptem-se, ajuste-se de tal modo ao mercado como
nenhuma criatura irracional é capaz de fazer. Isso só vai trazer benesses para vossas
vidas.

Rômulo Lima

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