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Registro: 2017.

0000800928

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Mandado de Segurança


nº 2127583-41.2017.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é impetrante
NILTON DE LIMA BRAHIM, é impetrado GOVERNADOR DO ESTADO DE
SÃO PAULO.

ACORDAM, em Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São


Paulo, proferir a seguinte decisão: "DENEGARAM A SEGURANÇA. V.U.
SUSTENTOU ORALMENTE O ADV. DR. DAVID FRANCISCO MENDES.", de
conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores


PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente sem voto), ALEX ZILENOVSKI,
ADEMIR BENEDITO, ANTONIO CARLOS MALHEIROS, MOACIR PERES,
FERREIRA RODRIGUES, PÉRICLES PIZA, EVARISTO DOS SANTOS,
MÁRCIO BARTOLI, JOÃO CARLOS SALETTI, FRANCISCO CASCONI,
RENATO SARTORELLI, CARLOS BUENO, FERRAZ DE ARRUDA, BORELLI
THOMAZ, JOÃO NEGRINI FILHO, SÉRGIO RUI, SALLES ROSSI, RICARDO
ANAFE, ALVARO PASSOS, AMORIM CANTUÁRIA E BERETTA DA
SILVEIRA.

São Paulo, 18 de outubro de 2017.

ANTONIO CELSO AGUILAR CORTEZ


RELATOR
Assinatura Eletrônica
Mandado de Segurança nº 2127583-41.2017.8.26.0000
Impetrante: Nilton de Lima Brahim
Impetrado: Governador do Estado de São Paulo
Interessado: Fazenda do Estado de São Paulo
Comarca: São Paulo
VOTO N. 2433/17

Mandado de segurança contra ato do Governador do


Estado de São Paulo. Investigador da Polícia Civil.
Procedimento Administrativo Disciplinar. Faltas
disciplinares de natureza grave. Imposição da
penalidade de demissão a bem do serviço público.
Prescrição da pretensão punitiva. Inocorrência. Faltas
funcionais que também configuram infrações penais.
Contagem que deve considerar o prazo prescricional em
abstrato da infração penal praticada (art. 80, III, da Lei
Complementar Estadual n. 207/79), no caso, 20 (vinte)
anos, a teor dos artigos 109, I, e 317, § 1º, do Código
Penal. Deflagração do procedimento administrativo a
partir de denúncia anônima. Possibilidade. Inexistência
de abuso de autoridade ou de qualquer outra
ilegalidade no procedimento. Observância dos
princípios constitucionais do devido processo legal, da
ampla defesa e do contraditório. Poder Judiciário que
exerce apenas controle de legalidade, sem enfrentar o
mérito administrativo. Procedimento sumário do
mandado de segurança que não comporta dilação
probatória. Instauração e desenvolvimento do processo
administrativo não condicionados a prévio
pronunciamento do Juízo Criminal.Ordem denegada.

V I S T O S.

Trata-se de mandado de segurança impetrado por


Eliel Cavallaro de Aguiar, qualificado à p. 01, em face de ato administrativo editado
pelo Exmo. Sr. Governador do Estado de São Paulo, com fundamento no artigo 5º,
LXIX, da Constituição Federal, e artigo 303, do Código de Processo Civil. Insurge-se o
impetrante contra a penalidade de demissão a bem do serviço público que lhe foi
imposta ao cabo do Procedimento Administrativo Disciplinar n. DGP 1889/2012-
SSP/SP, com fundamento nos artigos 74, inciso II, e 75, inciso VI, da Lei
Complementar Estadual nº 207/1979, com as alterações da Lei Complementar
Estadual nº 922/2002. Narrou o impetrante, em síntese, que ocorreu a prescrição da
pretensão punitiva no âmbito administrativo, nos termos do artigo 2º, do Decreto n.

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20.910/32, haja vista que a instauração do Procedimento DGP 1889/12 remonta a
16.03.2012, ao passo que a decisão que impôs a penalidade foi proferida somente em
16.03.2017; disse que a portaria investigativa inaugural lastreou-se em denúncia
anônima, o que inquina de nulidade absoluta o procedimento, nos termos do artigo
144 da Lei n. 8.112/90. Em relação ao mérito, alegou que não estava presente no
momento da apreensão do ônibus e das mercadorias procedentes do Paraguai e que
a referida denúncia anônima foi engendrada pelo investigador de polícia Valdemir
Cavalcante, o qual agiu no intuito de haurir vantagem indevida decorrente da prática
de ilícitos (infrações de contrabando e descaminho); asseverou que a autoridade
coatora foi induzida a erro, na medida em que o parecer da AJG n. 74/2017 aludiu a
inexistente condenação na esfera penal. Ao final, requereu o deferimento de liminar e
a “imediata suspensão do ato impugnado, que determinou a exoneração do
Impetrante, devendo ser reconhecida in limine a prescrição arguida”, para que
reassuma de imediato suas funções habituais, bem como a concessão da segurança,
reconhecendo-se a ilegalidade do ato do Governador do Estado de São Paulo. A
tutela de urgência foi indeferida a p. 3212. A autoridade impetrada prestou
informações a p. 3216/3242, no sentido da inocorrência da prescrição, uma vez que a
penalidade foi regularmente aplicada no prazo de cinco anos; apontou erro material ao
final do Parecer da AJG n. 74/2017 (consistente na menção equivocada da
condenação criminal do impetrante), o que, porém, não prejudica as considerações
neste contidas; bateu-se pela legalidade da denúncia anônima e a impossibilidade de
reanálise das provas e do mérito administrativo; defendeu a regularidade das provas
produzidas, as quais expõem com segurança a prática de infração administrativa de
natureza grave pelo impetrante; discorreu acerca da impossibilidade de acolhimento
do pedido de devolução de quantias não percebidas em razão da pena imposta,
porquanto o mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança. Às p.
3250/3262, a Douta Procuradoria Geral de Justiça emitiu parecer pela denegação da
ordem.
É o relatório.
Dispõe o artigo 5º, LXIX, da Constituição Federal,
acerca da possibilidade de impetração de mandado de segurança para a defesa ou
manutenção de direito líquido e certo, que não seja amparado por habeas corpus ou
habeas data, quando for constatada a prática de ilegalidade ou abuso de poder por
autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder
Público.

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O writ em apreço refere-se ao Procedimento
Administrativo Disciplinar nº DGP 1889/2012-SSP/SP, ao qual foi submetido o
impetrante Eliel Cavallaro de Aguiar, ex-Investigador de Polícia, nos termos da portaria
inaugural reproduzida às p. 90/96, que culminou com a imposição, pela autoridade
apontada como coatora, da penalidade de demissão a bem do serviço público, com
fundamento nos artigos 74, II, e 75, VI, da Lei Complementar nº 207, de 05 de janeiro
de 1979 (Lei Orgânica da Polícia Civil do Estado de São Paulo), com as alterações da
Lei Complementar nº 922, de 02 de julho de 2002.
Instaurou-se o processo disciplinar à vista de
denúncia anônima endereçada à Delegacia Seccional de Carapicuíba/Barueri, por
meio da qual o denunciante narrou que em 22.07.2007 retornava de excursão ao
Paraguai quando o ônibus em que viajava foi parado por policiais do 1º Distrito Policial
de Barueri, que estariam à procura de entorpecentes no veículo. Embora nenhuma
droga ilícita fosse encontrada, os policiais teriam solicitado a importância de
R$20.000,00 (vinte mil reais) para 'liberar' o ônibus e as mercadorias produto de
descaminho.
Em decorrência desses mesmos fatos, o impetrante
e os demais agentes policiais que tomaram parte nos fatos, Nilton de Lima Brahim,
Luiz Roberto Silveira Kortenhaus, Gerson Marcolino Pereira e Sérgio Luís Aguiar,
foram denunciados como incursos nos crimes previstos nos artigos 288, caput, e 317,
§ 1º, (por duas vezes) c/c artigo 29, na forma do artigo 69, todos do Código Penal, o
que deu origem ao Processo Crime n. 0027686-16.2007.8.26.0068, 2ª Vara Criminal
de Barueri.
Pretende o impetrante que esta Corte reconheça o
decurso do lapso prescricional da pretensão punitiva e, no mérito, declare a
ilegalidade da pena de demissão a bem do serviço público que lhe foi imposta, com o
que deverá ser reconduzido ao regular exercício das suas funções.
Entretanto, sem razão.
De início, não há prescrição a considerar.
O impetrante foi processado porque, em conjunto
com os agentes policiais supra referidos, em 27.07.2007 e 01.10.2007, solicitou de
terceiros vantagem econômica para liberar veículo e mercadorias trazidas do Paraguai
por comerciantes autônomos, as quais não tinham procedência comprovada.
Importante observar que as condutas faltosas que
ensejaram a instauração do PAD em desfavor do impetrante e dos demais agentes

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policiais também são capituladas como infrações criminais, o que atrai a incidência do
artigo 75, II, da Lei Complementar n. 207/79, com as alterações introduzidas pela Lei
Complementar n. 922/2002. As condutas típicas e antijurídicas praticadas pelo
impetrante estão descritas nos artigos 288 e 317, § 1º, do Código Penal, a saber:
Art. 288. Associarem-se três ou mais pessoas, para o
fim específico de cometer crimes:
Pena reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.
Parágrafo único. A pena aumenta-se até a metade se
a associação é armada ou se houver a participação de criança ou adolescente.
[...]
Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem,
direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em
razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e
multa.
§ 1º A pena é aumentada de 1/3 (um terço), se, em
consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar
qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.
Em vista disso, o lapso prescricional não é o de cinco
anos previsto no Decreto n. 20.910/32, mas sim aquele contado pela maior pena
criminal em abstrato, ausente notícia de absolvição criminal pela inexistência do fato
ou por este não configurar crime (artigo 65, parágrafo 2º, da Lei Complementar n.
207/79, com as alterações introduzidas pela Lei Complementar n. 922/2002).
Assim, aplica-se o disposto no artigo 80, III, da Lei
Complementar n. 207/79, com as alterações introduzidas pela Lei Complementar n.
922/02, verbis:
Artigo 80 - Extingue-se a punibilidade pela
prescrição:
[...]
III - da falta prevista em lei como infração penal, no
prazo de prescrição em abstrato da pena criminal, se for superior a 5 (cinco) anos.
Para o crime mais grave perpetrado (Corrupção
passiva), a pena máxima em abstrato ultrapassa 12 anos, de modo que incide o
disposto no artigo 109, inciso I, do Código Penal:
Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado

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a sentença final, salvo o disposto no § 1º do art. 110 deste Código, regula-se pelo
máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (Caput com

redação dada pela Lei nº 12.234, de 2010).

I - em vinte anos, se o máximo da pena é superior a


doze.
Simples exame dos autos aponta que não decorreu
período superior a 20 anos entre as balizas prescricionais previstas na legislação de
regência, de modo que a alegação de prescrição deve ser rechaçada.
Acerca da prescrição em hipóteses semelhantes,
assim já se manifestou este Órgão Especial:
“Mandado de segurança. Impetração que visa
reintegração de servidor demitido a bem do serviço público pelo Governador do
Estado. Falta disciplinar tipificada como crime. Cálculo do prazo prescricional
considerada a pena cominada em abstrato. Prescrição inocorrente. Ausência de
nulidade no processo administrativo disciplinar. Competência da autoridade
administrativa para instauração do procedimento. Denegação da segurança.” (MS n.
117.542-0/1-00. Rel. Des. Canguçu de Almeida, j. 29.06.05).
“Ação de mandado de segurança. Investigador de
polícia. Impetração contra ato do Governador do Estado de São Paulo. Demissão a
bem do serviço público. Art. 75, II da Lei Complementar 207, de 5 de janeiro de 1979.
A prescrição da falta administrativa se rege pela pena em abstrato do fato criminal.
Exame da legislação. Ordem denegada.” (MS n. 171.103-0/4-00 Rel. Des. Eros Piceli,
j. 21.10.09).
Em relação à denúncia anônima, observa-se que a
dicção do artigo 144 da Lei n. 8.112/90 não obsta que se apurem os fatos nela
narrados; o que o dispositivo impõe é o dever de a autoridade competente investigar
as denúncias que possuam autoria identificada:
“Art. 144. As denúncias sobre irregularidades serão
objeto de apuração, desde que contenham a identificação e o endereço do
denunciante e sejam formuladas por escrito, confirmada a autenticidade”.
De outro lado, o artigo 264 da Lei Estadual n.
10.261/68 impõe à autoridade o dever de instaurar investigação quando tiver
conhecimento, por qualquer meio, da prática de infração:
“Artigo 264 - A autoridade que, por qualquer meio,
tiver conhecimento de irregularidade praticada por servidor é obrigada a adotar

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providências visando à sua imediata apuração, sem prejuízo das medidas urgentes
que o caso exigir” (g.n.).
A abrangência da locução “por qualquer meio” deixa
claro que a investigação de uma possível irregularidade não se vincula a uma
iniciativa específica, de sorte que é perfeitamente possível o início do procedimento
disciplinar a partir de denúncia anônima.
Esse é o entendimento do C. Superior Tribunal de
Justiça, exemplificado pelos seguintes arestos:
“Direito Administrativo. Recurso Especial. Servidor
Público Federal. Processo Administrativo Disciplinar. Denúncia anônima. Nulidade.
Não-ocorrência. Recurso conhecido e improvido. 1. Tendo em vista o poder-dever de
autotutela imposto à Administração, não há ilegalidade na instauração de processo
administrativo com fundamento em denúncia anônima. Precedentes do STJ. 2.
Recurso especial conhecido e improvido”. (STJ - 5" T. - REsp. 867.666 - Rei. Arnaldo
Esteves Lima DJE 25.05.2009).
“Administrativo. Servidor Público. Militar. Demissão.
Processo Administrativo Disciplinar. Carta anônima. Licitude. Dilação probatória. Writ.
Via inadequada. I - A carta anônima é meio hábil para a instauração de processo
administrativo disciplinar, cabendo a Administração a apuração dos fatos narrados na
denúncia, ainda que apócrifa. II - Questões cuja solução demandaria,
necessariamente, revisão do material fático apurado no processo disciplinar, ou a
incursão sobre o mérito do julgamento administrativo, não podem ser apreciadas em
sede de mandamus. Recurso desprovido”. (STJ - 5a T. - ROMS 19.224 - Rei. Felix
Fischer-DJ 01.07.2005).
No mesmo sentido orienta-se a jurisprudência deste
Tribunal paulista:
“Mandado de segurança. Processo administrativo.
Demissão de policial civil. Deflagração de processo administrativo por meio de
denúncia anônima. Possibilidade. Processo-crime não obsta o andamento de
processo administrativo, em virtude da autonomia das instâncias. Sanção disciplinar
de "demissão a bem do serviço público" aplicada com suporte fático e legal.
Procedimento administrativo disciplinar que observou os princípios da legalidade, do
devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Sentença mantida. Recurso
desprovido”. (12ª Câmara de Direito Público Apelação n.
1001067-33.2014.8.26.0053, Relª. Desª. Isabel Cogan, j. 18.03.2015, g.n.).

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“Apelação Cível. Mandado de Segurança. Pretensão
de serventuário estatutário de serventia extrajudicial dirigida à anulação de processo
administrativo, por meio do qual lhe foi imposta pena de suspensão. Segurança
denegada na origem. Possibilidade de instauração de processo administrativo
disciplinar com base em denuncia anônima. Ilação que se extrai do poder-dever
de autotutela da Administração. Precedentes do STJ. Desnecessidade de prévia
sindicância. Natureza de mera peça informativa. Precedente do STF. Ausência, no
mais, de comprovação de prejuízo ('pas de nullité sans grief'). Efetiva prática das
infrações imputadas ao impetrante. Questão que demanda dilação probatória
incompatível com a estreita via de cognição propiciada pelo mandado de segurança.
Sentença mantida. Recurso não provido. '1) A denúncia anônima pode servir de
base para a instauração de processo administrativo disciplinar. 2) Em linha de
princípio, a sindicância, via de regra, não constitui fase obrigatória do processo
administrativo disciplinar senão e apenas fase preliminar facultativa ou fase única, em
circunstâncias especiais. A sindicância assume natureza bifronte: pode ser
preparatória, visando a obtenção de subsídios para a instauração do procedimento
administrativo, ou assumir autonomia, nas hipóteses de aplicação de pena de menor
magnitude, desde que seja assegurado o direito de ampla defesa'" (4ª Câmara de
Direito Público - Apelação n. 994.02.080925-5, Rel. Des. Rui Stoco, j. 19.04.2010,
g.n.).
“APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA.
SERVIDORA PÚBLICA ESTADUAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.
Anulação do processo pretendida pela impetrante, com a alegação de que se originou
em denúncia anônima, está fundamentado em prova obtida por meio ilícito, além de
haver excesso de prazo para a sua instauração. Procedimento administrativo que
observou os princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa.
Hipótese na qual, em momento anterior ao da apuração preliminar, a Administração
recebeu denúncia anônima contra a servidora, por "e-mail", e a Autoridade
competente, com o objetivo de apurar os fatos, instaurou a sindicância, que,
posteriormente, deu origem ao processo disciplinar contra a impetrante. Inexiste
empecilho constitucional ou legal ao acolhimento de denúncia anônima para
desencadear processo administrativo, visando à proteção de interesse público,
desde que se colham, oportunamente, os elementos probatórios pertinentes à
espécie, situação observada no caso. Precedentes do STJ neste sentido. Ausência
de ilicitude da prova e de vícios que pudessem ensejar a nulidade pretendida.

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Inocorrência de excesso de prazo na instauração do processo administrativo. Prazo
previsto no art. 277, da Lei Est. nº 10.261/68, que não é peremptório. Segurança
denegada em primeira instância. Sentença mantida. Recurso não provido”. (13ª
Câmara de Direito Público Apelação n. 1001438-26.2016.8.26.0053, Rel. Des.
Djalma Lofrano Filho, j. 19.04.2017, g.n.).
De outra parte, não se cogita de indução da
autoridade coatora a erro, por conta da informação constante do Parecer da AJG n.
74/2017. O teor do parecer é claro no sentido de que o impetrante e os demais
denunciados ainda respondem ao processo-crime deflagrado pelos fatos aqui
apreciados, de maneira que o equívoco não configura causa de nulidade da pena
imposta.
Em relação aos demais aspectos, imperioso destacar
a inadequação da via mandamental para a reanálise valorativa de provas, como
pretendido pelo impetrante, uma vez que não se presta a ação de segurança à revisão
do acervo probatório e ao reexame do suporte fático fundamentador da penalidade
imposta ao impetrante. Sobre este particular, assim já decidiu o C. Supremo Tribunal
Federal:
“MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR
POLICIAL. DEMISSÃO. INQUÉRITO ADMINISTRATIVO. INVIABILIDADE DE
DISCUTIR FATOS E PROVAS EM MANDADO DE SEGURANÇA. ILIQUIDEZ DE
FATOS. INDEFERIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA”. (MS 20441/DF - Rel.
Min. Néri da Silveira - Pleno - Julgamento: 01.08.1984 - DJ 01.03.1985).
Ademais, o rito sumário do mandado de segurança
não comporta dilação probatória; a comprovação do direito líquido e certo alegado
exige, pois, a presença de prova pré-constituída, ausente na espécie.
Nessa esteira, releva notar que o processo disciplinar
que culminou com a demissão do impetrante obedeceu rigorosamente aos princípios
constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal: o
impetrante foi regularmente citado, constituiu defensor, arrolou testemunhas e se
manifestou livremente nas oportunidades em que lhe cabia, conforme se observa dos
documentos juntados às p. 37/3212.
Destarte, o presente mandado de segurança não se
constitui no meio adequado para rever o mérito da decisão administrativa objurgada;
restringe-se a atuação do Poder Judiciário tão somente ao controle de legalidade e
eventuais abusos do ente administrativo.

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A pretendida revisão do conjunto probatório e do
mérito do ato administrativo não encontra espaço no âmbito do mandado de
segurança, consoante jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça mencionada
pelos D. Procuradores de Justiça oficiantes neste feito, Dr. Lycurgo de Castro Santos
e Dr. Rossini Lopes Jota:
“ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA.
PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. VIOLAÇÃO
DOS ARTIGOS 116, INCISO III E 117, INCISOS IX E XI, DA LEI Nº 8.112/90.
ALEGAÇÃO DE DESPROPORCIONALIDADE ENTRE OS FATOS APURADOS E A
PENA APLICADA. MÉRITO DO ATO ADMINISTRATIVO. AFERIÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE. 1. As alegações do impetrante limitam-se à mera discussão
acerca da proporcionalidade do ato administrativo emanado pelo Exmo. Ministro de
Estado da Previdência Social, que aplicou-lhe a pena de demissão do cargo de
Técnico Previdenciário do quadro de pessoal do Instituto Nacional do Seguro Social
INSS, por não observar as normas legais e regulamentares, por valer-se do cargo para
lograr proveito pessoal ou de outrem e, ainda, por atuar como procurador ou
intermediário junto à repartição pública, violando os artigos 116, inciso III e 117,
incisos IX e XI, da Lei nº 8.112/91. 2. Segundo a pacífica jurisprudência desta Corte
Superior de Justiça 'o controle jurisdicional dos processos administrativos se restringe
à regularidade do procedimento, à luz dos princípios do contraditório e da ampla
defesa, sem exame do mérito do ato administrativo' (RMS 22.567/MT, Rel. Ministro
OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 28/04/2011, DJe 11/05/2011). 3.
Segurança denegada”. (STJ, MS 11053/DF, S-3 Terceira Seção, Rel. Min. Vasco Della
Giustina, j.11.04.2012).
“RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE
SEGURANÇA. POLICIAL MILITAR. EXCLUSÃO. PENA. APLICAÇÃO. AUTORIDADE
COMPETENTE. COMANDANTE GERAL. ESFERAS ADMINISTRATIVA E PENAL.
INCOMUNICABILIDADE. MÉRITO ADMINISTRATIVO. LIMITES DO CONTROLE
JURISDICIONAL. PROPORCIONALIDADE. EXAME. INVIABILIDADE. 1. O
Comandante-Geral da Polícia Militar é a autoridade competente para a aplicação de
penalidade em razão da prática de ilícitos disciplinares. Precedentes. 2. As esferas
penal e administrativa são independentes e autônomas, razão pela qual a aplicação
de sanção administrativa não depende do desfecho da ação penal. Precedentes. 3.
Averiguar a adequação, à luz do princípio da proporcionalidade, da penalidade
imposta no processo disciplinar, importaria, nas circunstâncias do caso, fazer exame

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do próprio mérito administrativo, inviável em mandado de segurança. Precedentes. 4.
Recurso ordinário a que se nega provimento”. (STJ, RMS 32573/AM, T-1 Primeira
Turma, Rel. Min Teori Albino Zavascki, j.04.08.2011).
Importante destacar, por fim, que o feito
administrativo não está condicionado ao trânsito em julgado da ação penal, haja vista
a independência das esferas civil e criminal, conforme bem pontuado pelo Supremo
Tribunal Federal, em acórdão de relatoria do Min. Oswaldo Trigueiro:
"FUNCIONÁRIO. DEMISSÃO, APÓS PROCESSO
REGULAR, EM QUE SE ASSEGUROU AMPLA DEFESA. A PENALIDADE
ADMINISTRATIVA NÃQ ESTÁ CONDICIONADA AO PRÉVIO PRONUNCIAMENTO
DA INSTÂNCIA CRIMINAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E
PROVIDO." (1ª-T., RE 75.421/BA, Rel. Min. Oswaldo Trigueiro, j . 29.10.1974).
E ainda:
“Recurso em Mandado de Segurança. Processo
Administrativo Disciplinar. Policial Civil do Estado. Pena de Demissão. Falta
Administrativa Residual. Suspensão do Processo Administrativo até o Trânsito em
Julgado do Processo Criminal. Lei Complementar Estadual n° 114/2005.
Descabimento. Independência das Esferas Administrativa e Criminal. Inexistência de
Prova Pré-Constituída do Direito Alegado. Recurso Ordinário Improvido. O art. 217 da
LC estadual n° 114/2005, que determina a suspensão de processo administrativo
disciplinar até o julgamento da ação penal, expressamente excepciona a hipótese em
que há falta administrativa residual, como se verifica no caso em exame. Ademais, a
independência entre as esferas civil, administrativa e criminal, reconhecida pela
jurisprudência consolidada nesta Corte, corrobora a legalidade do procedimento
adotado na instância ordinária. A prova pré-constituída constante dos autos é coerente
com os fundamentos de fato e de direito do acórdão recorrido e da decisão
administrativa impugnada, não se comprovando, de outro modo, os argumentos
articulados pela recorrente. Recurso ordinário improvido”. (STJ 2ª-T., RMS
32.461/MS, Rel. Min. César Asfor Rocha, j. 12.06.2012).
Assim, a ausência de sentença penal condenatória
não impede a autoridade impetrada de apreciar, no âmbito administrativo, a conduta
imputada ao impetrante, tampouco de apená-lo com a respectiva sanção
administrativa.
Como se vê, considerando-se inexistir prova de
violação de direito líquido e certo e considerando-se a exposição acima e a

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inexistência de abuso de autoridade ou qualquer outra espécie de nulidade do
procedimento disciplinar a que foi submetido o impetrante, é de rigor a denegação da
ordem.
Ante o exposto, denega-se a segurança. Custas na
forma da Lei. Incabível a fixação de honorários advocatícios.

ANTONIO CELSO AGUILAR CORTEZ


RELATOR

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